DGPJ

Cláusulas Abusivas
Processo: 3258/16.0T8MTS
Tribunal 1ª instância: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DO PORTO
Juízo ou Secção: JUÍZO LOCAL CÍVEL DE MATOSINHOS - JUIZ 1
Tipo de Ação: AÇÃO INIBITÓRIA
Tipo de Contrato: COMPRA E VENDA À DISTÂNCIA
Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO
Réu: WORTEN - EQUIPAMENTO PARA O LAR, S.A.
Data da Decisão: 05/29/2018
Descritores: ALTERAÇÃO UNILATERAL DO CONTRATO
EXCLUSÃO OU LIMITAÇÃO DA RESPONSABILIDADE
EXCLUSÃO OU LIMITAÇÃO DA TUTELA JUDICIAL
IMPOSIÇÃO DE FICÇÕES
IMPOSIÇÃO DO FORO COMPETENTE
PRINCÍPIO DA BOA FÉ
REPARTIÇÃO DO ÓNUS DA PROVA
Texto das Cláusulas Abusivas: a) Declaram-se nulas:
1 - A cláusula 3, sob a epígrafe “Alteração das presentes Condições”, com o seguinte teor:
“A Worten Equipamentos para o Lar S.A., reserva-se o direito de modificar unilateralmente e em qualquer momento, sem aviso prévio, a apresentação e conteúdo do sítio Web, seus serviços e as condições gerais de utilização. Essas modificações servirão para uma melhoria do website, melhorando simultaneamente os serviços oferecidos ao utilizador do website.”.
2 – As cláusulas correspondentes aos parágrafos sexto e sétimo do número 7 da cláusula 6., sob a epígrafe “Tratamento e entrega do pedido”, com o seguinte teor:
“Todos os 55 de 135 artigos são entregues em embalagens seguras. Se detetar danos externos na embalagem do produto deverá reportar esse defeito ao transportador, no momento da entrega, fazendo também referência a esse dano no documento comprovativo da entrega. Deverá ainda contactar a nossa Linha de Apoio ao Cliente 808 100 007.
Atenção que um comprovativo de entrega sem referência a danos equivale a um produto entregue em embalagem em perfeitas condições. Se, após aberta a embalagem, detetar danos no produto, dispõe de 24 horas após a receção da encomenda para contactar a nossa linha de Apoio Ao Cliente 808 100 007.”.
3 - A cláusula correspondente ao parágrafo quinto da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, com o seguinte teor:
“1. Artigos sem sinal de uso indevido”.
4 - A cláusula correspondente ao parágrafo sétimo da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, com o seguinte teor:
“3. Prazo de Devolução: Até ao 15º dia consecutivo, a partir do dia da entrega
• Produto Avariado – Deverá dirigir-se a uma loja física da Worten, apresentando a fatura e o artigo completo. No caso de esta opção não ser possível deverá contactar a nossa linha de Apoio (linha Azul – preço de chamada local), que o ajudará a resolver o problema.
• Devoluções por danos de transporte - Os prazos para efetuar reclamação por danos causados pelo transporte serão de 48 horas desde a data da entrega. Passado este período de tempo, a Worten não se responsabiliza por qualquer defeito que possa ter ocorrido no transporte.”.
5 - A cláusula correspondente ao parágrafo oitavo da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, com o seguinte teor:
“Reembolso (Aplicável em compras em Worten.pt)
No caso de devolução, o reembolso do valor da sua compra será efectuado após a validação do cumprimento das condições de devolução descritos anteriormente, tendo a Worten um prazo de até 14 dias para o efeito.”.
6 - A cláusula 11., sob a epígrafe “Responsabilidade”, com o seguinte teor:
“A Worten Equipamentos para o lar S.A., não garante a ausência de vírus ou elementos similares em documentos eletrónicos e ficheiros armazenados no seu sistema informático e na sua página web, não se responsabilizando por qualquer dano provocado e derivado da eventual presença de vírus e outros elementos análogos.”.
7 - A cláusula correspondente ao parágrafo segundo da cláusula 13., sob a epígrafe “Lei e Foro”, com o seguinte teor:
“Todos os litígios emergentes da interpretação ou execução do presente acordo serão dirimidos pelo Tribunal da Comarca de Lisboa, com expressa renúncia a qualquer outro.”,
todas do Clausulado “Termos de Uso”, junto como documento nº 11 com a petição inicial.
Recursos: S

Recurso TRIBUNAL RELAÇÃO PORTO
Relator: RUI MOREIRA
Data do Acórdão: 01/11/2022
Decisão: Sumário:
I - Atentas as particularidades próprias do efeito de caso julgado na ação inibitória que é qualificado como um caso julgado secundum eventum litis (o caso julgado favorável aproveita a terceiro, o caso julgado desfavorável é-lhe inoponível), deve concluir-se que a simples correção ou supressão de cláusula por parte do demandado na ação fica aquém do que se pretende com a condenação proibitiva, que se estende a todos os contratos que o demandado venha a celebrar ou a recomendar.
II - A ação inibitória reconduz-se a um controle abstrato da legalidade das cláusulas contratuais gerais, não estando a sua sindicância dependente da inclusão em contratos singulares, bastando essa possibilidade.
III - É proibida e nula, nos termos da al. c) do nº 1 do art.º 22º, com referência ao art.º 12º do RJCCG, a cláusula contratual geral que atribui à predisponente o direito de alterar unilateralmente os termos do contrato, a qualquer momento, com base na sua própria conveniência e sem que ao consumidor seja dada a possibilidade de resolução do contrato ou de solicitar qualquer reembolso, compensação ou indemnização.
IV - Esta cláusula é igualmente proibida e nula por violar o princípio da boa fé, por criar um desequilíbrio na relação contratual estabelecida entre a predisponente e o utilizador/consumidor, colocando este à mercê do arbítrio daquela, perante a possibilidade conferida por esta cláusula de o predisponente poder, a todo o momento e de forma unilateral, alterar os termos do contrato, ou mesmo revoga-lo.
V - A designação “artigos sem sinal de uso indevido”, é uma expressão demasiado vaga e abstrata, podendo, por isso, ser-lhe atribuído o sentido de não permitir ao consumidor a utilização dos bens adquiridos, por forma a verificar a sua conformidade e, nessa justa medida, a cláusula sindicada é nula, por contender com valores fundamentais do direito defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos art.ºs 12.º, 15.º e 16º, do RJCCG, em concreto, por contender com lei imperativa, como é o caso dos art.ºs 14.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei nº 24/2014, de 14-02, sendo também nula nos termos do art.º 294.º do Código Civil.
VI - É nula, por contender com valores fundamentais do direito defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos art.ºs 12.º, 15.º e 16.º, do RJCCG, a cláusula que determina que, para situações de reembolso, determina “aplicável em compras no site B....pt”, por ser ambígua, no sentido de que o reembolso a efectuar ao consumidor será feito sempre através de um crédito a utilizar em compras no site da predisponente.
VII - A publicidade da decisão da ação inibitória tem um efeito dissuasor e visa transmitir à generalidade dos consumidores/interessados o resultado objetivo da ação e a disciplina jurídica a que passarão a estar inelutavelmente submetidos os contratos de adesão celebrados, mostrando-se plenamente adequada à vertente cívico/social da própria ação inibitória, direcionada para a proteção dos interesses difusos da generalidade dos consumidores/aderentes, informados precisamente dos seus direitos através da publicitação em órgãos de comunicação social, a todos os cidadãos plenamente acessíveis, do resultado final da causa.

Decisão:
Termos em que, julgando a apelação improcedente, confirma-se a decisão recorrida.

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Texto Integral: 3258_16_0T8MTS.pdf 3258_16_0T8MTS.pdf