Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:027/20.6BALSB
Data do Acordão:11/04/2020
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ARAGÃO SEIA
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P26685
Nº do Documento:SAP20201104027/20
Data de Entrada:03/04/2020
Recorrente:MINISTÉRIO DAS FINANÇAS E DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – ATA
Recorrido 1:A....., S.A.
Recorrido 2:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante AT, entidade Requerida no processo n.º 425/2019-T, em que é Requerente A…………, LDA, notificada da decisão arbitral proferida em 27.02.2020, nos autos referenciados, que correu termos no Tribunal Arbitral constituído no âmbito do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), e com esta não se conformando, vem, da mesma interpor Recurso para Uniformização de Jurisprudência, regulado no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, por remissão expressa do n.º 2 do artigo 25.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), por a mesma se encontrar em oposição com o decidido no recurso n.º 0485/17 deste Supremo Tribunal.

Alegou, tendo concluído:
A. O Recurso Para Uniformização de Jurisprudência previsto e regulado no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos tem como finalidade a resolução de um conflito sobre a mesma questão fundamental de direito, devendo o STA, no caso concreto, proceder à anulação da decisão arbitral e realizar nova apreciação da questão em litígio quando suscitada e demonstrada tal contradição pela parte vencida.
B. Ora, desde logo, quanto ao estabelecido pelas regras que determinam os requisitos de admissibilidade deste tipo de recursos, resulta que, para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos, é necessário que i) as situações de facto sejam substancialmente idênticas; ii) haja identidade na questão fundamental de direito; iii) se tenha perfilhado nos dois arestos uma solução oposta; e iv) a oposição decorra de decisões expressas e não apenas implícitas.
C. A matéria em causa no presente recurso diz respeito à determinação da percentagem do IVA dedutível, resultante dos custos suportados pelo sujeito passivo com serviços de utilização mista, afetos tanto a operações tributadas como a operações isentas.
D. No que concerne ao requisito das situações de facto substancialmente idênticas, temos, subjacente ao acórdão recorrido, a factualidade melhor descrita nas alegações, para cuja leitura se remete e
E. Subjacente ao Acórdão Fundamento, encontrava-se factualidade também descrita nas alegações, e para cuja leitura igualmente se remete.
F. Em ambos ao Acórdãos, Autora e Recorrida têm natureza de sujeito passivo misto em sede de IVA, exercendo atividades sujeitas a IVA e atividades isentas de IVA.
G. Ambas consubstanciam instituições de crédito abrangidas pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras e exercem, entre outras, as actividades de leasing (locação financeira) e ALD (aluguer de longa duração).
H. Ambas corrigiram valores deduzidos ao longo de um período fiscal, por força do pro rata definitivo determinado para o respetivo ano.
I. Ambas apuraram um montante a deduzir distinto ao apurado por recurso ao pro rata provisório.
J. Ambas imputam aos atos de liquidação de IVA vícios de violação de lei, por entender que nos termos do artigo 23.º, n.º 4 do CIVA, o pro rata de dedução deve considerar no seu cálculo o montante anual da globalidade das rendas de locação financeira e não apenas o montante correspondente aos juros e outros encargos relativos à actividade de leasing e ALD.
K. Considerando a factualidade supra aludida, fica, desde logo, demonstrado que entre o acórdão recorrido e o Acórdão Fundamento existe uma manifesta identidade de situações de facto.
L. Estava em causa em ambos os processos aferir da determinação da percentagem do IVA dedutível, resultante dos custos suportados pelo sujeito passivo com serviços de utilização mista, afetos tanto a operações tributadas como a operações isentas.
M. O Acórdão Fundamento entendeu, na senda do Processo C-183/13, ao abrigo do artigo 17.º, n.º 5 terceiro parágrafo, al. c) da Directiva IVA, reproduzida no ordenamento interno pelo artigo 23.º, n.º 2, 3 e 4 do CIVA, que os Estados-Membros «podem obrigar um banco que exerce, nomeadamente, actividades de locação financeira, a incluir no numerador e no denominador da fracção que serve para estabelecer um único e mesmo pro rata de dedução para todos os seus bens e serviços de utilização mista, apenas a parte das rendas pagas pelos clientes, no âmbito dos seus contratos de locação financeira, que corresponde aos juros, quando a utilização desses bens e serviços seja sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão desses contratos»,
N. O Acórdão Fundamento concluiu ainda que essa restrição - patente no Acórdão do TJUE, processo n.º C-183/13, de incluir no numerador e no denominador da fracção que serve para estabelecer um único e mesmo pro rata de dedução para todos os seus bens e serviços de utilização mista, apenas os juros - vai ao encontro da doutrina ínsita no ofício circulado n.º 30.108, de 30-01-2009.
O. Neste mesmo sentido se pronunciaram os doutos Acórdãos do STA de 29.10.2014 (proc.01075/13), 03.06.2015 (proc.0970/13), de 7.06.2015 (proc.01874/13), de 27.01.2016 (proc.0331/14), de 15.11.2017 (proc.0485/17) e Acórdão de 09-10-2019, proferido no processo 0401/14.7BEPRT.
P. Importa igualmente levar em linha de conta o expendido na declaração de voto vencido no processo arbitral n.º 442/2019-T pelo Professor Doutor Sérgio Vasques, cujas conclusões se transcrevem:
a. Seja no acórdão Banco Mais, seja no acórdão VW Financial Services, o TJUE reconduz estes métodos de dedução — que se traduzem na exclusão de elementos determinados do pro rata — às normas que reconhecem aos Estados Membros a faculdade de impor aos contribuintes um critério de afectação real. Dito de outro modo, estes coeficientes de imputação específicos são tratados pelo TJUE como critérios ad hoc de afectação real.
b. As normas da Directiva IVA têm correspondência no direito interno português, ressalvada diferença pontual de redacção e estrutura. Se, na leitura do TJUE, as normas da Directiva IVA que prevêem a imposição do método da afectação real podem servir de fundamento à aplicação critérios de imputação específicos, então devemos reconhecer às normas do Código do IVA que prevêem a imposição do método da afectação o mesmo alcance.
c. As normas do Código do IVA têm que ser interpretadas de acordo com o direito europeu que lhes serve de parâmetro de validade e com a jurisprudência do TJUE que fixa sentido ao direito europeu, estando os tribunais nacionais vinculados ao princípio do primado.
d. Interpretada a lei nacional em conformidade com o direito europeu que lhe serve de parâmetro, e atenta a jurisprudência do TJUE, é de concluir que o Ofício-Circulado 30.108 tem amparo suficiente no art.23, nº3, alínea b), CIVA.
e. O fundamento do Ofício-Circulado 30.108 e do pro rata mitigado ou “coeficiente específico de imputação” nele previsto não deve por isso ser procurado no art.23, n.º 4, CIVA.
Q. Já na decisão arbitral recorrida se entendeu em sentido oposto, no sentido que o artigo 23.º do Código do IVA não licencia a aplicação de um coeficiente de imputação específico que tenha por base a dedução do montante anual correspondente aos juros associados à actividade de locação financeira, excluindo dessa mesma base a dedução das amortizações de capital,
R. De acordo com a decisão recorrida a tal conclusão não obsta a circunstância de o Direito Comunitário, tal como interpretado pelo TJUE, conferir aos Estados-Membros a faculdade de aplicarem, numa determinada operação, um método ou um critério diferente do método baseado no volume de negócios, desde que esse método garanta uma determinação do pro rata de dedução mais precisa do que a resultante daqueloutro método, dado que, face ao direito português, essa faculdade deve imperativamente ser exercida por via legislativa, não decorrendo deste entendimento, antes pelo contrário, a violação de qualquer norma da CRP, incluindo o artigo 8.º/4 desta, ou o princípio da igualdade.
S. E mesmo que ainda, sempre se concluiria que o método que a AT pretende aplicar não preenche os pressupostos necessários à sua admissibilidade, por dele decorrerem distorções significativas na tributação.
T. A decisão arbitral ora sindicada alega que a matéria ora em discussão já foi apreciada em várias decisões arbitrais, nomeadamente nos processos 335/2018-T, 339/2018-T e 498/2018-T e fundamenta-se nos acórdãos 311/2017-T, 312/2017-T, 498/2018-T que subscreve inteiramente.
U. Em suma, entre a decisão recorrida e o Acórdão fundamento existe uma patente e inarredável contradição sobre as mesmas questões fundamentais de direito que importa dirimir mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação da decisão recorrida, com substituição da mesma por novo acórdão que decida definitivamente a questão controvertida acolhendo o decidido no acórdão Fundamento.
V. Termos em que é de concluir, também relativamente a esta matéria, dever esse Tribunal Superior acolher o entendimento perfilhado no Acórdão Fundamento.
W. De tudo o que acima se deixou, decorre encontrar-se a decisão arbitral recorrida em desconformidade com todos os preceitos e princípios acima referidos, não merecendo, por isso, ser mantido na ordem jurídica, devendo antes ser revogado e substituído por outro, convergente com o Acórdão Fundamento e com a jurisprudência atual desse Supremo Tribunal Administrativo.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas. deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência:
- ser admitido, por verificados os respetivos pressupostos; E
- ser julgado procedente, nos termos e com os fundamentos acima indicados e, consequentemente, revogada a decisão arbitral recorrida, sendo substituída por outra consentânea com o quadro jurídico vigente.

Contra-alegou a recorrida, tendo concluído:
A) A matéria constante dos factos provados demonstra que existe uma diferença substancial nas duas situações de facto objeto de análise (no acórdão fundamento e na decisão arbitral recorrida) a qual é, por si só, motivo bastante para rejeição do recurso, por falta de verificação de um dos pressupostos cumulativos da sua admissibilidade.
B) O Banco (objeto de análise do acórdão fundamento) tem por atividade a «realização de operações bancárias e financeiras e prestação de serviços conexos». Diversamente a Soc. de Leasing (objeto de análise na decisão arbitral recorrida) desenvolve, para além de atividade financeira, «a prestação de serviços relacionados com contratos de manutenção, reparação, assistência de veículos automóveis, motociclos, ciclomotores e atividades afins, compra e venda de veículos automóveis, motociclos, ciclomotores, novos e usados, bem como as respetivas peças e assessórios e atividades afins»
C) Esta divergência da matéria de facto é determinante no enquadramento jurídico, em sede de IVA, das duas situações distintas objeto de análise. Isto é, foi precisamente o facto de não ter sido provado que uma parte dos custos comuns foram incorridos para desenvolver atividades operacionais, que suportou a decisão do Acórdão fundamento.
D) Diversamente, na decisão arbitral recorrida ficou provado que a Recorrida incorporou por fusão seis outras sociedades e que apenas uma dessas sociedades tinha por atividade o financiamento e a gestão dos contratos de financiamento, sendo não financeiras todas as restantes atividades incorporadas.
E) Assim sendo o Acórdão recorrido concluiu e bem que «nestas circunstâncias, e á mingua de mais dados, não é possível concluir que a utilização de recursos comuns seja essencialmente determinada pelas atividades exclusivamente financeiras»
F) E nada mais é necessário para concluir que deve ser negado provimento ao presente recurso, porque existe uma divergência nos factos provados que é vital para o enquadramento jurídico em sede de IVA.
G) No ponto fulcral para fundamentar as decisões dos acórdãos fundamento e recorrido existe uma perfeita concordância na aplicação do Direito, pelo que é um erro ostensivo a AT afirmar que «entre a decisão recorrida e o acórdão fundamento existe uma patente e inarredável contradição».
H) Mais concretamente, o acórdão Fundamento decidiu manter o ato tributário impugnado por não ter ficado provado que os custos comuns eram utilizados na prossecução de atividades não financeiras e o acórdão Recorrido decidiu anular o ato tributário impugnado por não ter ficado provado que os custos comuns eram utilizados exclusivamente na prossecução de atividades financeiras.
I) Em suma, ambos os Acórdãos concordam, que não cabe à Autoridade Tributária fixar critérios genéricos, não tipificados na lei, para fixar o cálculo do pro rata. Ou seja, concordam ser sempre necessário aferir, em cada caso concreto, se a utilização dos bens e serviços de utilização mista é sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão desses contratos ou se, pelo contrário, a utilização desses serviços é em parte afeta aos procedimentos de entrega dos veículos aos locatários, ou a quaisquer outros procedimentos operacionais não diretamente relacionados com a operação de financiamento.
J) Tal como na situação análoga objeto de análise no douto Acórdão do STA, no âmbito do processo nº 91/19.0 BALSB, também no caso sub judice não se verifica «contradição quanto à questão fundamental de direito, a qual tem de ser reportada ao mesmo fundamento de direito, o que no caso não ocorre, tendo ocorrido alteração na regulamentação jurídica aplicável».
K) «Conclui-se, pois, que o presente recurso não deve prosseguir para conhecimento da oposição de acórdãos».
L) Sem nada conceder, caso se entenda que estão reunidos os pressupostos de admissão do presente recurso, ainda assim o recurso deverá ser julgado improcedente porque a decisão recorrida está em plena conformidade com o enquadramento jurídico-tributário aplicável à situação de facto em apreço e em plena conformidade com a doutrina e com a jurisprudência comunitária. Senão vejamos:
M) O Código do IVA apenas consagra duas circunstâncias excecionais em que é permitido o afastamento do pro rata como regime regra de dedução, a saber:
1ª A opção expressa do sujeito passivo pelo método de afetação real;
2ª A imposição pela AT da substituição do pro rata pela afetação real, com recurso a critérios que traduzem uma efetiva utilização dos recursos, conquanto:
- o sujeito passivo exerça atividades económicas distintas;
- a aplicação do método do pro rata conduza a distorções significativas.
N) A confirmar o entendimento da Recorrida, Sérgio Vasques, (in «Imposto sobre o Valor Acrescentado», Editora Almedina, fev. 2020) conclui que «relativamente aos custos mistos, aqueles que estão indistintamente associados a um e outro tipo de operações, a Directiva IVA acolhe o método do pro-rata como solução de primeira linha, apontando para o método da afectação real como solução de recurso».
O) No caso concreto em análise a Autoridade Tributária aceita expressamente a utilização do método do pro rata de dedução pela ora Recorrida «no que respeita ao IVA suportado na aquisição de bens e serviços indistintamente utilizados a jusante em operações sujeitas com e sem direito à dedução», introduzindo, todavia, correções no modo de aplicação desta metodologia de pro rata, nomeadamente excluindo da formula de cálculo a amortização financeira das rendas de locação.
P) A AT tenta justificar a alteração no cálculo do pro rata de dedução com base em razões substantivas, afirmado que esta correção à fórmula de cálculo do pro rata justifica-se de modo a evitar um aumento artificial da percentagem de repartição dos custos comuns.
Q) A AT não demonstrou a existência de qualquer distorção significativa, pelo que não só o método seguido pela Recorrida não pode ser alvo de crítica nem provoca qualquer “distorção” como, pelo contrário, tais “distorções significativas de tributação” poderão ser antes causadas pelo método que a AT pretende aplicar.
R) Como bem referem José Xavier de Basto e António Martins (in ob. cit.): “… não se consegue demonstrar que o expurgo da amortização financeira contribui para uma sintonia mais fina na determinação da parcela de imposto dedutível. Bem ao invés, demonstra-se que o procedimento que a AT quer obrigar o sujeito passivo a adotar provoca distorções significativas de tributação e não consegue de modo algum o objetivo que a lei, no artigo 23.º n.º 3, atribui ao método de afetação real (…) que consequência tem o apuramento do IVA dedutível segundo o método imposto pela AT de expurgar a amortização do cálculo da parcela dedutível? Tem a consequência de fazer flutuar a percentagem de IVA dedutível ao longo do tempo de duração do contrato. Esta flutuação, porém, só teria razão de ser se houvesse fundamentos para crer que ao longo desse tempo a intensidade do uso dos inputs promíscuos flutuava também na mesma onda. Ora, é bem claro que não há qualquer razão para crer que seja assim. (…) A solução imposta pela AT provoca, ela sim, distorções na tributação”.
Andou bem a decisão arbitral recorrida ao concluir no mesmo sentido.
S) Sem nada conceder, ainda que por mera hipótese de raciocínio académico fosse de admitir o aumento «artificial» da percentagem de dedução, a distorção, a ocorrer, teria de ser exclusivamente derivada do facto de a proporção de IVA dedutível alcançada pela Recorrida ser substancialmente desconforme com a medida de utilização efetiva (e já não presumida) dos “custos comuns”, por parte da atividade de locação financeira.
T) O Tribunal de Justiça pronunciou-se, no âmbito do processo C-183/13, no sentido que uma eventual distorção significativa, nos termos acima descritos, permite ao Estado Membro alterar a metodologia de cálculo do apuramento do IVA dedutível, concluindo que «o artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que um Estado-membro, em circunstâncias como as do processo principal, obrigue um banco que exerce, nomeadamente actividades de locação financeira a incluir, no numerador e no denominador da fracção que serve para estabelecer um único e mesmo pro rata de dedução para todos os seus bens e serviços de utilização mista, apenas a parte das rendas pagas pelos clientes, no âmbito dos seus contratos de locação financeira, que corresponde aos juros, quando a utilização desses bens e serviços seja sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão desses contratos, o que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar»
U) Ou seja, o TJUE entende que existe uma distorção significativa, a qual permite ao Estado Membro alterar a fórmula de cálculo do pro rata, quando «a utilização desses bens e serviços (entenda-se a utilização dos gastos comuns) seja sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão desses contratos (entenda-se contratos de locação financeira e/ou contratos de crédito)».
V) Distorção que não ocorre na situação concreta da Recorrida, uma vez que os gastos comuns não são utilizados sobretudo nas atividades de gestão dos contratos de locação financeira, desde logo porque ficou provado que a atividade da Recorrida, após ter incorporado por fusão (no ano de 2003) a sociedade …………, passou a abranger «a prestação de serviços relacionados contratos de manutenção, reparação, assistência de veículos automóveis, motociclos, ciclomotores e actividades afins, compra e venda de veículos automóveis, motociclos, ciclomotores, novos e usados, bem como as respectivas peças e acessórios e actividades afins».
W) Sem nada conceder, ainda que por mera hipótese de raciocínio académico se equacionasse a existência de uma distorção significativa, ou seja, se equacionasse a hipótese de estarem verificados os pressupostos ínsitos no n.º 3 do artigo 23.º do Código do IVA, ainda assim a AT estaria a aplicar uma metodologia de dedução que não tem acolhimento legal:
X) A solução propugnada pela AT, que subjaz às correções controvertidas, colide frontalmente com o disposto no n.º 3 do artigo 23.º do Código do IVA (que apenas admite a substituição do pro rata por um critério de afetação real, de utilização efetiva, com base em critérios de repartição específicos) na medida em que configura a aplicação de um “novo” método de dedução que o sistema justributário não contempla e, consequentemente, viola o princípio da legalidade e configura a aplicação retroativa de regimes tributários, abalando de forma incomportável o princípio da confiança e da segurança jurídica
Y) … «em momento nenhum, em lugar algum, se descortina neste art.º 23.º a menção ou a consagração do poder de a Autoridade Tributária, perante um sujeito passivo que opta pelo método do pro rata, lhe impor condições à percentagem de dedução. Isto é, para lá das instruções precisas fornecidas pelo n.º 4 do art.º 23.º - e que são objetivas na determinação daquela percentagem – o legislador não habilitou a Autoridade Tributária a contrariar a percentagem de dedução tal como resulta do n.º 4»; (cfr. Acórdão do Tribunal Arbitral Coletivo, de 20/11/2017, proferido no âmbito do processo arbitral nº 309/2017T).
Z) Sem nada conceder, ainda que por mera hipótese de raciocínio académico se admita que a Legislação Portuguesa (mais concretamente o CIVA) transpôs para o nosso ordenamento o que estava previsto na Diretiva, ou seja, a possibilidade que a mesma concedia de os Estados Membros efetivamente mitigarem o pro-rata, podendo obrigar o Contribuinte a incluir ou excluir determinadas verbas da fórmula de calculo do pro rata.
AA) Ainda assim, «sempre que as modalidades de cálculo da dedução não tenham em conta uma afetação real e significativa de uma parte dos custos gerais a operações que confiram direito à dedução, não se pode considerar que tais modalidades reflitam objetivamente a parte real das despesas efetuadas com a aquisição dos bens e dos serviços de utilização mista que pode ser imputada a essas operações. Por conseguinte, tais modalidades não são suscetíveis de garantir uma repartição mais precisa do que o que decorreria da aplicação do critério de repartição baseado no volume de negócios» (cfr. Acórdão C-153/17 do TJUE de 18-03-2018).
BB) Assim, no caso vertente, no que respeita ao método de cálculo do pro-rata de dedução do IVA aplicado pela Administração Fiscal, cabe ao órgão jurisdicional nacional verificar se este método tem em conta a afetação real e significativa de uma parte dos custos gerais para efeitos das operações que conferem direito à dedução. (cfr. Acórdão C-153/17 do TJUE de 18-03-2018).
CC) Ora no caso concreto em apreço, há um conjunto de serviços de utilização mista – custos gerais, nomeadamente com edifícios, mobiliário, eletricidade e outros consumíveis - que não são objeto de afetação real para efeitos das operações que conferem direito à dedução. A ora recorrida não é um banco nem o conjunto das suas atividades é similar as atividades desenvolvidas pelos bancos, nem os serviços de utilização mista (os gastos gerais) se destinam sobretudo a atividades de financiamento, conforme se demonstrou.
DD) Repetimos: na decisão arbitral recorrida ficou provado que a recorrida passou a ter como parte da sua atividade «a prestação de serviços relacionados contratos de manutenção, reparação, assistência de veículos automóveis, motociclos, ciclomotores e actividades afins, compra e venda de veículos automóveis, motociclos, ciclomotores, novos e usados, bem como as respectivas peças e acessórios e actividades afins». Nestas circunstâncias, e à míngua de mais dados, não é possível concluir que a utilização de recursos comuns seja essencialmente determinada pelas atividades exclusivamente financeiras» (cfr. pág. 43 da decisão recorrida) (sublinhado nosso).
EE) E por ser assim no caso concreto em apreço, a ora recorrida subscreve integralmente, a mais recente decisão do TJUE a respeito da metodologia de cálculo do pro-rata numa sociedade, que tem por atividade a locação financeira de veículos automóveis, que em seguida se transcreve:
«…os Estados-Membros não podem aplicar um método de repartição que não tenha em conta o valor inicial do bem em causa no momento da sua entrega, uma vez que esse método não é suscetível de garantir uma repartição mais precisa do que o que decorreria da aplicação do critério de repartição baseado no volume de negócios» (cfr. Acórdão C-153/17 do TJUE de 18-03-2018).
FF) Por último, concluímos que ao corrigir a metodologia de apuramento do IVA dedutível incorporado nos custos comuns apenas insinuando (mas sem nada provar nem sequer fundamentar) que esta metodologia «conduziria a um direito à dedução ilegítimo» a AT está, em rigor, a invocar retroativamente perante a A………… (que agiu com base numa interpretação (no mínimo) plausível da lei e de boa-fé) a orientação genérica (Ofício nº 30108) que ainda não estava «em vigor» no momento do facto tributário (2008).
GG) Consequentemente, o ato tributário de liquidação adicional de imposto que ora se impugna, no que concerne à matéria ora em apreço, viola não apenas o artigo 68º-A nº 2 da LGT como também viola ostensivamente os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, subjacentes ao princípio da não retroatividade das regras fiscais que afetam a base de incidência do imposto (cfr. artigo 103º nº 3 da CRP).
Em face de tudo o exposto concluímos que a decisão arbitral recorrida não enferma de qualquer vício e está em conformidade com a Lei, a Jurisprudência e a Doutrina, merecendo por isso ser mantida na ordem jurídica.

O Ministério Público junto deste Supremo Tribunal emitiu parecer no sentido de inexistir oposição entre o acórdão fundamento e a decisão arbitral recorrida, em função da diferente factualidade em equação.

Cumpre decidir.

Na decisão recorrida levou-se ao probatório a seguinte matéria de facto:
1- A Requerente é uma instituição de crédito cujo objecto social consiste na prática de todas as operações permitidas aos bancos, com excepção da recepção de depósitos, ao abrigo do artigo 4.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, e encontra-se colectada em IRC pelo exercício da actividade “Outra intermediação monetária” (CAE 64190).
2- A Requerente dedica-se à actividade de locação financeira desde 1982, tendo o seu objecto social sido ampliado em 2003, de forma a abranger a realização de operações de crédito, aquando da escritura de fusão por incorporação de três empresas: B..., S.A., C..., S.A. e D..., Lda.

3- A sociedade C..., S.A., tinha como actividade (no momento em que foi incorporada na ora Requerente): «a prestação de serviços relacionados com contratos de gestão de frotas, contratos de manutenção, reparação, assistência de veículos automóveis, motociclos, ciclomotores e actividades afins, compra e venda de veículos automóveis, motociclos, ciclomotores, novos e usados, bem como as respectivas peças e acessórios e actividades afins».
4- A D... tinha como actividade (no momento em que foi incorporada na ora Requerente): «o comércio e aluguer de bens e serviços; a prestação de serviços de investimento, administrativos, técnicos e consultadoria e apoio empresarial em geral, bem como de serviços afins e conexos».
5- Em Novembro de 2004, a Requerente incorporou por fusão as sociedades E..., Lda., F..., Lda. e G..., S.A.
6- O artigo 30.º dos estatutos da G..., S.A., vigente à data da fusão, estabelecia que «a sociedade tem por objecto a compra e venda de imóveis rústicos ou urbanos, a respectiva construção e gestão, e prestações de serviços conexos com as referidas actividades».
7- Após a incorporação da B..., S.A., em Outubro de 2003, a Requerente configurou-se como sujeito passivo de IVA misto.
8- A Requerente encontra-se, e encontrava-se à data dos factos, enquadrada, em sede de IVA, no regime normal de periodicidade mensal.
9- A Requerente caracteriza-se por ser um sujeito passivo "misto", uma vez que exerce actividades que conferem direito à dedução – operações de locação financeira e locação simples - e também realiza operações no âmbito da actividade financeira, a qual é isenta do imposto – operações de crédito à aquisição de veículos automóveis.
10- Para efeitos de dedução do IVA dos bens de utilização mista, e porque no âmbito da sua actividade a Requerente realiza operações de locação financeira, a Requerente adoptou o método do pro rata, e apurou uma percentagem de dedução definitiva de 64,34% para o ano de 2006.
11- A Requerente considerou no numerador da fracção o montante anual (imposto excluído) das transmissões de bens e prestações de serviços que dão lugar a dedução e, no denominador, o montante anual (imposto excluído) de todas as operações efectuadas, incluindo as operações isentas ou fora do campo do imposto.
12- O montante da renda (componente de capital e componente de juro) relativo às operações de locação financeira foi integralmente incluído no cálculo do pro rata a que se refere o ponto anterior.
13- No que diz respeito às operações de locação financeira, a Requerente considerou o valor das rendas cobradas aos clientes no decurso dos respectivos contratos.
14- A Requerente manteve os empréstimos obrigacionistas emitidos por entidades não residentes, denominados “Long Term Rental”, na sua propriedade, desde 2003, encontrando-se estes registados no activo, na categoria de títulos de investimento.
15- Os referidos títulos permaneceram em balanço no período de 2003 a 2005, tendo sido efectuada neste ano uma venda de dois desses títulos e a aquisição de quatro novos títulos de investimento no ano de 2005.
16- No âmbito de uma inspecção tributária ao exercício de 2003, a AT entendeu, para além do mais, que:
- “os proveitos provenientes de aplicações em títulos de investimento têm efectivamente um carácter acessório em relação à actividade principal da empresa (Ieasing), na medida em que apenas implica uma utilização muito limitada de bens e serviços pelos quais o IVA é devido ...”; e que
- “o facto de serem gerados por essas operações rendimentos elevados, em comparação com os rendimentos produzidos pela actividade principal, não pode, por si só, excluir a qualificação destas operações de "acessórias': pelo que não podem influenciar a fracção utilizada para o cálculo do pro rata, caso contrário teria como consequência falsear o cálculo desta, e consequentemente pôr em causa a neutralidade do IVA”
17- No âmbito das operações de titularização de créditos, a Requerente cedeu a uma terceira entidade, os direitos de crédito que detinha sobre os locatários em determinados contratos de locação financeira.
18- Nesses contratos, a Requerente continuou a ser a entidade locadora, isto é, continuou a ser a entidade responsável por prestar os serviços de locação e por cumprir todos os deveres associados à sua posição de locador e a ser a entidade que tem o direito de exigir ao locatário todos os deveres subjacentes à posição contratual de locatário.
19- Nas situações de titularização de créditos, a Requerente outorgou um contrato de locação de um veículo automóvel, na qualidade de locador, no qual é acordado um determinado período de vigência, sendo acordado o pagamento pelo locatário de um determinado número de rendas, durante o período de vigência do contrato.
20- Em data posterior à outorga do contrato de locação, mas antes de findo o seu prazo de vigência, a outorgante cedeu a terceira entidade o direito de crédito que detém sobre o locatário em virtude da outorga do contrato de locação.
21- No âmbito do seu objecto social, a Requerente celebra com os seus clientes contratos de locação financeira e de locação simples de viaturas automóveis cujos termos e condições genéricas estão definidos nas condições gerais do contrato e as especificidades, nas condições particulares.
22- Nos termos previstos nos referidos contratos, a Requerente obriga-se a conceder o uso do veículo ao locatário, mediante o pagamento de uma renda, e a vendê-lo, no final do período do contrato, caso o locatário venha a exercer o direito de opção de compra.
23- Em simultâneo com o contrato de locação financeira, o locatário é obrigado a “efetuar e a suportar um seguro de que o locador será beneficiário que abranja a eventual perda ou deterioração parcial, casual ou não, do bem locado, a menos que o mesmo seja efetuado pelo locador, caso em que o seu prémio será também suportado pelo locatário”.
24- No caso de perda total do bem locado, “o contrato considerar-se-á vencido na sua totalidade, na data em que a seguradora decretar a respetiva perda, devendo o locatário pagar ao locador o montante das rendas vincendas e o valor residual, atualizado, adicionado do montante das rendas vencidas e não pagas deduzindo-se a este valor o montante da indemnização que o locador tenha recebido ou venha a receber da seguradora”.
25- Em todas as situações de perda total de veículos ocorridas no ano de 2006, a locadora era tomadora ou beneficiária do seguro.
26- Nos contratos de aluguer, o locatário está obrigado a suportar um seguro de danos próprios do veículo “mas fazendo sempre figurar a A... como tomadora/beneficiária do mesmo” (artigo 9.º, alínea b) das condições gerais do contrato de locação).
27- A Requerente apresentou em 27-02-1996, um pedido de informação vinculativa relativamente ao enquadramento fiscal, para efeitos de IVA, das seguintes operações:
a) A indemnização paga pela seguradora à Requerente decorrente da concretização do risco coberto pelo seguro suportado pelo cliente;
b) O pagamento pelo cliente à Requerente do valor correspondente à diferença entre a soma das rendas vencidas e não pagas, com as rendas vincendas e com o valor residual, deduzida da indemnização paga pela seguradora.
28- A Requerente foi notificada através do ofício n.º..., datado de 21 de Novembro de 1996, do entendimento da AT, nos termos do qual:
a) “o débito da A... à companhia de Seguros não é abrangido pelas normas de incidência do IVA e, como tal, não deve ser tributado uma vez que se trata da transferência de responsabilidade civil do segurado”.
b) “o débito da A... ao locatário é tributado em IVA, uma vez que configura uma contraprestação a obter do adquirente de uma operação sujeita a imposto”.
29- Na sequência disso, a Requerente adoptou o seguinte procedimento:
• Relativamente à indemnização que recebe da companhia de seguros, considera-a não sujeita a IVA, por se tratar de uma operação que se encontra fora do âmbito de incidência do imposto;
•Quanto ao valor que é cobrado ao cliente, a Requerente sujeita-o a IVA, por entender tratar-se de uma operação que visa o ressarcimento de lucros cessantes, que se enquadra no conceito residual de “prestação de serviços”, previsto no n.º 1 do artigo 4.º do Código do IVA.
30- No âmbito do pro rata apurado pela Requerente, com referência a 2006, o total do numerador ascendeu a € 168.692.601,87, tendo o total do denominador ascendido a € 262.180.282,13, e tendo-se a percentagem de dedução obtida pelo coeficiente da referida fracção cifrado em 64,34%, valor este efectivamente utilizado pela Impugnante no apuramento do valor de imposto a deduzir.
31- No exercício de 2006, foram os seguintes os elementos que, em 2006, compuseram a fracção que determina a percentagem do pro rata de dedução do IVA: dá-se aqui por reproduzido o quadro imagem que consta da decisão original.
32- No mesmo exercício, a Requerente deduziu ao denominador da fracção os seguintes valores:
S) € 1.809.564,93, registados na conta # 79040005 - Juros Leasing, correspondentes a juros cobrados em operações de locação financeira de contratos não titularizados;
T) € 868.821,24, registados na conta # 79040005 - Juros Locação, correspondentes a juros cobrados em operações de locação de contratos não titularizados;
U) € 7.387.325,21, registados na conta # 79063 - Juros Crédito Securitizado - Leasing, correspondentes a juros cobrados em operações de locação financeira de contratos titularizados;
V) € 6.518.071,55, registados na conta # 79063 - Juros Crédito Securitizado - Locação, correspondentes a juros cobrados em operações de locação de contratos titularizados;
X) € 83.075,65 registados na conta # 83100 - Rescisões - LEASING, correspondentes a ganhos obtidos em rescisões relacionadas com operações de locação financeira
Z) € 40.005,87 registados na conta # 83102 - LOCAÇÃO, correspondentes a ganhos obtidos em rescisões relacionadas com operações de locação
AA) € 654.791,12 registados na conta # 83110 - Mais-valias ... - ...- LEASING, correspondentes a ganhos obtidos em rescisões relacionadas com operações de locação financeira (contratos titularizados)
AB) € 698.812,25 registados na conta # 83112 - Mais-valias ... - ...- LOCAÇÃO, correspondentes a ganhos obtidos em rescisões relacionadas com operações de locação (contratos titularizados)
AC) € 62.113,85 registados na conta # 83120 - ... - LEASING, correspondentes a ganhos obtidos em vendas de equipamento não locado nas operações de locação financeira
AD) € 73.977,55 registados na conta # 83122 - ...- LOCAÇÃO, obtidos em vendas de equipamento não locado nas operações de locação
AE) € 159.848,89 registados na conta # 83130 - ...- LEASING, correspondentes a ganhos obtidos em vendas de equipamento não locado nas operações (contratos titularizados)
AF) € 67.964,05 registados na conta # 83132 - ... - LOCAÇÃO, ganhos obtidos em vendas de equipamento não locado nas operações titularizados)
AG) € 10.174,56 registados na conta # 83180 - Outras valias - LEASING, correspondentes a outros ganhos obtidos nas operações de locação financeira (contratos titularizados)
AH) € 10.020,30 registados na conta # 831802 - Outras valias - LOCAÇÃO, correspondentes a outros ganhos obtidos nas operações de locação (contratos titularizados)
AI) € 217.257,04 registados na conta # 831810 - Outras valias - LEASING, correspondentes a outros ganhos obtidos nas operações de locação financeira (contratos titularizados)
AJ) € 150.865,42 registados na conta # 831812 - Outras valias - LOCAÇÃO, correspondentes a outros ganhos obtidos nas operações de locação (contratos titularizados).
33- Em 14-01-2010, através da Ordem de Serviço n.º OI2009..., a Requerente foi objecto de uma acção inspectiva, de âmbito parcial, em sede de IVA, com referência ao exercício de 2006.
34- No âmbito do referido procedimento inspectivo, a AT considerou que o montante de € 22.272.560,72, registado na conta # 7906, deveria ser excluído do numerador da fracção do pro rata, na medida em que respeita a juros auferidos pela Requerente, referentes à remuneração de empréstimos obrigacionistas emitidos por entidades residentes na União Europeia, tendo mantido o valor de € 22.272.560,72, registado na conta # 7906, no denominador da mesma fracção.
35- O procedimento referido no ponto anterior determinou uma variação de 8,34 pontos percentuais, desfavorável à ora Requerente, na sua percentagem de dedução, conforme o quadro seguinte: dá-se aqui por reproduzido o quadro imagem que consta da decisão original.
36- Caso, no que respeito à correcção a que aludem os pontos precedentes, tivesse sido alterado o denominador da fracção, expurgando-o dos montantes correspondentes a juros auferidos pela Requerente, referentes à remuneração de empréstimos obrigacionistas emitidos por entidades residentes na União Europeia, a correcção na percentagem de cálculo do pro rata de dedução seria de 2,34%, desfavorável à ora Requerente, resultando no pagamento de menos € 32.875,71 de imposto e € 4.139,64 de juros compensatórios.
37- No mesmo procedimento inspectivo, a AT entendeu ser ainda de expurgar do valor de € 142.300.804,47 (ínsito no numerador da fracção de cálculo do pro rata de dedução da Impugnante) correspondente à facturação de rendas de locação e à faturação de vendas de equipamentos não locados, nos seguintes montantes:
a. € 116.074.827,62, correspondentes ao valor da amortização de capital incluída no valor das rendas de locação financeira porque, no entender da Autoridade Tributária, os valores facturados nas rendas de locação, que para efeitos de cálculo financeiro corresponderem à parcela correspondente à amortização do capital financiado, não estão incluídos no conceito de volume de negócios a que se refere o n.º 4 do artigo 23.º do Código do IVA;
b. € 13.836.589, correspondentes ao valor dos juros incluídos nas rendas de locação financeira, cujos créditos foram objecto de titularização, ao abrigo do regime previsto no Decreto-Lei n.º 82/2002, de 5 de Abril, porque, no entender da AT, "o resultado contabilístico não reflecte, e correctamente, aqueles proveitos, atendendo a que o cedente (A...) é apenas o substituto da entidade a quem foram cedidos os créditos, pelo que aqueles proveitos não são sua pertença" e, em consequência deste facto, deixam de estar incluídos no conceito de volume de negócios a que se refere o n.º 4 do artigo 23.º do Código do IVA. Em consequência deste entendimento, ao valor de juros (€ 16.514.975,17) deveria ser expurgada a quantia de € 13.836.589 pelo que apenas o valor de € 2.678.386,17 deveria, ainda no entender da AT, ser incluído no cálculo do pro-rata;
c. € 9.711.001,68, correspondentes ao valor de "outros", nomeadamente capital não remunerado, caução ou valor residual, porque, no entender da Autoridade Tributária, "a parcela "capital", embora sujeita a IVA, não tem a natureza de proveito", não estando assim incluídos no conceito de volume de negócios a que se refere o n.º 4 do artigo 23.º do Código do IVA.
38- Em resultado das correcções atrás identificadas, o montante total considerado pela AT no numerador da fracção de cálculo da percentagem de dedução de IVA, no que a esta matéria diz respeito, seria de € 6.797.622,85 (valor correspondente à soma do montante de € 4.119.236,68, referente a diversas contas de proveitos, e do montante de € 2.678.386,17 registado na conta # 79040005 - Juros e rendimentos similares de operações de locação financeira mobiliária).
39- Em consequências das correções efectuadas no âmbito da acção inspectiva aos três elementos que compõem o numerador da fração de cálculo do pro rata de dedução, a AT reduziu o valor total do numerador da referida fração de € 168.692.601,87 para € 6.797.622,85 (€ 2.678.386,17 + € 4.119.236,68), e fixou o denominador da mesma em fracção € 71.811.054,19, tendo o pro rata corrigido pela AT sido cifrado em 9,47%.
40- Na sequência da referida inspeção tributária, a AT efectuou correcções meramente aritméticas, no valor de €839.189,41, relativas a:
• Apuramento do pro rata definitivo - €766.062,60;
• Falta de liquidação de IVA em rescisões de contratos por perda total - € 69.259,61;
• Regularizações indevidas a favor do sujeito passivo - €3.867,19.
41- A AT corrigiu ainda algumas situações em que a Requerente não liquidou IVA, nas facturas emitidas ao locatário, aquando da resolução dos contratos, em virtude de perda total dos veículos locados, que determinaram um acréscimo de imposto de € 880,22, e que a Requerente aceitou e pagou, nos termos do seguinte quadro: dá-se aqui por reproduzido o quadro imagem que consta da decisão original.
42- Em 12-04-2010, a Requerente foi notificada do Relatório de Inspecção Tributária, no qual a AT apurou imposto a liquidar adicionalmente, no valor de €839.189,41, relativo aos meses de janeiro, fevereiro, março abril, maio, novembro e dezembro de 2006.
43- A Requerente aceitou as correcções relativas às regularizações indevidas a favor do sujeito passivo, relativas ao período de novembro de 2006, tendo procedido ao pagamento da liquidação adicional.
44- Porém, a Requerente não se conformou com as correcções inerentes ao apuramento do pro rata e à falta de liquidação de IVA em rescisões de contratos por perda total, tendo apresentado impugnação judicial das correspondentes liquidações em 20-10-2010 junto do Tribunal Tributário de 1ª Instância.
45- Em 16-12-2016, a Requerente efectuou o pagamento integral das liquidações de imposto impugnadas, ao abrigo do regime especial de regularização de dívidas, previsto no Decreto-Lei n.º 67/2016, de 3 de Novembro.
46- Em 24-04-2019, a Requerente fez uso do cometimento de processo pendente para arbitragem, nos termos do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 81/2018.

No acórdão fundamento levou-se ao probatório a seguinte matéria de facto:
1) Foi emitida, pela área de gestão tributária do IVA - gabinete do subdiretor-geral dos impostos, instrução administrativa, correspondente ao ofício n° 30.108, de 30.01.2009, da qual consta designadamente o seguinte:
“1. O ofício circulado n° 30103, de 2008.04.23, do Gabinete do Subdirector-Geral da área de Gestão do IVA, procedeu à divulgação de instruções genéricas no sentido de uniformizar a interpretação a dar às alterações introduzidas ao artigo 23° do Código do IVA (CIVA), de assegurar o correcto enquadramento das várias actividades face aos novos preceitos, de estabelecer os procedimentos a serem seguidos na determinação da dedução do imposto e, ainda, de clarificar os critérios a utilizar, quando haja recurso à afectação real na determinação do quantum do imposto a deduzir e sempre que esteja em causa bens e serviços de utilização mista.
2. De acordo com as referidas instruções e seguindo as regras do artigo 23° do CIVA, para apurar o imposto dedutível contido em bens e/ou serviços de utilização mista, aplica-se supletivamente o método da percentagem ou pro rata, excepto quando estejam em causa operações não decorrentes de uma actividade económica, caso em que é obrigatória a afectação real. Nos demais casos, a afectação real é facultativa podendo, no entanto, a Administração Tributária impor esse método de imputação quando a aplicação do pro rata conduza a distorções significativas na tributação (n° 3 art. 23°).
3. No caso de utilização da afectação real, obrigatória ou facultativa, e segundo o n° 2 do artigo 23°, o sujeito passivo para determinar o grau de afectação ou utilização dos bens e serviços à realização de operações que conferem direito a dedução ou de operações que não conferem esse direito, deve recorrer a critérios objectivos devendo, em qualquer dos casos, a determinação desses critérios objectivos ser adaptada à situação e organização concretas do sujeito passivo, à natureza das suas operações no contexto da actividade global exercida e aos bens ou serviços adquiridos para as necessidades de todas as operações, integradas ou não no conceito de actividade económica relevante.
4. Os critérios adoptados podem ser corrigidos ou alterados pela DGCI, com os devidos fundamentos de facto e de direito, ou, se for caso disso, fazer cessar a utilização do método, se se verificar a ocorrência de distorções significativas na tributação.
5. No caso específico das entidades financeiras que desenvolvem igualmente actividades de Leasing ou de ALD, a prática conjunta de operações de concessão de crédito e de locação tributada, incluindo a locação financeira, implica, quando houver bens e serviços adquiridos que sejam conjuntamente utilizados em ambas, a necessidade de recorrer às disposições do artigo 23° do CIVA para apuramento da parcela do imposto suportado, que é passível de direito a dedução.
6. Face à anterior redacção do artigo 23° do CIVA, no âmbito da aplicação do método da afectação real, sempre que não fosse viável a aplicação da afectação no cálculo do IVA dedutível relativamente a bens de utilização mista, a solução encontrada e seguida pelos Serviços como sendo a que mais se aproximava da neutralidade desejada, foi no sentido de ser aplicada uma proporção entre os dois tipos de operações, de forma a determinar, o mais aproximadamente possível, a afectação dos inputs a cada uma delas.
No entanto, não estava aqui em causa a aplicação do n° 4 do artigo 23° do IVA mas do apuramento do imposto dedutível mediante a aplicação de um pro rata específico, uma vez que previamente o método utilizado fora o da afectação real.
7. Face à actual redacção do artigo 23°, a afectação real é o método que, tendo por base critérios objectivos de imputação, mais se ajusta ao apuramento do IVA dedutível nos bens e serviços de utilização mista.
8. Nesse sentido, considerando que o apuramento do IVA dedutível segundo a aplicação do pro rata geral estabelecido no n° 4 do artigo 23º do CIVA é susceptível de provocar vantagens ou prejuízos injustificados pela falta de coerência das variáveis nele utilizadas, ou seja, pode conduzir a “distorções significativas na tributação”, os sujeitos passivos que no âmbito de actividades financeiras pratiquem operações de Leasing ou de ALD, devem utilizar, nos termos do n° 2 do artigo 23° do CIVA, a afectação real com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços, de modo a determinar o montante de IVA a deduzir relativamente ao conjunto das actividades.
9. Na aplicação do método da afectação real, nos termos do número anterior e sempre que não seja possível a aplicação de critérios objectivos de imputação dos custos comuns, deve ser utilizado um coeficiente de imputação específico, tendo em conta os valores envolvidos, devendo ser considerado no cálculo da percentagem de dedução apenas o montante anual correspondente aos juros e outros encargos relativos à actividade de Leasing ou de ALD.
Neste caso, a percentagem atrás referida não resulta da aplicação do n° 4 do artigo 23° do CIVA” (cfr. fls. 165 a 167).
2) A impugnante foi constituída por escritura pública outorgada em dezembro de 1996, então com a designação B……………, SA, tendo sido indicado como objeto social a realização de operações bancárias e financeiras e prestação de serviços conexos, designadamente a concessão de crédito ao consumo e a locação financeira (cfr. fls. 175 e 176).
3) A impugnante, no exercício da sua atividade e nomeadamente em 2010, estava enquadrada no regime normal mensal de IVA e realizou operações financeiras isentas de IVA, a par de operações sujeitas a IVA, designadamente operações de locação mobiliária, consubstanciadas em celebração de contratos de locação financeira (leasing) e contratos de aluguer de veículo automóvel sem condutor (ALD financeiro), onde se prevê a possibilidade de compra do veículo pelo locatário (cfr. fls. 258 a 283).
4) No âmbito das operações de locação mencionadas em 3), designadamente em 2010, a impugnante, em alguns casos a solicitação e por indicação dos locatários, adquiriu determinados veículos, pagando integralmente o respetivo preço e entregando-os ao locatário para seu uso e fruição (cfr. fls. 258 a 283).
5) Na sequência do mencionado em 3) e 4), eram pagas à impugnante, pelos locatários, rendas, as quais englobam uma parte relativa a amortização financeira e outra parte relativa a juros e outros encargos, renda essa sujeita a IVA (cfr. fls. 258 a 283 e 286).
6) A parte da renda mencionada em 5) relativa a amortização financeira era registada na contabilidade da impugnante a crédito da conta 22.
7) A parte da renda mencionada em 5) relativa a juros era registada na contabilidade da impugnante como proveito.
8) No âmbito dos contratos de locação mencionados em 3), resolvidos por motivo de perda total do bem, os locatários pagaram à impugnante o valor correspondente ao capital em dívida, sendo emitida a correspondente fatura pela impugnante com IVA (cfr. fls. 258 a 272 e 285).
9) Na sequência da celebração dos contratos de locação mencionados em 3), resolvidos por incumprimento ou nos quais não houve transmissão da propriedade, a impugnante vendeu os veículos a diversas entidades, sendo emitida a correspondente fatura pela impugnante, com IVA (cfr. fls. 284).
10) Na concessão de crédito para estudo, viagens ou mobiliário e outras não sujeitas a IVA a impugnante não liquidou IVA, liquidando o Imposto do Selo na parte relativa aos juros (cfr. fls. 288 e 289).
11) Durante o ano de 2010 a impugnante apurou um volume de faturação, relativo a leasing e ALD financeiro no valor de 264.684.163,31 Eur. (cfr. fls. 163).
12) Durante o ano de 2010 a impugnante apurou um volume de faturação, relativo a concessão de crédito no valor de 84.914.092,66 Eur. (cfr. fls. 163).
13) Durante o ano de 2010, a impugnante suportou custos, em relação aos quais não conseguiu determinar especificamente a que operações, das mencionadas em 3), respeitavam.
14) Durante o ano de 2010, a impugnante utilizou dois métodos para cálculo do IVA dedutível:
a) Afetação real, relativo à atividade de locação financeira e à atividade isenta de IVA, quanto aos custos nos quais foi possível estabelecer um nexo direto e imediato;
b) Pro rata específico, relativo aos custos comuns à atividade tributada e à atividade isenta, mencionados em 13) (cfr. fls. 163).
15) Durante o ano de 2010, a impugnante utilizou, nas declarações periódicas de IVA relativas aos meses compreendidos entre janeiro e novembro, um pro rata provisório de 69% (cfr. declarações periódicas constantes de fls. 129 a 162 e 210 a 219).
16) O pro rata provisório mencionado em a incluiu, nos respetivos numerador e denominador, entre outros os valores mencionados em 5), 8) e 9).
17) A impugnante calculou um pro rata definitivo para 2010 de 24%, com base em entendimento da AT mencionado na instrução administrativa referida em a), calculado considerando no numerador o valor de 25.826.262,96 Eur. e no denominador o valor de 110.740.355,62 Eur. (cfr. mapa de cálculo constante de fls. 163).
18) Na sequência do referido em 17), a impugnante apresentou declaração de periódica de IVA relativa ao mês de dezembro de 2010, considerando os métodos mencionados em 14) e o valor do pro rata mencionado em 17), na qual declarou os seguintes valores:
a) Campo 61: 943.442,32 Eur.;
b) Campo 94: 1.632.562,74 Eur. (fls. 206 e 207).
2.2. Quanto a factos não provados, exarou-se o seguinte:
«Com interesse para a decisão e em cumprimento do ordenado no douto Acórdão do STA, de 03.06.2015 referido supra (Recurso n° 970/13-30), considera-se não provado o seguinte facto:
A) Os custos mencionados em 13) respeitam em parte à disponibilização, por parte da impugnante, dos veículos objeto dos contratos de locação referidos entre 3) e 5).
Não existem outros factos, provados ou não provados, em face das possíveis soluções de direito, com interesse para a decisão da causa.»

Há agora que conhecer o recurso que nos vem dirigido.
A recorrente delimita a questão a apreciar no presente recurso nos seguintes termos:
Está em causa em ambos os processos aferir da determinação da percentagem do IVA dedutível, resultante dos custos suportados pelo sujeito passivo com serviços de utilização mista, afetos tanto a operações tributadas como a operações isentas.

A admissibilidade do presente recurso.
Como é entendimento pacífico na jurisprudência do STA, a admissibilidade dos recursos por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27.º, alínea b) do ETAF, 284.º do CPPT e 152.º do CPTA, depende de existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
No que ao primeiro requisito respeita, como tem sido inúmeras vezes explicitado pelo Pleno desta Secção relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detectar a existência de uma contradição, quais sejam: - identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica; - que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica; - que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta; - a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta (cfr. Jorge de Sousa e Simas Santos, Recursos Jurisdicionais em Contencioso Fiscal, p. 424, e acórdãos do Pleno da seção de contencioso tributário do STA, de 15/9/2010, recs. nºs. 344/2009 e 881/2009, e de 26 de Setembro de 2007, 14 de Julho de 2008 e de 6 de Maio de 2009, recursos números 452/07, 616/07 e 617/08, respectivamente).

A decisão recorrida pronunciou-se sobre as seguintes questões:
-Da exclusão da amortização financeira das rendas de locação do denominador da fração do pro rata;
-Da exclusão dos créditos titularizados;
-Das “perdas totais”.

Por sua vez o acórdão fundamento pronunciou-se sobre as seguintes questões:
(i) determinação da percentagem do IVA dedutível, resultante de custos suportados pelo sujeito passivo com serviços de utilização mista (afectos a operações tributadas e a operações isentas) [na verdade, este Supremo Tribunal limitou-se a apreciar se o tribunal recorrido havia interpretado o disposto nos nºs. 2 e 3 do artigo 23º do CIVA (e 23º, n.º 4 do CIVA), em concordância com a interpretação do art. 17°, n° 5, 3° parágrafo, al. c), da Sexta Directiva 77/388/CEE, do Conselho, de 7/5/1977, efectuada no apontado acórdão do TJUE];
(ii) a legalidade da fundamentação superveniente de autoliquidação de IVA, em consequência da ampliação da matéria de facto determinada pelo acórdão do STA, proferido nestes autos em 03/06/2015 e constante de fls. 803 a 821; e
(iii) a aplicação do regime do ónus da prova dos factos constitutivos do direito à dedução de IVA.

Também no acórdão fundamento não se provou que os custos (suportados em 2010) relativamente aos quais não se conseguira apurar, especificamente, a que tipo de operações estavam associados (se a operações financeiras isentas de IVA ou a operações tributadas de locação mobiliária, tendo por objecto veículos automóveis, traduzidas na celebração de contratos de leasing e ALD) respeitassem à disponibilização dos veículos objecto dos contratos, o que era essencial e determinante à procedência do pedido aí formulado pelo impugnante recorrente, já na decisão recorrida concluiu-se que, à míngua de mais dados, não é possível concluir que a utilização de recursos comuns seja essencialmente determinada pelas actividades exclusivamente financeiras.
Ou seja, analisadas as questões resolvidas no acórdão fundamento, face à matéria de facto que se encontrava disponível e ao que ali vinha alegado em sede de recurso, surpreende-se que não há identidade entre tais questões e as que vieram a ser resolvidas na decisão recorrida.
Por outro lado, estando em causa em ambas as decisões a interpretação do disposto no artigo 23º, n.º 4 do CIVA, sendo que na decisão recorrida se apreciava a legalidade da liquidação referente ao exercício de 2006 e no acórdão fundamento a da liquidação referente ao exercício de 2010, e sabendo-se que a norma ali consagrada foi alterada pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12, não se mostram, assim também, reunidos os pressupostos legais para que este Supremo Tribunal possa conhecer deste recurso.
Pelo exposto, conclui-se que, no caso dos autos, falham os pressupostos para que possa julgar-se existir entre as decisões contradição juridicamente relevante e como tal não haverá que conhecer do mérito do recurso.

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em não tomar conhecimento do mérito do recurso.
Custas pela recorrente, com dispensa do pagamento do remanescente da t.j.
Comunique-se ao CAAD.
D.n.

Lisboa, 4 de Novembro de 2020. – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia (relator) – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - José Gomes Correia - Joaquim Manuel Charneca Condesso – Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Paulo José Rodrigues Antunes – Gustavo André Simões Lopes Courinha - Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro - Pedro Nuno Pinto Vergueiro - Anabela Ferreira Alves e Russo.