Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:027/03.0BTPRT
Data do Acordão:02/23/2022
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
TRIBUTAÇÃO PELO LUCRO CONSOLIDADO
IRC
INCONSTITUCIONALIDADE
VIOLAÇÃO
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Sumário:I - No que ao segmento decisório respeitante à correcção relativa ao acréscimo do diferencial de prejuízos a que se reporta o artigo 59.º n.º 11 do CIRC (redacção aplicável) existe oposição juridicamente relevante entre os arestos em confronto, porquanto a mesma questão fundamental de direito foi decidida de forma expressa em sentido oposto num e noutro: no sentido da aplicação literal do n.º 11 do artigo 59.º do Código do IRC no acórdão recorrido, abrangendo no seu âmbito situações, como a dos autos, em que existe uma mera alteração da composição do perímetro em resultado da saída autorizada de uma ou mais sociedades ; no sentido da interpretação restritiva da mesma norma, com o cálculo da reposição, em sede de lucro tributável, a ser efectuado em singelo e não sujeito ao factor de 1,5 consagrado no preceito, no acórdão fundamento, sendo que, num e noutro caso, está em causa a aplicação da mesma norma jurídica – o n.º 11 do artigo 59.º do Código do IRC, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 71/93 -, a situações de facto que não se descortina serem substancialmente díspares.
II - Na vigência do Regime de Tributação pelo Lucro Consolidado constante do Código do IRC – artigos 69.º a 72.º - o artigo 5.º da Lei de Orçamento Suplementar ao Orçamento do Estado para 1993 (Lei n.º 71/93 de 6 de novembro), veio introduzir alterações várias, entre as quais aquela que é objecto de apreciação nos presentes autos, determinadas por razões reditícias, que veio tornar o regime, nas palavras da “Comissão para o Desenvolvimento da Reforma Fiscal” “bastante complexo e relativamente pouco atrativo” , designadamente em razão da “penalização imposta às alterações na composição dos grupos consolidados”, recomendando a Comissão que “Na situação de saída de uma empresa do grupo consolidado, (…) os benefícios auferidos no âmbito do grupo consolidado sejam repostos, apenas com a incidência de juros compensatórios em substituição do actual regime” .
III - Também em matéria fiscal, e também perante o legislador – ao menos quando a desproporção seja evidente ou manifesta- o princípio da proporcionalidade ou da “igualdade proporcional” , decorrente da própria ideia de Justiça e corolário do princípio do Estado de Direito (art. 2.º da CRP) parece impor-se e sancionar com um juízo negativo de inconstitucionalidade normas que imponham um desfavorável tratamento igual a situações substancialmente diferentes e que se revelem desadequadas, desnecessárias e excessivas.
IV - É convicção deste Supremo Tribunal que tal sucede com a aplicação do acréscimo em 50% do diferencial dos prejuízos em situação como a dos autos, ex vi do n.º 11 do artigo 59.º do Código do IRC, na redação da Lei n.º 71/93, de 6 de novembro, razão pela qual se entende ser de desaplicar o referido segmento da norma.
V - Como tal, na medida em que, para além da reposição dos prejuízos “em singelo”, lhe acresce o valor de 50% do diferencial destes, será a norma do n.º 11 do artigo 59.º do Código do IRC, na redacção então vigente, desaplicada por inconstitucionalidade.
Nº Convencional:JSTA00071404
Nº do Documento:SAP20220223027/03
Data de Entrada:06/04/2021
Recorrente:Z....... INDÚSTRIA DE REVESTIMENTOS, SGPS, S.A.
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Legislação Nacional:ART. 59.º, n.º 11 CIRC;
ART. 02.º CRP/76
ART. 05.º LEI N.º 71/93, DE 06/11
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


- Relatório -

1 – Z……… SGPS, S.A., com os sinais dos autos, não se conformando com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte de 17 de janeiro de 2014 (complementado pelo acórdão proferido em 14 de julho de 2017, corretivo de erro material daquele) vem, nos termos do artigo 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário - CPPT (na redacção anterior à actual), dele interpor recurso para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste STA por alegada oposição daquele aresto:

- com o decidido por acórdão do TCA Norte de 18 de março de 2010, proc. n.º 00141/04, “no segmento em que aquele douto Acórdão manteve a correcção de ESC. 46.826.458$00, respeitante ao acréscimo do diferencial de prejuízos a que se reporta o artigo 59.º n.º 11 do CIRC (redacção aplicável)”;

- com o decidido por Acórdão do STA de 24 de outubro de 2007, proc. n.º 0429/07, “no segmento em que o douto Acórdão aqui recorrido considera inverificado o vício de violação do direito de audição prévia;

ambos transitados em julgado.

A recorrente apresentou alegação tendente a demonstrar a alegada oposição de julgados, concluindo que Em situações equivalentes e perfeitamente equiparáveis, senão mesmo iguais, quer do ponto de vista factual, quer legislativo, estamos perante as aludidas oposições de Acórdãos, nos sobreditos 2 segmentos decisórios.

Admitido o recurso pelo Tribunal Central Administrativo Norte a 3 de maio de 2021 (conforme consta de fls. 289 do SITAF), a Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, que terminou com as seguintes conclusões:

1. O douto Acórdão aqui recorrido, no segmento em que manteve a majoração, em 50% (ou seja, majoração em 1,5x), do acréscimo do diferencial de prejuízos a que se reporta o artigo 59º nº 11 do CIRC (redacção aplicável a 1993),

2. está em oposição com o douto Acórdão do TCAN, 2ª Secção/Contencioso Tributário, de 18.03.2010, Proc. 00141/04 (Relator: Francisco Rothes), in www.dgsi.pt, transitado em julgado (Acórdão fundamento, neste segmento).

3. Segundo o douto Acórdão recorrido, num caso de mera alteração da composição do perímetro de consolidação fiscal, tão só por causa de saída de sociedade(s), a que se reporta em especial o disposto no nº 11 do artigo 59º do CIRC (redacção aplicável),

4. cuja permanência do RTLC (regime da tributação pelo lucro consolidado) foi devidamente autorizado pela AT, sem qualquer incumprimento daquele RTLC,

5. deve ser aplicada a mesma majoração de 50% a que alude o nº 10 do mesmo preceito legal, especialmente prevista para os casos da cessação do RTLC.

6. Entende o douto Acórdão recorrido que aquela majoração de 50% não tem cariz de sanção.

7. Considerando ainda que não deve ser feita uma interpretação restritiva do disposto no artigo 59º nº 11 do CIRC.

8. E que o entendimento nele propugnado não contende com os princípios constitucionais da proporcionalidade, tributação pelo lucro real e respeito pela capacidade contributiva.

Por sua vez,

9. O douto Acórdão fundamento, em frontal oposição com aquele, considera que, nas mesmas circunstâncias, não deve ser aplicada a majoração de 50% a que alude o nº 10 do mesmo preceito legal, especialmente prevista para os casos da cessação do RTLC.

10. Também em total oposição com o douto Acórdão recorrido, considera o douto Acórdão fundamento que deve ser feita uma interpretação restritiva do disposto no artigo 59º nº 11 do CIRC,

11. ou seja, considera que a ratio legis ou pensamento legislativo, igualmente relevantes na interpretação das normas legais, estão aquém da letra da lei, que por isso deve ser interpretada/ajustada em conformidade.

12. Ainda em oposição com o douto Acórdão recorrido, considera o douto Acórdão fundamento que a majoração de 50% tem cariz de sanção, sendo por isso aplicável apenas nos casos do nº 10 do mesmo preceito legal, em que ocorre a cessação do RTLC.

13. Finalmente, também em oposição com o douto Acórdão recorrido, o douto Acórdão fundamento considera que o entendimento nele propugnado não contende com os princípios constitucionais da proporcionalidade, tributação pelo lucro real e respeito pela capacidade contributiva.

Por outro lado,

14. Como também se mencionou no requerimento de interposição do recurso, o douto Acórdão aqui recorrido, no segmento em que considera inverificado o vício da violação do direito de audição prévia,

15. está em oposição com o douto Acórdão do STA, 2ª Secção, de 24.10.2007, Proc. 0429/07, in www.dgsi.pt, transitado em julgado (Acórdão fundamento, neste segmento).

16. Perante situações iguais, de não concessão ao contribuinte do direito de audição prévia antes da liquidação,

17. e sobretudo perante situações iguais, em que a liquidação, posteriormente, foi parcialmente anulada, em ambos os casos no âmbito do processo de impugnação judicial,

18. o douto Acórdão recorrido entende que se aplica o princípio do aproveitamento do acto administrativo, enquanto o douto Acórdão fundamento, em oposição frontal com aquele, entende que não,

19. já que, como se refere no douto Acórdão fundamento, aquele princípio do aproveitamento do acto apenas poderá ser aplicado quando não se possam suscitar quaisquer dúvidas sobre a irrelevância do exercício do direito de audiência,

20. o que, como se afirma no mesmo Acórdão fundamento (em total oposição com o douto Acórdão recorrido), é de afastar quando a liquidação, na pendência da Impugnação Judicial, veio a ser parcialmente anulada (como igualmente sucedeu in casu).

21. Com efeito, se se verifica, a posteriori, que a liquidação deve ser parcialmente anulada, então não se pode considerar, sem margem para quaisquer dúvidas, que o eventual exercício do direito de audição prévia (à liquidação), se tivesse sido concedida essa oportunidade ao contribuinte, não poderia, em abstracto, alterar essa mesma liquidação.

Posto isto,

22. O douto Acórdão recorrido padece de erro de julgamento e de errada interpretação e aplicação das disposições legais nele mencionadas.

Com efeito,

23. Foi provado que, na sequência de pedido formulado pela Recorrente, as competentes autoridades fiscais autorizaram a tributação pelo lucro consolidado, para os exercícios de 1993 a 1997, para o grupo de sociedades de que era dominante a Recorrente, apesar da saída de sociedades desse mesmo perímetro fiscal, em 1994.

24. Mais concretamente, foi provado que, na sequência da saída da sociedade “Z……… Tecnologias de Informação, SA”, do âmbito de consolidação fiscal, em 1994, a Recorrente apresentou uma declaração de substituição modelo 22 relativamente ao exercício de 1993,

25. na qual procedeu à reposição dos prejuízos fiscais não compensados imputáveis àquela sociedade, sem o respectivo agravamento de 50% (cfr. 5. e 10. dos “factos provados”).

26. E foi provado que a Recorrente foi autorizada, pelas autoridades fiscais, à tributação pelo lucro consolidado relativamente aos períodos de 1994 a 1998.

27. Está em causa é o agravamento de 50% a que se refere o nº 10 do artigo 59º do CIRC (redacção aplicável a 1993), por remissão do nº 11 do mesmo preceito, conforme se deduz da factualidade provada.

28. De facto, ao ordenar o acréscimo de 1,5 do valor dos prejuízos fiscais, o nº 10 do artigo 59º do CIRC ordena o acréscimo não só do valor dos prejuízos fiscais, como agrava e penaliza esse acréscimo em 0,5 (50%).

29. E é precisamente esta penalização de 50% que aqui concretamente está em discussão.

30. Sendo certo que o preceito concretamente em questão é o nº 11 do artigo 59º do CIRC.

31. De facto, e conforme resulta da factualidade provada, o que ocorreu foi a saída, em 1994, do grupo fiscal, da referida “Z……….. Tecnologias de Informação, SA”, sem que tivesse havido lugar à caducidade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado – situação à qual se aplica o nº 11 do artigo 59º do CIRC.

32. Com efeito, e conforme resulta da factualidade provada, no caso concreto não se verificou a caducidade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado – sendo que o nº 10 do artigo 59º do CIRC reporta-se expressamente tão só e apenas a este tipo de situações.

33. De facto, o relatório inspectivo que esteve na génese desta correcção, e que se encontra parcialmente transcrito em 10. dos “factos provados”, é claro ao afirmar que o acréscimo de Esc. 46.826.458$00, aqui concretamente em questão, é “relativo ao acréscimo a que se refere o nº 11 do artº 59º do CIRC”.

34. Com efeito, o valor que a Recorrente entende como correcto corresponde àquele que foi oportunamente declarado na declaração modelo 22 de substituição apresentada relativamente a 1993, na sequência da saída da dita “Z………. Tecnologias de Informação, SA” do âmbito de consolidação fiscal, ou seja, o valor de 93.652.915$00; e não de 140.479.373$00 (= 93.652.915$00 x 1,5), como entende AT.

35. "In casu", o grupo simplesmente procedeu à reposição dos prejuízos fiscais imputáveis à "Z…….. Tecnologias de Informação, SA", incluindo os reportes de prejuízos fiscais não compensados, mas sem qualquer penalidade de 50%.

36. Conforme resulta da factualidade provada, o que está aqui concretamente em causa não é qualquer “sanção ” traduzida na caducidade da autorização para a tributação segundo o regime da tributação pelo lucro consolidado.

37. Muito pelo contrário, dado que a saída do grupo, em 1994, da sociedade Z……….. Tecnologias de Informação, SA, foi devidamente autorizada pelas autoridades fiscais - que autorizaram o grupo a permanecer no regime da tributação pelo lucro consolidado, apesar daquela saída -, não houve caducidade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado,

38. tal como resulta claramente da factualidade provada.

39. De facto, e tal como resulta igualmente da factualidade provada, o que está em causa é o facto da Recorrente, na sobredita declaração de rendimentos de substituição, ter acrescido, quanto ao exercício de 1993, tão só os prejuízos fiscais imputáveis àquela sociedade que saiu do consolidado em 1994, Esc. 93.652.915$00,

40. sem a penalização de 50% prevista no nº 11 do artigo 59º do CIRC, Esc. 46.826.458$00,

41. daí resultando, por conseguinte, que a correcção tenha ascendido a este último montante de Esc. 46.826.458$00.

42. O douto Acórdão recorrido entendeu que essa correcção não padece de qualquer ilegalidade.

43. Ora, o circunstancialismo factual a que se reportam os nºs 10 e 11 do artigo 59º do CIRC é totalmente distinto.

44. Aliás, é mesmo oposto: no caso de nº 10, pressupõe-se ter havido caducidade daquela autorização; no caso do nº 11, o legislador pressupõe exactamente o contrário, ou seja, que não houve caducidade dessa mesma autorização,

45. precisamente porque o grupo, apesar da saída de uma ou mais sociedades do grupo, obteve nova autorização para a tributação pelo lucro consolidado, nos termos dos nºs. 3 e 7 do artigo 59º do CIRC.

46. Ora, já daqui se vê que, sendo os pressupostos de aplicação dos nºs 10 e 11 inteiramente opostos, as correspondentes soluções legais não podem ser as mesmas.

47. Aliás, aqueles nºs 10 e 11 são igualmente distintos no seguinte: o nº 10 reporta-se às situações de caducidade da autorização pelo lucro consolidado quando: (i) deixam de ser verificar as condições legais previstas nas várias alíneas do nº 2 do mesmo preceito (mudança da sede ou direcção efectiva de alguma das sociedades do grupo para fora do território português; a sociedade dominante deixa de deter, pelo menos, 90% das dominadas; a totalidade dos rendimentos das sociedades do grupo deixa de estar sujeita ao regime geral de tributação e IRC); (ii) verifique-se a inobservância dos requisitos eventualmente impostos pela autorização administrativa (para a tributação pelo lucro consolidado); e (iii) ocorram alterações na composição do grupo.

48. Por sua vez, o nº 11 do artigo 59º do CIRC refere-se apenas ao caso específico da saída de uma ou mais sociedades do grupo – e quando não haja caducidade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado, precisamente porque o grupo, não obstante essa saída, obteve autorização administrativa, da AF, para a continuidade da aplicação do regime da tributação pelo lucro consolidado relativamente às sociedades que se mantiveram no grupo (nos termos dos nºs 3 e 7 do mesmo preceito).

49. Assim, os âmbitos de aplicação dos nºs 10 e 11 do artigo 59º do CIRC são totalmente distintos e autónomos.

50. Com efeito, os n.ºs 10 a 12 do artigo 59º do CIRC expressam situações de regularização de prejuízos fiscais quando exista caducidade por incumprimento das disposições legais quanto à autorizada consolidação (nº 10);

51. a saída de empresas e consequente alteração do perímetro, sem que haja incumprimento (nº 11);

52. e, por fim, também quando não haja renovação do pedido de consolidação (nº 12).

53. No n.º 10 está em causa o incumprimento das condições de manutenção do consolidado.

54. Importa saber qual a razão para que se aplique o factor 1,5 nos casos a que se reporta o nº 10 do artigo 59º do CIRC.

55. É que, caso haja caducidade da autorização, o consolidado já é penalizado com a exigência de impostos respeitantes a períodos anteriores e respectivos juros compensatórios.

56. Ora, tais ajustamentos só podem analisar-se quando se verifiquem vários períodos.

57. Ou seja, haverá que determinar em que medida é que uma sociedade, que obteve um prejuízo num dado ano (e que o compensou no consolidado), teria a capacidade de o "anular" por via de lucros que fizesse no período ou períodos seguintes, caso tivesse sido tributada autonomamente.

58. Com esta disposição pretendeu-se impedir que sociedades “sempre perdedoras" (com prejuízos fiscais em sucessivos anos) pudessem contribuir durante os períodos que quisessem, e enquanto se mantivessem nos perímetros de consolidação, para a diminuição/anulação da tributação consolidada.

59. Foi esta a motivação e que se traduz afinal na previsível "penalização" do consolidado, através da "reposição" dos prejuízos fiscais que a empresa nunca teria a hipótese de fruir nos anos imediatos, caso fosse tributada autonomamente, ainda que se admita a "recuperação" desses prejuízos fiscais para utilização individual (cfr. segunda parte da alínea c) do artigo 60.º do CIRC).

60. Já no n.º 11 do artigo 59º do CIRC, ao contrário do que entende o douto Acórdão recorrido, quando estão em causa meras alterações da composição dos perímetros fiscais devidamente autorizadas pela AF, como é o caso e resulta da factualidade provada acima transcrita, em que há continuidade do RTLC, há que repor tão só a dita diferença de prejuízos, como fez a Recorrente - sem qualquer penalização ou majoração de 50 %.

61. Ou seja, são situações em que não ocorre a cessação do RTLC – às quais se reporta outrossim o nº 10 do artigo 59º do CIRC, redacção aplicável.

62. Com efeito, nas situações de alteração na composição do grupo fiscal devidamente autorizadas pela AF, como é o caso, obviamente que não estão em causa quaisquer situações de incumprimento por parte do contribuinte, muito menos a cessação do RTLC em consequência desse incumprimento.

63. Ora, nesta hipótese não se pode obviamente aplicar qualquer penalidade de 50%.

64. A mera saída de sociedades do grupo, devidamente autorizada pela AF, ou seja, com a continuação do grupo fiscal/RTLC sem as sociedades que saíram, acarreta tão só a anulação, no consolidado fiscal, do eventual "contributo" (com prejuízos fiscais) das sociedades que saíram.

65. A própria FP reconhece que estamos perante uma situação devidamente autorizada pela própria AF.

66. Ora, perante um quadro desses, não se vislumbram quaisquer razões objectivas e/ou substanciais para aplicar uma penalização/sanção de 50%.

67. De facto, uma coisa será a mera "alteração da composição do grupo", mantendo- se o grupo (artigo 59º nº 7 do CIRC); outra, substancialmente distinta, é a caducidade/cessação do grupo fiscal (artigo 59º nº 6 do CIRC).

68. Com efeito, o grupo, apesar da saída de sociedades, obteve nova autorização da AF para a tributação pelo lucro consolidado, nos termos dos nºs. 3 e 7 do artigo 59º do CIRC.

69. Logicamente, perante situações factuais tão distintas, para não dizer OPOSTAS, os efeitos fiscais daí advenientes não podem obviamente ser os mesmos.

70. O nº 10 do artigo 59º do CIRC refere-se às situações de efectiva caducidade/cessação do grupo e não às situações de mera alteração do composição do grupo “sem que haja lugar a caducidade da autorização…" (artigo 59º nº 11 do CIRC).

71. A alteração na composição do grupo não determina sempre a sua cessação, pelo que haverá que distinguir as situações, isto é, os casos de cessação por incumprimento de regras ou normas legais, ou por alteração da composição do grupo sem autorização da AF para a continuação do grupo.

72. Situações que não se verificam no caso concreto, conforme decorre da factualidade provada, acima transcrita.

73. Por conseguinte, contrariamente ao decidido, a correcção em causa apenas se aplica aos casos de caducidade/cessação objectiva do RTLC, por força da lei, com a consequente aplicação do nº 10 da disposição legal considerada, ou seja, a penalização de 1,5.

74. Não entende a Recorrente como é possível aceitar (e interpretar) a penalização de 50% nos casos previstos no número 11 do artigo 59º do CIRC.

75. Aliás, também no n.º 12 do artigo 59º do CIRC, relativo a situações de livre opção do contribuinte pela não renovação do RTLC - situações em que chegou ao fim o período para o qual foi autorizado o grupo fiscal -, não se prevê qualquer majoração/penalização pelo factor 1,5, o que está na esteira do referido.

76. Com efeito, nessas situações trata-se tão só do fim do consolidado por legítima opção do contribuinte, sem qualquer incumprimento – o que justifica a não aplicação de qualquer penalização/sanção de 50%.

77. Ou seja, são situações de caducidade do regime de tributação pelo lucro consolidado, não por incumprimento da autorização anteriormente concedida, mas por mera não renovação do RTLC uma vez findo o período de validade da autorização (5 anos).

78. Situação, esta, também ela totalmente díspar daquela a que se reporta o nº 10 do mesmo preceito legal – no caso do nº 10, verifica-se que, no decurso do período de validade da autorização, o grupo violou os requisitos para a continuação no regime especial de tributação pelo lucro consolidado, daí advindo a caducidade dessa autorização.

79. Já nos casos do nº 12 do mesmo preceito, a caducidade advém meramente do facto de se ter chegado ao fim do período de 5 exercícios, que é o período máximo de validade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado, porque a sociedade dominante, simplesmente, não pretendeu a sua prorrogação - tal como decorre do disposto no nº 5 do artigo 59º do CIRC.

80. Ora, esse caso é paralelo à saída de sociedades com autorização da manutenção da consolidação fiscal com as sociedades que ficam, como é o caso, em que também não há qualquer incumprimento do contribuinte, muito pelo contrário – há AUTORIZAÇÃO EXPRESSA DA AF para a continuidade do RTLC.

81. Nestes casos - saídas de empresas que determinam apenas "alteração da composição do grupo" -, deve apenas existir a reposição dos prejuízos fiscais, sem a penalização de 50%, uma vez que a simples saída de empresas não determina a existência de razões determinantes (objectivas) de qualquer incumprimento, tanto mais que as alterações foram oportunamente autorizadas pela AF.

82. O que está em causa é tão somente a não renovação da aplicação do regime para as empresas que saem, à semelhança do que acontece no final do período de autorização de aplicação do regime de consolidação (artigo 59º nº 12 do CIRC).

83. Pelo que não devem ser diferentes as consequências, em particular no domínio do ajustamento dos prejuízos fiscais, quer para a não renovação total do RTLC (artigo 59º nº 12 do CIRC), quer para a não renovação parcial, ou seja, apenas para as sociedades que saíram do RTLC (artigo 59º nº 11 do CIRC).

84. De facto, não será admissível que uma simples alteração na composição do grupo produza os mesmos efeitos das situações derivadas de incumprimento das normas legais -circunstâncias estas que, essas sim, determinam a cessação do RTLC, por imposição legal.

85. Com efeito, este preceito legal - ao invés das situações a que se refere o nº 10 e à semelhança das situações a que se reporta o nº 12 do mesmo diploma legal -refere-se a situações de alteração na composição do grupo sem caducidade do mesmo, i.e. a alterações da composição no grupo oportuna e voluntariamente comunicadas à AF e por esta devidamente autorizadas – como foi o caso e ficou provado (vide supra),

86. sem que haja qualquer incumprimento dos requisitos de permanência no regime da tributação pelo lucro consolidado quanto às sociedades que continuaram no RETGS.

87. A ratio deste preceito legal (nº 11 do artigo 59º do CIRC) está em evitar a criação de grupos fiscais com o único objectivo de aproveitamento dos prejuízos fiscais de sociedades sistematicamente deficitárias e que de outra forma (sem a sua incorporação num grupo fiscalmente considerado) nunca seriam aproveitados.

88. Ora, num caso, como o dos autos, em que a própria AT autoriza a continuação do RTLC, é evidente a inexistência de um grupo societário com o único intuito de aproveitamento fiscal – nem há qualquer sinal ou indício, sequer, nesse sentido.

89. Sendo isto pacífico, parece-nos que a ratio do preceito se basta com a reposição dos prejuízos fiscais,

90. designadamente atendendo ao disposto na parte final da al. c) do artigo 60º do CIRC (redacção aplicável), que se refere tão só aos "prejuízos adicionados" e não a qualquer penalização de 50%,

91. assumida como uma "sanção" e uma "sanção desenquadrada, injustificada e desproporcionada" pela doutrina da própria AF - cfr., por todos, Maria dos Prazeres Lousa (1994), "Consolidação de Contas", in CTF, nº 373, Lisboa, CEF, pág. 57].

92. Sendo certo que a AF está juridicamente vinculada à interpretação que a própria faz das normas tributárias, por força dos princípios da boa-fé, do dever de colaboração com os contribuintes e da necessidade de protecção da confiança e legítimas expectativas dos contribuintes (cfr. artigos 55º, 59º e 68º-A da LGT, 10º do CPA e 266º nº 2 da CRP).

Aliás,

93. O artigo 59º nº 11 do CIRC (redacção de 1993), na interpretação de que é aplicável uma penalização/sanção/acréscimo de 50% à situação nele prevista, é materialmente inconstitucional, por violação dos princípios da proporcionalidade, da igualdade e da tributação do rendimento real, consignados nos artigos 104º nº 2 e 266º nº 2 da CRP (cfr., no mesmo sentido, Gonçalo Nunes Avelãs, in Tributação dos Grupos de Sociedades pelo Lucro Consolidado em sede de IRC, págs. 167 e ss.).

94. Com efeito, inexistindo in casu o pressuposto essencial e fundamental da aplicação de uma qualquer penalidade, multa ou coima (de qualquer regime sancionatório, em suma) - a culpa, enquanto juízo de censura ético-pessoal -, é ilegal, inconstitucional mesmo, entender que no caso concreto é aplicável uma penalidade de 50% sobre a diferença referida no nº 11 do artigo 59º do CIRC.

95. Culpa, essa, que também inexiste no caso do nº 12 do artigo 59º do CIRC, razão pela qual este também não ordena a aplicação de qualquer sanção ou penalidade de 50% ou outra.

96. Note-se que existe e existia um regime sancionatório específico das infracções fiscais - actualmente, o RGIT; anteriormente, o RJIFNA e o RJIFA e os seus regimes de coimas,

97. não se vislumbrando por que razões se há-de suportar uma penalidade por factos não tipificados no RJIFNA, não culposos, nem tendo qualquer carácter de infracção, mas antes devidamente autorizados pela AF.

98. Com efeito, e tal como decorre do disposto no artigo 13º do CP, igualmente aplicável em matéria de coimas e outras penalidades contra-ordenacionais, por remissão sucessiva do artigo 3º b) do RGIT e do artigo 32º do RGCO: Nulla Poena Sine Culpa.

99. Só é passível de penalização qualquer actuação culposa do contribuinte – o que, manifestamente, não é o caso das situações a que se reportam o nº 11 do artigo 59º do CIRC, onde é inobservável qualquer comportamento susceptível de reprovação.

100. Como se afirma no douto Acórdão do TCAN, 2ª Secção – CT, de 18.03.2010, Proc. 00141/04 (Acórdão fundamento/Relator Francisco Rothes), in www.dgsi.pt, não deve ser aplicada a majoração de 50% a que alude o nº 10 do mesmo preceito legal, especialmente prevista para os casos da cessação do RTLC,

101. considerando que deve ser feita uma interpretação restritiva do disposto no artigo 59º nº 11 do CIRC,

102. ou seja, considera que a ratio legis ou pensamento legislativo, igualmente relevantes na interpretação das normas legais, estão aquém da letra da lei, que por isso deve ser interpretada/ajustada em conformidade.

103. Entendendo ainda, aquele douto Acórdão, que a majoração de 50% tem cariz de sanção, sendo por isso aplicável apenas nos casos do nº 10 do mesmo preceito legal, em que ocorre a cessação do RTLC.

104. Finalmente, aquele douto Acórdão considera que o entendimento nele propugnado respeita os princípios constitucionais da proporcionalidade, tributação pelo lucro real e respeito pela capacidade contributiva (artigos 104º nº 2 e 266º nº 2 da CRP, e 4º nº 1 da LGT).

105. De facto, e pelas razões melhor referidas no douto Acórdão acabado de transcrever, deve-se fazer uma interpretação restritiva do segmento normativo contido no artigo 59º nº 11 do CIRC, no sentido de afastar a aplicação da penalização de 50% nas situações de saída autorizada, pela própria AT, de uma das sociedades do perímetro de consolidação fiscal.

106. Isto, como condição de salvaguarda da constitucionalidade daquele artigo 59º nº 11 do CIRC – mais concretamente, para compatibilizar esse preceito legal com os princípios da proporcionalidade e da tributação do lucro real, nos casos em que não há nem pode presumir-se qualquer comportamento censurável do sujeito passivo – como sucede no caso concreto.

107. Assim, contrariamente ao decidido, não só não há lugar à aplicação de qualquer penalização de 50%, como não houve qualquer violação do disposto no artigo 59º nº 11 do CIRC.

Mais,

108. Como se disse, aqueles nºs 10 e 11 são igualmente distintos no seguinte: o nº 10 reporta-se às situações de cessação da autorização pelo lucro consolidado (RTLC) quando: (i) deixam de ser verificar as condições legais previstas nas várias alíneas do nº 2 do mesmo preceito (mudança da sede ou direcção efectiva de alguma das sociedades do grupo para fora do território português; a sociedade dominante deixa de deter, pelo menos, 90% das dominadas; a totalidade dos rendimentos das sociedades do grupo deixa de estar sujeita ao regime geral de tributação e IRC); (ii) verifique-se a inobservância dos requisitos eventualmente impostos pela autorização administrativa (para a tributação pelo lucro consolidado); e (iii) ocorram alterações na composição do grupo.

109. Por sua vez, o nº 11 do artigo 59º do CIRC refere-se apenas ao caso específico da saída de uma ou mais sociedades do grupo – e quando não haja cessação da autorização para a tributação pelo lucro consolidado, precisamente porque o grupo, não obstante essa saída, obteve autorização administrativa, da AF, para a continuidade da aplicação do regime da tributação pelo lucro consolidado relativamente às sociedades que se mantiveram no grupo (nos termos dos nºs 3 e 7 do mesmo preceito).

110. Assim, os âmbitos de aplicação dos nºs 10 e 11 do artigo 59º do CIRC são totalmente distintos e autónomos.

111. E essas diferenças fundamentais podem resumir-se ao seguinte: o nº 10 pressupõe a caducidade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado por razões imputáveis ao contribuinte; o nº 11 pressupõe a continuidade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado.

112. Os casos do nº 11 do artigo 59º do CIRC pressupõem a não caducidade/cessação da autorização para a tributação pelo lucro consolidado; o nº 10 do mesmo preceito pressupõe a caducidade/cessação dessa autorização.

113. Logo, e por maioria de razão, é manifesto que a solução legal do nº 11 não pode coincidir, pelo menos na íntegra, com aquela que se extrai do nº 10 do mesmo normativo,

114. sobrepondo-se o nº 11 ao nº 10, relativamente às situações especificadamente previstas na facti species daquele nº 11 - “saída de uma ou mais sociedades do grupo sem que haja lugar a caducidade da autorização,

115. precisamente o que sucedeu in casu – conforme se deduz da factualidade provada.

116. A lei especial prevalece sobre a lei geral (artigo 7º nº 3 do CC).

117. Sendo certo que o intérprete e aplicador da lei, nos termos do artigo 9º do CC, ex vi do nº 1 do artigo 11º da LGT, não deve cingir-se à letra da lei.

118. Outrossim, deve atender ao também ao pensamento legislativo ou ratio legis, conquanto tenha um mínimo de correspondência verbal com a letra da lei.

119. Aliás, o “pensamento legislativo” é de capital importância na interpretação das normas legais, conforme é Doutrina unânime.

120. E é precisamente essa “racionalidade” do legislador que é decisiva na definição dos resultados da interpretação legislativa. Mais,

121. O douto Acórdão do STA, 2ª Secção, de 29.02.2012, Proc. 021/12, mencionado no douto Acórdão recorrido, refere-se a factualidade bem distinta daquela que aqui está em causa, acima assinalada.

122. Ao invés do caso presente, no caso concreto abordado naquele douto Acórdão do STA, 2ª Secção, de 29.02.2012, Proc. 021/12, não foi provado que, apesar da saída da sociedade do grupo fiscal, as autoridades fiscais autorizaram a continuam da aplicação do regime da tributação pelo lucro consolidado.

123. Aliás, face à fundamentação daquele douto Acórdão – em que a “pedra de toque” reside essencialmente no carácter não sancionatório da caducidade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado - tudo indicia precisamente o contrário, ou seja, que no caso nele apreciado houve caducidade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado.

124. Exactamente o oposto do sucedido no caso aqui em apreço.

125. E essa diferença fundamental – a autorização da AF para a continuação da autorização para a tributação pelo lucro consolidado, ao invés da caducidade deste regime especial de tributação – justifica que, no caso vertente, não seja devida a penalização de 50% que está prevista no nº 10 do artigo 59º do CIRC.

126. Logo, ao contrário do que preconiza o douto Acórdão recorrido, a Jurisprudência emanada daquele douto Acórdão não tem aqui aplicação, desde logo porque as situações de facto não são coincidentes – naquele caso terá havido caducidade, por saída de uma sociedade do grupo não autorizada; aqui não houve caducidade, porque, apesar da saída, foi autorizada a continuação da aplicação do regime da tributação do lucro consolidado relativamente às sociedades que continuaram no grupo.

127. O que faz toda a diferença.

128. E a correcção aqui concretamente em questão corresponde precisamente à penalização de 50% prevista no dito nº 10 do artigo 59º do CIRC,

129. nada tendo que ver com qualquer sanção decorrente de qualquer caducidade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado - que nunca existiu, antes pelo contrário -

Sendo certo que,

130. O nº 10 do artigo 59º do CIRC expressava situações de regularização de prejuízos fiscais quando existia caducidade da consolidação fiscal autorizada por motivos imputáveis ao contribuinte, como acima se referiu – o que pode justificar a aplicação de uma penalização de 50% ao valor dos prejuízos a acrescer.

131. Com o disposto no nº 11 do artigo 59º do CIRC, o legislador, ao invés, apenas teve em vista evitar que os grupos consolidados usassem e abusassem de sociedades permanentemente deficitárias, integrando-as no grupo com meros intuitos fiscais, de atenuação da carga tributária.

132. Daí que, nos casos do nº 11 do artigo 59º do CIRC, o legislador apenas tenha obrigado a “reposição” (no exercício anterior ao da saída) dos prejuízos fiscais da sociedade ou sociedades que saíram do grupo, como efectivamente foi feito “in casu”,

133. mas sem qualquer penalização de 50%, até porque, nos casos desse nº 11, não houve caducidade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado, precisamente porque a própria AF autorizou expressamente a continuidade desse regime especial de tributação.

134. De facto, a reposição desses prejuízos fiscais já é suficientemente penalizadora do grupo.

135. A penalização de 50% está prevista no nº 10 do artigo 59º do CIRC, para uma situação totalmente diferente daquela que aqui está em causa – a caducidade do regime da tributação pelo lucro consolidado em virtude do incumprimento dos pressupostos que condicionam a correspondente autorização.

136. Aqui, o que está em causa é a mera saída de determinada sociedade do perímetro de consolidação fiscal, devidamente autorizada pela AF, com a consequente não caducidade do regime da tributação pelo lucro consolidado.

137. Com efeito, nos casos de meras alterações na composição do grupo no decurso do período de validade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado (5 exercícios, cfr. nº 5 do artigo 59º do CIRC), devidamente autorizadas nos termos dos nºs. 3 e 7 do artigo 59º do CIRC,

138. e, consequentemente, sem caducidade do regime, como foi o caso (i.e., quando não se verificou qualquer incumprimento da autorização anteriormente concedida), não faz qualquer sentido a aplicação de uma penalização de 50%,

139. ao contrário do que acontece nas situações de caducidade do regime por razões imputáveis ao contribuinte - previstas no nº 10 do artigo 59º do CIRC.

140. No caso concreto não houve qualquer cessação/caducidade do regime da tributação pelo lucro consolidado, mas meramente uma alteração da composição do perímetro de consolidação fiscal encabeçado pela Recorrente.

141. Com efeito, no caso concreto não se exterioriza, não se evidencia, qualquer comportamento do contribuinte que possa justamente justificar a aplicação daquela penalização de 50%.

142. A realidade económica dos grupos societários é pautada por aquisições, fusões, vendas e outras operações sobre sociedades, efectuadas com a frequência que as constantes mutações dos dados económicos e estratégias exigem,

143. o que não se compadece com penalizações a aplicar sempre que ocorra uma alteração na composição desses grupos, e meramente pelo facto de se ter verificado tal alteração, sem mais – particularmente quando essas alterações são expressamente autorizadas pela AF, como é o caso.

144. Essa majoração em 50% reveste um carácter de sanção, que se vai reflectir na própria matéria colectável, por factos que não são ilegais, que não são fraudulentos e muito menos infrações.

145. Como se constata, trata-se de um regime em que a cessação da tributação do grupo de sociedades pelo RTCL é imperativa (neste sentido, Gonçalo Avelãs Nunes, ob. Cit., pág. 171) e em que, de alguma forma, existe um incumprimento superveniente das condições que justificaram a autorização da tributação segundo o RTLC.

146. Sendo assim, existe fundamento para a previsão, em tais casos, da apontada penalização.

147. Que não existe nas situações, como a dos autos, em que se verifica uma mera alteração da composição do perímetro, em resultado da mera saída de uma ou mais sociedades, saída essa devidamente autorizada pela própria AT.

148. Não se vislumbra aí qualquer comportamento que seja susceptível de justificar a aplicação de uma sanção e, ademais, tão gravosa - “desenquadrada, injustificada e desproporcionada”, também nas palavras de Gonçalo Avelãs Nunes, ob. Cit., pág. 174.

149. Essa sanção só teria justificação em caso de incumprimento dos requisitos da autorização para a tributação pelo lucro consolidado - ou seja, quando verificados os pressupostos legais para a caducidade dessa autorização, o que não é o caso, na medida em que houve nova autorização para o consolidado – trata-se de uma “sanção específica”, como refere Gonçalo Avelãs Nunes, op. cit.

150. De facto, não pode ser tratado de forma igual aquilo que é desigual,

151. conforme decorre dos princípios fundamentais da igualdade e da justiça (cfr. artigos 4º nº 1, 5º nº 2 e 55º da LGT, e 104º nº 2 e 266º nº 2 da CRP), que se podem reconduzir à designada “equidade fiscal”, patamar da tributação segundo o concreto rendimento real e a específica capacidade contributiva revelada por cada agente económico.

152. De facto, a desigualdade de tratamento fiscal de situações factualmente distintas é condição de realização do princípio da igualdade ou equidade, na sua vertente de que equidade vertical.

153. Ao contrário do decidido in casu, não está em questão a natureza sancionatória ou não sancionatória da caducidade/cessação da autorização para a tributação pelo lucro consolidado.

154. Ou, melhor dizendo, a sanção não reside na caducidade/cessação da autorização para a tributação pelo lucro consolidado; outrossim, na penalização de 50% aplicada ao valor dos prejuízos fiscais - no caso em apreço, sem qualquer justificação.

155. De facto, a questão em causa não se prende com o carácter sancionatório ou não da caducidade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado – que, no caso concreto, nem sequer ocorreu,

156. mas, outrossim, com a natureza sancionatória da aplicação do factor 1,5 previsto no nº 10 do artigo 59º CIRC – equivalente a uma penalização em 50% do valor dos prejuízos fiscais a acrescer no exercício anterior ao da saída,

157. a qual não tem qualquer justificação nas situações do nº 11 do mesmo artigo 59º do CIRC.

158. De facto, a aplicação desta penalização de 50%, nestas situações, viola frontalmente os princípios da proporcionalidade, da tributação pelo lucro real e da capacidade contributiva (cfr. artigos 4º nº 1, 5º nº 2 e 55º da LGT, 5º e 6º do CPA, 104º nº 2 e 266º nº 2 da CRP).

159. A “desproporção” é evidente quando se pretende penalizar o contribuinte com 50% dos prejuízos fiscais quando nada, mas absolutamente nada, o justifica (cfr. artigo 5º nº 2 do CPA).

160. O douto Acórdão recorrido abstrai indevidamente do facto, crucial, de que a alteração do perímetro de consolidação fiscal, nos casos do nº 11 do artigo 59º do CIRC, foi devidamente autorizada pela AF (como se provou), conforme decorre da sua conjugação com o disposto nos nºs. 3 e 7 do artigo 59º do CIRC.

161. A saída de sociedades do grupo, autorizada pela AF, e consequente não caducidade do regime da tributação pelo lucro consolidado, não representa qualquer violação dos objectivos de política económica e de interesse público que estão subjacentes à aplicação deste regime especial de tributação – se representassem, certamente que a AF não o teria autorizado, enquanto prossecutora dos princípios do interesse público e da legalidade (cfr. artigo 55º da LGT).

162. Por outro lado, os agentes económicos são livres de tomar as decisões de gestão que muito bem entenderem – se a sociedade dominante, aqui Recorrente, entendeu alienar participações sociais, é questão de gestão, do foro interno da Recorrente.

163. Não faz sentido considerar que o grupo tem necessariamente de se manter inalterável, ao longo de todo o período da autorização para a tributação pelo lucro consolidado, sem qualquer saída de sociedade, como condição para não lhe ser aplicada uma penalidade.

164. De facto, os agentes económicos são livres nas suas opções de gestão, para cujo efeito as normas tributárias não devem constituir entrave.

165. A menos que essas opções de gestão sejam ilegais ou fraudulentas – o que não se evidenciou, muito pelo contrário, pois a saída da dita sociedade foi autorizada pela AT,

166. é totalmente ilegítimo, desproporcional e injusto sobrecarregar o contribuinte com uma penalização de 50% sobre o valor dos prejuízos fiscais no exercício anterior ao da saída da sociedade sem qualquer razão objectiva.

167. De facto, a livre opção de gestão, não ilegítima e não fraudulenta, de alienar uma ou mais sociedades, com a sua consequente saída de um perímetro de consolidação fiscal, não justifica de modo algum a aplicação de qualquer penalização.

168. A interpretação restritiva do artigo 59º nº 11 do CIRC impõe-se pelas razões acima exaustivamente referidas – aliás, constitui mesmo uma condição para que o conteúdo e dimensão normativa do preceito não padeça de inconstitucionalidade material.

169. Sendo certo que a interpretação do nº 11 do artigo 59º do CIRC aqui preconizada, para além de ser condição para a constitucionalidade do preceito, tem correspondência verbal, na letra da lei.

170. E que a obrigação de “reposição”, no exercício anterior ao da saída, da diferença entre os prejuízos fiscais efectivamente compensados no âmbito do lucro consolidado pela sociedade que saiu e aqueles que a mesma sociedade poderia deduzir caso tivesse sido tributada autonomamente, já é suficientemente "penalizadora" do grupo.

171. A seguir-se a interpretação que o douto Acórdão recorrido faz do disposto no nº 11 do artigo 59º do CIRC, estar-se-á a violar os princípios constitucionais da tributação do lucro real, plasmado nos artigos 104º nº 2 da CRP, e da proporcionalidade, previsto nos artigos 55º da LGT, 5º do CPA e 266º nº 2 da CRP.

172. Por outro lado, deve-se questionar a legalidade e constitucionalidade da aplicação de uma penalidade de 50% sem a abertura de um processo adequado para o efeito, designadamente dando-se ao contribuinte as correspondentes oportunidades de defesa perante o pretenso ilícito contra-ordenacional, em violação do princípio da independência do processo sancionatório fiscal e do procedimento de liquidação, previsto, entre outros, nos artigos 107º nº 3 da LGT (entretanto revogado) e 51º do RGIT.

Assim,

173. Ao contrário do entendimento do douto Acórdão recorrido, não pode ter sido intenção do legislador aplicar uma sanção de 50% às situações previstas no nº 11 do artigo 59º do CIRC, devidamente autorizadas pela AF.

174. Por outro lado, também contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo, a interpretação restritiva acima preconizada tem respaldo na letra da lei.

175. Aliás, é a única que permite acomodar aquele preceito legal dentro dos princípios e regras constitucionais acima referidos.

176. Também contrariamente ao entendimento do douto Acórdão recorrido, a aplicação de uma sanção nos casos do nº 10 do artigo 59º do CIRC justifica-se por se tratar de situações de cessação do RETGS em razão do incumprimento das regras legais do RETGS - ao contrário do que sucede das situações do nº 11 e 12 do mesmo preceito legal, como acima se referiu, em que não há qualquer incumprimento.

177. A saída de qualquer sociedade do perímetro do consolidado fiscal não se traduz num “abandono” decidido por essa mesma sociedade.

178. Com efeito, essa saída advém, obviamente, de uma decisão de alienação das respectivas partes sociais por parte dos órgãos de gestão dos accionistas daquela sociedade, dentro dos princípios, acima referidos, da autonomia privada e liberdade de gestão dos agentes económicos – os quais não devem ser coarctados/constrangidos, muito menos manipulados, por regras fiscais.

179. Sendo que, no caso concreto, não se evidencia minimamente ter ocorrido a constituição de um grupo societário com o intuito de usufruir de quaisquer vantagens fiscais associadas ao RTLC.

Deste modo,

180. O douto Acórdão recorrido padece de erro de julgamento e violação dos sobreditos preceitos legais, designadamente do disposto no artigo 59º nº 11 do CIRC, redacção de 1993.

Por outro lado,

181. O douto Acórdão recorrido padece igualmente de erro de julgamento e violação de lei no segmento em que julga inverificado o vício da violação do direito de audição prévia,

182. Com efeito, e contrariamente ao decidido, a liquidação aqui impugnada padece de vício de forma por preterição de formalidade legal essencial – a não concessão, ao contribuinte, da oportunidade deste exercer o seu direito de audição prévia, antes da liquidação.

183. Segundo o douto Acórdão recorrido, a concessão da oportunidade do contribuinte exercer o seu direito de audição prévia, antes da liquidação, seria formalidade inútil.

184. Ora, como resulta dos sinais dos autos, a douta Sentença proferida em 1ª Instância anulou algumas correcções operadas pela AT, já com trânsito em julgado.

185. Pelo que não se pode considerar, sem qualquer dúvida, que o eventual exercício do direito de audição prévia pelo contribuinte, antes da liquidação, não surtiria qualquer efeito útil.

186. Com efeito, a liquidação padecia inequivocamente de vícios de facto e de Direito, como se veio a demonstrar em sede de Impugnação Judicial - pelo que não se pode concluir que o eventual exercício do direito de audição prévia não teria qualquer utilidade.

187. Ou seja, a preterição da sobredita formalidade legal essencial – concessão do direito de audição prévia -, no caso concreto, não se converteu em formalidade não essencial, já que o eventual exercício do direito de audição prévia poderia ter conduzido a um resultado distinto (rectius, a uma liquidação de imposto distinta).

188. De facto, no caso concreto nada garante que, mesmo que tivesse sido concedida oportunidade ao contribuinte de exercer o seu direito de audição prévia antes da liquidação, esta seria inelutavelmente tal e qual foi emitida.

189. O princípio do aproveitamento do acto administrativo apenas pode ser aplicado quando não se possam suscitar quaisquer dúvidas sobre a irrelevância do exercício do direito de audiência,

190. o que é de afastar quando a liquidação, na pendência da Impugnação Judicial, veio a ser parcialmente anulada.

191. Com efeito, se se verifica, a posteriori, que a liquidação deve ser parcialmente anulada, então não se pode considerar, sem margem para quaisquer dúvidas, que o eventual exercício do direito de audição prévia (à liquidação), se tivesse sido concedida essa oportunidade ao contribuinte, não poderia, em abstracto, alterar essa mesma liquidação.

192. Assim, o douto Acórdão recorrido, neste segmento, padece de erro de julgamento e violação do direito de audição prévia antes da liquidação, consignado, à data, nos artigos 100º a 103º do CPA e 267º nº 5 da CRP.

Nestes termos, nos melhores de Direito e com o douto suprimento de V. Exas., concedendo provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogando o douto Acórdão recorrido e julgando a Impugnação integralmente procedente, com as legais consequências, V. Exas., como sempre, farão inteira JUSTIÇA.

2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 – A Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunta junto deste Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer nos seguintes termos:

No caso presente a questão controvertida é a contida no Acórdão recorrido no segmento em que manteve a majoração, em 50% (ou seja, majoração em 1,5x), do acréscimo do diferencial de prejuízos a que se reporta o artigo 59º nº 11 do CIRC (redacção aplicável a 1993), nos casos de saída de uma ou mais sociedades do grupo sem que haja lugar a caducidade da autorização de aplicação do regime especial de tributação de grupos de sociedades.

Considerou o Acórdão recorrido que tendo presente o teor do art.º 59.º n.ºs 10 e 11 do CPPT, se conclui que o legislador quis que fosse aplicável a majoração do n.º 10 aos casos de saída de uma ou mais sociedades do grupo sem que haja lugar a caducidade da autorização, justificando-se, assim a expressão constante do n.º 11 que “o disposto no número 10 é igualmente aplicável". Sendo assim, saindo uma ou mais sociedades do grupo, mesmo não havendo lugar a caducidade da autorização, haverá que aplicar-se a majoração do n.º 10, a qual aplicando-se a situações de caducidade da autorização (n.º 10) é estendido pelo n.º 11 a situações em que tal caducidade não acontece.

Esta era a posição preconizada pela AT segundo a qual “a Contribuinte não se devia ter-se limitado a declarar tal diferença em singelo e que deveria ter majorado essa diferença em 50%, de acordo com o disposto no n.º 11 do art. 59.º do CIRC. Por isso, procedeu à correcção referida na alínea c) dos factos provados que se repercutiu na consequente liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios.”

Por seu lado no Acórdão fundamento, como vem, aliás, alegado pela recorrente, considerou-se que “tendo havido a saída de empresas do grupo fiscal, a Contribuinte,

…, empresa dominante, declarou em singelo a diferença entre os prejuízos fiscais que no decurso da aplicação do regime tributação pelo lucro consolidado foram efectivamente integrados na base tributável consolidada e os que teriam sido considerados para efeitos fiscais se as empresas tivessem sido tributadas autonomamente em IRC.”

Alegou ainda a recorrente que, estando em causa uma situação de simples saída de sociedades do perímetro de consolidação, devidamente autorizada e que não originou a caducidade da autorização, não é aplicável a majoração de 0,5 a que se reporta o n.º 10 do art. 59.º do CIRC, posição que logrou obter acolhimento no Acórdão fundamento. Considerou-se também neste Acórdão que a referida majoração reveste carácter de sanção e visa penalizar a utilização do RTLC numa perspectiva não conforme com os seus reais objectivos e que a mesma só encontra justificação nos casos em que existe um incumprimento superveniente das condições que justificaram a autorização da tributação ao abrigo do RTLC e já não quando, como no caso dos autos, existe uma mera alteração da composição do perímetro em resultado da saída autorizada de uma ou mais sociedades.

Como se sustenta no Acórdão fundamento «terá de operar-se uma interpretação restritiva do segmento normativo contido no art.º 59º n.º 11 do CIRC, na redacção aqui em causa, no sentido de afastar a aplicação da penalização que temos vindo a referir, nas situações de saída autorizada de uma das sociedades do perímetro de consolidação., Até para preservar a respectiva constitucionalidade, pois vê-se mal como possa compatibilizar-se tal penalização com os princípios da proporcionalidade e da tributação do lucro real nos casos em que não há nem pode presumir-se qualquer comportamento censurável do sujeito passivo».

É que, como também se considerou naquele Acórdão a majoração prevista no n.º 10 do art.º 59.º do CIRC, faz todo o sentido nas situações de incumprimento das disposições legais, previstas, quanto à consolidação autorizada não encontra explicação razoável nas situações previstas no n.º 11 do mesmo artigo de alteração do perímetro por saída de empresas, sem que haja incumprimento daquelas disposições e, para mais, tendo havido autorização prévia. Nestas situações, o que faz sentido é que haja lugar à reposição da diferença entre os prejuízos fiscais compensados no âmbito do lucro consolidado pela sociedade que saiu e aqueles que a mesma sociedade poderia deduzir caso tivesse sido tributada autonomamente, o que justifica a existência daquele n.º 11, que, assim, contrariamente ao que sustenta a Fazenda Pública, não fica esvaziado de conteúdo pela interpretação restritiva acolhida, sendo que não se vê explicação para a aplicação do factor sancionatório de 1,5.

Como sempre defendeu a aqui recorrente não estando em causa qualquer incumprimento por parte do contribuinte, tal acarreta a anulação no consolidado do “contributo” das sociedades que deixaram o grupo, com autorização, não se evidenciando quaisquer razões para a majoração de 1,5.

É nosso entendimento, que lhe assiste razão.

A Lei n.º 71/93 que aditou o n.º 11, foi publicada em 26/11/1993 e refere no seu n.º 4 que a alteração será aplicável na determinação da matéria colectável referente aos exercícios de 1993 e seguintes. Ainda assim entendemos que é legítimo colocar a questão da violação do princípio constitucional da não retroactividade da lei fiscal.

Quanto à inaplicabilidade da majoração prevista no n.º 10 do artigo 59º por remissão do n.º 11, é também nosso entendimento não ser aplicável ao caso dos autos na medida em que não se trata de uma situação de caducidade do regime de tributação pelo lucro consolidado, não tendo aplicação tal sanção.

Ao tempo, estabelecia o art.º 59º que, existindo um grupo de sociedades, a sociedade dominante poderia solicitar ao Ministro das Finanças autorização para que o lucro tributável em IRC fosse calculado em conjunto para todas as sociedades do grupo “mediante a consolidação dos balanços e das demonstrações de resultados das sociedades” que o integravam (n.º 1), caducando essa autorização, logo que deixasse de se verificar alguma das condições referidas no n.º 2 ou não se satisfizessem os requisitos mencionados no n.º 4, “não sendo já aplicável o regime previsto neste artigo no exercício em que o facto determinante dessa caducidade se verificar”, sem prejuízo do disposto nos números seguintes” (n.º 6); no caso de se verificar alteração na composição do grupo, designadamente por a sociedade dominante passar a ter o domínio total de uma ou mais sociedades que satisfaçam as condições do n.º 2, deverá obter-se autorização, nos termos do n.º 3, para que o novo grupo seja abrangido pelo regime deste artigo, sob pena de a autorização concedida à sociedade dominante caducar a partir do exercício seguinte, inclusive, àquele em que se verificou a alteração na composição do grupo (n.º 7).

Estabelecia ainda o mesmo dispositivo legal que “nos casos em que se verifique caducidade da autorização, nos termos dos nºs 6 ou 7 será, sem prejuízo do disposto no n.º 8, quando aplicável, adicionada para efeitos de determinação do lucro tributável do último exercício em que o regime for aplicado uma importância correspondente ao produto de 1,5 pelo valor da diferença entre os prejuízos que foram efectivamente integrados na base tributável consolidada e os que teriam sido considerados para efeitos fiscais se as sociedades tivessem sido tributadas autonomamente” (n.º 10).

Estabelecia ainda que “o disposto no número anterior é igualmente aplicável nos casos de saída de uma ou mais sociedades do grupo sem que haja lugar a caducidade da autorização, aplicando-se nesse caso relativamente à diferença entre os prejuízos dessas sociedades que foram integrados na base tributável consolidada e os que teriam sido considerados para efeitos fiscais se as sociedades tivessem sido tributadas autonomamente” (n.º 11).

É o n.º 11 acabado de citar que está no centro da discordância apresentado pela aqui pela recorrente. Se bem entendemos está em causa o exercício de 1993 e o citado n.º 11 foi introduzido (então como n.º 10), no então art.º 59.º do CIRS pela Lei n.º 71/93, de 26/11 (Orçamento suplementar ao Orçamento de Estado para 1993). Se assim é, nesta perspectiva afigura-se-nos que tem razão a recorrente quando defende que não se tratando de um caso de caducidade de aplicação do regime especial de tributação de grupos de sociedades, uma vez que foi autorizada a saída das sociedades identificadas e a continuação do grupo a que pertenciam, não é de aplicar o regime previsto no citado n.º 11, sob pena de tal aplicação representar aplicação retroactiva de lei fiscal não permitida nos termos da Constituição da República Portuguesa.

Consideramos que, no caso não ocorreu caducidade da autorização de aplicação do regime especial de tributação de grupos de sociedades, razão por que não há que aplicar a respectiva consequência e, ocorrendo, no caso, a alteração do perímetro do grupo, não lhe deverá ser aplicável Lei posterior, nos termos a que já nos referimos.

É certo que no questionado n.º 11, é clara a intenção do legislador ao estabelecer que, mesmo quando não haja lugar a caducidade da autorização, de mandar aplicar a referida majoração nos casos de saída de uma ou mais sociedades do perímetro de integração de um grupo tributado pelo regime do lucro consolidado, mas tal determinação só pode ser aplicada a factos tributários posteriores; na verdade, o regime previsto nos n.ºs 10 e 11 acaba por ser um regime sancionatório, gravoso, desproporcional e violador do princípio da tributação pelo lucro real, por isso mesmo não deve ser aplicado no caso presente (cf. voto de vencido no Ac. proferido no proc. n.º 021/12 disponível em www.dgsi.pt.).

Assim sendo, deve ser dada por verificada a oposição invocada e deve ser concedido provimento ao recurso interposto alterando-o no sentido da decisão do Acórdão indicado como fundamento (Ac. proferido no Proc. n.º00141/04).

4 - Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

- Fundamentação -

5 – Questões a decidir

Importa averiguar previamente da verificação dos pressupostos substantivos dos quais depende o conhecimento do mérito do presente recurso por oposição de acórdãos, cuja não verificação impede o conhecimento do presente recurso.

Concluindo-se no sentido da verificação de tais requisitos, haverá então que conhecer do mérito do recurso, aferindo se merece censura o Acórdão recorrido

6 – Matéria de facto

6.1 É do seguinte teor o probatório que consta do acórdão recorrido:

1. Por ofício 001728 datado de 14.01.1994 e na sequência de um pedido formulado pela impugnante, foi aquela notificada, sob Assunto: Tributação pelo lucro consolidado, do seguinte:

“(…) nos termos do artigo 59.º do CIRC, informa-se que o mesmo foi deferido por despacho 93.12.31 (…) sendo a autorização válida por um período de cinco exercícios de 1993 a 1997, nos termos do n.º 5 do art. 59.º do CIRC (…) Alerta-se para os procedimentos a adoptar pela saída de firmas do grupo à luz do n.º 11 do art. 59.º do CIRC, (…) O n.º 4 do art. 59.º da citada lei possibilita que a sociedade dominante renuncie à autorização concedida relativamente aos exercícios de 1993 e seguintes com as consequências de cessação do regime estabelecidas na redacção anterior dos artigos 59º e 60º do Código do IRC, devendo, nos termos do nº5 do mesmo artigo, solicitar a renuncia em requerimento dirigido ao Ministro das Finanças (...)" - cfr. fls. 178 a 186 dos autos que se tem por integralmente reproduzidas para os devidos efeitos legais.

2. Por ofício 004840 de 03.02.1995, a impugnante foi autorizada a tributação pelo lucro consolidado, relativamente aos períodos de 1994 a 1998 - cfr. fls. 187 a 197 dos autos.

3. Através de oficio 002363 de 17.01.1996 foi a impugnante notificada pela AF que lhe foi deferida tributação pelo lucro consolidado por despacho de 95.12.29 e que tal autorização seria válida por um período de cinco exercícios 1995 a 1999 - cfr.fls. 198 a 202.

4. Por ofício 009049 de 19.02.1996 foi a impugnante notificada pela AF do seguinte: "...confirma-se que a saída da "X………" e "Z……… TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO" do grupo ocorreu no ano 1994 pelo que os ajustamentos serão de efectuar relativamente ao ano 1993, devendo considerar alterado em conformidade o nosso ofício 2363 de 96.01.17.

5. Na sequência da saída de sociedades do âmbito de consolidação fiscal, designadamente a sociedade Z………. Tecnologias de Informação, SA, a impugnante apresentou uma declaração de substituição Mod. 22, relativamente ao exercício de 1993, tendo em conta os prejuízos da sociedade que saiu do perímetro de consolidação fiscal no valor de 93.652.915$00, procedendo à reposição dos efeitos provocados pela saída daquela sociedade, incluindo os prejuízos fiscais não compensados sem qualquer agravamento de 50%.

6. Em 1998, na sequência de acção de fiscalização levada a cabo pelos serviços da Administração Tributária à contabilidade da impugnante relativa ao exercício de 1993, designadamente à análise do lucro consolidado daquele exercício, foram efectuadas correcções à matéria colectável.

7. A acção inspectiva teve como documento base a análise, a declaração de substituição Mod. DC 22 apresentada pela impugnante relativamente ao exercício de 1993, acima referida - cfr. fls. 31 dos autos.

8. Em resultado dessas correcções, a Administração Tributária procedeu ao preenchimento do "Mapa de Apuramento'', Modelo DC-22, cujo teor consta de fls. 33 a 32 do PA que aqui se dá por reproduzido.

9. Entre essas correcções conta-se a inserta na linha 21 do quadro 20, no montante de 2.518.429. 799$00, respeitante, entre outros, a perdão de dívidas, quantificada em 8.943.428$00 contabilizado como custo da sociedade V…….., SA, 46.826.458$00 relativos ao acréscimo a que alude o artigo 59º nº 11 do CIRC.

10. Em 01.07.1998, ao nível do Lucro Tributável consolidado do grupo da Z………, conclui o relatório inspectivo que o mesmo ascendia a 89.334.395$00 a favor do Estado, em resultado das operações que descrimina no aludido Relatório junto 16 a 19 do procedimento de reclamação que aqui se tem por integralmente reproduzidos e onde consta entre o mais o seguinte:

"(...)

C) 8.943.428$00, relativos a perdão de dívidas.

O grupo não acrescentou no quadro 17 da declaração de rendimentos consolidados o montante de 8.943.428$00 contabilizado como custo do exercício pela sociedade V………,SA, relativo ao perdão parcial de dívidas efectuado aquando da rescisão de contratos de arrendamento de diversas lojas que essa sociedade explora. Trata-se de montantes em divida pelos diversos arrendatários que foram objecto de renegociação através da qual esta sociedade ofereceu como contrapartida parte do valor das dívidas até então acumuladas. Assim, o valor em causa não é aceite fiscalmente, conforme artigo 23º CIRC, por não ser indispensável à realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para manutenção da fonte produtora.

D) 10.809.000$00, relativos à posição de resultados relativos à reposição de resultados suspensos e acréscimos do diferencial de prejuízos integrados por saída de sociedades do grupo fiscal (nºs 8 e 11 do art. 59º CIRC).

Dada a saída das sociedades dependentes X……….. e Z……… Tecnologias de informação do perímetro fiscal do grupo no exercício de 1994, foi entregue por este em 28.02.96 uma declaração de substituição relativa aos rendimentos consolidados do exercício de 1993, na qual o grupo procedeu à reposição dos resultados internos ainda suspensos, gerados em operações em que participaram aquelas sociedades, dando assim cumprimento no disposto no nº 8 do art.º 59° do CIRC. Na mesma declaração, uma vez que se verificou a situação prevista no nº 11 do mesmo artigo, o grupo procedeu ao acréscimo do montante do prejuízo fiscal com que a sociedade Z………. Tecnologias de Informação contribuiu para o resultado consolidado do exercício de 1993. A referida declaração de substituição não foi no entanto liquidada, pelo que se considera o montante de 10.809.000$00, naquela acrescido, no documento de correcções modelo DC - 22 por nós elaborado na sequência da presente análise.

E) 46.826.458$00, relativos ao acréscimo a que se refere o nº11do art.º 59° do CIRC.

No exercício de 1993, a sociedade Z……. Tecnologias de Informação contribuiu com um prejuízo individual de 93.652.915$00 para o resultado fiscal consolidado. Dado ser 1993 o último exercício de consolidação fiscal aquela sociedade com o grupo Z…….. Investimentos, e atendendo a que o mesmo prejuízo não poderia ter sido utilizado pela sociedade que abandona o grupo no caso da sua tributação autónoma, foi acrescido pelo grupo o respectivo valor para apuramento do lucro consolidado constante da declaração de substituição relativa aos rendimentos consolidados do exercício de 1993.

De referir no entanto que, nos termos do nº 11 do art. 59º do CJRC, articulado com o nº 11 do mesmo artigo, "nos casos de saída de uma ou mais sociedades do grupo sem que haja lugar à caducidade da autorização ", deverá ser acrescida "uma importância correspondente ao produto 1,5" pelo valor da diferença entre os prejuízos dessa(s) sociedade(s) e os que teriam sido considerados supondo-se a tributação autónoma da(s) mesma(s).

Desta forma, conclui-se que o valor que deveria ter sido acrescido seria o resultante do produto de 1,5 por 93.652.915$00, isto é 140.479.373$00, e não 93.652.915$00, pelo que se acresce a diferença..."

11. Em 07.07.1998, na sequência do procedimento inspectivo referido foi efectuada a liquidação de IRC nº 8910009398, relativa ao exercício de 1993, de que não resultou qualquer imposto a pagar ou a receber - Cfr. Doc. 1 Com a PI e constante de fls. 20 dos autos que se tem por integralmente reproduzidas para os devidos efeitos legais.
12. Por ofício de 16.07.1998 foi a impugnante notificada dos fundamentos das correcções efectuadas relativas ao exercício de 1993 que, no que a estes autos importa, reproduzia as conclusões do relatório inspectivo referido em 10 - cfr. fls. 30 a 40 dos autos.

13. A liquidação impugnada resultou da análise à declaração de substituição mencionada nos pontos 5 e 7 dos factos provados.

14. A impugnante foi notificada da liquidação referida atrás e da fundamentação das correcções efectuadas à matéria colectável, em 20.07.1998 - cfr. fls. 20 e 30 dos autos.

15. A impugnante em 16.10.1998 apresentou reclamação graciosa contra o acto de liquidação referido - cfr. fls. 56 a 67 dos autos que se tem por integralmente reproduzidas para os devidos efeitos legais.

16. Quanto à Reclamação Graciosa apresentada foi prestada a informação 12/2002, pela Direcção Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária em 24.10.2002 - cfr. fls. 77 a 86 dos autos.

17. Da informação referida no ponto anterior consta entre o mais que:

"(...) 3.3. Quanto à correcção contestada, referida no ponto 2.3, no montante de 8.943.428$00, correspondente a custos extraordinários da sociedade dependente V………, SA, não aceite para efeitos fiscais com base nos seguintes fundamentos:

- trata-se de montantes em dívida através da qual esta sociedade ofereceu como contrapartida parte do valor das dividas até então acumuladas. Assim, o valor em causa não é aceite fiscalmente, conforme disposto no art. 23° do CIRC, por não ser indispensável à realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora"

3.3.1. O sujeito passivo alega:

"não podemos entender tais verbas como perdão de dívida, nem tão pouco como uma mera liberalidade em que não existem quaisquer contrapartidas. Tratam-se, em dois casos, de valores creditados pela V……… a título de revogação de contratos de arrendamento que anteriormente havia sido celebrado entre as partes, como é o caso das verbas 1.562.079$00 e 6.192.948$00"

"Em relação ao montante de 1.206.897$00, conforme pág. 4 do Anexo ix, o mesmo refere-se a uma verba creditada, como forma de compensar perdas sofridas pelo lojista resultante de deficiências no pavimento da "loja" onde o mesmo exercia a sua actividade" "De salientar que tais documentos são suportados sempre por documento equivalente a factura (nota de crédito), cumprindo-se todos os requisitos legalmente estipulados na sua emissão"

3.3.2. Em conformidade com a fotocópia do acordo celebrado em 09.12.1993 entre a V………. (...) e (...) remetido em anexo à reclamação como suporte documental do valor anteriormente referido de 6.192.948$00, constata-se o seguinte:

• ...reconhece-se que o senhor...tem uma dívida para com a V………. no valor de 9.975.131$00 referente a rendas e despesas comuns vencidas e não pagas da loja...

• Seguidamente é referido no acordo que a V………, credita na divida do segundo contraente a quantia de 6.975.131 $00, a título de revogação do contrato...pagando este último o remanescente do débito, no total de 3.000.000$00

3.3.3. Face ao exposto, conclui-se que os valores de 6.192.948$00 e 1.562.079$00 referidos conjuntamente pela reclamante como sendo valores creditados a terceiros a título de revogação de contratos de arrendamento (...) assumem a natureza de perdão de dívida (...) uma vez que atendendo ao mencionado acordo de 09112193, o crédito dos montantes em questão teve como objectivo a anulação de dívidas já existentes.

3.3.4 Como tal e, tratando-se de dividas resultantes da actividade normal da empresa devia o sujeito passivo em relação aos valores em causa ter constituído provisão para créditos de cobrança duvidosa (...)

3.3.5. Quanto ao valor de 1.206.897$00 (...) compensação de perdas sofridas com a existência de deficiências no pavimento (...) verifica-se que o que está em causa é uma indemnização por um evento segurável (...)"

3.3.6 A assunção da situação em questão como evento segurável foi efectuada pelo próprio sujeito passivo no ponto 5.5.5. da sua reclamação, conforme se passa a transcrever "no sentido de uma boa relação que a V………… pretende manter com os seus clientes, os lojistas, procurou resolver com maior brevidade e eficácia possível a situação ocorrida (...) não é, na maior parte dos casos eficiente o recurso sistemático às companhias seguradoras, face à demora e delonga processual a que os seguros se vêm compelidos a suportar..."

4. CONCLUSÕES

De acordo com o exposto nos pontos anteriores afigura-se-nos ser de indeferir a totalidade das pretensões formuladas pela reclamante ..." - cfr. fls. 77 a 86 dos autos.

18. Sobre a informação atrás referida foi proferido despacho de "Concordo" pelo Director de Serviços em 05.12.2002 - cfr. fls. 76 dos autos.

19. Através de oficio 2238 de 11.04.2003, foi a impugnante notificada da intenção de indeferimento da Reclamação Graciosa e para exercício de audição prévia antes da decisão final sobre a reclamação, nos termos constantes de fls. 73 a 76 e seguintes dos autos.

20. Por oficio de 15.05.2003 foi a impugnante notificada de que, por despacho de 14.05.2003 foi indeferida a reclamação apresentada - cfr.fls. 69 a 71 dos autos.

21. A presente impugnação judicial deu entrada em 02.06.2003 - cfr. fls. 2 dos autos.

22. A impugnante alterou a sua designação de Z……….. INVESTIMENTOS - SGPS, SA, para a designação actual, Z……….- SGPS, SA, tendo comunicado tal designação à AF. FACTOS NÃO PROVADOS

Não se provou que o montante de Esc. 1.206.897$00 (€ 6.034,48) referente a despesas com reparação de deficiências na pavimentação de uma loja explorada pela V………., SA, se relacionasse com um evento (custo cujo risco não fosse susceptível de ser segurado - objecto de contrato de seguro).».

6.2 Os Acórdãos fundamento fixaram os seguintes factos:

A) acórdão do TCA-Norte de 18 de março de 2010, rec. n.º 0141/04:

a) Na sequência de acção de fiscalização levada a cabo pelos serviços da Administração Tributária à contabilidade da impugnante relativa ao exercício de 1994, vieram a ser efectuadas correcções à matéria colectável.

b) Em resultado dessas correcções, a Administração Tributária procedeu ao preenchimento do “Mapa de Apuramento”, Modelo DC-22, cujo teor consta de fls. 31 a 39 e que aqui se dá por reproduzido.

c) Entre essas correcções conta-se a inserta na linha 23 do quadro 20, no montante de 51.624.508$00, respeitante a tributação de resultados internos, quantificada em 5.070.508$00 a favor da impugnante e à majoração dos prejuízos fiscais ocasionados pela saída de empresas do grupo fiscal de que a impugnante é sociedade dominante, quantificada em 56.685.353$00.

d) Em relação a este último montante, exarou-se em sede de fundamentação das correcções constante do “Mapa de Apuramento”, o seguinte: “Quanto à diferença imputável aos prejuízos fiscais (56.695.353$00), é motivada essencialmente pelo facto de apenas ter sido adicionado pela sociedade dominante a diferença entre os prejuízos fiscais que no decurso da aplicação do regime foram efectivamente integrados na base tributável consolidada e os que teriam sido considerados para efeitos fiscais se as empresas tivessem sido tributadas autonomamente em IRC, quando deveria ter sido acrescido o produto de 1,5 pela referida diferença, conforme o estipulado no nº 11 do art. 59º do CIRC ”.

e) Por outro lado, foi inserta uma correcção constante da linha 1 do quadro 12 do “Mapa de Apuramento”, no valor de 89.379.746$00, relativa à dedução indevida de prejuízos fiscais da sociedade “U………., S.A.”.

f) Em relação a esta correcção consta da fundamentação constante do “Mapa de Apuramento” o seguinte: “Do controlo interno efectuado ao montante de prejuízos susceptível de ser objecto de reporte no exercício de 1994 pelo grupo T………– Sociedade Gestora de Participações Sociais, S.A., constata-se ter sido indevidamente deduzido o montante de 89.379.746$00, nos termos da alínea a) do art. 60º do CIRC, relativo à sociedade dependente “U………., S.A.”, dado ter-se verificado que o valor correcto era de 20.480.754$00 em vez de 109.860.500$00. Como tal, procedeu-se à tributação da importância de 89.374.746$00 ”.

g) E mais adiante: “Face ao estipulado no art. 60º do CIRC, conjugado com o art. 46º do mesmo código, o entendimento da Administração Fiscal é de que a referida dedução de prejuízos fiscais, no montante de 311.772.000$00, é respeitante em 223.538.283$00 a prejuízos fiscais gerados anteriormente à aplicação do regime de tributação pelo lucro consolidado (os quais foram inscritos nas declarações individuais modelo 22 de IRC de 1993 das sociedades dependentes a que dizem respeito) e em 88.233.717$00 a prejuízos fiscais consolidados gerados em 1992. Importa referir que, atendendo aos valores corrigidos de 1993 (tanto ao nível do lucro tributável consolidado, o qual passou de 311.772.000$00 para 663.079.546$00, como ao nível da dedução de prejuízos ficais ao lucro tributável consolidado, a qual passou a ser de 663.079.546$00 em vez de 311.772.000$00) e após consideração do decréscimo de 513.192.060$00, a efectuar à matéria colectável consolidada corrigida de 1993, para cumprimento do respectivo limite mínimo consignado no art. 59º-A do CIRC (513.192.060$00, verifica-se que para além da integração da totalidade dos prejuízos fiscais corrigidos gerados no próprio exercício de 1993, no montante de 180.041.433$00, foram ainda integrados na base tributável consolidada corrigida de 1993, prejuízos fiscais gerados anteriormente à aplicação do RTLC, no valor de 149.887.486$00 (correspondente à diferença entre o lucro tributável corrigido de 1993 e a mencionada matéria colectável corrigida mínima de 513.192.060$00), tendo este sido imputado em termos proporcionais às empresas que reunindo as condições impostas na alínea c) do art. 60º do CIRC, possuíam reporte de prejuízos fiscais mais antigos, isto é: (…) U……….., S.A. – 51.385.546$00 – (prejuízos gerados em 1990) ”.

h) No exercício de 1993, no apuramento da respectiva matéria colectável, a impugnante apenas utilizou prejuízos fiscais consolidados e não prejuízos fiscais individuais da sociedade originária devedora “U……….., S.A.”.

i) Em resultado das correcções efectuadas pela Administração Tributária veio a ser efectuada a liquidação de imposto cuja nota demonstrativa consta de fls. 27 e aqui se dá por integralmente reproduzido.

j) O prazo para pagamento voluntário da quantia liquidada terminou em 30 de Junho de 1999 e a presente impugnação foi apresentada em 28 de Setembro de 1999.

b) Acórdão do STA de 24 de outubro de 2007, rec. n.º 0429/07:

a) Com Base em fiscalização tributária efectuada ao impugnante marido, colectado em IRS pelo exercício da actividade de "Construção Civil – CAE - 45.43" foi elaborada Nota de Fundamentação das Correcções Técnicas, que aqui se dá por inteiramente reproduzido para efeitos legais, onde se refere:

"(...) A Ordem de Serviço vinha acompanhada de uma "ficha de fiscalização" extraída no contribuinte em análise durante a fiscalização ao mesmo(...). Nesta fiscalização, foi detectado que o contribuinte, utilizava facturas como senão relativas a serviços prestados em regime de subcontratação, emitidas -por fornecedores "indiciados como emitentes de facturas falsas", como forma de arranjar "custos fictícios", para as obras construídas no desenvolvimento da sua actividade, fl. ficha de fiscalização acima citada, fl. ficha de fiscalização acima citada, indica dois subcontratos "(B …" e "C…"(...).<Procedemos a uma análise detalhada, dos registos e documentos existentes na contabilidade do contribuinte, relativos a subcontratos, durante o 2° semestre de 1996, onde detectamos os factos a seguir apresentados:

1.2 — Efectivamente a empresa em análise continua a ter na sua contabilidade, registados de sub contratos, valores que constam em facturas emitidas pelos dois fornecedores, atrás indicados, (...) (Para além dos fornecedores já referidos, o contribuinte tem ainda registados na sua contabilidade, na rubrica de subcontratos, valores que constam de facturas emitidas pelo fornecedor "D…", as quais também se encontram relacionadas no anexo I, tendo o mesmo igualmente sido considerado como "emitente de facturas falsas", em função dos factos analisados na fiscalização já citada. Acrescente-se que, o valor das facturas relacionadas no anexo I, foi considerado como custo do exercício de 1996, sendo indicado na linha 1-subcontratos, do quadro 28 do "Anexo C" da declaração de rendimentos - IRS mod 2 do mesmo ano.(...).(Relativamente ao fornecedor "D…-807 062 154 "por consulta aos terminais da (DGSI/SIT, relativamente a IRS, não consta a declaração de rendimentos modelo 2 do ano de 1994. (...).

Quanto ao fornecedor "C…-…………", (...) conforme extracto informático (DGCI/SIT, relativamente ao IRS, nunca entregou qualquer declaração de rendimentos (...). (Desconhece-se o paradeiro deste contribuinte. O desconhecimento do seu paradeiro foi confirmada pela esposa do mesmo. (...)

Quanto ao fornecedor "B… - …………."(...) conforme extracto informático da (DGCI/STI, relativamente ao IRS, não consta a declaração de rendimentos modelo 2 do ano de 1996.(...)

No decorrer da presente fiscalização, não houve a possibilidade de efectuar qualquer análise, relativamente ao levantamento dos cheques emitidos por A…, para pagamento dos valores registados na rubrica de subcontratos, nomeadamente à ordem dos três fornecedores já citados, pois embora tivesse notificado o contribuinte em 11/08/97, para apresentar em 16/09/97, os cheques por ele emitidos no período de 01/07/96 a 31/12/96, até à data não o fez.

Ainda relativamente à actividade desenvolvida em 1996, embora o contribuinte tivesse sido notificado para tal, através da notificação acima citada, também não foram apresentados elementos contabilísticos, que permitissem relativamente a cada obra, discriminar os respectivos custos e facturação, como sejam orçamentos, autos de medição, distribuição do pessoal nas obras, e as facturas emitidas nem sempre referem em concreto a obra em causa. (Por outro todo, relativamente às obras em curso em 31/12/96, no valor de 10 205 000$00, não foi apresentada a sua "inventariação física" — cfr. folhas 29 e ss do processo administrativo (p. a.) em apenso;

b) Com base na nota de fundamentação foi apurado, por correcções técnicas, um rendimento líquido total no valor de 114 961 966$00 (esc.) - cfr. folhas 26 e ss do p.a. em apenso;

c) Os agora impugnantes foram notificados das correcções efectuadas, referidas na alínea anterior, por ofício datado de 12.08.1999 e recebido em 18.08.1999- cfr. aviso de recepção e notificação a folhas 24 e 25 do p.a. em apenso;

d) Em 12.08.1999 foi elaborada a liquidação oficiosa n.º 53222632718 de IRS do ano de 1996 no montante de 45.243.495$00 (esc.), sendo 42.942.260$00 valor de imposto e 2.301.235$00 (esc.) de juros compensatórios, cuja data limite de pagamento era 20/10/1999 — cfr. documento de cobrança de folhas 13 dos presentes autos;

e) Por decisão proferida pelo Director de Finanças em 20.03.01, foi o acto tributário parcialmente revogado, no sentido de ser corrigida para menos a matéria colectável na importância de 7.977.725$00 (esc.), -verba que foi considerada em duplicado em termos de proveitos — cfr. folhas 160 dos autos;

f) Dado cumprimento ao disposto no artigo 111.º nº 6 do CPPT, os impugnantes mantiveram a impugnação — cfr. folhas 171, 171 v. e 172 dos autos;

g) Na sequência do referido em e), em 24.07.2001 foram corrigidos os rendimentos líquidos dos impugnantes para 106.714.241$00 (esc.) – cfr. folhas 178 a 181 dos autos;

h) O impugnante é um empresário de construção civil que executa obras de acabamento, assentamento de tijolo, assentamento de paredes e construção de telhados para outros sempre a quem são adjudicadas obras de grande dimensão como construção de escolas, prédios e hipermercados. O impugnante não tem pessoal para fazer todas as obras que aceita nas condições antes referidas e por isso contrata outras empresas. — depoimento da primeira e segunda e quarta testemunhas inquiridas;

i) No 2.º semestre de 1996, o impugnante trabalhou na construção de uma escola C+ S de … . O Sr. D… era subempreiteiro do impugnante e fez o assentamento de umas ripas no telhado onde depois são colocadas as telhas e também obra de areamento de exteriores e portais na referida obra. — depoimento da 1ª testemunha inquirida;

j) Quem fornecia os materiais para a obra era o empreiteiro - depoimento da 1, 2ª 3ª, 4ª e 5ª testemunhas inquiridas;

k) Os trabalhadores contratados podiam ser contratados para serviços específicos mas habitualmente eram contratados para vários serviços sendo logo de início estabelecido qual o preço que o impugnante pagava por cada m ou m2 de obra feita — depoimento de todas as testemunhas inquiridas;

l) O Sr. (D… trabalhou para o impugnante no 2° semestre de 1996 nas obras de Celeiros, Angra do Heroísmo, Valongo e Famalicão — depoimento da 2ª testemunha inquirida;

m) As facturas emitidas a folhas 31, 34, 37, 40, 43, 46, 48 que tiveram a ver com rebocos na Escola de …, assentamento de lajetas na obra "E…" foram todas escritas pela 2ª testemunha inquirida, tal como os recibos de folha 32, 35, 38, 41, 44, 47 e 49. Todas as facturas e recibos referidos foram assinados pelo Sr. D… — depoimento da 2ª testemunha inquirida após exibição dos referidos documentos;

n) C… trabalhou também para o impugnante nas obras referidas na alínea 1), no 2.º semestre de 1996, tendo muita gente a trabalhar para ele mas não executava obras porque é deficiente motor— depoimento da 2ª, 3ª e 4ª testemunhas inquiridas;

o) As pessoas que trabalhavam para C… assentaram azulejos e fizeram obras de reboco no pavilhão de Valongo. Na escola C+S, executaram obras de reboco, serzites, andaimes e portais, na Avenida do Saldanha — Foz executaram obras de reboco e estanho — cfr. depoimento da 2ª, 3ª e 4ª testemunhas inquiridas;

p) Os pagamentos das obras feitas, depois de medidas, eram sempre efectuadas em cheque — cfr. depoimento da 4ª testemunha inquirida;

q) O Sr. B… trabalhou como subempreiteiro para o impugnante, no 2.º semestre de 1996, em Celeiros, .......... no (Porto e Açores – cfr. depoimentos da 2.ª e 5.ª testemunhas inquiridas.

7 – Apreciando

7.1 Dos requisitos de admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos

Ao presente processo, iniciado antes de 1-1-2004 (concretamente, em 2 de junho de 2003 – cfr. o n.º 21 do probatório fixado), aplica-se o regime anterior ao ETAF de 2002 e CPTA. O art. 30.º do ETAF de 1984, ao prever a competência do Pleno da Secção do Contencioso Tributário, estabelecia os requisitos dos recursos com fundamento em oposição de julgados, nos seguintes termos, no que aqui interessa: Compete ao pleno da Secção de Contencioso Tributário conhecer: (...) b) Dos recursos de acórdãos da Secção que, relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência de alteração substancial da regulamentação jurídica, perfilhem solução oposta à de acórdão da mesma Secção ou do respectivo pleno; b’) Dos recursos de acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo proferidos em último grau de jurisdição que, na hipótese prevista na alínea anterior, perfilhem solução oposta à de acórdão da mesma Secção ou da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, ou do respectivo pleno; (...)

Os recursos com fundamento em oposição de julgados apenas são admitidos quando no acórdão recorrido e no acórdão invocado como fundamento, foram perfilhadas soluções opostas, relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência de alteração substancial de regulamentação jurídica.

No que ao primeiro requisito respeita, como tem sido numerosas vezes explicitado pelo Pleno desta Secção relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA para detectar a existência de uma contradição, quais sejam:

- Identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;

- Que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica;

- Que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;

- A oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta (Acórdãos do Pleno desta Secção do STA de 26 de Setembro de 2007, 14 de Julho de 2008 e de 6 de Maio de 2009, recursos números 452/07, 616/07 e 617/08, respectivamente).

A alteração substancial da regulamentação jurídica relevante para afastar a existência de oposição de julgados verifica-se “sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica” (v. Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA de 19 de Junho de 1996 e de 18 de Maio de 2005, proferidos nos recursos números 19532 e 276/05, respectivamente). Por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais (cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Comentado, volume II, 5.ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2007, p. 809 e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Abril de 1995, proferido no recurso n.º 87156).

Vejamos.

Alega a Recorrente que entre os arestos em confronto existe oposição juridicamente relevante para o efeito de admitir o presente recurso por oposição de julgados. Conclui te que, entre as decisões em confronto, em situações equivalentes e perfeitamente equiparáveis, senão mesmo iguais, quer do ponto de vista factual, quer legislativo, estamos perante as aludidas oposições de Acórdãos, nos sobreditos 2 segmentos decisórios, a saber, “no segmento em que aquele douto Acórdão manteve a correcção de ESC. 46.826.458$00, respeitante ao acréscimo do diferencial de prejuízos a que se reporta o artigo 59.º n.º 11 do CIRC (redacção aplicável)” e “no segmento em que o douto Acórdão aqui recorrido considera inverificado o vício de violação do direito de audição prévia”.

A Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunto junto deste STA secunda a alegação da recorrente no que respeita ao primeiro segmento, omitindo pronúncia relativamente à alegada preterição do direito de audição.

No que ao segmento decisório respeitante à correcção de ESC. 46.826.458$00, relativa ao acréscimo do diferencial de prejuízos a que se reporta o artigo 59.º n.º 11 do CIRC (redacção aplicável) a existência de oposição é assumida pelo acórdão sindicado, que revogou a sentença do TAF do Porto que aderira ao decidido pelo TCA Norte no acórdão ora apresentado como fundamento. Existe, efectivamente, oposição juridicamente relevante, porquanto a mesma questão fundamental de direito foi decidida de forma expressa em sentido oposto num e noutro aresto: no sentido da aplicação literal do n.º 11 do artigo 59.º do Código do IRC no acórdão recorrido, abrangendo no seu âmbito situações, como a dos autos, em que existe uma mera alteração da composição do perímetro em resultado da saída autorizada de uma ou mais sociedades ; no sentido da interpretação restritiva da mesma norma, com o cálculo da reposição, em sede de lucro tributável, a ser efectuado em singelo e não sujeito ao factor de 1,5 consagrado no preceito, no acórdão fundamento, sendo que, num e noutro caso, está em causa a aplicação da mesma norma jurídica – o n.º 11 do artigo 59.º do Código do IRC, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 71/93 -, a situações de facto que não se descortina serem substancialmente díspares.

Haverá, pois, que conhecer do mérito relativamente a esta questão.

Já no que tange ao segmento decisório respeitante ao direito de audição prévia, não se verifica, porém, oposição juridicamente relevante legitimadora da prossecução do recurso.

É que embora ambos os arestos versem sobre a preterição do direito de audição, prévio à liquidação e respectivo efeito invalidante sobre o acto tributário, sendo no sentido do “aproveitamento do acto” a decisão do acórdão do TCA recorrido e no sentido do seu “não aproveitamento” no Acórdão fundamento, são diversas as normas jurídicas convocadas num e noutro aresto – a redacção inicial do artigo 60.º da LGT, no acórdão fundamento; os artigos 100.º a 103.º do CPA, por remissão do n.º 7 do artigo 2.º do mesmo diploma, no acórdão recorrido, acrescendo no acórdão recorrido circunstâncias de facto evidenciadas no probatório sem paralelo no acórdão fundamento e que, do ponto de vista da actual jurisprudência sobre a matéria, são relevantes para a decisão (cfr. os n.ºs 15 e 19 do probatório fixado – “a impugnante foi notificada da intenção do indeferimento da Reclamação Graciosa e para exercício de audição prévia antes da decisão final sobre a reclamação (…)).

Não há, pois, quanto a este segmento da decisão, que conhecer do recurso.

O presente recurso deve, pois, prosseguir apenas para conhecimento do mérito da primeira questão, a do segmento decisório respeitante à correcção de ESC. 46.826.458$00, respeitante ao acréscimo do diferencial de prejuízos a que se reporta o artigo 59.º n.º 11 do CIRC.

7.2 Da apreciação do mérito do recurso

Cumpre agora decidir se a decisão do Tribunal Central Administrativo Norte sufragada no acórdão sob recurso merece censura.

Considerou o acórdão sindicado, acompanhando o Acórdão deste STA de 29 de fevereiro de 2012, no processo n.º 021/12, que o n.º 11 do artigo 59.º do Código do IRC (na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 71/93, de 26 de novembro), impunha, em situação como a dos autos – em que houve saída de uma sociedade do perímetro da consolidação fiscal sem caducidade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado -, que a sociedade dominante não apenas declarasse “em singelo” o diferencial dos prejuízos imputáveis à sociedade que saiu do perímetro da consolidação mas ainda a majoração em 50% destes.

Entendeu o TCA que tal solução é a que decorre expressamente da letra da lei, ponto de partida da tarefa do intérprete e a que se acomoda ao espírito do legislador, que pretende desencorajar as sociedades a saírem do perímetro da consolidação, não se podendo dizer que tal majoração corresponda a uma penalização, porquanto não tem carácter sancionatório, tratando-se ao invés de um mecanismo que visa desencorajar as sociedades (…) a não saírem do perímetro de consolidação, mantendo-se numa organização estável, na medida em que só assim se alcançam os objectivos visados pelo legislador com a instituição do RTLC (cfr. fls. 29 da numeração autónoma do acórdão recorrido), não se afigurando tal mecanismo nem desproporcional nem violador da tributação pelo lucro real e da capacidade contributiva, razão pela qual conclui que o n.º 11 do artigo 59.º do Código do IRC não deve ser interpretada na forma restritiva como o fez a sentença recorrida, pois há uma vontade inequívoca do legislador no sentido de aplicação da majoração de 1.5 no caso de saída de uma ou mais sociedades do perímetro societário, verificando-se coincidência entre o teor literal do preceito e a razão de ser do mesmo. O que significa que a correcção efectuada pela administração tributária obedeceu à determinação legal, não padecendo a liquidação impugnada, nesta parte, de qualquer ilegalidade (cfr. fls. 30 da numeração autónoma do acórdão recorrido).

Discorda do decidido a recorrente, alegando que não entende (…) como é possível aceitar (e interpretar) a penalização de 50% nos casos previstos no número 11 do artigo 59º do CIRC, estando em causa situação totalmente díspar daquela a que se reporta o nº 10 do mesmo preceito legal, sendo a situação dos autos mais próxima da do n.º 12 do mesmo artigo, em que não há lugar a penalização porque não há incumprimento do contribuinte, sendo inadmissível que uma simples alteração na composição do grupo produza os mesmos efeitos das situações derivadas de incumprimento das normas legais. Mais alega a recorrente que o artigo 59º nº 11 do CIRC (redacção de 1993), na interpretação de que é aplicável uma penalização/sanção/acréscimo de 50% à situação nele prevista, é materialmente inconstitucional, por violação dos princípios da proporcionalidade, da igualdade e da tributação do rendimento real, consignados nos artigos 104º nº 2 e 266º nº 2 da CRP (cfr., no mesmo sentido, Gonçalo Nunes Avelãs, in Tributação dos Grupos de Sociedades pelo Lucro Consolidado em sede de IRC, págs. 167 e ss.). Insiste que essa majoração em 50% reveste um carácter de sanção, que se vai reflectir na própria matéria colectável, por factos que não são ilegais, que não são fraudulentos e muito menos infrações. Entende que a aplicação da penalização de 50% nas situações em que não há caducidade da autorização viola frontalmente os princípios da proporcionalidade, da tributação pelo lucro real e da capacidade contributiva (cfr. artigos 4º nº 1, 5º nº 2 e 55º da LGT, 5º e 6º do CPA, 104º nº 2 e 266º nº 2 da CRP), que o douto Acórdão recorrido abstrai indevidamente do facto, crucial, de que a alteração do perímetro de consolidação fiscal, nos casos do nº 11 do artigo 59º do CIRC, foi devidamente autorizada pela AF e que não faz sentido considerar que o grupo tem necessariamente de se manter inalterável, ao longo de todo o período da autorização para a tributação pelo lucro consolidado, sem qualquer saída de sociedade, como condição para não lhe ser aplicada uma penalidade. Pugna pela interpretação restritiva do artigo 59º nº 11 do CIRC (…) que constitui mesmo uma condição para que o conteúdo e dimensão normativa do preceito não padeça de inconstitucionalidade material.

A Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunta junto deste STA emitiu parecer no sentido do provimento do recurso, no entendimento de que está em causa o exercício de 1993 e o citado n.º 11 foi introduzido (então como n.º 10), no então art.º 59.º do CIRS pela Lei n.º 71/93, de 26/11 (Orçamento suplementar ao Orçamento de Estado para 1993). Se assim é, nesta perspectiva afigura-se-nos que tem razão a recorrente quando defende que não se tratando de um caso de caducidade de aplicação do regime especial de tributação de grupos de sociedades, uma vez que foi autorizada a saída das sociedades identificadas e a continuação do grupo a que pertenciam, não é de aplicar o regime previsto no citado n.º 11, sob pena de tal aplicação representar aplicação retroactiva de lei fiscal não permitida nos termos da Constituição da República Portuguesa.//Consideramos que, no caso não ocorreu caducidade da autorização de aplicação do regime especial de tributação de grupos de sociedades, razão por que não há que aplicar a respectiva consequência e, ocorrendo, no caso, a alteração do perímetro do grupo, não lhe deverá ser aplicável Lei posterior, nos termos a que já nos referimos.//É certo que no questionado n.º 11, é clara a intenção do legislador ao estabelecer que, mesmo quando não haja lugar a caducidade da autorização, de mandar aplicar a referida majoração nos casos de saída de uma ou mais sociedades do perímetro de integração de um grupo tributado pelo regime do lucro consolidado, mas tal determinação só pode ser aplicada a factos tributários posteriores; na verdade, o regime previsto nos n.ºs 10 e 11 acaba por ser um regime sancionatório, gravoso, desproporcional e violador do princípio da tributação pelo lucro real, por isso mesmo não deve ser aplicado no caso presente (cf. voto de vencido no Ac. proferido no proc. n.º 021/12 disponível em www.dgsi.pt.).

Vejamos.

Não nos oferece dúvidas que o acórdão do TCA sindicado nos presentes autos é tributário e plenamente conforme ao entendimento sufragado pelo STA no Acórdão da Secção de Contencioso Tributário deste STA de 29 de fevereiro de 2012, processo n.º 021/12, para o qual a equiparação, para efeitos de “acréscimo em 50% do diferencial dos prejuízos”, da saída de sociedade do grupo do perímetro da consolidação sem caducidade da autorização (n.º 11 do art. 59.º do Código do IRC, na redacção vigente à data dos factos), aos casos de incumprimento geradores da caducidade da autorização (n.º 10 do art. 59.º do Código do IRC), resulta da lei, foi querida pelo legislador e não ofende a Constituição.

Este entendimento do STA não foi, porém, unânime, como resulta do voto de vencido aposto no Acórdão, nem foi reiterado ou infirmado em jurisprudência posterior deste Supremo Tribunal, razão pela qual se justifica revisitá-lo.

A definição de um regime tributário próprio para os grupos de sociedades foi introduzida no ordenamento jurídico português pelo Decreto-Lei n.º 414/87 de 31 de Dezembro, na sequência da publicação do Código das Sociedades Comerciais, que estabeleceu na lei comercial portuguesa a regulamentação jurídica das sociedades coligadas, entre elas aquelas em que se verifica uma relação de “domínio total”.

Tratava-se, como confessado no preâmbulo do referido diploma, de retirar dessa disciplina jusmercantil as consequências fiscais necessárias através da consideração dos grupos constituídos por domínio total, como uma unidade económica para efeitos de tributação nos impostos sobre o rendimento,

O regime então adoptado – de “Tributação pelo Lucro Consolidado” (RTLC), de adesão facultativa e sujeita a autorização prévia pelo Ministro das Finanças-, manteve-se, com as necessárias adaptações decorrentes da substituição de um sistema de imposto cedular (contribuição industrial) e de imposto de sobreposição (imposto complementar) por um sistema de imposto único, quando da aprovação do Código do IRC – cfr. os seus artigos 69.º a 72.º -, até à reforma empreendida pela Lei n.º 30-G/2000 de 29 de dezembro, que o veio substituir pelo Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS) (Sobre a origem e evolução do regime cfr. LUÍS MIGUEL BELO/PAULO ALVES RODRIGUES,/ZITA MARGARIDA ALMEIDA, «A tributação dos grupos de sociedades – um regime em evolução», Revista Electrónica de Fiscalidade da AFP, Ano I, Nº 1 (2019), disponível em www.afp.pt).

Trata-se, qualquer que seja o sistema concretamente adoptado, não de um regime de favorecimento fiscal, de benefício fiscal, antes da adopção por parte do sistema jurídico de uma “postura de neutralidade” em face da realidade empresarial, porquanto, como se dizia no preâmbulo do Código do IRC – cfr. o respectivo n.º 11 –, se entendia que uma reforma da tributação dos lucros não pode ignorar a evolução das estruturas empresariais, antes há de encontrar o quadro normativo que, obedecendo a princípios de eficiência e equidade, melhor se ajuste a essas mutações e a existência de grupos de sociedades que constituem uma unidade económica é uma das realidades atuais que deve merecer um adequado tratamento fiscal, na esteira, aliás, do que vem acontecendo noutras legislações.

Na vigência do Regime de Tributação pelo Lucro Consolidado constante do Código do IRC – artigos 69.º a 72.º - o artigo 5.º da Lei de Orçamento Suplementar ao Orçamento do Estado para 1993 (Lei n.º 71/93 de 6 de novembro), veio introduzir alterações várias ao regime de tributação dos grupos de sociedades vigente até 1993, entre as quais aquela que é objecto de apreciação nos presentes autos. Trataram-se de alterações determinadas por razões reditícias, em face do sucesso que o regime havia conhecido, medido pela adesão que mereceu dos grupos nacionais, mas que veio tornar o regime, nas palavras da “Comissão para o Desenvolvimento da Reforma Fiscal” “bastante complexo e relativamente pouco atrativo” (Cfr. Comissão para o Desenvolvimento da Reforma Fiscal, Relatório da Comissão para o Desenvolvimento da Reforma Fiscal, Lisboa, Ministério das Finanças, 1996, pp. 671.) , designadamente em razão da “penalização imposta às alterações na composição dos grupos consolidados”, recomendando a Comissão que “Na situação de saída de uma empresa do grupo consolidado, (…) os benefícios auferidos no âmbito do grupo consolidado sejam repostos, apenas com a incidência de juros compensatórios em substituição do actual regime” (Idem, p. 674.).

Dispunha o artigo 59.º do Código do IRC, na redacção que lhe foi conferida pelo artigo 5.º da Lei n.º 71/93, de 6 de novembro (destacados nossos):

Artigo 59.º

Âmbito e condições de aplicação

1 - ......................................................................................................................

2 - ......................................................................................................................

3 - ......................................................................................................................

4 - ......................................................................................................................

5 -A autorização é válida por um período de cinco exercícios, devendo a sociedade dominante efectuar novo pedido nos termos referidos no n.º 3, caso deseje que a mesma seja prorrogada.

6 - ......................................................................................................................

7 - ......................................................................................................................

8 - ......................................................................................................................

9 - ......................................................................................................................

10 - Nos casos em que se verifique a caducidade da autorização, nos termos dos n.º 6 ou 7, será, sem prejuízo do disposto no n.º 8, quando aplicável, adicionada para efeitos de determinação do lucro tributável do último exercício em que o regime for aplicado uma importância correspondente ao produto de 1,5 pelo valor da diferença entre os prejuízos que foram efectivamente integrados na base tributável consolidada e os que teriam sido considerados para efeitos fiscais se as sociedades tivessem sido tributadas autonomamente.

11 - O disposto no número anterior é igualmente aplicável nos casos de saída de uma ou mais sociedades do grupo sem que haja lugar a caducidade da autorização, aplicando-se nesse caso relativamente à diferença entre os prejuízos dessas sociedades que foram integrados na base tributável consolidada e os que teriam sido considerados para efeitos fiscais se as sociedades tivessem sido tributadas autonomamente.

12 - Sempre que não haja lugar à renovação do regime de tributação pelo lucro consolidado, nos termos do n.º 5 do presente artigo, os prejuízos fiscais de qualquer sociedade do grupo que foram efectivamente integrados na base tributável consolidada e que não teriam sido tomados em consideração se essas sociedades tivessem sido tributadas autonomamente são adicionados para efeitos de determinação do lucro tributável do último exercício em que seja aplicável o regime de tributação pelo lucro consolidado.

13 - Quando antes do termo de validade da autorização haja lugar a fusões ou cisões envolvendo apenas sociedades abrangidas pela tributação pelo lucro consolidado, o disposto nos n.ºs 10 e 11 não é aplicável se houver continuidade de aplicação da tributação pelo lucro consolidado e, a pedido da sociedade dominante a apresentar no prazo de 90 dias após a fusão ou cisão, tal for autorizado pelo Ministro das Finanças.

14 - Sempre que, durante o período de validade da autorização ou imediatamente após o seu termo, em resultado de uma operação de fusão envolvendo apenas a totalidade das sociedades abrangidas pela tributação pelo lucro consolidado, uma das sociedades pertencentes ao grupo incorpore as restantes ou haja lugar à constituição de uma nova sociedade, pode o Ministro das Finanças, a requerimento da sociedade dominante apresentado no prazo de 90 dias após a fusão, autorizar que não seja aplicável o disposto nos n.ºs 10, 11 e 12, podendo, nos termos e condições estabelecidos no n.º 5 do artigo 62.º, ser igualmente autorizado que o prejuízo consolidado ou os prejuízos não objecto de compensação, por virtude do disposto no artigo 59.º-A, possam ser deduzidos dos lucros tributáveis da nova sociedade ou da sociedade incorporante.

Em face da própria letra da lei a equiparação legal das situações em que tenha havido caducidade da autorização (n.º 10) e aquelas em que houve apenas a saída de uma ou mais sociedades do perímetro da consolidação fiscal, mas sem caducidade da autorização pela tributação pelo lucro consolidado (n.º 11) terá sido pretendida pelo legislador.

Questão é, porém, a de saber se a equiparação operada pelo legislador encontra fundamento material bastante ou se, pelo contrário, se revela desproporcional, e como tal contrária à Constituição da República, impondo-se a sua desaplicação.

Pressuposto da aplicação do n.º 10 do artigo 59.º do Código do IRC é ter havido caducidade da autorização para a tributação pelo lucro consolidado, por incumprimento das condições de que depende a manutenção do regime, sendo o pressuposto de que depende a aplicação do n.º 11 do artigo 59.º não ter havido caducidade da autorização apesar da saída de uma ou mais sociedades do perímetro da consolidação. Não obstante os pressupostos de aplicação diversos, a consequência jurídica é a mesma – reposição dos prejuízos acrescidos de um agravamento em 50%, não obstante o regime de consolidação se mantenha para as sociedades que permanecem no perímetro de consolidação.

Escapam-se-nos as razões objectivas que eventualmente justifiquem a parificação das consequências jurídicas em situações tão diversas, não se encontrando razão justificativa para tão grave consequência jurídica na situação da mera alteração do perímetro da consolidação fiscal mas sem caducidade deste para as demais sociedades, sabendo que embora se devam prevenir as situações de utilização “abusiva” do regime – mormente por via da incorporação no perímetro do consolidado de sociedades sistematicamente deficitárias para por via da consolidação diminuir a carga fiscal do grupo no seu todo – onde não há abuso, ou incumprimento de requisitos legais, antes a dinâmica própria da vida societária que determina alterações no grupo, não se encontra justificação para a “penalização fiscal” (em sentido impróprio) num regime cuja criação e manutenção foi determinada por razões de neutralidade.

Não conseguimos, pois, encontrar justificação aceitável para a equiparação de regimes, porquanto as situações que as desencadeiam são substancialmente diferentes e a estabilidade do perímetro da consolidação durante o período da autorização, se posta em causa por razões económicas válidas para o grupo e não determinantes da caducidade do regime, apenas pode encontrar justificação em razões de simplicidade na gestão tributária. Mas perante tal justificação, o acréscimo em 50% ao diferencial de prejuízos parece manifestamente excessivo (Assim NUNO DE OLIVEIRA GARCIA, «Tributação pelo Lucro Consolidado (Comentário ao Acórdão n.º 021/12 do Supremo Tribunal Administrativo – 2.ª Secção – de 29 de Fevereiro de 2012), Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano V, n.º 1 (Primavera), pp. 255-263.).

Ora, também em matéria fiscal, e também perante o legislador – ao menos quando a desproporção seja evidente ou manifesta (Cfr. Ana Raquel Gonçalves Moniz, «Juízo(s) de Proporcionalidade e Justiça Constitucional», ROA, ano 80, n. 1/2, Jan/Jun 2020, pp. 56/57.) - o princípio da proporcionalidade ou da “igualdade proporcional” , decorrente da própria ideia de Justiça e corolário do princípio do Estado de Direito (art. 2.º da CRP) parece impor-se e sancionar com um juízo negativo de inconstitucionalidade normas que imponham um desfavorável tratamento igual a situações substancialmente diferentes e que se revelem desadequadas, desnecessárias e excessivas.

É convicção deste Supremo Tribunal que tal sucede com a aplicação do acréscimo em 50% do diferencial dos prejuízos em situação como a dos autos, ex vi do n.º 11 do artigo 59.º do Código do IRC, na redação da Lei n.º 71/93, de 6 de novembro, razão pela qual se entende ser de desaplicar o referido segmento da norma.

Como tal, na medida em que, para além da reposição dos prejuízos “em singelo”, lhe acresce o valor de 50% do diferencial destes, será a norma do n.º 11 do artigo 59.º do Código do IRC, na redacção então vigente, desaplicada por inconstitucionalidade.

Assim, dar-se-á provimento ao recurso, revogando o acórdão recorrido no segmento apreciado e julgando procedente a impugnação.

- Decisão -

8 – Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em, conhecendo do mérito do recurso quanto à primeira questão elencada, conceder-lhe provimento, revogando nessa parte o acórdão recorrido e julgando procedente a impugnação, mais anulando a liquidação sindicada nesse segmento.

Custas pela recorrida, sem taxa de justiça neste STA porque aqui não contra-alegou.

Lisboa, 23 de fevereiro de 2022. - Isabel Cristina Mota Marques da Silva (relatora) - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - José Gomes Correia - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Gustavo André Simões Lopes Courinha - Anabela Ferreira Alves e Russo.

SEGUE ACÓRDÃO DE 26 DE MAIO DE 2022

Notificada do nosso Acórdão do Pleno da Secção do passado dia 23 de fevereiro - que concedeu provimento ao recurso interposto por Z……… SGPS, S.A., revogando o acórdão do TCA na parte impugnada e julgando procedente a impugnação, com a consequente anulação da liquidação sindicada nesse segmento -, vem a Fazenda Pública, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 616.º e n.º 1 do artigo 666.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi da alínea e) do artigo 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), requerer a respectiva reforma quanto a custas, reconhecendo-se a isenção de que beneficia a FP neste processo (cfr. fls. 3 do seu requerimento de reforma).

Alega, em síntese, que o Acórdão a condenou em custas, embora sem taxa de justiça no STA porque ali não contra-alegou, mas estas não são devidas porque a decisão foi proferida em processo instaurado em data anterior a 2004, sendo-lhe aplicável o Código das Custas (CCJ) aprovado pelo DL 224-A/96, de 26/11, na redacção anterior às alterações introduzidas pelo DL 324/03, de 27/12, e nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do CCJ a Fazenda Pública estava isenta de custas, isenção que perdeu posteriormente mas apenas para os processos novos, conforme abundante jurisprudência pacífica deste STA (que cita).

Foram dispensados os vistos, dada a simplicidade da questão.

Cumpre decidir.

Tem inteira razão a Fazenda Pública ao pedir a reforma do Acórdão quanto a custas, em razão da isenção de que beneficiava à data da instauração do processo e que se mantém até ao termo deste.

Como bem diz, ao tempo em que a impugnação judicial foi deduzida – 2 de junho de 2003 - a Fazenda Pública gozava de isenção de custas processuais - ex vi do disposto no artigo 3.º do Regulamento das Custas dos Processos Tributários (RCPT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 29/98, de 11 de Dezembro e do artigo 2.º da Tabela de Custas do Supremo Tribunal Administrativo (TCSTA), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 42.150, de 12 de Fevereiro de 1959 – isenção que perdeu nos processos iniciados após a revogação daquelas isenções, o que ocorreu no dia 1 de Janeiro de 2004, data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro (cfr. o seu artigo 16.º, n.º 1), diploma este que, por força do disposto no n.º 1 do seu artigo 14.º, apenas se aplica aos processos judiciais tributários iniciados a partir da data da sua entrada em vigor (neste sentido, entre outros, os Acórdãos deste STA de 25 de Maio de 2005, rec. n.º 0195/05; de 30 de Novembro de 2005, rec. n.º 0212/05; de 31 de Outubro de 2012, rec. n.º 0985/12; de 12 de Dezembro de 2012, rec. n.º 0627/12; de 18 de Novembro de 2009, rec. n.º 0952/09, de 25 de Novembro de 2009, rec. n.º 0794/09 e de 26 de Maio de 2010, rec. n.º 0259/10, bem como JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, Volume I, 6.ª edição, Lisboa, Áreas Editora, 2011, pp.276/278 – anotação 8 ao art. 20.º do CPPT).

Impõe-se, pois, concluir, que tem razão a AT ao pretender a reforma do Acórdão quanto a custas, sendo de deferir o pedido e de reconhecer à recorrente a isenção a que mantém direito.

Vai, pois, deferido o pedido de reforma quanto a custas.

- Decisão -

Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em deferir o pedido de reforma do Acórdão quanto a custas, dele passando a constar, em substituição do segmento condenatório em custas anterior, o seguinte: “Sem custas, pois a Fazenda Pública delas estava isenta à data da impugnação judicial”.

Sem custas.

Lisboa, 26 de maio de 2022. - Isabel Cristina Mota Marques da Silva (relatora) - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - José Gomes Correia - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Gustavo André Simões Lopes Courinha - Anabela Ferreira Alves e Russo.