Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01789/15.8BELRS
Data do Acordão:07/03/2024
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P32475
Nº do Documento:SA22024070301789/15
Recorrente:A..., S.A.
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE LOURES E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
A..., S.A., Impugnante melhor identificada nos autos supra mencionados, notificada da sentença datada de 10 de Maio de 2021, e com ela não se conformando, vem interpor RECURSO para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 280.º do Código do Procedimento e Processo Tributário, uma vez que o presente recurso se fundamenta exclusivamente em matéria de direito e, ainda, do n.º 1 do artigo 282.º do mesmo Código, nos termos e com os fundamentos constantes das alegações que junta.

Concluiu as suas alegações nos seguintes termos:
A. O presente recurso é interposto contra a Sentença do Tribunal Tributário de Lisboa de 10 de Maio de 2021 que considerou improcedente a impugnação judicial apresentada pela ora Recorrente contra as taxas de ocupação do espaço público liquidadas pela Junta de Freguesia ..., no período de 2015, no valor de €5.040,00.
B. A referida Sentença considerou que a Junta de Freguesia ..., no âmbito da sua autonomia administrativa, tem poderes para cobrar a referida taxa.
C. Considerou ainda o Tribunal a quo que, uma vez que o painel publicitário é onde se afixa a publicidade, é este o motivo pelo qual a taxa de ocupação do domínio municipal está correctamente liquidada.
D. Contudo, a Recorrente não pode conformar-se com a referida Sentença, pelos argumentos apresentados na petição inicial, que ora se renovam e, ainda pelos seguintes: (i) pela natureza do conceito de taxas, (ii) pelos princípios constitucionais ligados ao seu conceito e aplicação pelos Municípios / Freguesia, (iii) e, ainda, sob pena de incorrer em duplicação de colecta.
E. Conforme referido na petição inicial, a Recorrente foi notificada pela Recorrida da liquidação das taxas de publicidade e das de ocupação do espaço público.
F. Não tendo nada a opor quanto às primeiras, mas quanto às segundas não pode concordar com a forma de cálculo utilizada.
G. Ora, em 2015, a Recorrente tinha instalados, à data dos presentes autos, cinco painéis publicitários na área do domínio público da Junta de Freguesia ....
H. Cada um dos painéis publicitários tinha uma área de 24 m2, comprimento de 8,20 m2 e profundidade de 25 cms, sendo três destes painéis suportados por quatro pilares fixados no solo e dois painéis suportados por dois pilares fixados no solo, estando todos inseridos em sapatas de cimento de 0,25 m2.
I. Uma vez que a publicidade afixada verticalmente é já considerada para efeitos de cálculo da taxa de publicidade – sendo esta taxa a única em que se justifica que a área do painel seja um dos factores de cálculo –, não deve a taxa de ocupação de espaço público ser calculada igualmente sobre a referida área.
J. Assim, entende a Recorrente que as taxas de ocupação do espaço público deveriam ser calculadas sobre a área ocupada pelos pilares que suportam os painéis publicitários, uma vez que esta é a área que efectivamente ocupa o domínio público, i.e., o solo.
K. Se por mera hipótese se devesse considerar o espaço aéreo correspondente à superfície, então esse espaço não seria o da área do painel, mas sim o da sua projecção no solo (com uma área de 2,05 m2), e, neste caso, a taxa anual devida por cada painel sempre seria de €86,00 (2,05 m2 x €3,50 x 12 meses).
L. No entanto, tal hipótese (área de projecção do painel no solo) não corresponde à área efectivamente ocupada no espaço público, uma vez que por debaixo do painel publicitário, a Freguesia ... pode ocupá-lo como bem entender (por exemplo, com bancos de jardim, lugares de estacionamento, caixotes de lixo, etc).
M. Pelo que apenas faz sentido cobrar-se a taxa de ocupação de espaço público pelo espaço efectivamente ocupado pela Recorrente (para além do já tributado painel publicitário através da taxa de publicidade), ou seja, a área ocupada pelos pilares no solo.
N. Tal decorre da própria natureza das taxas, determinando o n.º 2 do artigo 4.º da LGT que estas “assentam na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares.”.
O. Neste âmbito, sempre se dirá que os Municípios / Freguesias podem legalmente cobrar taxas uma vez que têm o “(…) direito de exigência de um determinado tributo em contrapartida de uma prestação efectivamente prestada ao sujeito passivo ou por este beneficiada.”, cf. NUNO DE OLIVEIRA GARCIA, in Contencioso de Taxas, liquidação, audição e fundamentação, Almedina, 2018, 3.ª edição, pág. 55 e seguintes.
P. Mais refere aquele Autor a necessidade da liquidação das taxas se “regular por princípios e regras que levem em linha de conta as particularidades da taxa, a fim de produzir segurança nas relações entre a administração e os particulares.”.
Q. Este princípio da segurança jurídica nas relações entre a administração e os particulares tem por base a relação sinalagmática entre a equivalência do custo da taxa para o Município/ Freguesia e o benefício obtido pelo sujeito passivo e que veio a ser consagrado no artigo 3.º do RGTAL.
R. E inclui igualmente o respeito pelo princípio da proporcionalidade, previsto no n.º 2 do artigo 266.º da CRP, uma vez que implica que “não pode ocorrer uma desproporção que, pela sua dimensão, demonstre com clareza que não existe entre aquele benefício e aquela quantia a correspectividade ínsita numa relação sinalagmática.”, cf. conclusão do STA no acórdão proferido em 18.02.2009, no âmbito do processo n.º 0947/08.
S. In casu, tal princípio obriga a Recorrida a abster-se da imposição à Recorrente de um cúmulo de taxas que visam possibilitar a esta última o benefício de instalar o painel publicitário no espaço público.
T. E, caso se mantenha em vigor o cúmulo de taxas em questão, estaremos perante uma dupla incidência / dupla tributação, a qual “(…) é, em geral, admitida, em matéria de impostos, quando o mesmo facto tributário se insere em mais que uma norma de incidência objectiva, mas não o é em matéria de taxas devidas pela ocupação de bens de domínio público, pois sendo aquelas a contrapartida do benefício obtido, não se pode justificar um duplo pagamento pelo mesmo benefício.”, cf. determinado pelo STA em 17.04.2013, no processo n.º 01154/12.
U. Na situação em apreço, o painel publicitário é já considerado para efeitos de cálculo da taxa de publicidade – a qual naturalmente já inclui a necessária ocupação do espaço público –, não podendo ser igualmente incluído para efeitos da taxa de ocupação do espaço público, sob pena de uma efectiva duplicação de colecta pela Freguesia ....
V. Neste sentido, a Recorrente aceita que pela instalação de cada painel publicitário a Junta de Freguesia ... liquide as duas taxas em questão: a da publicidade e a da ocupação do espaço público.
W. No entanto, a Recorrente não se conforma que a Junta de Freguesia ... proceda ao cálculo das duas taxas pela área do painel publicitário, uma vez que a ocupação vertical do domínio público é já taxada pela taxa de publicidade, correspondendo a área ocupada no espaço público remanescente à dos pilares, no solo.
X. Ou seja, a taxa de ocupação do espaço público deve ser calculada unicamente tendo por base a área ocupada pelos pilares no solo; no limite, podendo equacionar-se a área de projecção do painel no solo, com a reserva acima apontada de que, neste caso, não corresponde à área que, na realidade, é ocupada pela Recorrente, uma vez que o espaço em causa pode ser utilizado pela Freguesia como bem entender.
Y. Neste âmbito, o Tribunal a quo concluiu que não se poderia excluir o painel publicitário para efeitos de cálculo da taxa de ocupação do espaço público com base no facto de que é neste local onde é afixada a publicidade, contudo, salvo o devido respeito, é exactamente essa a razão justificativa do facto de o painel publicitário ter de ser excluído do cálculo da taxa de ocupação do espaço público, uma vez que este já é considerado para efeitos de cálculo da taxa de publicidade.
Z. Entendimento este que tem vindo a ser adoptado pelas Juntas de Freguesia ... e ... na liquidação das taxas em questão,
AA. E, igualmente, pelos tribunais, que têm defendido um entendimento semelhante (Cf. Acórdão de 28.12.2020, proferido no âmbito do Processo n.º 349/18.6BELLE pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, no Acórdão de 28.12.2020 e, Acórdão de 28.12.2020, proferido no âmbito do Processo n.º 349/18.6BELLE pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé), ou seja, o de que a área do painel publicitário deverá apenas ser considerada para efeitos de cálculo da taxa de publicidade, sendo que a taxa de ocupação do espaço público deverá incidir sobre a área ocupada pela Recorrente no espaço remanescente, ou seja, sobre a área ocupada pelos pilares no solo.
BB. Devendo nos termos expostos ser revogada a Sentença e, consequentemente, anuladas as taxas de ocupação do espaço público.
Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente, por provado, tal como na petição inicial e, em consequência, ser revogada a Sentença proferida pelo Tribunal a quo e anulada a taxa de ocupação do espaço público notificada à Recorrente pela Recorrida com referência ao período de 2015, no valor de €5.040,00, sendo ainda reembolsados à Recorrente todos os custos entretanto incorridos com a prestação de garantia para efeitos de suspensão do processo de execução n.º 72/16, instaurado pela Recorrida com referência às taxas de 2015.

Contra-alegaram as entidades recorridas, tendo concluído:
1ª. O artigo 67.º, al. g), do RTML, prevê o pagamento de uma taxa por m2 e por mês, no valor de € 3,5, no momento da emissão da licença para a utilização e aproveitamento do domínio municipal com suportes publicitários.
2ª. O artigo 75.º do referido Regulamento, prevê que pela autorização de produção de publicidade em suporte publicitário é devida, pelo titular, no momento da emissão da autorização, uma taxa, a cobrar por m2 e por ano, no valor de € 43,00, relativamente a anúncios não luminosos, no valor de € 154,00, com referência a anúncios luminosos ou directamente iluminados e, no valor de € 25,00, respeitante a abrigos.
3ª. Pretende a Recorrente que existe dupla tributação, já que as taxas de ocupação do espaço público devem ser calculadas sobre a área ocupada pelos pilares que suportam os painéis publicitários e que o espaço aéreo correspondente à superfície se espelha na projecção do painel no solo, mas sem qualquer razão.
4ª. Como muito bem decidiu a douta sentença recorrida, estas taxas incidem sobre utilidades ou benefícios manifestamente distintos, sendo a primeira devida em função da ocupação e utilização do domínio, público ou privado, municipal, por parte do particular, sendo que tal domínio público ou privado, municipal, abrange o solo, o subsolo e o espaço aéreo, nos mesmos moldes que se encontram previstos para a propriedade privada, no art. 1344.º do Código Civil (CC), isto é, até ao limite do espaço sobrejacente ao solo, a partir do qual o proprietário não pode proibir actos de terceiros que, pela profundidade ou pela altura a que têm lugar, não tenha interesse em impedir, sendo certo que, para além desse limite, já se encontra o domínio público estadual, em conformidade com o disposto no art. 84.º, n.º 1, al. b), da CRP (vide acórdão do STA, de 09.05.2007, processo n.º 01223/06, acórdão do TCAN, de 26.03.2009, processo n.º 00949/06; e, acórdão do TRC, de 10.05.2011, processo n.º 4644/08).
5ª. A segunda taxa é devida em função da remoção de um obstáculo jurídico a um determinado comportamento do particular, sendo a publicidade uma actividade relativamente proibida, por razões de interesse público associadas ao ordenamento do território e à qualidade ambiental das povoações e da vida urbana, previstos no art. 66.º, n.º 2, als. b) e e), da CRP.
6ª. E o Município fiscaliza esta actividade, cobrando uma determinada taxa (vide acórdão do TCAS, de 09.03.2004, processo n.º 00566/03).
7ª. Assim, a referida taxa é exigível ao particular independentemente de o suporte publicitário estar instalado numa propriedade privada ou no domínio, público ou privado, municipal, desde que, em qualquer dos casos, a publicidade se aviste da via pública - ruas, estradas, caminhos, avenidas, praças e todos os demais lugares onde transitem livremente peões ou veículos, conforme vem expressamente enunciado no art. 86.º, n.º 2, do Regulamento de Taxas do Município de Loures.
8ª. Deste modo, o pagamento de cada uma das referidas taxas representa uma contrapartida de diferentes utilidades ou benefícios que o Município de Loures coloca à disposição do respectivo sujeito passivo, verificando-se “in casu” os pressupostos para o pagamento das duas taxas, não se colocando aqui nenhum problema de dupla tributação (vide Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. III, 6.ª edição, 2011, pág. 528; acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional n.º 177/2010, de 05.05.2010; acórdão do Pleno da Secção do CT do STA, de 293.03.2017, processo n.º 01091/16; e, acórdãos do STA, de 20.11.2010, processo n.º 0513/10, e de 17.04.2013, processo n.º 01154/12, a contrario sensu).
9ª. A Recorrente tem instalados no domínio público da Freguesia ... cinco painéis publicitários, cada um com a área de 24 m2, o comprimento de 8,20 m e a profundidade de 25 cm, sendo três painéis suportados por quatro pilares fixados no solo e dois painéis suportados por dois pilares fixados no solo, estando todos inseridos em sapatas de cimento com a área de 0,25 m2 e a profundidade de 1,20 m).
10ª. Assim, a Junta de Freguesia ... emitiu, em seu nome, relativamente ao ano de 2015, cinco taxas por ocupação da via pública, calculadas com base na área do painel publicitário de 24 m2, no valor total de € 5.040,00, e cinco taxas de publicidade, calculadas com base na mesma área, no valor total de € 7.824,00 (cfr. pontos n.ºs 4 e 5 do probatório).
11ª. Resulta dos autos que a Junta de Freguesia ... e ... emitiu, em nome da Recorrente, relativamente ao ano de 2014, oito taxas por ocupação da via pública, calculadas com base no número de postes em que assenta cada painel publicitário, e oito taxas de publicidade, calculadas com base na área do painel publicitário de 24 m2, pugnando a Recorrente ser esta a interpretação correcta do RTML, mas sem razão.
12ª. Na verdade, a Junta de Freguesia ... apenas deu cumprimento ao disposto nos arts. 67.º, al. g) e 75.º do RTML, já que a taxa de ocupação da via pública e a taxa de publicidade podem incidir sobre a área dos referidos painéis publicitários, dado que as mesmas visam tributar utilidades ou benefícios manifestamente distintos, não ocorrendo, por isso, uma situação de dupla tributação.
13ª. E também não se verifica qualquer erro no apuramento da base de incidência da taxa de ocupação da via pública, uma vez que o domínio público municipal, abrange o espaço aéreo sobrejacente ao solo, sendo certo que a publicidade encontra-se afixada no painel publicitário e não nos respectivos pilares ou na projecção do painel publicitário sobre o solo.
14ª. E, o facto de a Junta de Freguesia ... e ..., no ano de 2014, ter calculado a taxa de ocupação da via pública sobre um suporte publicitário com base no número de postes de cada suporte publicitário, ao invés de atender à área de cada painel publicitário, traduz-se num erro na interpretação e aplicação do artigo 67.º, al. g), do RTML, sendo certo que o princípio da igualdade não confere ao administrado um direito à igualdade na ilegalidade.
15ª. Aliás, como muito bem reflecte a douta sentença recorrida, a noção de suporte publicitário inclui também os respectivos pilares, fazendo-se incidir a taxa em questão sobre a totalidade da área ocupada por esses elementos no solo, no subsolo e no espaço aéreo do domínio municipal.
16ª. Deste modo, muito bem andou a douta sentença recorrida ao manter na esfera jurídica da recorrente, as liquidações efectuadas pela Junta de Freguesia ... relativas ao ano de 2015, não se verificando, ao invés do que pretende a recorrente, qualquer situação de dupla tributação.
Nestes termos e nos mais de direito, deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se na esfera jurídica da Recorrente as liquidações de taxas de ocupação da via pública, do período de tributação de 2015, no valor total de € 5.040,00.

O Ministério Público junto deste Supremo Tribunal emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.

Cumpre decidir.

Na sentença recorrida levou-se ao probatório a seguinte matéria de facto:
1. A Impugnante tem instalados no domínio público da Freguesia ... cinco painéis publicitários, cada um com a área de 24 m2, o comprimento de 8,20 m e a profundidade de 25 cm, sendo três painéis suportados por quatro pilares fixados no solo e dois painéis suportados por dois pilares fixados no solo, estando todos inseridos em sapatas de cimento com a área de 0,25 m2 e a profundidade de 1,20 m (cfr. artigos 8.º e 18.º da petição inicial, admitidos por acordo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
2. Através do ofício n.º ...03, de 08 de Abril de 2014, a Junta de Freguesia ... e ... comunicou à Impugnante, designadamente, que “(…)
[IMAGEM]
(…)” (cfr. ofício, de fls. 17 dos autos – numeração do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
3. Em anexo ao ofício descrito no ponto antecedente consta um quadro, onde se pode ler, designadamente, que “(…)
[IMAGEM]
(…)” (cfr. quadro, de fls. 18 dos autos – numeração do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
4. Através do ofício n.º ...92, de 08 de Maio de 2015, a Junta de Freguesia ... comunicou à Impugnante, designadamente, que “(…)

[IMAGEM]
(…)” (cfr. ofício, de fls. 11 dos autos – numeração do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
5. Em anexo ao ofício descrito no ponto antecedente consta um quadro, onde se pode ler, designadamente, que “(…)
[IMAGEM]
(…)” (cfr. quadro, de fls. 12 dos autos – numeração do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
6. No dia 13 de Maio de 2015, a Impugnante remeteu uma reclamação contra as liquidações de taxas de ocupação da via pública descritas nos pontos antecedentes (cfr. petição de reclamação e data aposta nessa petição, de fls. 13 e 14 dos autos – numeração do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
7. Através do ofício n.º ...15, de 16 de Junho de 2015, a Junta de Freguesia ... comunicou à Impugnante, designadamente, que “(…)
[IMAGEM]
(…)” (cfr. ofício, de fls. 15 e 16 dos autos – numeração do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
8. No dia 02 de Julho de 2015, a Impugnante remeteu a presente impugnação judicial a este Tribunal, via e-mail (cfr. data aposta no e-mail, de fls. 01 e 02 dos autos – numeração do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
Nada mais se levou ao probatório.

Há que conhecer do recurso que nos foi dirigido.
A questão aqui em apreciação já não é nova e foi mesmo anteriormente decidida por este Supremo Tribunal em sentido coincidente com o propugnado pela recorrente.
Na verdade, no processo n.º 1637/16.1BELRS decidiu-se esta mesma questão, que se encontrava em discussão entre as mesmas partes, sendo que a única diferença reside no facto de a taxa em cobrança dizer respeito ao ano de 2016, enquanto que nestes autos diz respeito ao ano de 2015. Assim, por uma questão de economia dar-se-á aqui pro reproduzido o que ali se disse:
Vem o presente recurso interposto pela impugnante, ora Recorrente A..., S.A., da decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida, visando as taxas de ocupação do espaço público aplicadas aos cinco painéis publicitários com 24 m2 cada um, referentes ao ano de 2016, liquidadas pela Junta de Freguesia ..., entidade ora Recorrida, no valor de €5.040. Para decidir pela improcedência da acção, considerou o Tribunal a quo, em resumo, que as taxas aplicadas sobre os cinco painéis publicitários com 24 m2 cada um, instalados na área do domínio público da Junta de Freguesia ... foram aplicadas duas taxas, uma taxa de publicidade ao abrigo do artigo 75.º do Regulamento de Taxas do Município de Loures (in DR II de 25 de setembro de 2009) e outra taxa de ocupação do espaço publico, ao abrigo do artigo 67.º, alínea g) do referido regulamento. Argumenta ainda que ―…a intenção do Regulamento é a de que a taxa traduza a remoção do obstáculo jurídico à utilização, para um fim privado de um espaço comum, que obviamente se não restringe ao espaço aéreo nem terrestre, mas engloba ambos nessa sua destinação temporária a um específico fim privado. Deste modo, surge sem qualquer apoio no texto regulamentar ou na teleologia normativa da instituição da taxa a posição da Impugnante, que entende a ocupação do espaço restrita à área ocupada no solo pelos suportes dos painéis, os pilares, no que erradamente assimila os termos de determinação e quantificação da taxa à sua razão de ser.‖ - cf. p. 7 da sentença sob recurso.
II. Do assim decidido, vem a ora Recorrente interpor recurso para este Supremo Tribunal, alegando que ―…as taxas de ocupação do espaço público deveriam ser calculadas sobre a área ocupada pelos pilares que suportam os painéis publicitários, uma vez que esta é a área que efectivamente ocupa o domínio público.‖, devendo por isso ser aplicado a taxa de publicidade prevista no artigo 75.º do Regulamento de Taxas do Município de Loures na medida em que esta também comtempla a ocupação do espaço publico. Sustenta, ainda, a Recorrente que a aplicação da segunda taxa prevista no artigo 67.º do citado Regulamento sob a epígrafe - “Utilização e aproveitamento do domínio municipal com construções ou instalações especiais” o beneficio obtido é o mesmo da taxa anteriormente referida uma vez que ―…não pode suceder sob pena de uma dupla tributação, o que é manifestamente ilegal em matéria de taxas.‖ - cfr. conclusão S da alegação de recurso. E termina peticionando a anulação do ato tributário impugnado.
III. Portanto, e de acordo com o teor das Conclusões apresentadas – as quais delimitam o objecto do recurso – a questão a apreciar consiste em saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de Direito por errónea interpretação e aplicação das normas do regulamento municipal, designadamente do disposto na alínea g) do artigo 67º do Regulamento de Taxas do Município de Loures, na redação em vigor na altura dos factos.
Vejamos, então.
IV. Comecemos por reconhecer que, apesar de incomum, e como bem sublinha a Recorrida, nem sempre existem obstáculos a que duas distintas taxas partilhem da mesma base de incidência e cálculo, conquanto o desiderato que pretendem prosseguir – portanto, o interesse em que se estriba o sinalagma de cada uma delas – seja devidamente autónomo e determinável por referência a uma tal base. E importa reconhecer, igualmente, que o domínio público municipal abrange o espaço aéreo sobrejacente ao solo, nos termos do artigo 1344.° do Código Civil – o que viabilizaria a posição proposta pelo município in casu – assim, entre outros, vd. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, lavrado em 26 de Março de 2009, no processo n.º 949/06, onde se conclui: “III. Não se pode concluir, todavia, que os municípios não sejam detentores de espaço aéreo sobrejacente ao seu domínio público, mormente, ao domínio público rodoviário e que sobre esse espaço os mesmos não possam ou não devam exercer seus poderes de administração, efectivando dessa forma seus direitos e interesses.” – disponível em www.dgsi.pt.
V. Todavia, quando se confronta a factualidade dos autos com a regulamentação elaborada pelo município para o efeito – o Regulamento de Taxas do Município de Loures, Publicado no Diário da República, 2.ª série — N.º 187 — 25 de Setembro de 2009 (doravante, o Regulamento) – não deixamos de nos surpreender pela particular redacção dada ao artigo 67.º de tal Regulamento, onde se pode ler:
“Artigo 67.º”
Utilização e aproveitamento do domínio municipal com construções ou instalações especiais A utilização e aproveitamento do domínio municipal com construções ou instalações especiais, está sujeita ao pagamento, no momento da emissão da licença, pelo utilizador, das respectivas taxas: a) Construções ou instalações provisórias por motivos de festejos ou outras celebrações, por m2 de domínio municipal utilizado e por dia - 0,80€ b) Acampamentos ocasionais, por dia e por unidade de ocupação - 2,00€ c) Quiosques, por m2 de domínio municipal utilizado e por mês - 8,00€ d) Bancas e expositores, por m2 de domínio municipal utilizado e por dia - 0,15€ e) Pavilhões por m2 de domínio municipal utilizado e por dia - 0,30€ f) Agências ou postos de venda de bilhetes, m2 de domínio municipal utilizado e por mês - 10,00€ g) Suportes publicitários, por m2 e por mês - 3,50€ h) Recintos itinerantes, por m2 e por dia - 0,30€ i) Recintos improvisados, por m2 e por dia - 0,35€ j) Outras construções ou instalações não incluídas nas alíneas anteriores, por m2 de domínio municipal utilizado e por dia - 0,25€.”
Quer dizer, todas as situações elencadas pelo normativo de incidência municipal se referem à implantação de várias modalidades de “construções” no solo, tomando, por isso mesmo, por referência o espaço ocupado por tais construções na superfície deste.
E, em simultâneo, a própria fixação do evento tributário se reporta aos “suportes publicitários”, parecendo abstrair da área dos cartazes ou painéis para se focar, uma vez mais, na implantação ou ligação destes ao solo.
VI. Esta conclusão sai ainda reforçada pelo contraste notório de tal norma regulamentar com aquela outra constante do artigo 75.º do mesmo diploma, onde, sob a epígrafe “Publicidade afecta a mobiliário urbano”, se pode ler: “Pela autorização de produção de publicidade em suporte publicitário, são devidas, pelo titular, no momento da emissão da autorização, as taxas que se seguem, a cobrar por m2 e por ano: a) Anúncios não luminosos - 50,00€ b) Anúncios luminosos ou directamente iluminados - 300,00€”.
Aqui, não só o desiderato sinalagmático expressamente identificado é a “publicidade”, como a base de incidência são os “anúncios”, por contraste com os “suportes publicitários” que definiam o tributo anteriormente referido e cuja legalidade da arrecadação surge aqui questionada. Quer dizer, a própria utilização de distintas expressões, assim como a diversidade de modelação das taxas e, por fim, já deixa entender que foi distinto o critério de cálculo de uma e de outra taxa.
VII. Acresce que o mencionado regulamento já possui no respectivo artigo 65.º a tributação associada, precisamente e como a epígrafe logo salienta, à “Utilização e aproveitamento do domínio municipal aéreo”, o que dificulta ainda mais a correção da leitura propalada pela Recorrida, devendo a mencionada tributação dos “suportes publicitários” encontrar-se aqui localizada para fundamentar o cálculo do mesmo, tal como ocorrido in casu.
VIII. Assim, entendemos como inevitável concluir que assiste plena razão à Recorrente quando contesta a liquidação da taxa aqui sindicada por referência ao espaço aéreo ocupado pelos suportes publicitários.
Como bem se sintetiza no Parecer do Ministério Público junto aos autos, “Daí que se nos afigure que em razão da sua inserção sistemática no regulamento municipal, o legislador deu prevalência à ocupação do solo por este equipamento para efeitos de avaliação da utilização e aproveitamento do domínio público municipal, servindo de elemento aferidor a área do solo que lhe está afeta. E assim sendo, a área a atender para este efeito será a área delimitada no solo pela projeção do painel, que impede a utilização desse espaço para outros fins.”.

Considerando que não há agora razões de facto e/ou de direito que imponham uma diferente solução que aquela anteriormente encontrada por este Supremo Tribunal, também agora se dará provimento a este recurso que nos vem dirigido.
Vem ainda neste recurso a recorrente pedir o reembolso todos os custos entretanto incorridos com a prestação de garantia para efeitos de suspensão do processo de execução n.º 72/16, instaurado pela Recorrida com referência às taxas de 2015.
Na presente impugnação não se encontra provada qualquer matéria de facto respeitante a tal prestação de garantia pelo que, o pedido não pode ser atendido.

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Supremo Tribunal em:
- conceder provimento ao presente recurso;
- revogar a decisão recorrida e,
- anular a liquidação das taxas de ocupação do espaço público aplicadas aos painéis publicitários, referentes ao ano de 2015, assim se concedendo procedência à presente impugnação,
-mais se indefere o pedido de reembolso das despesas incorridas devido à prestação de garantia.
Custas pelas recorridas em ambas as instâncias.
D.n.
Lisboa, 3 de Julho de 2024. – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia (relator) – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – Joaquim Manuel Charneca Condesso.