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Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02724/23.5BELSB
Data do Acordão:06/20/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:PEDRO MACHETE
Descritores:AUTORIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA
INTIMAÇÃO PARA PROTECÇÃO DE DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS
MEIO PROCESSUAL ADEQUADO
URGÊNCIA DA DECISÃO
Sumário:(Remete-se para o sumário constante do acórdão relatado no processo nº. 0741/23.4BELSB de 6 de junho de 2024):

I- Para a permanência regular em território nacional de cidadãos estrangeiros oriundos de países terceiros em relação à UE, não basta a titularidade de documento de viagem e com visto. Exige-se, nos termos da Lei n.º 23/2007, de 04/07, uma autorização de residência.
II- A autorização de residência pode ser temporária ou permanente, conforme a sua duração. A autorização temporária é aquela que é válida pelo período de dois (2) anos contados a partir da data da emissão do título e é renovável por períodos sucessivos de três anos. A autorização de residência determina a emissão de um título de residência, que substitui o documento de identificação – artigos 74.º, 75.º/ 1 e 84.º da Lei n.º 23/2007, de 04 de julho.
III- O prazo para a entidade demandada decidir o pedido de autorização de residência temporária para o exercício de atividade profissional subordinada é de 90 dias – n.º1 do artigo 82.º da Lei n.º 23/2007. A Lei apenas prevê o deferimento tácito para os pedidos de renovação de autorização de residência que não sejam decididos pela Administração no prazo legal de 60 dias.
IV- A permanência de um cidadão estrangeiro indocumentado em território nacional por razões alheias ao mesmo, assacáveis aos serviços a quem legalmente está atribuída a incumbência de tramitar o procedimento para a emissão da decisão final, não é compatível com o leque de direitos que lhe são formalmente reconhecidos pela Constituição da República Portuguesa (CRP) e pelos tratados internacionais, que reconhecem direitos a qualquer pessoa, independentemente da nacionalidade ou estatuto legal.
V- Está em causa um verdadeiro direito de cidadania previsto no n.º1 do artigo 26.º da CRP, entendido no sentido lato que resulta da previsão do artigo 15.º relativo à equiparação entre estrangeiros e cidadãos nacionais. A falta de um título de residência temporária, que permita a permanência de um imigrante no território nacional, durante um período certo, afeta o reduto básico de direitos pessoais e sociais, que se ligam, todos eles, ao princípio da dignidade da pessoa humana (cfr. artigo 1.º da CRP).
VI- Enquanto a autorização de residência temporária não for concedida o recorrente permanece vulnerável a abusos, designadamente, a nível laboral, sujeito a aproveitamentos indevidos da sua condição de clandestino.
VII- Estando em jogo o exercício de direitos, liberdades e garantias fundamentais, formalmente reconhecidos pela CRP e por instrumentos de direito internacional ao cidadão estrangeiro, mas cuja efetividade se encontra materialmente comprometida pela falta de decisão do pedido de autorização de residência, a garantia do gozo de tais direitos por parte do mesmo não se compagina com uma tutela precária, num cenário que é contingente para o mesmo.
VIII- Para a tutela de tais direitos, a adoção de uma providência cautelar traduzida na atribuição de uma autorização de residência provisória não é suficiente. A atribuição de residência provisória no âmbito da tutela cautelar é uma autorização com termo incerto, que a qualquer momento pode cessar, não conferindo ao cidadão estrangeiro um horizonte temporal mínimo de estabilidade e de previsibilidade em relação à duração da sua permanência regular em território português.
IX- A intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias é o meio processual mobilizável quando a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adoção de uma conduta positiva ou negativa se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, por não ser possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento de uma providência cautelar – artigo 109.º, n.º 1, do CPTA.
X- Dispor de um tempo mínimo de residência regular em território nacional é condição necessária para que um cidadão estrangeiro possa delinear o seu projeto de vida com alguma segurança e estabilidade, a que acrescem ainda facilidades procedimentais (artigos 76.º, n.º3 e 82.º, n.º7 da Lei n.º 23/2007).
XI- Estando em causa a urgência na obtenção de uma decisão principal ou de mérito para a tutela de direitos, liberdades e garantias fundamentais, a Intimação prevista nos artigos 109.º a 111.º do CPTA é meio processual adequado.
(Sumário elaborado pela relatora – art.º 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil).
Nº Convencional:JSTA000P32400
Nº do Documento:SA12024062002724/23
Recorrente:AA
Recorrido 1:AGÊNCIA PARA A INTEGRAÇÃO, MIGRAÇÃO E ASILO (AIMA)
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento: