Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0559/23.4BEPNF
Data do Acordão:07/11/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:FONSECA DA PAZ
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
PROCESSO CAUTELAR
EXTINÇÃO
Sumário:É de admitir a revista onde está em causa averiguar se ocorreu a extinção do processo cautelar por a acção principal não ter sido intentada pela requerente no prazo de 3 meses a contar da data em que lhe foi notificado o acto suspendendo, ou se deve entender que esse prazo ainda não decorreu por o acto, consubstanciando-se numa anulação administrativa posterior à publicação da lista definitiva de colocação dos docentes, ainda não ter adquirido eficácia.
Nº Convencional:JSTA000P32546
Nº do Documento:SA1202407110559/23
Recorrente:AA
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA FORMAÇÃO DE APRECIAÇÃO PRELIMINAR DA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO:


1. AA intentou, no TAF, contra o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, processo cautelar, pedindo a suspensão da eficácia do despacho, de 18/10/2023, da Directora-Geral da Administração Escolar, que lhe anulou a colocação no grupo de recrutamento 410-Filosofia, no quadro de zona pedagógica 01, no âmbito do concurso externo de vinculação dinâmica para o ano escolar de 2023/24 e, em consequência, anulou a colocação por ela obtida, em sede de concurso de mobilidade interna, na Escola Profissional de Agricultura e Desenvolvimento Rural de Marco de Canavezes.
Foi proferida sentença que, declarou extinto o processo cautelar, por intempestividade do uso da acção principal adequada.
A requerente apelou para o TCA-Norte, o qual, por acórdão de 17/05/2024, negou provimento ao recurso, confirmando a sentença.
É deste acórdão que o requerente vem pedir a admissão de recurso de revista.

2. Tem-se em atenção a matéria de facto considerada pelo acórdão recorrido.

3. O art.º 150.º, n.º 1, do CPTA, prevê que das decisões proferidas em 2.ª instância pelos tribunais centrais administrativos possa haver excepcionalmente revista para o STA “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como decorre do texto legal e tem sido reiteradamente sublinhado pela jurisprudência deste STA, está-se perante um recurso excepcional, só admissível nos estritos limites fixados pelo citado art.º 150.º, n.º 1, que, conforme realçou o legislador na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs. 92/VIII e 93/VIII, corresponde a uma “válvula de segurança do sistema” que apenas pode ser accionada naqueles precisos termos.
A sentença julgou extinto o processo cautelar, ao abrigo da al. a) do n.º 1 do art.º 123.º, conjugado com a al. b) do n.º 1 do art.º 58.º, ambos do CPTA, por o prazo para impugnar contenciosamente o acto suspendendo ter terminado em 20/2/2024 sem que a acção respectiva tenha sido intentada.
O acórdão recorrido, para negar provimento ao recurso que a requerente interpusera desta sentença, considerou:
(…).
Dispunha o invocado artigo 15.º do Decreto-Lei 132/2012, de 27.06, sob a epígrafe “Listas definitivas”, entretanto revogado, a partir de 08.05.2023, pelo artigo 57.º do Decreto-Lei n.º 32-A/2023, de 08.05:
“1 - Esgotado o prazo de notificação referido no n.º 5 do artigo anterior, as listas provisórias convertem-se em definitivas, contendo as alterações decorrentes das reclamações julgadas procedentes e as provenientes das desistências.
2 - O preenchimento dos lugares respeita as preferências identificadas no presente diploma e materializa-se nas listas de colocações, as quais dão origem igualmente a listas graduadas de candidatos não colocados, publicitadas nos termos do aviso de abertura do concurso.
3 - As listas definitivas de ordenação, de exclusão, de colocação e de candidatos não colocados são homologadas pelo diretor-geral da Administração Escolar, sendo publicitadas pela Direção-Geral da Administração Escolar na respetiva página da Internet
4 - Das listas definitivas de colocação, de ordenação e de exclusão pode ser interposto recurso hierárquico, elaborado em formulário eletrónico, sem efeito suspensivo, a apresentar no prazo de cinco dias úteis.
(…).
O preceito invocado exige a publicitação, apenas, das listas definitivas, o que faz sentido, dado dizerem respeito, por regra, a milhares de professores.
Não diz respeito - não cabe minimamente na letra da lei, nem no seu espírito – à notificação de acto individuais e concretos dirigidos a um único candidato como é o caso do acto impugnado.
Para estes actos, como o suspendendo, valem as regras de notificação previstas no artigo 112º, n.º 1, alínea a), e 114º, ambos do Código de Procedimento Administrativo.
Regras que no caso forma cumpridas dado que a interessada foi notificada do acto em apreço no dia por carta.
E, como se refere na decisão recorrida, embora não tenha ficado provada a data em que foi comunicado à Requerente o acto suspendendo, ficou provado que esta intentou em 20.11.2023 o presente processo cautelar de suspensão da eficácia do referido acto.
Ou seja, pelo menos nesta, 20.11.2023 a Requerente já tinha recebido a carta de notificação do acto suspendendo, pelo que o prazo de 3 meses para impugnar contenciosamente aquela decisão terminou, no limite, a 20.02.2024.
Pelo que quando foi proferida a decisão recorrida já tinha efectivamente caducado o direito de acção da Requerente, pelo decurso do prazo de três meses previsto no artigo 58.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos”.
A requerente justifica a admissão da revista com a relevância social fundamental da questão a analisar – que extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio, podendo a sua solução constituir uma orientação para a apreciação de outros casos futuros, visto estar em causa um concurso de recrutamento de pessoal docente que anualmente coenvolve a intervenção de milhares de docentes e a mesma ser transponível para outros procedimentos similares – e com a necessidade de se proceder a uma melhor aplicação do direito, imputando ao acórdão recorrido erro de julgamento por violação do n.º 3 do art.º 15.º do DL n.º 132/2012, de 27/6, do art.º 170.º do CPA e dos artºs. 54.º, n.º 1, 58.º, n.º 1, al. b) e 59.º, n.º 1, todos do CPTA, dado que o prazo de impugnação do acto suspendendo ainda não começara a correr, atento à ineficácia deste decorrente da sua não publicação na página da internet.
Resulta do exposto que o que está em causa é averiguar se ocorreu a extinção do processo cautelar nos termos do art.º 123.º, n.º 1, al. a), do CPTA, por a acção principal não ter sido intentada pela requerente no prazo de 3 meses a contar da data em que lhe foi notificado o acto suspendendo, ou se, pelo contrário, se deve entender que esse prazo ainda não decorreu por o acto ser ineficaz, dado que, consubstanciando-se numa anulação administrativa posterior à publicação da lista definitiva de colocações, só adquiriu eficácia após a publicação a que esta estava sujeita e que ainda não se verificara.
A questão que se discute nos autos, além de interessar a um número alargado de docentes, prende-se – apesar de surgir no âmbito de um processo cautelar – com o pressuposto processual da tempestividade da impugnação dos actos administrativos e respectiva harmonização com o pressuposto processual da sua eficácia que, com frequência os tribunais da jurisdição administrativa são chamados a decidir, o que faz antever como objectivamente útil a intervenção do Supremo na qualidade de órgão de regulação do sistema.
Assim, porque se está perante questão passível de se repetir em casos futuros e porque a solução que foi adoptada suscita fundadas dúvidas, justifica-se a intervenção clarificadora deste STA, deste modo se quebrando a regra da excepcionalidade da admissão das revistas.

4. Pelo exposto, acordam em admitir a revista.
Sem custas.

Lisboa, 11 de Julho de 2024. – Fonseca da Paz (relator) – Teresa de Sousa – José Veloso.