Sentença de Julgado de Paz
Processo: 286/2018-JPSXL
Relator: HELENA ALÃO SOARES
Descritores: REALIZAÇÃO DE REPARAÇÕES DE DANOS; INDEMNIZAÇÃO
Data da sentença: 05/03/2019
Julgado de Paz de : SEIXAL
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
(artigo 60.º, n.º 1 da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, alterada e republicada pela Lei n.º 54/2013, de 31-07 (LJP)).

Processo n.º 286/2018-JPSXL
Matéria: Responsabilidade civil extracontratual (Artigo 9.º, n.º 1, alínea h) da Lei de Organização, Funcionamento e Competência do Julgados de Paz, aprovada pela Lei n.º 78/2001, de 13-07, alterada e republicada pela Lei n.º 54/2013, de 31-07 (LJP))
Objecto do litígio: Realização de reparações de danos; indemnização
1.º Demandante: A, portador do Cartão do Cidadão n.º 000, contribuinte fiscal n.º 000, com residência na Praceta XX Amora
2.ª Demandante: B, com residência na Praceta XX Amora
Demandado: C, contribuinte fiscal n.º 000, com residência na Praceta XX Amora
Demandada: D, contribuinte fiscal n.º 000, com residência na Praceta XX Amora
Valor da acção: €495,06 (quatrocentos e noventa e cinco euros e seis cêntimos)
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I. Dos Articulados:
Os Demandantes A e B, intentaram a presente acção declarativa de condenação, com fundamento na alínea h) do n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, alterada e republicada pela Lei n.º 54/2013, de 31-07 (LJP), contra os Demandados C e D, através do requerimento inicial que aqui se dá por integralmente reproduzido, de fls. 3 a 5, pedindo a sua condenação na resolução da origem do problema que provoca os danos nas suas casas de banho e na reparação dos estragos provocados ou serem indemnizados pelos danos patrimoniais sofridos, numa verba nunca inferior ao montante de € 495,06.
Alegam, em suma, que os Demandados são proprietários do 2.º andar esquerdo do prédio sito na Praceta XX Amora e que no início de Janeiro de 2018, os Demandantes repararam que no tecto da sua casa de banho (maior) estavam a manifestar-se algumas manchas de humidade por cima da banheira, junto aos cantos superiores e que na mesma altura apareceu na casa de banho (menor) uma mancha no tecto, junto à parede contígua com a casa de banho maior.
Alegam os Demandantes que entraram em contacto com o Demandado e que este disse que iria participar à sua companhia de seguros, e que o Demandado nunca mais informou os Demandantes do resultado do contacto da sua Companhia de Seguros, com vista à resolução do assunto e que os Demandantes participaram o sinistro à sua companhia de seguros, tendo sido realizada por esta Companhia (Fidelidade) peritagem e relatório.
Mais alegam que os Demandados não tomaram nenhuma iniciativa com vista à resolução do problema e que os danos nas suas casas de banho são cada vez maiores e que cada vez que os Demandados usam a casa de banho, “chove” na casa de banho dos Demandantes e que para evitar riscos elétricos foi desligada a fonte de iluminação do tecto da casa de banho dos Demandantes e colocados panos no chão para ensopar a água que pinga.
Os Demandados, regularmente citados, apresentaram a sua contestação, constante de fls.62 e 63, a qual se dá por integralmente reproduzida, alegando, em suma que quando foram contactados pela 2.ª Demandante disseram que não tinham dinheiro para fazer as reparações necessárias e que na altura as reclamações eram da casa de banho pequena e que por isso deixaram de usar a casa de banho pequena para que os Demandantes deixassem de ser prejudicados e que depois, há cerca de dois meses os Demandantes se foram queixar de problemas na outra casa de banho (grande) e que os Demandados responderam que quando tivessem todo o material para as reparações fariam as obras necessárias. Mais disseram que já têm algum do material necessário e estão dispostos a fazer as reparações na fracção de que são proprietários para que os Demandantes não sejam mais afectados com qualquer tipo de infiltração e que estão dispostos a pagar a indemnização de €495,06 para que os Demandantes efectuem as reparações necessárias nas duas casas de banho, mas que não têm possibilidade de pagar numa só prestação esse montante.
II. Tramitação:
Os Demandantes propuseram a presente acção em 13/11/2018.
Os Demandados, regularmente citados (cfr. fls. 56 e 57), apresentaram a sua contestação (cfr. 61 a 63).
Os Demandantes recusaram aceder à pré-mediação, pelo que foi marcada audiência de julgamento.
A audiência de julgamento realizou-se nos termos das actas constantes de folhas 80, 81, 88 e 89, tendo sido suspensa e designado o dia 3/05/2019 para sua continuação para prolacção da sentença.
Nesta data, e uma vez mais, os Demandados faltaram.
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Nos termos do disposto nos artigos 297.º, n.ºs 1 e 2, 299.º, n.º 1 e 306.º, n.ºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 63.º da LJP, fixo à presente acção o valor de €495,06 (quatrocentos e noventa e cinco euros e seis cêntimos).
O Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do objecto, do território e do valor. Estando reunidos os pressupostos da estabilidade da instância, cumpre apreciar e decidir.
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III. Fundamentação:
A) De Facto:
Com base nas declarações dos Demandantes e documentos juntos aos autos, dão-se como provados, relevantes para o exame e decisão da causa, os seguintes factos:
1 – Os Demandantes são proprietários da fracção autónoma designada pela letra “J”, correspondente ao primeiro andar esquerdo do prédio urbano sito na Praceta XX Amora, descrito na Conservatória do Registo Predial de Amora, Freguesia de Amora, sob o n.º 00/------------------------.
2 – Os Demandados são proprietários da fracção autónoma designada pela letra “L”, correspondente ao segundo andar esquerdo do prédio urbano sito na Praceta XX Amora, descrito na Conservatória do Registo Predial de Amora, Freguesia de Amora, sob o n.º 00/----------------------.
3 – O Demandante, de 03/05/2017 a 03/05/2018, tinha contratado o Seguro multiriscos habitação da Companhia de Seguros Fidelidade, para cobertura dos riscos nela previstos, com o n.º de apólice MR000.
4 – Em data não apurada, mas em Janeiro de 2018, no tecto da casa de banho maior da fracção da propriedade dos Demandantes, começaram a surgir manchas de humidade por cima da banheira, junto aos cantos superiores e na casa de banho menor apareceu uma mancha no tecto junto à parede contígua com a casa de banho maior.
5 – O Demandante, segurado, participou a ocorrência das manchas de humidade dos tectos das casas de banho da sua fracção à Seguradora Fidelidade, dando origem ao processo n.º 00MR/001.
6 – Em 08/02/2018 foi realizada uma peritagem, tendo o perito visitado a fracção dos Demandantes e verificado os danos nos tectos e paredes das duas casas de banho, devido a humidade.
7 – O perito mediu os níveis de humidade e verificou que os mesmos se encontravam elevados, sendo a proveniência da parte superior do edifício.
8 – O perito visitou também a fracção dos Demandados e observadas as duas casas de banho, verificou forte presença de água junto à sanita.
9 – Do relatório de peritagem patrimonial realizado, consta que foram verificados os danos nas paredes e nos tectos das duas casas de banho da fracção segura, pertença dos Demandantes, e que o evento teve origem em presença de humidade/água proveniente da parte superior do edifício.
10 – A reparação dos danos ocorridos na fracção dos Demandantes, encontra-se orçamentada em €495,06.
11 – O Demandado informou os Demandantes e o perito que havia participado a ocorrência à sua Seguradora.
12 – Os Demandantes, para evitar riscos de curto circuito elétrico, desligaram a corrente do tecto da casa de banho maior.
13 – Os danos dos tectos e paredes das casas de banho (manchas de humidade) da propriedade dos Demandantes decorrem de infiltrações que têm origem em água/humidade proveniente da fracção dos Demandados (anomalia de canalização de água ou de esgotos).
14 – Os Demandados não realizaram as reparações na sua fracção porque não têm o material para fazer as obras necessárias.
15 – Os Demandados não realizaram as reparações necessárias na sua fracção, com vista a fazer cessar os danos na fracção dos Demandantes e não procederam à reparação destes, que persistem e têm vindo a agravar-se.
Não resultaram provados quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa.
Motivação da matéria de facto:
A convicção probatória do tribunal, de acordo com a qual apurou a matéria dada como provada, ficou a dever-se ao conjunto da prova produzida nos presentes autos, tendo sido tomados em consideração os documentos juntos pelos Demandantes, as declarações das partes nos seus articulados e dos Demandantes em audiência de Julgamento.
B) De Direito:
No caso dos autos, a relação material controvertida envolve danos na fracção autónoma dos Demandantes, decorrentes de infiltrações de águas/humidades provenientes da fracção autónoma dos Demandados, e a respectiva responsabilidade civil destes últimos, pelos danos ocasionados.
A determinação das causas de infiltrações nem sempre é fácil. Todavia, neste caso em concreto, resultaram provados quer o dano (manchas de humidade nos tectos e paredes das casas de banho da fracção autónoma dos Demandantes) quer a sua causa (infiltração proveniente de águas/humidades provenientes da fracção dos Demandados (anomalia de canalização de água e/ou de esgotos).
Dispõe o artigo 483.º, do Código Civil que, “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.”
São requisitos, cumulativos, da responsabilidade civil estabelecidos no n.º 1 do artigo 483.º do Código Civil para a obrigação de indemnizar o dano, o facto, a ilicitude, traduzida na violação de direitos subjetivos absolutos, ou de normas destinadas a tutelar interesses privados; a imputação psicológica do facto ao lesante, sob a forma de dolo ou de mera culpa e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
O artigo 493.º do Código Civil estabelece uma presunção legal de culpa, dispondo que “ Quem tiver em seu poder coisa móvel ou imóvel, com o dever de a vigiar (…) responde pelos danos que a coisa ou os animais causarem, salvo se se provar que nenhum culpa houve da sua parte.”
Ora, no caso dos autos encontram-se preenchidos os requisitos da responsabilidade civil dos Demandados, pelos danos sofridos nos tectos e paredes das casas de banho da fracção autónoma dos Demandantes.
O artigo 562.º do Código Civil consagra o princípio geral da reconstituição natural, dispondo que “Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.”. Apenas é fixada indemnização em dinheiro quando a reconstituição natural não é possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor (artigo 566.º do Código Civil).
No caso concreto dos autos, os Demandantes diligenciaram no sentido de verem os seus danos reparados por parte dos Demandados, mas estes não diligenciaram, como lhes incumbia, no sentido de realizar as reparações necessárias para resolver o problema existente na sua fracção, origem das infiltrações e causa dos danos que se verificam na fracção dos Demandantes, nem a reparação dos danos sofridos e reportados por estes.
Não obstante o exposto, na presente acção, os Demandantes formularam, no fundo um pedido de reparação da causa dos danos (a resolução da origem do problema que provoca os danos nas suas casas de banho), e dois pedidos, em alternativa: reparação dos estragos provocados na sua fracção (reparação natural) ou serem indemnizados pelos danos patrimoniais sofridos, em valor nunca inferior ao montante de € 495,06 (indemnização em dinheiro).
Se a escolha pertencer ao credor e este não a tiver feito na própria petição inicial, mantendo a indeterminação pode deduzir um pedido alternativo, cabendo ao devedor depois a escolha da prestação.
“Tendo sido formulados dois pedidos alternativos, sem que tivesse sido exercido, por quem tem o direito de o fazer, a escolha da prestação, não podia o tribunal condenar apenas num dos termos da alternativa, mas antes, em conformidade como o preceituado pelo artigo 661, n.º1 do C.P.C., interpretado à contrario sensu, condenar em prestações alternativa, ficando assim a opção relegada para a execução.”- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 17/07/2008, Proc. 2115/2008-4, in www.dgsi.pt.
A indeterminação da prestação pode manter-se durante toda a acção declarativa e dar lugar a uma sentença de condenação em prestação alternativa.
O credor, na execução pode exigir que o devedor, dentro do prazo estipulado ou do estabelecido na lei de Processo, declare por qual das prestações quer optar, sob pena de se devolver ao credor o direito de escolha (artigo 548.º do Código Civil).
Assim, face ao exposto, procede o pedido formulado pelos Demandantes, de condenação dos Demandados na resolução da origem do problema existente na sua fracção (anomalia de canalização de água ou de esgotos) que provoca as infiltrações e os danos dos tectos e paredes das casas de banho dos Demandantes.
Quanto aos pedidos formulados em alternativa, também procedem, condenando-se os Demandados, em prestações alternativas, de reparação dos danos/estragos provocados nas casas de banho dos Demandantes, constantes dos factos provados, ou a pagar uma indemnização pecuniárias aos Demandantes, no valor de € 495,06.
IV. Decisão
Em face do exposto, julgo a acção totalmente procedente, por provada, e condeno os Demandados:
a) Na realização de obras de reparação de canalização de água e/ou esgotos da sua fracção (a resolução da origem do problema que provoca as infiltrações e danos nos tectos e paredes das casas de banho dos Demandantes);
b) Em alternativa, na reparação dos danos provocados na fracção dos Demandantes (tectos e paredes das casas de banho) ou no pagamento de uma indemnização no montante de € 495,06, cuja escolha da prestação, se relega para execução da sentença.
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Custas
As custas serão suportadas pelos Demandados, que são declarados parte vencida (art.º 8.º da Portaria n.º 1456/2001,de 28 de Dezembro).
Atento o pagamento da taxa de justiça no valor de € 35,00, pelos Demandados, aquando da apresentação da sua contestação, encontra-se ainda em falta o valor de € 35,00, da sua responsabilidade, pelo que deverão os Demandados pagar o valor de € 35,00, no prazo de três dias úteis a contar da notificação para o efeito, sob pena de, não o fazendo, incorrerem no pagamento de uma sobretaxa diária de €10,00 (dez euros) por cada dia de atraso no cumprimento dessa obrigação, até ao valor máximo de €140,00, ao abrigo dos n.º 8 e 10 da Portaria n.º 1456/2001 de 28/12, o n.º 10 na redação da Portaria n.º 209/2005 de 24/02.
Reembolsem-se os Demandantes, nos termos do n.º 9.º, da mesma Portaria, no montante de 35,00€.
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Esta sentença foi proferida nos termos do n.º 2, do artigo 60.º da Lei dos Julgados de Paz.
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Registe.
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Seixal, 03/05/2019
A Juiz de Paz Auxiliar

Helena Alão Soares