Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01044/13.8BESNT |
Data do Acordão: | 07/11/2024 |
Tribunal: | 1 SECÇÃO |
Relator: | FONSECA DA PAZ |
Descritores: | APRECIAÇÃO PRELIMINAR GUARDA NACIONAL REPUBLICANA PENSÃO DE REFORMA |
Sumário: | É de admitir a revista se o acórdão recorrido não contém um raciocínio claro, nem uma fundamentação sólida e consistente e, aparentemente, padece de erros de subsunção jurídica que faz, legitimamente, duvidar do acerto da posição que nele se adoptou. |
Nº Convencional: | JSTA000P32547 |
Nº do Documento: | SA12024071101044/13 |
Recorrente: | CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, I.P. |
Recorrido 1: | AA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | ACORDAM NA FORMAÇÃO DE APRECIAÇÃO PRELIMINAR DA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO: 1. AA intentou, no TAF, contra a Caixa Geral de Aposentações, IP (doravante CGA), acção administrativa especial, onde pediu a anulação do acto, de 10/5/2013, da Direcção da CGA, que lhe reconheceu o direito à aposentação e fixou o montante da respectiva pensão, bem como a condenação da entidade demandada a emitir decisão que respeite o regime transitório de que beneficiava estabelecido pelo art.º 3.º, n.º 1, do DL n.º 159/2005, de 20/9 e art.º 285.º, als. a) e c), do EMGNR, aprovado pelo DL n.º 279/2009, de 14/10. Foi proferida sentença que, julgando a acção procedente, anulou o acto impugnado e condenou “a Ré a emitir decisão de conteúdo equivalente àquele, que respeite o regime transitório, nos termos acima referidos, de que o Autor beneficia; e a ter em consideração tempo de descontos efectuados pelo A, com as respetivas consequências.” A entidade demandada apelou para o TCA-Sul, o qual, por acórdão de 19/3/2024, negou provimento ao recurso, confirmando a sentença. É deste acórdão que a CGA vem pedir a admissão do recurso de revista. 2. Tem-se em atenção a matéria de facto considerada pelo acórdão recorrido. 3. O art.º 150.º, n.º 1, do CPTA, prevê que das decisões proferidas em 2.ª instância pelos tribunais centrais administrativos possa haver excepcionalmente revista para o STA “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”. Como decorre do texto legal e tem sido reiteradamente sublinhado pela jurisprudência deste STA, está-se perante um recurso excepcional, só admissível nos estritos limites fixados pelo citado art.º 150.º, n.º 1, que, conforme realçou o legislador na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs. 92/VIII e 93/VIII, corresponde a uma “válvula de segurança do sistema” que apenas pode ser accionada naqueles precisos termos. A sentença, para fixar o objecto do litígio, considerou o seguinte: “O Autor veio, a fls. 86, referir que com o pedido anulatório pretendia dois efeitos do acto anulando: o cálculo correcto da sua pensão de reforma; e a dívida de 11.325,74 €, referida no ponto 13 da PI, de que a Ré entende ser credora. O primeiro desses intentos – o cálculo – já foi obtido por iniciativa da própria Ré, que procedeu ao recálculo da pensão, e o seu novo valor encontra-se correcto. No entanto, a Ré continua sem dar razão ao Autor, na contagem do tempo de serviço e no seu entendimento de que o Autor lhe deve a quantia de € 11.325,74. Pelo que a utilidade da presente lide se mantém apenas quanto a este aspecto – o reconhecimento de que o despacho anulando não ponderou correctamente o tempo de serviço do A., pretendendo que este lhe pague o que não é devido. Ora, importa desde já referir que, esta nova delimitação do objecto do pedido apenas inutiliza a necessidade de decisão sobre o cálculo, mas, tendo o A. mantido o demais, o tribunal terá de conhecer de fundo praticamente toda a matéria e o seu regime, pois o cálculo é um mero pormenor desse conjunto”. Para tanto, a sentença, após entender que “a situação do A. se subsume na previsão do art.º 285.º, al. a), do DL n.º 297/2009, de 14/10” por, considerando a bonificação de tempo, ter completado 36 anos de serviço até 31/12/2005, concluiu pela inexistência de fundamento para a exigência da quantia de € 11.325,74, dado que ao caso se aplicava o regime do EMGNR de 1993 e porque “o A. já descontou para a CGA num total de 40 anos e 9 meses” e uma vez que o art.º 10.º, n.º 2, do DL n.º 160/2004, de 20/7, o dispensava do pagamento de quota. O acórdão recorrido, depois de referir que, de acordo com princípio “tempus regit actum”, o DL n.º 3/2017, de 1/1 – com base no qual a CGA procedera á rectificação da pensão do A. –, não tinha aplicação ao caso em apreço, por a acção ter sido intentada em 2013 e o requerimento da passagem à reforma datar de 19/6/2012, confirmou a sentença com a seguinte fundamentação: “(…). O Recurso em análise resulta pois da discordância da CGA relativamente ao decidido em 1ª Instância, onde se reconheceu ao recorrido o direito à aposentação, fixando-se o correspondente valor da pensão, mais se tendo condenado aquela a emitir decisão que respeite o regime transitório de que o Recorrido beneficiará, atentos os descontos efetuados Em síntese, o Recorrido em 31 de Dezembro de 2005, detinha já as condições para a sua passagem à reforma, impondo-se apenas verificar qual seria o regime legal aplicável, e se subsistiria alguma dívida à CGA. Com efeito, permaneceu controvertida a questão de saber se se manteria alguma divida, nomeadamente no valor de €11.325,74, reclamada pela CGA. Em qualquer caso, é a própria recorrente quem afirma que em 31 de Dezembro de 2005, o recorrido somava 31 anos e 5 meses de tempo efetivo e que depois disto prestou mais 7 anos e 4 meses também de tempo efetivo, sendo que em oficio de 15 de Fevereiro de 2017, a CGA fixou o tempo de serviço efetivo do Recorrido em 38 anos e 10 meses e como tempo de percentagem 7 anos e 5 meses, num total de 46 anos e 3 meses, o que significa insofismavelmente que o Recorrido, mesmo na perspetiva da CGA tem tempo de serviço efetivo, com os correspondentes descontos, suficiente para que não haja lugar ao pagamento de qualquer dívida, em linha com o decidido em 1ª Instância”. A entidade demandada justifica a admissão da revista com a necessidade de se proceder a uma melhor aplicação do direito, por as instâncias terem ignorado a aplicação do disposto no art.º 28.º, do Estatuto da Aposentação – de que decorre que apenas pode ser contado para a aposentação o tempo de serviço em relação ao qual tenham sido ou venham a ser pagas as quotas correspondentes – e que a Lei n.º 9/2002, de 1/2, apenas se aplica ao tempo de serviço prestado pelos ex-combatentes, incorrendo, por isso, em erro de julgamento por violação do princípio da contributividade, previsto no art.º 54.º, da Lei n.º 4/2007, de 16/1 (que aprovou as Bases da Segurança Social), bem como os artºs.13.º, n.º 2, 25.º, al. c), 28.º, n.º 1 e 29.º, n.º 2, todos do referido Estatuto, por a contagem do tempo por bonificação estar sempre sujeito a quotização, não se alcançando as razões que levaram o acórdão recorrido a decidir em sentido contrário. É verdade que, como nota a entidade demandada, o acórdão recorrido não prima pela clareza, não contém uma fundamentação sólida e consistente e, aparentemente, padece de erros de subsunção jurídica que faz, legitimamente, duvidar do acerto da posição que nele se adoptou. Deve, pois, o Supremo reanalisar o caso para uma melhor indagação e, eventualmente, uma melhor decisão numa matéria que, suscitando interrogações jurídicas, reclama uma clarificação de directrizes, assim se quebrando a regra da excepcionalidade da admissão das revistas. 4. Pelo exposto, acordam em admitir a revista. Sem custas. Lisboa, 11 de julho de 2024. – Fonseca da Paz (relator) – Teresa de Sousa – José Veloso. |