Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0279/11.2BEPRT 0669/18
Data do Acordão:05/12/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:IRC
CUSTOS
PRINCÍPIO DA ESPECIALIZAÇÃO DO EXERCÍCIO
CUSTO PLURIANUAL
Sumário:I - Os gastos e perdas da empresa (cfr.artº.23, do C.I.R.C.) constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico.
II - O princípio da especialização ou do acréscimo encontra-se consagrado no artº.18, do C.I.R.C. (cfr.artº.22, do anterior C.C.I.), o qual determina que os proveitos e os custos devem ser imputados ao período a que respeitam, independentemente do seu recebimento ou pagamento. Por outras palavras, em determinado exercício, devem ser contabilizados os proveitos, e também os custos, que nele efectivamente tenham sido realizados.
III - Compreendem-se no artº.19, do C.I.R.C., as obras cujo ciclo de produção ou tempo de construção seja superior a um (1) ano, isto é, aquelas cuja duração de execução se estende para além de um exercício económico. Consagra-se no preceito a possibilidade de as empresas que realizam obras de carácter plurianual adoptarem, na determinação dos resultados, o método do encerramento da obra ou o método da percentagem de acabamento, reconhecidos de há longa data pela prática contabilística e recomendados pelas normas internacionais de contabilidade.
IV - A possibilidade de opção entre os dois métodos identificados (método do encerramento da obra ou método da percentagem de acabamento) é muito restringida pelo legislador (cfr.artº.19, nº.2, do C.I.R.C.), o qual impõe a utilização do método da percentagem de acabamento nas obras públicas ou privadas em que haja lugar a facturações parciais do preço estabelecido e as obras realizadas tenham atingido o grau de acabamento correspondente aos montantes facturados e, igualmente, nas obras efectuadas por conta própria e vendidas fraccionadamente (cfr.artº.19, nº.2, al.b), do C.I.R.C., na versão em vigor em 2005).
V - Estamos perante métodos que pretendem dar tradução à correlação temporal entre proveitos e custos, tendo como pano de fundo o citado princípio da especialização dos exercícios e que suscitam relevantes dificuldades de aplicação. No caso específico do método da percentagem de acabamento, tal regime deve ser complementado pela Circular 5/90, de 17/01/1990, da Direcção-Geral dos Impostos.
(sumário da exclusiva responsabilidade do relator)
Nº Convencional:JSTA000P27642
Nº do Documento:SA2202105120279/11
Data de Entrada:07/04/2018
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A............. - SOCIEDADE GESTORA DE PARTICIPAÇÕES SOCIAIS, SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença, datada de 9/04/2018, proferida pelo Mº. Juiz do T.A.F. do Porto, constante a fls.222 a 232 do processo, a qual julgou procedente a presente impugnação visando, mediatamente, o acto de liquidação adicional de I.R.C., relativa ao ano fiscal de 2005 e em cuja demonstração se conclui pela inexistência de qualquer montante de imposto a pagar.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.240 a 246 do processo físico) formulando as seguintes Conclusões:
A-Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a presente impugnação e em consequência anulou as correções impugnadas, na parte correspondente aos custos diferidos de exercícios anteriores e às provisões para depreciação de existências.
B-Em sede de impugnação a aqui recorrida alega errónea qualificação do facto tributário decorrente da não – aceitação de custos diferidos, que foram gradualmente imputados às frações alienadas, em função da permilagem.
C-A impugnante entende que tal fracionamento se encontra de acordo com o artigo 18º e 19º do CIRC e com a Circular nº 5 da DSIRC, uma vez que se trata de obras plurianuais e que os custos deduzidos, efetivamente suportados e essenciais para a realização de proveitos se devem considerar como indiretos para efeitos da referida Circular nº 5 da DSIRC, devendo ser anuladas as correções em causa.
D-A sentença do Tribunal a quo decidiu que «A Circular nº 5, de 17/09/1990, da DSIRC refere, no seu ponto 6 que “Para efeitos do disposto no número anterior, os custos indirectos deverão ser repartidos e imputados a cada fracção tendo em conta a respectiva permilagem ou área de acordo com outro critério, devidamente justificados, que se revele adequado à especialidade da situação”, referindo o ponto 5 a “obras a que se refere a alínea b) do número 2 do artigo 19º do Código do IRC.
(…)
Como decorre do probatório [ou melhor, a sociedade que integra o seu grupo] utilizou, até final da obra em questão, o mesmo método para apuramento de resultados, o da permilagem, um dos recomendados pela Circular 5/90.
A referida Circular refere que os custos indiretos devem seguir tal método, sendo repartido pelas várias fracções, como sucedeu.
(…)
Atento o exposto, cumpriu a impugnante com os ditames legais e contabilísticos referentes à repartição dos custos, não estando em causa o princípio da especialização dos exercícios, por funcionar uma das suas excepções, o das obras plurianuais»
E-A impugnante é uma sociedade que se dedica a “actividades de gestão de participações sociais” e encontra-se abrangida pelo regime especial de tributação de grupo de sociedades, previsto no artigo 63º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (doravante CIRC).
F-Em procedimento externo de inspeção tributário foram verificadas incorreções praticadas nas declarações de rendimentos individuais referentes ao exercício de 2005 relativas a uma entidade que faz parte do grupo de sociedades de que a impugnante é dominante – B……………. Imobiliária e Serviços, S.A. (NIPC …………).
G-A B………… contabilizou, no exercício de 2005 como custo o montante de € 241.943,69 referente a custos de comercialização, serviços de gestão, publicidade e propaganda e custos financeiros.
H-Os referidos custos foram suportados do exercício de 2000 até ao exercício de 2002 através do registo em custos diferidos, de acordo com as políticas contabilísticas seguidas pela B…………, associados a obras de carácter plurianual de acordo com o que se encontra definido pela alínea b) do nº 2 do artigo 19º do CIRC.
I-O POC (Plano Oficial de Contabilidade) só prevê que se revelem simultaneamente os proveitos e os custos de produção associados.
J-De facto, quando estamos perante obras de caráter plurianual, como é o caso específico de vendas fracionadas, os custos de produção são refletidos no resultado quando as vendas se realizam.
K-Neste sentido aponta a alínea b) do nº 2 do artigo 19º do CIRC, corroborada pela Circular nº 5 de 17/01/1990 da Direção de Serviços do IRC no ponto 5.
L-Assim, dispõe o ponto 5 da referida Circular nº 5 “A determinação dos resultados das obras a que se refere a alínea b) do nº 2 do artigo 19º do Código do IRC será feita com base no valor da venda e nos custos imputáveis à fração vendida:”
M-O ponto 6. da mesma Circular nº 5 determina que “Para efeitos do disposto do número anterior, os custos indiretos deverão ser repartidos e imputados a cada fração tendo em conta a respetiva permilagem ou área ou de acordo com outro critério, devidamente justificado, que se revele adequado à especificidade da situação”, ou seja, aborda-se no ponto 6. a questão de que os custos indiretos de produção deverão ser repartidos e imputados a cada fração de acordo com a permilagem ou qualquer outro critério objetivo, desde que devidamente fundamentado.
N-Como custos de produção/construção entende-se o somatório dos encargos tais como custo de matérias – primas e outros materiais consumidos, gastos de mão-de-obra direta, com energia, depreciação de equipamento, entre outros direta e exclusivamente conexos com as frações.
O-Não podem ser imputados ao custo/produção os custos de distribuição, de administração geral e os financeiros, pois estes são considerados custos do exercício em que são suportados.
P-O princípio contabilístico da especialização económica dos exercícios encontra-se vertido no artigo 18º do CIRC (à data dos factos) e consiste em incluir nos resultados fiscais apenas os proveitos e os custos correspondentes a cada exercício económico.
Q-O Princípio da anualidade determina que todos os proveitos e custos devem ser imputados ao período a que respeitam, independentemente do seu recebimento ou pagamento regra que, aliás encontra acolhimento do POC – trata-se de um critério económico e não financeiro ou de caixa.
R-O nº 2 do artigo 18º do CIRC permite que alguns proveitos e custos respeitantes a um exercício possam ser imputados a exercícios posteriores se, na data do encerramento das contas daquele a que respeitam, forem imprevisíveis ou manifestamente desconhecidos, não obstante a determinação do lucro tributável obedecer ao princípio da especialização dos exercícios.
S-O nº 5 do artigo 18º do CIRC considera a hipótese dos proveitos e custos relativos a atividades de caráter plurianual poderem ser repartidos por diversos períodos, atendendo ao ciclo de produção ou tempo de construção.
T-Por sua vez, o artigo 19º estabelece algumas regras a ter em conta relativamente ao apuramento dos resultados das obras de caráter plurianual, pretendendo dar tradução a uma correlação temporal entre proveitos e custos de um mesmo exercício.
U-Desta forma, a Administração Fiscal estabeleceu dois critérios neste tipo de atividades: o critério de encerramento da obra e o critério de percentagem de acabamento.
V-Ora, relativamente ao critério da percentagem do acabamento, os resultados devem ser relevados contabilisticamente de acordo com o estado de evolução da obra sendo a sua utilização obrigatória nos casos previstos no nº 2 do artigo 19º do CIRC.
W-O que se pretende no artigo 19º do CIRC é que quando ocorre a venda se consiga determinar o resultado dessa venda em relação à obra.
X-O ponto 8. da referida Circular nº 5 refere que “Para efeitos do cálculo do grau de acabamento nos termos do número 4 do artigo 19º do Código do IRC, os custos incorporados na obra a considerar são os que sejam imputáveis à mesma de acordo com o sistema de custeio utilizado pela empresa para efeitos contabilísticos, sendo ainda de observar o seguinte: “Grau de acabamento”
(…)
b) Para determinação dos custos da obra deverão ser considerados os que com ela tenham uma relação direta, tais como mão - de - obra, materiais e depreciação de equipamento que nela foi usado exclusivamente e também os custos que, estando relacionados com a actividade geral da empresa, podem ser imputados especificamente a cada uma das suas obras, tais como seguros, assistência técnica e gastos gerais de construção.”
Y-Ou seja, no fundo o que se pretende é que na determinação dos resultados se obtenha uma margem bruta que é dada pelo valor de venda da fração e o custeio direto dessa fração, e que não é mais do que o custo da mercadoria vendida.
Z-E isso, obriga a que as empresas tenham de adotar um sistema de custeio consistente e uniforme, ou seja, que lhes permita em termos analíticos determinar o custo industrial de produção.
AA-O custo industrial de produção é constituído por duas componentes principais: mão - de - obra direta (salários dos operários + custos sociais), matéria - prima [EIMP + (compras + custos de compras – devoluções – descontos comerciais) - EfMP] e gastos gerais de fabrico (Ei Materiais Indiretos + Compras de Materiais Indiretos – Ef Materiais Indiretos + MOI + Outros custos produção [(energia elétrica, amortizações dos equipamentos, das máquinas e do edifício industriais, etc)].
BB- A Circular nº 5 ajuda a uniformização da determinação dos sistemas de custeio.
CC-Os custos de comercialização, publicidade e propaganda, serviços de gestão e custos financeiros, que foram imputados pela B…………… no total de € 241.943,69, e que contribuíram para o cálculo do resultado líquido dos exercícios de 2004 e 2005, nas contas de custos não são aceites para efeito de apuramento dos resultados tributáveis dos respetivos exercícios nos termos do artigo 18º do CIRC.
DD-O procedimento adotado nos anos de 2000 a 2002 foi abandonado no decorrer do exercício de 2003, na medida em que nesse exercício (conclusão do empreendimento), os custos referidos passaram a fazer parte do cômputo do resultado líquido desse exercício em que foram suportados, independentemente de já se terem vendido ou não a totalidade dos imóveis.
EE-O nº 6 do artigo 19º do CIRC dispõe que as empresas envolvidas em obras de carater plurianual deverão manter o mesmo método de apuramento de resultados até ao final da obra.
FF-O nº1, alínea b) do artigo 19º do CIRC apenas comtempla os custos de produção/construção, ou seja os custos diretos, aqueles que estão objetivamente ligados a determinado produto.
GG-No caso concreto os custos de comercialização, serviços de gestão, publicidade e propaganda e custos financeiros, contabilizados pela B…………… por não se tratarem de custos diretamente ligados à realização do empreendimento não têm aplicação no nº1 alínea b) do artigo 19º do CIRC e por conseguinte têm que ser contabilizados no exercício em que ocorreram.
HH-Desta forma, e por tudo quanto se expôs, entende a Fazenda Pública que a douta sentença enferma de errónea interpretação e aplicação do direito aplicável ao caso sub judice, porquanto faz errada aplicação do direito, máxime do nº 2, alínea b) do artigo 19º do CIRC e artigo 18º do CIRC.
X
A sociedade impugnante e ora recorrida produziu contra-alegações no âmbito da instância de recurso (cfr.fls.249 a 255 do processo físico), as quais encerra com o seguinte quadro Conclusivo:
1-As correcções fiscais em causa nos autos resultam da não aceitação de custos diferidos de exercícios anteriores e relacionados com actividades de carácter plurianual – os quais foram suportados com a globalidade de um empreendimento imobiliário, imputados gradualmente à medida que foram alienadas as fracções e em função da permilagem.
2-Ou seja, o custo global era registado, fraccionadamente, à medida em que era realizado o proveito para cuja realização aquele concorreu directamente – sendo certo que a AT não colocou em causa nem o efectivo suporte dos custos, nem a indispensabilidade dos mesmos para a realização de proveitos.
3-E daí que o Tribunal a quo tenha decidido, e bem, que:
“cumpriu a Impugnante os ditames legais e contabilísticos referentes à repartição dos custos, não estando em causa o princípio da especialização dos exercícios, por funcionar uma das suas excepções, o das obras plurianuais.”.
4-Refere a Recorrente, na sua conclusão V), que “relativamente ao critério da percentagem de acabamento, os resultados devem ser relevados contabilisticamente de acordo com o estado de evolução da obra” – o que constitui invocação nova que, como tal, não integrou a fundamentação das correcções fiscais em causa.
5-Outrossim, já no decurso do procedimento gracioso, a AT limitou-se a remeter genericamente para a Circular n.º 5, de 17.01.1990, da Direcção de Serviços do IRC (doravante “Circular”) e para o disposto no artigo 19.º CIRC, sem nunca explicitar, de forma clara, por que motivo não considerou os custos diferidos em causa.
6-É igualmente serôdia e írrita a invocação, feita na conclusão GG) do recurso a que se responde, no sentido de que os custos em causa nos autos não são “directamente ligados à realização do empreendimento” – o que não tem qualquer suporte probatório.
7-Outrossim, os custos diferidos incluem todo o conjunto de despesas relacionadas com o desenvolvimento dos projectos imobiliários em curso que, pela sua natureza, não são de incluir nas rubricas de existências - razão pela qual tais valores foram capitalizados de uma forma gradual e consistente com o reconhecimento dos proveitos com que se relacionam.
8-Como decidido por este Venerando Tribunal, «Sem pôr em causa a relevância fiscal de tal princípio [da especialização dos exercícios], não haverá impedimento à imputação de custos (ou de proveitos) a exercícios anteriores, quando tal imputação não tenha resultado de omissões voluntárias e intencionais com vista a operar transferência de resultados entre exercícios.»( Cfr. Ac. STA de 23.02.2000, rec. n. 24.039).
9-Vem a Recorrente alegar na sua conclusão DD) que o procedimento adoptado pela B……….. nos anos de 2000 a 2002 veio a ser alterado no exercício de 2003 - aludindo assim à falta de cumprimento do princípio da consistência.
10-Ora, quanto a este segmento, a Recorrente faz por olvidar a matéria de facto provada quanto à aludida alteração de procedimento contabilístico – mormente a constante no ponto 3. da matéria de facto assente – para cuja sindicância não é idóneo o presente recurso.
11-Ademais, como correctamente aferido pelo Tribunal a quo, pretende a Recorrente invocar um incumprimento do princípio da consistência, que a AT apenas veio a suscitar no decurso do procedimento gracioso – o que constitui uma ilegal fundamentação a posteriori (Cfr. Ac. STA, de 17.03.2005, Proc. 0103/05, in www.dgsi.pt, e neste sentido, entre outros, os Acs. STA de 10.11.98 (Pleno) – Rec. 32702, de 30.04.96 – Rec. 35734, de 14.06.00 – Rec. 45029 e de 19.12.01 – Rec. 48126).
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no qual termina pugnando pelo não provimento do recurso (cfr.fls.260 a 262 do processo físico).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.264 e 265 do processo físico), vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.224 a 226-verso do processo físico):
1-A Impugnante é uma sociedade que se dedica a “actividades de gestora de participações sociais” e está “abrangid[a] pelo regime especial de tributação de grupo de sociedades, previsto no artigo 63º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), e como sociedade dominante do mesmo é responsável pela entrega da declaração de rendimentos, modelo 22, relativa ao apuramento do resultado do grupo” – cfr. relatório de inspecção [RIT], a fls. 76 e 81 do procedimento de reclamação graciosa [PRG] apensado aos autos físicos;
2-A sociedade B…………. – Imobiliária e Serviços, SA faz parte do grupo referido em 1) e dedica-se a “Compra e Venda de Bens Imobiliários” – cfr. RIT, a fls. 96 e 98 do PRG apensado aos autos físicos;
3-No ponto 2 do Balanço da sociedade referida em 2, referente ao ano de 2003, consta que “Até 31 de Dezembro de 2002, era critério da Empresa o diferimento, na rúbrica de Acréscimos e Diferimentos, dos custos suportados com a gestão, financiamento, publicidade e comercialização, associados ao projecto imobiliário que está a desenvolver, passando a partir de 1 de Janeiro de 2003, a contribuir para o resultado do exercício e, que no exercício de 2003 ascende a 711.105 Euros. Esta alteração de critério prende-se com o facto da Empresa, a partir de 1 de Janeiro de 2003, ter adoptado as normas de contabilização definidas nas IAS (International Accounting Standards” – cfr. documento 2 junto com a petição inicial, a fls. 104 dos autos físicos;
4-Foi realizada pela técnica tributária C………………., entre 19 de Fevereiro e 24 de Julho de 2008, uma acção inspectiva externa à sociedade referida em 2), referente aos períodos de 2004 e 2005, tendo sido apurado IRC em falta, quanto ao exercício de 2005, no valor de € 284.573,34 – cfr. RIT, a fls. 93, 95 e 96 do PRG apensado aos autos físicos;
5-As correcções referidas em 4) decorreram de:
i. Não-aceitação de “custos diferidos de exercícios anteriores”, no valor de € 241.943,69;
ii. Não-aceitação de “provisões para depreciação de existências”, no valor de € 34.165,30;
iii. “Correcções nos termos do artigo 58.º-A do CIRC”, no valor de € 2.411;
iv. Não-aceitação de “custos suportados”, no valor de € 6.053,35;
– Cfr. Capítulo III do RIT, de fls. 98 a 106 do PRG apensado aos autos físicos, que se dá por integralmente reproduzido;
6-Foi efectuada a correcção referida em 5.i) uma vez que “Não podem ser imputados ao custo de produção/construção os custos de distribuição, de administração geral e os financeiros, estes são considerados custos do exercício em que são suportados.” – Cfr. RIT, a fls. 101 do PRG apensado aos autos físicos;
7-A correcção referida em 5.ii) decorre da acepção que os “custos considerados para efeitos do cálculo da provisão a parcela que diz respeito à quota-parte respectiva nos custos que foram deferidos não poderá ser aceite para efeitos fiscais uma vez que o artigo 36º do CIRC é claro quando define que o custo a considerar é o custo de produção. Assim, tendo em conta o documento suporte à provisão procede-se a um ajustamento fiscal ao resultado tributável de 2005 no montante total de € 34.165,30, que corresponde ao somatório da quota-parte dos imóveis objecto de provisão nos custos diferidos” – cfr. RIT, a fls. 103 do PRG apensado aos autos físicos;
8-Pelo ofício 57875/055, de 13 de agosto de 2008, foi enviado à sociedade referida em 2), por correio registado com a referência RM 046815599PT, o relatório resultante da inspecção referida em 4), para a morada constante do relatório – cfr. ofício, a fls. 90 e 91 do PRG apensado aos autos físicos;
9-Consta, no verso do envelope com o registo referido em 8), como motivo de devolução “Desconhecido” e a inscrição manuscrita de “não pertence à D………… Imobiliário” – cfr. envelope, a fls. 92 [verso] do PRG apensado aos autos físicos;
10-No dia 16 de Junho de 2009 foi emitida a liquidação 2009 8910014657, referente ao exercício de 2005, com o valor apurado “€ 0,00” – cfr. liquidação, a fls. 60 do PRG apensado aos autos físicos;
11-No dia 23 de Outubro de 2009, a Impugnante apresentou reclamação graciosa da liquidação referida em 10) – cfr. comprovativo de entrega de reclamação graciosa, a fls. 2 do PRG apensado aos autos físicos;
12-No dia 12 de Novembro de 2010 foi dado parecer e despacho concordante sobre informação elaborada pela técnica tributária C…………….., onde consta que:
“No âmbito do processo de reclamação graciosa n.º 1805200904004353 de 23-10-2009 interposto pela sociedade A…………. – SGPS, S.A. (A………), é alegada a incompatibilidade específica prevista na alínea d) do artigo 20º do Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária (RCPIT) da funcionária da inspecção designada par a acção de inspecção. […] Em 1999 foi efectuada uma reestruturação do grupo que passou pela fusão da D……….. Comércio e Serviços, S.A., na sociedade E……………., S.A., NIPC …………, entidade na qual fui integrada e na qual permaneci em funções até 8 de Junho de 2001, ano em que assumi funções na direcção Geral dos Impostos. No final da minha colaboração como trabalhadora dependente passei a exercer funções de apoio fiscal às empresas da área de distribuição. Não exerci funções na sociedade A………….. – SGPS, S.A., NIPC …………, ou prestei qualquer serviço a esta entidade durante o tempo em que durou a ligação laboral enunciada.”
– cfr. Informação, a fls. 162 a 163 [verso], que se dá por integralmente reproduzida;
13-A reclamação graciosa referida em 11) foi indeferida, por despacho de 30 de Dezembro de 2010, apresentando, como fundamento:
“i. Quanto a “IMPEDIMENTO DO AGENTE INSPECTIVO”, que “A) C…………. não exerceu funções em nenhuma das empresas do grupo de sociedade do Grupo A…………. de que a Reclamante (A…….. –SGPS, S.A., NIPC ………..) é a sociedade dominante, ou prestou qualquer serviço a esta entidade durante o tempo em que durou a ligação laboral enunciada (1998-2001). B) A título meramente exemplificativo podemos dizer que ainda que se considerasse que C………………… prestou serviços à sociedade A…………. até ao dia 8 de Junho de 2001, as acções de inspecção para as quais foi designada e que realizou tiveram início em 2008. Logo, o prazo de cinco anos estabelecido no normativo invocado foi respeitado. Pelo exposto concluímos que não houve vício de impedimento não declarado, susceptível de pôr em crise a imparcialidade da máquina fiscal, uma vez que não se verifica a alegada incompatibilidade específica prevista na alínea d) do Artigo 20.º do RCPIT”
ii. Quanto a “FALTA DE NOTIFICAÇÃO DA B……………. DA DECISÃO FINAL DO PROCEDIMENTO INSPECTIVO”, que “tendo a Administração Fiscal in casu, nos exactos termos em que a lei o determina e conforma, desencadeado os mecanismos ao seu alcance para notificação (envio da carta registada para o domicílio fiscal do Contribuinte) e desconhecendo os motivos (motivos estes que lhe são alheios) pelos quais a carta não foi recebida consideramos que a valoração dos factos deve ser feita contra a Reclamante, fazendo funcionar a presunção de notificação (art. 39.º, n.º 1 do CPPT);
iii. Quanto aos “CUSTOS DIFERIDOS DE EXERCÍCIOS ANTERIORES (241.943,69 €)”, que “Na prática, só os custos suportados até ao exercício de 2002 é que foram diferidos de acordo com a permilagem por cada uma das fracções que constituem o empreendimento, constatando-se, por isso, que existiu uma violação clara do princípio contabilístico da consistência. […] Face ao exposto, deverá ser INDEFERIDO o pedido apresentado na presente Reclamação Graciosa mantendo-se as correcções efectuadas ao exercício de 2005.”
– cfr. Projecto de Despacho e Despacho, de fls. 168 a 173 e 178, respectivamente, que se dão por integralmente reproduzidos.
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: "…Não se deram como não provados quaisquer factos relevantes para a decisão da causa…".
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: "… Ao declarar quais os factos que considera provados, o juiz deve proceder a uma análise crítica das provas, especificar os fundamentos que foram decisivos para radicar a sua convicção e indicar as ilações inferidas dos factos instrumentais.
A convicção do Tribunal sobre a matéria de facto provada baseou-se na prova documental oferecida pelas partes e indicada a seguir a cada um dos factos.
O depoimento da testemunha ……………….., ainda que credível e efectuado de forma isenta, não logrou alterar a matéria dada como provada, uma vez que apenas corrobora o conteúdo da contabilidade da Impugnante…".
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou procedente a presente impugnação, com fundamento na ilegalidade das correcções efectuadas relativas aos custos diferidos, tal implicando, igualmente, a anulação da correcção referente a provisões para depreciação de existências, pela primeira desconsideradas, na quota-parte (€ 34.165,30) dos imóveis objecto de provisão abarcados pelos ditos custos diferidos (cfr. nºs.5 a 7 do probatório supra).
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Relembre-se que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal "ad quem", ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, "ex vi" do artº.281, do C.P.P.Tributário).
O recorrente dissente do julgado alegando, em síntese, que não podem ser imputados aos custos de produção/construção as despesas de distribuição, de administração geral e os custos financeiros, pois estes são considerados custos do exercício em que são suportados, nos termos do artº.18, do C.I.R.C. Que tais despesas não estão directamente ligadas à realização do empreendimento, assim não se enquadrando na previsão do artº.19, nº.2, al.b), do mesmo diploma. Que a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito, porquanto, faz uma errada aplicação dos artºs.18 e 19, do C.I.R.C. (cfr.conclusões A) a HH) do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
A base de incidência do I.R.C. estava consagrada no artº.3, do C.I.R.C. (na redacção em vigor em 2005, a aplicável ao caso "sub iudice"), sendo, nos termos do seu nº.2, definido o lucro tributável como o resultante da "diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código".
Por outro lado, era no artº.17 e seg. do mesmo diploma que se consagravam as regras gerais de determinação do lucro tributável, especificando-se no artº.23 quais os custos que, como tal, deviam ser considerados pela lei.
Para o conceito fiscal de custo valia a definição constante do aludido artº.23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que sejam os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que, inevitavelmente, daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para tal efeito (cfr. J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, Lex Lisboa 2000, 2ª. Edição, pág.237 e seg.; António Moura Portugal, A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, pág.101 e seg.; Rui Duarte Morais, Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, pág.79 e seg.).
Os gastos e perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico (cfr.F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.Edição, 1996, pag.206 e seg.; Rui Marques, Código do IRC anotado e comentado, Almedina, 2019, pág.203 e seg.).
"In casu", o Tribunal "a quo", concluiu pela ilegalidade das correcções efectuadas pela A. Fiscal relativas aos custos diferidos, os quais foram contabilizados pela sociedade "B…………. - Imobiliária e Serviços, S.A." no ano fiscal de 2005, empresa que faz parte do perímetro do grupo consolidado, tal implicando, igualmente, a anulação da correcção referente a provisões para depreciação de existências, pela primeira desconsideradas, na quota-parte (€ 34.165,30) dos imóveis objecto de provisão abarcados pelos ditos custos diferidos, não estando em causa o princípio da especialização dos exercícios, por funcionar uma das suas excepções, o das obras plurianuais, cujo regime se encontrava previsto no artº.19, do C.I.R.C.
O recorrente, pelo contrário, defende que os custos em causa no processo (despesas de comercialização, serviços de gestão, de publicidade e propaganda e os custos financeiros) não se enquadram na previsão do artº.19, nº.2, al.b), do C.I.R.C., antes devendo ser considerados custos do exercício em que são suportados, nos termos do artº.18, do mesmo diploma, portanto, sujeitar-se ao citado princípio da especialização dos exercícios. Pelo que, ao não decidir desta forma, incorreu o Tribunal "a quo" em erro de julgamento.
Vejamos quem tem razão.
Dir-se-á, antes de mais, que é hoje pacífico que as leis fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina (cfr.artº.9, do C.Civil; artº.11, da L.G.Tributária; José de Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral, Editorial Verbo, 4ª. edição, 1987, pág.335 e seg.; J. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1989, pág.181 e seg.; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de C.T.Fiscal, nº.174, 1996, pág.363 e seg.).
A vida de uma unidade económica não possui, em regra, qualquer limitação temporal, caracterizando-se pelo desenvolvimento de uma actividade de duração tendencialmente ilimitada, facto, aliás, que suporta a previsão, em sede do direito contabilístico, do princípio da continuidade da exploração. Porém, a actividade da unidade económica evolui em diversas fases, temporalizadas por exercícios económicos, genericamente coincidentes com o ano civil, realidade que alicerça, em termos de contabilização e de tributação, a previsão do princípio da especialização ou do acréscimo, ínsito no artº.18, do C.I.R.C. (cfr.artº.22, do anterior C.C.I.), o qual determina que os proveitos e os custos devem ser imputados ao período a que respeitam, independentemente do seu recebimento ou pagamento. Por outra palavras, em determinado exercício, devem ser contabilizados os proveitos, e também os custos, que nele efectivamente tenham sido realizados, nisto se expressando o dito princípio da especialização dos exercícios (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 2/04/2008, rec.807/07; J.L.Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, Deveres de Cooperação, Autoavaliação e Avaliação Administrativa, 2ª. Edição, Lex, 2000, pág.224 e seg.; António Moura Portugal, A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, pág.172 e seg.; Rui Duarte Morais, Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, pág.64 e seg.).
Abordemos, agora, o regime das obras de carácter plurianual, as quais colocam especiais dificuldades à concretização do princípio da especialização dos exercícios, previsto no artº.18, do C.I.R.C., na redacção em vigor no ano de 2005.
O citado regime das obras de carácter plurianual merecia consagração legal no artº.19, do C.I.R.C.
Sendo pacificamente aceite que o momento de reconhecimento dos proveitos obtidos e dos custos incorridos nem sempre coincidem com os dos respectivos recebimentos e pagamentos, nem por isso aqueles dois pares de factos patrimoniais podem ser definitivamente dissociados. Quer isto significar que um proveito só o será verdadeiramente se lhe vier a suceder uma receita ou recebimento de um meio usual de pagamento ou uma desobrigação de um passivo e, por forma semelhante, um custo só o será verdadeiramente se lhe vier a suceder um dispêndio, uma despesa ou pagamento ou então uma diminuição de um qualquer activo afecto ao património.
Havendo a possibilidade de diferimento entre as operações geradoras de proveitos e de incorrência em custos e as dos correspondentes recebimentos e pagamentos devem, por isso, os proveitos e os custos, quando não recebidos ou pagos de imediato, ser reconhecidos quando houver uma razoável probabilidade de os mesmos serem cobrados dos devedores ou satisfeitos aos credores, respectivamente.
Compreendem-se no citado artº.19, do C.I.R.C., as obras cujo ciclo de produção ou tempo de construção seja superior a um (1) ano, isto é, aquelas cuja duração de execução se estende para além de um exercício económico. Nesta definição cabem, a título exemplificativo, a construção de pontes, barragens, estradas, edifícios, navios e bens de equipamento, não se circunscrevendo, portanto, à construção civil e empreitadas de obras públicas e privadas. São excluídas da previsão do preceito, todavia, as actividades de ciclo de produção ou de tempo de construção inferior a doze meses, embora com início e termo situados em dois períodos fiscais anuais diferentes.
Consagra-se no preceito a possibilidade de as empresas que realizam obras de carácter plurianual adoptarem, na determinação dos resultados, o método do encerramento da obra ou o método da percentagem de acabamento, reconhecidos de há longa data pela prática contabilística e recomendados pelas normas internacionais de contabilidade.
A possibilidade de opção entre os dois métodos identificados (método do encerramento da obra ou método da percentagem de acabamento) é muito restringida pelo legislador (cfr.artº.19, nº.2, do C.I.R.C.), o qual impõe a utilização do método da percentagem de acabamento nas obras públicas ou privadas em que haja lugar a facturações parciais do preço estabelecido e as obras realizadas tenham atingido o grau de acabamento correspondente aos montantes facturados e, igualmente, nas obras efectuadas por conta própria e vendidas fraccionadamente.
Estamos perante métodos que pretendem dar tradução à correlação temporal entre proveitos e custos, tendo como pano de fundo o citado princípio da especialização dos exercícios e que suscitam relevantes dificuldades de aplicação. No caso específico do método da percentagem de acabamento, tal regime deve ser complementado pela Circular 5/90, de 17/01/1990, da Direcção-Geral dos Impostos (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/12/2018, proc.7907/14; Maria dos Prazeres Lousa, A determinação dos resultados nas obras de carácter plurianual, Revista Fisco, nº.8, Maio de 1989, pág.3 e seg.; Rui Duarte Morais, Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, pág.71 e seg.; F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.Edição, 1996, pag.181 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, reconhecendo a própria Fazenda Pública que nos encontramos perante obras de carácter plurianual e tendo por objecto vendas fraccionadas, se deve aplicar o critério da percentagem de acabamento supra identificado nos termos do artº.19, nº.2, al.b), do C.I.R.C., na versão em vigor em 2005 (cfr.nºs.5 e 6 do probatório), assim constituindo uma excepção ao princípio da especialização dos exercícios, previsto no artº.18, do mesmo diploma (cfr.artº.18, nº.5, do C.I.R.C.).
Apesar disso, a A. Fiscal considerou que determinados custos (despesas de comercialização, serviços de gestão, de publicidade e propaganda e os custos financeiros) não se enquadravam na previsão do artº.19, nº.2, al.b), do C.I.R.C., antes devendo ser considerados custos do exercício em que são suportados, nos termos do artº.18, do mesmo diploma, portanto, sujeitar-se ao citado princípio da especialização dos exercícios.
"In casu", não se percebe porque tais despesas não podem ser consideradas como custos indirectos do empreendimento imobiliário em causa, assim sendo passíveis de imputação diferida de acordo com o critério da permilagem, tal como foi contabilizado pelo sujeito passivo. E recorde-se que a citada Circular 5/90, de 17/01/1990, no seu nº.6, consagra a possibilidade de imputação fraccionada dos custos indirectos (v.g.gastos gerais de construção (cfr.Rui Marques, Código do IRC anotado e comentado, Almedina, 2019, pág.179).), nomeadamente, de acordo com o aludido critério da permilagem. Ora se, em regra, nos gastos gerais de construção não se detecta uma relação inequívoca com determinados proveitos, no caso concreto é no próprio relatório dos serviços de inspecção que é reconhecida essa relação (cfr.nºs.5 e 6 do probatório; teor do relatório de inspecção cuja cópia se encontra junta a fls.93 a 107 do processo de reclamação graciosa apenso). E verificando-se esse nexo de imputação entre os custos indirectos contabilizados e o empreendimento imobiliário realizado, existe fundamento para que os mesmos sejam abarcados pela regra do diferimento de custos nos termos do artº.19, nº.2, al.b), do C.I.R.C., desde que os métodos contabilísticos usados sejam fiáveis e aplicados consistentemente a todos os custos que tenham características semelhantes, situação que, no caso "sub iudice", não é questionada pela A. Fiscal no relatório de inspecção.
Sem necessidade de mais amplas considerações, confirma-se a decisão recorrida, a qual não padece dos erros de julgamento de direito que lhe são imputados (errada aplicação dos artºs.18 e 19, do C.I.R.C., então em vigor).
Atento o relatado, nega-se provimento ao presente recurso e, em consequência, mantém-se a sentença recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DESTE SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A SENTENÇA RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 12 de Maio de 2021. - Joaquim Manuel Charneca Condesso (relator) - Paulo José Rodrigues Antunes - Pedro Nuno Pinto Vergueiro.