Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0530/18.8BEALM |
Data do Acordão: | 05/08/2024 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | PEDRO VERGUEIRO |
Descritores: | IMPUGNAÇÃO JUDICIAL IRS RENDIMENTO CATEGORIA FISCAL ENGLOBAMENTO |
Sumário: | I - As mais ou menos valias previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, têm regime diverso das previstas alíneas b), e), f) e g) do citado preceito, dado que, só relativamente às mais ou menos valias previstas nas alíneas b), e), f) e g), do n.º 1 do artigo 10.º é possível, ao sujeito passivo, optar pelo englobamento, sendo as mais ou menos valias previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, de englobamento obrigatório ainda que apenas por 50% (cfr. artigos 43º nº 2 e 22º nº 1 do CIRS). II - Embora os rendimentos de uma determinada categoria, se forem positivos, sejam, em princípio, comunicáveis aos rendimentos das outras categorias, já não são comunicáveis se forem negativos, devendo, antes, a perda sofrida ser reportada, para efeitos da respectiva dedução, aos eventuais rendimentos positivos apurados na mesma categoria nos anos posteriores. III - Contrariamente ao decidido, o artigo 55.º do CIRS não é facultativo, e a utilização do verbo “pode” apenas se refere ao reporte de perdas caso o contribuinte opte pelo englobamento, sendo essa é a única possibilidade de opção que a lei (artigo 22º nº 3, al. b) e artigo 72º n.ºs 4 e 8 do CIRS) atribui ao contribuinte - englobar ou não os rendimentos previstos nas alíneas b), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 10.º do citado Código do IRS, verificando-se que se o contribuinte optar pelo englobamento, pode reportar as perdas para os dois anos seguintes, caso contrário não poderá fazer o reporte das perdas nos dois anos seguintes. IV - A lei permite, apenas, que o saldo negativo das alienações onerosas de partes sociais e outros valores mobiliários, seja reportado para os dois anos seguintes, caso o contribuinte tenha optado pelo englobamento no ano em que o mesmo se verificou e caso, nos anos seguintes, existam mais-valias (saldo positivo) provenientes, também, da alienação onerosa de partes sociais e outros valores mobiliários. |
Nº Convencional: | JSTA000P32223 |
Nº do Documento: | SA2202405080530/18 |
Recorrente: | AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA |
Recorrido 1: | AA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Processo n.º 530/18.8BEALM (Recurso Jurisdicional) Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. RELATÓRIO O Excelentíssimo Representante da Fazenda Pública, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, datada de 18-12-2023, que julgou parcialmente procedente a pretensão deduzida por AA no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com o despacho de indeferimento da reclamação graciosa, proferido pelo Chefe de Divisão da Direcção de Finanças de Setúbal, referente à liquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), relativa ao ano de 2013. Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “ (…) A. Sem quebra do devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o decidido na, aliás, Douta Sentença do Tribunal a quo, que julgou parcialmente procedente a presente Impugnação e determinou a anulação do ato de liquidação de IRS impugnado e correspondentes juros compensatório e a decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa contra aquele deduzida, na parte correspondente ao apuramento dos rendimentos da categoria G; B. Não se pode concordar com a afirmação do Tribunal recorrido, de que C. "(…) considerando a redação e a inserção sistemática do artigo 55.º do CIRS, (…) não pode esta norma servir de base para justificar a impossibilidade de conciliação entre os saldos das mais e das menos-valias apuradas pelo Impugnante no ano de 2013."; D. Se assim fosse, o legislador não teria sentido necessidade de introduzir, no Código de IRS, os n.ºs 5 e 6 no artigo 55.º, que se aplicam a diferentes tipos de mais valias E. Com efeito, atento o disposto nos n.ºs 5 e 6 do artigo 55.º, na redação vigente ao tempo, conjugado com o artigo 43.º, n.º 2 do CIRS é evidente que as mais ou menos valias previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, têm regime diverso das previstas alíneas b), e), f) e g) do citado preceito; F. Pois que só relativamente às mais ou menos valias previstas nas alíneas b), e), f) e g), do n.º 1 do artigo 10.º é possível, ao sujeito passivo, optar pelo englobamento, sendo as mais ou menos valias previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, de englobamento obrigatório ainda que apenas por 50% (cf. artigos 43.º, n.º 2 e 22.º, n.º 1 do CIRS); G. No mesmo sentido veja-se o referido por Francisco Jorge Comprido Gomes de Lima, in “A Tributação de Mais-Valias da Alienação de Acções: Evolução Legislativa e Desafios Fiscais num Panorama de Crise Económica”, 2013, que refere que a lei no “(…) regime das mais-valias constituídas mediante a venda/aquisição de ações é a de optar pela tributação mediante a aplicação de uma taxa especial de 28% do saldo positivo obtido nesse ano ao invés de estarem sujeitos ao englobamento (o artigo 22º, nº3 do CIRS exclui este tipo de rendimentos do englobamento obrigatório), sendo que nas circunstâncias em que estejamos perante uma Menos-Valia pois aí já será possível a dedução da perda, a reportar nos 2 anos seguintes, caso o Sujeito tenha optado pelo regime do englobamento. - cfr art.55º, nº6 do CIRS.”; H. Também na decisão arbitral proferida no processo 747/2015-T, de 25.05.2016 é referido que na redação vigente ao tempo dos factos, “(…) o nº 6 do artigo 55º do CIRS dispunha no sentido seguinte: "o saldo negativo apurado num determinado ano, relativo às operações previstas nas alíneas b), e), f) e g) do nº 1 do artigo 10º, pode ser reportado para os dois anos seguintes, aos rendimentos com a mesma natureza, quando o sujeito passivo opte pelo englobamento". I. Não sendo demais referir que o n.º 6, foi aditado ao artigo 55.º do CIRS pelo Decreto-Lei n.º 228/2002, de 31 de outubro que foi alterado pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de dezembro, que, no n.º 4 do seu artigo 26.º lhe conferiu natureza interpretativa; J. Também o Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão de 24.02.2010, Processo n.º 01085/09 refere que a regra estabelecida n.º 1º do artigo 55.º “(…) sofre as excepções constantes dos números seguintes do mesmo artigo [excepções que, no dizer de André Salgado Matos- Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, Anotado, 1999, Nota 2 ao art. 54º, pag. 329 - e reportando se o autor à redacção que então constava no art. 54º) quase que esvaziam a regra do nº 1, "estabelecendo a incomunicabilidade dos resultados líquidos negativos apurados precisamente nas categorias em que eles são mais susceptíveis de ocorrer. Trata-se de uma enorme brecha no carácter unitário do IRS e uma concessão muito extensa à cedularidade."]."; K. Pelo exposto é de concluir que, contrariamente ao decidido na sentença ora sobre recurso, o artigo 55.º do CIRS não é facultativo, e a utilização do verbo "pode" apenas se refere ao reporte de perdas caso o contribuinte opte pelo englobamento; L. Essa é a única possibilidade de opção que a lei (cf. artigo 22.º, n.º 3, al. b) e artigo 72.º, n.ºs 4 e 8 do CIRS) atribui ao contribuinte - englobar ou não os rendimentos previstos nas alíneas b), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 10.º do citado Código do IRS; M. Se o contribuinte optar pelo englobamento, pode reportar as perdas para os dois anos seguintes, caso contrário não poderá fazer o reporte das perdas nos dois anos seguintes; N. A lei não permite que as perdas (menos valias) sejam compensadas com as mais valias resultantes da alienação de bens imóveis; O. Não dando, também, a lei, a faculdade ao contribuinte, ou à Autoridade Tributária e Aduaneira, possibilidade de optar pela dedução das perdas (menos valias) resultantes da alienação de participações sociais, no mesmo ano em que foram realizadas; P. Ao decidir, como decidiu, o Douto Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento de Direito porquanto fez errónea interpretação e aplicação do disposto no n.º 6 do artigo 55.º do CIRS. Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.ªs Ex.ªs se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e em consequência ser a douta Sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que julgue TOTALMENTE IMPROCEDENTE a presente impugnação, tudo com as devidas e legais consequências.” O Recorrido AA apresentou contra-alegações, nas quais enuncia as seguintes conclusões: “(…) 1. O Recorrido procedeu à alienação de direitos reais sobre imóveis e de partes sociais, no ano de 2013, como resulta das alíneas A), J) e K) da matéria de facto provada, e como resultado dessas operações decorre a) Uma mais-valia na venda dos imóveis (cfr. venda das partes sociais, determinado por subtração do valor de aquisição ao valor de realização, descontadas as despesas (cfr. alíneas A) e K) da matéria de facto provada). 2. Resulta do art. 10º do CIRS que a mais ou a menos-valia apurada é a que resulta da diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição acrescido das despesas que foram necessárias e efetivamente praticadas inerentes à alienação das operações. 3. Ora, conforme resulta da declaração de IRS apresentada no 24/10/2014, relativamente à alienação dos prédios, a mais valia corresponde à diferença entre o valor da alienação (€1.160.000,00) e o valor de aquisição (€655,288,97) deduzido o valor das despesas (€48.719,99) - cfr. alíneas A) e J) dos factos provados. 4. Quanto à alienação das partes sociais, conforme resulta da declaração de IRS apresentada, verifica-se uma menos valia no valor de €521.054,21, resultante da diferença entre o valor da alienação (€1.432.200,00) e o valor de aquisição (€1.940.650,00) deduzido o valor das despesas (€3.604,04) - cfr. alíneas A) e K) dos factos provados. 5. Isto é, da alienação dos imóveis verificou-se uma mais-valia e da alienação das partes sociais verificou-se uma menos-valia. 6. O nº 1 do art. 43º do CIRS, contrariamente ao nº 6 do art. 55º do mesmo diploma legal, não exige que o saldo a apurar seja entre rendimentos com a mesma natureza. 7. Aquela norma apenas refere que tem de se considerar o saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, nada mais acrescentando. 8. Não há lugar à aplicação do art. 55º do CIRS uma vez o que o Recorrido aqui pretende é que o saldo negativo resultante da alienação das partes sociais seja reportado no próprio ano, e não nos anos seguintes. 9. Nem se poderá aplicar analogicamente aquele preceito uma vez que a analogia, nos termos do art. 10º do Código Civil, pressupõe uma omissão do legislador, o que no caso em apreço não se verifica uma vez que a situação vem regulada no nº 1 do art. 43º do CIRS. (cfr. Galvão Telles in Introdução ao Estudo do Direito - Vol I - 11ª ed., Reimpressão - Coimbra Editora, pags. 261 e 262). 10. Conjugados o n° 1 do art. 43º e o nº 6 do art. 55º do CIRS o que se depreende é que: i) quando é apurado um saldo negativo e se pretende fazer o englobamento nesse mesmo ano, poderá considerar-se rendimentos de natureza diferente, ii) quando o saldo é negativo e pretende-se fazer o englobamento nos anos seguintes, apenas poderá considerar-se rendimentos com a mesma natureza. 12. o nº 1 do art. 43 º do CIRS é claro ao referir que o valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, sem qualquer referência adicional quanto à natureza dos rendimentos. 13. Mais se acrescenta que, uma interpretação extensiva do nº 1 do art. 43º do CIRS, conjugado com o nº 6 do art. 55º do mesmo diploma legal, estaria totalmente esvaziada de conteúdo por falta de correspondência verbal mínima na letra da lei. 14. Tal interpretação é violadora do princípio da tipicidade fiscal (cfr. artigo 55º da LGT e n.º 2 do artigo 266º da CRP). Nestes termos e com o sempre mui douto suprimento de Vossas Excelências deverá a decisão proferida pelo Tribunal a quo ser mantida e o recurso ser julgado totalmente improcedente. ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA!” O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso. Cumpre decidir. 2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a matéria apontada nos autos resume-se, em suma, em indagar da bondade da decisão recorrida que determinou a anulação parcial da liquidação de IRS impugnada e correspondentes juros compensatórios e a decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa contra aquela deduzida, na parte correspondente ao apuramento dos rendimentos da categoria G sujeitos a englobamento. 3. FUNDAMENTOS 3.1. DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: “… A) Em 16/09/2014, o Impugnante procedeu à entrega da declaração modelo 3 de IRS, respeitante ao ano de 2013, inscrevendo no anexo G (mais-valias), nos quadros 4 e 8 o seguinte: [IMAGEM] (…) [IMAGEM] (cfr. documento de fls. 63 a 64 dos autos); B) O Impugnante declarou, no anexo G da declaração referida em A), optar pelo englobamento dos rendimentos incluídos no quadro 8 (cfr. documento de fls. 63 a 64 dos autos); C) Na declaração de IRS, identificada em A), o Impugnante declarou, no anexo A, ter auferido rendimentos resultantes do trabalho dependente no valor de €11.497,00 (facto não controvertido, que se extrai do relatório de fls.69 a 87 e admitido pelo Impugnante na petição inicial - artigo 6.º) D) Em resultado da declaração referida na alínea anterior foi emitida a liquidação de IRS, sobretaxa e juros compensatórios n.º ...76, no valor de € 245.217,43, com data limite de pagamento em 29.10.2014 (facto não controvertido, que se extrai do projeto de decisão de fls.89 a 95 e admitido pelo Impugnante na petição inicial - artigo 2.º); E) Em 24/10/2014, o Impugnante procedeu à entrega de declaração de substituição da declaração de IRS identificada em A), a fim de corrigir os valores anteriormente declarados no quadro 4 do anexo G (mais-valias), passando a constar os seguintes valores: (…) [IMAGEM] (…) (cfr. documento de fls. 65 a 66 dos autos); F) Em 26.02.2015, o Impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação de IRS identificada em D), que deu origem ao processo de reclamação graciosa n.º ...17 (cfr. documento de fls. 47 a 60 dos autos); G) Em 24.03.2015, foi desencadeado procedimento de inspeção externo, para o período de 2013, em relação ao IRS, que decorreu entre 26.01.2017 e 22.09.2017 (cfr. documento de fls. 69 a 87 dos autos); H) Em 23.10.2017, no âmbito da inspeção identificada em G), o serviço de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Setúbal elaborou o respetivo “Relatório/Conclusões”, do qual, com relevo para os autos, constam as seguintes correções: “III. 1.1.3 - Síntese das correções Na sequência das correções propostas para o ano de 2013 ao longo dos pontos III.1.1.1 e III. 1.1.2, elabora-se o quadro abaixo com o resumo das mesmas: [IMAGEM] Deste modo, propõe-se que seja realizada uma correção ao rendimento global do sujeito passivo no montante de €167.998,22 (=€329.360,10 - €161.361,88), nos termos do n.º 4 do art.º 65.º do CIRS, relativa à omissão de proveitos das categorias F e G, conforme abaixo se discrimina: [IMAGEM] (a) nos termos do art.º 55.º, n.º 6 do CIRS, o saldo negativo resultante da alienação dos valores mobiliários em 2013 foi reportado para dedução de perdas nos dois anos seguintes, em rendimentos da mesma natureza, compensação entre esse saldo negativo e o saldo positivo da alienação de imóveis em 2013 (b) este montante atende às correções propostas junto do sujeito passivo, resultando da diferença entre a mais-valia inicial e a mais-valia corrigida, conforme cálculos que se expressam em (c); (c) a mais-valia corrigida resulta da diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, após correções, considerada em apenas 50% por aplicação do art.º 43.º, n.º 2 do CIRS, e atendendo ao coeficiente de correção monetária de 1,20 previsto no art.º 50.º do CIRS, bem como às despesas e encargos corrigidos previsos no art.º 51.º. A mais-valia tributada é calculada da seguinte forma: €321.466,66 = (€1.160.000,00 - €415.288,97 X1,20 - €18.719,91)/2” (cfr. documento de fls. 69 a 87 dos autos); I) Na sequência do procedimento inspetivo referido em G), foi processada uma “Declaração Oficiosa/DC”, passando a constar, do quadro 4, do anexo G, da declaração de rendimentos, referente ao ano de 2013, o seguinte: [IMAGEM] (cfr. documento de fls. 67 a 68 dos autos); J) A declaração referida na alínea anterior deu origem à liquidação n.º ...45, com cálculo de imposto a pagar no valor de €167.756,66, anulando parcialmente a liquidação identificada em D) (cfr. informação de fls. 89 a 95 dos autos); K) Em 14.02.2018, a Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal elaborou informação, propondo o indeferimento da reclamação graciosa a que se refere a alínea F), que aqui se dá por integralmente reproduzido e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor: “(…)” No que respeita ao vício da falta de fundamentação, há que reiterar o facto de a liquidação objeto dos autos ter assentado direta e imediatamente na declaração voluntariamente entregue pelo sujeito passivo e não em quaisquer correções feitas ou propostas pelos serviços da Administração Tributária. E, sendo esse o caso, não impendia sobre a Administração Tributária qualquer dever de fundamentação, pois que, nos termos da lei (designadamente do art.º 76º do CIRS), a liquidação tem por objeto o rendimento coletável determinado com base nos elementos declarados pelo contribuinte, pelo que aqui só poderão ser discutidos vícios ou erros relativos aos valores declarados e não já a um qualquer procedimento dos serviços que, como constatámos, não está na origem da liquidação contestada. (…) Por conseguinte, tendo sido o sujeito passivo a declarar os montantes mencionados no anexo G, tal declaração presume-se verdadeira e prestada de boa fé nos termos do art.º 75.º da LCT, sem prejuízo do disposto no nº 4 do artº 65º do CIRS (poderes de correção por parte da administração tributária) ou da possibilidade de o contribuinte afastar a presunção legal mediante prova em contrário. Pelo que não tem fundamento o invocado vício de falta de fundamentação. Quanto ao erro na quantificação e qualificação dos rendimentos da categoria G: No que respeita aos valores declarados no anexo G da declaração inicial, não iremos pronunciar-nos, uma vez que os mesmos foram objeto de correção posterior, quer na sequência da declaração de substituição apresentada pelo reclamante em 24/10/2014 (que não chegou a produzir efeitos) quer na sequência do procedimento inspetivo (cujos vícios só podem ser invocados em sede de reclamação/impugnação do ato de liquidação subsequente). Pelo que a análise se irá centrar no regime de comunicabilidade perdas verificadas na Categoria G. Foram ainda apuradas perdas resultantes de transações com valores mobiliários no montante de € 512.054,04 (2), que constam na liquidação como "perdas a reportar". Entende o reclamante que estas perdas são igualmente comunicáveis ao saldo positivo das mais valias imobiliárias, sob pena de se estar a fazer, em seu entender, uma interpretação extensiva do nº 1 do artº 43º do CIRS ou uma interpretação analógica do nº 6 do artº 55º do CIRS. Mas não tem razão. Dispõe o artº 43º nº 1 do CIRS que: "O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos seguintes." (negrito nosso) Do que resulta que para o apuramento das mais e menos valias há que atender ao disposto nas normas seguintes, mais concretamente ao disposto nos artºs 44º a 52º que se reportam às respetivas regras de cálculo. Regras essas que foram aplicadas na liquidação, tendo por base os valores declarados pelo sujeito passivo. A dedução de perdas, no entanto, constitui uma secção distinta na organização sistemática do CIRS, inserida também ela no capítulo da determinação do rendimento coletável. E, no que toca aos rendimentos da categoria G, dispõe esta norma que: "5 - A percentagem do saldo negativo a que se refere o n.º 2 do artigo 43.º só pode ser reportada aos cinco anos seguintes àquele a que respeita, deduzindo-se aos resultados líquidos da mesma categoria. 6 - O saldo negativo apurado num determinado ano, relativo às operações previstas nas alíneas b), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 10.º, pode ser reportado para os dois anos seguintes, aos rendimentos com a mesma natureza, quando o sujeito passivo opte pelo englobamento. Do que resulta que, por força do n.º 5, as perdas resultantes das transações de bens imóveis são dedutíveis aos resultados líquidos da categoria G e, quando não seja possível deduzi-las, podem ser reportadas aos cinco anos seguintes. Razão porque, as perdas apuradas pelo reclamante no ano 2010, em resultado da alienação de um prédio, no valor de € 8.497,78 foram deduzidas às mais-valias apuradas no ano 2013 em resultado da venda de imóveis. Mas, no que toca às perdas apuradas em resultado de transações de partes sociais e outros valores mobiliários, dispõe o n.º 6, que as mesmas só são reportáveis para os dois anos seguintes e aos rendimentos com a mesma natureza. Do que resulta, por um lado, que o saldo resultante das operações previstas no artº 10.º n.º 1 als. b), e), f) e g) do CIRS, não é comunicável ao saldo das operações com bens imóveis e, por outro lado, que o mesmo só pode ser deduzido (nos dois anos seguintes) aos ganhos apurados em resultado de operações com a mesma natureza (as previstas no art.º artº 10.º n.º 1 als. b), e), f) e g) do CIRS). Razão porque as perdas apuradas em resultado das alienações de ações, declaradas pelo sujeito passivo, surgem na liquidação objeto dos autos como "perdas a reportar". Pelo que a liquidação foi feita em estrita conformidade com o regime de dedução de perdas previsto no artº 55º n.ºs 5 e 6 do CIRS, não tendo sido feita qualquer interpretação extensiva do art.º 43º n.º 1 (que não regula o regime de dedução de perdas) e, muito menos, uma interpretação analógica do n.º 6 do artº 55º do CIRS, uma vez que é esta a única norma que define o regime de dedução das perdas em sede de IRS, tendo sido feita uma aplicação direta e imediata da mesma. Pelo que, também, nesta parte, não tem fundamento o erro de quantificação dos rendimentos que vem invocado. 1) O cálculo foi efetuado por aplicação da seguinte fórmula: V. Realização - [(V.aquisição x Coef. 1,20) + Despesas] * 50% - artº 10º , nº 4 a), 43º nº 2, 44º f), 46º nº 1, 50º e 51º nº 1 a) do CIRS, Portaria nº 376/2013, de 30/12; (2) O cálculo foi efetuado por aplicação da seguinte fórmula: V. Realização - (V.aquisição + Desp.Alien) - artº 10º, nº 4 a), 44º n.º1 d), 48º e 51º nº 1 b) do CIRS; (…)” (cfr. informação de fls. 89 a 95 dos autos); L) Em 13.03.2018, a Direção de Finanças de Setúbal emitiu documento denominado de “INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR”, propondo a conversão do projeto de decisão de indeferimento em decisão definitiva (cfr. documento de fls. 111 dos autos); M) Em 18.03.2018, o Chefe de Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal proferiu despacho de concordância com a “INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR” a que se refere a alínea anterior, indeferindo a reclamação graciosa referida em F) (cfr. documento de fls. …. dos autos); N) Em 15.03.2018, a Direção de Finanças de Setúbal emitiu o ofício n.º ...91, dirigido ao mandatário do Impugnante, comunicando-lhe a decisão de indeferimento da reclamação graciosa referida em F) (cfr. documento de fls. 113 dos autos). * FACTOS NÃO PROVADOS Não existem factos não provados com interesse para a decisão da causa. *** MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.” «» 3.2. DE DIREITO Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de indagar da bondade da decisão recorrida que determinou a anulação parcial da liquidação de IRS impugnada e correspondentes juros compensatórios e a decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa contra aquela deduzida, na parte correspondente ao apuramento dos rendimentos da categoria G sujeitos a englobamento. Nas suas alegações, a Recorrente defende que o Tribunal a quo incorreu em erro no julgamento de direito, porquanto fez errónea interpretação e aplicação do disposto no nº 6 do art. 55º do CIRS, pois que, atento o disposto nos n.ºs 5 e 6 do artigo 55.º, na redação vigente ao tempo, conjugado com o artigo 43.º, n.º 2 do CIRS é evidente que as mais ou menos valias previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, têm regime diverso das previstas alíneas b), e), f) e g) do citado preceito, na medida em que, só relativamente às mais ou menos valias previstas nas alíneas b), e), f) e g), do n.º 1 do artigo 10.º é possível, ao sujeito passivo, optar pelo englobamento, sendo as mais ou menos valias previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, de englobamento obrigatório ainda que apenas por 50% (cf. artigos 43.º, n.º 2 e 22.º, n.º 1 do CIRS), além de que o nº 6, foi aditado ao artigo 55.º do CIRS pelo Decreto-Lei n.º 228/2002, de 31 de outubro que foi alterado pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de dezembro, que, no n.º 4 do seu artigo 26.º lhe conferiu natureza interpretativa; Assim, é de concluir que, contrariamente ao decidido na sentença ora sobre recurso, o artigo 55º do CIRS não é facultativo, e a utilização do verbo “pode” apenas se refere ao reporte de perdas caso o contribuinte opte pelo englobamento, sendo essa é a única possibilidade de opção que a lei (cf. artigo 22.º, n.º 3, al. b) e artigo 72.º, n.ºs 4 e 8 do CIRS) atribui ao contribuinte - englobar ou não os rendimentos previstos nas alíneas b), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 10.º do citado Código do IRS e se o contribuinte optar pelo englobamento, pode reportar as perdas para os dois anos seguintes, caso contrário não poderá fazer o reporte das perdas nos dois anos seguintes, verificando-se que a lei não permite que as perdas (menos valias) sejam compensadas com as mais valias resultantes da alienação de bens imóveis, nem dá ao contribuinte a faculdade, ou à Autoridade Tributária e Aduaneira, a possibilidade de optar pela dedução das perdas (menos valias) resultantes da alienação de participações sociais, no mesmo ano em que foram realizadas. Para conceder abrigo à pretensão do aqui Recorrido, a sentença posta em crise ponderou, além do mais, o seguinte: “(…) Em suma, o saldo dos incrementos patrimoniais resultante da alienação quer de bens imóveis, quer de participações sociais é apurado, numa primeira fase, operação a operação, e, numa segunda fase, pela soma de todos os saldos resultantes daquelas primeiras operações, independentemente da origem das mais ou menos-valias, determinando-se, desta forma, o montante que ficará sujeito a tributação (cf. artigo 43.º a 51.º do CIRS). Só após o apuramento do rendimento sujeito a tributação é que o sujeito passivo poderá, caso queira, deduzir eventuais perdas de anos anteriores, nos termos do disposto no artigo 55.º do CIRS. Por fim, resta referir que, enquanto o regime constante no artigo 43.º, n.º 1, do CIRS, é de aplicação obrigatória, impondo-se que o apuramento das mais-valias seja feito nos termos aí determinados, o regime do artigo 55.º, n.º 6, do CIRS, é facultativo, como resulta da utilização do verbo “pode”, estando dependente de uma opção por parte do sujeito passivo, não podendo tal opção ser feita pela Autoridade Tributária.”. (…) “Assim, considerando o quadro fáctico mencionado e o enquadramento jurídico anteriormente referido, resulta que, de acordo com o artigo 43.º, n.º 1, do CIRS, a matéria coletável dos rendimentos qualificados como mais-valias é apurada tendo por base o saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, independentemente da natureza das mesmas. Pelo que a liquidação impugnada deveria ter considerado o saldo resultante da diferença entre a mais-valia decorrente da alienação dos bens imóveis e a menos-valia respeitante à alienação das partes sociais. E, não tendo o feito, a razão está, aqui, com o Impugnante, pois que, ao não considerar o saldo assim apurado, o ato impugnado padece de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito, o que acarreta a sua anulação, devendo a liquidação de IRS do ano de 2013 ser corrigida, de modo a atender ao que se determinou. …”. Que dizer? Com interesse nesta matéria, a decisão recorrida começa por aludir a um conjunto de normas, desde logo, o artigo 10.º, n.º 1, alíneas a) e b), do CIRS, com a redação conferida pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro (Doravante, salvo indicação em contrário, as referências que se fizerem ao CIRS presumem-se feitas para a redação resultante da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, por ser a versão que se encontrava em vigor à data dos factos tributários em apreço), que estipula o seguinte: "1 - Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de: a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário; b) Alienação onerosa de partes sociais, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, e de outros valores mobiliários e, bem assim, o valor atribuído aos associados em resultado da partilha que, nos termos do artigo 81.º do Código do IRC, seja considerado como mais-valia; (…)” Por sua vez, a alínea a) do n.º 4 do referido artigo 10.º estabelecia que o ganho sujeito a IRS é constituído pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimento de capitais, considerando-se o mesmo obtido no momento da alienação (n.º 3). De acordo com os artigos 1.º, n.º 1 e 9.º, n.º 1, al. a) do CIRS, as mais-valias apuradas nos termos supra expostos constituem rendimentos da categoria G. Quanto à forma de determinação do rendimento coletável, o artigo 22.º, n.º 1, do CIRS, inserido no capítulo com a epígrafe “Determinação do rendimento coletável”, estatuía que “O rendimento colectável em IRS é o que resulta do englobamento dos rendimentos das várias categorias auferidos em cada ano, depois de feitas as deduções e os abatimentos previstos nas secções seguintes.” Em relação à forma de apuramento dos rendimentos da categoria G, dispunha o artigo 43º nº 1, do CIRS, que “O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos seguintes.”, referindo o nº 2 do mesmo preceito que “O saldo referido no número anterior, respeitante às transmissões efectuadas por residentes previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, positivo ou negativo, é apenas considerado em 50% do seu valor.”. No que respeita à dedução de perdas, estabelece o artigo 55º, inserido na seção e com a epígrafe com a mesma designação, nos seus n.ºs 1, 5 e 6, o seguinte: 1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, é dedutível ao conjunto dos rendimentos líquidos sujeitos a tributação o resultado líquido negativo apurado em qualquer categoria de rendimentos. (…) 5 - A percentagem do saldo negativo a que se refere o n.º 2 do artigo 43.º só pode ser reportada aos cinco anos seguintes àquele a que respeita, deduzindo-se aos resultados líquidos da mesma categoria. 6 - O saldo negativo apurado num determinado ano, relativo às operações previstas nas alíneas b), e), f) e g) do nº 1 do artigo 10º, pode ser reportado para os dois anos seguintes, aos rendimentos com a mesma natureza, quando o sujeito passivo opte pelo englobamento.”. Por fim, determinava ainda os n.ºs 4 e 8 do artigo 72.º, do CIRS, que: “(…) 4 - O saldo positivo entre as mais-valias e menos-valias, resultante das operações previstas nas alíneas b), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 10.º, é tributado à taxa de 28 %. (…) 8 - Os rendimentos previstos nos n.ºs 4 a 7 podem ser englobados por opção dos respetivos titulares residentes em território português. (…)”. Pois bem, nesta matéria, cremos que é inequívoco que as mais ou menos valias previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, têm regime diverso das previstas alíneas b), e), f) e g) do citado preceito, dado que, só relativamente às mais ou menos valias previstas nas alíneas b), e), f) e g), do n.º 1 do artigo 10.º é possível, ao sujeito passivo, optar pelo englobamento, sendo as mais ou menos valias previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, de englobamento obrigatório ainda que apenas por 50% (cfr. artigos 43º nº 2 e 22º nº 1 do CIRS). Neste ponto, crê-se pertinente o exposto por Francisco Jorge Comprido Gomes de Lima, “A Tributação de Mais-Valias da Alienação de Acções: Evolução Legislativa e Desafios Fiscais num Panorama de Crise Económica.”, 2013, a páginas 12 e seguintes, citado pela Recorrente, quando aponta que: “2.4) Regime de tributação das mais-valias provenientes de ações Os rendimentos obtidos através de mais-valias, decorrentes da alienação de ações pelos sujeitos passivos, são, na maioria das vezes, ganhos de valor consideravelmente elevados em relação ao valor inicial do bem. Ou seja, a tributação desse rendimento num único momento - o da venda e consequente realização da mais-valia – iria implicar uma carga fiscal, em certos casos, sobrecarregada suscetível de vir a penalizar os sujeitos que viessem a usufruir deste tipo de rendimentos, podendo vir a criar um efeito estático na venda das ações ou mesmo incitar à sua evasão. Por esta razão a lei veio a prever mecanismos de atenuação, tendo sido o próprio legislador sensível nesta questão, tendo inclusive, expressamente, referido no ponto 12 do preâmbulo ao Código do IRS, a propósito das mais-valias, que tratando-se de “rendimentos excecionais”, foi devidamente ponderado o regime tributário adequado em face da excessiva gravidade que a tributação englobada poderia gerar, prevendo-se, para esta categoria uma substancial dedução à matéria coletável. (…) Outra “benéfica” opção concedida pela Lei e aqui já aplicável ao regime das mais-valias constituídas mediante a venda/aquisição de ações é a de optar pela tributação mediante a aplicação de uma taxa especial de 28% do saldo positivo obtido nesse ano ao invés de estarem sujeitos ao englobamento (o artigo 22º, nº3 do CIRS exclui este tipo de rendimentos do englobamento obrigatório), sendo que no entanto a matéria coletável aqui a considerar – se optarem pelo englobamento - será composta pela totalidade dos rendimentos provenientes do saldo entre as mais-valias e as menos-valias resultantes das alienações de ações e não apenas em metade desse valor, o que de certa forma incentiva, de sobremaneira, a tributação por via da taxa especial, isto, lá está, no caso das Mais-Valias decorrentes da alienação de ações, salvo as circunstâncias em que estejamos perante uma Menos-Valia pois aí já será possível a dedução da perda, a reportar nos 2 anos seguintes, caso o Sujeito tenha optado pelo regime do englobamento. - cfr art.55º, nº6 do CIRS.”. A partir daqui, já se intui a posição menos feliz vertida na decisão recorrida quando pretende que a liquidação impugnada deveria ter considerado o saldo resultante da diferença entre a mais-valia decorrente da alienação dos bens imóveis e a menos-valia respeitante à alienação das partes sociais, pois que, a lei não permite que as aludidas perdas (menos-valias) sejam compensadas com as mais-valias resultantes da alienação de bens imóveis. Com efeito, se é certo que, ao contrário da redacção actual (introduzida pelo artigo 2º do Lei nº 82-E/2014, de 31 de Dezembro) que condiciona a dedução do resultado negativo aos resultados líquidos positivos da mesma categoria de rendimentos, ao tempo, o dispositivo em causa, previa a dedução de perdas “resultado líquido negativo apurado em qualquer categoria de rendimentos”, consagrando o princípio da intercomunicabilidade das categorias, o que em boa verdade, também na prática se esbatia face ao que dispunham os seus vários números, apesar de o nº 1 do artigo 55º consagrar o princípio contrário - o da intercomunicabilidade das categorias - os números seguintes do artigo inviabilizam tal princípio, numa solução de difícil articulação com a tributação pelo rendimentos real e a unicidade do imposto, referindo o já descrito art. 55º nº 6 do CIRS que “o saldo negativo apurado num determinado ano, relativo às operações previstas nas alíneas b), e), f) e g) do nº 1 do artigo 10º, pode ser reportado para os dois anos seguintes, aos rendimentos com a mesma natureza, quando o sujeito passivo opte pelo englobamento”, sendo que tal número foi aditado ao artigo 55º do CIRS pelo D.L. nº 228/2002, de 31-10 e foi alterado pela Lei nº 32-B/2002, de 30-12, que, no nº 4 do seu artigo 26.º lhe conferiu natureza interpretativa. Por outro lado, diga-se que o Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 24-02-2010, Proc. nº 01085/09, www.dgsi.pt, refere que “Embora configurado em termos de estrutura cedular (por categorias de rendimento), o IRS é um imposto único sobre o rendimento; daí a regra contida no nº 1 deste seu art. 55º é dedutível ao conjunto dos rendimentos líquidos sujeitos a tributação o resultado líquido negativo apurado em qualquer categoria de rendimentos. Mas, como logo se refere no segmento inicial deste nº 1, tal regra sofre as excepções constantes dos números seguintes do mesmo artigo [excepções que, no dizer de André Salgado Matos - Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, Anotado, 1999, Nota 2 ao art. 54º, pag. 329 - e reportando-se o autor à redacção que então constava no art. 54º) quase que esvaziam a regra do nº 1, «estabelecendo a incomunicabi1idade dos resultados líquidos negativos apurados precisamente nas categorias em que eles são mais susceptíveis de ocorrer. Trata-se de uma enorme brecha no carácter unitário do IRS e uma concessão muito extensa à cedularidade. …”, ou seja, embora os rendimentos de uma determinada categoria, se forem positivos, sejam, em princípio, comunicáveis aos rendimentos das outras categorias, já não são comunicáveis se forem negativos, devendo, antes, a perda sofrida ser reportada, para efeitos da respectiva dedução, aos eventuais rendimentos positivos apurados na mesma categoria nos anos posteriores. Com este pano de fundo, temos de acompanhar a Recorrente quando aponta que, contrariamente ao decidido, o artigo 55.º do CIRS não é facultativo, e a utilização do verbo “pode” apenas se refere ao reporte de perdas caso o contribuinte opte pelo englobamento, sendo essa é a única possibilidade de opção que a lei (artigo 22º nº 3, al. b) e artigo 72º n.ºs 4 e 8 do CIRS) atribui ao contribuinte - englobar ou não os rendimentos previstos nas alíneas b), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 10.º do citado Código do IRS, verificando-se que se o contribuinte optar pelo englobamento, pode reportar as perdas para os dois anos seguintes, caso contrário não poderá fazer o reporte das perdas nos dois anos seguintes. Em suma, a lei permite, apenas, que o saldo negativo das alienações onerosas de partes sociais e outros valores mobiliários, seja reportado para os dois anos seguintes, caso o contribuinte tenha optado pelo englobamento no ano em que o mesmo se verificou e caso, nos anos seguintes, existam mais-valias (saldo positivo) provenientes, também, da alienação onerosa de partes sociais e outros valores mobiliários, situação que implica a procedência do presente recurso, a revogação da sentença recorrida no segmento impugnado, com a consequente improcedência da impugnação judicial nesse domínio. 4. DECISÃO Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, revogar a sentença recorrida no segmento impugnado, julgando a presente impugnação judicial improcedente nesse domínio. Custas pelo Recorrido. Notifique-se. D.N.. Lisboa, 8 de Maio de 2024. – Pedro Nuno Pinto Vergueiro (relator) - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos. |