Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1000/19.2PRPRT-H.P1.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO
Relator: PAULO FERREIRA DA CUNHA
Descritores: PERDA DE BENS A FAVOR DO ESTADO
PODERES DE COGNIÇÃO
CONFIRMAÇÃO IN MELLIUS
DUPLA CONFORME
REJEIÇÃO DE RECURSO
Apenso:
Data do Acordão: 12/15/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMETO
Sumário :
I - Emerge uma questão prejudicial e liminar, de que depende a sorte da lide. É questão processual prévia, remetendo para os poderes de cognição do STJ: é ou não admissível a questão submetida, na presente sede de recurso? Uma mera exegese literal nos levaria logo a subsumir o caso na al. f) do n.º 1 do art. 400.º do CPP. Na raiz do problema há uma confirmação do acórdão recorrido por parte do tribunal da relação, na modalidade de reformatio in mellius. Cf. acórdão deste STJ de 14-03-2018, proferido no processo n.º 22/08.3JALRA.E1.S1.

II - Tratando-se de questão a apreciar liminarmente, será, no caso, apreciação da inadmissibilidade com base na ocorrência de dupla conformidade. E ocorre, no caso, dupla conformidade, pela “melhoria da situação processual do condenado” (cf., v.g., acórdão deste STJ proferido no processo n.º 1042/07.0PAVNG.P1.S1, de 11-04-2012).

III - Nenhuma objeção de índole constitucional se pode vislumbrar como procedendo contra este entendimento (que em nada contende com os direitos e garantias constitucionais relativos ao recurso – designadamente o art. 32.º, n.º 1, da CRP), como aliás decorre de múltipla jurisprudência que refletiu e resolveu de forma cabal e definitiva, no atual estado legislativo-constitucional.

IV - Além de que o recurso com dignidade constitucional parece remeter para questões precisamente de algum vulto e dimensão e, de resto, remete explicitamente para o processo penal. Atente-se, apenas, na letra do respetivo texto constitucional (art. 32.º, n.º 1, da CRP). É o penal (ou criminal) que assegura todas as garantias penais constitucionalmente acolhidas. É ele, pois, o protagonista dessa defesa, tutelada pelo pano de fundo da “cabeça de capítulo” (Pellegrino Rossi) da norma constitucional. Nele se deve antes de mais buscar a solução, tendo em atenção o enquadramento constitucional, que não parece suscitar neste caso quaisquer dúvidas. Cf., por todos, o já citado acórdão deste STJ de 14-03-2018, proferido no processo n.º 22/08.3JALRA.E1.S1 S1 (máx. sumário, 2), assim como vários acórdãos deste STJ, v.g. de 08-01-2014, processo n.º 124/10.6JBLSB.E1.S1, de 26-06-2014, processo n.º 160/11.5JAPRT.C1.S1 e de 10-09-2014, processo n.º 223/10.4SMPRT.P1.S1.

V - Na medida em que o acórdão raiz de toda a questão opera uma reformatio in mellius face ao previamente proferido, verifica-se uma situação de dupla conformidade, caindo sob a previsão da al. f) do n.º 1 do art. 400.º do CPP, que necessariamente torna inadmissível o conhecimento do recurso sobre tal acórdão. Mas alargando a impossibilidade a todas as questões conexas, e, obviamente, à suscitada pelo recorrente, no caso vertente (cf. sumário, 5, do acórdão do STJ de 14-03-2018, proferido no processo n.º 22/08.3JALRA.E1.S1).

VI - Assim, estando, por razões de competência, o STJ impedido de conhecer do recurso interposto de uma decisão, encontra-se do mesmo modo impedido de conhecer de todas as questões processuais ou de substância que digam respeito a essa decisão. Estão também excluídos da apreciação vícios da decisão indicados no art. 410.º do CPP, respetivas nulidades (art. 379.º e 425.º, n.º 4) e aspetos relacionadas com o julgamento dos crimes que constituem o seu objeto, aí se incluindo apreciação da prova, qualificação jurídica dos factos e determinação da pena, inter alia.

VII - Sintetizando: não cabe (nem é legalmente possível), perante o contexto de inadmissibilidade de recurso, curar de quaisquer questões emergentes ou que lhe estejam subjacentes, sejam elas substantivas, processuais, ou de constitucionalidade.

VIII - Dada a impossibilidade legal de receber o recurso, fica in limine prejudicada, como óbvio se torna, qualquer apreciação de fundo. Termos em que se acorda em rejeitar recurso, conforme o art. 420.º, n.º 1, al. b), do CPP, tendo presentes as disposições conjugadas do art. 400.º, n.º 1, al. f), do art. 432.º, n.º 1, al. b), e do art. 414.º, n.º 3, todos igualmente do CPP.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça





I
Relatório



 1. AA, com os respetivos sinais identificativos nos autos, por Acórdão proferido a 25/05/2020, foi condenado em cúmulo jurídico a pena única de oito anos de prisão.

2. Inconformado com a decisão, a 19/06/2020 interporia Recurso para o Tribunal da Relação do ..., o qual veio a conceder parcial provimento ao recurso, reduzindo a pena única do concurso aplicada ao arguido a seis anos e oito meses de prisão, mas mantendo no demais, o Acórdão recorrido.

3. Na sequência do referido Acórdão, no juízo Central Criminal do Tribunal Judicial da Comarca ..., em processo comum e para julgamento perante Tribunal Coletivo, a Meritíssima Juíza titular do processo proferiu decisão indeferindo o pedido do Ministério Público de declaração de perdimento a favor do Estado do veículo automóvel marca ..., modelo ..., matriculado com o n.º ..-RB-.. e que, no deferimento do pedido do arguido, determinou que tal veículo lhe fosse entregue.


4. O Ministério Público no respetivo Tribunal recorreu.


5. O sentido do Acórdão que dirimiria a questão, datado de 23 de junho de 2021, foi pela procedência do recurso do Ministério Público, determinando, nos termos do art. 109 n.º 1 do CP, a perda da favor do Estado do veículo automóvel marca ..., modelo ..., matriculado com o n.º ..-RB-...


6. Vem agora o arguido interpor recurso do dito Acórdão do Tribunal da Relação do ....


7. Interpretam-se e aceitam-se, por economia e celeridade processual, como sendo as seguintes as Conclusões da sua motivação das alegações de recurso (pelo sentido e intencionalidade do seu conteúdo, localização do texto na estrutura da motivação e similitude da apresentação gráfica com as Conclusões do Recorrente (expressamente assim qualificadas) na sua resposta ao Ministério Público (conforme, aliás, transcrição do Acórdão recorrido):

“I. O PRESENTE RECURSO, VEM INTERPOSTO NOS TERMOS DO ARTº 432 DO CP, CONSEQUÊNCIA DO ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO ..., QUE REVOGOU O DESPACHO EMANADO PELO TRIBUNAL DE 1ª INSTANCIA E DECLAROU O VEÍCULO AUTOMOVEL APREENDIDO NOS PRESENTES AUTOS PERDIDO A FAVOR DO ESTADO.

II. POR ACÓRDÃO DECRETADO A 25/05/2020, FOI O ARGUIDO CONDENADO EM CÚMULO JURÍDICO A PENA ÚNICA DE OITO ANOS DE PRISÃO, TENDO RECORRIDO PARA O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO ... QUE VEIO A CONCEDER PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, REDUZINDO A PENA ÚNICA APLICADA AO ARGUIDO A 6 ANOS E 8 MESES.

III. O TRIBUNAL DE 1ªINSTANCIA NÃO SE PRONUNCIOU EM SEDE DE SENTENÇA SOBRE OS OBJECTOS APREENDIDOS, PESE EMBORA O MINISTÉRIO PUBLICO TIVESSE REQUERIDO O SEU PERDIMENTO A FAVOR DO ESTADO.

IV. VERIFICOU-SE UMA OMISSÃO DE PRONUNCIA, QUE NÃO FOI ARGUIDA TEMPESTIVAMENTE PELO MINISTÉRIO PÚBLICO.

V. A SENTENÇA TRANSITOU EM JULGADO E O ARGUIDO, PROPRIETARIO DO VEÍCULO AUTOMÓVEL APREENDIDO NOS AUTOS, REQUEREU A SUA ENTREGA, QUE FOI DEFERIDA POR DESPACHO PELO TRIBUNAL DE 1ª INSTANCIA.

VI. INCONFORMADO COM A DECISÃO, VEIO O MINISTÉRIO PUBLICO RECORRER PARA O Tribunal da Relação do ..., ALEGANDO PARA TANTO A TOTAL VIOLAÇÃO DO ARTIGO 109º DO CÓDIGO PENAL, PEDINDO QUE O BEM FOSSE DADO COMO PERDIDO A FAVOR DO ESTADO.

VII. O Tribunal da Relação do ..., DECIDIU REVOGAR A DECISÃO DO ENTÃO TRIBUNAL A QUO, DECLARANDO NOS TERMOS DO ART.109º Nº 1 DO CP O PERDIMENTO DO VEÍCULO AUTOMÓVEL marca ..., modelo ..., MATRICULADO COM o n.º...-RB-..., A FAVOR DO ESTADO.

VIII. TODAVIA E UMA VEZ QUE O ACÓRDÃO PROLATADO PELO TRIBUNAL DE 1ª INSTANCIA, NÃO SE PRONUNCIOU QUANTO AO DESTINO A DAR AOS BENS APREENDIDOS, CONTRARIANDO O DISPOSTO NOS REQUISITOS GERAIS DA SENTENÇA, CONFORME PRECEITUA A ALÍNEA C) DO Nº3, DO ARTº 374 DO CPP, NEM OS DECLAROU PERDIDOS A FAVOR DO ESTADO, ESTES DEVIAM SER ENTREGUES AO SEU PROPRIETÁRIO APÓS TRANSITO EM JULGADO, COMO DECORRE DO ARTº186 DO CPP E COMO DECIDIU O TRIBUNAL DE 1ª INSTÂNCIA, ATRAVÉS DE DESPACHO POSTERIOR.

IX. ISTO PORQUE ENCONTRA-SE HÁ MUITO ESGOTADO O PODER JURISDICIONAL (ARTº613 DO CÓDIGO DO PROCESSO CIVIL), UMA VEZ QUE PROFERIDA A DECISÃO, AQUELE PODER EXTINGUIU-SE RELATIVAMENTE AS QUESTÕES SOBRE AS QUAIS INCIDIU A DECISÃO, FICANDO O JUIZ PRETERIDO DE EMITIR NOVA SENTENÇA OU DE A MODIFICAR.

X. ASSIM, NÃO RESTAM DÚVIDAS QUE O MOMENTO CORRECTO PARA DAR DESTINO AOS OBJECTOS APREENDIDOS, É A SENTENÇA, POIS É NELA QUE SE DECIDE SE DETERMINADO OBJECTO SERVIU PARA A PRATICA DE UM FACTO ILÍCITO TÍPICO, OU SE PELA SUA NATUREZA OU CIRCUNSTÂNCIAS OFERECE RISCOS DE SER UTILIZADO NO COMETIMENTO DE NOVOS FACTOS.

XI. ORA NÃO TENDO SIDO ORDENADO O PERDIMENTO A FAVOR DO ESTADO DO BEM EM CAUSA ATÉ AO TRANSITO EM JULGADO, DEFENDE MAIORITARIAMENTE A JURISPRUDÊNCIA, QUE O SEU PERDIMENTO PODE E DEVE SER FEITO POR DESPACHO AUTÓNOMO POSTERIOR, PORÉM UNICAMENTE QUANDO PERANTE UM OBJECTO ILÍCITO.

XII.   O QUE QUER DIZER, QUE APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO, O PERDIMENTO DE UM OBJECTO OU BEM A FAVOR DO ESTADO, SÓ PODERÁ ACONTECER EM DECISÃO POSTERIOR, CASO O BEM OU OBJECTO, PELAS SUAS CARACTERÍSTICAS ESTEJA REVESTIDO DE ILICITUDE, OU SEJA, QUANDO A SUA DETENÇÃO POR PARTICULARES NÃO FOR POR LEI PERMITIDA.

XIII.    PORQUE O VEÍCULO AUTOMÓVEL PERTENCENTE AO ARGUIDO É UM BEM LICITO, UM BEM QUE PODE SER DETIDO POR PARTICULARES, O ÚNICO MOMENTO EM QUE PODERIA SER DECLARADO PERDIDO A FAVOR DO ESTADO, ERA NA SENTENÇA, ATÉ AO TRÂNSITO EM JULGADO.

XIV. ASSIM, AO DECIDIR COMO DECIDIU, O Tribunal da Relação do ... INCORREU NUMA VIOLAÇÃO DE CASO JULGADO E SOBRETUDO PRATICOU UMA DESLEALDADE PROCESSUAL, VIOLANDO AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DE DEFESA DO ARGUIDO EXPRESSAS NO Nº1 DO ARTº32 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA.

XV. PORQUANTO A DECISÃO É INCONSTITUCIONAL.

XVI. O FACTO DO M. PUBLICO TER PEDIDO EXPRESSAMENTE A DECLARAÇÃO DE PERDA DO BEM A FAVOR DO ESTADO E A CIRCUNSTÂNCIA DO TRIBUNAL NADA TER DECLARADO, CONSTITUIU UMA OMISSÃO DE PRONUNCIA QUE PODERIA TER SIDO ARGUIDA NOS TERMOS DO ARTº 379º DO CPP, E NÃO FOI.

XVII. SENDO A SENTENÇA OMISSA QUANTO A ESTA QUESTÃO, NÃO PODE TAL OMISSÃO SER COLMATADA POR DESPACHO OU COMO NO PRESENTE CASO, EM SEDE DE RECURSO DESSE DESPACHO, SOB PENA DE ESTARMOS A APLICAR EX NOVO O ARTº109 DO CP.

XVIII.  PORQUANTO, QUER O RECURSO, QUER A DECISÃO DO PERDIMENTO A FAVOR DO ESTADO,     INVOCANDO A GRAVIDADE DOS CRIMES PRATICADOS, SÃO TOTALMENTE EXTEMPORÂNEOS, POIS CONFORME RESULTA A LEI, OS BENS APREENDIDOS EM PROCESSO PENAL, SÓ PODEM SER DECLARADOS PERDIDOS A FAVOR DO ESTADO ATÉ AO TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO FINAL, EXCEPTO SE PELA SUA NATUREZA NÃO PODEREM SER REAVIDOS, O QUE NÃO É O CASO DO VEÍCULO AUTOMÓVEL DOS AUTOS.

XIX. LOGO, O ACÓRDÃO EMANADO PELO Tribunal da Relação do ..., ORA EM CRISE, DEVE SER REVOGADO E SUBSTITUÍDO POR OUTRO QUE CUMPRA O DISPOSTO NO ARTIGO 186º, Nº 2 DO CPP, JÁ QUE O BEM APREENDIDO É DE DETENÇÃO LÍCITA POR PARTICULARES E NÃO FOI OBJECTO DE DECLARAÇÃO DE PERDIMENTO A FAVOR DO ESTADO NO “MOMENTO CERTO”, NEM ESTA OMISSÃO FOI ARGUIDA DE MODO A ADMITIR UMA DECISÃO DIFERENTE ANTES DO TRANSITO EM JULGADO.

XX. SALVO O DEVIDO RESPEITO,ANDOU MAL O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO ..., NA MEDIDA EM QUE FUNDAMENTOU A SUA DECISÃO PARA REVOGAR O DESPACHO QUE ENTREGOU O OBJECTO A QUEM DE DIREITO, NO ARTº 109 DO CP, DESCONSIDERANDO E VIOLANDO O ARTº186 DO CPP, AFIRMANDO DE MODO VAGO QUE “O TRÂNSITO DA SENTENÇA NÃO É CRITÉRIO, NEM TINHA DE SER, PARA A OPORTUNIDADE DE APRECIAÇÃO DESTE REGIME” .

XXI. CONTRARIANDO ASSIM, O SENTIDO DA JURISPRUDÊNCIA MAIORITÁRIA SUFRAGADA, CITADA NO ACÓRDÃO DA RELAÇÃO DO PORTO DE 12/07/2017, RELATADO POR LUÍS COIMBRA, PROCESSO 803/14.9JABRG.P2 IN WWW.DGSI.PT, CUJO SUMÁRIO : “- NÃO OBSTANTE SER A SENTENÇA O MOMENTO CORRECTO PARA DAR DESTINO AOS OBJECTOS APREENDIDOS, SERÁ AINDA POSSÍVEL, POSTERIORMENTE, DECLARAR O SEU PERDIMENTO A FAVOR DO ESTADO NO CASO DE BEM OU OBJECTO, QUE PELA SUA PRÓPRIA NATUREZA, SEJA DE DETECÇÃO PROIBIDA POR PARTICULARES. II - JÁ NÃO ASSIM, NO CASO DE TRANSITADA A SENTENÇA ONDE NADA SE DECIDIU EM RELAÇÃO AOS BENS OU OBJECTOS APREENDIDOS, DE DETENÇÃO LÍCITA POR PARTICULARES, DEVENDO, NESTE CASO, SER ORDENADA A SUA ENTREGA A QUEM DE DIREITO.”

XXII. ASSIM COMO OUTROS ACÓRDÃOS TAMBÉM DECIDIRAM NESTE SENTIDO, “OS ACÓRDÃOS DESTA RELAÇÃO DO PORTO DE 30.06.2004 (PROC 0413638, REL. FERNANDO MONTERROSO); DE 17-05-2006 (PROC. 0610514, REL. JOAQUIM GOMES) E DE 20.01.2014 (PROC. 549/11.0JAPRT-A.P1, REL. ARTUR OLIVEIRA); OS ACÓRDÃOS DA RELAÇÃO DE ÉVORA DE 16.04.2013 (PROC. 28/11.5GBORQ.E1, REL. SÉNIO ALVES) E DE 12-04-2016 (PROC. 1072/11.8 GTABF-B.E1, REL. MARIA FILOMENA SOARES); E OS ACÓRDÃOS DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES 12-01-2009 (PROC. 2200/08.2, REL FILIPE MELO), DE 28-9-2009 (PROC. 2143/05.5TBBCL, REL. ANA PARAMÉS), DE 17.01.2011 (PROC. 1168/03.0PBGMR, REL. MARIA ISABEL CERQUEIRA) E DE 21.10.2013 (PROC. 316/09.0JABRG-F.G1, REL. ANTÓNIO CONDESSO) - TODOS ACESSÍVEIS IN WWW.DGSI.PT). NO MESMO SENTIDO, VEJA-SE AINDA O ACÓRDÃO DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES DE 07.02.2011 (PROFERIDO NO PROC 741/02.8TDPRTR-S.G1, REL LUISA ARANTES.” ACÓRDÃO DA RELAÇÃO DO PORTO DE 12/07/2017, RELATADO POR LUÍS COIMBRA, PROCESSO 803/14.9JABRG.P2 IN WWW.DGSI.PT

XXIII. E MAIS RECENTEMENTE O ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA, PROLATADO EM 22/05/2018, RELATOR SIMÕES DE CARVALHO, IN WWW.DGSI.PT, TAMBÉM CONCLUI NO MESMO SENTIDO: “NESTA CONFORMIDADE, APÓS SER PROFERIDA UMA SENTENÇA IMPÕE-SE, EM REGRA, QUE OS OBJECTOS APREENDIDOS SEJAM RESTITUÍDOS, COMO SE DIZ NO TEXTO LEGAL, “A QUEM DE DIREITO”, OU SEJA, À PESSOA QUE TIVER DIREITO A ELES – ENTENDIMENTO ESTE QUE JÁ REMONTA A LUÍS OSÓRIO, COMO SE PODE VER NO SEU “COMENTÁRIO AO C.P.P. PORTUGUÊS” (1934), PÁG. 224. DAÍ QUE, COMO JÁ SE DECIDIU NO ACÓRDÃO DA RELAÇÃO DO PORTO DE 30-06-2004, RELATADO PELO EXM.º DESEMBARGADOR FERNANDO MONTERROSO E DIVULGADO EM WWW.DGSI.PT, “OS BENS APREENDIDOS NO PROCESSO PENAL NÃO PODEM SER DECLARADOS PERDIDOS A FAVOR DO ESTADO, EM DESPACHO PROFERIDO APÓS A SENTENÇA”, RESSALVANDO-SE QUE AQUI NÃO ESTAVAM EM CAUSA BENS CUJA DETENÇÃO POR PARTICULARES FOSSE PROIBIDA, CONFORME, ALIÁS, ACONTECE, TAMBÉM, NA SITUAÇÃO ORA EM CAUSA. NESTA CONFORMIDADE, PODEMOS ASSENTAR QUE, APÓS A PROLAÇÃO DE UMA SENTENÇA E TRATANDO-SE DE BENS OU OBJECTOS APREENDIDOS QUE TENHAM NATUREZA E CARACTERÍSTICAS LÍCITAS, OS MESMOS DEVEM SER RESTITUÍDOS ÀS PESSOAS QUE TIVEREM DIREITO A ELES..”

XXIV. ASSIM, TRANSITADA EM JULGADO A SENTENÇA, EXAURIDO O PODER JURISDICIONAL DO TRIBUNAL, A DECISÃO NÃO PODIA TER SDO ALTERADA COMO FOI, COM BASE NO PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS DO ARTº109 DO CP.

XXV. ACRESCE AINDA QUE A DECISÃO DE PERDIMENTO DE BENS E OBJECTOS RELACIONADOS COM A PRATICA DE UM CRIME DEVE SER FUNDAMENTADA E NÃO PRESUMIDA, POR EXIGÊNCIA DO ARTº205 DA CRP E Nº5 DO ARTº97 DO CPP, COMO GARANTIA CONSTITUCIONAL DE DEFESA, (Nº1 DO ARTº32 DO TEXTO CONSTITUCIONAL), O QUE OBRIGA A DECISÃO JUDICIAL A DAR A CONHECER AS RAZÕES QUE A SUSTENTAM, SOB PENA DE INCONSTITUCIONALIDADE.

XXVI. PORQUANTO NÃO RESTAM DÚVIDAS QUE O Tribunal da Relação do ..., AO REVOGAR O DESPACHO PROFERIDO, ALICERÇANDO A SUA DECISÃO NO ARTº109 DO CP, ALEGANDO A SUA TUTELA PREVENTIVA, TRATOU DE MODO IGUAL, OBJECTOS COM CARACTERÍSTICAS DIFERENTES, CAINDO NUM ERRO FATAL DE INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS E CONSEQUENTE DETERMINAÇÃO.


NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO, QUE V.EXAS DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVE SER DADO TOTAL PROVIMENTO AO RECURSO E, CONSEQUENTEMENTE SER REVOGADA A DECISÃO RECORRIDA, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE DETERMINE A IMEDIATA ENTREGA DA VIATURA AO RECORRENTE.

DECIDINDO DESTE MODO, FARÃO V.EXAS,

JUSTIÇA.”


8. O Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal a quo, em ponderada Resposta, considerou que a decisão é irrecorrível. E ainda que,

“Caso assim se não entenda, o que só por hipótese de raciocínio se coloca, deverá o mesmo improceder, renovando o Ministério Público os argumentos que aduziu no recurso que interpôs e fazendo seus os que sustentaram a decisão recorrida.

Nestes termos, deverá rejeitar-se o recurso, ou, se assim não entendido, decidir-se pela sua improcedência.”


6. Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto manifestou-se, em esclarecido e incisivo Parecer, assim concluindo:

“Somos assim de parecer, que nos termos das disposições conjugadas dos artigos 400º, n º 1, alínea c); 432º, n º 1, alínea b), e 414º, n º 3, todos do Código de Processo Penal, o recurso não é admissível, pelo que deve ser rejeitado - ut CPP 420º, n º 1, alínea b).”


7. Foi cumprido o disposto no art. 417, n.º 2 do CPP, não tendo havido qualquer resposta.


Efetuado o exame preliminar, remeteu-se o processo a vistos legais e de seguida à Conferência, de acordo com o disposto no art. 419 do CPP.



II

Do Acórdão recorrido



Particularmente relevante se afigura o dispositivo do Acórdão recorrido, sem prejuízo, como é óbvio, da atenção que merece a integralidade do mesmo:


“DISPOSITIVO.

Pelo exposto, acordam os juízes na ... secção criminal do Tribunal da Relação do ... em julgar o recurso penal procedente e consequentemente, nos termos e fundamentos expostos, revogar a decisão do Tribunal a quo, determinando-se nos termos do art. 109º nº 1 do CP a perda do veículo automóvel marca ..., modelo ..., matriculado com o n.º...-RB-..., a favor do Estado. Notifique.”




II

Fundamentação

A

Questões Processuais Prévias




1. O facto de o presente recurso ter sido admitido não vincula este Supremo Tribunal de Justiça, como, aliás, não vincula qualquer tribunal superior – conforme o art. 414, n º 3 do CPP.


2. É consensual que, sem prejuízo do conhecimento oficioso de certas questões legalmente determinadas – arts. 379, n.º 2 e 410, n.º 2 e 3 do CPP – é pelas Conclusões apresentadas em recurso que se recorta ou delimita o âmbito ou objeto do mesmo (cf., v.g., art. 412, n.º 1, CPP; v. BMJ 473, p. 316; jurisprudência do STJ apud Ac. RC de 21/1/2009, Proc. 45/05.4TAFIG.C2, Relator: Conselheiro Gabriel Catarino; Acs. STJ de 25/3/2009, Proc. 09P0486, Relator: Conselheiro Fernando Fróis; de 23/11/2010, Proc. 93/10.2TCPRT.S1, Relator: Conselheiro Raul Borges; de 28/4/2016, Proc. 252/14.9JACBR., Relator: Conselheiro Manuel Augusto de Matos).


3. Emerge uma questão prejudicial e liminar, de que depende a sorte da lide. É questão processual prévia, remetendo para os poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça. Assim, a Fundamentação, na sua essência, confunde-se com esse problema: é ou não admissível esta questão na presente sede de recurso?


5. Atente-se o necessário enquadramento legal. Assim prescreve o art. 400 do CPP:

“Decisões que não admitem recurso

1 - Não é admissível recurso:

a) De despachos de mero expediente;

b) De decisões que ordenam actos dependentes da livre resolução do tribunal;

c) De acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações que não conheçam, a final, do objecto do processo;

d) De acórdãos absolutórios proferidos, em recurso, pelas relações, exceto no caso de decisão condenatória em 1.ª instância em pena de prisão superior a 5 anos;

e) De acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações que apliquem pena não privativa de liberdade ou pena de prisão não superior a 5 anos;

f) De acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos;

g) Nos demais casos previstos na lei. (…)”. (sublinhado nosso).


Uma mera exegese literal nos levaria a subsumir o caso na alínea f) do n.º 1 do citado art. 400 do CPP. Na raiz do problema há uma confirmação do Acórdão recorrido por parte do Tribunal da Relação, na modalidade de reformatio in mellius.

O contexto geral de tais situações ganha em ser enquadrado. Atente-se, assim, no Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 14.03.2018, proferido no Proc.º n.º 22/08.3JALRA.E1.S1 (Relator: Conselheiro Lopes da Mota), do qual, pela sua importância, citamos a seguinte passagem:                                            

“1. Só é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, limitado ao reexame de matéria de direito, de acórdãos das Relações proferidos em recurso que apliquem penas superiores a 8 anos de prisão ou que apliquem penas superiores a 5 anos e não superiores a 8 anos de prisão em caso de não confirmação da decisão da 1.ª instância. Esta regra é aplicável quer se trate de penas singulares, aplicadas em caso de prática de um único crime, quer se trate de penas que, em caso de concurso de crimes, sejam aplicadas a cada um dos crimes em concurso (penas parcelares) ou de penas conjuntas aplicadas aos crimes em concurso.

2. O regime de recursos para o STJ definido pelas normas dos artigos 400.º, n.º 1, al. e) e f), e 432.º, al. b), do CPP, efectiva, de forma adequada, a garantia do duplo grau de jurisdição, traduzida no direito de reapreciação da questão por um tribunal superior, quer quanto a matéria de facto, quer quanto a matéria de direito, consagrada no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, enquanto componente do direito de defesa em processo penal, reconhecida em instrumentos internacionais que vigoram na ordem interna e vinculam internacionalmente o Estado Português ao sistema internacional de protecção dos direitos fundamentais (artigos 14.º, n.º 5, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e 2.º do Protocolo n.º 7 à Convenção Para a Protecção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais). O artigo 32.º, n.º 1, da Constituição não consagra a garantia de um triplo grau de jurisdição, isto é, de um duplo grau de recurso, em relação a quaisquer decisões condenatórias.


3. Garantido o duplo grau de jurisdição em matéria de facto e em matéria de direito, têm os sujeitos processuais à sua disposição duas vias possíveis de exercer o direito ao recurso: querendo impugnar a decisão em matéria de facto (incluindo a arguição dos vícios da decisão a que se refere o artigo 410.º do CPP) e em matéria de direito, devem usar a via de recurso para o tribunal da Relação (artigos 427.º e 428.º do CPP), qualquer que seja a pena aplicada; limitando o recurso a matéria de direito, a lei impõe caminhos distintos, consoante a pena aplicada, que define o critério de competência dos tribunais superiores: se a pena não exceder 5 anos de prisão, o conhecimento do recurso é da competência do tribunal da Relação (artigo 427.º do CPP); se for superior a 5 anos, tal competência pertence ao STJ (artigos 432.º e 434.º do CPP), o qual, em caso de concurso de crimes, deve conhecer de todas as questões, de direito, relativas às penas aplicadas a cada um deles e à pena conjunta aplicada aos crimes em concurso (acórdão de fixação de jurisprudência n.º 5/2017, DR I, de 23.6.2017).


4. O conhecimento do recurso implica que o tribunal ad quem aprecie e decida, oficiosamente ou a pedido do recorrente, todas as questões de direito relacionadas com o objecto e âmbito do recurso da sua competência, incluindo das nulidades relativas à decisão recorrida que constitui o objecto do recurso, as quais, sendo admissível recurso, nele devem ser arguidas (artigo 379.º, n.º 2, do CPP).


5. Como tem sido afirmado na jurisprudência do STJ, estando este, por razões de competência, impedido de conhecer do recurso interposto de uma decisão, está também impedido de conhecer de todas as questões processuais ou de substância que digam respeito a essa decisão, tais como os vícios da decisão indicados no artigo 410.º do CPP, respectivas nulidades (artigo 379.º e 425.º, n.º 4) e aspectos relacionadas com o julgamento dos crimes que constituem o seu objecto, aqui se incluindo as questões relativas à apreciação da prova, à qualificação jurídica dos factos e à determinação da pena correspondente ao tipo de ilícito realizado pela prática desses factos ou de penas parcelares de medida não superior a 5 ou 8 anos de prisão, consoante os casos das alíneas e) e f) do artigo 400.º do CPP, incluindo nesta determinação a aplicação do regime de atenuação especial da pena previsto no artigo 72.º do Código Penal, bem como de questões de inconstitucionalidade suscitadas nesse âmbito.

 (…)”


6. Tratando-se de questão a apreciar liminarmente, a mais imediata e ponderosa questão a ponderar será, no caso, a apreciação da admissibilidade com base na ocorrência de dupla conformidade.

Com efeito, ocorre, no caso, dupla conformidade, pela “melhoria da situação processual do condenado”.

Como explicita, nomeadamente, o Ac. deste STJ proferido no Proc.º n.º 1042/07.0PAVNG.P1.S1, de 11-04-2012 (Relator: Conselheiro Raul Borges):

I - É admissível recurso para o STJ nos casos contemplados no art. 432.º do CPP, sem prejuízo de outros casos que a lei especialmente preveja, como explicita o art. 433.º do mesmo diploma legal.

II - Com a entrada em vigor da Lei 48/2007, de 29-08, foi modificada a competência do STJ em matéria de recursos das decisões proferidas, em recurso, pelas Relações, restringindo-se a impugnação daquelas decisões para o STJ, no caso de dupla conforme, apenas a situações em que tenha sido aplicada pena de prisão superior a 8 anos (cf. art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP).

III - Esta solução quanto à irrecorribilidade de decisões proferidas, em recurso, pelo Tribunal da Relação, enquanto confirmativas da deliberação da 1.ª instância não ofende qualquer garantia do arguido, nomeadamente o direito ao recurso, expressamente incluído na parte final do n.º 1 do art. 32.º da CRP. De facto, o direito ao recurso em matéria penal, inscrito como integrante da garantia constitucional do direito à defesa, está consagrado em um grau, possibilitando a impugnação das decisões penais através da reapreciação por uma instância superior das decisões sobre a culpabilidade e a medida da pena, sendo estranho a tal dispositivo a obrigatoriedade de um terceiro grau de jurisdição, por a CRP se bastar com um duplo grau.

IV - A noção de dupla conforme inclui a confirmação de uma decisão da 1.ª instância pela Relação, quando apenas parcial, se bem que traduzindo-se, exactamente, por força da intervenção do tribunal superior, numa melhoria da posição processual do condenado, que ainda assim «obtém ganho de causa».


7. Sublinhe-se, para além do aresto acabado de citar: nenhuma objeção de índole constitucional se pode vislumbrar como procedendo contra este entendimento (que em nada contende com os direitos e garantias constitucionais relativos ao recurso – designadamente o art. 32, n.º 1 da CRP), como aliás decorre de múltipla jurisprudência que refletiu e resolveu de forma cabal e definitiva, no atual estado legislativo-constitucional das coisas.

Além de que o recurso com dignidade constitucional parece remeter para questões precisamente de alguma dimensão e remete explicitamente para o processo penal. Atente-se, apenas, na letra do respetivo texto constitucional (art. 32, n.º 1 CRP). É o processo penal (ou criminal) que assegura todas as garantias penais constitucionalmente acolhidas. É ele, pois, o protagonista dessa defesa, tutelada pelo pano de fundo da “cabeça de capítulo” (como diria Pellegrino Rossi) da norma constitucional. Nele se deve antes de mais buscar a solução, tendo em atenção o enquadramento constitucional, que não parece suscitar neste caso quaisquer dúvidas. Cf., por todos, o já citado Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 14/03/2018, proferido no Proc.º n.º Processo 22/08.3JALRA.E1.S1 S1 (Relator: Conselheiro Lopes da Mota), assim como vários acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça, v.g. de 8/01/2014, Proc.º n.º 124/10.6JBLSB.E1.S1, de 26/06/2014, Proc.º n.º 160/11.5JAPRT.C1.S1 e de 10/09/2014, Proc.º n.º 223/10.4SMPRT.P1.S1.

Insista-se, pela sua relevância, designadamente no ponto 2. do Sumário do já citado aresto.


10. Em suma. Na medida em que o Acórdão raiz de toda a questão opera uma reformatio in mellius face ao previamente proferido, verifica-se uma situação de dupla conformidade, caindo sob a previsão da alínea f) do n.º 1 do artigo 400 do CPP, que necessariamente torna inadmissível o conhecimento do recurso sobre tal Acórdão. Mas alargando a impossibilidade a todas as questões conexas, e, obviamente, à suscitada pelo recorrente, no caso vertente. Recorde-se o Ponto 5 do Sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.03.2018, proferido no Proc.º n.º 22/08.3JALRA.E1.S1.

Assim, estando, por razões de competência, o Supremo Tribunal de Justiça impedido de conhecer do recurso interposto de uma decisão, encontra-se do mesmo modo impedido de conhecer de todas as questões processuais ou de substância que digam respeito a essa decisão.

O aresto referido especifica, exemplarmente: estão também excluídos da apreciação vícios da decisão indicados no artigo 410 do CPP, respetivas nulidades (artigo 379 e 425, n.º 4) e aspetos relacionadas com o julgamento dos crimes que constituem o seu objeto, aí se incluindo apreciação da prova, qualificação jurídica dos factos e determinação da pena, inter alia, conforme se citou supra.

Sintetizando: não cabe (nem é legalmente possível), neste contexto, curar de quaisquer questões subjacentes ou emergentes, sejam elas substantivas, processuais, ou de constitucionalidade, desde que, como é o caso, afirmem com o cerne da questão decidida (que é, na verdade, já res judicata) uma conexão tão profunda que como que se acolham à sombra da decisão já tomada, confirmativa e, no caso, para mais, em maior favor do Recorrente.

Dada a inadmissibilidade legal de receber o recurso, fica in limine prejudicada, como óbvio se torna, qualquer apreciação de fundo.




IV

Dispositivo



  Termos em que, decidindo em conferência, na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça se acorda em rejeitar recurso, conforme o art. 420, n.º 1, al. b) do CPP, tendo presentes as disposições conjugadas do art. 400, n.º 1, al. f), do art. 432, n.º 1, alínea b), e do art. 414, n.º 3, todos igualmente do CPP.

 Cstas pelo Recorrente.

Taxa de Justiça:  5 UCs

Condenação nos termos do art. 420, n.º 3 do CPC: 4 UC.


Supremo Tribunal de Justiça, 15 de dezembro de 2021


Dr. Paulo Ferreira da Cunha (Relator)

Dr.ª Maria Teresa Féria de Almeida (Juíza Conselheira Adjunta)