Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
407/20.7PBHRT.L1.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: CID GERALDO
Descritores: RECURSO PER SALTUM
AMEAÇA
DANO
OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA QUALIFICADA
CONCURSO DE INFRAÇÕES
PLURIOCASIONALIDADE
REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS
PENA PARCELAR
PENA ÚNICA
MEDIDA DA PENA
FINS DAS PENAS
Data do Acordão: 06/09/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
I - O objecto do recurso em apreciação, circunscreve-se à medida das penas parcelares e unitária, fixadas pelo acórdão proferido nos autos em 3/12/2021, com penas de prisão parcelares, respectivamente de 15 (quinze) 6 (seis) meses; 8 (oito) meses, 2 (dois) meses, 6 (seis) meses, 10 (dez) meses e 2 (dois) anos e 8 (oito) meses, sendo o arguido condenado na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.
II - Trata-se de recurso da decisão proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca dos Açores Juízo Central Cível e Criminal de Angra do Heroísmo - Juiz 1, que condenou o arguido em pena única superior a 5 anos de prisão, visando exclusivamente matéria de direito, pelo que, nos termos dos art. 427.º e 432.º, n.º 1, al. c), ambos do CPP, a competência para conhecer o presente recurso pertence ao S.T.J.
III - Segundo o CPP, é admissível recurso direto para o STJ nos casos em que a pena aplicada seja superior a 5 anos, e o recurso vise exclusivamente matéria de direito ou com os fundamentos previstos nos n.os 2 e 3 do art. 410.º [art. 432.º, n.º 1, al. c), com a nova redação da Lei n.º 94/2021 de 21-12 - art. 11.º - que procede à alteração ao CPP] — o que constitui uma exceção à regra geral de recorribilidade das decisões para a Relação, nos termos do art. 427.º do CPP. Além disto, se o recurso é direto para o STJ e exclusivamente sobre matéria de direito não pode haver recurso prévio, em matéria de direito, para a Relação — art. 432.º, n.º 2, do CPP.
IV - A determinação da pena comporta duas operações distintas: a determinação da pena aplicável (moldura da pena), por via da averiguação do preenchimento do tipo legal de crime (tipo fundamental) e de circunstâncias modificativas que podem conduzir à punição por um tipo de crime agravado ou privilegiado, e a determinação concreta da pena (medida da pena), em função da culpa do agente e das exigências de prevenção (art. 71.º, n.º 1, do CP).
V - Em caso de concurso de crimes (art. 30.º, n.º 1, do CP), há ainda que determinar a pena única, a partir da moldura definida pela pena mais grave aplicada aos crimes em concurso e pela soma das penas aplicadas, sem ultrapassar o limite de 25 anos de prisão, tendo em consideração, no seu conjunto, a gravidade dos factos e a personalidade do agente (art. 77.º, n.os 1 e 2, do CP).
VI - Estabelece o n.º 1 do art. 71.º do CP que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo o tribunal atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele.
VII - A finalidade útil da pena assume-se numa função basicamente preventiva que se desdobra orientada para a comunidade – prevenção geral – e para o indivíduo – prevenção especial. Culpa e prevenção são os dois termos do binómio com o auxílio do qual há-de ser construído o modelo da medida da pena em sentido estrito.
VIII - A prevenção geral não se reconduz somente ao efeito dissuasor que o anúncio da aplicação de uma pena exercerá sobre o potencial infractor no que se designa como prevenção geral negativa. Já a vertente da prevenção especial reconduz-se ao objectivo de evitar a recidiva mediante a ressocialização ou reinserção social sem embargo de se lhe adicionar também, numa deriva mais securitária, o objectivo de intimidação individual e de inocuização.
VIII - Tendo em consideração todos estes parâmetros, bem como a moldura penal abstrata de cada um dos crimes (com o limite mínimo um mês de prisão e como máximo 4 anos de prisão, em relação ao crime de ofensa à integridade física qualificada; como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 2 anos de prisão, quanto ao crime de ameaça agravada; como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 3 anos de prisão, quanto a cada um dos crimes de dano; como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 5 anos de prisão, relativamente ao crime de dano qualificado), o que se constata é que as penas singulares foram fixadas no patamar mínimo permitido pela culpa, nomeadamente a pena concreta fixada de 6 meses de prisão por cada um dos quinze crimes de ameaça agravada; 8 meses de prisão pelo crime de ofensa à integridade física qualificada; 2 meses de prisão, pelo crime de dano (relativamente ao frigorífico amolgado – facto 36, dado como provado), 6 meses de prisão por outro dos crimes de dano (relativamente ao aparelho de vigilância electrónica estragado – factos 56 e 59, dados como provados); 10 meses de prisão pelo terceiro dos crimes de dano (relativamente ao aparelho de vigilância electrónica totalmente inutilizado – factos 56, 57 e 58, dados como provados) e 2 anos e 8 meses de prisão, pelo crime de dano qualificado, se situam todas elas muito abaixo do respectivo limite abstracto médio, exceptuando a pena aplicada ao crime de dano qualificado que se mostra ligeiramente acima do respectivo limite abstracto médio, mostrando-se justas, correta e adequadamente fixadas, pois a sua redução, além de não ser justificada ao nível da prevenção especial mormente por qualquer circunstância com destaque ao nível da condição social do recorrente ou outra que pudesse ser tida como factor atenuativo, criaria relativamente a factos semelhantes uma aberrante ideia de impunidade.
IX - Quanto à apreciação da condenação numa pena única, no presente caso, o limite máximo da pena unitária a aplicar é de 12 anos e 4 meses de prisão (que resulta da soma das penas concretamente aplicadas, respectivamente de 6 meses de prisão, de 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, de 8 meses de prisão, de 2 meses de prisão, de 6 meses de prisão, de 10 meses de prisão e de 2 anos e 8 meses de prisão), e o limite mínimo é de 2 anos e 8 meses de prisão (a mais elevada das penas parcelares).
X - Estabelecida a moldura penal do concurso a medida da pena única deverá ser encontrada em função das exigências gerais de culpa e prevenção, tendo em especial consideração os factos no seu conjunto e a personalidade do agente – Cfr., J. Figueiredo Dias, Direito Penal Português — As consequências Jurídicas do Crime, Lisboa: Aequitas/Ed. Notícias, 1993, § 421, p. 290 a 292).
XI - Pese embora alguns dos crimes não sejam especialmente graves, deverá ser considerado o conjunto factual na sua globalidade (de modo a descortinar as possíveis conexões entre eles), bem como a personalidade do arguido, a fim de se avaliar criticamente a pena única que lhe foi atribuída. Será no âmbito daquela moldura penal e de acordo com a personalidade do agente, procedendo a uma análise global dos factos e tendo em conta as exigências de prevenção geral e especial, que deverá ser determinada a pena única conjunta a aplicar ao arguido.
XII - Na avaliação da personalidade, ter-se-á que verificar se dos factos praticados pelo agente decorre uma certa tendência para o crime ou se estamos apenas perante uma pluriocasionalidade, sem possibilidade de recondução a uma personalidade fundamentadora de uma "carreira" criminosa. Apenas quando se possa concluir que se revela uma tendência para o crime, quando analisados globalmente os factos, é que estamos perante um caso onde se suscita a necessidade de aplicação de um efeito agravante dentro da moldura do concurso. Para além disto, e sabendo que também influem na determinação da pena conjunta as exigências de prevenção especial, dever-se-á atender ao efeito que a pena terá sobre o delinquente e em que medida irá ou não facilitar a necessária reintegração do agente na sociedade.
XIII - Os factos praticados são expressivos de uma atitude de desconsideração e indiferença pelo respeito de valores bem essenciais da comunidade. Quanto à personalidade do arguido, já se apresentam sintomas atinentes a uma tendência criminosa, ao praticar os factos descritos ao longo período de tempo de 2015 a 2020, revelando total desprezo em relação às suas vítimas – a quem responsabiliza pela sua conduta, deixando nas mesmas sequelas físicas e sobretudo psíquicas, vivendo ao longo dos anos num constante receio de serem agredidas – com total falta de arrependimento, mantendo o seu discurso de desresponsabilização e/ou vitimização, com reduzida capacidade de lidar com a frustração e um défice na resolução de problemas, a revelar forte propensão para a reiteração da actividade criminosa com especial incidência na prática de crimes contra a propriedade e contra as pessoas.
XIV - Assim, tudo ponderado, tendo presente a gravidade dos crimes, no que tange ao concreto contexto em que os factos foram praticados, que fornecem a imagem global de uma atitude significativamente desconforme ao direito, a demonstrar a clara incapacidade do arguido em interiorizar a ilicitude da sua conduta, demonstrada pela falta de arrependimento, da culpabilização apontada à família pela prática dos seus actos, e tendo ainda presente a moldura penal abstracta a considerar para a fixação da pena única, a qual se baliza entre os 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão, correspondente à mais elevada das penas parcelares aplicadas, e os 12 (doze) anos e 4 (quatro) meses de prisão, consideramos perfeitamente adequada, ajustada e equilibrada a pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão que o tribunal a quo tinha fixado, que assim será mantida.
Decisão Texto Integral:


 Proc.º nº 407/20.7PBHRT.L1.S1

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça.

I. RELATÓRIO

 1. No Processo Comum, com julgamento em Tribunal Colectivo, nº 407/20.7PBHRT, do Tribunal Judicial da Comarca dos Açores Juízo Central Cível e Criminal de Angra do Heroísmo - Juiz 1, o Ministério Publico acusou AA, imputando-se-lhe a prática, após alteração da qualificação jurídica em autoria material e na forma consumada, de quinze crimes de ameaça agravada, previstos e punidos pelos arts. 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelos arts. 143.º, n.º 1 e 145.º, n.ºs 1, al. a), e n.º 2, do Código Penal, com referência ao art. 132.º, n.º 2, al. a), do Código Penal, de três crimes de dano, previstos e punidos pelo art. 212.º, n.º 1, do Código Penal e de um crime de dano qualificado, previsto e punido pelos arts. 212.º, n.º 1, e 213.º, n.º 1, al. a), do Código Penal.

*

Findo o julgamento, foi proferido acórdão em 3 de Dezembro de 2021 que, julgando a acusação, após alteração da qualificação jurídica, procedente, por provada, em consequência, condenou o Arguido AA:

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelos arts. 143.º, n.º 1 e 145.º, n.ºs 1, al. a), e n.º 2, do Código Penal, com referência ao art. 132.º, n.º 2, al. a), do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime dano, previsto e punido pelo art. 212.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime dano, previsto e punido pelo art. 212.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime dano, previsto e punido pelo art. 212.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 10 (dez) meses de prisão;

- pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de dano qualificado, previsto e punido pelos arts. 212.º, n.º 1, e 213.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão;

- Em cúmulo jurídico, foi o arguido AA, condenado na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.

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Inconformado com o acórdão condenatório, recorreu o arguido AA, para o Tribunal da Relação de Lisboa que se declarou materialmente incompetente para conhecer do recurso – atento o seu objecto (matéria de direito) e a pena única aplicada ser superior a 5 anos –, determinando a remessa dos autos a este Supremo Tribunal.

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 Da motivação do recurso, retira o recorrente as seguintes conclusões:

1. O Arguido devidamente identificado vem recorrer para V. Exas. por entender que a pena que lhe foi aplicada é manifestamente desproporcionada.

2. O Arguido, no geral, confessou a prática dos factos de que vinha acusado.

3. Resultou provado em sede de julgamento que o comportamento inconstante e não ponderado por parte do Arguido resulta da “sua fraca socialização, perturbada, desde a infância, pelas práticas punitivas e severas do progenitor, bem como por todos os conflitos entre os progenitores, bem como pelo facto de ter sido institucionalizado aos 14 anos”, por razões imputáveis aos progenitores e não resultantes do comportamento do Arguido.

4. O Arguido é primário.

5. Por tudo o exposto, apesar do grau de ilicitude do facto ser mediano a elevado, o contexto em que ocorre tem de ser tido em consideração, não se afigurando necessário a aplicação de uma pena tão elevada e efectiva, para salvaguardar as necessidades de punição.

6. Nessa medida e apenas no que concerne ao quantum da pena aplicada pelo Tribunal a quo ao arguido, houve, salvo o devido respeito, violação do disposto no Artigo 71.º do Código Penal;

7. É entendimento do Recorrente que o Tribunal deverá condenar o arguido numa pena mais harmoniosa, proporcional e justa face às circunstâncias acima expostas, de acordo com o disposto naquele normativo legal

8. Devendo, assim, as penas aplicadas, quer a título individual, quer em sede de cúmulo jurídico, ser reduzidas para o seu limite mínimo,

9. Ou pelo menos, para uma pena inferior a 5 anos, suspensa na sua execução, com medida de proibição de contactos com sua progenitora, irmãs e avó,

10. Por se entender que desta forma se realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, a proteção dos bens jurídicos ofendidos e a reintegração do agente na Sociedade.

Face ao exposto, e muito que será suprido por vossas excelências, deverá ser concedido provimento ao presente recurso,

E revogar a aliás douta sentença que condenou o recorrente na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão, efetiva na sua execução, por ser desproporcionada às finalidades da punição

E ser aplicadas as penas pelos seus limites mínimos, reduzindo-se a mesma para uma pena não superior a 5 anos, suspensa na sua execução, com medida de proibição de contactos com os membros da família, aqui Ofendidos.

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O Ministério Público junto da Instancia Central Cível e Criminal de Angra do Heroísmo, apresentou resposta ao recurso, concluindo que “a pena imposta ao arguido, situa-se no circunspecto de ponderação da gravidade do crime - ponderada a personalidade do agente - e foi graduada de harmonia com as necessidades punitivas (ressocialização e prevenção), tudo conforme os artigos 40°, 70° e 71°, do Código Penal, não se justificando, com todo o respeito, nenhum poder corretivo pelo Tribunal de Recurso”, devendo manter-se a pena aplicada.

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Neste Tribunal a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso, mantendo-se o Acórdão recorrido.

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Foi dado cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 417.º do CPP nada tendo sido requerido.

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Colhidos os vistos, e uma vez que não foi requerida audiência, o processo foi presente à conferência para decisão.

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II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1.A. DE FACTO:

Da prova produzida e discussão da causa resultaram os seguintes:

1.FACTOS PROVADOS:

1.1. FACTOS CONSTANTES DA ACUSAÇÃO E/OU NÃO SUBSTANCIALMENTE ALTERADOS:

1. O arguido é filho de BB.

2. É irmão de CC, nascida a .../.../1995, e de DD, nascida a .../.../2003.

3. E neto de EE, nascida a .../.../1946.

4. O arguido residiu juntamente com a sua mãe e irmãs supra mencionadas na Ilha ..., em período não apurado, mas anterior a 2017.

5. Deixou de deixou de residir com a sua mãe e irmãs até data não concretamente apurada situada entre Outubro e Dezembro de 2017.

6. Tendo retornado ao agregado em causa entre Outubro e Dezembro de 2017 e passando todos a residir na Ilha ....

7. Na Ilha ... residiram, após a data mencionada em 6., na habitação sita na ..., nº..., na freguesia ..., concelho ....

8. Em habitação independente, com o nº..., residia a avó materna do arguido mencionada em 3.

9. CC residiu na habitação aludida em 7., até Março de 2018.

10. Por força de comportamentos do arguido deixou de viver na mesma.

11. O arguido, pelo menos desde Abril de 2012 que consome canábis e drogas sintéticas.

12. Em data não concretamente apurada situada entre 2015 e 2016, na casa em que moravam na Ilha ... nos termos descritos em 4., o arguido, sem motivo, muniu-se de uma faca de cozinha, apontou a faca em causa à sua irmã DD, encurralou-a contra a parede e espetou a faca nessa parede, um pouco acima da cabeça da sua irmã.

13. Desde que integrou o agregado em causa, por um número não concretamente apurado de vezes, o arguido pedia dinheiro à sua mãe.

14. E, se esta não lhe desse dinheiro, ficava nervoso, dizia que partia a casa, dava socos nas portas e dizia que ia deitar fogo à casa.

15. Desde que integrou o agregado em causa, em número de vezes não apurado, o arguido ouvia música colocando o som muito alto.

16. Sendo que, por vezes, a pedido da mãe ou da irmã, baixava o som e, outras vezes, não.

17. Em data não concretamente apurada entre Dezembro de 2017 e 21/10/2020, a mãe do arguido estava a estudar na mesa da sala e pediu ao arguido que colocasse a musica mais baixa.

18. Por tal motivo, o arguido, de imediato, dirigiu-se à mesa, pegou nos livros e atirou-os para o ar, deixando-os cair e espalhar-se no chão.

19. Pelo menos por três vezes, em momento anterior e próximo a 21/10/2020, o arguido disse à sua mãe: “não vais ser a primeira mãe que aparece morta; vais ser morta e ninguém vai dar contigo”.

20. Pelo menos por cinco vezes, nos meses anteriores a 21/10/2020, o arguido disse à sua mãe que lhe batia.

21. No dia 7 de Outubro de 2020 o arguido disse à sua mãe: “se me põe fora de casa vou pegar-lhe fogo; vou-te matar”.

22. Alguns dias depois, o arguido dirigiu-se à sua mãe e disse-lhe que: “fazia uma cova e a tapava com estrume e que ninguém a encontrava”.

23. Pelo menos por três vezes, nas semanas que antecederam o dia 21/10/2020, o arguido disse à sua mãe e à sua irmã DD: “ninguém quer saber de mim, sou um triste! Se pensam que vou matar-me, primeiro vou ter um desgosto!”

24. No mesmo período e com a mesma frequência, disse, ainda, à sua mãe e à sua irmã DD: “basta colocar uma pedra dentro de uma garrafa de gás e rebento com isto tudo!”.

25. Após ter integrado o agregado em causa o arguido disse, pelo menos por uma vez, à sua mãe e à sua irmã DD: “não tenho problemas nenhum de matar uma pessoa, mato uma pessoa como mato uma galinha!”.

26. No ano de 2019, estava DD ajoelhada no chão junto do frigorifico.

27. Nesse momento, o arguido, ao passar, sem que nada o fizesse prever, agarrou a porta do frigorífico e fê-la embater contra a cabeça da sua irmã, causando-lhe dores físicas.

28. Pelo menos duas vezes, nos três a quatro meses anteriores a 21/10/2020, o arguido disse à sua irmã DD: “não é a primeira irmã ou mãe que aparecem mortas! É fácil fazer desparecer um corpo; não me importo de matar pois vou preso, mas aliviado”.

29. Pelo menos por uma vez, no ano anterior a 21/10/2020, o arguido disse à sua irmã DD: “tu andas no caminho, ainda te vai acontecer qualquer coisa!”.

30. Em data não concretamente apurada entre Outubro e Dezembro de 2017, o arguido, ao ser repreendido por consumir estupefacientes, desferiu um soco no peito da sua irmã CC, fazendo-a sentir dores.

31. Pelo menos por duas vezes, no ano anterior a 21/10/2020, o arguido disse à sua irmã CC: “vou-te matar, não tenho problema nenhum de matar uma pessoa”.

32. Todos os factos descritos em 13 a 31 ocorreram na habitação referida em 7.

33. Em data não apurada entre 2018 e 2019, o arguido empurrou, com as mãos no peito, a sua avó EE.

34. Com a força do empurrão, EE foi projectada e bateu com as costas contra os mobiliários da cozinha.

35. Como consequência directa e necessária da descrita conduta do arguido, a sua avó EE ficou magoada nas costelas, recebendo tratamento hospitalar.

36. No dia 18 de Outubro de 2020 o arguido, com os próprios punhos, provocou duas mossas na porta em inox do frigorifico de casa da sua mãe.

37. Consequentemente, a sua mãe procurou-o em casa da avó materna supra mencionada e, aí, ordenou ao arguido que abandonasse a residência e fosse habitar em outro local.

38. O arguido seguiu a sua mãe até casa, dizendo: “não saio daqui sem dinheiro”.

39. Tendo, por isso, a sua mãe lhe dado 20 € e a sua irmã DD € 2,00.

40. No dia 20 de Outubro de 2020, o arguido pernoitou em casa de sua avó materna, a pretexto de que a sua mãe o teria colocado fora de casa.

41. Aí, afirmou: “vou à polícia pois quero ir para a cadeia”.

42. No dia 20 de Outubro de 2020, ao final da tarde, o arguido compareceu na casa da sua mãe, afirmando que ia voltar para casa e tendo a sua mãe respondido que não o queria mais ali.

43. Por esse motivo, o arguido disse: “amanhã os bombeiros vão vir aqui acima, vou pegar fogo a isto”.

44. No dia 21 de Outubro de 2020, durante a manhã, o arguido dirigiu-se à residência sita na ... nº..., em ..., ..., determinado, por vingança para com a sua mãe, a destruir todo o seu recheio.

45. Aí, munido de martelo de ferro com um extremo em forma redonda e outro extremo em forma de escopo, com cabo de madeira ..., o arguido deambulou pela casa e partiu o vidro da janela da cozinha e a porta da entrada da cozinha.

46. Partiu e destruiu a porta da entrada da casa das máquinas, o exaustor, o fogão, o forno, a mesa, as cadeiras, as portas de armários, as gavetas, o televisor, a torradeira, a cafeteira eléctrica e a máquina do café existentes na cozinha.

47. Arremessou o micro-ondas para o exterior da casa, partindo-o.

48. No corredor de acesso aos quartos, partiu objectos de decoração e atirou com têxteis, deixando-os espalhados pelo chão.

49. Na casa de banho, partiu o armário, o espelho e as prateleiras.

50. No quarto de dormir da mãe, partiu o televisor e desalinhou o colchão e demais objectos.

51. Quando saiu de casa, atirou uma botija de gás vazia, pela janela, para dentro da casa de banho.

52. E, partiu dois vidros de janelas do alçado lateral esquerdo.

53. Bem como um vaso.

54. O arguido partiu os vidros da frente, traseiro e os quatro vidros laterais, o painel eléctrico de informações, amolgou o tejadilho e partiu o espelho retrovisor esquerdo, do veículo ... de matrícula ...-HQ-..., da sua mãe, e que havia sido adquirido por esta pelo valor de € 8500,00.

55. Os objectos destruídos/estragados pelo arguido têm o seguinte valor ou custo de reparação:

55.1. o micro-ondas valia, pelo menos, € 150,00;

55.2. a mesa da cozinha valia, pelo menos, € 230,00;

55.3. a placa do fogão, o exaustor e o forno, valiam, pelo menos, € 1400,00;

55.4. a televisão de plasma valia, pelo menos, € 100,00;

55.5. a torradeira e a tostadeira, valiam, pelo menos, € 40,00;

55.6. a máquina do café valia, pelo menos, € 100,00;

55.7. a cafeteira de aquecer água valia, pelo menos, € 30,00;

55.8. a gaveta da cozinha tem um custo de reparação de € 30,00;

55.9. os 3 quadros valiam, pelo menos, e 20,00, cada um;

55.10. a porta do armário da casa de banho e o espelho, valiam, pelo menos, € 60,00;

55.11. a jarra e um castiçal, ambos de cristal, valiam, pelo menos, € 30,00;

55.12. o espelho do guarda fatos valia, pelo menos, € 30,00;

55.13. os 4 vidros partidos da casa valiam, pelo menos, € 200,00 cada um;

55.14. a pedra de mármore e a tijoleira, valiam, pelo menos, € 100,00.

55.15. o veículo automóvel tem um custo de reparação de € 2325,00.

56. Na sequencia de medidas de coacção aplicadas em 22 de Outubro de 2020, foi aplicado ao arguido um dispositivo de identificação pessoal, vulgo “pulseira eletrónica”, bem como uma unidade de posicionamento móvel, propriedade da sociedade S.…, Lda..

57. Nos dias 19 e 22 de Fevereiro de 2021 o arguido, contra a vontade e sem conhecimento da sua legítima proprietária, destruiu os referidos equipamentos, com os números ...32 e ...51, com o valor de € 1800,00 cada um.

58. Na sequência da conduta do arguido o equipamento com o número ...32 ficou completamente inutilizado e irreparável;

59. Na sequência da conduta do arguido o equipamento com o número ...51 foi reparado mediante a substituição da capa frontal.

60. O arguido actuou como referido em 19, 21, 22, 23, 24, 28 e 31 sabendo que com a prolação das expressões em causa criaria no espírito de cada uma das ofendidas medo ou receio iminente quanto à sua integridade física e vida, por serem as mesmas idóneas a provocar medo e inquietação nestas.

61. Não obstante, actuou do modo descrito, querendo e conseguindo causar o medo em causa.

62. O arguido actuou como referido em 33, 34 e 35 sabendo que com a sua conduta ofenderia, sem motivo, a integridade física da sua avó, já com mais de 70 anos de idade.

63. Não obstante, actuou do modo descrito, querendo e conseguindo ofender a integridade física desta.

64. O arguido actuou como referido em 36 sabendo que com a sua conduta estragaria o frigorífico em causa.

65. Não obstante, actuou do modo descrito, querendo e conseguindo estragá-lo nos termos supra descritos.

66. O arguido actuou como referido em 44 a 55.15. sabendo que com a sua conduta estragaria os objectos em causa, o que, pelo seu valor, implicaria um prejuízo superior a € 5.100,00.

67. Não obstante, actuou do modo descrito, querendo e conseguindo estragá-los nos termos supra descritos.

68. O arguido actuou como referido em 56, 57, 58 e 59 sabendo que com a sua conduta estragaria os aparelhos em causa.

69. Não obstante, actuou do modo descrito, querendo e conseguindo estragá-los nos termos supra descritos.

70. Em todos os momentos supra descritos o arguido actuou de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que as suas condutas eram punidas pela lei penal como crime.

1.2. FACTOS RELATIVOS ÀS CONDIÇÕES ECONÓMICAS, PESSOAIS, SOCIAIS E PROFISSIONAIS DO ARGUIDO

71. O arguido, tem 23 anos.

72. É ..., Ilha ....

73. É oriundo de um agregado de estrato sociocultural baixo, sendo o pai ... e a mãe ... no ….

74. É o 4.º da fratria uterina de 5 elementos, sendo a irmã mais nova, germana do arguido.

75. Tem o 6.º ano de escolaridade.

76. Teve um percurso escolar pautado pela desmotivação.

77. Tal ocorreu pelo desinteresse associado às dificuldades de aprendizagem e subsequente absentismo.

78. Bem como pela associação a pares com comportamentos disruptivos, no espaço escolar.

79. O arguido e a irmã mais nova são resultado da 3.ª relação de tipo marital da progenitora, quando esta tinha 30 anos de idade.

80. Tal relação durou 14 anos, 12 dos quais a residir na Ilha ..., onde nasceram ambos os filhos mais novos.

81. A socialização primária do arguido foi pautada pela conflitualidade conjugal dos progenitores, interligada com consumos de bebidas alcoólicas e a utilização de estratégias disciplinares rígidas / punitivas por parte do progenitor.

82. Por essa razão, e após ruptura da relação conjugal entre os progenitores do arguido, a mãe alterou a sua residência para a Ilha ..., em 2011, onde permaneceu até 2017.

83. Tal circunstância levou à institucionalização do arguido e da irmã, com 14 anos e 8 anos, respectivamente, na Casa de Acolhimento ..., na ..., na Ilha ..., no âmbito de processo de promoção e protecção, relacionado com a dificuldade sentida pela progenitora em impor estratégias disciplinares aos filhos, uma vez que, desde cedo, o arguido evidenciou comportamentos rebeldes e de oposição.

84. Os comportamentos disruptivos, personalizados pelo arguido, vieram a agravar-se quando aquele reintegrou o agregado da mãe, em 2012, após o período de um ano de acolhimento institucional.

85. Posteriormente, em 2014, o arguido foi acolhido numa estrutura de acolhimento para sem abrigos, na ..., na sequência da perturbação intrafamiliar, materializada em confrontos hostis / agressivos (física e emocional) para com a progenitora e irmãs, sempre que contrariado.

86. O motivo dos confrontos centrou-se, essencialmente, nas questões monetárias, que se traduziram em atitudes/ comportamentos conflituosos e com a utilização de uma verbalização imprópria e intimidatória, e com algumas investidas físicas e de destruição de equipamento doméstico.

87. Entre 2015 e a data dos factos, manteve um enquadramento familiar, de forma intermitente entre o agregado da progenitora e 2 das irmãs, e períodos de mendicidade, justificado pelas recorrentes atitudes opositoras do arguido.

88. O arguido tem reduzida capacidade de lidar com a frustração e um consequente défice de resolução de problemas, com impacto no tipo de relacionamento com a mãe e as irmãs, que culminou nos comportamentos que deram origem aos presentes autos.

89. Não demonstra qualquer empatia com as presumíveis vítimas, não se identificando com a maioria das acusações e justificando as restantes com sentimentos de revolta para com a família e com o sistema de segurança social, que responsabiliza pela situação em que se encontra.

90. Embora assuma o consumo de estupefacientes, não os relaciona com os comportamentos e atitudes relatados nos autos, atribuindo à progenitora responsabilidades na desvinculação emocional / abandono sobre si, que utiliza como justificação para o seu comportamento e que deu origem ao presente Processo.

91. Tem um percurso laboral irregular resultante da sua baixa escolaridade.

92. Dedicou-se, apenas, à execução …, a solicitação de terceiros, condicionados pela conotação comunitária que o associa a consumos de estupefacientes e à definição de relacionamentos interpessoais caracterizados pela conflitualidade /agressividade.

93. O arguido não reconhece tal realidade, considerando possuir competências suficientes nas áreas de … e ...

94. Não demonstra consciência critica quanto aos factos descritos no presente processo.

95. Contudo, assume que, em alguns períodos do seu percurso, manifestou comportamentos impulsivos e desadequados.

96. Enquadra-os num discurso de desresponsabilização / desculpabilização mediante as suas condições de vida, sem suporte familiar e social.

97. Assume uma postura de vitimização relativamente às circunstâncias da sua vivência pessoal.

1.3.ANTECEDENTES CRIMINAIS DO ARGUIDO

98. O arguido não tem quaisquer antecedentes criminais.

*

2.FACTOS NÃO PROVADOS:

a) Que o arguido pedisse dinheiro às suas irmãs e à sua avó materna.

b) Em algumas ocasiões, o arguido, em discussões, desferiu empurrões contra a sua mãe.

c) O arguido dirigia-se diariamente à sua avó dizendo que “partia tudo”.

d) Em data não apurada do final do ano de 2019, o arguido desferiu uma bofetada na sua mãe.

e) No dia 10 de Novembro de 2017, no interior da residência da família, o arguido consumia charros na presença das suas irmãs CC e DD e da sua mãe, sendo que, e quando foi repreendido pela mãe para que não o fizesse, passou a vociferar contra todas, causando-lhes temor e perturbação.

f) Que, por força do soco dado pelo arguido no peito, CC caiu no chão e que o arguido, depois, colocou-se por cima desta para a agredir mais, sendo retirado à força pela sua mãe.

g) Que EE, por força do empurrão dado pelo arguido, arrastou a mesa da cozinha, ficando caída entre esta e o fogão.

h) Que EE, por força do empurrão dado pelo arguido, fracturou duas costelas.

i) No dia 20 de Abril de 2019, o arguido, na casa onde moravam, exigiu da sua mãe dinheiro e, porque esta se recusou a entregar-lho, discutiu com a sua mãe e desferiu-lhe socos na zona do peito.

j) Depois, muniu-se de uma faca e afirmou que qualquer dia cometia uma loucura, deixando na sua mãe a convicção de que viria a usar aquele objecto para atentar contra a sua integridade física ou mesmo contra a sua vida.

k) Que as mossas referidas em 36. tenham sido provocadas por um objecto.

l) Que o arguido tenha destruído o frigorifico existente na cozinha da casa da sua mãe, o qual valia € 350,00.

m) Que o arguido tenha deixado uma pedra por cima da garrafa de gás que tombou.

n) As 2 taças em pyrex destruídas pelo arguido valiam € 30,00.

o) A mais do dado como provado, que o arguido agiu com o propósito, alcançado, de exercer poder sobre e de dominar a sua avó, querendo causar-lhe, como causou, medo, humilhação e vergonha, e impedir, como impediu, a sua liberdade e o livre desenvolvimento da sua personalidade pois que sabia que pela sua avançada idade se tratava de pessoa particularmente vulnerável.

p) A mais do dado como provado, que o arguido agiu com o propósito, alcançado, de exercer poder sobre e de dominar a sua mãe e irmãs, querendo causar-lhes, como causou, humilhação, angustia, ansiedade, tristeza, vergonha e sofrimento físico e dores físicas, e impedir, como impediu, o livre desenvolvimento da sua personalidade, designadamente a sua estabilidade psicológica e sociabilidade, pois bem sabia que a sua actuação repetida e a gravidade da sua conduta eram de molde a gerar nestas perturbação, inquietação, ansiedade e tristeza, o que quis e conseguiu.

q) A mais do dado como provado, que o arguido agiu com o propósito, alcançado, de destruir e fazer imprestáveis os objectos descritos com promessa séria e firme de actos contra a vida e integridade física de sua irmã DD e sua mãe, querendo atingi-las e atingindo-as na sua liberdade de acção e de determinação.

*

II.2. Constitui entendimento constante e pacífico que o âmbito dos recursos é definido pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, que delimitam as questões que o tribunal ad quem tem de apreciar, sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso (cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, 2.ª ed. 2000, p. 335; Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos em Processo Penal, 6.ª ed., 2007, p. 103; Ac. STJ de 11-09-2019, Proc. n.º 96/18.9GELLE.E1.S1, Relator: Raúl Borges).

*

II.3. O objecto do recurso em apreciação, circunscreve-se à medida das penas parcelares e unitária fixadas pelo Acórdão proferido nos autos em 3/12/2021, com penas de prisão parcelares, respectivamente de 15 (quinze) X6 (seis) meses; 8 (oito) meses, 2 (dois) meses, 6 (seis) meses, 10 (dez) meses e 2 (dois) anos e 8 (oito) meses, sendo AA condenado na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.

Alega o recorrente, em síntese, que a pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão efetiva em que foi condenado é excessiva e injusta porque não teve em conta os princípios básicos dos fins das penas. Em seu entender, no caso concreto dos autos, com a fixação de uma pena de prisão não superior a 5 (cinco) anos, suspensa na sua execução, alcançar-se-ia o fim último da ressocialização do arguido.

No caso presente, trata-se de recurso da decisão proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca dos Açores Juízo Central Cível e Criminal de Angra do Heroísmo - Juiz 1, que condenou o arguido em pena única superior a 5 anos de prisão, visando exclusivamente matéria de direito, pelo que, nos termos dos artigos 427.º e 432.º, n.º 1, al. c), ambos do CPP, a competência para conhecer o presente recurso pertence ao S.T.J.

Segundo o CPP, é admissível recurso direto para o STJ nos casos em que a pena aplicada seja superior a 5 anos, e o recurso vise exclusivamente matéria de direito ou com os fundamentos previstos nos n.ºs 2 e 3 do artigo 410.º [art. 432.º, n.º 1, al. c), com a nova redação da Lei n.º 94/2021 de 21 de dezembro - artigo 11.º - que procede à alteração ao Código de Processo Penal] — o que constitui uma exceção à regra geral de recorribilidade das decisões para a Relação, nos termos do art. 427.º do CPP. Além disto, se o recurso é direto para o STJ e exclusivamente sobre matéria de direito não pode haver recurso prévio, em matéria de direito, para a Relação — art. 432.º, n.º 2, do CPP.

*

II.4. Da medida das penas parcelares.

O tribunal recorrido puniu o arguido por cada um dos quinze crimes de ameaça agravada com a pena concreta de 6 meses de prisão; pelo crime de ofensa à integridade física qualificada, na pena de 8 meses de prisão; por cada um dos três crimes de dano com uma pena respetivamente de 2, 6 e 10 meses de prisão e, pelo crime de dano qualificado na pena de 2 anos e 8 meses de prisão.

Quanto às penas parcelares, limita-se o recorrente a alegar que as mesmas devem ser reduzidas para o seu limite mínimo.

Vejamos:

A determinação da pena comporta duas operações distintas: a determinação da pena aplicável (moldura da pena), por via da averiguação do preenchimento do tipo legal de crime (tipo fundamental) e de circunstâncias modificativas que podem conduzir à punição por um tipo de crime agravado ou privilegiado, e a determinação concreta da pena (medida da pena), em função da culpa do agente e das exigências de prevenção (artigo 71.º, n.º 1, do Código Penal).

Em caso de concurso de crimes (artigo 30.º, nº 1, do Código Penal), há ainda que determinar a pena única, a partir da moldura definida pela pena mais grave aplicada aos crimes em concurso e pela soma das penas aplicadas, sem ultrapassar o limite de 25 anos de prisão, tendo em consideração, no seu conjunto, a gravidade dos factos e a personalidade do agente (artigo 77.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal).

*

II.4.1. A determinação da medida da pena pelo tribunal da condenação mostra-se fundamentada nos seguintes termos:

«2. DETERMINAÇÃO CONCRETA DA MEDIDA DA PENA

Nessa conformidade, passemos, então, à determinação concreta da medida da pena a aplicar ao arguido pelos crimes por que vimos dever ser condenado.

Conforme resulta do art. 40.º, do Código Penal, “A aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” (n.º 1), sendo que “Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa” (n.º 2).

Por outro lado, estipula o art. 70.º, do Código Penal, a preferência do legislador pelas penas não privativas da liberdade, sempre que realizem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, e estatui o art. 71.º, do mesmo diploma legal, que “A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção” e, para essa operação, o tribunal terá de atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele (n.º 2 do mesmo normativo).

Assim, a culpa, segundo a função que lhe é político-criminalmente determinada, constitui condição necessária de aplicação da pena e limite inultrapassável da sua medida. Dentro do limite máximo permitido pela culpa, a pena deve ser determinada no interior de uma moldura de prevenção geral positiva, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico; dentro desta moldura de prevenção geral positiva a medida da pena será encontrada em função de exigências de prevenção especial, maxime, de socialização. Em sentido idêntico, cfr. JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, in Direito Penal Português. As consequências jurídicas do Crime, Editorial Notícias, 1993, Coimbra, pp. 227 a 229.

*

Façamos, antes de analisar cada uma das penas a aplicar, um parêntesis para apurar se será de aplicar ao arguido, com menos de 21 anos à data da prática de alguns dos factos (art. 1.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 401/82, de 23 de Setembro), o regime especial para jovens, ínsito no DL n.º 401/82, de 23 de Setembro.

Assim, se for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado (artigo 4.º, do DL n.º 401/82, de 23 de Setembro).

Note-se que não estamos perante uma aplicação automática da atenuação especial e das demais medidas consagradas como especiais para os jovens (cf., como expressão de uma jurisprudência uniforme, o acórdão do STJ de 3 de Março de 1999, no processo nº 198/99).

Sobre este ponto, entendemos que a interpretação que melhor corresponde ao espírito do legislador do DL n.º 401/82, de 23 de Setembro, vai no sentido de, reconhecendo embora o carácter não automático da aplicação do regime especial para jovens, admitir que só um juízo de prognose negativo poderá afastar a aplicação da atenuação especial, pois só então as exigências preventivas podem fazer valer os seus direitos sobre as preocupações ressocializadoras do legislador.

Nessa conformidade, entendemos a atenuação especial como um regime penal normal para os jovens de idade compreendida entre os 16 e os 21 anos — e não revestida de carácter excepcional, como a atenuação especial prevista no artigo 72.º, do Código Penal (é nesta perspectiva que se move, por ex., o acórdão do STJ de 29 de Março de 2001, acentuando por um lado a flexibilidade do julgador, que é mesmo preconizada e incentivada no preâmbulo do Decreto-Lei nº 401/82, de 23 se Setembro, e, por outro lado, a inconveniência dos efeitos estigmatizantes das penas (Cfr., ainda, o acórdão da Relação de Lisboa de 7 de Fevereiro de 2001, CJ, ano XXVI 2001, tomo I, p. 150).

Vertendo ao caso dos autos, entendemos, precisamente verificar-se uma daquelas situações em que é de formular um juízo de prognose negativo afastador da aplicação da atenuação especial.

Na verdade, não obstante a idade do arguido à data da prática de alguns dos factos e a ausência de antecedentes criminais, as exigências de prevenção geral que se fazem sentir são elevadas, estando em causa actuações com especial incidência nesta comarca, sendo inúmeros os crimes em apreciação nos autos e a conduta do arguido prolongada no tempo e especialmente dirigida àqueles que lhe eram próximos.

Por outro lado, e decisivamente, o facto de o arguido não estar minimamente integrado, nem a nível social, nem profissional, nem sequer familiar (pois dirige os crimes contra a sua família que já nem constitui um seu suporte), aliado, sobretudo, à sua personalidade, demonstrada pelo seu percurso pessoal ligado à problemática toxicológica aditiva que sofre, impõem que as exigências preventivas, sobretudo ao nível da prevenção especial, sobrelevem sobre as preocupações ressocializadoras do legislador.

Não há, assim, sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do arguido, pelo que este não beneficiará do regime especial para jovens, ínsito no DL n.º 401/82, de 23 de Setembro, nem, consequentemente, de qualquer atenuação especial, nos termos dos arts. 73.º e 74.º, do Código Penal (art. 4.º, do DL n.º 401/82, de 23 de Setembro).

*

Isto posto, passemos à pena a aplicar por cada um dos crimes de ameaça agravada por que vimos dever ser condenado (e, fá-lo-emos em conjunto porque a ilicitude e as vítimas dos mesmos não divergem em termos de gravidade).

No caso em apreço, atendendo à factualidade provada, e prevendo o tipo legal da ameaça agravada (artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal), em alternativa, pena de multa e pena de prisão, atendendo à personalidade do arguido ao número de crimes e teor global dos factos por que irá condenado nestes autos, entendemos não se poder já aplicar a pena de multa, por não se mostrar ser suficiente e adequada para satisfazer as finalidades da punição.

Nessa conformidade, por força do disposto nos arts. 41.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, a pena de prisão tem como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 2 anos.

No que concerne ao concreto tempo de privação da liberdade a impor ao arguido, importa ponderar, à luz dos critérios estabelecidos pelo art., 71.º, do Código Penal, que, quanto ao crime em apreço, são elevadas as necessidades de prevenção geral, derivadas do facto de a incriminação em causa ser das mais frequentes por todo o país.

Contudo, se, como já dissemos, são, cada vez mais, prementes as necessidades de prevenção geral em crimes deste tipo, também não deixa de ser verdade que a pena a aplicar concretamente há-de resultar das regras da prevenção especial, segundo as quais esta será o limite necessário à reintegração do arguido na sociedade, causando-lhe apenas e tão-só o mal necessário.

Assim, o limite aconselhado pela culpa e pela prevenção geral, deve ser temperado pela prevenção especial que, atendendo à idade e à ausência de antecedentes criminais, aconselha uma agravação médio/baixa.

Atendendo aos critérios estabelecidos pelo art. 71.º, n.º 2, do Código, temos, em síntese, que a favor do arguido militam as seguintes circunstâncias:

– a admissão das condutas em causa;

– a ausência de grandes consequências advindas da conduta do Arguido em todas as suas actuações;

– a condição socioeconómica e instrução de grau baixo; – o contexto de dependência toxicológica em que actuou; – a inexistência de antecedentes criminais.

Por seu turno, em desfavor deste, há que considerar o seguinte: – a ilicitude de grau médio;

– o facto de o arguido ter actuado com dolo directo;

– a ausência de integração familiar, social e profissional;

– a total ausência de arrependimento (desresponsabilizando-se o arguido das suas condutas e invertendo o papel agressor/vítima).

Por conseguinte, em face das circunstâncias supra enumeradas e forma como tudo ocorreu, entendemos que a conduta deste deverá ser sancionada, por cada um dos quinze crimes de ameaça agravada, com uma pena de 6 meses de prisão.

*

Avancemos, agora, para a pena a aplicar pelo crime de ofensa à integridade física qualificada.

No caso em apreço, prevê o tipo legal da ofensa à integridade física qualificada (do artigo 145.º, n.ºs 1, al. a), e 2, do Código Penal, com referência ao art. 132.º, n.º 2, al. a), do Código Penal), pena de prisão, prisão essa que tem como limite mínimo um mês de prisão e como máximo 4 anos de prisão (cfr. os arts. 41.º, n.º 1, e 145.º, n.º 1, al. a), do Código Penal).

Isto posto, no que concerne ao concreto tempo de privação da liberdade a impor ao arguido, importa ponderar, à luz dos critérios estabelecidos pelo art.º, 71.º, do Código Penal, que, quanto ao crime em apreço são, cada vez mais, prementes as necessidades de prevenção geral, derivadas do facto de a incriminação em causa se apresentar com grande intensidade, com uma clara repercussão e alarme social, pondo-se em causa a tranquilidade e segurança variadíssimas vezes no círculo restrito familiar.

Contudo, se, como já dissemos, são, cada vez mais, prementes as necessidades de prevenção geral em crimes deste tipo, também não deixa de ser verdade que a pena a aplicar concretamente há-de resultar das regras da prevenção especial, segundo as quais esta será o limite necessário à reintegração do arguido na sociedade, causando-lhe apenas e tão-só o mal necessário.

Assim, o limite aconselhado pela culpa e pela prevenção geral, deve ser temperado pela prevenção especial que, in casu, atendendo à idade do arguido, à ausência de antecedentes criminais e não esquecendo o circunstancialismo em que tudo se processou, aconselha uma agravação médio/baixa.

Atendendo aos critérios estabelecidos pelo art. 71.º, n.º 2, do Código, temos, em síntese, que a favor do arguido militam as seguintes circunstâncias:

– a admissão da conduta em causa;

– a ausência de grandes consequências advindas da conduta do Arguido (ficando a avó magoada nas costelas);

– a condição socioeconómica e instrução de grau baixo; – o contexto de dependência toxicológica em que actuou; – a inexistência de antecedentes criminais.

Por seu turno, em desfavor deste, há que considerar o seguinte:

– a ilicitude de grau médio, atendendo ao tipo de agressão que perpetrou; – o facto de o arguido ter actuado com dolo directo;

– a ausência de integração familiar, social e profissional;

– a total ausência de arrependimento (desresponsabilizando-se o arguido das suas condutas e invertendo o papel agressor/vítima).

Por conseguinte, em face das circunstâncias supra enumeradas e factualidade dada como provada, entendemos que a conduta do Arguido deverá ser sancionada, pelo crime de ofensa à integridade física qualificada, com uma pena de 8 meses de prisão.

*

Em terceiro lugar, vejamos à pena a aplicar por cada um dos crimes de dano por que vimos dever ser condenado (e, fá-lo-emos em conjunto, embora divergindo na pena consoante a ilicitude destes como veremos).

No caso em apreço, atendendo à factualidade provada, e prevendo o tipo legal do dano (artigo 212.º, n.º 1, do Código Penal), em alternativa, pena de multa e pena de prisão, atendendo à personalidade do arguido ao número de crimes e teor global dos factos por que irá condenado nestes autos, entendemos não se poder já aplicar a pena de multa, por não se mostrar ser suficiente e adequada para satisfazer as finalidades da punição.

Nessa conformidade, por força do disposto nos arts. 41.º, n.º 1, e 212.º, n.º 1, do Código Penal, a pena de prisão tem como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 3 anos.

No que concerne ao concreto tempo de privação da liberdade a impor ao arguido, importa ponderar, à luz dos critérios estabelecidos pelo art., 71.º, do Código Penal, que, quanto ao crime em apreço, são elevadas as necessidades de prevenção geral, derivadas do facto de a incriminação em causa ser das mais frequentes por todo o país.

Contudo, se, como já dissemos, são, cada vez mais, prementes as necessidades de prevenção geral em crimes deste tipo, também não deixa de ser verdade que a pena a aplicar concretamente há-de resultar das regras da prevenção especial, segundo as quais esta será o limite necessário à reintegração do arguido na sociedade, causando-lhe apenas e tão-só o mal necessário.

Assim, o limite aconselhado pela culpa e pela prevenção geral, deve ser temperado pela prevenção especial que, atendendo à idade e à ausência de antecedentes criminais, aconselha uma agravação médio/baixa.

Atendendo aos critérios estabelecidos pelo art. 71.º, n.º 2, do Código, temos, em síntese, que a favor do arguido militam as seguintes circunstâncias:

– a ilicitude de grau baixo no caso do frigorífico amolgado e do aparelho de vigilância electrónica reparado;

– a admissão das condutas em causa;

– a condição socioeconómica e instrução de grau baixo;

– o contexto de dependência toxicológica em que actuou;

– a inexistência de antecedentes criminais.

Por seu turno, em desfavor deste, há que considerar o seguinte:

– a ilicitude de grau médio, no caso do aparelho de vigilância electrónica estragado;

– o facto de o arguido ter actuado com dolo directo;

– a ausência de integração familiar, social e profissional;

– a total ausência de arrependimento (desresponsabilizando-se o arguido das suas condutas e invertendo o papel agressor/vítima).

Por conseguinte, em face das circunstâncias supra enumeradas e forma como tudo ocorreu, entendemos que a conduta deste deverá ser sancionada, por um dos crimes de dano (relativamente ao frigorífico amolgado – facto 36, dado como provado), com uma pena de 2 meses de prisão, por outro dos crimes de dano (relativamente ao aparelho de vigilância electrónica estragado – factos 56 e 59, dados como provados), com uma pena de 6 meses de prisão, e, pelo terceiro dos crimes de dano (relativamente ao aparelho de vigilância electrónica totalmente inutilizado – factos 56, 57 e 58, dados como provados), com uma pena de 10 meses de prisão.

*

Finalizemos, com a pena a aplicar pelo crime de dano qualificado por que vimos dever ser condenado.

No caso em apreço, atendendo à factualidade provada, e prevendo o tipo legal do dano qualificado (artigo 213.º, n.º 1, al. a), do Código Penal), em alternativa, pena de multa e pena de prisão, atendendo à personalidade do arguido ao número de crimes e teor global dos factos por que irá condenado nestes autos, entendemos não se poder já aplicar a pena de multa, por não se mostrar ser suficiente e adequada para satisfazer as finalidades da punição.

Nessa conformidade, por força do disposto nos arts. 41.º, n.º 1, e 212.º, n.º 1, do Código Penal, a pena de prisão tem como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 5 anos.

No que concerne ao concreto tempo de privação da liberdade a impor ao arguido, importa ponderar, à luz dos critérios estabelecidos pelo art., 71.º, do Código Penal, que, quanto ao crime em apreço, são elevadas as necessidades de prevenção geral, derivadas do facto de a incriminação em causa ser das mais frequentes por todo o país.

Contudo, se, como já dissemos, são, cada vez mais, prementes as necessidades de prevenção geral em crimes deste tipo, também não deixa de ser verdade que a pena a aplicar concretamente há-de resultar das regras da prevenção especial, segundo as quais esta será o limite necessário à reintegração do arguido na sociedade, causando-lhe apenas e tão-só o mal necessário.

Assim, o limite aconselhado pela culpa e pela prevenção geral, deve ser temperado pela prevenção especial que, atendendo à idade e à ausência de antecedentes criminais, à motivação e contexto em que actuou, aconselha uma agravação média.

Atendendo aos critérios estabelecidos pelo art. 71.º, n.º 2, do Código, temos, em síntese, que a favor do arguido militam as seguintes circunstâncias:

– a admissão da conduta em causa;

– a condição socioeconómica e instrução de grau baixo;

– o contexto de dependência toxicológica em que actuou;

– a inexistência de antecedentes criminais.

Por seu turno, em desfavor deste, há que considerar o seguinte:

– a ilicitude de grau médio, actuando o arguido com extrema violência sobre os objectos da sua mãe que encontrou pelo caminho e para se vingar da mesma;

– o facto de o arguido ter actuado com dolo directo;

– a ausência de integração familiar, social e profissional;

– a total ausência de arrependimento (desresponsabilizando-se o arguido das suas condutas e invertendo o papel agressor/vítima).

Por conseguinte, em face das circunstâncias supra enumeradas e forma como tudo ocorreu, entendemos que a conduta deste deverá ser sancionada, pelo crime de dano qualificado, com uma pena de 2 anos e 8 meses de prisão».

*

II.4.2. Nos termos do artigo 40.º do Código Penal, que dispõe sobre as finalidades das penas, «a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade» e «em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa».

Estabelece o n.º 1 do artigo 71.º do Código Penal que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo o tribunal atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele.

A finalidade útil da pena assume-se numa função basicamente preventiva que se desdobra orientada para a comunidade – prevenção geral – e para o indivíduo – prevenção especial. “(…) só finalidades relativas de prevenção, geral e especial, não finalidades absolutas de retribuição e expiação, podem justificar a intervenção do sistema penal e conferir fundamento e sentido às suas reacções específicas. (...) Prevenção geral, porém, não como prevenção geral negativa, de intimidação do delinquente e de outros potenciais criminosos, mas como prevenção positiva ou de reintegração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida.” [1].

Culpa e prevenção são os dois termos do binómio com o auxílio do qual há-de ser construído o modelo da medida da pena em sentido estrito.

A prevenção geral não se reconduz somente ao efeito dissuasor que o anúncio da aplicação de uma pena exercerá sobre o potencial infractor no que se designa como prevenção geral negativa. Contém em si e principalmente uma mensagem de reafirmação e de consolidação da validade da lei penal como meio de «manter e reforçar a “confiança” da comunidade na validade e na vigência das suas normas de tutela de bens jurídicos e como instrumento por excelência destinado a revelar perante a comunidade a inquebrantibilidade da ordem jurídica»[2], na faceta de prevenção geral positiva sendo então, decerto, nas normas que, no sistema, tutelam bens que assumem expressão e valor superlativo, como a vida, que essa expectativa da comunidade na validade de tais normas, na restauração da paz jurídica, encontra o seu pleno sentido e a sua máxima expressão.

Já a vertente da prevenção especial reconduz-se ao objectivo de evitar a recidiva mediante a ressocialização ou reinserção social sem embargo de se lhe adicionar também, numa deriva mais securitária, o objectivo de intimidação individual e de inocuização.

E se é a prevenção geral positiva que fornece uma “moldura de prevenção” não pode escamotear-se – como bem se salienta no acórdão deste Supremo Tribunal de 30/05/2019, proc. 21/17.4JAFUN.L1.S1, 5ª Secção, relator: Nuno Gomes da Silva – «haver “dentro” dessa moldura de prevenção um efeito de prevenção geral negativa ou prevenção de intimidação que embora não constitua «por si mesma uma finalidade autónoma da pena pode surgir como um efeito lateral (porventura, em certos ou em muitos casos desejável) da necessidade de tutela dos bens jurídicos).

É ainda dentro da dita “moldura de prevenção” que «devem actuar, em toda a medida possível, pontos de vista de prevenção especial sendo assim eles que vão determinar, em última instância, a medida da pena.

É este, no essencial, o programa político-criminal que está vertido no art. 40º, nº 1 do C. Penal onde se determina que a aplicação de uma pena visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade conferindo a essa pena a natureza preventiva geral e especial».

Na determinação da medida da pena foram levados em conta os seguintes factores relevantes (artigo 71.º do Código Penal):

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- Quanto ao crime de ameaça agravada (artigos 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal), prevendo em alternativa, pena de multa e pena de prisão, entendeu, e bem, o tribunal recorrido que, atendendo à personalidade do arguido, ao número de crimes e teor global dos factos praticados nestes autos, não se poderá aplicar a pena de multa, por não se mostrar ser suficiente e adequada para satisfazer as finalidades da punição. Assim, por força do disposto nos arts. 41.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, a pena de prisão terá como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 2 anos.

Sendo elevadas as necessidades de prevenção geral, deverá, contudo, como bem salienta a decisão recorrida, a pena a aplicar concretamente resultar das regras da prevenção especial, segundo as quais esta será o limite necessário à reintegração do arguido na sociedade, causando-lhe apenas e tão-só o mal necessário. Assim, o limite aconselhado pela culpa e pela prevenção geral, deve ser temperado pela prevenção especial que, atendendo à idade e à ausência de antecedentes criminais, aconselha uma agravação médio/baixa.

Atendendo aos critérios estabelecidos pelo art. 71.º, n.º 2, do Código, temos, em síntese, a ilicitude dos factos, de grau médio; o dolo, que é directo; a ausência de integração familiar, social e profissional; a total ausência de arrependimento (desresponsabilizando-se o arguido das suas condutas e invertendo o papel agressor/vítima).

A favor do arguido milita a admissão das condutas em causa; a ausência de grandes consequências advindas da conduta do arguido em todas as suas actuações; a condição socioeconómica e instrução de grau baixo; o contexto de dependência toxicológica em que actuou e a inexistência de antecedentes criminais.

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- Quanto ao crime de ofensa à integridade física qualificada [artigo 145.º, n.ºs 1, al. a), e 2, do Código Penal, com referência ao art. 132.º, n.º 2, al. a), do Código Penal], o mesmo é punido com pena de prisão, prisão essa que tem como limite mínimo um mês de prisão e como máximo 4 anos de prisão (cfr. os arts. 41.º, n.º 1, e 145.º, n.º 1, al. a), do Código Penal).

Havendo que acautelar as necessidades de prevenção geral, por o crime em causa apresentar uma clara repercussão e alarme social, pondo em causa a tranquilidade e segurança variadíssimas vezes no círculo restrito familiar, também aqui, a pena a aplicar concretamente há-de resultar das regras da prevenção especial, segundo as quais esta será o limite necessário à reintegração do arguido na sociedade, causando-lhe apenas e tão-só o mal necessário.

Assim, o limite aconselhado pela culpa e pela prevenção geral, deve ser temperado pela prevenção especial que, in casu, atendendo à idade do arguido, à ausência de antecedentes criminais e não esquecendo o circunstancialismo em que tudo se processou, aconselha uma agravação médio/baixa.

A ilicitude dos factos apresenta-se de grau médio, atendendo ao tipo de agressão que perpetrou; o dolo é directo; releva a ausência de integração familiar, social e profissional e a total ausência de arrependimento (desresponsabilizando-se o arguido das suas condutas e invertendo o papel agressor/vítima).

A favor do arguido militam as seguintes circunstâncias: a admissão da conduta em causa; a ausência de grandes consequências advindas da conduta do arguido (ficando a avó magoada nas costelas); a condição socioeconómica e instrução de grau baixo; o contexto de dependência toxicológica em que actuou; a inexistência de antecedentes criminais.

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- Quanto a cada um dos crimes de dano (artigo 212.º, n.º 1, do Código Penal), como acima foi já referido, relativamente ao crime de ameaça agravada, prevendo em alternativa, pena de multa e pena de prisão, entendeu, e bem, o tribunal recorrido que, atendendo à personalidade do arguido e ao número de crimes e teor global dos factos praticados nestes autos, não se poderá aplicar a pena de multa, por não se mostrar ser suficiente e adequada para satisfazer as finalidades da punição. Assim, por força do disposto nos arts. 41.º, n.º 1, e 212.º, n.º 1, do Código Penal, a pena de prisão tem como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 3 anos.

Quanto ao crime em apreço, são elevadas as necessidades de prevenção geral, devendo, porém, a pena a aplicar concretamente, resultar das regras da prevenção especial, segundo as quais esta será o limite necessário à reintegração do arguido na sociedade, causando-lhe apenas e tão-só o mal necessário, pelo que o limite aconselhado pela culpa e pela prevenção geral, deve ser temperado pela prevenção especial que, atendendo à idade e à ausência de antecedentes criminais, aconselha uma agravação médio/baixa.

A ilicitude dos factos apresenta-se de grau médio, no caso do aparelho de vigilância electrónica totalmente inutilizado (factos 56, 57 e 58, dados como provados), e de baixa intensidade, em relação ao frigorífico amolgado (facto 36, dado como provado) e ao aparelho de vigilância electrónica reparado (factos 56 e 59, dados como provados); o dolo é directo; releva a ausência de integração familiar, social e profissional e a total ausência de arrependimento (desresponsabilizando-se o arguido das suas condutas e invertendo o papel agressor/vítima).

A favor do arguido militam as seguintes circunstâncias: a admissão das condutas em causa;  a condição socioeconómica e instrução de grau baixo; o contexto de dependência toxicológica em que actuou; a inexistência de antecedentes criminais.

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- Quanto ao crime de dano qualificado (artigo 213.º, n.º 1, al. a), do Código Penal), prevendo, também, em alternativa, pena de multa e pena de prisão, entendeu, e bem, o tribunal recorrido que, atendendo à personalidade do arguido e ao número de crimes e teor global dos factos praticados nestes autos, não se poderá aplicar a pena de multa, por não se mostrar ser suficiente e adequada para satisfazer as finalidades da punição. Nessa conformidade, por força do disposto nos arts. 41.º, n.º 1, e 212.º, n.º 1, do Código Penal, a pena de prisão tem como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 5 anos.

Sendo elevadas as necessidades de prevenção geral, deverá, contudo, como bem salienta a decisão recorrida, a pena a aplicar concretamente resultar das regras da prevenção especial, segundo as quais esta será o limite necessário à reintegração do arguido na sociedade, causando-lhe apenas e tão-só o mal necessário. Assim, o limite aconselhado pela culpa e pela prevenção geral, deve ser temperado pela prevenção especial que, atendendo à idade e à ausência de antecedentes criminais, aconselha uma agravação médio/baixa.

Atendendo aos critérios estabelecidos pelo art. 71.º, n.º 2, do Código, temos, em síntese, a ilicitude dos factos, de grau médio, actuando o arguido com extrema violência sobre os objectos da sua mãe que encontrou pelo caminho e para se vingar da mesma; o dolo que é directo; a ausência de integração familiar, social e profissional; a total ausência de arrependimento (desresponsabilizando-se o arguido das suas condutas e invertendo o papel agressor/vítima).

A favor do arguido milita a admissão das condutas em causa; a condição socioeconómica e instrução de grau baixo; o contexto de dependência toxicológica em que actuou; a inexistência de antecedentes criminais.

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II.4.3. Tendo em consideração todos estes parâmetros, bem como a moldura penal abstrata de cada um dos crimes (com o limite mínimo um mês de prisão e como máximo 4 anos de prisão, em relação ao crime de ofensa à integridade física qualificada; como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 2 anos de prisão, quanto ao crime de ameaça agravada; como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 3 anos de prisão, quanto a cada um dos crimes de dano; como limite mínimo 1 mês e como limite máximo 5 anos de prisão, relativamente ao crime de dano qualificado), o que se constata é que as penas singulares foram fixadas no patamar mínimo permitido pela culpa, nomeadamente a pena concreta fixada de 6 meses de prisão por cada um dos quinze crimes de ameaça agravada; 8 meses de prisão pelo crime de ofensa à integridade física qualificada; 2 meses de prisão, pelo crime de dano (relativamente ao frigorífico amolgado – facto 36, dado como provado), 6 meses de prisão por outro dos crimes de dano (relativamente ao aparelho de vigilância electrónica estragado – factos 56 e 59, dados como provados); 10 meses de prisão pelo terceiro dos crimes de dano (relativamente ao aparelho de vigilância electrónica totalmente inutilizado – factos 56, 57 e 58, dados como provados) e 2 anos e 8 meses de prisão, pelo crime de dano qualificado, se situam todas elas muito abaixo do respectivo limite abstracto médio, exceptuando a pena aplicada ao crime de dano qualificado que se mostra ligeiramente acima do respectivo limite abstracto médio, mostrando-se justas, correta e adequadamente fixadas, pois a sua redução, além de não ser justificada ao nível da prevenção especial mormente por qualquer circunstância com destaque ao nível da condição social do recorrente ou outra que pudesse ser tida como factor atenuativo, criaria relativamente a factos semelhantes uma aberrante ideia de impunidade.  

Pelo que se conclui pela improcedência da pretendida redução do quantum das penas parcelares aplicadas.

*

II.5. Quanto à apreciação da condenação numa pena única:

II.5.1. É entendimento do recorrente que o Tribunal deverá condenar o arguido numa pena mais harmoniosa, proporcional e justa, inferior a 5 anos, suspensa na sua execução, com medida de proibição de contactos com sua progenitora, irmãs e avó, por entender que desta forma se realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, a proteção dos bens jurídicos ofendidos e a reintegração do agente na Sociedade. Pugna pela revogação do Acórdão proferido e que o condenou na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão, efetiva na sua execução, por ser desproporcionada às finalidades da punição.

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II.5.2. Nos termos do artigo 77.º, n.º 1 do Código Penal, quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena, sendo nesta considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente (n.º 1).

A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas, não podendo, contudo, ultrapassar 25 anos, tratando-se de pena de prisão, e como limite mínimo, a mais elevada daquelas penas (n.º 2, artigo 77.º Código Penal).

No presente caso, o limite máximo da pena unitária a aplicar é de 12 anos e 4 meses de prisão (que resulta da soma das penas concretamente aplicadas, respectivamente de 6 meses de prisão, de 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, 6 meses de prisão, de 8 meses de prisão, de 2 meses de prisão, de 6 meses de prisão, de 10 meses de prisão e de 2 anos e 8 meses de prisão), e o limite mínimo é de 2 anos e 8 meses de prisão (a mais elevada das penas parcelares).

Estabelecida a moldura penal do concurso a medida da pena única deverá ser encontrada em função das exigências gerais de culpa e prevenção, tendo em especial consideração os factos no seu conjunto e a personalidade do agente – Cfr., J. Figueiredo Dias, Direito Penal Português — As consequências Jurídicas do Crime, Lisboa: Aequitas/Ed. Notícias, 1993, § 421, p. 290 a 292).

Conforme ensina o citado Professor, “Tudo deve passar-se, por conseguinte, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é recondutível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)”.

Na concretização da regra estabelecida no nº 1 in fine, do artigo 77.º do Código Penal, de acordo com o qual na medida da pena - no que à punição do concurso concerne - são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, tem sido pacífico, designadamente ao nível da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, que essencial «na formação da pena conjunta é a visão de conjunto, a eventual conexão dos factos entre si e a relação desse bocado de vida criminosa com a personalidade, de tal forma que a pena conjunta deve formar-se mediante uma valoração completa da pessoa do autor e das diversas penas parcelares»[3], o que, contudo, não dispensa o recurso às exigências de prevenção geral e especial, encontrando, também, a pena conjunta o seu limite na medida da culpa.

*

II.5.3. Pese embora alguns dos crimes não sejam especialmente graves, deverá ser considerado o conjunto factual na sua globalidade (de modo a descortinar as possíveis conexões entre eles), bem como a personalidade do arguido, a fim de se avaliar criticamente a pena única que lhe foi atribuída.

Será no âmbito daquela moldura penal e de acordo com a personalidade do agente, procedendo a uma análise global dos factos e tendo em conta as exigências de prevenção geral e especial, que deverá ser determinada a pena única conjunta a aplicar ao arguido.

Na avaliação da personalidade, ter-se-á que verificar se dos factos praticados pelo agente decorre uma certa tendência para o crime ou se estamos apenas perante uma pluriocasionalidade, sem possibilidade de recondução a uma personalidade fundamentadora de uma "carreira" criminosa. Apenas quando se possa concluir que se revela uma tendência para o crime, quando analisados globalmente os factos, é que estamos perante um caso onde se suscita a necessidade de aplicação de um efeito agravante dentro da moldura do concurso. Para além disto, e sabendo que também influem na determinação da pena conjunta as exigências de prevenção especial, dever-se-á atender ao efeito que a pena terá sobre o delinquente e em que medida irá ou não facilitar a necessária reintegração do agente na sociedade.
Analisando a decisão sob recurso no que respeita à justificação dada para a referida pena única aplicada ao arguido/recorrente, verificamos que os factos provados pelo tribunal recorrido encontram-se concatenados e intimamente relacionados progredindo do ano de 2015/16 (quando começam), até ao dia 21 de outubro de 2020 (factos provados nos pontos 12 a 44), num escalar de violência inusitado contra as ofendidas/ familiares, que só termina com a prisão preventiva do recorrente.

O recorrente revela uma personalidade com relativa propensão para a prática de crimes contra o património e contra a família, à qual não repugna o uso da violência para levar a cabo os seus intentos. Concretamente, no dia 21de outubro de 2020, o recorrente, por mera vingança (facto provado em 44), munido de um escopo e de um martelo de ferro (ponto provado em 45), destruiu a quase totalidade do património da sua progenitora - casa, recheio e carro - numa onda de destruição absolutamente gratuita (factos provados de 44 a 59).

Como bem salienta a decisão recorrida: «(…) No presente caso em apreço em termos da gravidade da ilicitude global constata-se que os crimes que integram o concurso são crimes essencialmente relacionados entre si, ligados à vivência familiar do arguido e cometidos num sequencial e prolongado espaço temporal, e que, olhando à idade do arguido e apesar da ausência de antecedentes criminais, são claros indicadores de uma personalidade que, de muito jovem, é voltada para a prática de crimes desde logo no seio familiar e sem respeito por este núcleo, personalidade que, actualmente, atendendo à ausência de grandes indicadores de mudança (até pela postura de desresponsabilização assumida) e após período de prisão preventiva, não revela ainda indicadores de poder sofrer uma inversão no sentido da aceitação progressiva das regras de comportamento social e afastamento futuro da criminalidade».
Os factos praticados são expressivos de uma atitude de desconsideração e indiferença pelo respeito de valores bem essenciais da comunidade.
Quanto à personalidade do arguido, já se apresentam sintomas atinentes a uma tendência criminosa, ao praticar os factos descritos ao longo período de tempo de 2015 a 2020, revelando total desprezo em relação às suas vítimas – a quem responsabiliza pela sua conduta, deixando nas mesmas sequelas físicas e sobretudo psíquicas, vivendo ao longo dos anos num constante receio de serem agredidas – com total falta de arrependimento, mantendo o seu discurso de desresponsabilização e/ou vitimização, com reduzida capacidade de lidar com a frustração e um défice na resolução de problemas, a revelar forte propensão para a reiteração da actividade criminosa com especial incidência na prática de crimes contra a propriedade e contra as pessoas.

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II.5.4. Assim, tudo ponderado, tendo presente a gravidade dos crimes, no que tange ao concreto contexto em que os factos foram praticados, que fornecem a imagem global de uma atitude significativamente desconforme ao direito, a demonstrar a clara incapacidade do arguido em interiorizar a ilicitude da sua conduta, demonstrada pela falta de arrependimento, da culpabilização apontada à família pela prática dos seus actos, e tendo ainda presente a moldura penal abstracta a considerar para a fixação da pena única, a qual se baliza entre os 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão, correspondente à mais elevada das penas parcelares aplicadas, e os 12 (doze) anos e 4 (quatro) meses de prisão, consideramos perfeitamente adequada, ajustada e equilibrada a pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão que o tribunal a quo tinha fixado, que assim será mantida.

Fixada em 5 anos e 6 meses de prisão a pena concreta do concurso, nos termos expostos, excluída se mostra a aplicabilidade de pena de substituição, designadamente a suspensão da sua execução, nos termos do art. 50º nº 1 do C.P

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III - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 5 UC`s.

 

Lisboa, 9 de junho de 2022

Cid Geraldo (Relator)

Leonor Furtado

Eduardo Loureiro 


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[1] Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português, Parte geral II, As consequências jurídicas do crime, Editorial Noticias, 1993, p.72.
[2] Cfr Figueiredo Dias, ob. cit. pag. 51.
[3] Cf. Ac. STJ de 05.07.2012, Proc. n.º 145/06.SPBBRG.S1.