Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:018/18.7BECBR-S1
Data do Acordão:06/26/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
NULIDADE DE ACÓRDÃO
PRESCRIÇÃO
Sumário:Não é de admitir revista se as questões jurídicas suscitadas na apelação, parecem ter sido tratadas de forma plausível pelo acórdão recorrido [bem como pelo acórdão complementar de 05.04.2024 que indeferiu a arguição de nulidade], sendo certo que na revista apenas vêm suscitadas nulidades de decisão, não se demostrando, no juízo sumário que a esta Formação de Apreciação Preliminar cabe realizar, que o acórdão padeça de qualquer nulidade ou erro, muito menos ostensivo, que justifique a intervenção deste STA.
Nº Convencional:JSTA000P32424
Nº do Documento:SA120240626018/18
Recorrente:A..., S.A.
Recorrido 1:AA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório
A..., SA, Ré nos autos, vem interpor revista, invocando o disposto nos arts. 145º, nº 1 do CPTA e 617º do CPC, do acórdão proferido pelo TCA Norte em 30.11.2023 [complementado pelo acórdão de 05.04.2024 que indeferiu a arguição de nulidade do primeiro], que no recurso interposto pela mesma Ré: i) não admitiu o recurso interposto do despacho saneador na parte em que julgou improcedente a excepção de ilegitimidade passiva; e, ii) concedeu provimento ao recurso interposto do despacho saneador na parte em que julgou improcedente a excepção de prescrição, revogando, nessa parte, a decisão recorrida e, determinando a baixa dos autos ao TAF de Coimbra para aí prosseguir os seus termos, na acção intentada por AA para efectivação de responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito.

Não foram apresentadas contra alegações.

2. Os Factos
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. O Direito
O art. 150º, nº 1 do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como resulta do próprio texto legal, e a jurisprudência deste STA tem repetidamente sublinhado, trata-se de um recurso excepcional, como, aliás, o legislador sublinhou na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando o preceito como uma “válvula de segurança do sistema”, que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

O Autor com a presente acção pretende, para efectivação de responsabilidade civil extracontratual, ser indemnizado pelas Rés [além da aqui Recorrente a B..., SA], em virtude dos danos por si sofridos na sequência de um acidente ocorrido no dia 28.11.2023, ao km 206,050 da auto-estrada A..., no sentido norte/sul, nas proximidades da localidade de ..., concelho ..., distrito ..., no qual foi interveniente o veículo ligeiro de mercadorias com a matrícula ..-JM-.., pertencente à empresa C..., Lda, o qual era conduzido por BB e no qual o Autor seguia como ocupante, ao lado do condutor, ambos ao serviço da referida empresa. Mais alegou que surgiu, súbita e inesperadamente, na frente do veículo um animal de porte médio, de raça canina, não tendo o condutor, possibilidade de efectuar qualquer manobra de desvio que evitasse a colisão do referido veículo com o canídeo, acabando por embater no mesmo. Donde resultou, além do mais, ferimentos no autor, que teve de ser transportado, de imediato, para o Centro hospitalar e Universitário ...

O TAF de Coimbra proferiu despacho saneador em 13.01.2023, no qual julgou não verificadas as excepções de ilegitimidade da Ré e da prescrição, por aplicação do prazo mais alargado, previsto no nº 3 do art. 498º do Código Civil.

Interposta apelação pela Ré/Recorrente veio o acórdão recorrido, a entender que em relação ao recurso interposto do despacho saneador na parte em que o mesmo apreciou e julgou improcedente a excepção de ilegitimidade passiva, sendo aquele um despacho interlocutório, o nele decidido nesta parte, só poderia ser impugnado no recurso que venha a ser interposto da decisão final (art. 142º, nº 5 do CPTA e 644º, nºs 1 e 2 do CPC, não sendo, por isso, o recurso admissível.
Quanto à excepção de prescrição considerou que podendo o quadro factual descrito na petição inicial ser susceptível de integrar a prática de um ilícito criminal, com o consequente alargamento do prazo prescricional, tendo tal quadro fáctico sido impugnado pela ré, carece de ser demonstrado pelo autor.
Concluiu, assim, que, “(…), forçoso é de concluir que o conhecimento da excepção de prescrição no despacho saneador revela-se prematuro, pois existe matéria de facto controvertida relevante para a decisão. O conhecimento dessa excepção deve, assim, ter lugar na sentença final, depois de ser produzida prova de tais factos.
Assiste, pois, razão ao recorrente ao defender que o saneador não podia ter decidido como decidiu, devia ter deixado a questão para final, depois da produção da prova.
Nessa parte, o acórdão revogou o despacho saneador recorrido e determinou a baixa dos autos ao TAF para aí prosseguirem os seus ulteriores termos processuais.

Na sua revista a Recorrente defende que o acórdão recorrido incorreu em nulidade por omissão e excesso de pronúncia quanto à excepção de ilegitimidade (art. 615º, nº 1, al. d) do CPC), não devendo ter-se pronunciado sobre a prescrição. Alega, para tanto, quanto à nulidade por omissão de pronúncia que o acórdão devia ter começado por conhecer da excepção de “Ilegitimidade/Pluralidade subjectiva subsidiária ilegal”, o que não fez. E que ao “ter entrado no conhecimento da matéria da prescrição, sem que antes tenha conhecido das excepções dilatórias da legitimidade – conclusões 2ª, 3ª, 4ª e 5ª da apelação – e da pluralidade subjetiva subsidiária” teria incorrido no invocado excesso de pronúncia.
A tese da Recorrente não é, porém, convincente.
Com efeito, o acórdão recorrido explicitou que, em relação à excepção de ilegitimidade passiva, o recurso não era admissível (devendo o despacho saneador ser impugnado no recurso que venha a ser interposta da decisão final), pelo que passou a apreciar a matéria atinente à excepção de prescrição, sem que se vislumbre, assim, que haja incorrido em nulidade por omissão ou excesso de pronúncia.
As questões jurídicas suscitadas na apelação, parecem ter sido tratadas de forma plausível pelo acórdão recorrido [bem como pelo acórdão complementar de 05.04.2024 que indeferiu a arguição de nulidade], sendo certo que na revista apenas vêm suscitadas nulidades de decisão, não se demostrando, no juízo sumário que a esta Formação de Apreciação Preliminar cabe realizar, que o acórdão padeça de qualquer nulidade ou erro, muito menos ostensivo, que justifique a intervenção deste STA.
Assim, face ao aparente acerto do acórdão recorrido, não se justifica postergar a regra da excepcionalidade da revista.

4. Decisão
Pelo exposto, acordam em não admitir a revista.
Custas pela Recorrente.

Lisboa, 26 de Junho de 2024. – Teresa de Sousa (relatora) – José Veloso – Fonseca da Paz.