Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0187/17.3BEBRG |
Data do Acordão: | 07/03/2024 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | JOAQUIM CONDESSO |
Descritores: | INCIDENTE NULIDADE DE ACÓRDÃO FUNDAMENTOS OMISSÃO DE PRONÚNCIA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO CONTRADIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO |
Sumário: | I - Tal como as sentenças de 1ª. Instância, os acórdãos proferidos pelos Tribunais Superiores podem ser objecto de arguição de nulidade. Além das nulidades previstas nas diferentes alíneas do artº.615, nº.1, do C.P.Civil, surgem-nos ainda duas situações decorrentes da colegialidade do Tribunal que profere o acórdão e que dão origem a nulidades específicas deste: o acórdão ser lavrado contra o vencido e, por outro lado, sem o necessário vencimento (cfr.artºs.666, nº.1, 667 e 679, do C.P.Civil). II - Entre os possíveis fundamentos da nulidade de um acórdão vamos encontrar a omissão de pronúncia prevista no artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil. A omissão de pronúncia (vício de "petitionem brevis") pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma. III - Para que ocorra a nulidade de acórdão que consiste na falta de fundamentação é necessário que seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da mesma peça processual, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.607, nº.4, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação. IV - Nos termos do preceituado no artº.615, nº.1, al.c), do C. P. Civil, é nulo o acórdão quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão. Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artº.154, nº.1, do C.P.Civil. O vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos do acórdão devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada. No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário. (sumário da exclusiva responsabilidade do relator) |
Nº Convencional: | JSTA000P32459 |
Nº do Documento: | SA2202407030187/17 |
Recorrente: | A..., LDA |
Recorrido 1: | AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | ACÓRDÃO "A..., L.DA.", notificada do acórdão datado de 28/02/2024 e constante a fls.90 a 95 do processo físico, deduziu incidente de nulidade de acórdão (cfr.97 e seg. do processo físico), alegando, em síntese e se bem percebemos:X RELATÓRIO X 1-Que deve o aresto objecto do presente incidente ser declarado nulo ao abrigo do artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, dado que, sofre de nulidade por omissão de pronúncia, visto que ignorou totalmente a questão que consiste em avaliar se, para o caso, é ou não relevante o conceito contabilístico de mais-valias, ou se, ao contrário, o que conta é o conceito emergente do artº.46, do C.I.R.C., norma que no seu nº.1 estabelece o respectivo conceito pela positiva e no nº.6, pela negativa, excluindo do mesmo situações que poderiam estar incluídas pelo nº.1; 2-Sendo que esta questão é decisiva para avaliar da procedência da pretensão da recorrente, porque, se relevar o conceito emergente do C.I.R.C., então só pode excluir os resultados ali previstos do regime das mais e menos-valias e não do cômputo do lucro tributável; 3-Se porventura se entender que o acórdão assumiu (implicitamente, porque explicitamente seguramente não) que o conceito de mais e menos-valias a reter é o contabilístico, então existe falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, nulidade consagrada no artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil; 4-Que deve o aresto objecto do presente incidente ser declarado nulo ao abrigo do artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, dado que, sofre de nulidade por omissão de pronúncia, visto ter ignorado totalmente a seguinte questão: as disposições dos artºs.25, nº.1, e 46, nº.6, ambos do C.I.R.C., estabelecem ou não regimes diferentes para situações diferentes. Se sim, qual a diferença entre o regime previsto numa disposição e o regime previsto na outra ? 5-Se porventura se entender que o acórdão assumiu (implicitamente, porque explicitamente seguramente não) que as identificadas normas dos artºs.25, nº.1, e 46, nº.6, ambos do C.I.R.C., estabelecem regimes iguais para situações diferentes, então existe falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, nulidade consagrada no artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil; 6-Que deve o aresto objecto do presente incidente ser declarado nulo ao abrigo do artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, dado que, sofre de nulidade por omissão de pronúncia, visto ter ignorado totalmente a seguinte questão: os rendimentos da alínea b), do nº.6, do artº.46, do C.I.R.C., estarem ou não excluídos do cômputo do lucro tributável e de o seu regime ser de aplicar, em pé de igualdade, aos rendimentos da alínea a), ou seja os resultados decorrentes da entrega dos bens ao locador; 7-Se porventura se entender que o aresto não padece de omissão de pronúncia, então houve oposição entre os fundamentos e a decisão porque o acórdão se louva num entendimento do autor AA, quando tal entendimento deveria conduzir a decisão diferente da que foi proferida, tudo nos termos do artº.615, nº.1, al.c), do C.P.Civil. X Notificada do requerimento a suscitar o incidente sob exame, a entidade recorrida nada disse.X O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no qual termina pugnando pela improcedência do incidente de nulidade de acórdão suscitado (cfr.fls.106 a 108 do processo físico).X Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação (cfr.artºs.657, nº.4, 666, nº.2, e 679, todos do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, "ex vi" do artº.281, do C.P.P.Tributário).X Uma vez proferida a sentença (ou acórdão), imediatamente se esgota o poder jurisdicional do Tribunal relativo à matéria sobre que versa (cfr.artº.613, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Excepciona-se a possibilidade de reclamação com o objectivo da rectificação de erros materiais, suprimento de alguma nulidade processual, esclarecimento da própria sentença ou a sua reforma quanto a custas ou multa (cfr.artºs.613, nº.2, e 616, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.125, do C.P.P.Tributário).ENQUADRAMENTO JURÍDICO X Tanto a reclamação, como o recurso, passíveis de interpor face a sentença (ou acórdão) emanada de órgão jurisdicional estão, como é óbvio, sujeitos a prazos processuais, findos os quais aqueles se tornam imodificáveis, transitando em julgado. A imodificabilidade da decisão jurisdicional constitui, assim, a pedra de toque do caso julgado (cfr.artºs.619 e 628, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Já a possibilidade de dedução do incidente de nulidade da sentença (acórdão) visa satisfazer a preocupação de realização efectiva e adequada do direito material e o entendimento de que será mais útil à paz social e ao prestígio e dignidade que a administração da Justiça coenvolve, corrigir do que perpetuar um erro juridicamente insustentável, conforme se retira do preâmbulo do dec.lei 329-A/95, de 12/12 (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 24/02/2011, rec.400/10; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 19/10/2011, rec. 497/11; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 18/11/2020, rec.194/09.0BEPNF; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 5/06/2024, rec.365/22.3BEAVR; Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. Edição, II Volume, Áreas Editora, 2011, pág.356 e seg.; António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª. Edição, 2017, Almedina, pág.325 e seg.; José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, C.P.Civil anotado, Volume 2º., 4ª. Edição, Almedina, 2021, pág.728 e seg.). Tal como as sentenças de 1ª. Instância, os acórdãos proferidos pelos Tribunais Superiores podem ser objecto de arguição de nulidade. Além das nulidades previstas nas diferentes alíneas do artº.615, nº.1, do C.P.Civil, surgem-nos ainda duas situações decorrentes da colegialidade do Tribunal que profere o acórdão e que dão origem a nulidades específicas deste: o acórdão ser lavrado contra o vencido e, por outro lado, sem o necessário vencimento (cfr.artºs.666, nº.1, 667 e 679, do C.P.Civil; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 5/06/2024, rec.365/22.3BEAVR; José Lebre de Freitas e Outros, C.P.Civil anotado, Volume 3º., 3ª. Edição, Almedina, 2022, pág.186 e seg.; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. Edição, Almedina, 2009, pág.59 e seg.). "In casu", a sociedade requerente pede, antes de mais, que este Tribunal declare a nulidade do aresto produzido no processo ao abrigo do artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, dado que, sofre de omissão de pronúncia, visto que ignorou totalmente a questão que consiste em avaliar se, para o caso, é ou não relevante o conceito contabilístico de mais-valias, ou se, ao contrário, o que conta é o conceito emergente do artº.46, do C.I.R.C., norma que no seu nº.1 estabelece o respectivo conceito pela positiva e no nº.6, pela negativa, excluindo do mesmo situações que poderiam estar incluídas pelo nº.1. Que esta questão é decisiva para avaliar da procedência da pretensão da recorrente, porque, se relevar o conceito emergente do C.I.R.C., então só pode excluir os resultados ali previstos do regime das mais e menos-valias e não do cômputo do lucro tributável. Antes de mais, deve recordar-se que nos encontramos face a uma questão de direito, sendo que o Tribunal é livre de conhecer dos aspectos jurídicos da causa (indagação, interpretação e aplicação das regras de direito), até com independência das razões invocadas pelas partes (cfr.artº.5, nº.3, do C.P.Civil). Entre os possíveis fundamentos da nulidade de uma sentença/acórdão vamos encontrar a omissão de pronúncia prevista no artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil. A omissão de pronúncia (vício de "petitionem brevis") pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Já não consubstancia esta nulidade a mera omissão do exame de linhas de fundamentação jurídica diferentes das examinadas pelo Tribunal e que as partes hajam invocado. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença/acórdão, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/02/2011, rec.50/11; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. Edição, 2011, pág.362 e seg.; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V volume, Coimbra Editora, 1984, pág.142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, C.P.Civil anotado, Volume 2º., 4ª. Edição, Almedina, 2021, pág.737). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por um lado, "questões" e, por outro, "razões" ou "argumentos" para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das "questões") integra a nulidade de omissão de pronúncia, mas já não a mera falta de discussão das "razões" ou "argumentos" invocados para concluir sobre as mesmas questões. É evidente a improcedência do incidente, nesta parcela, pelas seguintes razões: 1-Conforme mencionado supra, deve recordar-se que nos encontramos face a uma questão de direito, sendo que o Tribunal é livre de conhecer dos aspectos jurídicos da causa (indagação, interpretação e aplicação das regras de direito), até com independência das razões invocadas pelas partes (cfr.artº.5, nº.3, do C.P.Civil); 2-O aresto objecto do presente incidente examina a diferenciação entre as mais e menos-valias contabilísticas e fiscais, somente estas últimas relevando, além do mais, no seguinte trecho que reproduzimos: "Um dos exemplos em que isso acontece é, precisamente, o caso das mais-valias ou menos-valias: as mais-valias e as menos-valias fiscalmente relevantes são as determinadas na "Subsecção VI – Regime das mais-valias e menos-valias realizadas" (artºs.46 a 48, do C.I.R.C.) e não as reflectidas no resultado líquido do período de tributação, as ditas mais-valias e menos-valias contabilísticas. O apuramento das mais-valias é, por isso, um dos casos em que se opera um total afastamento entre a contabilidade empresarial e a contabilidade fiscal (cfr.António Rocha Mendes, IRC e as Reorganizações Empresariais, Universidade Católica Editora, 2016, pág.85 e seg.). O artº.46, do C.I.R.C., consubstancia, assim, uma norma especial que, desde logo, regula a relevância como componente, negativa ou positiva, do lucro tributável, das mais-valias ou menos-valias contabilísticas, acolhendo-as nuns casos e noutros não." Concluindo, não se vislumbra qualquer nulidade, devido a eventual omissão de pronúncia, de que padeça o acórdão exarado nestes autos e constante de fls.90 a 95 do processo físico, no segmento acabado de examinar. Mais aduz a sociedade requerente que, se porventura se entender, que o acórdão assumiu (implicitamente, porque explicitamente seguramente não) que o conceito de mais e menos-valias a reter é o contabilístico, então existe falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, nulidade consagrada no artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil. Também é evidente a improcedência do incidente, nesta parcela, pelos seguintes motivos: 1-Para que o acórdão padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da mesma peça processual, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.607, nº.4, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/02/2011, rec.871/10; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/07/2021, rec.1709/05.8BEPRT; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. Edição, 2011, pág.357; José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, ob.cit., pág.735 e seg.); 2-É patente a fundamentação do acórdão, no que se refere ao conceito de mais e menos-valias relevantes, o qual se reconduz às consagradas no artº.46 e seg., do C.I.R.C., portanto, as mais e menos-valias fiscais, e não as contabilísticas, tudo em sede de exegese do artº.46, do C.I.R.C., na redacção em vigor em 2014 (cfr.fls.9 e 10 do acórdão). Concluindo, não se vislumbra qualquer nulidade, devido a eventual falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito, de que padeça o acórdão exarado nestes autos e constante de fls.90 a 95 do processo físico. Alega, igualmente, a sociedade requerente que o aresto objecto do presente incidente sofre de nulidade por omissão de pronúncia, visto ter ignorado totalmente a seguinte questão: as disposições dos artºs.25, nº.1, e 46, nº.6, ambos do C.I.R.C., estabelecem ou não regimes diferentes para situações diferentes. Se sim, qual a diferença entre o regime previsto numa disposição e o regime previsto na outra ? É, também, evidente o não provimento do incidente, nesta parcela. É que, nenhuma questão se colocou no acórdão objecto do presente incidente, no que se refere ao exame concatenado dos artºs.25, nº.1, e 46, nº.6, ambos do C.I.R.C. Com este pressuposto, resultante do exame do enquadramento jurídico constante do aresto, prejudicado fica, desde logo, a colocação da mesma questão como sendo objecto do recurso, assim não podendo surgir a existência de uma nulidade por omissão do seu conhecimento. Em conclusão, este Tribunal pronunciou-se sobre todas as questões (que não, razões ou argumentos) constantes das conclusões do recurso deduzido. E recorde-se que o acto tributário objecto do presente processo, liquidação adicional de I.R.C. estruturada pela A. Fiscal, fundamenta-se, juridicamente, no citado artº.46, nº.6, al.a), do C.I.R.C. (cfr.nº.14 do probatório constante do acórdão objecto do presente incidente). Refira-se, afinal, que pode a sociedade requerente não concordar com a decisão efectuada, considerando até haver erro de julgamento nessa matéria. Porém, para esse efeito, não é adequado o incidente de nulidade de acórdão devido a omissão de pronúncia, pois que este apenas logra aplicação, como vimos, quando o Tribunal não toma conhecimento de questão de que podia e devia conhecer. Aduz, ainda, a sociedade requerente que, se porventura se entender, que o acórdão assumiu (implicitamente, porque explicitamente seguramente não) que as identificadas normas dos artºs.25, nº.1, e 46, nº.6, ambos do C.I.R.C., estabelecem regimes iguais para situações diferentes, então existe falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, nulidade consagrada no artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil. Remetendo para o regime da nulidade ora invocada e supra delineado, mais uma vez, é manifesta a improcedência do incidente neste segmento. Desde logo, porque não havendo qualquer questão que obrigasse este Tribunal a decidir, não pode o aresto ser apodado de nulo devido a falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Por outro lado, recorde-se que esta nulidade somente ocorre quando a alegada falta de fundamentação seja absoluta. Sem necessidade de maiores considerandos, nega-se provimento à presente parcela do incidente. Defende, identicamente, a sociedade requerente que deve o aresto objecto do presente incidente ser declarado nulo ao abrigo do artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, dado que, sofre de nulidade por omissão de pronúncia, visto ter ignorado totalmente a seguinte questão: os rendimentos da alínea b), do nº.6, do artº.46, do C.I.R.C., estarem ou não excluídos do cômputo do lucro tributável e de o seu regime ser de aplicar, em pé de igualdade, aos rendimentos da alínea a), ou seja os resultados decorrentes da entrega dos bens ao locador. Que dizer. Da apreciação do enquadramento jurídico constante do acórdão objecto do presente incidente se deve, linearmente, concluir que em nenhum momento se colocou a questão do exame concatenado das alíneas a) e b), do nº.6, do artº.46, do C.I.R.C., na redacção em vigor em 2014. Antes somente a al.a), do citado normativo estava sob exame, dado ter sido nessa alínea que a A. Fiscal fundamentou a correcção meramente aritmética que originou o acto tributário objecto do processo, o qual foi confirmado pelas duas instâncias judiciais que examinaram a conduta da Fazenda Pública, concluindo pela legalidade da mesma. Por consequência, não pode o aresto objecto do presente incidente padecer da nulidade de omissão de pronúncia nesta concreta parcela. Por último, defende a sociedade recorrente/requerente que o aresto sofre de nulidade, dado se verificar a oposição entre os fundamentos e a decisão porque o acórdão se louva num entendimento do autor AA, quando tal entendimento deveria conduzir a decisão diferente da que foi proferida, tudo nos termos do artº.615, nº.1, al.c), do C.P.Civil. De acordo com o artº.615, nº.1, al.c), do C.P.Civil, é nula a sentença (ou acórdão) quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral, consagrado no artº.154, nº.1, do C.P.Civil. O vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.141 e 142; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.689 e 690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36 e 37; José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, ob.cit., pág.736 e seg.). No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário. Igualmente, é evidente o não provimento do incidente, nesta parcela, dado que do exame do enquadramento jurídico e dispositivo do acórdão produzido no processo não se vislumbra qualquer quebra do silogismo judiciário. Concretizando, em sede de fundamentação o aresto conclui pela legalidade da actuação da A. Fiscal e, por consequência, nega provimento ao recurso deduzido, assim confirmando a sentença do Tribunal "a quo" que já decidira no mesmo sentido. E não modifica tal conclusão o facto de o acórdão conter citações de obras doutrinais. O que sucede é que a requerente não concorda com a exegese do Tribunal incidente sobre o artº.46, nº.6, al.a), do C.I.R.C., na redacção em vigor em 2014, e a sua consequente aplicação ao caso concreto. Ora, decerto que esta discordância da requerente para com o entendimento do Tribunal merece todo o respeito, mas, num Estado de Direito, os Tribunais Tributários, como órgãos independentes a quem incumbe administrar a justiça dirimindo os litígios emergentes das relações administrativo-tributárias (cfr.artºs.202, nº.1, e 212, nº.3, da C.R.Portuguesa), têm de decidir segundo o seu próprio entendimento sobre a solução das questões jurídicas que lhes incumbe resolver e não adoptar aquele que uma das partes teria se fosse ela, e não o Tribunal, a entidade a que a lei atribui o poder de julgar. Está-se assim, manifestamente, perante uma situação em que não é viável a declaração de nulidade de acórdão ao abrigo das diversas alíneas, do artº.615, nº.1, do C.P.C. Atento tudo o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se totalmente improcedente o presente incidente de nulidade de acórdão, ao que se provirá na parte dispositiva. X Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO em INDEFERIR A REQUERIDA NULIDADE DO ACÓRDÃO constante a fls.90 a 95 do processo físico.DISPOSITIVO X X Condena-se a sociedade requerente em custas pelo presente incidente, fixando-se a taxa de justiça em três (3) U.C., atenta a sua complexidade (cfr.artº.527, nº.1, do C.P.Civil; artº.7 e Tabela II, do R.C.Processuais).X Registe.Notifique. X Lisboa, 3 de Julho de 2024. - Joaquim Manuel Charneca Condesso (Relator) - Gustavo André Simões Lopes Courinha - José Gomes Correia. |