Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0131/20.0BALSB
Data do Acordão:06/30/2021
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
IRS
MAIS VALIAS
NÃO RESIDENTE
Sumário:I - O recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral pressupõe que se verifique, entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão invocado como fundamento, oposição quanto à mesma questão fundamental de direito (cf. o n.º 2 do art. 25.º RJAT), não devendo, ainda, o recurso ser admitido se, não obstante a existência de oposição, a orientação perfilhada no acórdão impugnado estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (cf. o n.º 3 do art. 152.º do CPTA, aplicável ex vi do disposto no n.º 3 do art. 25.º do RJAT).
II - A existência de uma jurisprudência consolidada deve transparecer ou do facto de a pronúncia concernente já ter sido emitida de acórdão do Pleno assumido pela generalidade dos Conselheiros em exercício na Secção ou do facto de existir uma sequência ininterrupta de várias decisões no mesmo sentido, obtidas por unanimidade em todas as formações da Secção.
III - Inverifica-se tal requisito se a orientação perfilhada na decisão recorrida é plenamente idêntica à assumida em acórdão do Pleno da Secção, em que intervieram todos os Juízes Conselheiros em exercício.
Nº Convencional:JSTA000P27967
Nº do Documento:SAP202106300131/20
Data de Entrada:11/11/2020
Recorrente:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A................ E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1. – Relatório

A Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) vem, nos termos do n.º 1 do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (“CPTA”), aplicável ex vi n.ºs 2 a 4 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributaria — “RJAT”), com a alteração introduzida pela Lei n.º 119/2019, de 18 de Setembro, interpor recurso de uniformização de jurisprudência para o Pleno do Contencioso Tributário do STA, da decisão arbitral proferida no Processo n.º 683/2019-T do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), em que são recorridos A……………….. e B……………………., melhor sinalizados nos autos, relativo à aplicação do artigo 43.º, n.º 2 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, em sede de tributação de IRS de mais-valias, quando obtidas por cidadãos europeus não residentes em território nacional, e invocando contradição com a decisão arbitral proferida no Processo n.º 539/2018-T.

Inconformada, formulou a recorrente Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, as seguintes conclusões:

A – O Acórdão arbitral recorrido (683/2019-T) incorreu em erro de julgamento, porquanto decidiu o Tribunal Arbitral “Assim, tudo visto e ponderado, parece resultar claro que os actos de liquidação mediatamente postos em crise, por se terem fundado na interpretação de que o nº 2 do artigo 43º do Código do IRS só é aplicável aos residentes em território português, são ilegais e como tal devem ser anulados, ainda que se dê aos residentes noutros Estados-membros a possibilidade de serem tributados como se residentes em Portugal fossem, por sua opção.”
B – E sustenta o referido acórdão arbitral que “Acresce que o TJUE apreciou já, pelo menos um caso cujas características permitem que dele aqui se fale: é o caso Gielen, de 18.03.2010, proc. C-440/08. Ainda que referente à proibição de restrições à livre prestação de serviços, nele se rejeita a possibilidade de se oferecer ao contribuinte a opção entre um quadro de tributação ilegal e outro pretensamente legal. O TJUE precisou que, perante uma vantagem fiscal cujo benefício é recusado aos não residentes, uma diferença de tratamento entre estas duas categorias de contribuintes pode ser qualificada de discriminatória, na acepção do TFUE, quando não haja nenhuma diferença suscetível de justificar as diferenças de tratamento, quanto a este aspeto, entre as referidas categorias de contribuintes.
Transpondo este postulado para o caso sub judice, a vantagem fiscal consistiria na possibilidade de os residentes verem a tributação incidir apenas sobre metade da mais-valia imobiliária apurada nos termos do Código do IRS, ao passo que os não residentes vê-la-iam incidir sobre a totalidade do respetivo montante, ainda que a taxa diferente. Ora, em rigor, não parece haver nenhuma diferença objetiva entre as duas situações para além da residência. Uns são tributados de uma forma, porque residentes em território português e outros são tributados de forma diversa porque nela não residem. É pois, evidente que os contribuintes residentes e os contribuintes não residentes se encontram numa situação comparável.
(…)
Ora, entendem os Requerentes que este diverso tratamento tributário, distinguindo residentes em território português de residentes noutros Estados-Membros da União Europeia é objetivamente discriminatório, não se justificando à luz da liberdade de circulação de capitais consagrada no artigo 63º do TFUE.
Defende-se a Requerida dizendo que sempre terão os residentes noutros Estados-Membros da União Europeia a possibilidade de optarem por um regime de tributação em tudo idêntico ao aplicável aos residentes em território português, nos termos do disposto nos números 14 e 15 do artigo 72º do Código do IRS (números 9 e 10 à data da alienação do imóvel pelos Requerentes).
Sucede que a existência desta opção não afasta a invalidade do regime objetivamente discriminatório que autorizou a prática dos atos de liquidação de IRS mediatamente impugnados nos presentes autos arbitrais.”
C – Ao contrário do que decidiu a Decisão Arbitral fundamento (processo n.º 539/2018-T), na qual o Tribunal arbitral considerou que:
“14 - Apresenta-se, pois, neste processo, uma dupla situação que encerra incongruências, entre si, quanto ao que o Requerente pretende, porquanto: a) Por um lado, pretende a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS, que é aplicável às mais-valias obtidas em território português, que, de facto manda considerar a tributação de 50% saldo das mais-valias de imóveis, respeitantes às transmissões efetuadas por residentes, previstas na alínea a)2 do n.º 1 do artigo 10.º.
b) Por outro lado, exige que seja feita uma tributação do referido saldo, reduzido em 50%, com aplicação da taxa aplicável a não residentes de 25%, conforme opção de tributação pelo regime geral, conforme campo 07 do quadro 8B da sua Declaração mod. 3 de IRS, e não pela aplicação das taxas gerais do artigo 68.º e das demais regras aplicáveis aos residentes.
15 - Ora, esta forma de tributação mista, de escolha do melhor dos regimes de tributação, ou seja, ser considerado como residente para efeitos de aplicação do artigo 43.º, n.º 2 e não residente para efeitos de aplicação da taxa do artigo 72.º, n.º 1, ambos do CIRS, o que é incongruente e inaplicável, e nem sequer se pode argumentar que há violação dos Tratados da União Europeia, por não se estar perante uma qualquer discriminação.
16 - Isto porque o Requerente tinha ao seu dispor a possibilidade de ver tributadas as suas mais-valias de harmonia com todas as regras aplicáveis aos residentes, se, para tanto, tivesse feito essa opção, ao abrigo do n.º 9 do artigo 72.º do Código do IRS, como a lei lhe permite - o que não aconteceu.
17 - Assim, ao não ter optado pela tributação das suas mais-valias imobiliárias, pela aplicação das taxas do artigo 68.º do CIRS e das demais regras aplicáveis aos residentes, mas sim pelas taxas gerais, não assiste razão ao Requerente.
18 - Aliás, nem aos residentes as normas do CIRS permitem esta dualidade de tratamento, ou seja, redução a 50% das mais-valias imobiliárias e aplicação das taxas do artigo 72.º do CIRS, obrigando sempre, neste caso, ao englobamento deste saldo com os demais rendimentos para aplicação à totalidade dos rendimentos auferidos as taxas gerais do artigo 68.º do Código do IRS.
19. O regime escolhido pelo Requerente, embora invoque que é um residente na União Europeia, foi o da tributação pelas taxas do artigo 72.º aplicáveis a não residentes e não as aplicáveis a residentes, pelo que o regime escolhido deve ser aplicado "in toto", como procedeu, e bem, a Requerida, no entender do Tribunal.
19- Assim sendo, não se poderá invocar a discriminação negativa como pretende o Requerente e isto porque as suas opções foram respeitadas.
20- Recorda-se que o Acórdão do TJCE de 2007OUT11 (Hollman) foi proferido antes das alterações introduzidas ao artigo 72.º do CIRS, já anteriormente citadas, precisamente para permitir uma tributação igualitária entre residentes em território português e não residentes, desde que os sujeitos passivos o requeiram - o que não foi o caso.”
D – Concluindo o Acórdão fundamento que:
“20 - Nesta conformidade, entende este Tribunal que a liquidação impugnada não sendo incompatível com o disposto no artigo 63.º do TFUE, dada a opção do Requerente, julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se na ordem jurídica a liquidação n.º 2018.5005490173, relativa ao ano de 2017 e no valor de €47.034,56.
(…)
Termos em que se decide:
a) Julgar improcedente o pedido arbitral formulado e, em consequência, manter na ordem jurídica a liquidação de IRS impugnada.
b) Julgar igualmente improcedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios a favor do Requerente. (…)”
E – Verifica-se uma patente e inarredável contradição quanto à mesma questão fundamental de direito, que consiste em saber se o regime de exclusão de tributação de mais-valias previsto no artigo 43.º, n.º 2 do CIRS é aplicável aos não residentes.
F – Quanto ao estabelecido pelas regras que determinam os requisitos de admissibilidade deste tipo de recursos, resulta que, para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos, é necessário (vd., entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 2015-06-03, processo 0793/14) que:
· as situações de facto sejam substancialmente idênticas;
· haja identidade na questão fundamental de direito;
· se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta; e,
· a oposição deverá decorrer de decisões expressas e não apenas implícitas.
G - As presentes alegações demonstram que, no caso vertente, se encontram reunidos os referidos requisitos para que se tenha por verificada a alegada oposição de acórdãos.
H - Para que se considere que há oposição de acórdãos, entende a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo que os acórdãos em confronto versem sobre situações fácticas substancialmente idênticas e que se pronunciem sobre a mesma questão fundamental de direito. Ou seja, importa que as soluções opostas tenham sido perfilhadas relativamente ao mesmo fundamento de direito, o se verificou.
I - Entre o Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento há uma identidade de situações de facto, na medida que em ambos os casos, a factualidade consignada se reporta a tributação no âmbito de IRS, tendo em conta a aplicação do art. 43.º, n.º 2 do CIRS aos não residentes.
J - As decisões em confronto perfilharam, sobre a mesma questão fundamental de direito, soluções opostas de forma expressa, isto é, adotaram sobre a mesma questão de direito soluções juridicamente divergentes em idênticas situações de facto.
K - Resta concluir que o Acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento, bem como que se encontra em manifesta oposição quanto à mesma questão fundamental de direito com a jurisprudência firmada na Decisão fundamento, devendo ser substituído por novo Acórdão que julgue improcedente o pedido arbitral.
Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser aceite e posteriormente julgado procedente, por provado, sendo, em consequência, nos termos e com os fundamentos acima indicados revogada a decisão arbitral recorrida e substituída por outro Acórdão consentâneo com o quadro jurídico vigente.

Houve contra-alegações, das quais os recorridos A………………. e B………………….. concluíram da seguinte forma:

I – É notória a contradição entre as soluções alcançadas pelo Tribunal Arbitral, uma vez que, em ambas as situações sobre as quais o Tribunal Arbitral foi confrontado, nos deparamos com a aplicação de normas (e, consequentemente, taxas de tributação) diferentes, não obstante a não identidade de factualidade.
II – Não deve a solução alcançada e contida no Acórdão Fundamento ser perfilhada, uma vez que, ao entender que a liquidação impugnada não é incompatível com o disposto no artigo 63.º do TFUE, dada a possibilidade de escolha do sujeito passivo entre o regime da tributação à taxa autónoma de 28%, prevista no artigo 72.º do CIRS, e a tributação à taxa das regras gerais, previstas no artigo 68.º, com a consideração por metade do valor das mais-valias auferidas, através da declaração da totalidade dos rendimentos auferidos (quer em território nacional quer fora deste), porquanto:
a) A discriminação negativa a discriminação negativa entre os sujeitos passivos residentes e os sujeitos passivos residentes noutro Estado-Membro, através da não aplicação do mencionado número 2 do artigo 43.º do CIRS na determinação do imposto devido pelas mais-valias auferidas por sujeitos passivos residentes noutro Estado-Membro consubstancia uma violação da liberdade de circulação de capitais e do princípio da não discriminação de cidadãos europeus;
b) A possibilidade conferida pelos números 14 e 15 do artigo 72.º do CIRS configura um regime igualmente discriminatório dos princípios e liberdades conferidos pelo Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia;
c) O regime da tributação dos rendimentos provenientes de mais-valias imobiliárias a uma taxa especial de 28%, sem a aplicação do disposto no número 2 do artigo 43.º do CIRS é um regime objectivamente discriminatório, discriminação objectiva esta que apenas é agravada pela imposição de um regime de tributação mais gravoso com base num critério com a residência;
III – No Acórdão Gillen rejeitou-se peremptoriamente a possibilidade de se oferecer ao sujeito passivo a opção entre dois regimes, um ilegal e um outro pretensamente legal, afastar a discriminação existente, uma vez que, perante uma vantagem legal (a consideração da mais-valia pela metade do seu valor) cujo benefício é recusado aos residentes noutro Estado-Membro, numa clara violação dos princípios e fundamentos basilares da União Europeia, a diferença de tratamento entre duas categorias de contribuinte (residentes em território português e residentes noutro Estado-Membro) é, inegavelmente, discriminatória, quando não haja uma diferença objectiva de situação susceptível de justificar as diferenças de tratamento entre ambas as categorias.
IV – A conclusão pela ilicitude da diferença de tratamento entre as duas categorias de sujeitos passivos não é, de todo, afastada pela existência da opção prevista nos números 14 e 15 do artigo 72.º do CIRS, não sendo, por qualquer forma suscetível de remover a mancha de discriminação e ilicitude que a enferma, nem excluir, ou sequer atenuar, os efeitos discriminatórios que tal opção acarreta;
V – A mera existência de uma opção que permita eventualmente tornar uma situação compatível com o direito Europeu não tem por efeito sanar, per se, o carácter ilegal de um tal sistema, como o previsto pelo normativo em apreço, que compreende um mecanismo de tributação incompatível com as normas de Direito da União Europeia, maxime TFUE, garantes da não discriminação entre cidadãos de diferentes Estados-Membros e da liberdade de circulação de capitais.
VI – Nestes termos, a possibilidade de escolha concedida entre dois regimes fiscais não neutraliza, nem sana a discriminação intrínseca do regime base geral.
VII – Pelo que, na esteira da jurisprudência maioritária que vem sendo produzida, não só dos Tribunais Europeus, mas também dos tribunais nacionais, nomeadamente pelo S.T.A, é imperioso que se conclua, de forma inequívoca, pela decisão proferida no douto Acórdão Arbitral recorrido, a qual secundamos na íntegra e aplaudimos pelo rigor e necessidade de justiça fiscal europeia.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO QUE V. EXAS. DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVERÁ O PRESENTE RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA SER JULGADO IMPROCEDENTE NOS TERMOS REQUERIDOS, SENDO, EM CONSEQUÊNCIA, NOS TERMOS E COM OS FUNDAMENTOS EXPOSTOS, CONFIRMADA A DECISÃO ARBITRAL RECORRIDA, DEVENDO O ACÓRDÃO RECORRIDO SER MANTIDO NA INTEGRA NA ORDEM JURÍDICA – O QUE ORA SE IMPETRA A V. EXAS.

Neste Supremo Tribunal Administrativo, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, notificada nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de ser de negar provimento ao recurso, no seguinte parecer:

“O presente recurso vem interposto pela Directora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA) inconformada, com a decisão final proferida no processo de pedido de pronúncia arbitral tributária que correu seus termos no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) registado sob o n.º 683/2019-T, em que foi requerida, o que faz nos termos do art.º 25.º, n.º 2 e 4, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo DL n.º 10/2011.
Nos termos do art.º 25.º n.º 3 do RJAT ao recurso é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152.º do CPTA.
São recorridos A………………. e B………………….
Segundo a recorrente é objecto do recurso, a decisão final proferida, em 12-10-2020, por Tribunal Arbitral colectivo, em matéria tributária, constituído sob a égide do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), na sequência de pedido de pronúncia arbitral apresentado ao abrigo do regime aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011 (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, RJAT) e supra identificado (Processo n.º 206/2019-T).
Nos termos do acórdão recorrido, foi decidido:
“…
b) Julgar totalmente procedente o pedido de declaração de ilegalidade e consequente anulação parcial dos actos de liquidação de IRS n.º 2018 55449821 e n.º 2018 55413801, referente ao ano de 2017, no montante de €34.028,43 (trinta e quatro mil, vinte e oito euros e quarenta e três cêntimos) e de €34.666,76 (trinta e quatro mil seiscentos e sessenta e seis euros e setenta e seis cêntimos), respectivamente;
c) Condenar a Requerida a reembolsar a cada um dos Requerentes o que eles pagaram indevidamente; …”
De acordo com o previsto no art.º 25.º n.º 2 do RJAT, “a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é … suscetível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com outra decisão arbitral ou com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo.”
No pedido de pronúncia arbitral (ppa), alegaram os recorridos que:
1. Por escritura pública, outorgada a 5 de Dezembro de 2011, em comum e partes iguais, adquiriram o prédio urbano, sito em Garcia, freguesia e concelho de São Brás de Alportel, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 7559 (atual 8520), pelo preço, de 22 000 000$ (vinte e dois milhões de escudos - €109 735,54) e em 24 de Maio de 2017, venderam o referido prédio pelo preço de €410 000,00.
2. Individualmente, na qualidade de sujeitos passivos não residentes em território nacional - à data, residiam no Reino Unido – entregaram a declaração modelo 3 de IRS, para efeitos de cálculo de mais-valia, conforme declarações modelo 3 de IRS.
3. Em 13 de Março de 2019, ambos pediram, nos termos do art.º 78º, n.º 1 da Lei Geral Tributária, a revisão da liquidação do Imposto Sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRS), referente ao período de rendimentos entre 2017-01-01 e 2017-12-31, com o fundamento de a Administração Tributária ter tomado, em consideração, para efeitos de cobrança do imposto, a totalidade das mais-valias realizadas e não apenas metade do seu valor, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art.º 43º do Código do IRS, como se lhe impunha por força do princípio europeu da não discriminação de cidadãos, de acordo com o disposto no art.º 18.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) e por força do princípio da liberdade de circulação de capitais, contido no art.º 63º do mesmo tratado.
4. A transacção efectuada pelos AA é uma alienação onerosa do direito de propriedade sobre um bem imóvel, enquadrando-se assim na al. a) do n.º 1 do art.º 10.º do CIRS, sendo que, se a mesma alienação tivesse sido efectuada nas mesmas condições por sujeitos passivos considerados residentes para efeitos da legislação tributária, esses mesmos hipotéticos sujeitos passivos residentes em território nacional teriam beneficiado de desconsideração de metade do valor apurado para efeitos de tributação de mais-valias, prevista no art.º 43.º n.º 1, al. a).
5. A ATA discriminou negativamente os sujeitos passivos não residentes em território português, mas europeu, relativamente a sujeitos passivos residentes em território português, uma vez que estes beneficiam da desconsideração, pela metade do valor da mais-valia.
6. Esta discriminação negativa de cidadãos europeus consubstancia uma violação da liberdade de circulação de capitais, consagrado no artigo 63º do TFUE e representa uma manifesta violação do princípio da não discriminação, contido no art.º 18º do TFUE, porquanto resulta da sua aplicação um tratamento fiscal desigual para os não residentes, na medida em que permite, no caso de realização de mais-valias, uma tributação mais gravosa e superior à que é suportada pelos residentes numa situação objectivamente comparável (cfr. Acordão do TJUE de 11 de Outubro de 2007, proferido no processo C- 443/06, denominado Hollman versus Fazenda Pública).

Pediram os ora recorridos A…………… e B…………….. a procedência da acção e que, em consequência, fossem anulados os actos de indeferimento tácito dos pedidos de revisão oficiosa das liquidações de IRS apresentadas.
A recorrente defende que a decisão proferida colide frontalmente com a jurisprudência firmada na Decisão arbitral proferida no processo n.º 539/2018-T, de 2019-04-22, o qual invoca como fundamento do recurso para uniformização de jurisprudência.
Como supra se referiu o Tribunal Arbitral, julgou totalmente procedente o pedido de declaração de ilegalidade e consequente anulação parcial dos actos de liquidação de IRS n.º 2018 55449821 e n.º 2018 55413801, referente ao ano de 2017, no montante de €34.028,43 e condenou a Requerida a reembolsar cada um dos Requerentes o que eles pagaram indevidamente.
Discorda, a Recorrente, da decisão do Tribunal Arbitral e bem assim da análise efectuada, submetendo-a a reapreciação deste Supremo Tribunal Administrativo e pretendendo “uniformização de jurisprudência”.
Como vem alegado pela recorrente, é certo que são requisitos de admissibilidade desta espécie de recurso, previsto no art.º 25.º n.º 2 do RJAT que se verifique a oposição de decisões arbitrais, de mérito, sendo necessário (cf. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de proferido no Proc. 0793/14) que (i) as situações de facto sejam substancialmente idênticas, (ii) haja identidade na questão fundamental de direito (iii) se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta e (iv) a oposição decorra de decisões expressas e não apenas implícitas.
Importa, então, desde já, averiguar se aqueles requisitos se verificam cumulativamente, sendo certo que a não verificação de um deles faz sufragar o pedido e torna desnecessária a averiguação de existência dos demais.
A factualidade apurada, é idêntica na decisão recorrida e na decisão fundamento, como resulta da análise atenta do ponto 2 da decisão arbitral recorrida, cujos factos provados se encontram elencados de 2.1.1. a 2.1.13. e do ponto III. A) da decisão fundamento, cujos factos provados estão elencados de 1 a 9; concluímos, assim, como a recorrente que as situações fácticas são substancialmente idênticas.
Também, como alega a recorrente entre a “decisão arbitral recorrida” e a “decisão arbitral fundamento” verifica-se contradição quanto à mesma questão fundamental de direito.
Na verdade, como defende a recorrente as soluções jurídicas encontradas são opostas, sendo que no acórdão recorrido foi decidido:
“…
b) Julgar totalmente procedente o pedido de declaração de ilegalidade e consequente anulação parcial dos actos de liquidação de IRS n.º 2018 55449821 e n.º 2018 55413801, referente ao ano de 2017, no montante de € 34.028,43 (trinta e quatro mil, vinte e oito euros e quarenta e três cêntimos) e de € 34.666,76 (trinta e quatro mil seiscentos e sessenta e seis euros e setenta e seis cêntimos), respectivamente;
c) Condenar a Requerida a reembolsar a cada um dos Requerentes o que eles pagaram indevidamente; …”
Por seu lado, no acórdão fundamento foi decidido:

a) Julgar improcedente o pedido arbitral formulado e, em consequência, manter na ordem jurídica a liquidação de IRS impugnada.

b) Julgar igualmente improcedente o pedido de pagamento de juros Indemnizatórios a favor do Requerente.”
Sendo as situações de facto substancialmente idênticas e as soluções jurídicas encontradas quanto à mesma questão fundamental de direito, opostas, torna-se imperioso analisar o mérito da questão de direito objecto do litígio tendo em vista o destino do recurso.
A questão que constitui o objecto do recurso é a de saber se a possibilidade de os “residentes” em Portugal verem a tributação incidir apenas sobre metade (50%) da mais-valia imobiliária apurada nos termos do Código do IRS, beneficiando de vantagem fiscal ao passo que os não residentes vendo incidir a tributação sobre a totalidade do respectivo montante, ainda que a taxa diferente suportam uma desvantagem.
Note-se que, o que se verifica, objectivamente, é que os cidadãos residentes, porque residentes em território português, são tributados de uma forma e os outros, os cidadãos não residentes são tributados de forma diversa, porque nele não residem.
É, pois, evidente que os contribuintes residentes e os contribuintes não residentes são tratados de forma diversa, o que é, objectivamente discriminatório e injustificável à luz da liberdade de circulação de capitais consagrada no art.º 63.º do TFUE.

E isso é assim, ainda que, como defende a recorrente, os residentes noutros Estados-Membros da União Europeia tenham a possibilidade de optar por um regime de tributação em tudo idêntico ao aplicável aos residentes em território português, nos termos do disposto nos números 14 e 15 do art.º 72º do Código do IRS (números 9 e 10 à data da alienação do imóvel pelos Recorridos). É que, a existência desta opção não afasta a invalidade do regime objectivamente discriminatório que autorizou a prática dos actos de liquidação de IRS mediatamente impugnados.
Aqui chegados é nosso entendimento que a recorrente não tem razão e que os actos de liquidação impugnados pelos aqui recorridos, por se terem fundado na interpretação de que o nº 2 do art.º 43º do Código do IRS só é aplicável aos residentes em território português, são ilegais e como tal foram anulados, ainda que se dê aos residentes noutros Estados-membros a possibilidade de serem tributados como se fossem residentes em Portugal, se for essa a sua opção.
Nesta perspectiva torna-se desnecessário discutir a questão de saber se os aqui recorridos poderiam beneficiar da redução de 50% das mais-valias, para tributação e beneficiar, também, da aplicação da taxa destinada a não residentes, de 25%, de acordo com opção de tributação pelo regime geral, conforme campo 07 do quadro 8B da Declaração de Rendimentos, mod. 3 de IRS e não pela aplicação das taxas gerais do art.º 68.º e das demais regras aplicáveis aos residentes.
Nem importa, para o caso em análise, o que vem alegado pela recorrente de que os requerentes, aqui recorridos, tenham escolhido o regime de tributação pelas taxas do art.º 72.º aplicáveis a não residentes, embora invoquem que são residentes na União Europeia. A este propósito e neste sentido, pode ver-se, o Acórdão deste STA proferido no processo n.º 075/20.6BALSB.
Aliás, como se considerou no Acórdão recorrido, a existência daquela opção não afasta a invalidade do regime objectivamente discriminatório que autorizou a prática dos actos de liquidação de IRS impugnados.
Na verdade, a tributação em sede de IRS dos rendimentos resultantes das mais-valias provenientes da alienação de direitos reais sobre imóveis situados em Portugal por não residentes neste território, mas residentes noutro Estado-Membro da União Europeia, pode dar-se por dois regimes fiscais diversos:
(i) o regime que tributa esses rendimentos a uma taxa especial de 28% e

(ii) o regime aplicável aos contribuintes residentes em território português, pelo qual os mesmos rendimentos ficam sujeitos às taxas progressivas previstas no n.º 1 do artigo 68.º do Código do IRS.

No primeiro dos regimes, as mais-valias são consideradas pelo seu montante total.
No segundo, essas mais-valias são consideradas apenas em metade do seu valor, mas levam em consideração todos os rendimentos auferidos pelos sujeitos passivos, mesmo os obtidos fora de Portugal.
A previsão deste regime facultativo faz impender sobre os não residentes em território português um ónus suplementar, comparativamente aos residentes, não sendo a opção de equiparação susceptível de excluir a discriminação em causa.
Como consta da decisão recorrida, assim se tem decidido em várias decisões arbitrais, como por exemplo as prolatadas nos processos 74/2019-T, 208/2019-T, 438/2019-T, 771/2019-T e 904/2019-T, para referir apenas os mais recentes.
É de fazer notar, aliás, a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo mencionada no Acórdão recorrido (cf. processo 0901/11.0BEALM), em que este se apoia e no qual se escreveu:
[O art. 56.º do TCE (actual 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia) proíbe todas as restrições aos movimentos de capitais, entre Estados-Membros - são proibidas todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros.
O TJUE em acórdão de 11/10/2007, proferido no processo C-443/06, declarou que: “O artigo 56.° CE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no litígio no processo principal, que sujeita as mais-valias resultantes da alienação de um bem imóvel situado num Estado-Membro, no caso vertente em Portugal, quando essa alienação é efectuada por um residente noutro Estado-Membro, a uma carga fiscal superior à que incidiria, em relação a este mesmo tipo de operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde está situado esse bem imóvel.”
(…)
Por imperativo constitucional as disposições do Tratado que rege a União Europeia prevalecem sobre as normas de direito ordinário nacional, nos termos definidos pelos órgãos de direito da União, desde que respeitem os princípios fundamentais do Estado de direito democrático. Nos termos do art. 8.º, n.º 4, da CRP “as disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático”
Tendo Portugal competência para legislar quanto ao imposto sobre o rendimento, por tal não ser matéria de competência exclusiva da UE, não pode incluir nessa regulamentação normas que, em concreto, sejam violadoras dos Tratados, na interpretação que deles faça, como fez, o Tribunal de Justiça da UE.
Contrariamente ao alegado pela recorrente, em face do que se expôs apenas pode concluir-se que o acto impugnado, que aplicou o referido art. 43.º, n.º 2 do CIRS, incompatível com o referido art.º 56.º do Tratado que instituiu a Comunidade Europeia (actual art.º 63.º do TFUE), enferma de vício de violação deste último normativo, o que consubstancia ilegalidade, que justifica a sua anulação (artº 135.º do Código de Procedimento Administrativo).
O Supremo Tribunal Administrativo tem vindo repetidamente a adoptar este entendimento que foi integralmente acolhido pela sentença recorrida que, não enferma, pois, dos vícios que lhe vinham apontados, impondo-se a sua confirmação.]
Considerando a factualidade descrita e bem assim a solução de direito adoptada no Acórdão recorrido, há que concluir, nos termos e para efeitos do n.º 2 do art.º 152.º do CPTA, que o Acórdão recorrido não padece de qualquer erro de julgamento, verificando-se, embora, a alegada oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito.
De tudo quanto ficou exposto, para além de resultar manifesta a contradição entre ambas as decisões arbitrais identificadas, resulta, como se referiu, que a decisão recorrida não padece de qualquer erro de julgamento, pois, como resulta da análise da decisão proferida no Acórdão fundamento, assume-se, neste, uma posição discriminatória injustificável e contrária à legislação da EU.
O tribunal a quo, ao proferir a decisão aqui recorrida, analisou, interpretou e aplicou correctamente as normas legais mencionadas, encontrando-se em consonância com a jurisprudência firmada, quer do STA, quer do TJUE; sendo assim, deve a decisão recorrida ser mantida.
No processo n.º 075/20.6BALSB, supra referido, em acórdão proferido em 09/12/2020, este Supremo Tribunal Administrativo decidiu uniformizar jurisprudência nos seguintes termos:
“O n.º 2 do art. 43.º do CIRS, na redacção aplicável, ao prever uma limitação da tributação a 50% das mais-valias realizadas apenas para os residentes em Portugal, e não para os não residentes, constitui uma restrição aos movimentos de capitais, incompatível com o art. 63.º do TJUE, não tendo essa discriminação negativa dos não residentes sido ultrapassada pelo regime opcional introduzido no art. 72.º do CIRS pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro, previsto, aliás, apenas para os residentes noutro Estado-membro da UE ou na EEE e não para os residentes em Países terceiros.”
Nestes termos, sendo admitido o presente recurso por se verificarem os necessários pressupostos, contradição de julgados entre duas decisões arbitrais, a decisão recorrida e a decisão fundamento relativamente a uma mesma questão fundamental de direito, sendo idêntica a questão de facto, deve porém ser-lhe negado provimento.”

*

Os autos vêm à conferência do Pleno corridos os vistos legais.


*

2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:

Na decisão arbitral recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:

2.1.1. Por escritura pública outorgada a 05.12.2001, os Requerentes, em comum e partes iguais, adquiriram a propriedade do prédio urbano sito em ..., freguesia e concelho de ..., inscrito na respectiva matriz sob o artigo ... (actual ...), descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o número ... da dita freguesia (documento n.º 1, junto com o pedido de pronúncia arbitral).

2.1.2. O valor de aquisição do Imóvel foi de 22.000.000$00 (vinte e dois milhões de escudos), correspondentes a €109.735,54 (cento e nove mil setecentos e trinta e cinco euros e cinquenta e quatro cêntimos), o que, para cada um deles, monta a €54.867,77 (cinquenta e quatro mil oitocentos e sessenta e sete euros e setenta e sete cêntimos) (documento n.º 1, junto aos autos com o pedido de pronúncia arbitral).

2.1.3. Por escritura pública outorgada a 24.05.2017, os Requerentes venderam o Imóvel pelo preço de €410.000,00 (quatrocentos e dez mil euros), o que representa um valor de realização do Imóvel, para cada um deles, de €205.000,00 (duzentos e cinco mil euros) (documento n.º 2, junto aos autos com o pedido de pronúncia arbitral).

2.1.4. À data da venda do Imóvel os Requerentes residiam no Reino Unido, em ..., ..., ... (art.º 7.º do pedido de pronúncia arbitral).

2.1.5. Os Requerentes submeteram, individualmente, na qualidade de sujeitos passivos não residentes em território português, a declaração modelo 3 de IRS, para efeitos de cálculo de mais-valias (acordo das Partes).

2.1.6. Os Requerentes declararam, no rosto da declaração, o estado civil de casados, tendo seleccionado a opção pela “não tributação conjunta dos rendimentos” e no quadro 8 B relativo à Residência Fiscal declararam a qualidade de não residentes em território português e assinalaram a opção constante do campo 07, “Tributação pelo regime geral”, não tendo assinalado “Opção pelas regras dos residentes – Artigo 17.º-A do CIRS”, nem indicado o total dos rendimentos obtidos no estrangeiro” (processo administrativo junto aos autos com a Resposta).

2.1.7. O valor final da mais-valia da Requerente mulher foi determinado em €121.530,11 (cento e vinte e um mil quinhentos e trinta euros e onze cêntimos), ao qual foi aplicada a taxa autónoma de 28% nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 72.º do Código do IRS, de que resultou, como consta da liquidação de IRS n.º 2018..., de 18.07.2018, um imposto a pagar de € 34.028,43 (trinta e quatro mil e vinte e oito euros e quarenta e três cêntimos) (cópia do pedido de revisão do acto de liquidação de IRS, junto aos autos com o pedido de pronúncia arbitral).

2.1.8. O valor final da mais-valia do Requerente marido foi determinado em €123.809,86 (cento e vinte e três mil oitocentos e nove euros e oitenta e seis cêntimos), ao qual foi igualmente aplicada a taxa autónoma de 28% nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 72.º do Código do IRS, de que resultou, como consta da liquidação de IRS n.º 2018..., de 05.07.2018, um imposto a pagar de € 34.666,76 (trinta e quatro mil seiscentos e sessenta e seis euros e setenta e seis cêntimos) (documento n.º 6, junto aos autos com o pedido de pronúncia arbitral).

2.1.9. O imposto do Requerente marido foi pago no dia 26.07.2018 e o da Requerente mulher no dia 30.07.2018. (processo administrativo junto aos autos com a Resposta).

2.1.10. No dia 13.03.2019 os Requerentes pediram, nos termos do artigo 78.º da Lei Geral Tributária, a revisão dos actos de liquidação de IRS n.º 2018..., de 18.07.2018, e n.º 2018..., de 05.07.2018, o primeiro referente à Requerente mulher e o segundo ao Requerente marido (processo administrativo junto aos autos com a Resposta).

2.1.11. Os pedidos de revisão referidos no número anterior foram expressamente indeferidos por despacho de 03.04.2019 do Senhor Director de Finanças de Faro (processo administrativo junto aos autos com a Resposta).

2.1.12. Da decisão de indeferimento referida no número anterior os Requerentes, no dia 10.05.2019, interpuseram recurso hierárquico (procedimentos números ...2019... e ...2019...) (processo administrativo junto aos autos com a Resposta).

2.1.13. Os procedimentos de recurso hierárquico referidos no número anterior foram tacitamente indeferidos (processo administrativo junto aos autos com a Resposta).




Na decisão arbitral fundamento proferida no processo nº 539/2018-T foi dada como provada a seguinte matéria factual:

1 - O Requerente era residente à data de 2017, em Madrid, Espanha, ou seja, era residente num Estado-Membro da União Europeia, como comprovou;

2 - O Requerente apresentou a sua Declaração Modelo 3 de IRS, de substituição, com o Anexo G, declarando para efeitos de mais-valias os valores de aquisição e de alienação onerosa de dois prédios urbanos, participações sociais, valor de despesas e encargos e rendimentos prediais (Doc. 6).
3 - Verifica-se pelo Rosto da Declaração Mod. 3 que no quadro 8 B foram assinalados pelo Requerente o campo 4 (não residente), o campo 6 (residência em país da União Europeia) e o campo 7 (pretende a tributação pelo regime geral aplicável aos não residentes).

4 - E verifica-se também que o Requerente não preencheu os campos 9 (opção pelas taxas do artigo 68.º do Código do IRS) e 11 (total dos rendimentos obtidos no estrangeiro).

5 - Os referidos bens alienados e rendimentos declarados foram todos auferidos todos em território português e eram os seguintes:
3.1 - Fração autónoma designada pela letra C, a que corresponde o 1.º andar D.to, destinado à habitação, do prédio urbano sito na Rua ..., n.º..., freguesia de..., concelho de Lisboa, inscrito na respetiva matriz da freguesia de ... sob o artigo ... (Doc. 4), por escritura de 15/09/2017, pelo preço de €255,000,00 (Doc. 3).
A referida fração havia sido adquirida pelo preço de €90.000,00, por escritura pública de 20/04/2015 (Doc. 2).
3.2 - Fração autónoma designada pela letra F, a que corresponde o 2.º andar Esq.º, destinado à habitação, do prédio urbano sito na Rua ..., n.º..., em ..., concelho de Lisboa, inscrito na respetiva matriz sob o artigo ... (Doc. 4), por escritura de venda de 21/03/2017, pelo preço de €155,000,00 (Doc. 5).
A referida fração havia sido adquirida pelo preço de €55.000,00, por escritura pública de 10/11/2015 (Doc. 4).
3.3 - Participações sociais vendidas 06/10/2017, pelo montante de €21.290,10, que havia adquirido em 26/08/2014, pelo preço de €19.805,40.
3.4 - Rendimentos prediais de €4.300,00 respeitantes às rendas relativas às duas frações autónomas alienadas, referidas nos pontos anteriores, sem menção de encargos ou retenções por conta.

6 - A sua declaração foi aceite e validada pela Autoridade Tributária, dando origem à liquidação n.º 2018..., com um montante de imposto a pagar de €46.551,36 (Doc. 7), posteriormente retificada por uma 2.ª liquidação com o n.º 2018..., com um valor de imposto a pagar de €47.034,56, originando um estorno do montante também a pagar, em relação à 1.ª liquidação, de €483,20 (Doc.8).

7 - O Requerente procedeu ao pagamento da quantia de €46.551,31 em 24-08-2018 e também de €483,20 na mesma data, num total de €47.034,56 (Doc.s 9 e 10).

8 - Pela demonstração da 2.ª liquidação de IRS, com o n.º 2018..., conforme certidão junta aos autos, constata-se o apuramento de um rendimento global e coletável de €167.980,58 e a coleta de €47.034,56 (à taxa de 28%).

9 - O Requerente procedeu ao pagamento da quantia de €46.551,31 e também de €483,20, num total de €47.034,56, em 24-08-2018 (Doc.s 9 e 10).


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2.2.- Motivação de Direito

No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão arbitral recorrida e a decisão arbitral fundamento se encontram em manifesta e evidente contradição, na medida em que defenderam soluções opostas quanto à interpretação e aplicação do disposto no artigo 43.º, n.º 2 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, em sede de tributação de IRS dos rendimentos resultantes de mais-valias provenientes da alienação de direitos reais sobre imóveis situados em Portugal, quando obtidos por cidadãos europeus não residentes em território nacional.
Vejamos.

2.2.1. Da admissibilidade do recurso de uniformização

O presente recurso vem interposto ao abrigo do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (“CPTA”), aplicável ex vi artigo 25.º, nºs. 2 a 4, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária — “RJAT”, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 119/2019, de 18 de Setembro, interpor recurso de uniformização de jurisprudência para o Pleno do Contencioso Tributário do STA, da decisão arbitral proferida no processo da decisão arbitral proferida no Processo n.º 683/2019-T, do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), a qual julgou procedente o Pedido de Pronúncia Arbitral apresentado pela ora Recorrente, no que respeita à tributação no âmbito de IRS a sujeitos passivos não residentes em território nacional - subsumível ao disposto no artigo 43º, nº 2 do CIRS.
Invoca a recorrente oposição entre a decisão arbitral anteriormente identificada e a decisão arbitral proferida no processo nº539/2018-T
Neste Supremo Tribunal o Ministério Público sustenta, pelas razões constantes seu Parecer supra transcrito, embora seja manifesta a contradição entre ambas as decisões arbitrais identificadas, resulta, que a decisão recorrida não padece de qualquer erro de julgamento, pois, como resulta da análise da decisão proferida no Acórdão fundamento, assume-se, neste, uma posição discriminatória injustificável e contrária à legislação da EU, tendo o tribunal a quo, na decisão aqui recorrida, analisado, interpretado e aplicado correctamente as normas legais mencionadas, encontrando-se em consonância com a jurisprudência firmada, quer do STA, quer do TJUE, pelo que deve ser mantida uniformizando-se jurisprudência nos termos já constantes do processo n.º 075/20.6BALSB, em acórdão proferido em 09/12/2020, este Supremo Tribunal Administrativo.
Importará, então e preliminarmente, perante o circunstancialismo fáctico-jurídico seleccionado aquilatar da verificação dos requisitos do recurso por oposição quanto à mesma questão fundamental de direito previsto pelo artº 25º, nº 2 do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, DL nº 10/2011, de 20/1).
Consoante o disposto no nº 2 do art. 25º do RJAT (DL nº 10/2011, de 20/1) a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo.
A este recurso é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, contando-se o prazo para o recurso a partir da notificação da decisão arbitral (cfr. o nº 3 do mesmo art. 25º).
O único requisito explicitamente referido para a admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência (152º do CPTA) é a existência de contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito.
Na ausência de qualquer expresso tratamento legislativo neste domínio serão de acatar os critérios jurisprudenciais já fixados na vigência da LPTA e do ETAF quer relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deverá existir contradição, quer quanto à verificação da oposição de julgados.
Nessa senda, os acórdãos consideram-se proferidos no domínio da mesma legislação sempre que, durante o intervalo da sua publicação, não tenha sido introduzida qualquer alteração legislativa substancial que interfira, directa ou indirectamente, na resolução da questão de direito controvertida.
No tocante à existência da oposição, impõe-se que a mesma norma jurídica tenha sido interpretada e aplicada diversamente numa idêntica situação de facto, não podendo ser considerada quando relativamente a um dos acórdãos em oposição vier a ser assinalada uma divergência sobre a factualidade apurada que puder ser determinante para a aplicação de um diferente regime jurídico.
A oposição deverá resultar de expressa resolução da questão de direito suscitada, não sendo atendível a oposição implícita dos julgados, o que acarreta que tenha havido julgamento contraditório sobre questões que tenham sido colocadas à apreciação do tribunal e sobre as quais este carecia de emitir pronúncia – cf., neste sentido, Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Dicionário de Contencioso Administrativo, Ed. Almedina, pags. 608/609, e, entre muitos outros, acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 05.05.1992, in AP. DR de 29.11.1994, pág. 426, de 18.02.1998, recurso 28637, de 26.09.2007, recurso 452/07, de 21.05.2008, recurso 460/07, de 13.11.2013, recurso 594/12, de 26.03.2014, recurso 865/13, de 07.05.2014, recurso 60/14, de 25.02.2015, recurso 964/14, e de 18.03.2015, recurso 525/14, todos in www.dgsi.pt.
Não obstante, determina o n.°3 do artigo 152.° que, "o recurso não é admitido se a orientação perfilhada na decisão impugnada estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.”
Em suma e tal como referem Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2.ª edição revista, 2007, página 883, e o Acórdão do STA-SCA, de 2012.07.05-P. 01168/1 disponível no sítio da Internet wvww.dgsi.pt, são requisitos do prosseguimento do presente recurso para uniformização de jurisprudência: (i) contradição entre um acórdão do TCA ou do STA e a decisão arbitral; (ii) trânsito em julgado do acórdão fundamento; (iii) existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito; (iv) ser a orientação perfilhada no acórdão impugnado desconforme com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA.
Acresce que quanto à caracterização da questão fundamental de direito, é exigível a identidade da questão de direito sobre a qual incidiu o acórdão em oposição, que tem pressuposta a identidade dos respectivos pressupostos de facto, oposição que terá deverá emergir de decisões expressas, e não apenas implícitas, não obstando ao reconhecimento da existência da contradição que os acórdãos sejam proferidos na vigência de diplomas legais diversos se as normas aplicadas contiverem regulamentação essencialmente idêntica. E as normas diversamente aplicadas podem ser substantivas ou processuais, podendo ser invocados mais de um acórdão fundamento, desde que as questões sobre as quais existam soluções antagónicas sejam distintas em oposição ao acórdão recorrido.
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2.2.2.- Da análise do caso concreto:

No caso sub judicibus é por demais manifesto, como expendem a recorrida e o EPGA sobre tal apreciação, que a situação factual é semelhante em ambas as decisões.
E é incontroverso que a decisão arbitral recorrida apreciou o mérito da pretensão que lhe foi apresentada.
E também o é que ambas as decisões em cotejo se pronunciaram sobre a mesma questão fundamental de direito, concretamente, a de saber se a tributação por mais-valias imobiliárias em Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), no caso dos não residentes, tal como prevista na lei em vigor nos anos de 2017, viola o princípio da livre circulação de capitais, consagrado no art. 63.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE), por se traduzir numa situação de discriminação entre residentes e não residentes, ficando estes últimos sujeitos a um tratamento fiscal desfavorável.
Na verdade e como salienta o Ministério Público no seu douto Parecer, é patente que a factualidade assente, é idêntica na decisão recorrida e na decisão fundamento, como resulta da simples análise do ponto 2 da decisão arbitral recorrida, cujos factos provados se encontram elencados de 2.1.1. a 2.1.13. e do ponto III. A) da decisão fundamento, cujos factos provados estão elencados de 1 a 9; concluímos, assim, como a recorrente, o Ministério Público e a própria recorrida, que as situações fácticas são substancialmente idênticas.
Outrossim, é manifesto que entre a decisão arbitral recorrida e a decisão arbitral fundamento ocorre contradição quanto à mesma questão fundamental de direito porquanto:
- No acórdão recorrido foi decidido: “… b) Julgar totalmente procedente o pedido de declaração de ilegalidade e consequente anulação parcial dos actos de liquidação de IRS n.º 2018 55449821 e n.º 2018 55413801, referente ao ano de 2017, no montante de € 34.028,43 (trinta e quatro mil, vinte e oito euros e quarenta e três cêntimos) e de € 34.666,76 (trinta e quatro mil seiscentos e sessenta e seis euros e setenta e seis cêntimos), respectivamente; c) Condenar a Requerida a reembolsar a cada um dos Requerentes o que eles pagaram indevidamente; …” e,
-No acórdão fundamento foi decidido: “ a) Julgar improcedente o pedido arbitral formulado e, em consequência, manter na ordem jurídica a liquidação de IRS impugnada. b) Julgar igualmente improcedente o pedido de pagamento de juros Indemnizatórios a favor do Requerente.”

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Ante o exposto, é forçoso concluir que ambas as decisões se pronunciaram sobre a mesma questão, no âmbito do mesmo quadro legislativo (as liquidações em causa respeitam ao ano de 2017, sem que as regras do CIRS aplicáveis tenham sofrido alteração), e o fizeram em sentido divergente.

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Não obstante, importa ainda deslindar se a decisão recorrida perfilha orientação que esteja de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo – a afastar a admissibilidade do recurso, nos termos do art. 152.º, n.º 3, do CPTA, aplicável ex vi do n.º 3 do art. 25.º do RJAT.
Aquilatando:
Não obstante a verificada contradição, o recurso não deve prosseguir para conhecimento do mérito, porquanto a decisão recorrida se encontra em plena sintonia com orientação mais recentemente consolidada deste STA sobre a matéria, isto em plena adesão ao discurso fundamentador vertido no Acórdão do Pleno deste STA prolatado em 20.01.2021, no Processo nº 056/20.0BALSB e cuja solução foi seguida pelos Acórdãos do Pleno daquela mesma data, nos Processos nºs 071/20.3BALSB e 0108/20.6BALSB, de 09/12/2020, Processo nº075/20.6BALSB e de 21/04/2021, Processo nº. 0114/20.0BALSB, e que foi elaborada nos seguintes termos:
“(…)
“Efectivamente, no passado dia 9 de Dezembro foram proferidos em Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal administrativo dois Acórdãos – proferidos nos processos n.º 75/20.6BALSB e n.º 64/20.0BALSB -, pelos quais se consolidou o entendimento – já antes consagrado em Acórdãos da Secção -, segundo o qual o n.º 2 do art. 43.º do CIRS, na redacção aplicável, ao prever uma limitação da tributação a 50% das mais-valias realizadas apenas para os residentes em Portugal, e não para os não residentes, constitui uma restrição aos movimentos de capitais, incompatível com o art. 63.º do TJUE, não tendo essa discriminação negativa dos não residentes sido ultrapassada pelo regime opcional introduzido no art. 72.º do CIRS pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro, ou, na outra versão, Quanto a mais-valias imobiliárias obtidas por não residente em território português e residente noutro Estado membro da União Europeia, que declarou pretender a tributação pelo regime geral sem opção de acordo com o regime previsto no art. 72.º do Código do IRS, na redação vigente em 2017 e 2018, não é de excluir a aplicação do previsto no artigo 43.º, n.º 2, do mesmo Código quanto a ser considerado 50% do respetivo saldo
II - O entendimento contrário é discriminatório, nos termos do artigo 65.º n.º 3, por referência ao n.º1, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e não pode ser aplicado pois violaria o princípio do primado com assento no artigo 8.º n.º 4 da Constituição da República Portuguesa.
Estando a decisão recorrida em plena sintonia harmonia com esta jurisprudência do STA, que entretanto se consolidou, e tendo o recurso sido admitido, não há que conhecer do respectivo mérito, porquanto dispõe o n.º 3 do artigo 152.º do CPTA, aplicável ex vi do disposto no n.º 3 do artigo 25.º do RJAT, que o recurso não é admitido se a orientação perfilhada no acórdão impugnado estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, o que se verifica in casu.”
Nessa conformidade, foi uniformizada jurisprudência no seguinte sentido:
«o n.º 2 do art. 43.º do CIRS, na redacção aplicável, ao prever uma limitação da tributação a 50% das mais-valias realizadas apenas para os residentes em Portugal, e não para os não residentes, constitui uma restrição aos movimentos de capitais, incompatível com o art. 63.º do TJUE, não tendo essa discriminação negativa dos não residentes sido ultrapassada pelo regime opcional introduzido no art. 72.º do CIRS pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro, previsto, aliás, apenas para os residentes noutro Estado-membro da UE ou na EEE e não para os residentes em Países terceiros.»
Destarte, a decisão recorrida está em conformidade com aquela que é a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, de acordo com os critérios que têm vindo a ser definidos nos referidos arestos, de que se destaca o acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 12 de Dezembro de 2012, tirado no processo n.º 0932/12, no qual se proclamou que «a jurisprudência consolidada deve transparecer ou do facto de a pronúncia respectiva constar de acórdão do Pleno assumido pela generalidade dos Conselheiros em exercício na Secção (consoante prevê o art. 17º, nº 2, do actual ETAF) ou do facto de existir uma sequência ininterrupta de várias decisões no mesmo sentido, obtidas por unanimidade em todas as formações da Secção».
E, como veio de demonstrar-se, já resultando reunida a dita sequência inquebrantável, não se encontra preenchido o requisito de admissão do recurso previsto no n.º 3 do artigo 152.º do CPTA, o que determina que dele não se conheça.

*
3.- Decisão:

Em face do exposto, os juízes do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam em não tomar conhecimento do mérito do recurso.

Custas pela Recorrente.

Comunique-se ao CAAD.
*

Assinado digitalmente pelo relator (José Gomes Correia), que consigna e atesta que, nos termos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente acórdão os restantes Conselheiros que integram a formação de julgamento.
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Lisboa, 30 de Junho de 2021

José Gomes Correia (Relator) - Isabel Cristina Mota Marques da Silva - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Paulo José Rodrigues Antunes - Gustavo André Simões Lopes Courinha - Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro - Pedro Nuno Pinto Vergueiro – Anabela Ferreira Alves e Russo.