Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0235/23.8BEPRT
Data do Acordão:07/03/2024
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P32483
Nº do Documento:SA2202407030235/23
Recorrente:AA
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
AA, Recorrente no processo à margem identificado, tendo sido notificada do acórdão proferido por este Supremo Tribunal Administrativo (“Acórdão Reclamado”), vem, ao abrigo do disposto no artigo 615.º, nº. 1, alínea b) e 4, e no artigo 685.º, do Código de Processo Civil (“CPC”) (ex vi artigos 2.º, alínea e), e 281.º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”)), apresentar reclamação do referido Acórdão, com fundamento em nulidade por vício de falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:

1. O presente recurso excecional de revista foi interposto de acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte (“TCAN”) que indeferiu a arguição de nulidade por vício de omissão de pronúncia quanto às questões (i) da fixação da data a que deve reportar-se in casu a declaração em falhas da dívida exequenda e (ii) do conhecimento da prescrição do crédito tributário (“Acórdão Recorrido”).
No Acórdão Recorrido, o TCAN decidiu expressamente que o processo de reclamação judicial regulado nos artigos 276.º e ss. do CPPT consubstancia um contencioso de mera anulação, cabendo apenas aos tribunais tributários, nessa sede, manter na ordem jurídica o ato reclamado ou determinar a sua anulação total ou parcial. Com base nesta interpretação, concluiu então o TCAN que não estava verificado o vício de omissão de pronúncia imputado ao Acórdão Recorrido, já que o Tribunal não dispunha de poderes para conhecer das questões subjacentes à nulidade arguida.
Efetivamente, lê-se no Acórdão Recorrido o seguinte: «Mas, com o devido respeito, não lhe assiste razão, porquanto a solução jurídica adoptada no decisório do Acórdão não podia ser outra, ou seja, não podia deixar de ter a limitação que constitui a base da arguição da nulidade sob análise, por tal ser inerente a um contencioso de mera de anulação, no qual se insere o presente meio processual, “reclamação de actos do órgão de execução fiscal”. […] Assim, o Tribunal apenas dispõe, em sede impugnatória de actos praticados na execução fiscal, de poderes de anulação ou declaração de nulidade dos mesmos, apenas lhe cabendo considerar o acto reclamado legal ou ilegal, à luz da fundamentação contextual integrante do mesmo, e, em consequência, mantê-lo ou anulá-lo (ou declarar a sua nulidade ou inexistência), como, efectivamente, foi decidido no caso vertente. […] Em conclusão, não enferma o Acórdão proferido nos autos do apontado vício que legitime a arguição de nulidade em análise, que, assim, terá de ser desatendida, o que se decidirá seguidamente
2. Sejamos, pois, claros. O TCAN indeferiu a nulidade arguida pela aqui Recorrente com um único fundamento (errado), qual seja, a circunstância de (alegadamente) os tribunais tributários, em sede de reclamação judicial, disporem de poderes de mera anulação. É desta decisão – que indeferiu a nulidade por vício de omissão de pronúncia com o fundamento referido – que foi interposto o presente recurso excecional de revista.
3. De facto, das alegações do presente recurso excecional de revista resulta inequívoco que a questão fundamental de direito submetida à apreciação deste Supremo Tribunal Administrativo cinge-se ao âmbito dos poderes de cognição dos tribunais tributários em sede de processo de reclamação judicial.
Em concreto, pretende a Recorrente que o Supremo Tribunal Administrativo profira acórdão através do qual clarifique que, no âmbito do processo de reclamação judicial, os tribunais tributários têm poderes para fixar a data em que deveria ter sido declarada em falhas da dívida exequenda, bem como, a data em que se verificou a prescrição da obrigação tributária.
Sucede que:
4. Analisado o teor do Acórdão Reclamado, constata-se que o Tribunal decidiu não admitir o presente recurso excecional de revista em virtude de a questão controvertida submetida à sua apreciação ter por referência um acórdão que se pronunciou sobre uma nulidade arguida pela Recorrente.
De facto, lê-se no Acórdão Reclamado o seguinte:
«Como facilmente se depreende deste discurso fundamentador, dificilmente poderia o presente recurso eleger uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental, uma vez que se trata de uma apreciação de nulidades direccionadas a anterior acórdão, ou seja, a apreciação das nulidades terá sempre que ser feita face ao concretamente decidido no acórdão anterior, bem como à sua fundamentação, e, nessa medida, dificilmente se conseguiria retirar uma doutrina que viesse a ser útil para casos posteriores.»
5. Contudo, não é invocado no Acórdão Reclamado nenhum fundamento de facto ou de direito que permita perceber a razão pela qual o recurso excecional de revista não pode ser interposto de acórdão que tenha apreciado a arguição de nulidade de uma decisão jurisdicional.
Porque assim é, o Acórdão Reclamado padece de um vício de falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, que determina a respetiva nulidade (artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPC).
Termos em que deve ser concedido provimento à presente Reclamação, devendo ser conhecida e suprida a nulidade do Acórdão Reclamado por vício de falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão.

Decidindo dir-se-á:
Ao contrário do referido pela reclamante, a fundamentação do acórdão que não admitiu a revista não se reduz ao reproduzido nesta reclamação.
A revista não foi admitida com os seguintes fundamentos:
Como facilmente se depreende deste discurso fundamentador, dificilmente poderia o presente recurso eleger uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental, uma vez que se trata de uma apreciação de nulidades direccionadas a anterior acórdão, ou seja, a apreciação das nulidades terá sempre que ser feita face ao concretamente decidido no acórdão anterior, bem como à sua fundamentação, e, nessa medida, dificilmente se conseguiria retirar uma doutrina que viesse a ser útil para casos posteriores. Por outro lado, no caso concreto relevou-se para o indeferimento da nulidade arguida a impugnação da matéria de facto relevada no anterior acórdão o que estava vedado no acórdão que conhece das nulidades, trata-se, como também ali se diz, de um erro de julgamento.
Lido o anterior acórdão, este limitou-se a anular o acto proferido pelo órgão de execução fiscal para que fosse praticado novo acto acrescido da discussão da matéria de facto que se considere relevante para o deferimento ou indeferimento da pretensão dirigida ao órgão de execução fiscal e, nessa medida, mais uma vez, trata-se ainda de resolver qual a matéria de facto relevante para a decisão. Ou seja, os pedidos formulados a este Supremo Tribunal no âmbito deste recurso contende com apreciação da matéria de facto o que lhe está legalmente vedado.
Nesta medida o recurso não está em condições de ser admitido.

Bastaria o facto de ser necessário reapreciar ou apreciar ex novo alguma matéria de facto, ainda que irrelevante, para que este Supremo Tribunal estivesse impedido de admitir o presente recurso.
Assim, também não assiste agora razão à reclamante, como já anteriormente não lhe assistia razão ao ter deduzido recurso de revista nos precisos termos em que o fez.

Pelo exposto indefere-se a reclamação que nos vinha dirigida.
Custas pela reclamante fixando-se a t.j. em 3 ucs.
D.n.

Lisboa, 03 de julho de 2024. – Aragão Seia (relator) – Isabel Marques da Silva – Francisco Rothes