Sentença de Julgado de Paz
Processo: 357/2015-JPCBR
Relator: MARGARIDA SIMPLÍCIO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL /DANOS PATRIMONIAIS/ RESPONSABILIDADE DOS DEMANDADOS
Data da sentença: 04/29/2019
Julgado de Paz de : COIMBRA
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
Processo n.º 357/2015-J.P.CBR

RELATÓRIO:

O demandante, Condomínio do prédio sito na ..., Lote ..., na freguesia de ..., no concelho de Coimbra, representado por mandatária constituída.

Requerimento Inicial: O condomínio do prédio sito na ..., Lote ..., em Coimbra encontra-se descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Coimbra, sob o n.º 1... da freguesia de ... e São Paulo de Frades, com a matriz n.º 3..... O prédio foi constituído em propriedade horizontal, por escritura pública outorgada a 10 de Dezembro de 1996, no Primeiro Cartório Notarial de Coimbra. Atualmente, o prédio é administrado pela sociedade “C..., Lda.” representada por M.. Os primeiro, segundo e terceiro demandados são comproprietários da fracção AA do referido prédio, composto por um estabelecimento em duplex, sito no rés-do-chão e primeiro andar, identificado pelo n.º 2, o segundo a contar do poente, destinado e comércio, indústria hoteleira, e similar, pátio do lado poente e norte, ao nível do rés-do- chão e quatro estacionamentos na cave, com os números vinte e seis, vinte e sete, vinte e oito e vinte e nove, respectivamente os primeiro, segundo, terceiro e quarto a contar do poente da fila central-norte. A quarta demandada é arrendatária da referida fracção, exerce a sua actividade de padaria, pastelaria e similares, venda de charcutaria, café, snack-bar, bombonaria, geladaria e tabaco. Em finais de 2013, os demandados realizaram obras de fundo no estabelecimento comercial, com alterações de todo o espaço interior da fracção, e concomitantemente, alterações no pátio existente à entrada do estabelecimento comercial, colocando um novo piso, com características diversas das existentes até à data. Ora, as obras provocaram inúmeros danos no edifício, nomeadamente na parede do hall de entrada do prédio e junto ao elevador, no rodapé, no tecto e candeeiros do hall de entrada. Também ao nível da cobertura, os cabos de electricidade não foram devidamente acondicionados e foram retiradas as grelhas de ventilação. Os danos mencionados foram reparados após a notificação efectuada pela demandante para o efeito. Sucede que, desde a conclusão das obras realizadas no interior e no exterior do estabelecimento comercial, em finais de 2013, foram detectadas infiltrações na garagem da cave, situada no piso imediatamente inferior ao aludido terraço, cuja reparação se revela necessária e urgente. A garagem coletiva é constituída por 39 lugares de garagem correspondentes ao Lote ..., servindo de passagem a outros lugares de estacionamento do Lote 2. As infiltrações e humidades verificam-se numa extensão correspondente a cerca de 30 metros, com todo o tecto da garagem manchado e com sinais evidentes de humidades e bolores, que necessitam de reparação urgente. Os danos são provenientes das águas pluviais, que se infiltram em local indeterminado do estabelecimento comercial, alastrando-se por uma grande zona do tecto da garagem e caindo no piso da mesma, com acumulação em grandes poças de água que abrangem parte significativa da área da entrada da garagem e de passagem dos veículos automóveis. Existem deficiências nas obras realizadas, que provocam infiltrações das águas pluviais para o interior da garagem, deteriorando as paredes, pilares, tectos e o próprio piso, pelo que urge realizar obras de remoção do pavimento e rodapé em toda a esplanada/pátio, bem como as caixas de escoamento e aplicação de material de impermeabilização e revestimento, de forma a eliminar as infiltrações existentes no interior da garagem. Apesar de notificados, os demandados não procederam à reparação das anomalias verificadas na garagem, pelo que, conforme acta n.º 24 da Assembleia Geral de Condóminos, sob o ponto 6 da ordem de trabalhos “assuntos de interesse geral”, foi deliberado pela Assembleia de Condóminos que, em virtude do surgimento das infiltrações após a realização de obras no estabelecimento comercial onde se encontra a Padaria P., obras realizadas sem a autorização da Assembleia de Condóminos, responsabilidade que deveria ser atribuída ao estabelecimento comercial. Assim, em Fevereiro de 2015, os demandados foram interpelados, por escrito, da existência das infiltrações da garagem da cave, provenientes do terraço do prédio e para a necessidade de procederem à reparação dos danos verificados, após a realização das obras da sua responsabilidade. Por falta de resposta, os demandados foram novamente interpelados em Maio de 2015. Contudo, não tomaram providências no sentido de procederem à realização das obras no terraço do prédio e pôr fim às infiltrações e danos existentes na garagem, com maior incidência em época de chuvas. As infiltrações na garagem são provenientes das alterações no piso situado em frente ao estabelecimento comercial dos demandados, e resultam directamente das obras realizadas em finais de 2013. As infiltrações provocaram danos na garagem da cave, designadamente nos tectos, paredes, pilares e chão, que urgem uma reparação. Para resolução dos danos verificados no pátio será necessário proceder à remoção do pavimento e rodapé em toda a esplanada, bem como caixas de escoamento, com abertura de um corte de 1 cm de profundidade e 10 cm de altura em todas as paredes da esplanada para dobrar a rede e posterior aplicação de resina de aderência em toda a superfície, bem como aplicação de cerâmico semelhante ao existente e rodapé semelhante ao pavimento, com a substituição da caixa de escoamento de águas e seu isolamento, bem como substituição das descargas existentes. O valor estimado para a reparação dos defeitos foi orçamentado em 6.7200€, acrescidos de IVA. Com a acção pretende-se que os demandados suportem a remoção do pavimento e rodapé e a reparação de todos os danos causados com as infiltrações verificadas na garagem comum ao prédio. As infiltrações e humidades existentes na garagem são consequência directa e exclusiva das obras realizadas pelos demandados e da falta de impermeabilização do terraço. A situação é regulada pelos artigos da responsabilidade civil. No caso presente, resulta que os demandados praticaram um facto ilícito, consubstanciado no levantamento do piso do terraço pertencente ao condomínio e na colocação de um pavimento sem as características ideias para o local e condições do mesmo, nomeadamente sem a devida impermeabilização do piso. Assim, violaram o direito de propriedade do condomínio. Com efeito, efectuar obras e deixar que as águas pluviais se infiltrem no prédio inferior, é um facto ilícito, violando as normas do direito de propriedade. No caso presente, o demandante pede a reconstituição natural e como hipótese mais remota, após trinta dias de não execução, a indemnização em dinheiro. A garagem do condomínio sofreu danos em consequência de infiltrações provindas do terraço, desde as obras efectuadas pelos demandados, por isso não existem dúvidas quanto à obrigação de serem reparadas por quem as provocou, ou seja, os demandados. O demandante imputa as infiltrações e suas consequências exclusivamente a problemas causados com a realização de obras pelos demandados. Conclui pedindo que os demandados sejam solidariamente condenados: A) a proceder à realização das obras necessárias à reparação das infiltrações e deteriorações existentes na garagem do prédio, de modo a reparar as infiltrações detectadas na garagem comum ao edifício, nomeadamente no tecto, paredes, pilares e piso, obras a efectuar no prazo máximo de 30 dias; Ou, em alternativa, B) a proceder ao pagamento do valor orçamentado de 7.200€, correspondente à reparação dos danos supra identificados, valor esse acrescido dos respectivos juros de mora, contados desde a citação até integral e efectivo pagamento; C) a suportar os encargos da presente acção, nomeadamente taxas de justiça e procuradoria condigna. Juntou 8 documentos.

MATÉRIA: Ação de responsabilidade civil extracontratual, enquadrada no art.º 9, n.º1, alínea H) da L.J.P.

OBJETO: Apurar a responsabilidade por danos patrimoniais existentes na garagem do demandante, reparação com as devidas obras.

VALOR DA AÇÃO: 7.200€ (sete mil e duzentos euros, fixado nos termos dos art.º 305, n.º4 e 306, n.º1 ambos do C.P.C.)

Os demandados, MM, casado com MT, com residência na Rua ….; SR, casado com I., com residência na …, Marvão; V., casado com J., com residência na …., Marvão, …, todos residentes no concelho Cantanhede, representados por mandatária constituída.

Contestação: Por excepção: Os contestantes são comproprietários da fracção AA, estabelecimento em duplex, rés-do-chão e lº andar, identificado pelo nº 2, 0 2ª a contar do Poente, destinado a comércio - indústria hoteleira ou similar, pátio do lado Poente e Norte ao nível do rés-do-chão, inscrito na matriz predial respectiva sob o nº …. da freguesia de ... concelho de Coimbra e descrito na CRP respectiva sob o nº 1.../….. Por contrato celebrado no dia 1 de Março de 2004 os deram de arrendamento a referida fracção à sociedade por quotas “Padaria P. Lda.”, também demandada. De acordo com o contrato de arrendamento, o local arrendado destina-se ao exercício da actividade de padaria e pastelaria e a arrendatária obriga-se a fazer um uso prudente do locado. Resulta que os senhorios deixaram de ter o gozo e uso da fracção em 1 de Março de 2004. De acordo com o alegado, em finais de 2013 foram efetuadas obras no estabelecimento comercial. Ora, os demandados, comproprietários da fração, não efetuaram qualquer obra na fracção. Os demandados, comproprietários da fração, não autorizaram, por qualquer forma ou em qualquer momento, qualquer obra e/ ou intervenção que a arrendatária quisesse fazer. Aliás, em momento algum a arrendatária solicitou por escrito qualquer autorização, ou deu conhecimento de qualquer pedido de licenciamento de obras na fracção. Assim, entendem que, qualquer obra e/ou intervenção na fracção em causa é da exclusiva iniciativa e responsabilidade da arrendatária. Conforme resulta do contrato de arrendamento, na sua cláusula 5ª, a “Padaria P. Lda.” ficou obrigada a “ fazer um uso prudente do arrendado, não podendo realizar quaisquer obras que não sejam previamente autorizadas, por escrita, pelos primeiros outorgantes e que devidamente licenciadas, ficarão a fazer parte integrante do arrendado sem direito a qualquer pagamento ou indemnização”, pelo que não tendo sido autorizada pelos proprietários/senhorios, a realização de obras, não lhes pode ser imputada, bem como quaisquer danos daí decorrentes. Do exposto resulta que, os factos invocados extinguem o efeito pretendido pelo demandante, razão pela qual devem os proprietários ser absolvidos do pedido. No ponto 10 do r.i alega danos e no ponto 12 acrescenta que “os danos mencionados foram reparados após notificação da demandante para o efeito”. Ora, desconhecem os comproprietários a quem foi dirigida a notificação, e tendo sido efetuada alguma reparação, quem a fez e quando. Mas, tal reparação, a ter ocorrido, terá sido por conta da arrendatária. Quanto às reparações alegadas no art.º 21 do r.i. os comproprietários enviaram á arrendatária a carta que o demandante lhes enviou, remeteram-lhe toda a responsabilidade, dando simultaneamente, conhecimento disso á Administração, porquanto é do conhecimento dos demais condóminos e da Administração do condomínio, que o uso e fruição da fracção é exclusivo da arrendatária, a Padaria P. Lda. Por reconhecerem isso, na Assembleia de condomínio, conforme alega no ponto 20 do r.i, os condóminos deliberaram que “ em virtude do surgimento das infiltrações após a realização de obras no estabelecimento comercial onde se encontra a Padaria P., obras estas realizadas sem a respectiva autorização da Assembleia de Condóminos, a responsabilidade desta situação deveria ser atribuída ao referido estabelecimento comercial”. Acresce que é do conhecimento de todos os condóminos e da Administração do Condomínio, que o prédio onde se insere a fração tem, evidenciado diversos defeitos de construção que obrigaram à realização de obras. Nomeadamente, o piso do terraço da fracção dos R e os pisos dos terraços das varandas superiores à dos RR, destinadas a uso comum, levantaram/dilatam e tiveram de ser reparados, o que aconteceu por ordem da Administração de Condomínio. Contudo, a reparação foi defeituosamente efetuada e o piso teve de ser novamente reparado, ou seja, os pisos do terraço da fracção dos RR e dos terraços das fracções que lhe são superiores, destinadas a uso comum, já foram reparados várias vezes, em virtude de empreitas defeituosas, mas sempre por conta e ordem da Administração de Condomínio. Estas obras de reparação do piso das varandas exteriores são do conhecimento dos demandados porquanto, algumas ocorreram em data anterior a Março de 2004, em que tinham a posse plena da fracção. Tendo sido obras realizadas a mando da Administração do Condomínio, por empresas contratadas, terão as mesmas sido objecto de discussão e aprovação em Assembleia de Condomínio, e como tal as Atas far-lhes-ão necessariamente referência. Pelo que, não tendo na sua posse as Atas, nem a identidade das empresas contratadas, dado o lapso de tempo decorrido, requer-se a notificação do demandante para juntar cópia das atas e informar a identidade da empresa que realizou a(s) empreitada (s). É igualmente do conhecimento de todos os condóminos e da Administração do Condomínio que houve, nos últimos anos, uma cedência no nível dos solos onde se encontra edificado o prédio onde se insere a fração dos RR. A cedência dos solos teve consequências nas paredes exteriores de prédio, onde abriram fissuras, as quais, ao nível do rés-do-chão, onde se encontra a fracção, permitem a entrada de águas e humidades nas fracções inferiores. Resulta que os RR não deram causa, nem autorizaram qualquer obra ou intervenção na sua fração da qual resulte qualquer dano que importe a obrigação de indemnizar ou reparar. Sendo do conhecimento dos condóminos e da Administração, que no prédio já foram efectuadas diversas obras, por ordem da Administração, designadamente nas varandas exteriores comuns. Alega no ponto 31, que a reparação dos danos importa o custo de 7.200€ mais IVA. Desconhecendo os RR como obteve tal valor, apesar de o remeter para o doc. 8, que não foi remetido junto com o r.i., pelo que se impugna. Consigna-se que, não foram remetidos os documentos mencionados no r.i. como doc. 4, 5, 6 e 7 razão pela qual não se pronunciam. Pelo exposto, consideram ser útil, a realização de uma peritagem com vista ao integral levantamento das intervenções realizadas no local e ao estabelecimento do nexo de casualidade entre as mesmas e os danos alegados. Desconhecem, por não ser de conhecimento pessoal, e por isso se impugnam os pontos 13º, 2ª parte, 15º, 16º, 17º, 18º, 20º, 24º, 26º, 27º, 28º, 29º, 30º. Bem como se impugna por não corresponder à verdade a matéria alegada nos pontos 6º, 7º, 8º, 9º, 10º, 11º, 12º, 13º, até “finais de 2013”, 19º, 21º, (quanto à responsabilidade dos RR), 22º, 23º, 25º, 33º, 39º, 40º, 41º, 45º, 46º, e demais matéria que estive em oposição com a presente contestação. Os comproprietários não praticaram qualquer ato ou ação ilícita pela qual lhe possam ser imputados os danos ocasionados e consequentemente não importa para eles qualquer obrigação de indemnizar ou reparar. Concluem pedindo que: deve a excepção deduzida ser julgada provada e consequentemente, deve a presente acção ser julgada totalmente improcedente, absolvendo-se os comproprietários dos pedidos formulados. Requer a realização de Prova Pericial.

A demandada, Padaria P., Lda., NIPC ….,com sede na ..., …., Lote ..., …, 3000-446 Coimbra, representada por mandatário constituído.

Contestação: Impugna toda a matéria de facto descrita no r.i., porquanto não corresponde á verdade. A demandada é mera arrendatária do espaço correspondente á Padaria P., ou seja, é efectivamente arrendatária da fracção. Não viola nem nunca violou qualquer regulamento de condomínio, nem, tão pouco, prejudica ou prejudicou, de qualquer forma ou a qualquer título, o prédio constituído em propriedade horizontal, em que se insere a fracção arrendada, o condomínio ou os direitos dos condóminos. O Condomínio age, aqui, em verdadeiro abuso de direito. A demandada arrendou, através de imobiliária, o espaço que hoje ocupa. De imediato ficou claro que teria de fazer obras de reparação e de melhoramento. Todas as obras realizadas, e sobretudo estas de que se fala, designadamente, um terraço e espaço de esplanada, foram autorizados e realizadas á vista de toda a gente, porquanto se tratam de espaços sujeitos a visualização directa por parte dos outros condóminos, quer estando na via público, quer das janelas que directamente incidem sobre o local. Nunca durante as obras ou em momento posterior alguém manifestou qualquer motivo de descontentamento ou discórdia. Acresce que o espaço em causa, ainda que (enquanto terraço ou esplanada) seja de afectação exclusiva da demandada é uma parte comum do prédio nos termos legais. São comuns as partes estruturais do edifício, bem como as que constituam pisos de fracções e, simultaneamente, cobertura de outras. É ao demandante que compete fazer a reparação de tais espaços. A demandada limitou-se a efetuar reparações e melhoramentos estéticos, não mexeu na estrutura ou em qualquer elemento estrutural da fracção ou dos espaços que já tinham a afectação que ora têm. O piso colocado é um mero revestimento, não houve qualquer alteração na estrutura do prédio, ou na sua impermeabilização, pelo contrário, o revestimento colocado é mais isolante. A impermeabilização do espaço não é responsabilidade da demandada, mas do próprio condomínio. Ainda que haja infiltração nos espaços sob os terraços ou esplanadas, ela resulta de deficiente isolamento que não lhe é imputável mas ao condomínio, pois não removeu qualquer isolamento existente. Contudo, sempre alertou que o edifício apresentava fissuras e rachas, alertou logo a imobiliária, o condomínio e os proprietários da fracção. A própria demandada pediu, sempre, que fossem feitas obras, obras que implicam a reparação da estrutura do prédio e que não são, nem podem ser de sua responsabilidade. Aliás, este facto e as humidades que se infiltram nos espaços arrendados, causaram-lhe graves prejuízos e, inclusive, limitação de uso de espaços. Estes danos têm de ser indemnizados pelo demandante a que, nos meios comuns se peticionará, e que aqui pleiteia com abuso de direito, imputando a outrem responsabilidade que é apenas sua. E porque as fissuras e danos estruturais são responsabilidade do demandante, desconhecendo-se se acionou os seguros em tempo próprio, quando é notório que em 2013 e 2014 choveu acima dos níveis normais e houve danos, genericamente, em várias propriedades no distrito de Coimbra e no prédio em causa. Conclui-se, que nenhuma razão lhe assiste, que nada lhe deve e nenhum dano lhe causou. Conclui pedindo que: deve improceder a ação com a sua absolvição do pedido, sendo os custos o cargo do demandante, que dá causa à ação.

TRAMITAÇÃO:

Realizou sessão de mediação sem consenso das partes.

As partes são legítimas e dispõem de capacidade judiciária.

O processo está isento de nulidades que o invalidem na totalidade.

O Tribunal é competente em razão da matéria, valor e território.

Realizou-se peritagem, junta de fls. 198 a 284.

AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO:

Foi iniciada dando cumprimento ao disposto no art.º 26, n.1 da L.J.P., sem lograr o consenso das partes. Seguiu-se para produção de prova com junção de documentos, inspecção judicial ao imóvel e requerimentos das partes. Na 2ª sessão iniciaram-se os depoimentos das testemunhas, com o perito a prestar esclarecimentos, requerimentos e junção de 1 documento. Na 3ª sessão continuou-se com a prova testemunhal e junção de 3 documentos. Na 4ª sessão continuou a prova testemunhal, e mais requerimentos das partes. Na 5ª sessão continuou a prova testemunhal. Na 6ª sessão, terminaram as declarações das testemunhas, e findou com as alegações finais dos mandatários das partes, conforme consta das atas de fls. 304 a 308, 325 a 330, 333 a 335, 364 a 368, 3390 a 392, 393 a 396.

-FUNDAMENTAÇÃO-

I-DOS FACTOS ASSENTES (Por Acordo):

A)O condomínio do prédio sito na ..., Lote ..., em Coimbra encontra-se descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Coimbra, sob o n.º 1... da freguesia de ... e São Paulo de Frades, com a matriz n.º 3.....

B) O prédio foi constituído em propriedade horizontal, por escritura pública outorgada a 10 de Dezembro de 1996, no Primeiro Cartório Notarial de Coimbra.

C) Os primeiros, segundo e terceiro demandados são comproprietários da fracção AA do prédio.

D)A fração AA compõem-se por estabelecimento em duplex, sito no rés-do-chão e primeiro andar, identificado pelo n.º 2, o segundo a contar do poente, destinado e comércio, indústria hoteleira, e similar, pátio do lado poente e norte, ao nível do rés-do- chão e quatro estacionamentos na cave, com os números vinte e seis, vinte e sete, vinte e oito e vinte e nove, respectivamente os primeiro, segundo, terceiro e quarto a contar do poente da fila central-norte.

E) A quarta demandada é arrendatária da referida fração, exerce a sua actividade de padaria, pastelaria e similares, venda de charcutaria, café, snack-bar, bombonaria, geladaria e tabaco.

II-DOS FACTOS PROVADOS:

1) Em 2013 os demandados realizaram obras no estabelecimento comercial.

2) E, alteraram o espaço interior da fração.

3) E, alteraram o pátio, existente á entrada do estabelecimento comercial.

4) Colocando um novo piso, com caraterísticas diversas das existentes até á data.

5) As obras provocaram danos no edifício, nomeadamente no hall da entrada do prédio, junto ao elevador, no rodapé e candeeiros do hall da entrada.

6)Na cobertura, os cabos de eletricidade não foram acondicionados e retiraram as grelhas de ventilação.

7) Os danos referidos nos factos 5 e 6, já foram reparados.

8)A garagem coletiva é constituída por 39 lugares de estacionamento no Lote ..., e serve de passagem para o estacionamento do lote 2.

9) Há infiltrações e humidades, o tecto da garagem está manchado e com sinais de humidade e bolores, que precisam de reparação.

10) Há águas que se infiltram e alastram-se pelo tecto da garagem, caindo no piso desta, com acumulação de poças de água que abrangem parte da entrada da garagem e de passagem dos veículos automóveis.

11)Apesar de notificados, os demandados não repararam as anomalias verificadas na garagem.

12) As infiltrações provocaram danos na garagem da cave, designadamente nos tetos, paredes, pilares e chão, que urgem de reparação.

13) A demandada, Padaria P. é arrendatária do espaço da fração.

14) A demandada não violou qualquer regulamento de condomínio, nem prejudicou o prédio constituído em propriedade horizontal, no que se insere a fração arrendada.

15) As obras realizadas, designadamente o terraço e espaço de esplanada, foram autorizadas e realizadas á vista de toda a gente.

16) Pois o espaço é sujeito a visualização direta dos outros condóminos, quer pela via pública, quer das janelas que diretamente incidem sobre o local.

17) Nunca durante as obras alguém manifestou motivo de descontentamento ou discórdia.

18) O espaço em causa, terraço ou esplanada, é de afetação exclusiva da demandada.

19) A demandada limitou-se a efetuar melhoramentos estéticos, não mexeu na estrutura ou em elemento estrutural do prédio.

20) O espaço que em que as obras efetuou já tinha a afetação que ora tem.

21) O piso colocado é um mero revestimento, mais isolante.

22) As fissuras e danos estruturais são da responsabilidade do demandante.

23) Os demandados, são comproprietários da fração AA, estabelecimento em duplex, r/c e 1º andar, identificado pelo n.º 2, a contar do poente, destinado a comercio-industria de hoteleira ou similar, pátio do lado poente e norte ao nível do r/c, inscrito na matriz predial sob n.º … da freguesia de ..., concelho de Coimbra, descrita na Conservatória do Registo predial sob n.º 1.../….

24) Por contrato de arrendamento celebrado a 1/03/2004 deram de arrendamento a referida fração á sociedade por quotas Padaria P., Lda.

25) O local arrendado destinava-se exclusivamente ao comércio da atividade de padaria e pastelaria.

26) A arrendatária obrigava-se afazer um uso prudente do locado.

27) Os demandados deixaram de ter o gozo e uso do espaço da fração em 1/03/2004.

28) Os comproprietários não efetuaram qualquer obra na dita fração em finais de 2013.

29) Os comproprietários não autorizaram, por qualquer forma, ou em qualquer momento, qualquer obra e/ou intervenção que a arrendatária quisesse fazer.

30) Nem a arrendatária solicitou por escrito, qualquer autorização, ou sequer deu conhecimento de qualquer pedido de licenciamento de obras.

31) Qualquer obra e/ou intervenção na fração é da exclusiva iniciativa ou responsabilidade da arrendatária.

32) Os comproprietários enviaram á arrendatária a carta que o demandante lhes enviou, e remeteram-lhes toda a responsabilidade.

33) E, disso deram conhecimento á administração do condomínio.

34) Em assembleia de condóminos foi reconhecido que a responsabilidade dessa situação devia ser atribuída ao estabelecimento comercial.

35) O prédio onde se insere a fração tem evidenciado ao longo de anos diversos defeitos de construção, que obrigam a realização de obras.

36) Nomeadamente, o piso do terraço da fração dos demandados e os pisos dos terraços das varandas superiores á dos demandados, destinados ao uso comum, levantaram e tiveram de ser reparados.

37) O que sucedeu por ordem da administração do condomínio.

38) Contudo, a obra foi defeituosamente realizada e o piso teve de ser novamente reparado.

39) Os pisos dos terraços da fração dos demandados e dos terraços superiores foram reparados em virtude de empreitadas defeituosas.

40) O que sucedeu por conta e ordem da administração do condomínio.

41) O que é do conhecimento dos comproprietários por ser anterior a 2004, quando, ainda, tinham a posse plena da fração.

42) As ditas obras foram objeto de discussão em assembleia.

43) Nas paredes exteriores do prédio abriram fissuras.

44) As quais ao nível do r/c, onde se encontra a fração dos demandados, permite a entrada de águas, e de humidades.

MOTIVAÇÃO:

O Tribunal sustenta a decisão na análise critica de toda a prova produzida, a qual foi ponderada na sua globalidade, tendo em consideração as regras de repartição do ónus da prova e da experiência comum, bem como no relatório de peritagem e demais documentos juntos aos autos pelas partes, considerados em geral pertinentes e relevantes para a causa.

Na inspeção o Tribunal pode, diretamente, percecionar o estado de conservação geral do edifício, o qual apresenta alguns indícios de idade, como é visível na porta de acesso á garagem, a qual apresenta uma fissura em toda a largura, e a necessitar de pintura em toda a extensão do edifício, encontrando-se no exterior, por trás da padaria, alguns andaimes montados.

A garagem é subterrânea e comum a 2 prédios, sendo um espaço amplo, aberto, e com vários pilares de suporte. Notou-se, ainda, existir um acentuado declive, no local onde o prédio se encontra implantado, sendo o acesso á garagem pela rua, situada numa cota mais baixa.

No dia da inspeção ao local, embora chovesse, no interior da garagem comum não se verificou existir qualquer poça de água na zona que corresponde por cima á padaria, a qual está situada nos dois estacionamentos em frente ao portão da garagem. No entanto, no lado oposto a este visualizou-se existir no limite desta, no tecto, pingos de água, que escorriam pela parede e com várias pequenas estalactites formadas no tecto, como também foi relatado no relatório técnico junto a fls. 317 verso.

Também se constatou existir, em diversos pontos da garagem, manchas de humidade no tecto, tal como também é retratado em diversas fotos do relatório de peritagem, de fls. 213 a 21, e de fls. 269 a 271.

Efetuou-se, também, a inspeção á padaria, onde se viu a diferença entre os atuais mosaicos do terraço, dos primitivos, de cor mais clara e sem textura, ainda existentes, num espaço interior junto á cozinha, conforme se verificou.

O perito, FA, prestou esclarecimentos pertinentes sobre a peritagem que realizou, que se prenderam com o estado do edifício e com a peritagem. Esta foi inconclusiva, na medida em que não indicou a origem concreta do problema mas vários problemas que podem estar na origem deste problema. Não obstante, o resultado dos testes ser inconclusivo, é inequívoco que existem danos materiais visíveis na garagem, facto que o Tribunal também constatou na inspeção que efetuou á mesma, os quais afetam a estrutura do edifício, nomeadamente paredes e ferro. O perito explicou que para ter a certeza teria de realizar mais testes, que ficariam dispendiosos. Referiu, ainda, que não será pelo ladrilho hidráulico colocado no piso do terraço, o qual é de melhor qualidade do que aquele que existia, desde que devidamente cimentado e betumado, admitindo que está mais inclinado para os tubos verticais de queda de águas pluviais, existentes no interior do edifício, e que vêm do último andar até á cave, os quais estavam cheios de água, no dia em que realizou a peritagem. Reconhece que um dos problemas que apontou na peritagem foi resolvido, a questão com uma tubagem de esgoto, que se situa no lado oposto da garagem, onde ocorrem as poças de água, não sendo essa a causa do problema. Para além disso, e com especial relevo, apontou como possível causa o colapso do sistema de drenagem dos muros de suporte de terras de todo o edifício, realçando que a parede dupla construída, precisamente para evitar e ocultar as infiltrações, não terá acautelado o problema, pois não terá o devido escoamento, conforme consta nas explicações no ponto 11, a fls. 260 e 261, sendo que a parede/muro de suporte emboca precisamente no tecto da garagem, uma vez que a zona onde o prédio está implementado tem um declive acentuado, conforme é visível pelo exterior do prédio. Esclareceu, ainda, que devido á idade do prédio, cerca de 28 anos, é normal que ocorram vários problemas, pois todos os materiais têm um prazo de duração, que com o passar do tempo vão-se degradando, estando o prédio a necessitar de manutenção geral. Auxiliou na prova dos factos com os n.º 4, 9, 10, 12, 14, 18, 21, 22, 42, 43 e 44.

A testemunha, AM, é o proprietário da fração 6º C, é um dos sócios da empresa que construiu o loteamento e o prédio em questão, L., Lda., daí o seu conhecimento pessoal dos factos. Admitiu que foi construída uma parede dupla na garagem, o que sucedeu logo após a construção do prédio, e que durante anos não surgiu água na garagem. Não obstante reconheceu que existem em diferentes pontos da garagem várias manchas de humidade. Esclareceu que efetivamente teve uma fração, loja, arrendada á X, durante cerca de 15 anos, sita por trás da padaria/pastelaria, a qual tinha no prédio colocado uma antena com um grande gerador, que foi retirada, estando vazia á cerca de 4 anos, sendo no terraço desta que está o andaime instalado para repararem o terraço, mas a obra está parada, pois a empresa abandonou a obra. Auxiliou na prova dos factos com os n.º 1,2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 12, 13, 16, 17, 20, 34, 35, 42, 42 e 44.

A testemunha, JG, é o proprietário da fração 3º-C, sita por cima da padaria/pastelaria, daí o seu conhecimento pessoal dos factos. Explicou que se apercebeu das obras e que ficou aborrecido pois não pediram autorização para as realizarem ao condomínio. Esclareceu que foi ele que tirou várias fotografias ao local onde aparecem as poças de água na garagem. Reconhece que o senhor que explora a padaria reparou os problemas que surgiram no hall do prédio, ao ser confrontado pela administradora com o sucedido. Referiu que a água surge quando chove, mas não sabe em concreto de onde vem, o que vê quando vai á garagem. Esclareceu que a questão de mau cheiro foi ele que alertou a administradora do prédio. Entretanto apurou-se que vinha de um cano entupido, de esgoto, isto foi em 2017/2018, mas o tubo é numa zona oposta á padaria. Auxiliou na prova dos factos n.º 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 16, 17, 20, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41 e 42.

A testemunha, O, é a proprietária da fração 5º-C, daí o seu conhecimento pessoal dos factos. Referiu que vai pouco á garagem, mas teve conhecimento dos factos através da assembleia de condóminos, não só pela administradora, como também pelo sr. M.. O depoimento desta foi pouco relevante, no entanto como coincidente com outras testemunhas, auxiliou na prova dos factos n.º 1, 2, 3, 4, 5, 6, 9, 10 e 34.

A testemunha, M., foi a anterior administradora do condomínio, sendo também nora de um dos sócios da empresa que construiu o edifício, L., Lda., daí o seu conhecimento pessoal dos factos. Auxiliou na prova dos factos n.º4, 5, 6, 7, 11, 13, 16, 17, 18, 20, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 42, 44.

AM prestou declarações nos termos do art.º 57, n.º1 da L.J.P., pois é um dos comproprietários da fração AA, onde está a padaria/pastelaria, daí o seu conhecimento pessoal dos factos. Esclareceu que a padaria possui 4 estacionamentos na garagem, que não tiveram conhecimento das obras realizadas até receberem a carta do condomínio, reconhecendo que houve uma época que pouco iam às assembleias de condóminos, passando depois deste acontecimento a irem. Quanto ao estado do prédio reconhece que carece de várias obras de manutenção, e que pouco tem sido realizado, com exceção de algumas intervenções nos terraços, os quais são a cobertura de algumas frações. Quanto á água sabe que não foi só depois de 2013 que apareceu água na garagem, embora antes disso fosse com menor intensidade. Auxiliou na prova dos factos n.º 1, 2, 3, 4, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 16, 18, 20, 23, 24, 25, 26, 17, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 39, 40, 41 e 42.

A testemunha, J, foi o ladrilhador dos mosaicos, daí o seu conhecimento pessoal dos factos. Referiu que conhece bem o local, pois trabalhou na construção do edifício, foi ele que assentou o mosaico de todo o prédio. Reconhece que o material que colocou deteriorou-se com os anos e a passagem habitual das pessoas no espaço. Depois disso voltou a ir ao prédio, á cerca de 10 anos, por conta do condomínio, substituir alguns mosaicos que se partiram e descolaram em alguns terraços. Reconhece que o pavimento que foi posteriormente colocado na pastelaria é melhor, sendo antiderrapante, estando totalmente nivelado, o que sabe pois foi ao espaço após as obras. Esclareceu que no exterior do edifício ocorreu, há alguns anos, um abatimento da calçada junta ao mesmo, reconhecendo que o tecto da garagem está mais abaixo que o local onde ocorreu o abatimento e a própria rua. Na altura da construção do prédio viu que fizeram a 2ª parede no topo norte, pois “gemia água” na garagem, sendo a solução encontrada pela construtora para evitar entrar água no local. Auxiliou na prova dos factos com os n.º 4, 14, 15, 16, 18, 19, 20 e 21.

A testemunha, JC, frequenta a padaria á cerca de 10 anos, daí o seu conhecimento pessoal dos factos. Viu as alterações realizadas no espaço comercial, o que foi realizado á frente de todos, á cerca de 5 anos, o que tornou o espaço comercial mais agradável e limpo, tendo assistido a diversas limpezas realizadas no pátio exterior, antes de fechar, o que fazem com a mangueira. Reconhece que não tem visto obras de manutenção no prédio, embora tenha notado que foi colocado uns andaimes, e que ainda lá se encontram na zona por trás do estabelecimento, pois pode vê-lo da rua. Auxiliou na prova dos factos com os n.º 1, 2, 3, 4, 15, 16 e 20.

A testemunha, MR, é a proprietária das 3 fracções do 7º-C, sendo a 1ª a habitar no prédio, quando ainda estava em construção e antes de ter realizado a escritura, daí o seu conhecimento pessoal dos factos. Explicou que viu construir a parede dupla na garagem, situada precisamente na zona onde por cima se situa a padaria/pastelaria, pois desde o início surgiram problemas de águas e foi a forma que arranjaram para evitar entrar água. Durante alguns anos não apareceu água na garagem, mas depois ressurgiu, após ser retirada uma antena da X, o que se nota sempre que chove durante algum tempo, e com o passar dos anos têm surgido mais água, que empoça na zona em frente ao portão da garagem, o que vê quando estaciona na garagem. Auxiliou na prova dos factos com os n.º 1, 2, 3, 4 8, 9, 10, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 20, 23, 35, 36 e 39.

A testemunha, G, engenheiro civil e arquitecto, foi o responsável técnico pelo projeto de alteração do espaço interior da padaria junto da C.M.C., mas não acompanhou a realização da obra, daí o seu conhecimento dos factos. Auxiliou na prova dos factos n.º 1,2, 3, 14, 18, 20 e 21.

A testemunha, V, engenheiro civil, é o responsável pelo relatório junto aos autos de fls. 315 a 318, tendo efetuado uma vistoria ao edifício, antes de o elaborar, daí o seu conhecimento dos factos. Os seus esclarecimentos foram isentos e muito pertinentes, pois esclareceram muitas questões técnicas, que foram ao encontro das respostas dadas pelo próprio perito.

O facto n.º 8 resulta essencialmente do documento 2 junto de fls. 12 a 28.

O facto n.º 23 resulta essencialmente do documento 1 junto de fls. 10.

Os factos n.º 24, 25, 26, 27 e 28, resultam essencialmente do contrato de arrendamento, documento junto de fls.

Quanto ao facto n.º 15 resultou da conjugação de prova testemunhal e com o entendimento que a autorização era referente á C.M.C.

Quanto ao relatório apresentado pela demandada, de fls. 315 a 318, é evidente que não se trata de uma perícia, não obstante pode ser valorizado no conjunto da prova, uma vez que vai ao encontro da perícia e da maioria da prova testemunhal, nomeadamente aponta algumas patologias que o edifício apresenta, o que é normal, pois segundo foi apurado possui mais de 23 anos e não tem sido objeto de regular manutenção.

Da ata da assembleia de condómino, junta de fls. 310 a 311, pode concluir-se que no decurso dos autos, ocorreu a alteração na administração do condomínio demandante, motivo pelo qual o facto 3 do r.i., não pode ser considerado provado. Não obstante, a actual administração do condomínio demandante assegurou a regularidade da instância, representando-o regularmente, como se infere da mesma ata.

Quanto á ata da assembleia de condómino n.º 24, junta de fls. 35 a 37, tendo em consideração que nesta ação, não se aprecia o ato de votação de uma deliberação, que nem consta da ordem de trabalhos, inserindo-se apenas nos assuntos de interesse geral, e que nem se percebe o sentido de voto de nenhum condómino, serviu somente para formar a convicção que a administração informou os condóminos que estavam presentes naquela assembleia que, devia ser imputado ao estabelecimento comercial a responsabilidade pelo aparecimento das infiltrações, passando assim a constar da ata.

Conjugando o teor desta ata com o depoimento de algumas testemunhas, nomeadamente J, AM e O, apurou-se que alguns condóminos entendem que os inquilinos da fração AA, a padaria/pastelaria, deviam ter pedido autorização ao condomínio para realizarem as obras, e como não o fizeram, deixaram até de frequentar a mesma, e por este motivo imputam a responsabilidade de vários danos existentes na garagem àquelas obras, tal como foi registado na dita ata. Não obstante, não significa que realmente seja essa a causa da entrada de água, pois há anos que aparecia água, embora com menor intensidade, conforme várias testemunhas admitiram.

Note-se que não se apurou se existia ou não tela isolante na laje do prédio, e em caso positivo se foi ou não afetada com as obras.

Os factos não provados devem especialmente á ausência de prova cabal dos mesmos.

Note-se que ponderou-se o facto de ter sido solicitado á padaria/pastelaria os documentos referentes às obras realizadas em 2013, mas por dificuldades de obtenção, junto da C.M.C. não os pode juntar. Não obstante, através do depoimento da testemunha G, foi apurado que, as obras foram devidamente licenciadas pela C.M.C., sobretudo pelas remodelações realizadas no interior, que exigiam projetos de especialidade em termos acústicos e de alterações ao espaço interior, estando aprovadas, sendo emitida a devida licença de utilização.

Quanto ao orçamento para reparação dos danos, que por tem por base as obras realizadas pela padaria/pastelaria, não sendo esta a causa, e sendo apontada outras, não pode ser considerado nem o valor, nem as obras referidas para restaurar o problema.

III-DO DIREITO:

O assunto dos autos prende-se com a entrada de águas e danos numa garagem de prédio urbano.

Questões: responsabilidade dos demandados, requisitos da responsabilidade civil, reparação/indemnização, má-fé.

O princípio geral que rege a matéria da responsabilidade civil está consignado no art.º 483 do C.C. segundo o qual “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”, incumbindo ao lesado provar a culpa do autor da lesão, de acordo com o disposto no art.º 487, nº1, do C.C.
Assim, são pressupostos do dever de reparação: a existência de um facto voluntário do agente; a ilicitude desse facto; a existência de um nexo de imputação do facto ao lesante; que da violação do direito subjectivo ou da lei resulte um dano; que haja um nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima de forma a poder concluir-se que este resulta daquela, in Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, I Vol., 1986, 477/478.

A trave mestra da reparação do dano ao nível civil rege-se pelo princípio da reposição ou reconstituição natural (art.º 562, do C.C.), o qual se traduz na obrigação de reconstituir a situação anterior à lesão, ou seja, o dever de repor as coisas na situação em que estariam caso o evento lesivo não se tivesse produzido. Tal princípio legitima o lesado a exigir a reparação dos danos, o que equivale á restauração natural.

A ação foi intentada contra duas entidades distintas: 1º os comproprietários da fração AA, 2º a arrendatária da mesma fração, que exerce comercialmente uma atividade económica: padaria e pastelaria.

Face á prova realizada na audiência foi apurado que a fração AA estava efetivamente arrendada á 2ª demandada, o que sucede desde 1/03/2004 conforme contrato de arrendamento junto em audiência, de fls. 369 a 372.

Do exposto resulta que, a haver alguma responsabilidade dos comproprietários da referida fração, atendendo á data de realização das obras referidas no r.i., 2013, só no caso de terem consentido na realização das mesmas, conforme refere no art.º 5 do dito contrato de arrendamento, uma vez que não têm a fruição da fração autónoma.

Para além disso, foi ainda apurado que, os comproprietários da fração AA, desconheciam a realização das obras, e somente com as cartas enviadas pela administração do condomínio, juntas de fls. 38 a 41, tomaram conhecimento das mesmas.

No que diz respeito aos factos, está provado que a demandada Pastelaria/padaria efetuou obras de remodelação no interior do seu espaço e também no terraço.

Foi, igualmente, provado que no decurso das obras causou alguns danos, nomeadamente na zona do hall do prédio, na cobertura e na parte elétrica.

Danos estes que, já foram reparados pela demandada, Padaria P., conforme o demandante alegou nos art.º 12 do r.i. Todavia, apesar de interpelada para proceder, de forma igual, em relação á garagem não o fizeram.

No que diz respeito aos danos da garagem, cumpre dizer em primeiro lugar que, em princípio, a realização de quaisquer obras não representa um facto ilícito, pese embora se reconheça que a realização de obras deva ser efetuada de forma diligente e de acordo com a legis artis, no que se inclui as obras de remodelação do espaço levadas a cabo pela demandada, a Padaria/pastelaria.

No que respeita ao assunto em análise, a lei estabeleceu uma presunção legal no art.º 492, n.º1 do C.C. referente ao proprietário ou possuidor de edifício ou de obra, o qual responde pelos danos causados por vício de construção, salvo se provar que não houve culpa da sua parte ou que, mesmo com a diligência devida, se não teriam evitado os danos.

Esta disposição legal inverteu assim o ónus da prova da culpa em relação ao proprietário ou possuidor, não obstante não prescinde da prova de que os danos/ruina se devem ao vício de construção, entendida no sentido lato.

Efetivamente existe, na ordem jurídica nacional o dever genérico de não lesar interesses alheios, o que torna, em termos genéricos, a entidade que realize obras como garante da não ocorrência dos danos.

No caso em apreço, a ordem jurídica nacional perfilhou a posição de que o possuidor de coisas tem, também, o dever de tomar as providências adequadas para evitar a ocorrência de danos (art.º 492 do C.C.).

Na sequência do que se acabou de referir, e contrariando os considerandos que inicialmente se fizeram sobre os comproprietários da fração AA, é preciso não esquecer que sobre o proprietário ou possuidor do edifício, no sentido amplo de imóvel (art.º 204 alínea a) do C.C.), passa também a recair a presunção legal por defeitos de conservação, que obriga o seu titular a conservar a obra/coisa. De facto, pretendeu-se responsabilizar todos os que retiram vantagens da propriedade, quer seja proprietário e possuidor, em nome próprio, como também os senhorios dos imóveis, que devem estar a par da do que se passa na sua propriedade, uma vez que têm o dever de assegurar a fruição do espaço (art.º 1031, alínea b) do C.C.).

Esta presunção foi objeto de alguma querela doutrinária, pois há autores que defendem que se trata apenas de uma presunção de culpa, como é o caso de Antunes Varela, que chega a defender que, nestes casos o lesado embora não tenha de provar a culpa, tem de provar que há defeito de conservação da coisa.

Porém, como este artigo contem uma verdadeira presunção legal, deve reger-se pelo princípio geral previsto no art.º 350 do C.C. Assim, e contrariando as regras gerais do art.º 342, n.º1 do C.C., não recai sobre o lesado a sua prova, já que goza de uma presunção legal, posição defendida por Luís Menezes Leitão, e seguida também por este Julgado de Paz.

De facto, defende este autor que existindo uma presunção legal, seria demasiado injusto fazer recair sobre o lesado a forma como ocorreu o incumprimento. Por outro lado, é antes sobre o titular da coisa que recai o dever genérico de demonstrar que não foi por sua culpa que ocorreram os danos, por vício de conservação da coisa, ou que os danos continuariam a verificar-se, ainda que não houvesse culpa sua.

Decorre da experiência comum, que as coisas, sobretudo os imóveis, com o passar dos anos vão-se degradando, pela exposição a que os elementos que o compõem ficam sujeitos, por isso é necessário periodicamente proceder á sua manutenção, e caso não seja realizada em termos adequados é passível de ocorrem danos. Carece pois de vigilância com a inerente carga preventiva, derivada da manutenção e conservação a cargo o proprietário ou possuidor, ou até de quem assuma esse encargo.

Ora esse dever não será de menor intensidade, só porque existe um conjunto de frações num edifício, antes pelo contrário, existe o dever de cada proprietário respeitar a propriedade do outro, e em especial de respeitar a compropriedade, como é o caso dos autos, pois a garagem é um espaço comum (art.º 1421, n.º2 alínea d) do C.C.).

De forma a apurar a efetiva responsabilidade da entidade que efetuou a obra, foi requerida pelas partes uma perícia judicial á garagem do edifício.

E, a mesma apresentou um resultado inconclusivo, isto é, apontou várias causas como podendo ser a origem/fonte dos problemas existentes na garagem, como também o próprio demandante admitiu, a fls. 225 verso, pelo que requereu e indicou quesitos suplementares, de forma a apurar melhor a causa das infiltrações que ocorrem na garagem.

Na realidade, foi essa a conclusão que retirei da perícia, e também das explicações proferidas por quem a realizou, sobretudo tendo por referência o ponto 4, acrescentado pelo demandante a fls. 208.

Vejamos, efetivamente a demandada, padaria/pastelaria alterou o pavimento que existia no espaço exterior nomeadamente no pátio/ esplanada, colocando mosaico hidráulico, o qual segundo foi explicado em audiência, até será de melhor qualidade - mais resistente e anti-derrapante - do que o antigo, sendo por isso adequado ao espaço em concreto. Esta obra apenas podia ser a causa do dano na eventualidade de ter ofendido a tela impermeabilizadora, algo que se desconhece se sucedeu, já agora acrescento, que pela prova realizada nem se sabe se realmente o prédio tem ou não a dita tela impermeabilizadora, embora dite as boas regras de construção que devia ter. Ora todas as respostas do perito foram precisamente partindo do pressuposto que a construção deste prédio obedece às boas regras de construção, não obstante, também, o perito desconhece se possui ou não a tela isolante, conforme referiu ao ser questionado sobre o assunto.

Foi, igualmente, apurado que, desde o início da habitabilidade do prédio, apareceu águas na garagem do mesmo, conforme foi explicado pela 1ª pessoa que nele habitou, a testemunha R.

De facto, o prédio em questão está situado numa zona com acentuado declive, conforme se constatou na inspeção ao local, ficando a garagem num plano bastante inferior, em especial a parede nascente do lado exterior do prédio, a qual nem é visível do exterior, estando praticamente enterrada. Esta parede desde o inicio da construção do edifício deu problemas, precisamente devido ao local onde se insere, cota inferior face á superfície visível – rua -, algo que a testemunha, J, presenciou na altura da construção, explicando que gemia água daquela parede, note-se que esta é também o suporte do prédio, conforme foi explicado pelo perito e pelo construtor, a testemunha AM. Ora, devido ao local onde se situa, era essencial que fosse devidamente impermeabilizada, para evitar que em contacto constante com a terra/solo ficasse suscetível às introduções de humidades.

Precisamente para colmatar este problema foi construída uma 2ª parede, aquela que se vê, somente do interior da garagem, conforme o construtor do edifício admitiu existir, a testemunha, AM. E de facto durante alguns anos parecia ter resolvido o assunto, todavia se não foi bem executado, com a colocação de um escoamento para o exterior - drenos subdurais -, mais tarde ou mais cede, o problema reaparece, sobretudo nos anos em que chove mais, conforme foi explicado pelo perito e pela testemunha, V.

Efetivamente, o prédio em questão terá hoje cerca de 23 anos, e carece de obras de manutenção geral, conforme se verificou na inspeção, pois existem várias fissuras visíveis a olho nu, e também, varias manchas de humidade no teto da garagem, o que é visível não apenas no local onde o demandante alega existirem danos mas noutros pontos da garagem, conforme bem elucidam as fotos juntas com a peritagem, é o caso das constantes nas folhas 269 e 271. Isto significa que, embora possam por vezes, aparecer poças de água, no local em frente á entrada da garagem, há outros locais onde a entrada de água está a fazer estragos, note-se que as estalactites existentes em diversos locais do teto da garagem são sinónimo disso mesmo, pois estas calcificações demoram muitos anos a formarem-se, conforme explicaram os engenheiros civis que visitaram o prédio, o perito F e as testemunhas G e V.

Resulta da experiência comum que, a água vai-se infiltrando nas zonas mais sensíveis do edifício, e se esta situação se verificar por muitos anos acabará por sair, embora não exatamente pela zona por onde entrou, mas naquela onde se encontra em maior quantidade, e enquanto não sair a acumulação de água acaba por causar danos, o que coincide precisamente com a resposta do perito no 2º parágrafo da fls. 248 verso, na resposta ao ponto 11.1 dos aditamentos á peritagem.

Para além desta situação, o perito aponta outra causa, e como referiu em audiência, para ele é fortemente provável ser esta a causa, pois os tubos de queda de água (águas pluviais que correm para tubos, que estão situados no interior da parede e passam pelo teto da garagem), a qual é uma parede estrutural, sendo propriedade do próprio condomínio (art.º 1421, alínea a do C.C.), vejam-se as respostas aos pontos 1, 2, 3 e 4 dos aditamentos á peritagem inicial, constante a fls. 247. Mais esclareceu o perito que, no dia em que realizou a micro filmagem os tubos estavam cheios de água, pelo que não foi possível apurar se realmente esta é a causa concreta daquele dano.

Note-se que no decurso desta perícia ocorreu um incidente, que se prendeu com um tubo de esgoto, situação pontual que foi logo resolvida pelo condomínio, mas que nada tem que ver com esta situação, conforme foi explicado pelo próprio perito, estando a mesma retratada de fls. 228 verso e 229, e obtida a devida explicação, a fls. 233 verso, pois tinha ocorrido um rutura de canalização, o que também foi esclarecido pela então administradora do mesmo, a testemunha M..

Todavia, foi provado que as ditas poças de água apenas têm surgindo em alturas de muita chuva ou em períodos de chuva prolongados, afastando-se assim a ideia que possa ser causado pelo local onde o demandante aponta como causa do mesmo, os novos mosaicos da padaria/pastelaria, pois embora por vezes o dito terraço seja lavado com mangueira, a qual causa pressão e sai com alguma intensidade, como resulta da experiência comum, se fosse essa a causa, as poças de água não apareciam só em altura de chuva intensa ou de períodos de chuva prolongado, devendo também aparecer em tempo seco, o que todos os moradores do prédio foram unânimes na resposta, que tal não sucede.

Do exposto resulta que, para que fosse imputado a responsabilidade pelos danos existentes na garagem, às obras realizadas no terraço/pátio da fração AA, era necessário existir apenas um nexo causal entre as obras e os danos, o que nos é dado pelo disposto no art.º 563 do C.C., que perfilha a teoria da causalidade adequada, segundo a qual é necessário que no plano naturalista o facto seja a causa do dano, para que depois em termos de direito, seja em abstrato, ou em geral, a causa do dano.

E, de facto não existe, antes pelo contrário, existem outras situações que, são tão ou mais importantes, do que aquela que foi apontada pelo demandante como causa desse mesmo dano. Desta forma, foi elidida a presunção legal que recaia sobre todos os demandados, pelo que não se pode atribuir os danos existentes no teto da garagem como sendo da responsabilidade destes.

Quanto ao abuso de direito, de facto existem danos nas partes comuns, exercendo o demandante o seu direito enquanto lesado e proprietário. Embora pudesse ter sido mais cauteloso, não se provou existir má-fé, nos termos do art.º 542 do C.P.C., na medida em cooperou com a descoberta da verdade, sendo ele que suportou a despesas com a deslocação do perito, que se dispôs a prestar esclarecimento da peritagem, na audiência de julgamento.

DECISÃO:

Nos termos expostos julga-se a ação improcedente, por não provada, absolvendo-se os demandados do pedido.

CUSTAS:

São da responsabilidade do demandante, devendo proceder ao pagamento da quantia de 35€ (trinta e cinco euros) no prazo de 3 dias úteis, sob pena de aplicação da sobretaxa diária na quantia de 10€ (dez euros).

Proceda-se ao reembolso dos demandados.

Notificada nos termos do art.º 60, n.º2 da L.J.P.

Coimbra, 29 de abril de 2019

A Juíza de Paz

(redigido e revisto pela signatária, art.º 131, n.º5 C.P.C.)

(Margarida Simplício)