Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01309/09.3BESNT
Data do Acordão:07/11/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
INSTITUTO DO EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL
COMISSÃO DE SERVIÇO
REGIME TRANSITÓRIO
EMPREGO PÚBLICO
Sumário:Justifica-se admitir revista já que as questões que se suscitam neste recurso, parecem ter sido tratadas pelo acórdão recorrido de forma controversa, tendo em conta anteriores decisões do TCA Sul em situações de natureza semelhante.
Nº Convencional:JSTA000P32548
Nº do Documento:SA12024071101309/09
Recorrente:INSTITUTO DO EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL
Recorrido 1:AA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório
AA, com os sinais dos autos, intentou no TAF de Sintra, acção administrativa especial contra o Instituto do Emprego e Formação Profissional, IP (IEFP), pedindo a anulação da deliberação do Conselho Directivo do IEFP, de 14.07.2009, exarada na informação nº ...09, de 07.07.2009, e os subsequentes actos determinativos dos descontos nos vencimentos da Autora, e, em consequência, o reconhecimento do direito de transitar, a partir de 01.01.2009, para o regime do contrato de trabalho em funções públicas (CTFP), com o vencimento e demais direitos adquiridos na situação antecedente, designadamente à manutenção da qualidade de subscritora da Caixa Geral de Aposentações, condenando-se a Entidade Demandada (doravante ED) a manter o vencimento que auferia a 31.12.2008, e a pagar as diferenças de vencimento devidas desde 01.01.2009, até à data da execução da sentença, ao que acresce os juros de mora, à taxa legal.

O TAF de Sintra, por sentença de 15.05.2017, julgou a acção parcialmente procedente e anulou os actos impugnados, consubstanciados na deliberação de 14.07.2009, no que respeita à autora, bem como os subsequentes actos determinativos dos descontos nos seus vencimentos, e condenou a Ed a colocar a A. na posição remuneratória que garanta a remuneração base mensal que a mesma auferia em 31.12.2008, e, em consequência, no pagamento àquela do valor correspondente às diferenças salariais apuradas entre o montante da remuneração base mensal efectivamente auferida e o montante da remuneração base mensal correspondente à posição remuneratória devida, desde 01.01.2009, até à data em que seja processada a primeira remuneração base mensal corrigida, acrescida de juros de mora.

O IEFP interpôs recurso para o TCA Sul que veio a proferir o acórdão de 09.05.2024 negando provimento ao recurso e confirmando a sentença recorrida.

É deste acórdão que o IEFP interpõe a presente revista, nos termos do art. 150º, nº 1 do CPTA, fundamentando a admissibilidade da mesma na circunstância de estar em causa a apreciação de questão com relevância jurídica, sendo também necessária uma melhor aplicação do direito.

Em contra-alegações, a Recorrida defende que a revista não é admissível por o valor da acção estar muito abaixo do valor da alçada para recorrer (art. 142º, nº 1 do CPTA).

2. Os Factos
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. O Direito
O art. 150º, nº 1 do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como resulta do próprio texto legal, e a jurisprudência deste STA tem repetidamente sublinhado, trata-se de um recurso excepcional, como, aliás, o legislador sublinhou na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando o preceito como uma “válvula de segurança do sistema”, que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.
A recorrida defende a inadmissibilidade da revista por o valor da acção - €1.577,44 – ser inferior ao valor da alçada do tribunal de que se recorre (art. 142º, nº 1 do CPTA).
Não lhe assiste razão, já que a admissibilidade do recurso de revista apenas está dependente da verificação dos pressupostos acabados de enunciar, conforme resulta do disposto nos arts. 140º, nºs 1 e 2 e 150º do CPTA, sendo irrelevante, para os efeitos da respectiva admissibilidade, o valor da acção.

Na presente revista o Recorrente pretende ver discutida a questão de saber se a comissão de serviço (constituída ao abrigo da Portaria nº 66/90, de 27/1) nos termos da qual a A./Recorrida se encontrava a exercer as suas funções na data da sua transição para o novo regime de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas (aprovado pela Lei nº 12-A/2008, de 27/2 - LVCR), sendo certo que a Recorrida veio a exercer o seu direito de opção, manifestando pretender manter o seu vínculo de trabalho ao IEFP, no regime de funcionária pública, foi correctamente apreciada pelo acórdão recorrido, alegando que este padece de erro de julgamento de direito.
Defende que a comissão de serviço criada ao abrigo da Portaria nº 66/90, de 27/1, (art. 3º), com a entrada em vigor da Lei nº 12-A/2008 e do Regime do CTFP, aprovado pela Lei nº 59/2008, de 11/9, implicou, necessariamente, a transição da recorrida, nos termos das disposições combinadas do nº 4 do art. 88º, do art. 97º, do art. 104º e do art. 109º, todos da lei nº 12-A/2008, para o contrato de trabalho em funções públicas, tendo em conta a sua carreira/categoria de origem, à qual acedeu por nomeação definitiva, em 22 de Março de 1978. Mais defende que a comissão de serviço, quanto à sua natureza, contém as características mencionadas no acórdão recorrido: carácter transitório e voluntário e, por isso, duração limitada (já que a Recorrida poderia, a qualquer momento pôr-lhe termo). Mas, por outro lado, tem carácter reversível, já que, cessando a sua comissão de serviço, a Recorrida cessa o estatuto que correspondia à função desempenhada, nomeadamente em termos remuneratórios, retornando à carreira/categoria base de origem. Defende que, no que respeita à transição de regimes de emprego público, a Recorrida transitou, ope legis, para a modalidade de contrato de trabalho em funções públicas, por tempo indeterminado, por força do nº 4 do art. 88º da lei nº 12-A/2008, pelo que, a partir de 01.01.2009, teve direito à remuneração base correspondente à carreira/categoria de que era titular por nomeação definitiva/promoção e não à remuneração a que teria direito se, previamente, tivesse optado pelo contrato individual de trabalho, caso em que seria exonerada da função pública.
E que, ao invés do decidido, por força da conversão legal operada pelo referido art. 88º e seguintes e art. 109º, ambos da Lei nº 12-A/2008, as comissões de serviço estabelecidas no IEFP, por tempo indeterminado, atípicas, não se convolaram em contratos de trabalho em funções públicas.
As questões que se suscitam na revista, nos termos supra indicados, parecem ter sido tratadas pelo acórdão recorrido de forma controversa, tendo em conta anteriores decisões do TCA Sul em situações de natureza semelhante.
Com efeito, a jurisprudência do TCA Sul nos acórdãos proferidos em 19.04.2018, Proc. nº 1384/09.0BEALM, em 18.06.2020, Proc. nº 2259/09.9BEALM e em 02.06.2021, Proc. nº 02284/09.0BELSB, perfilhou tese contrária à do presente acórdão, sendo certo que essa jurisprudência foi considerada plausível pelo ac. desta Formação de Apreciação Preliminar, que, no processo nº 02284/09.0BELSB, por acórdão de 18.11.2021, não admitiu a revista interposta pela aí autora, “…, face ao aparente acerto do decidido não se justifica a intervenção deste STA, …”.
Assim, no caso presente justifica-se a intervenção deste STA, com vista a um melhor esclarecimento e pacificação da jurisprudência, em casos de natureza semelhante que revestem inegável relevância jurídica e social.

4. Decisão
Pelo exposto, acordam em admitir a revista.
Sem custas.

Lisboa, 11 de Julho de 2024. – Teresa de Sousa (relatora) – José Veloso – Fonseca da Paz.