Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01535/20.4BEPRT |
Data do Acordão: | 07/11/2024 |
Tribunal: | 1 SECÇÃO |
Relator: | TERESA DE SOUSA |
Descritores: | APRECIAÇÃO PRELIMINAR FUNCIONÁRIO POLÍCIA JUDICIÁRIA DEFICIENTE DAS FORÇAS ARMADAS |
Sumário: | Não é de admitir revista de acórdão do TCA que teve em conta os diplomas legais aplicáveis ao caso, dos quais não resulta que o Recorrido tivesse direito a beneficiar do regime de GDFA, e, teve também em conta o princípio constitucional da legalidade. |
Nº Convencional: | JSTA000P32549 |
Nº do Documento: | SA12024071101535/20 |
Recorrente: | AA |
Recorrido 1: | MINISTÉRIO DA JUSTIÇA/DIRECÇÃO GERAL DE REINSERÇÃO E SERVIÇOS PRISIONAIS |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Formação de Apreciação Preliminar Acordam no Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório AA vem interpor recurso de revista, nos termos do art. 150º do CPTA, do acórdão proferido pelo TCA Norte em 15.03.2024, no qual se decidiu conceder provimento ao recurso interposto pelo Réu Ministério da Justiça da sentença proferida pelo TAF do Porto que julgou procedente a acção administrativa que intentou impugnando o despacho proferido em 27.07.2020, que lhe indeferiu a qualificação como Grande Deficiente das Forças Armadas. O Recorrente interpõe o presente recurso de revista invocando a relevância jurídica e social da questão, mostrando-se necessária uma melhor aplicação do direito. Em contra-alegações o Ministério da Justiça alega que a revista não deve ser admitida ou deve improceder. 2. Os Factos Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete. 3. O Direito O art. 150º, nº 1 do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”. Como resulta do próprio texto legal, e a jurisprudência deste STA tem repetidamente sublinhado, trata-se de um recurso excepcional, como, aliás, o legislador sublinhou na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando o preceito como uma “válvula de segurança do sistema”, que só deve ter lugar, naqueles precisos termos. O Autor foi funcionário da Polícia Judiciária (PJ), com a categoria de especialista auxiliar da carreira do grupo de apoio à investigação criminal, tendo sofrido um acidente em serviço em 22.02.2003, ficando com uma desvalorização que por Junta Médica da CGA, de 10.09.2019, se veio a consolidar em 67,2%, tendo-se, entretanto aposentado em 06.11.2012. Pretende com a presente acção a anulação do despacho da Ministra da Justiça, de 22.07.2020 que, após parecer do Conselho Consultivo da PGR, indeferiu o seu requerimento de 06.03.2020, no qual requereu que lhe fosse reconhecido o estatuto de “Grande Deficiente das Forças Armadas” (GDFA), nos termos previsto no DL nº 314/90, de 13/10, em conjugação com o regime orgânico da Polícia Judiciária, e a condenação da Entidade Demandada a qualificar o Autor como GDFA. O TAF do Porto proferiu sentença julgando a acção procedente. O acórdão recorrido, conhecendo da apelação do Réu, concedeu provimento ao recurso, revogou a sentença recorrida e julgou a acção improcedente. Para tanto, teve em conta, além de outros, o DL nº 138/2019, de 13/09, que estabelece actualmente o Estatuto Profissional do Pessoal da Polícia Judiciária, o DL nº 314/90, de 13/10 que instituiu a qualificação como GDFA e o DL nº 43/76, de 20/1 que estabelece regras aplicáveis aos Deficientes das Forças Armadas. Considerou o acórdão, em síntese, que, “Verifica-se, assim, que nesta matéria há dois diplomas legais com regimes distintos, sendo que um estabelece o estatuto de DFA – DL 43/76, de 20de janeiro – e o outro estabelece o estatuto dos GDFA – DL 314/90, de 13 de outubro. É indiscutível que, quer o atual estatuto quer os anteriores estatutos do pessoal da PJ, previam apenas e tão só a equiparação daquele pessoal ao regime de DFA e não ao regime de GDFA. Ora, como se referiu, no parecer do Conselho Consultivo da PGR, de 9 de julho de 2020, emitido no âmbito do caso, “A aplicação do Decreto-Lei n.º 314/90, de 13 de outubro, envolvendo a equiparação aos «Grandes Deficientes das Forças Armadas», e cuja aplicação tem justamente como pressuposto não se encontrar o requerente em condições de ser qualificado como Deficiente das Forças Armadas, segundo o Decreto-Lei n.º 43/76, de 20 de janeiro, exorbitaria largamente a equiparação prevista, primeiro no artigo 105.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de setembro, depois do artigo 89.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 275-A/90, de 9 de novembro, e, por fim, em termos mais estritos, no artigo 17.º, n.º 1, do Estatuto Profissional do Pessoal da Polícia Judiciária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 138/2019, de 13 de setembro”. (…) “Em todo o caso, o Regime dos Grandes Deficientes das Forças Armadas não é nem nunca foi aplicável aos trabalhadores da Polícia Judiciária, por direito próprio ou por equiparação”. O bloco integral do regime especialíssimo e excecional do GDFA aplica-se estritamente aos militares das Forças Armadas e esse regime não prevê a sua extensão ou equiparação a quaisquer outros trabalhadores, nem existe diploma legal que determine a extensão ou preveja a equiparação de determinados trabalhadores/cidadãos, neste caso, dos trabalhadores da PJ, ao estatuto dos GDFA. Além do mais, considerar-se o Recorrido abrangido pelo regime dos GDFA, como fez a sentença recorrida, correríamos o risco de ter de vir a considerar, de futuro, que um trabalhador da PJ vítima de um regular e normal acidente em serviço, como ocorreu no presente caso, lhe fosse aplicado o regime especial dos GDFA, por mera decorrência do artigo 17.º do DL 138/2019, de 13 de setembro, o que, não tendo apoio legal, não se mostra defensável.”. Fazendo, ainda, apelo ao princípio da legalidade, previsto no art. 266º, nº 2 da CRP e ao art. 3º do CPA, para concluir que “outra não poderia ter sido a decisão do Recorrente que não a do indeferimento do pedido do aqui Recorrido por inexistência de base legal para o efeito”. Na revista o Recorrente alega que o acórdão recorrido violou o disposto no nº 1 do art. 1º do DL nº 314/90, de 13/10, no nº 1 do art. 17º do DL nº 138/2019, de 13/9 e no art. 13º da CRP Diremos, desde já, que não há fundamento para a admissão da revista. Com efeito, o acórdão recorrido teve em conta os diplomas legais aplicáveis ao caso, dos quais não resulta que o Recorrido tivesse direito a beneficiar do regime de GDFA, e, teve também em conta o princípio constitucional da legalidade, sendo certo que para o caso dos autos não pode relevar eventuais situações de outras forças policiais às quais tenha sido concedido o estatuto aqui pretendido, até porque o princípio da igualdade (apenas invocado na presente sede) não pode ser chamado à colação em, eventuais, circunstâncias de ilegalidade de decisões tomadas e que no caso se desconhecem. Ora, tudo indica que o acórdão recorrido decidiu correctamente, tendo interpretado e aplicado os diplomas e respectivos preceitos aqui em causa adequadamente, estando o dito acórdão fundamentado de forma consistente e plausível, não se vislumbrando a necessidade da revista para uma melhor aplicação do direito. Acresce que não se vê que a questão que se pretende ver reapreciada em revista tenha especial relevância jurídica ou social, já que o que está em causa é o interesse do próprio Recorrente, não extravasando do seu caso concreto e do entendimento que sobre ele pretendeu discutir na acção. Assim, não se justifica admitir a revista, tudo apontando para a necessária prevalência da regra de excepcionalidade da revista. 4. Decisão Pelo exposto, acordam em não admitir a revista. Sem custas. Lisboa, 11 de Julho de 2024. – Teresa de Sousa (relatora) – José Veloso – Fonseca da Paz. |