Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
90/16.4GAVVC-A.E1.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO
Relator: PAULO FERREIRA DA CUNHA
Descritores: ARGUIÇÃO DE NULIDADES
ACORDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
INCONSTITUCIONALIDADE
PODERES DE COGNIÇÃO
INDEFERIMENTO
TAXA SANCIONATÓRIA EXCECIONAL
Data do Acordão: 12/15/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: ACALARAÇÃO INDEFERIDA
Sumário :
I - O arguido veio invocar a nulidade do acórdão que decidira rejeitar o recurso que havia interposto, por alegada omissão de pronúncia, invocando os art. 379.º, n.º 1, al. c) e 379.º, n.º 2, ambos do CPP. Considerou sobretudo que a decisão proferida não se pronunciaria sobre as questões suscitadas, nomeadamente no tocante à questão da constitucionalidade.

II - Com efeito, ocorre que o acórdão sub judice não apreciou o mérito da causa, rejeitando o recurso por inadmissbilidade legal. Pelo que é por natureza e logicamente insuscetível de ser arguida uma omissão de pronúncia num caso em que, por definição, não havia o tribunal de pronunciar-se.

III - Na sua arguição de pretensa nulidade, o arguido não enuncia concretamente nenhuma questão que haja ficado sem resposta, salvo a alusão que faz à de uma alegada inconstitucionalidade. A qual, evidentemente, teria (a admitir-se) que passar pelo crivo dos respetivos requisitos, e não se satisfaz com a mera invocação – mas disso não se curou no acórdão em apreço, nem se cura agora.  Com as razões então aduzidas, que se reiteram.

IV - O acórdão em causa considerou bastante, sobre o problema, além da subsunção legal, especialmente invocar jurisprudência recente sobre o tema, proferida até nesta mesma secção do STJ. Era e é ela absolutamente cristalina e cabalmente resolve a questão em apreço. Cf. o acórdão deste STJ, de 05-05-2021, proferido no processo n.º 64/19.3T9EVR.S1. E1.S1, para que se remete.

V - No plano de uma questão em abstrato do maior relevo (mas que para o caso não releva), refira-se que não se curou da questão constitucional de caso pensado e expressamente explicitado, por se considerar que esse tipo de questões acompanha todas as demais que não podem ser suscitadas in casu. Insistindo no aresto citado: a verificada “Irrecorribilidade (…) é extensiva a todas as questões relativas à actividade decisória, sejam elas de constitucionalidade, substantivas ou processuais, referentes à matéria de facto ou à aplicação do direito.” (sublinhado nosso).

VI - No acórdão sub judice é fundamentada, de forma absolutamente completa e compreensível (e a concisão para tal ainda mais contribui) a decisão tomada, não havendo qualquer omissão de pronúncia.

VII - A presente diligência parece ser uma nova manifestação da não conformação do arguido com a decisão condenatória. Porém, é óbvio que tal discordância jamais se poderá confundir com a omissão de pronúncia ou qualquer falta de fundamentação, não sendo curial revisitar as questões anteriormente invocadas, já decididas e consabidamente irrecorríveis, tentando criar um novo grau de jurisdição, sob a alegação de invocação de omissão de pronúncia.

VIII - O acórdão em apreço apreciou cabalmente todas as questões que lhe foram invocadas, não padecendo de qualquer nulidade, designadamente por “omissão de pronúncia”, nem sobre constitucionalidade, nem sobre qualquer outra, pelo que se julga absolutamente improcedente a reclamação apresentada.

IX - Promove fundamentadamente o Ministério Público que haja lugar à taxa sancionatória excecional, o que foi contrariado pelo recorrente.

Tendo presente a jurisprudência deste STJ, nomeadamente o acórdão de 09-05-2019, proferido no processo n.º 565/12.4TATVR-C.E1-A.S1 e o acórdão de 20-05-2021, proferido no processo n.º  1573/17.4T9CSC.L1.S1, resulta que neste requerimento se justifica a aplicação da referida taxa sancionatória, não se tratando de “defesa enérgica e exaustiva”, que seria obviamente de pleno admissível, mas de uma irresignação sem qualquer base (esgrimindo inexistente “omissão de pronúncia”), manifestamente infundada, que assim se pode considerar imprudente e votada plausivelmente ao insucesso.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça




I
Relatório



1. AA, com os respetivos sinais constantes dos autos, veio arguir a nulidade do Acórdão que decidira rejeitar o recurso que havia interposto por alegada omissão de pronúncia, invocando os artigos 379, n.º 1 alínea c) e 379, n.º 2, ambos do CPP.


2. Considera sobretudo que a decisão proferida não se pronuncia quanto às questões suscitadas, nomeadamente, relativamente à questão da constitucionalidade, alegando o Recorrente que que não teceria ela qualquer consideração relativamente à mesma. Entendendo, assim, que o Acórdão “padece de um vício gravíssimo que acarreta a nulidade do mesmo - o VÍCIO DE OMISSÃO DE PRONÚNCIA, porquanto não se pronunciou sobre questões primordiais que devia apreciar!”


3. O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal de Justiça elaborou douto e incisivo parecer, nos termos que a seguir se transcrevem:

“Arguição de nulidade, que antecede:

O acórdão nos autos proferido, não padece de qualquer omissão de pronúncia. Os fundamentos de não tido lugar a apreciação da decantada inconstitucionalidade, estão expressis verbis plasmados na decisão, transcrevendo-se nela o sumário do acórdão do STJ de 05-05-2020, tirado no processo 64/ 19. 3T9EVR.S1. E1.S1-3ª Secção, relator Nuno Gonçalves, de resto citado no nosso parecer, em cujo ponto V se pode ler:

V - Irrecorribilidade que é extensiva a todas as questões relativas à actividade decisória, sejam elas de constitucionalidade,1 substantivas ou processuais, referentes à matéria de facto ou à aplicação do direito.

Tal linha jurisprudencial é perfilhada nemine discrepante pelo Supremo Tribunal de Justiça.

A fundamentação, da não apreciação da alegada inconstitucionalidade, que, de resto, a leitura da jurisprudência do Tribunal Constitucional em matéria de garantia do direito ao recurso não consente ou autoriza, está assim plasmada no acórdão em termos claros, que permitem mais uma vez e agora com insofismável clareza, verificar que o arguido pratica actos processuais, com intuitos meramente dilatórios e abusivos em ordem a atrasar o cumprimento do julgado.

Entende-se assim, ser caso além do mais, ser condenado no pagamento de taxa sancionatória excepcional, nos termos dos artigos 521º, n º 1 do Código de Processo Penal e 531º do Código de Processo Civil.”


4. Depois da vista o Ministério Público, foi exercido o contraditório, tendo o Recorrente respondido o seguinte:

“O arguido ora Recorrente, foi nos presentes autos condenado numa pena de 15 (quinze) meses de prisão, suspensa na sua execução, sujeita a regime de prova, pela prática de um crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro – fls. 176 e 179. 

Contudo, o Acórdão proferido não se pronuncia verdadeiramente, relativamente, à eventual substituíção da pena por trabalho a favor da comunidade, ou o cumprimento da mesma em regime de permanência na habitação, bem como, quanto à concreta medida da pena de multa aplicada à arguida.

O que o Acórdão faz, na boa verdade, é apenas e só mencionar que a pena de prisão efetiva se mostra adequada.

Nada mais! Assim, e salvo melhor opinião, o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de ..., padece de um vício gravíssimo que acarreta a nulidade do mesmo – o VÍCIO DE OMISSÃO DE PRONÚNCIA E FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO, porquanto não se pronunciou sobre questão primordial que devia apreciar!

E não se diga, que a Decisão proferida pelo Tribunal da Relação de ..., não é susceptível de recurso.

Pois o acórdão é recorrível para o Supremo Tribunal de Justiça, tanto assim o é que o mesmo foi admitido pelo TR....

Não admitir o presente recurso, constituiria inconstitucionalidade, por ir contra o princípio

fundamental da recorribilidade em pelo menos um grau das decisões judiciais limitadoras da liberdade contido no art.º 32º da CRP. - INCONSTITUCIONALIDADE QUE DESDE JÁ SE ALEGA E REQUER PARA OS DEVIDOS EFEITOS LEGAIS.

Por outro lado, mesmo que fosse identificada uma norma travão, tratar-se-ia, in casu, de norma inconstitucional, porque infractora do princípio fundamental da recorribilidade em um grau.

Em primeiro lugar, o caso não cabe em nenhuma irrecorribilidade.

Com efeito, o tema dissidente teve apenas uma e só uma abordagem jurisdicional: é por assim dizer uma decisão da Relação, mas em primeira instância.

E todas as decisões penais de primeira instância são recorríveis.

O problema, a arguida nulidade, de omissão de pronúncia, foi na verdade, arguida perante o tribunal de Segunda Instância o Tribunal da Relação de ..., que sobre ele se debruçou pela primeira e única vez.

Logo tem de haver lugar a recurso, pelo menos a um grau de recurso.

Mas se for entendido que, pelo contrário, se trata apenas da mesma questão sob a regulamentação diferente, então o recurso justifica-se pela intolerabilidade em abstracto do erro palmar de direito.

Em processo penal como é o caso dos autos, que é o direito mais directamente ligado às liberdades e garantias constitucionais, um erro deste tipo corresponde afinal à contra aplicação directa de uma norma fundamental.

Assim, em confronto directo com o artigo 18º nº 1 da Constituição da República Portuguesa.

E deste modo onde não é proporcional a conversão de direito ao recurso, tal como a proíbe o artigo 18º nº 3 do mesmo diploma legal.

O acórdão proferido em 11 de Maio de 2021, à semelhança do Acórdão anteriormente proferido, padece de a nulidade.

Face ao supra exposto, e sem necessidade de mais considerandos, deve o Douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de ... em 11 de Maio de 2021, ser revogado e substituído por outro que deve declarar o Acórdão proferido naquela mesma data, NULO, com todas as consequências legais que daí advenham.

O recorrente não pretende protelar ou atrasar o que quer que seja, mas sim que seja feita justiça.

A interposição do presente recurso, trata-se do exercício de um direito constitucionalmente garantido.

Pelo que não deve haver lugar a qualquer condenação em taxa sancionatória.”


Efetuado o exame preliminar, remeteu-se o processo a vistos legais e de seguida à Conferência, de acordo com o disposto no art. 419 do CPP.




II

Do Acórdão em Apreço



Sem prejuízo da integralidade do Acórdão em apreço, que obviamente se tem presente, ressalte-se a respetiva Fundamentação:


“1. É consensual que, sem prejuízo do conhecimento oficioso de certas questões legalmente determinadas – arts. 379, n.º 2 e 410, n.º 2 e 3 do CPP – é pelas Conclusões apresentadas em recurso que se recorta ou delimita o âmbito ou objeto do mesmo (cf., v.g., art. 412, n.º 1, CPP; v. BMJ 473, p. 316; jurisprudência do STJ apud Ac. RC de 21/1/2009, Proc. 45/05.4TAFIG.C2, Relator: Conselheiro Gabriel Catarino; Acs. STJ de 25/3/2009, Proc. 09P0486, Relator: Conselheiro Fernando Fróis; de 23/11/2010, Proc. 93/10.2TCPRT.S1, Relator: Conselheiro Raul Borges; de 28/4/2016, Proc. 252/14.9JACBR., Relator: Conselheiro Manuel Augusto de Matos).


2. Embora este recurso, interposto em 27 de maio de 2021 para este Supremo Tribunal de Justiça, haja sido admitido, tal não vincula este Tribunal (art. 414, n.º 3 CPP).


3. A pena atribuída não é inovadora, antes confirma a da 1.ª Instância, e o quantum da pena é de 15 meses de prisão, pela comissão de um crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal. Tal significa que o presente recurso não é admissível, nos termos do art. 400, n º 1, alínea e) in fine:

“1 - Não é admissível recurso: (…)

e) De acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações que apliquem pena não privativa de liberdade ou pena de prisão não superior a 5 anos;”


4. Afigura-se-nos muito pertinente a síntese jurisprudencial (omitindo-se agora, por imposição legal, a questão da alegada omissão de pronúncia) do relativamente recente Acórdão deste STJ, de 05-05-2021, proferido no Proc.º n.º 64/ 19. 3T9EVR.S1. E1.S1- (Relator: Conselheiro Nuno Gonçalves):

“IV - Não é recorrível para o STJ o acórdão da relação que, confirmando a condenação em 1ª instância, aplica pena não superior a 5 anos de prisão.

V - Irrecorribilidade que é extensiva a todas as questões relativas à actividade decisória, sejam elas de constitucionalidade, substantivas ou processuais, referentes à matéria de facto ou à aplicação do direito.”

Nesta perspetiva, que perfilhamos, fica prejudicado liminarmente o conhecimento das questões de omissão de pronúncia, fundamentação, e até de constitucionalidade. Ao menos na presente sede.”




III

Fundamentação



1. Seremos, naturalmente, sintéticos. A tanto obriga, aliás, a natureza da questão, que é simples e claríssima, tanto quanto possa haver casos claros (clear cases).


2. O Acórdão sub judice não apreciou o mérito da causa, rejeitando o recurso por inadmissibilidade legal. Pelo que é por natureza e logicamente insuscetível de ser arguida uma omissão de pronúncia num caso em que, por definição, não havia o Tribunal de pronunciar-se.


3. Por aqui poderíamos ficar. Contudo, sempre se dirá, ainda, para mais clareza (e plena lisura processual):

Na sua arguição de nulidade, o arguido não enuncia concretamente nenhuma questão que haja ficado sem resposta, salvo a alusão que faz à de uma pretensa inconstitucionalidade. A qual, evidentemente (diga-se, eventualmente, em obter dictum), teria (a admitir-se) que passar pelo crivo dos respetivos requisitos, e não se satisfaz com a mera invocação – mas disso não se curou, nem se curará.  Com as razões então aduzidas, que se reiteram.


4. Como foi com rigor advertido pelo Parecer do Ex.mo Procurador-Geral Adjunto e se crê que ser a única leitura razoável do respetivo texto, o Acórdão em causa considerou bastante, sobre o problema, além da subsunção legal, especialmente invocar jurisprudência recente, proferida nesta mesma secção, sobre o tema. Era e é ela absolutamente cristalina e cabalmente resolve a questão em apreço. Cf. o Acórdão deste STJ, de 05-05-2021, proferido no Proc.º n.º 64/19.3T9EVR.S1. E1.S1- (Relator: Conselheiro Nuno Gonçalves), que seria ocioso citar novamente nos pontos IV e V, recordando-se apenas, ex novo, os iniciais:

           

“I - A sentença ou acórdão devem ser esgotantes e autossuficientes, no sentido de conhecer da totalidade das pretensões e de conter todos os elementos indispensáveis à compreensão do juízo decisório.

II -  Omissão de pronúncia significa ausência de conhecimento ou de decisão do tribunal sobre matérias que a lei impõe que o juiz resolva.

III - Ocorre quando o tribunal deixa de apreciar e julgar questões de facto e/ou de direito que lhe foram submetidas pelos sujeitos processuais ou que deve conhecer oficiosamente, entendendo-se por questões os problemas concretos e não argumentos mais ou menos hipotéticos, opinativos ou doutrinários.”


5. Seria ocioso, entraria necessariamente por “pedantes subtilezas”, como lhes chama Santi Romano, e contrariaria o princípio da economia processual, alongar-se este Supremo Tribunal em razões que seriam minudências ou excursos (contrárias ao princípio de minimis…). E pior: que pela natureza da questão não podem ser conhecidas.

Com efeito, não se curou da questão constitucional de caso pensado e expressamente explicitado, por se considerar que esse tipo de questões acompanha todas as demais que não podem ser suscitadas in casu. Insistindo no aresto já várias vezes citado, a verificada “Irrecorribilidade (…) é extensiva a todas as questões relativas à actividade decisória, sejam elas de constitucionalidade, substantivas ou processuais, referentes à matéria de facto ou à aplicação do direito.” (sublinhado nosso).

6. No acórdão sub judice é fundamentada, de forma absolutamente completa e compreensível (e a concisão para tal ainda mais contribui) a decisão tomada, não havendo qualquer omissão de pronúncia.

A presente diligência parece ser uma nova manifestação da não conformação do arguido com a decisão condenatória. Porém, é óbvio que tal discordância jamais se poderá confundir com a omissão de pronúncia ou qualquer falta de fundamentação, não sendo curial revisitar as questões anteriormente invocadas, já decididas e consabidamente irrecorríveis, tentando criar um novo grau de jurisdição, sob a alegação de invocação de omissão de pronúncia.

Tem-se presente, além do mais, o lúcido Parecer do Ex.mo Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal de Justiça, designadamente neste decisivo segmento ponderador:

“A fundamentação, da não apreciação da alegada inconstitucionalidade, que, de resto, a leitura da jurisprudência do Tribunal Constitucional em matéria de garantia do direito ao recurso não consente ou autoriza, está assim plasmada no acórdão em termos claros, que permitem mais uma vez e agora com insofismável clareza, verificar que o arguido pratica actos processuais, com intuitos meramente dilatórios e abusivos em ordem a atrasar o cumprimento do julgado.” (sublinhado nosso).


7. O acórdão em apreço apreciou cabalmente todas as questões que lhe foram invocadas, não padecendo de qualquer nulidade, designadamente por “omissão de pronúncia”, nem sobre constitucionalidade nem sobre qualquer outra, pelo que se julga absolutamente improcedente a reclamação apresentada.


8. Promove o Ministério Público, na sequência do trecho citado supra, sub 5 in fine, que haja lugar à taxa sancionatória excecional:

“Entende-se assim, ser caso além do mais, ser condenado no pagamento de taxa sancionatória excepcional, nos termos dos artigos 521º, n º 1 do Código de Processo Penal e 531º do Código de Processo Civil.”

Como é judiciosamente recortado no Acórdão deste STJ de Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09-05-2019, proferido no Proc.º n.º 565/12.4TATVR-C.E1-A.S1 (Relatora: Conselheira Conceição Gomes):

“I - Constituem pressupostos da aplicação da taxa sancionatória excepcional, prevista no art. 521.º, do CPP, a natureza manifestamente improcedente do requerimento, recurso, reclamação ou incidente, visando-se evitar a prática de actos inúteis, impedindo que o tribunal se debruce sobre questões que se sabe de antemão serem insusceptíveis de conduzir ao resultado pretendido, assim se salvaguardando o princípio da economia processual, e a actuação imprudente, desprovida da diligência, no caso exigível, e como tal censurável, da parte de quem os formula/apresenta.

II - Com a taxa sancionatória excepcional não se pretende responder/sancionar erros técnicos, pois estes sempre foram punidos através do pagamento de custas; procura-se, isso sim, reagir contra uma atitude claramente abusiva do processo, sancionando o sujeito que intencionalmente o perverte.

III - Não contendo o CPP norma expressa relativa à má-fé, encontrando-se o recurso ao CPC, perante a desarmonia de princípios neste particular, não havendo fundamento para sustentar o entendimento de que há lacuna (art. 4.º, do CPP), considerando o estatuto do arguido, não lhe pode ser aplicável o instituto da litigância de má-fé, o legislador no DL 34/2008, de 26-02, criou uma taxa sancionatória especial, com carácter penalizados, para os intervenientes processuais que, por motivos dilatórios, “bloqueiam” os tribunais com recursos e requerimentos manifestamente infundados.”

É ainda de ponderar, em coordenação com esta jurisprudência, a estabelecida recentemente pelo Acórdão também deste STJ, em 20-05-2021, proferido no Proc.º n.º  1573/17.4T9CSC.L1.S1 (Relator: Conselheiro Eduardo Loureiro):

“(…) II - A taxa sancionatória excepcional em processo penal vem prevista no art. 521.º do CPP, que se limita, quanto aos sujeitos processuais, a remeter para o art. 531.º do CPC. Não tem natureza tributária, mas sim sancionatória, o que significa que ela se destina a punir uma conduta processual reprovável.

III - A lei fornece um critério muito lato ou flexível para a caracterização dos actos susceptíveis desta sanção: a manifesta improcedência; e, cumulativamente, ainda a falta de prudência ou diligência devidas. E acentua no texto do artigo, como também na epígrafe, o carácter excepcional da sanção, que funciona como elemento integrante da própria cominação.

IV - O que significa, em síntese, que esta taxa poderá/deverá ser aplicada só quando o acto processual praticado pela parte seja manifestamente infundado, tendo ainda a parte revelado nessa prática falta de prudência ou de diligência, a que estava obrigada, assumindo o acto um carácter excepcionalmente reprovável, por constituir um desvio acentuado e injustificado à tramitação regular e adequada do processo. Tipicamente cabe nessa previsão a utilização de meios não previstos na lei ou a sua utilização abusiva para dificultar a marcha do processo, ou seja, a prática de actos meramente dilatórios completamente infundados.

V - O uso da faculdade prevista no art. 531.º, do CPC no processo penal deve ser objecto de especial rigor, para não ser posto em causa o direito das partes a usufruir plenamente dos seus direitos de defesa ou de patrocínio dos seus interesses processuais. Ou seja, não se deve confundir a defesa enérgica e exaustiva desses interesses com o seu uso desviante e perverso. Só neste caso se justificará o sancionamento nos termos do citado art. 531.º do CPC.”

Da coordenação de ambas as abordagens aos fundamentos do referido instituto aplicada ao caso, resulta que neste requerimento se justifica a aplicação da referida taxa sancionatória, não se tratando de “defesa enérgica e exaustiva”, que seria obviamente de pleno admissível, mas de uma irresignação sem qualquer base (esgrimindo inexistente omissão de pronúncia), manifestamente infundada, que assim se poder considerar imprudente e votada plausivelmente ao insucesso, confluindo com o apreciado, nos termos que se referiram já, na aludida Promoção, que sublinha ainda razões dilatórias.




IV

Dispositivo



Termos em que, decidindo em conferência, na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça se acorda em indeferir a arguida nulidade.

Custas pelo Recorrente.

 Taxa de Justiça: 7 UCs

Condena-se o reclamante na taxa sancionatória excecional, nos termos dos artigos 521, n º 1 do Código de Processo Penal e 531 do Código de Processo Civil, no montante de 3 UC.


Supremo Tribunal de Justiça, 15 de dezembro de 2021


Dr. Paulo Ferreira da Cunha (Relator)

Dr.ª Maria Teresa Féria de Almeida (Juíza Conselheira Adjunta)