Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0659/20.2BEBRG |
Data do Acordão: | 07/11/2024 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | GUSTAVO LOPES COURINHA |
Descritores: | INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA QUESTÃO DE FACTO |
Sumário: | I - Das decisões dos Tribunais Tributários de 1.ª Instância cabe recurso a interpor, em primeira linha, para os Tribunais Centrais Administrativos, salvo quando respeitem a matéria exclusivamente de Direito, caso em que tal recurso tem de ser interposto para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo. II - A violação desta regra de competência, em razão da hierarquia, determina a incompetência absoluta do tribunal ao qual é, indevidamente, dirigido o recurso. III - Existe discordância com a fundamentação de facto da decisão recorrida por erro, insuficiência ou excesso, no caso de existirem divergência quanto às ilações de facto extraídas dos factos provados e não provados. |
Nº Convencional: | JSTA000P32515 |
Nº do Documento: | SA2202407110659/20 |
Recorrente: | AA |
Recorrido 1: | AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – RELATÓRIO I.1 - Alegações AA, com os demais sinais nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que julgou improcedente a presente impugnação por ela apresentada visando o despacho de indeferimento da reclamação graciosa de liquidação de IRS e respectivos juros compensatórios, referente ao ano de 2018 no valor global de € 49.102,33. Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões a fls. 523 a 545 do SITAF: 1) A Impugnante, aqui Recorrente, não se conforma com a decisão ora recorrida, que julgou declarou a total improcedência da Impugnação Judicial deduzida, quanto à liquidação de IRS em dissídio; 2) E fê-lo assente em duas ordens de razão, entendendo que: I –os “montantes pagos para levantamento dos ónus existentes sobre os prédios (hipotecas e penhoras), no montante de € 302.071,14” não “constituem despesas necessárias e inerentes à alienação, para efeitos do disposto na alínea a), do art.º 51.º, do CIRS”; e II – que não logrou a Impugnante “demonstrar erro notório no cálculo da mais-valia” 3) Não podendo a Impugnante conformar-se com essa decisão; Vejamos, 4) A Impugnante notificada da Liquidação de IRS, referente ao ano de 2018, reagiu perante a mesma apresentando Reclamação Graciosa; 5) Tal contencioso veio a ser indeferido o que levou a Impugnante a apresentar a presente Impugnação Judicial; - Pois que, não se conforma a Impugnante com a tributação de rendimentos não recebidos, que foram afectos a terceiros para libertação de ónus e encargos dos imóveis vendidos, no montante total de 302.091,13 €, conforme aliás decorre da factualidade dada como provada pelo Insigne Tribunal a quo – cfr. Factos Provados n.º 4), 5), 6), 7), 8), 9), 10), 11) e 12); - Sem o expurgo de tais ónus ou encargos a venda não teria sido possível – cfr. Factos Provados n.º 28); - Pelo que, entende a Recorrente que tais valores, que serviram para pagar a terceiros as suas hipotecas e penhoras que impendiam sobre os imóveis vendidos, têm ser deduzidos no preço, devendo apenas ser tributado o valor efectivamente por si recebido, que contas feitas, se fixa não em 450.000,00 €, mas sim em quantia que não excede os 150.000,00 €, isto sem considerar as demais despesas deduzidas, relacionadas com o acto de venda propriamente dito; Sem prescindir, Por cautela do patrocínio, 6) Outro entendimento diverso do acima patenteado, significa inevitavelmente tributar rendimento não efectivamente recebido, o que naturalmente contraria as mais básicas regras e princípios fiscais; 7) Tais como, o princípio da legalidade tributária, da igualdade, capacidade tributária, da justiça fiscal, da tributação do rendimento real, entre outros… Assim, 8) Em face do exposto, deveria o Tribunal de Instância Inferior ter declarado a Impugnação Judicial totalmente procedente, anulando a liquidação em referência, o que agora se requer; 9) Assim, apodíctico é que a douta sentença recorrida, violou, entre outros, o disposto nos artigos 103.º e 104.º da CRP; 8.º, 9.º e 16.º da LGT; 10.º e 51.º do CIRS; artigo 11.º da Lei 82-E/2014, de 31.12; I.2 - Contra-alegações Não foram proferidas contra alegações no âmbito da instância. I.3 - Parecer do Ministério Público Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, veio o Ministério Público emitir parecer com o seguinte conteúdo: “AA vem interpor recurso da sentença da Mmª Juiz do TAF de Penafiel, que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais, a qual julgou improcedente a impugnação judicial, por si deduzida, relativa ao despacho de indeferimento da reclamação graciosa de liquidação de IRS e respectivos juros compensatórios, referente ao ano de 2018. É jurisprudência pacífica que o âmbito do recurso é definido pelas conclusões extraídas pela recorrente das respectivas alegações. Alega, em resumo, que o julgador incorreu em erro de julgamento por que “faz uma incorrecta aplicação do direito aos factos, bem como uma errónea apreciação dos factos e da prova realizada e carreada para os Autos,” ao não considerar que a liquidação sindicada enferma de erro no cálculo das mais-valias por ter desconsiderado os montantes pagos para o levantamento dos ónus existentes sobre os prédios (hipotecas e penhoras) e que constituem despesas necessárias e inerentes à alienação, para efeitos do disposto na alínea a) do art. 51º do CIRS. Mais refere que a decisão “violou, entre outros, o disposto nos artigos 103.º e 104.º da CRP; 8.º, 9.º e 16.º da LGT; 10.º e 51.º do CIRS; artigo 11.º da Lei 82-E/2014, de 31.12”, menciona nas alegações e em sede conclusiva, que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais. QUESTÃO PRÉVIA Nos termos do artigo 280º, nº3, do CPPT, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 74-B/2023 de 28 de Agosto: 3 - Os recursos interpostos das decisões de mérito proferidas por tribunais tributários são da competência do Supremo Tribunal Administrativo quando cumulativamente: a) As partes aleguem apenas questões de direito; b) O valor da causa seja superior à alçada dos tribunais centrais administrativos; c) O valor da sucumbência seja superior a metade da alçada do tribunal de que se recorre. O artigo 26º alínea b) do ETAF, na redacção dada pelo DL supra mencionado, atribui competência à Secção do Contencioso Tributário do STA para conhecer dos recursos interpostos de decisões de mérito dos tribunais tributários, com exclusivo fundamento em matéria de direito, sempre que o valor da causa seja superior à alçada dos tribunais centrais administrativos e o valor da sucumbência seja superior a metade da alçada do tribunal de que se recorre. A violação desta regra de competência em razão da hierarquia determina, por provisão explícita do artigo 6º nº1 do CPPT, determina a incompetência absoluta do Tribunal, ao qual é, indevidamente dirigido o recurso, v. Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), artigo 26º alínea b) e 38º alínea a). O recurso não versa exclusivamente matéria de direito, se nas suas conclusões se questionar matéria factual, manifestando-se divergência, por insuficiência, excesso ou erro, quanto à factualidade provada na decisão recorrida, Quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, Quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, Quer, ainda, porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar da mesma factualidade provada (cf. Acórdãos do S.T.A.-2ª. Secção de 29/9/2010, rec.446/10; T.C.AS, 8/5/2012, proc.3180/09, consultáveis em www.dgsi.pt). Existe matéria de facto, quando o apuramento das realidades se faz todo à margem da aplicação directa da lei, isto é, quando se trata de averiguar factualidade cuja existência, ou não existência, não depende da interpretação a dar a nenhuma norma jurídica. Voltando aos autos: Estando em causa um recurso que versa sobre matéria de direito, tal pressupõe que se considere assente e fixada a base factual da sentença, não sendo admissíveis valorações probatórias. O que não se verifica, na situação em apreço. A Recorrente, nas conclusões, manifesta discordância com o decidido, no que respeita aos juízos de apreciação da prova, efectuados pelo Tribunal a quo, assumindo uma clara divergência nas ilações de facto retiradas do probatório, por não terem sido devidamente considerados os montantes suportados para o levantamento dos ónus existentes sobre os prédios. Isto porque, conforme transcrevemos das conclusões: “… não se conforma a Impugnante com a tributação de rendimentos não recebidos, que foram afectos a terceiros para libertação de ónus e encargos dos imóveis vendidos, no montante total de 302.091,13 €, conforme aliás decorre da factualidade dada como provada pelo Insigne Tribunal a quo – cfr. Factos Provados n.º 4), 5), 6), 7), 8), 9), 10), 11) e 12); Sem o expurgo de tais ónus ou encargos a venda não teria sido possível – cfr. Factos Provados n.º 28); Pelo que, entende a Recorrente que tais valores, que serviram para pagar a terceiros as suas hipotecas e penhoras que impendiam sobre os imóveis vendidos, têm de ser deduzidos no preço, devendo apenas ser tributado o valor efectivamente por si recebido, que contas feitas, se fixa não em 450.000,00 €, mas sim em quantia que não excede os 150.000,00 €, isto sem considerar as demais despesas deduzidas, relacionadas com o acto de venda propriamente dito.” Ao invés da decisão, em que, com base na factualidade assente a Mmª Juiz concluiu que, citamos: “No ano de 2018, a Impugnante vendeu os referidos imóveis pelo preço global de € 450.000,00 [cfr. ponto 3) da factualidade julgada como provada]. À data em que foi celebrada a escritura de compra e venda, sobre o prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo ...68, melhor identificado supra, encontravam-se inscritas uma hipoteca voluntária a favor do Banco 1... S.A. e uma hipoteca legal e uma penhora a favor do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. [cfr. ponto 7) da factualidade julgada como provada]. Por seu turno, sobre o prédio inscrito na matriz sob o artigo ...61, encontravam-se inscritas uma hipoteca voluntária a favor de A..., S.A., uma hipoteca voluntária a favor da Banco 2... e uma hipoteca legal e penhora a favor do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. [cfr. ponto 8) da factualidade julgada como provada]. Para o cancelamento das hipotecas e penhoras que incidiam sobre os prédios, foi pago à Banco 2... o montante de € 233.000,00 e ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social o valor de € 63.305,01, através de cheques entregues pelo comprador dos imóveis como forma de pagamento do preço [cfr. pontos 5) e 7) da factualidade julgada como provada]. À B..., S.A. foi paga a quantia de € 5.766,13 com vista ao cancelamento do registo da hipoteca constituída a favor daquela sobre o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ...68 [ponto 10) da factualidade julgada como provada]. Embora o averbamento do cancelamento das hipotecas e penhoras tenha ocorrido em data posterior à celebração a escritura de compra e venda, à data de celebração desta, já havia sido autorizado o cancelamento das hipotecas e penhoras incidentes sobre os prédios [cfr. pontos 9), 11) e 12) da factualidade provada].” A questão que se coloca nos presentes autos, como a identificou o julgador,” traduz-se em saber se os montantes pagos para levantamento dos ónus existentes sobre os prédios (hipotecas e penhoras), no montante global de € 302.071,14, constituem despesas necessárias e inerentes à alienação, para efeitos do disposto na alínea a), do art.º 51.º, do CIRS.” Não pondo em causa o constante do probatório, a recorrente dá enfoque a determinada factualidade aí mencionada, que em seu entender, levaria a uma conclusão diferente da que teve o Tribunal, ao considerar que apenas deve “ser tributado o valor efectivamente por si recebido, que contas feitas, se fixa não em 450.000,00 €, mas sim em quantia que não excede os 150.000,00 €.” Ou seja, questões cuja solução passa pela análise da factologia fornecida pelos autos, já que invoca argumentos cuja compreensão requer uma atenta apreciação dos factos que estão na base do litígio, no que concerne á natureza dessas importâncias pagas. Manifestando uma estrutural divergência com as ilações deles retirada, em que o TAF de Penafiel fundou a sua decisão, o que pressupõe que o Tribunal ad quem, em sede de recurso, se terá de pronunciar sobre tal. Donde que, em atenção ao que se deixou dito, a solução da divergência não será resultado de uma actividade de interpretação e aplicação de normas jurídicas, dado que, se torna necessário fazer um juízo sobre questões probatórias. É jurisprudência consolidada do STA, que “não pode conhecer-se do mérito do recurso se o recorrente erigiu como objecto do recurso uma questão que não é de direito, mas antes respeita ao julgamento da matéria de facto” (Cfr. entre outros, o acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA de 30.06.2021- P.0240/12.0BEFUN). Verifica-se assim a incompetência do Supremo Tribunal Administrativo, em razão da hierarquia, para dele conhecer (v. neste sentido, os Acs, do STA nos processo nº 01459/13, 324/15.2BEPRT e 02021/19.0BEPRT, respectivamente, de 2/7/2014, 13/7/2022 e 21/9/2022, in www.dgsi.pt.). Pertencendo antes ao Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), a competência para o seu conhecimento, por força do artigo 38º alínea b), do E.T.A.F., a quem o processo deve ser remetido.” I.4 – Notificadas as partes do teor do Parecer do Ministério Publico, nada vieram dizer sobre o mesmo. I.5 - Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. II - FUNDAMENTAÇÃO II.1 - De facto A sentença efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos: 1) Por escritura pública de doação, celebrada em 29-09-2010, BB declarou doar, com reserva de usufruto, a AA, que declarou aceitar, os seguintes imóveis: A. um prédio urbano, sito no lugar ..., composto por casa de habitação de ... e ... andar, logradouro, com todas as suas pertenças, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...75, inscrito na matriz sob o artigo ...54, com o valor patrimonial tributável de € 41.102,83 e atribuído de € 20.950,00; B. um prédio rústico, sito no Lugar ... ou ..., freguesia ..., Concelho ..., denominado por “Campo ...”, terra de cultura e videiras de enforcado, descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o n.º ...64, e inscrito na respetiva matriz sob o artigo ...68, com o valor patrimonial tributável de € 17,74 e atribuído de € 50,00 – cfr. documento de fls. 14 a 16 do processo administrativo; 2) Em 09-02-2011, foi celebrada escritura pública de doação na qual AA declarou aceitar de BB, a doação, com reserva de usufruto, de um prédio urbano sito no Lugar ..., freguesia ..., Concelho ..., correspondente a edifício de ..., sobre piso, logradouro, com todas as suas pertenças, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...56, e inscrito na respetiva matriz sob o artigo ...61, com o valor patrimonial tributável de € 218.512,44 e atribuído de € 110.000,00 – cfr. documento de fls. 16 (verso) a 18 do processo administrativo; 3) Por escritura pública celebrada em 19-03-2012, BB, renunciou ao usufruto de que era titular incidente sobre os imóveis referidos em 1) e 2) - cfr. documento de fls. 18 (verso) a 20 (verso) do processo administrativo; 4) Em 27-03-2018, entre AA e os representantes da sociedade C..., S.A., foi celebrada escritura de compra e venda, na qual a primeira declarou vender e os segundos declararam aceitar, um prédio rústico, denominado "Campo ...", sito no Lugar ... ou ..., na freguesia ..., Concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ...64, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...68, pelo preço de € 100.000,00, e um prédio urbano, sito no Lugar ..., na freguesia ..., Concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ...56, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...61, pelo montante de € 350.000,00 - cfr. documento de fls. 21 a 24 do processo administrativo; 5) Na escritura de compra e venda mencionada na alínea anterior, consta que AA declarou ter já recebido o preço de € 450.000,00 que foi pago pela sociedade C..., S.A. da seguinte forma: «(…) --- O valor de vinte e cinco mil euros, pagos no dia dezanove do corrente mês, a título de sinal aquando da celebração do contrato promessa, por cheque com o número ...15, sacado sobre o Banco 3... --- O valor de sessenta e três mil trezentos e cinco euros, e um cêntimo, pagos na presente data ao INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P., para expurgo das inscrições hipotecárias, por um cheque com o número ...16, emitido pelo Banco 4... S.A.. --- O remanescente no valor de trezentos e sessenta e um mil seiscentos e noventa e quatro euros e noventa e nove cêntimos, pagos na presente data por dois cheques com os números ...32 e ...08, emitido pelo Banco 4... S.A.. (…)» - cfr. fls. 21 a 24 do processo administrativo; 6) O cheque com o n.º ...08, foi emitido pelo Banco 4... S.A., no valor de € 233.000,00, constando como beneficiária a Banco 2... e o cheque n.º ...16, no valor de € 63.305,01, foi emitido em nome do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. – cfr. fls. 21 a 24 e 31 do processo administrativo e documentos de fls. 459 do SITAF; 7) À data da celebração da escritura mencionada em 4), sobre o prédio rústico, sito no Lugar ... ou ..., freguesia ..., Concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o n.º ...64, e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...68, encontravam-se inscritas: i) Uma hipoteca voluntária a favor do Banco 1... S.A., conforme inscrição da ap. nove, de 21-04-2003, e posteriormente titulada pela B..., S.A., face à cessão de crédito, registada em 14-01-2011, pela ap. quatro mil seiscentos e trinta e dois; ii) Uma hipoteca legal a favor do Instituto De Gestão Financeira Da Segurança Social, I.P., conforme inscrição da ap. três mil cento e seis, de 10-08-2010; iii) Uma penhora a favor do Instituto De Gestão Financeira Da Segurança Social, I.P., conforme inscrição da ap. três mil cento e sete, de 10-08-2010 – cfr. documento de fls. 84 a 86 (verso) do processo administrativo; 8) À data da escritura mencionada em 4), sobre o prédio urbano sito no Lugar ..., freguesia ..., Concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o n.º ...56, e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...61, encontravam-se inscritas: i) Uma hipoteca voluntária a favor da Banco 2..., conforme inscrição da ap. dezassete, de 07-08-2000 e posteriormente titulada por D..., S.A., face à transmissão de crédito, registada em 12-01-2009, pela ap. setecentos e sessenta; ii) Uma hipoteca voluntária a favor da Banco 2..., conforme inscrição da ap. mil seiscentos e sessenta e seis, de 13-05-2009; iii) Uma hipoteca legal a favor do Instituto De Gestão Financeira Da Segurança Social, I.P., conforme inscrição da ap. três mil duzentos e quatro, de 10- 08-2010; iv) Uma penhora a favor do Instituto De Gestão Financeira Da Segurança Social, I.P. conforme inscrição da ap. três mil duzentos e cinco, de 10-08-2010 - cfr. documento de fls. 87 a 90 do processo administrativo; 9) Na escritura pública de compra e venda mencionada em 4), as partes declararam: a) no que respeita à hipoteca voluntária identificada na alínea i), do ponto 7) da factualidade julgada como provada, que o «cancelamento foi autorizado por declaração emitida em ../../2017»; b) quanto à hipoteca legal e penhora identificadas nas alíneas ii) e iii), do ponto 7) da factualidade julgada como provada, que os «cancelamentos foram autorizados por certidão emitida em ../../2018»; c) relativamente à hipoteca voluntária identificada na alínea ii), do ponto 8) da factualidade julgada como provada, que o «cancelamento foi autorizado por declaração emitida em ../../2018»; d) quanto à hipoteca legal e à penhora identificadas nas alíneas iii) e iv), do ponto 8) da factualidade julgada como provada, que o «cancelamento foi autorizado por certidão emitida em ../../2018» - cfr. fls. 21 a 24 do processo administrativo; 10) À B..., S.A. foi entregue, por BB, em 20-03-2018, a quantia de € 5.766,13 com vista ao cancelamento da hipoteca mencionada na alínea i), do ponto 7) da factualidade julgada como provada - cfr. documento de fls. 45 do processo administrativo (fls. 114 e seguintes do SITAF) e depoimento da testemunha BB; 11) Em 04-04-2018, pelas ap. 2411, 2412 e 2413, foi averbado o cancelamento das hipotecas e da penhora mencionadas em 7) – cfr. fls. 84 a 86 (verso) do processo administrativo; 12) Pelas aps. 2414, 2415 e 2416 de 04-04-2018 e pela ap. 769 de 06-04-2018, foi averbado o cancelamento das hipotecas e da penhora mencionadas em 8) – cfr. fls. 87 a 90 do processo administrativo; 13) Em 28-06-2019, AA apresentou, junto da Autoridade Tributária e Aduaneira, Declaração Modelo 3 de IRS, n.º ...-...-35, respeitante ao ano de 2018 – cfr. documento de págs. 5 a 12 de fls. 268 do SITAF; 14) Em 05-07-2019, AA apresentou Declaração Modelo 3 de IRS, n.º ....-...-53, respeitante ao ano de 2018, tendo declarado, no anexo G, o seguinte: «(…) [IMAGEM] 15) Na sequência da declaração mencionada na alínea antecedente, foi emitida, em ../../2019, em nome de AA, a liquidação de IRS n.º ...91, com o valor a pagar de € 17.945,77 – cfr. documento de fls. 34 do processo administrativo; 16) Em 08-10-2019, foi instaurado em nome de AA o processo de execução fiscal n.º ...89, para cobrança coerciva da quantia de € 17.945,77, referente à liquidação n.º ...91, acrescida de juros de mora e custas – cfr. fls. 2 do processo administrativo; 17) AA foi notificada, por carta registada com aviso de receção, que «[a] declaração de rendimentos relativa ao ano de 2018, com a identificação ...3, foi selecionada para análise por ter(em) sido detetada(s) a(s) seguinte(s) situação(ões): Residência do titular diferente do imóvel objecto do reinvestimento e/ou comprovação dos valores de empréstimos ou de valores de reinvestimento declarados» e para, no prazo de 15 dias, prestar os devidos esclarecimentos – cfr. fls. 34 (verso) do processo administrativo; 18) Em 26-10-2019, AA apresentou Declaração Modelo 3 de IRS, n.º ...-...-94, respeitante ao ano de 2018, sem opção pela tributação conjunta de rendimentos, tendo declarado, no anexo A, o montante de € 14.039,33, a título de rendimentos do trabalho dependente, o montante de € 2.005,00, de retenções na fonte e o valor de € 2.046,32, a título de contribuições e, no anexo G, o seguinte: «(…) [IMAGEM] 19) Na sequência da declaração mencionada na alínea antecedente foi emitida, em nome de AA, a liquidação de IRS n.º ...99, de 31- 10-2019, com um valor a pagar de € 49.102,33 – cfr. fls. 35 do processo administrativo; 20) Em 06-11-2019, foi emitida a demonstração de acerto de contas n.º ...86, tendo por referência a liquidação n.º ...99, bem como a liquidação de juros compensatórios n.º ...00 e o respetivo estorno da liquidação n.º ...91, resultando um total de imposto a pagar no valor de € 31.156,56 - cfr. pág. 41 de fls. 268 do SITAF; 21) A mais-valia respeitante à venda do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo ...61, foi calculada pela Administração Tributária da seguinte forma: [IMAGEM] - cfr. documentos de págs. 1 e 2 de fls. 408 do SITAF; 22) E a mais-valia respeitante à venda do prédio rústico inscrito na matriz predial sob o artigo ...68 foi assim calculada pela Administração Tributária: [IMAGEM] 23) Em 17-12-2019, AA apresentou junto da Autoridade Tributária e Aduaneira, ...-....-10, respeitante ao ano de 2018, tendo declarado, no anexo G, o valor de € 450.000,00 respeitante ao valor de realização dos imóveis identificados em 4), o montante de € 214.616,56 como valor de aquisição e a quantia de € 303.545,94 a título de despesas e encargos – cfr. documento de págs. 29 a 36 de fls. 268 do SITAF; 24) A declaração mencionada na alínea antecedente encontra-se em estado «Declaração Não Liquidável» – cfr. pág. 37 de fls. 268 do SITAF; 25) Em 08-01-2020, foi instaurado em nome de AA o processo de execução fiscal n.º ...15, para cobrança coerciva da quantia de € 31.156,56, mencionada em 20), acrescida de juros de mora e custas – cfr. fls. 2 do processo administrativo; 26) Em 09-01-2020, AA apresentou reclamação graciosa da liquidação mencionada em 19) – cfr. fls. 6 a 13 do processo administrativo; 27) Através de Ofício n.º ...20 5000037713, datado de 13-02-2020, AA foi notificada da decisão de indeferimento da reclamação graciosa mencionada na alínea antecedente, proferida a 13-02-2020 – cfr. fls. 52 a 54 (verso) do processo administrativo; 28) Sem o levantamento dos ónus que incidiam sobre os prédios inscritos na matriz predial rústica sob o artigo ...68 e na matriz predial urbana sob o artigo ...61, AA não teria realizado o negócio de compra e venda mencionado em 4) – cfr. depoimento da testemunha BB; II.2 – De Direito I. Vem o presente recurso interposto pela impugnante, ora Recorrente, AA, da douta sentença proferida pelo TAF de Penafiel que julgou totalmente improcedente a presente impugnação judicial contra o indeferimento da reclamação graciosa por ela apresentada com vista à anulação da liquidação de IRS e juros compensatórios, respeitante ao ano de 2018, no valor global de € 49.102,33. A decisão recorrida ao julgar improcedente a referida impugnação judicial sob recurso, considerou louvando-se não só no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, processo n.º 0245/17.4BELRA, de 18-11-2020, disponível em www.dgsi.pt, mas também no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 03-03-2016, processo n.º 05182/11 que “…as despesas suportadas com vista ao levantamento dos ónus (hipotecas e penhoras) que incidiam sobre os imóveis alienados não constituem despesas necessárias e inerentes à alienação, na aceção da alínea a) do artigo 51.º do Código do IRS, por não estarem relacionadas intrinsecamente com a alienação, tendo apenas sido suportadas para desonerar os imóveis dos ónus que sobre eles incidiam. Noutras palavras, as despesas em causa foram necessárias à desoneração dos imóveis e não à alienação dos mesmos.” Neste contexto, alega ainda o tribunal a quo que “…os imóveis alienados foram adquiridos pela Impugnante através de doação, a título gratuito [cfr. pontos 1) e 2) da factualidade provada], nada resultando dos autos que a Impugnante tenha contraído um empréstimo para a aquisição dos mesmos, e, por isso, que tenha esse crédito para amortizar, não se verificando, assim, o estatuído no n.º 1, do art.º 11.º, da Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro” Acrescenta ainda a sentença recorrida que a impugnante, ora Recorrente, não conseguiu demonstrar erro notório no cálculo da mais-valia, razão pela qual, conclui pela improcedência do presente recurso. II. A Recorrente insurge-se contra o assim decidido, sustentando, no essencial, que a douta sentença fez “…uma incorrecta aplicação do direito aos factos, bem como uma errónea apreciação dos factos e da prova realizada e carreada para os Autos, tendo concluído, em consequência, com uma desajustada aplicação do direito ao caso sub juditio.” Em suma considera a ora Recorrente que “… a sentença, ora recorrida, deve ser revogada, por contrária à lei, por ter realizado uma valoração errada da prova produzida e junta aos Autos. E, assim, partindo de falsas premissas e incorrecção análise da prova dos Autos, foi proferida decisão final desacertada e injusta, tudo isto em clara antonímia com o disposto no artigo 607.º n.º 4 e 5 do CPC.” III. Remetidos os autos a este Supremo Tribunal, veio o MP no seu parecer a fls. 562 e seguintes do SITAF, levantar a questão prévia da existência de uma exceção dilatória de conhecimento oficioso, que, por sua vez, determina a incompetência absoluta deste Tribunal para conhecer do objecto do presente recurso, sendo competente para o efeito, o Tribunal Central Administrativo Sul nos termos artigo 38.º, n.º 1, alínea a) do ETAF, e artigo 2.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 325/2003, de 29 de Dezembro. Cumpre, por isso, conhecer primeiramente da questão prévia suscitada pelo MP quanto à competência deste Supremo Tribunal em razão da hierarquia. IV. Recordemos que, nos termos do artigo 280.º, n.º 1 do CPPT, das decisões dos Tribunais Tributários de 1.ª Instância cabe recurso a interpor, em primeira linha, para os Tribunais Centrais Administrativos, salvo quando respeite a questão exclusivamente de Direito, caso em que tal recurso tem de ser interposto para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo. Ora, atentando a que, nos termos do artigo 26.º, alínea b) do ETAF, se atribui competência à Secção do Contencioso Tributário do STA para conhecer dos recursos interpostos das decisões que versem exclusivamente sobre questões de Direito dos Tribunais Tributários, e que, por sua vez, o artigo 38.º, alínea a) do mesmo diploma atribui competência à Secção de Contencioso Tributário de cada Tribunal Central Administrativo para conhecer dos recursos de decisões dos Tribunais Tributários, ressalvando-se precisamente o disposto no citado artigo 26.º, alínea b), deve concluir-se que, para o conhecimento dos recursos jurisdicionais interpostos de decisões dos Tribunais Tributários de 1.ª Instância, a competência deste Supremo Tribunal está circunscrita a decisões exclusivamente sobre questões de Direito – cfr., entre muitos outros, os Acórdãos da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal proferidos no processo n.º 0762/16, de 1 de Julho de 2020, no processo n.º 054/16, de 17 de Junho de 2020, e processo n.º 02501/15, de 9 de Outubro de 2019 (disponíveis em www.dgsi.pt). V. No que ao presente caso interessa, deve entender-se que o recurso não tem por fundamento exclusivamente matéria de Direito sempre que, nas conclusões das respectivas alegações – as quais fixam o objecto do recurso artigo 635.º, n.º 4 do CPC – o Recorrente retira distintas ilações da matéria fáctica fixada na decisão recorrida ou não invoca, como devia, factos que suportam a sua pretensão. Tal como foi, ainda recentemente, recordado por este Supremo Tribunal no acórdão lavrado em 13 de Julho de 2022, no Processo n.º 2955/16: “Os recursos não têm por fundamento exclusivo matéria de direito sempre que nas conclusões das alegações, que fixam o objecto do recurso (art.635º nº4 CPC vigente), o recorrente manifesta discordância com a fundamentação de facto da decisão recorrida por erro, insuficiência ou excesso, nos seguintes termos (i) foram julgados provados factos não verificados; (ii) não foram inscritos no probatório factos verificados; (iii) divergência com as ilações de facto extraídas dos factos provados ou não provados.” - disponível em www.dgsi.pt. VI. Ora, é precisamente o que sucede com a (decisiva, a este respeito) conclusão n.º 5: “Tal contencioso veio a ser indeferido o que levou a Impugnante a apresentar a presente Impugnação Judicial; - Pois que, não se conforma a Impugnante com a tributação de rendimentos não recebidos, que foram afectos a terceiros para libertação de ónus e encargos dos imóveis vendidos, no montante total de 302.091,13 €, conforme aliás decorre da factualidade dada como provada pelo Insigne Tribunal a quo – cfr. Factos Provados n.º 4), 5), 6), 7), 8), 9), 10), 11) e 12); - Sem o expurgo de tais ónus ou encargos a venda não teria sido possível – cfr. Factos Provados n.º 28); - Pelo que, entende a Recorrente que tais valores, que serviram para pagar a terceiros as suas hipotecas e penhoras que impendiam sobre os imóveis vendidos, têm ser deduzidos no preço, devendo apenas ser tributado o valor efectivamente por si recebido, que contas feitas, se fixa não em 450.000,00 €, mas sim em quantia que não excede os 150.000,00 €, isto sem considerar as demais despesas deduzidas, relacionadas com o acto de venda propriamente dito;” (sublinhado nosso). Com efeito, e na linha do igualmente defendido pelo Ministério Público em Parecer junto aos autos, sem prejuízo da (meramente) aparente não contestação da factualidade consolidada na decisão recorrida, a verdade é que se impõe cotejar tal conclusão (que reflecte as extensas alegações produzidas no mesmo sentido) com o teor da decisão recorrida, onde se pode ler: “No ano de 2018, a Impugnante vendeu os referidos imóveis pelo preço global de € 450.000,00 [cfr. ponto 3) da factualidade julgada como provada]. À data em que foi celebrada a escritura de compra e venda, sobre o prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo ...68, melhor identificado supra, encontravam-se inscritas uma hipoteca voluntária a favor do Banco 1... S.A. e uma hipoteca legal e uma penhora a favor do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. [cfr. ponto 7) da factualidade julgada como provada]. Por seu turno, sobre o prédio inscrito na matriz sob o artigo ...61, encontravam-se inscritas uma hipoteca voluntária a favor de A..., S.A., uma hipoteca voluntária a favor da Banco 2... e uma hipoteca legal e penhora a favor do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. [cfr. ponto 8) da factualidade julgada como provada]. Para o cancelamento das hipotecas e penhoras que incidiam sobre os prédios, foi pago à Banco 2... o montante de € 233.000,00 e ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social o valor de € 63.305,01, através de cheques entregues pelo comprador dos imóveis como forma de pagamento do preço [cfr. pontos 5) e 7) da factualidade julgada como provada]. À B..., S.A. foi paga a quantia de € 5.766,13 com vista ao cancelamento do registo da hipoteca constituída a favor daquela sobre o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ...68 [ponto 10) da factualidade julgada como provada]. Embora o averbamento do cancelamento das hipotecas e penhoras tenha ocorrido em data posterior à celebração a escritura de compra e venda, à data de celebração desta, já havia sido autorizado o cancelamento das hipotecas e penhoras incidentes sobre os prédios [cfr. pontos 9), 11) e 12) da factualidade provada].” A questão que se coloca nos presentes autos, como a identificou o julgador,” traduz-se em saber se os montantes pagos para levantamento dos ónus existentes sobre os prédios (hipotecas e penhoras), no montante global de € 302.071,14, constituem despesas necessárias e inerentes à alienação, para efeitos do disposto na alínea a), do art.º 51.º, do CIRS.”… Como supra se disse, a despesa em causa não se revela como necessária à obtenção do rendimento, pelo que, tendo a Impugnante sido tributada de acordo com a sua capacidade contributiva, i.e., com o rendimento-acréscimo decorrente da venda dos imóveis em questão nos presentes autos, inexistiu qualquer violação dos princípios referidos. A Impugnante alegou, ainda, a existência de um erro notório no cálculo da mais-valia, defendendo que, quanto ao prédio inscrito na matriz sob o artigo ...68 a mais-valia é de € 10.000,00 e quanto ao prédio inscrito na matriz sob o artigo ...61 é de € 120.000,00, pelo que, sendo as mais-valias tributadas em apenas metade, de acordo com o disposto na alínea b), do n.º 2, do art.º 43.º, do CIRS, englobadas com os restantes rendimentos da Impugnante, de cerca de € 15.000,00, daria um imposto a pagar de € 25.000,00. Contudo, não se alcança de que modo foi efetuado pela Impugnante o cálculo das mais-valias que alega padecerem de erro. A Impugnante limita-se a indicar os valores que supra se referiram sem concretizar a forma de cálculo. Note-se que, de acordo com o plasmado no art.º 74.º, n.º 1, da LGT, é sobre a Impugnante que recai o ónus de prova a existência do alegado erro na determinação das mais-valias. Ademais, como resulta dos pontos 18), 21) e 22) da factualidade julgada como provada, as mais-valias foram calculadas de acordo com os valores (de realização, de aquisição e encargos), indicados pela Impugnante no quadro 4, do anexo G, da declaração de IRS que serviu de base à liquidação impugnada, daí resultando uma mais-valia sujeita a imposto no que respeita ao prédio rústico inscrito na matriz predial sob o artigo ...68, no valor de € 49.972,22, e, no que diz respeito ao prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo ...61, de € 63.116,02. Cabia à Impugnante demonstrar o erro notório no cálculo da mais-valia, de acordo com o ónus da prova que sobre si impendia, o que não logrou fazer. Pelas razões apontadas, improcede o alegado pela Impugnante.” (sublinhados nossos). VII. Feito este confronto, torna-se evidente, estamos em crer, que aquela conclusão pressupõem um juízo que ultrapassa o exercício meramente exegético, demandando conclusões e indagações de natureza forçosamente factual que vão além dos dados consolidados no Probatório, antes pressupondo a adaptação das ilações daí extraídas – em particular, na questão nuclear na “necessidade” e “inerência” das despesas, porquanto a actividade jurisdicional que se exige a este respeito não se restringe à mera interpretação do escopo da norma legal, mas a um processo que exige considerações fácticas a respeito do teor do vertido no Probatório. VIII. Por todo o exposto, cabe declarar competente o Tribunal Central Administrativo Norte e mandar remeter os autos a esse Tribunal, conforme estabelece o artigo 18.º, n.º 1 do CPPT, podendo este Tribunal Central, assim, conhecer da comprovação factual (ou não) da existência e justificação das “despesas necessárias e inerentes à alienação”, para efeitos do preenchimento do disposto na alínea a) do art.º 51.º do Código do IRS, assim como das demais questões que se coloquem. III. Conclusões I – Das decisões dos Tribunais Tributários de 1.ª Instância cabe recurso a interpor, em primeira linha, para os Tribunais Centrais Administrativos, salvo quando respeitem a matéria exclusivamente de Direito, caso em que tal recurso tem de ser interposto para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo. II – A violação desta regra de competência, em razão da hierarquia, determina a incompetência absoluta do tribunal ao qual é, indevidamente, dirigido o recurso. III – Existe discordância com a fundamentação de facto da decisão recorrida por erro, insuficiência ou excesso, no caso de existirem divergência quanto às ilações de facto extraídas dos factos provados e não provados.
IV. Decisão |