Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1119/08.5BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:07/04/2019
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:PARQUE DA ARRÁBIDA.
PRINCÍPIO DO “TEMPUS REGIT ACTUM”
REGIME NULIDADE NO ÂMBITO DA APLICAÇÃO DA PORTARIA Nº 26-F/80, DE 09 DE JANEIRO POR REFERÊNCIA AOS ARTIGOS 2° Nº 2 ALÍNEA B) E 103° DO DECRETO-LEI Nº 380/99, DE 22 DE SETEMBRO.
PRINCÍPIOS DA BOA FÉ, DA CONFIANÇA E DA PROPORCIONALIDADE.
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I) - Em princípio, não é lícito invalidar um acto administrativo com base num quadro legal não vigente à data da sua prática, sem prejuízo de nalgumas situações ser de aplicar a figura de invalidade sucessiva ou superveniente, que decorre de um acto, originariamente válido, vir a ser invalidado “ex vi” de uma alteração superveniente da situação de facto ou de direito que esteve na base da sua prática.

II) -Enferma de nulidade a licença de loteamento, por violação do diploma à data da prolação do acto autorizativo ("in tempus regit actum") e porque a nulidade é expressamente cominada pelo artigo 9º do Decreto-Lei nº 622/76, de 28 de Julho, sendo esse vício também o cominado para os actos que não se conformem com os planos especiais de ordenamento do território (Cfr. artigo 103° do Decreto-Lei nº 380/99, de 22 de Setembro) e, por assim ser, ao contrário do que pretende a Recorrente, a inobservância do disposto no artigo 14° nº 2 da Portaria no 26-F/80, de 09 de Janeiro não gera mera anulabilidade, sanável pelo decurso do tempo, mas sim nulidade da licença de 1989 e de todos os actos sucessivos.

III) - O parecer do Parque Natural da Arrábida e a licença de loteamento da Câmara Municipal de Sesimbra são nulos, na parte em que classificam a área como urbana e em que dispensam, por isso, o respectivo procedimento - nos termos dos arts. 12º e 14° n.º2 e 17° da Portaria nº26-F/80, de 9 de Janeiro, e do Dec.-Lei n.º 622176, de 28 de Julho, e que classificam como rural o terreno em causa.

IV) -É incontrovertível que a assacada nulidade está expressamente prevista, à data da emissão daquele parecer do Parque Natural da Arrábida, no art. 9° do mesmo Dec.-Lei n.º 622/76, de 28 de Julho: «2. São nulas e de nenhum efeito as licenças municipais concedidas com violação do regime instituído neste decreto».

V) – E é também uma evidência que a Portaria 26-F/80, de 9 de Janeiro, que aprovou o Regulamento do Parque Natural da Arrábida, se enquadra na noção de Plano Especial e nos seus objectivos, nos termos dos arts. 42° e 43º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, mas a tipicidade que este estipula vigora para o futuro, sendo tal Portaria, à data da ilicitude do acto em causa, o diploma jurídico que condicionava a edificação no Parque Natural da Arrábida - e tanto basta.

VI) – Assim, nessa data, às proibições constantes da Portaria 26-F/80, de 9 de Janeiro, de natureza imperativa, correspondiam as sanções expressas quer do regime geral do art. 294° do Código Civil (nulidade), para os negócios jurídicos de direito privado, quer do regime especial do art. 19° nº 5 do Decreto­ Regulamentar n.º 23/98, de 14 de Outubro (nulidade), para os actos administrativos, sendo que para estes tal regime corresponde à excepção prevista no art. 135° do Código do Procedimento Administrativo - «São anuláveis os actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção».

VII) -Mesmo a entender-se que a Portaria nº 26-F/80, de 09 de Janeiro deva ser reconduzida a plano sectorial, a sua violação é, igualmente, sancionada com a nulidade (Cfr. artigos 2° nº 2 alínea b) e 103° do Decreto-Lei nº 380/99, de 22 de Setembro), não se convalidando na ordem jurídica por força do decurso do prazo de um ano. Isso porque "São nulos os actos praticados em violação de qualquer instrumento de gestão territorial aplicável." (vide artigo 103° e artigo 134º do Código do Procedimento Administrativo, vigente ao tempo).

VIII) –A essa luz, é também pacífico que não resulta da conduta administrativa da ED que esta haja criado na Recorrente a confiança de que poderia proceder ao loteamento e de que se tratava de um loteamento em área rural, não sendo configurável a violação pelo acto impugnado dos princípios da boa fé, da legalidade, da justiça e da proporcionalidade.

IX) -E a fundamentação aduzida pelo Administração, ao contrário do que alega o Recorrente, não se configura como uma fundamentação por mera referência para os factos e normas que os subsumam, antes se mostra suficientemente arrazoada, com utilização do silogismo judiciário, onde a conclusão se estriba em premissas explanadas, pelo que se trata de uma fundamentação cabal das normas que a exigem, até porque, como assertivamente assevera o recorrida: "Uma coisa é a Recorrente não concordar com os fundamentos expostos na decisão aqui impugnada, outra coisa, é vir dizer que o Recorrido não fundamentou as suas decisões".
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, no 2º Juízo da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul

I – Relatório

Vem interposto recurso jurisdicional por A............., SA., visando a revogação da sentença de 16-01-2017, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou totalmente improcedente a acção administrativa especial intentada contra o INSTITUTO DA CONSERVAÇÃO DA NATUREZA E BIODIVERSIDADE, I.P. - na qual peticionava a anulação do despacho de 2008-02-15 da Diretora do Departamento de Gestão das Áreas Classificadas Litoral de Lisboa e Oeste, que declarou a nulidade da licença de loteamento de 1989-03-02, emitida no processo de loteamento nº ........ a que corresponde o Alvará nº …/2005 da Câmara Municipal de Sesimbra de que a Autora é titular e o reconhecimento da validade da referida licença de loteamento que deu origem ao Alvará nº …/2005.

Irresignada, nas suas alegações, formulou a recorrente A............., SA. as seguintes conclusões:

“1ª- A Autora, ora Recorrente, não se conforma com a decisão recorrida porquanto, salvo o devido respeito, esta não fez correta interpretação e aplicação das disposições legais aplicáveis tendo também violado disposições imperativas no que concerne à fixação da matéria de facto relevante para a decisão da causa.
2ª- A licença de loteamento que foi posta em causa pelo despacho impugnando foi obtida pela Autora, há mais de duas décadas atrás, através do procedimento administrativo adequado no qual o Réu, ora Recorrido, no âmbito da suas competências e a solicitação da Câmara Municipal de Sesimbra, tomou, por duas vezes, posição expressa favorável, seja no âmbito do pedido de informação sobre a viabilidade do loteamento, seja no processo de licencia mento propriamente dito.
3ª- A presente ação enquadra-se numa longa luta da Autora para a execução de um projeto que tem mais de 20 anos e cuja execução, no momento próprio, foi impedida primeiro pela ação ilegal e abusiva do poder autárquico e, posteriormente pela ação, também abusiva, de quem alega tutelar interesses ambientais do país, descurando, no entanto, as mais elementares regras e princípios de direito, gerais e específicos da atividade administrativa, sacrificando direitos constituídos em nome de alegados interesses ambientais há muito desaparecidos pela própria inação do Estado.
4ª - Ou seja, mais de 20 anos depois veio o Réu dar o dito por não dito e por em causa o parecer favorável dos seus próprios serviços, sem sequer se preocupar em informar-se quais as circunstancias em que foi emitido o alvará e ignorando - apesar de insistentemente a Autora o ter lembrado - que o que releva em termos dos direitos urbanísticos é a licença datada de 1989 e que alvará em causa não se rege pela legislação vigente ao momento da sua prática mas pela legislação em vigor em 1989/1990, data em que o mesmo podia/devia ter sido emitido.
5ª - A ilegalidade de toda esta atuação do ICNB é para a ora Recorrente por demais evidente, padecendo, por isso, a sentença recorrida de manifesto erro de julgamento.
6ª - Desde logo, é absolutamente estranha e ilegal a decisão contida na sentença recorrida de dispensar a junção do processo administrativo que deu origem ao Alvará de Loteamento, sem o qual, naturalmente, não é possível apreciar a existência da nulidade que vem imputada à licença de loteamento pelo Réu nos atos impugnandos.
7ª - Mais gravoso ainda é o facto de o Tribunal Recorrido ter entendido dispensar a junção de tal processo e, em seguida, dar por não provados factos alegados pela Autora, ora Recorrente, relevantes para a justa decisão da causa e cuja prova resultaria precisamente - e necessariamente - de documentos constantes do mesmo, como o pedido de aprovação das obras de urbanização apresentado pela Autora à Câmara Municipal de Sesimbra em 1989-09.11e a decisão de deferimento tácito que sobre o mesmo se formou.
8ª - De tal processo administrativo de licenciamento decorre ainda informação relevante sobre os despachos do Sr. Secretario de Estado do Ambiente e Recursos Naturais que recaíram sobre as alterações aos perímetros urbanos do Parque Natural da Arrábida solicitadas pela Município de Sesimbra.
9ª - Acresce que, ao contrário do decidido, era ao Réu ICNB, ora Recorrido, que cabia provar que o terreno está em zona rural e não à Autora, ora Recorrente, que competia provar que o seu terreno não estava inserido em área rural, até porque, para além do mais, trata-se de facto negativo. Cabia, por isso ao Réu, levar a cabo todas as diligências probatórias da qual pudesse ser extraída uma conclusão sobre tal pressuposto essencial da decisão impugnanda.
10ª- Sendo assim aplica-se ao Direito Administrativo a regra consagrada no art. 516º do CPC "À dúvida sobre a realidade de um facto e sobre a repartição do ónus da prova resolve-se contra a parte a quem aproveita".
11ª - Pelo que, não podia o Tribunal Recorrido ter dado como não provada a publicação do despacho do Senhor Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais que em 1986 reintegrou os terrenos da Autora na zona urbana do perímetro do PNA.
12ª - Estavam também dependentes de prova documental através do processo de loteamento, os seguintes factos alegados pela Autora e que não podia o tribunal recorrido ter considerado não provados, a saber:
• Por requerimento datado de 8.09.1989 a Autora requereu a aprovação dos projetos de arruamentos, redes de abastecimento de água e drenagem de águas residuais e a respetiva "Memoria Descritiva" do Projeto de obras de urbanização - facto alegado no artigo 41º da PI e que resulta de fls. 96 a 116 do processo administrativo de licenciamento do loteamento;
• A Câmara Municipal de Sesimbra não decidiu sobre tal pedido no prazo previsto no Decreto-Lei nº 400/84, de 31 de Dezembro - facto alegado no artigo 42º da PI e cuja prova resulta igualmente do processo administrativo de licenciamento do loteamento;
• Em 14.11.1989 formou-se ato tácito de deferimento do pedido de licenciamento das obras de urbanização - facto alegado no artigo 43º da PI e que resulta de fls. 96 a 116 do processo administrativo de licenciamento do loteamento;
• Por requerimento datado de 8.09.1989 (com carimbo de entrada de 11.09.1989), a Autora requereu a aprovação dos Estudos Prévios de Arquitetura das Moradias em Banda - cfr. fls. 120 a 148 do processo administrativo de licenciamento do loteamento;
13ª- O Tribunal Recorrido ignorou e desconsiderou factos alegados pela Autora, ora Recorrente na sua PI, dos quais fez prova através de documentos juntos com a PI, e que são manifestamente relevantes para a boa e justa decisão da causa, nomeadamente em sede de apreciação do princípio da proporcionalidade, designadamente:
• É manifesta a pressão urbanística existente à volta do terreno da Autora, com centenas de construções aprovadas e consentidas ao longo de todos estes anos pelo PNA - facto alegado no artigo 164º da PI e que resulta provado do documento nº 27 junto com a mesma PI;
• Foi dada autorização à S............. não apenas para prolongar a exploração das pedreiras do O........ bem como par duplicar o volume de extração das pedreiras - facto alegado no artigo 165º da PI e que resulta provado dos documentos nºs 28 a 31juntos com a mesma PI;
• As referidas pedreiras situam-se ao lado dos terrenos da Autora e na mesma área protegida - facto alegado no artigo 166º da PI e que resulta provado dos documentos nºs 28 a 31juntos com a mesma PI
14ª - Por constituírem factos relevantes para a apreciação da questão de saber se o terreno da Autora, ora Recorrente, está/estava ou não inserido em zona urbana do perímetro do PNA nos termos em que tal questão foi colocada e analisada pelo próprio Tribunal, nomeadamente, tendo em conta a eficácia/ineficácia do Despacho do Sr. Secretário de Estado do Ambiente e Recurso Naturais, de 23.12.1989, não podia o Tribunal ter ignorado e deixado de incluir nos factos provados, os seguintes factos que resultam dos documentos constante do PA junto aos autos pelo Réu:
• O terreno da A. situa-se em "área de paisagem protegida" face ao mapa anexo ao DL n.º 622/76, de 29 de Junho, regulamentado pela Portaria n.º 26-F/80, de 9 de Janeiro, a qual não tem mapa anexo;
• Desde 1979 que os terrenos da Autora estavam inseridos na zona urbana do PNA conforme resulta do PA junto aos autos e dos documentos de tis. 144 e 145 dos autos.
• Os terrenos da Autora foram retirados da zona urbana do PNA em 1984, pela proposta e respetivo despacho do Sr. Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais referidos nos pontos B. e C. da matéria de facto dada como provada e que constam do PA junto aos autos bem como dos documentos de fls 144 e 145 dos autos.
• Os estudos e propostas de alterações a efetuar ao perímetro urbano do PNA nos anos de 1984 e de 1986 e sobre os quais recaíram despachos do Sr. Secretário de Estado do ambiente e Recursos Naturais, em 1984 e 1989; são os que constam das plantas de fls. 122 e a de fls. 121 do PA n2 C0/3ª - v. PA junto aos autos.
16ª - Devem, pois, os factos acima enunciados ser aditados à matéria de facto provada, porque com manifesta relevância para a justa decisão da causa e por resultarem da prova produzida nos autos-.
17ª- É manifesto o erro de julgamento da sentença recorrida na decisão dada a todas as questões jurídicas nela enunciadas.
18ª - Ao contrário do decidido, resulta claramente do despacho impugnando que o mesmo considerou estar em causa a apreciação da validade do alvará de loteamento emitido em 2005 e não do ato de loteamento, fazendo sempre menção a tal alvará e invocando, como fundamento da declaração de nulidade nele contida, as normas do POPNA, e concluindo como bem se pode ler no despacho em causa que "deverá a A............. S.A repor as condições do terreno nas condições pré-existentes no prazo de 45 dias, por os trabalhos efetuados violarem o disposto nos artigos 18º e 22º do POPONA".
19ª - Ou seja, o despacho impugnado nos presentes autos, ao contrario do que decorre da sentença recorrida, fundamentou a nulidade do ato de loteamento e a consequente nulidade das obras de urbanização efetuadas pela Autora na violação do POPNA apesar de ter feito sumária referencia à Portaria 26-F/80.
20ª - Pelo que, o que estava em causa e deveria ter sido analisado na sentença recorrida era a questão de saber se as normas que fundaram a declaração de nulidade do loteamento eram as normas aplicáveis ao ato administrativo em causa e não a questão de saber se a legalização da obra deveria ser feita ou não à luz do POPNA, coisa que a Autora nunca contestou.
21ª - Nem podia o Tribunal Recorrido proceder a uma espécie de fundamentação do ato impugnado, aduzindo argumentos que dele não constam, como acabou por fazer ao considerar que a referência ao POPNA no mesmo se referia à suscetibilidade de legalização porquanto tal não decorre do texto do ato impugnado.
22ª - A sentença sob recurso padece ainda de manifesto erro de julgamento ao entender, como entendeu, que à data da prática da licença de loteamento havia que aplicar o Regulamento anexo à Portaria 26-F/80, de 9 de Janeiro por, no entender do Tribunal Recorrido não ter ficado provado que ao despacho proferido em 1986-12-23 pelo Secretário de Estado do Ambiente e dos Recurso Naturais, no sentido da aprovação da inserção do terreno da Autora no perímetro urbano, através do despacho "Concordo" aposto no oficio datado de 1986-12-09 e que o mesmo foi comunicado aos serviços do Parque Natural da Arrábida e à Câmara Municipal de Sesimbra, "tenha sido dada a publicidade exigida pelos artigos 3º e 14º do Decreto­ Lei nº 560/71, de 17 de Dezembro e em termos gerais dada a natureza regulamentar da alteração pelo artigo 5º do Código Civil e pelo artigo 122º, nº 1, ai, h) e nº 4 da CRP".
23ª O licenciamento dos terrenos da Autora foi deferido por atos municipais praticados durante o ano de 1989, mostrando-se, desde aí, definitivamente conformada, em termos substantivos, a sua situação jurídica.
24ª - O Réu nem sequer se preocupou em apurar e identificar na decisão impugnanda, a licença de loteamento, nem a data da sua emissão, às quais não se faz qualquer referência na decisão em causa. O que teria naturalmente sucedido se o Réu tivesse querido declarar a nulidade de tal licença e não do alvará, como fez.
25ª - Ao contrário do sustentado na sentença recorrida o despacho do Sr. Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais, datado de 1986-12-23, não tinha que ser publicado, quer porque não os exigiam as normas especiais aplicáveis às alterações das áreas urbanas e rurais do perímetro do Parque Natural da Arrábida, quer porque o despacho em causa não tem, manifestamente, natureza regulamentar, mas sim de ato administrativo plural.
26ª - De acordo com as disposições vigentes à época, os planos de ordenamento de cada Parque Natural, incluindo os do PNA, deveriam ser aprovados por despacho do Sr. Secretario de Estado do Ambiente, sendo que os referidos planos não tinham que revestir a forma de Portaria.
27ª - Foi ao abrigo da do artigo 9º, nº 3 Decreto-Lei nº 4/78, de 11de Janeiro que se foi desenvolvendo o regime de uso e ocupação do solo no perímetro do PNA: através de planos de ordenamento aprovados pelo Sr. Secretário de Estado do Ambiente. Foi assim até à entrada em vigor da Portaria 26-F/80 e depois desta porquanto a referida norma procedimental e de competência constantes do Decreto 4/78 se manteve em vigor.
28ª - Os terrenos da Autora, ora Recorrente, foram incluídos no Plano de Ordenamento Prévio do Parque Natural da Arrábida aprovado por despacho do Secretário de Estado do Urbanismo e Ambiente, de 17 de Agosto de 1979, como fazendo parte do "perímetro urbano" . - v. Referencia a esse despacho a fls. 72 do processo administrativo C0/3ª - 86 -Vol 1 do PNA.
29ª - Ao contrário do que parece resultar da sentença recorrida, a referida Portaria nº 26-F/80 não tem qualquer mapa anexo, tendo a inserção do terreno loteado no "perímetro urbano" do PNA ocorrido ainda antes da entrada em vigor da Portaria 26-F/80.
30ª - A razão pela qual a Portaria não tem em anexo qualquer planta resulta do que acima se expos: o Decreto nº 4/78 determinava que os planos de ordenamento eram aprovados por despacho do Sr. Secretário de Estado do Ambiente e que os regulamentos dos referidos planos eram aprovados por Portaria.
31ª - Foi o que aconteceu: em 1979 já havia sido aprovado por despacho do Sr. Secretário de Estado do Ambiente o plano de ordenamento, e em 9 de Janeiro é publicada a portaria que vem regulamentar tal plano, ou seja, definir as regras a que fica sujeito o uso do solo dos terrenos incluídos no plano em causa.
32ª - Ou seja, quando entrou em vigor a Portaria 26-F/80, o terreno loteado já se encontrava-se no perímetro urbano do PNA, tendo nele sido inserido por despacho do sr. Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais de 1979.
33ª - Se os terrenos da ora Recorrente não tivessem estado desde início incluídos no perímetro urbano, não teriam dele sido retirados em 1984 (como referido acima e bem decorre do PA juntos aos presentes autos).
34ª - Com efeito, como também consta dos autos, ocorreu em 1984 uma revisão do plano de ordenamento do PNA, por iniciativa da Câmara Municipal de Sesimbra que exclui o terreno da Autora do perímetro urbano. Tal alteração assumiu novamente a forma determinada pelo Decreto 4/78, ou seja, a forma de despacho do Sr. Secretário de Estado do Ambiente
35ª - Em suma, como resulta do exposto supra, a forma de elaboração e alteração dos planos de ordenamento a que se refere o artigo 92 do Decreto 4/78 foi sempre a mesma, como resulta sobejamente demonstrado, não tendo sido qualquer dos despachos que a elas procedeu objeto de publicação.
36ª - As alterações aos perímetros que entretanto ocorreram não são alterações aos limites do PNA definidos no plano preliminar publicado com o Decreto-Lei nº 622/76, pelo que não estavam sujeitos à mesma forma pelo princípio da equiparação.
37ª - Do regime legal exposto, que o Tribunal Recorrido não analisou, resulta inequivocamente que o despacho do Sr. Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais, datado de 23.12.1986, que aprovou a inserção do terreno da Autora no perímetro urbano não tinha que ser objeto de publicação.
38ª - Ao contrário do decidido, o despacho em causa também não estava sujeito a publicação obrigatória "nos termos gerais, dada a natureza regulamentar da alteração, pelo artigo 5º do Código Civil e pelo artigo 122º, nº 1. AI. H) e nº 4 da CP (na redação da 1º revisão de 1982)".
39ª - É que a alteração do perímetro a que procedeu o despacho do Sr. Secretario de Estado do Ambiente e Recursos Naturais de 23.12.1989, não tem, obviamente, natureza regulamentar, constituindo a definição de uma situação concreta de um particular - a Autora, ora Recorrente - e, por isso tem, consequentemente a natureza de ato administrativo.
40ª - O referido despacho limitou-se a determinar a inclusão, na zona urbana do PNA, de dois terrenos concretos, de dois proprietários concretos, um deles a Autora, ora Recorrente, consubstanciando assim, sem margem para qualquer dúvida ou hesitação, um ato administrativo plural, que, portanto, não estava sujeito a regras especiais de publicidade, bastando a sua comunicação aos interessados, como aconteceu, para produzir efeitos.
41ª - De qualquer modo, em face das regras do ónus da prova, não podia o Tribunal Recorrido ter concluído que a publicação não ocorreu
42ª - Em qualquer caso, ainda que tal publicidade fosse legalmente exigida, a omissão de tal formalidade, e a consequente ineficácia, não podem, obviamente, ser opostas à Autora, ora Recorrente, prejudicando-a, por quem a ela deu causa.
43ª - Finalmente, a entender-se exigível a publicação de tal despacho, teria também que concluir-se, pelas mesmas razões, pela ineficácia do despacho do mesmo Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recurso Naturais, datado de 28.08.1984, que retirou os terrenos da Autora da zona urbana.
44ª - A decisão constante da sentença recorrida, revela-se, pois, neste ponto inadmissível incongruente. Pois, a alteração aprovada em 1986 observou exatamente trâmites e formalidades que a alteração aprovada em 1984. Ou seja, ambas as alterações foram propostas pela Câmara Municipal de Sesimbra, obtiveram parecer favorável do Conselho Geral do Parque e lograram aprovação pelo Secretário de Estado do Ambiente.
45ª - Assim, consequentemente, não podia a sentença recorrida ter deixado de concluir, para efeitos da análise da questão de saber se os terrenos estavam ou não à data do licenciamento inserido em zona urbana, que o que releva é o Despacho do Secretário de Estado do Urbanismo e Ambiente, de 17 de Agosto de 1979, que aprovou Plano de Ordenamento Prévio do Parque Natural da Arrábida, e através do qual os terrenos da Autora, ora Recorrente, foram inseridos na zona urbana.
46ª - Também quanto à questão "Admissão da licença de loteamento cumpriu as normas contidas na Portaria 26-F/80, de 9 de Janeiro? " as conclusões da sentença recorrida resultam de falta de rigor na análise subjacente e revelam erro grosseiro na forma como o Tribunal Recorrido apreciou a legalidade do despacho impugnando.
47ª - Em primeiro lugar, porque, como resulta do exposto supra, os terrenos da Autora, ora Recorrente, estavam inseridos em zona urbana e não em zona rural como pretendeu fazer crer o Réu e como se concluiu erradamente na sentença recorrida.
48ª - Em segundo lugar, porque, de acordo com o regime instituído pela Portaria 26- F/80 "paisagem protegida" não equivale a proibição absoluta de construção, sendo o diploma muito claro ao distinguir vários tipos de uso do solo consoante as zonas.
49ª - Ou seja, para efeitos da análise e correta decisão das questões em causa nos autos, não bastava alegar, como faz o Réu, ora Recorrido, que Autora estava em área de paisagem protegida, porquanto, de acordo com a Portaria 26-F/80, tal qualificação não determina, por si só, a proibição de construir ou lotear.
50ª- Cabia ao Réu ICNB ter alegado - no ato impugnando e não nos autos - e bem assim provado, que as condicionantes apostas no parecer favorável do PNA não foram cumpridas pela aqui Autora, ora Recorrente.
51ª - O que não foi feito porquanto nada se diz no ato impugnando nem nos pareceres que o antecederam sobre tal questão tendo a mesmo sido levantada pelo Tribunal Recorrido, extravasando claramente os poderes que lhe são conferidos no CPTA.
52ª- Por auto lado, e no que concerne à prova do cumprimento de tais condicionantes, também não podia a sentença recorrida ter dispensado a junção aos presentes autos do processo administrativo de licenciamento do qual dependia, naturalmente, a prova do cumprimento de tais condicionantes.
53ª - Ao fazê-lo, a sentença recorrida entrou em contradição intrínseca e violou os mais elementares princípios processuais, nomeadamente, o princípio da tutela jurisdicional efetiva constitucionalmente consagrado nos artigos 20º e 268º da CRP, por ter rejeitado a apensação de documentos cuja junção foi requerida pela Autora e que, teriam feito prova da matéria em causa.
54ª - Acresce que, ao contrário do que parece ter entendido Tribunal Recorrido, a declaração de nulidade do loteamento e a ordem de reposição do terreno emitidos pelo Réu INCB não assentaram na violação das condicionantes apostas no parecer do PNA emitido no processo de loteamento, estranhando-se, por isso, em absoluto, a decisão recorrida também neste ponto.
55ª - Basta atentar no teor quer dos despachos impugnandos quer da informação jurídica que o precedeu - transcritos aliás nos pontos AL e AM da matéria de facto provada -, para se alcançar que a decisão do ICNB assentou exclusivamente na consideração dos terrenos da Autora como situados em zona rural do perímetro do PNA e não em qualquer outra circunstância ou ilegalidade.
56ª - Com efeito, tal invalidade agora imputada ao ato de licenciamento não vem, sequer indiretamente, mencionada na fundamentação do ato recorrido, tendo sido aduzida pelo Réu em sede de contestação, como se pudesse através da presente ação corrigir ou aditar a fundamentação constante dos atos objeto de impugnação nos autos.
57ª - Ora, o Tribunal Recorrido não podia julgar improcedente a presente ação pela criação de novos argumentos em favor da tese do Réu sobre a ilegalidade do ato de licenciamento do loteamento, sob pena de estar a aditar a fundamentação de atos administrativos, substituindo-se à administração no exercício de poderes de natureza administrativa.
58ª- Ao considerar, para efeitos de apreciar a legalidade da licença de loteamento, uma questão de invalidade que não foi suscitada por qualquer das partes e que deveria ter sido prima facie objeto de uma decisão administrativa, a sentença recorrida violou o artigo 95º do CPTA e padece de nulidade nos termos do artigo 615º, nº 1, al. d) do novo CPC, por conhecer de questões de que não podia ter conhecido.
59ª - Sendo certo que, por ter decidido uma questão sobre a qual não foi dada à Autora, ora Recorrente, a oportunidade de se pronunciar, a sentença recorrida padece de nulidade por excesso de pronúncia nos termos da alínea d), do nº 1, do artigo 615º do CPC.
60ª- Tendo violado ainda os mais elementares direitos de defesa da Autora e, consequentemente o princípio do acesso ao direito e da tutela jurisdicional efetiva constante do artigo 20º da CRP.
61ª - Acresce que, do processo administrativo de loteamento resulta precisamente o contrário do decidido, designadamente que por requerimento datado de 8.09.1989 (com carimbo de entrada de 11.09.1989), a Autora requereu a aprovação dos Estudos Prévios de Arquitetura das Moradias em Banda - cfr. fls. 120 a 148 do processo administrativo de licenciamento do loteamento.
62ª - Resultando ainda do mesmo processo, que em 19.09.1989 a Autora juntou ao processo as fotografias do Estudo Prévio de Arquitetura das moradias em Banda - cfr. fls. 152 a 158 processo administrativo de licenciamento do loteamento;
63ª- Acresce, em qualquer caso, que ao contrário do decidido, não havia qualquer obrigatoriedade de pedido de parecer prévio ao Parque Natural da Arrábida sobre o estudo prévio de arquitetura e de parecer do Museu de Arqueologia e Etnografia de Setúbal.
64ª - No parecer emitido pelo PNA, em 24 de Maio de 1998, defendeu-se o deferimento do pedido de loteamento dos terrenos da Consulente com a condição de ulterior apresentação de um 'Estudo Prévio de Arquitetura ('nomeadamente das zonas de implantação em banda e geminadas para que a área possa ter uma unidade de conjunto'), e da realização de consulta ao Museu de Arquitetura e Etnografia em Setúbal ' de acordo com a ata nº 32 de 21 de Novembro de 1986, do Conselho Geral deste Parque Natural".
65ª- A primeira condição estabelecida - entrega de um Estudo Prévio de Arquitetura - foi efetivamente cumprida pela Requerente, a qual procedeu à junção dos elementos solicitados em 11de Setembro de 1989, juntamente com os projetos de obras de urbanização, tendo o referido estudo Prévio de Arquitetura submetido à apreciação da Câmara Municipal de Sesimbra, em conformidade com o solicitado no parecer do ICN e na licença de loteamento.
66ª - Por outro lado, o PNA foi devidamente consultado quanto ao pedido de loteamento apresentado. Para além dessa consulta inexistia qualquer preceito legal que exigisse novo parecer do PNA (desta feita) sobre o estudo prévio de arquitetura apresentado, sendo certo que essa mesma exigência também não foi imposta no parecer emitido pelo PNA em 24 de Maio de 1988.
67ª- Acresce que, nos termos da lei procedimental aplicável (em concreto o Decreto-lei nº 400/84, de 31 de Dezembro), não seria possível proceder a uma segunda audição do PNA, em sede de licenciamento de obras de urbanização, uma vez que o procedimento correspondente não comportava uma nova fase de consultas a entidades exteriores.
68ª - Cumulativamente, no que respeita à segunda condição imposta no parecer do PNA - a eventual consulta do Museu de Arqueologia e Etnografia de Setúbal - importa evidenciar que, como foi referido nesse parecer a consulta daquele organismo deveria ser realizada de acordo com a ata nº 32, de 21 de Novembro de 1986 do Conselho Geral do Parque Natural' na qual se afirma que "quando vier o respectivo pedido de viabilidade do loteamento ao Parque Natural da Arrábida este fará acompanhar a sua resposta do parecer emitido pelo Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal ou do Serviço Regional de Arqueologia Sul do Instituto Português do Património Cultural" (realce nosso).
69ª - Em consequência, é manifesto que, ao contrário do decidido, cabia ao PNA, proceder à consulta do Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal, devendo o parecer de ambas as entidades - PNA e Museu de Arqueologia e Etnografia - ser conjuntamente apresentado à Câmara Municipal de Sesimbra.
70ª - Pelo que, ao contrário do decidido, a licença de loteamento não violou o parecer prévio vinculativo do PNA e não padece, por isso da nulidade que lhe foi imputada pelo Tribunal Recorrido.
77ª - Acresce que, no que concerne ao regime de invalidade aplicável, nem o Decreto-Lei nº 100/84 nem o Decreto-Lei n2 400/84 sancionam com a nulidade a desconformidade do licenciamento com planos urbanísticos e muito menos com planos preliminares de ordenamento do território.
78ª - A violação do disposto no nº 2 do artigo 14º da Portaria nº 26-F/80, de 9 de Janeiro, única argumento que foi invocado nos despachos impugnados, não integra qualquer dos casos de nulidade excepcionalmente previstos nos mencionados diplomas, mais concretamente, no artigo 88º, nº 1, do Decreto-lei nº 100/84, de 19 de Março, e no artigo 652, n2 1 do Decreto-Lei n!! 400/84, de 31 de Dezembro.
80ª - O legislador reservou o regime de nulidade estabelecido no nº 2 do artigo 9º do Decreto-Lei nº 622/76, de 28 de Julho, para a violação das normas desse mesmo diploma, afigura-se ilegal e abusiva a pretensão de estender esse regime a quaisquer outras situações.
81ª- De acordo com o disposto no artigo 65º do Decreto-lei nº 400/84, de 31 de Dezembro, eram considerados nulos os atos das Câmaras Municipais respeitantes as operações de loteamento ou obras de urbanização que não tivessem sido precedidos de parecer prévio das entidades que devessem ser consultadas.
82ª - No caso em análise, a Câmara Municipal de Sesimbra, ainda que não legalmente obrigada consultou, para todos os efeitos, o PNA que informou que se tratava de zona urbana.
83ª- Por outro lado, e pelas razões acima expostas não está em causa a violação das condicionantes apostas no parecer do PNA - violação de parecer vinculativo -, pelo que, também não se verifica, por essa via, qualquer das nulidades previstas no citado artigo 65º do Decreto-lei nº 400/84.
84ª- Isto significa que, ao contrário do decidido, o ato de licenciamento da operação urbanística, a ser ilegal - o que por mera questão de patrocínio judiciário se concede, - padeceria de mera anulabilidade e que, consequentemente, a ilegalidade alegada - a existir, no que não se concede - ter-se-ia sanado pelo decurso do tempo, ou seja, pelo prazo de um ano, que é o prazo mais alargado de impugnação dos atos administrativos.
85ª - Ao contrário do decidido, o ICNB suscitou na Autora através dos seus atos administrativos confiança no sentido de proceder ao loteamento, em área urbana, situação que ocorreu durante 20 anos, pelo que o ato deve ser anulado por contrariar o princípio da proporcionalidade, o princípio da boa-fé, da segurança jurídica e por constituir abuso de direito.
86ª - Mesmo que pudesse considerar-se a licença nula - o que vimos já não é o caso - não poderia, nesta fase decretar-se tal nulidade e a reposição do terreno sob pena de violação do princípio da proporcionalidade legal e constitucionalmente consagrados.
87ª - Em primeiro lugar, porque nos termos do disposto no artigo 5º, nº 2 do CPA, "as decisões da Administração que colidam com direitos subjectivos ou interesses protegidos só podem afectar essas posições em termos adequados e proporcionais aos objectivos a realizar".
88ª - Nem a declaração de nulidade foge ao princípio assinalado por imposição expressa do artigo 134º, nº 3 do mesmo CPA, em vigor à data do ato impugnando, que determina que o regime da nulidade "(...) não prejudica a possibilidade atribuição de certos efeitos jurídicos a situações de facto decorrentes de atos nulos, por força do simples decurso do tempo, de harmonia com os princípios gerais de direito".
89ª - A sentença recorrida não procedeu à correta ponderação dos interesses em presença, sendo certo que, ao contrário do que resulta da sentença recorrida, a ponderação não é entre o direito de propriedade da Autora e os interesses ambientais, mas sim entre um direito constituído na sua esfera jurídica por ato administrativo e os referidos interesses ambientais.
90ª - Ora, da matéria de facto alegada e provada pela Autora, ora Recorrente, nos presentes autos, resulta que da execução da operação urbanística em causa não decorrerão quaisquer prejuízos efetivos para o interesse público, nem os mesmos foram invocados na decisão impugnanda, sendo qualquer alegação pelo ICNB de interesses ambientais no local uma manifestação de hipocrisia, pois inexiste qualquer interesse ambiental concreto relevante a tutelar no local.
91ª- Desde logo porque, das decisões do próprio Parque Natural resulta que o loteamento da Autora, ora Recorrente, não punha em causa quaisquer interesses ambientais relevantes no local.
92ª - Por outro lado, os interesses ambientais que têm vindo a ser alegados pelo ICNB junto das instâncias judiciais, a existirem, foram há muito postos em causa e deixaram de existir em virtude da manifesta (e a olho nú visível) pressão urbanística existente à volta do terreno para o qual está licenciada a operação de loteamento, com centenas de construções aprovadas e consentidas ao longo de todos estes anos pelo Parque Natural da Arrábida, o que é facilmente constatável no local e nas fotografias aéreas que se juntam (cfr. documento nº 27 adiante junto e que aqui se dá por integralmente reproduzido).
93ª- A comprovar que os interesses ambientais não são postos em causa com obras como a da Autora está também a autorização dada à S............. não apenas para prolongar a exploração das pedreiras do O........ como para duplicar o volume de extração de tais das pedreiras (dr. documentos ns2 28, 29, 30, 31juntos com a PI). Tais pedreiras são ali ao lado e situam-se na mesma área protegida onde os alegados interesses ambientais são exatamente os mesmos!
94ª- Da ponderação de interesses que devia ter sido efetuada pela sentença recorrida resulta a conclusão de que o sacrifício imposto à Autora é manifestamente desproporcional aos interesses que se pretende tutelar, como bem se entendeu, aliás parecer jurídico nº 22/2008 do PNA no qual se afirma que "(...) não deixa de ser relevante, por um lado, o facto de a Exponente ser titular de uma licença de loteamento e, por outro, o sacrifício que lhe é imposto pela presente ordem de reposição e também tendo em conta os princípios da proporcionalidade e da boa-fé (arts. 5º e 6º-A do CPA)".
95ª - Acresce que, decorre expressamente da lei que a ordem de reposição e a ordem de demolição constituem a ultima ratio devendo sempre ser evitadas quando a operação urbanística reputada ilegal seja suscetível de legalização (cfr. artigo 106º, nº 2 do Decreto-lei nº 555/99).
96ª - Ao contrário do sustentado pelo Tribunal Recorrido, dos despachos objeto dos presentes autos não constam quaisquer factos ou normas jurídicas que permitam concluir pela insusceptibilidade de legalização da operação urbanística em causa, tendo-se o Réu limitado a afirmar de forma totalmente conclusiva que a obra não é suscetível de legalização.
97ª - Por outro lado, e como entendeu já o Venerando Supremo Tribunal Administrativo, para se concluir pela impossibilidade de legalização é necessário que se tenha iniciado, junto da entidade administrativa competente, um processo autónomo com vista a tal legalização e nele se tenha concluído pela impossibilidade de a mesma ocorrer.
98ª - Ou seja, a lei exige atualmente que a administração deve explorar de forma exaustiva a via da legalização em detrimento das medidas de reposição de legalidade mobilizando todos os esforços e tramites destinados a avaliar a possibilidade de manter, no todo ou em parte, a operação urbanística já concretizada, e só depois de uma conclusão definitiva e fundamentada sobre a insusceptibilidade de legalização nesse procedimento poderá ser determinada a demolição.
99ª - A legalização das operações urbanísticas pode ocorrer mediante a alteração do direito aplicável por efeito da alteração do quadro legal aplicável quando se esteja perante "... violação de normas de planos municipais cujo conteúdo tenha sido determinado no exercício de uma discricionariedade de planificação ...", assim como pode resultar da suspensão do plano (que só poderá ser decidida no âmbito de um procedimento de alteração ou de revisão) ou da sua alteração ou revisão.
100ª - Ou seja, inexistindo razões substanciais e apenas uma alegada razão de ordem totalmente formal (falta de publicação de um despacho que seria alegadamente condição de eficácia da classificação do solo) parece evidente que a legalização não apenas seria possível como se imporia no caso concreto.
101ª - Ao entender em contrário, a sentença recorrida, violou, por errada interpretação e aplicação os artigos 5º, nº 2 e 134º, nº 3 do CPA, o artigo 106º, nº 2 do RJUE e 266º, nº 2 da CRP.
102ª - Acresce ainda que, a questão da confiança legítima que a Autora, ora Recorrente, alegou nos autos não se refere, ao contrário da visão redutora do Tribunal Recorrido, à classificação dos solos. A questão da confiança refere-se -- e assim foi suscitada nos autos pela Autora - à confiança na validade do título jurídico de era detentora e no direito que o mesmo criou na sua esfera jurídica a construir nos seus terrenos nos moldes aprovados pelas entidades competentes, nomeadamente pelo Réu, ora Recorrido.
103ª - O que neste contexto releva é que a Autora, ora Recorrente, foi titular, durante duas décadas (desde 1989, data da emissão de licença, a 2008, data declaração de nulidade) de uma licença constitutiva de direitos. E, obviamente, o ordenamento jurídico não pode ser alheio e ignorar tal facto como se pretende na sentença sob recurso, quando, no âmbito do loteamento da Autora, o ICNB (então PNA) emitiu dois pareceres expressos afirmando que os terrenos a lotear se encontravam em área urbana, deixando assim que a autora confiasse na validade da sua licença, conformando a sua atuação em conformidade com tal convicção.
104ª- E, neste contexto, não pode naturalmente ser ignorado, como foi, o prazo de 10 anos previsto no nº 4 do artigo 69º do RJUE para instauração de ação de declaração de nulidade de atos de gestão urbanística, que é precisamente o prazo mínimo que deve ser considerado para efeitos de proteção da confiança.
105ª - Em face do enquadramento fáctico considerada na sentença recorrida, é inadmissível outro entendimento que não seja o de que decisão administrativa em causa nos autos padece irremediavelmente de vício de violação de lei por violação do princípio da boa-fé e da tutela da confiança.
106ª - Ao não entender assim, a sentença recorrida padece de manifesto erro de julgamento e violou de forma flagrante os artigos 2º, 11º e 266º, nº 2 da Constituição.
107ª - Também quanto ao vício de forma por falta de fundamentação andou mal a sentença recorrida, pois é manifesto que, ao não explicitar a razão ou razões pelas quais considerou improcedentes quer os argumentos expendidos pela Autora em sede de audiência prévia quer os argumentos constantes do parecer jurídico dos serviços do PNA, o despacho de 15.02.2008 violou de forma flagrante dos artigos 124º e 125º do CPA.
108ª - Por outro lado lado Pois, em face da existência de uma licença de loteamento emitida com parecer favorável do próprio Parque Natural da Arrábida, o ICNB teria que explicitar porque razão alterou o seu entendimento quanto à inclusão dos terrenos da Autora em área rural que foi o principal pressuposto da emissão da licença de loteamento, o que não fez. Tal explicitação veio apenas a ser feita a posterior, já em sede da contestação apresentada pelo ICNB nos presentes autos.
109ª - Finalmente, a decisão do ICNB nada diz sobre as razões que levaram o ICNB a concluir pela insusceptibilidade de legalização da operação de loteamento. Limitando-se a afirmar conclusivamente que "(...) os trabalhos efectuados são insusceptíveis de legalização não restando outra solução, senão a reposição do terreno nas condições pré-existentes. "
110ª - Em face de todo o exposto não podia a sentença recorrida ter deixado de reconhecer a validade da licença de loteamento concedida à Autora, ora Recorrente, tal como por esta foi requerido nos autos.
NESTES TERMOS,
Deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, revogando-se a sentença recorrida e, em consequência:
a) Deve ser admitida a junção aos autos do processo administrativo de loteamento que se encontra apenso ao processo cautelar nº1792/06.9BELSB;
b) Deve ser alterada a matéria de facto provada adiantando-se novos factos nos termos acima requeridos;
c) Devem ser anulados os atos impugnandos e reconhecida a conformidade da licença de loteamento emitida em 2 de março de 2015 com as disposições aplicáveis, nomeadamente as constantes da Portaria nº 26-F/80, e a consequente validade da licença de loteamento em causa.
Só assim se decidindo
SERÁ CUMPRIDO O DIREITO e
FEITA JUSTIÇA

Houve contra-alegações em que o recorrido INSTITUTO DA CONSERVAÇÃO DA NATUREZA E BIODIVERSIDADE, I.P., conclui da seguinte forma:
“1 º
A decisão recorrida não merece qualquer reparo ou censura, tendo o Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada decidido bem, quer de facto, quer de Direito, motivo pelo qual a mui douta motivação de Recurso apresentada pela recorrente, não detém qualquer fundamento.
A Sentença Recorrida não violou qualquer disposição legal, e muito menos carece de factos que não sejam suficientes para poder forma a sua convicção, bem pelo contrário.
O Tribunal aplicou correctamente o Direito, sem quaisquer juízos de valor ou desvalor ou vícios que originem a revogação de tal decisão.

Toda a prova foi devidamente valorada e devidamente conjugada.

Não tem razão a Recorrente quando alega que o despacho da Sra. Directora do Departamento de Gestão de Áreas Classificadas Litoral de Lisboa e Oeste, impugnado nos autos, fundamenta a ilegalidade da obra embargada com base em legislação posterior à data do facto relevante - a licença camarária de 02.03.89 e não o alvará de loteamento n.º …/2005, bastando para tal ler o teor do mesmo.
Quando a Sra. Directora do Departamento de Gestão de Áreas Classificadas Litoral de Lisboa e Oeste decidiu ordenar a reposição do terreno nas condições pré-existentes, fê-lo com os dois referidos fundamentos:

i) por um lado, à data da autorização camarária de 02.03.89, a violação da Portaria nº26-F/80, de 9 de Janeiro, na parte em que classifica a área em causa como rural, dependente de parecer prévio do Parque Natural da Arrábida, através da remissão expressa do seu art. 17º para o Dec.-Lei n.º 622/76, de 28 de Julho, que criou o Parque Natural da Arrábida e que classifica como rural, no seu mapa anexo, o terreno em causa;
ii) por outro lado, à data da emissão do Alvará n.º …/2005, de 24.11.2005, a violação do Plano Especial de Ordenamento, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 141/2005, de 23 de Agosto, na parte em que classifica a área em causa como rural e de protecção complementar, sendo que as áreas designadas por ''espaços de transição" no Plano Director Municipal de Sesimbra, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 15/98, de 2 de Fevereiro, são igualmente rurais porque não integram os perímetros urbanos definidos (Cfr. Processo Administrativo junto ao processo nº 1792/06.9BELSB -Vol. 2, fls. 103 e fls. 85-86).
E no próprio Plano Director Municipal de Sesimbra, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 15/98, de 2 de Fevereiro, a área em causa é (e mantém-se) rural, bem como o Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida classificaram a área em causa como solo rural.
O Recorrido /Parque Natural da Arrábida tinha todos os elementos necessários para decidir ordenar a reposição do terreno nas condições pré-existentes, como fez.
Acresce que, a licença de loteamento aqui em causa nestes autos encontra-se ferida de nulidade, por violação do diploma à data da prolação do acto autorizativo ("in tempus regit actum") e porque a nulidade é expressamente cominada pelo artigo 9º do Decreto-Lei nº 622/76, de 28 de Julho.
10º
Vício esse que continuou a ser cominado para os actos que não se conformem com os planos especiais de ordenamento do território (Cfr. artigo 103° do Decreto-Lei nº 380/99, de 22 de Setembro).
11º
Assim sendo, e ao contrário do que pretende a Recorrente, a inobservância do disposto no artigo 14° nº 2 da Portaria no 26-F/80, de 09 de Janeiro não gera mera anulabilidade, sanável pelo decurso do tempo, mas sim nulidade da licença de 1989 e de todos os actos sucessivos.

12°
E isto porque o parecer do Parque Natural da Arrábida e a licença de loteamento da Câmara Municipal de Sesimbra são nulos, na parte em que classificam a área como urbana e em que dispensam, por isso, o respectivo procedimento - nos termos dos arts. 12º e 14° n.º2 e 17° da Portaria nº26-F/80, de 9 de Janeiro, e do Dec.-Lei n.º 622176, de 28 de Julho, e que classificam como rural o terreno em causa.
13°
Nulidade essa expressamente prevista, à data da emissão daquele parecer do Parque Natural da Arrábida, no art. 9° do mesmo Dec.-Lei n.º 622/76, de 28 de Julho: «2. São nulas e de nenhum efeito as licenças municipais concedidas com violação do regime instituído neste decreto» - sublinhado nosso.
14º
Acresce ainda referir que, a Portaria 26-F/80, de 9 de Janeiro, que aprovou o Regulamento do Parque Natural da Arrábida, enquadra-se na noção de Plano Especial e nos seus objectivos, nos termos dos arts. 42° e 43º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, mas a tipicidade que este estipula vigora para o futuro, sendo tal Portaria, à data da ilicitude do acto em causa, o diploma jurídico que condicionava a edificação no Parque Natural da Arrábida - e tanto basta.
15°
Portanto, nessa data, às proibições constantes da Portaria 26-F/80, de 9 de Janeiro, de natureza imperativa, correspondiam as sanções expressas quer do regime geral do art. 294° do Código Civil (nulidade), para os negócios jurídicos de direito privado, quer do regime especial do art. 19° nº 5 do Decreto­ Regulamentar n.º 23/98, de 14 de Outubro (nulidade), para os actos administrativos, sendo que para estes tal regime corresponde à excepção prevista no art. 135° do Código do Procedimento Administrativo - «São anuláveis os actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção».
16°
Todavia, sem conceder, mas mesmo a entender-se que a Portaria nº 26-F/80, de 09 de Janeiro deva ser reconduzida a plano sectorial, a sua violação é, igualmente sancionada com a nulidade (Cfr. artigos 2° nº 2 alínea b) e 103° do Decreto-Lei nº 380/99, de 22 de Setembro), não se convalidando na ordem jurídica por força do decurso do prazo de um ano.
17º
Pois que "São nulos os actos praticados em violação de qualquer instrumento de gestão territorial aplicável." - Cfr. referido, na altura, artigo 103° e artigo 134º do Código do Procedimento Administrativo.
18°
O Recorrido jamais criou na Recorrente a confiança de que poderia proceder ao loteamento e de que se tratava de um loteamento em área rural.
19°
Não viola o acto aqui em causa os princípios da boa fé, da legalidade, da justiça e da proporcionalidade, nem tão pouco padece de falta de fundamentação.

*

Nestes termos e nos melhores de Direito e com o mui douto suprimento de V. Exas., não deverá o presente recurso merecer acolhimento, devendo, em consequência, ser mantida a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, nos precisos termos em que foi proferida, com todas as consequências legais, como é de Direito e de Justiça.

Neste Tribunal Central Administrativo, o Exmo. Procurador -Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.
*

Os autos vêm à conferência corridos os vistos legais.

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2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:

Na decisão recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:

A – Em requerimento subscrito por Maria ............. dirigido ao Presidente da Câmara Municipal de Sesimbra consta que quando adquiriu, em julho de 1983, o prédio rústico nº…, da Freguesia do Castelo, em Pedreiras, Sesimbra, este encontrava-se em perímetro urbano e que, por deliberação de 14 de junho de 1984, foi alterado o uso dos solos, “propondo retirar das zonas dadas como urbanas, “os terrenos baixos e as bacias onde existissem linhas de água” e incluíndo nestas a minha propriedade (…)”, cfr. Doc. 8, fls. 79 e 80 dos autos.

B - Em 1984-08-03, o Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza, submeteu a Proposta nº 280/84, sob o assunto: “PNA – Proposta de alteração dos perímetros urbanos no concelho de Sesimbra”, à consideração do Secretário de Estado do Ambiente, que abrangia o terreno da Autora cfr. Doc.24, fls. 144 e 145 dos autos.

C - Em 1984-08-28, o Secretário de Estado do Ambiente proferiu despacho de concordância com a proposta supra, cfr. Doc.24, fls. 144 dos autos.

D - Em 1986-07-18, o Vereador substituto do Presidente da Câmara, B............., dirigiu ao Diretor do Parque Natural da Arrábida, o ofício com o nº ............., sob o assunto: “Alteração aos perímetros urbanos na parte do Concelho de Sesimbra sob jurisdição do P.N.A.”, cujo teor é o seguinte:
“1 – Em Junho de 1984 a C.M.S. solicitou ao P.N.A. redefinição dos perímetros urbanos, na parte do Concelho sob a sua jurisdição.
2 – No estudo de alteração então apresentado e posteriormente aprovado, procurou-se não aumentar a área urbana total, já anteriormente definida, mas sim redefinir os seus contornos, de forma mais consentânea com a realidade. Tal objectivo levou a que se retirassem das zonas urbanas, alguns terrenos com aptidão para construção para que a área total não fosse aumentada.
3 – Está neste caso a Srª. D. Maria ............., cujo terreno à data da compra, estava parcialmente abrangido por zona urbana, e que após a redefinição dos perímetros, ficou totalmente em área rural. (…)
4 – Porque o terreno em questão, tem parcialmente aptidão para construção, solicitamos a V. Exª. que seja reposto o anterior perímetro urbano em vigor até Junho de 1984, na parte que abrange o terreno em causa.
Junto se envia uma planta à escala 1/5000, assinalando a vermelho a área que se pretende integrar em zona urbana.
(…)”., cfr. Doc. 9, fls. 81 e 82 dos autos.

E - Em 1986-07-28, o Instituto Nacional de Investigação Agrária e de Extensão Rural do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, através de ofício com o nº de saída …, sob o assunto: “Reserva Agrícola (Decº-Lei 451/82) Parecer técnico sobre um terreno sito em O........., freguesia do Castelo, concelho de Sesimbra, inscrito sob o nº …, secção F-…. Maria .............” comunicou que:
Relativamente ao assunto acima referenciado informamos V. Exa. que os solos que pretende utilizar para os fins requeridos se incluem na Reserva Agrícola, na parte da mancha colorida a verde, conforme definido no Decº-Lei 451/82, de 16 de Novembro, pelo que se lhes aplica o regime estabelecido no nº1 do artigo 3º do referido diploma legal.
Na restante área, não colorida, os solos não se incluem na Reserva Agrícola, pelo que sob o ponto de vista dos solos nada temos a opor.”, cfr. Doc. 11 fls. 89 e 90 dos autos.

F – O Conselho Geral do Parque Natural da Arrábida, consultado, deliberou em 21 de novembro de 1986 a inclusão dos terrenos em perímetro urbano, conforme consta da ata nº 32, cujo teor se transcreve por extrato:
“…
O presidente do Conselho geral, Engº. M............. (…) deu início à reunião apresentando a ordem de trabalhos que consistia na apreciação de propostas de alteração de perímetros urbanos por iniciativas da Câmara Municipal de Sesimbra e da Câmara Municipal de Palmela.
A proposta da Câmara Municipal de Sesimbra consistiu na apreciação da reposição de um terreno rural em zona urbana, cujo estatuto tinha sido alterado na revisão quinquenal de 1984, por iniciativa da respectiva câmara municipal e devidamente estudada pelo Parque Natural da Arrábida e aprovada pelo seu Conselho Geral. No entanto, a Câmara Municipal de Sesimbra, cometeu o lapso de não publicar os respectivos Editais dando publicidade a essa decisão. Desse modo, a actual proposta da Câmara Municipal de Sesimbra a apreciar neste Conselho Geral, tem como base a reclamação da proprietária de um desses terrenos, que em 1984 passaram de rurais a urbanos sem que tivesse sido dada publicidade a essa decisão.
Apresentou-se nesta reunião o parecer do consultor jurídico do Serviço Nacional Parques, Reservas e Conservação da Natureza oficio nº ........) que considera legal a apreciação excepcional de alterações a perímetros urbanos fora das respectivas revisões quinquenais de planos não aprovados superiormente.
A pedido do Presidente do Conselho Geral o Arquitecto E............. localizou o terreno em questão e apresentou o parecer técnico deste Parque Natural segundo o qual não se vê objecção a pôr à referida petição (Ofício ........).
(…)
A apreciação dessa proposta levou a um vivo debate e finalmente chegou-se, por unanimidade, ao seguinte consenso:
- Aprovação, a título excepcional da proposta da Câmara Municipal de Sesimbra de modo a repor como urbano o terreno da requerente Maria ............. alertando para a necessidade de, utilizando os meios legais ao seu dispor, a Câmara Municipal tomar as respectivas precauções de modo a que esta situação não seja generalizada.
- Quando vier o respectivo pedido de viabilidade de loteamento ao Parque Natural da Arrábida, este fará acompanhar a sua resposta do parecer emitido pelo Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal ou do Serviço Regional de Arqueologia da Zona Sul do Instituto Português do Património Cultural.
(...)", cfr. Doc. 10, fls. 83 a 88 dos autos.

G – Em 1986-12-09, o Diretor do Parque Natural da Arrábida remeteu ao Presidente do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza o ofício refª. CO/…-86, sob o assunto: “Alterações aos perímetros urbanos de Palmela, Cabanas (Palmela) e Pedreiras (Sesimbra)”, cujo teor é o seguinte:

“Junto envio a V. Exª. a proposta de alterações dos perímetros urbanos de Palmela,
Cabanas (Palmela) e Pedreiras (Sesimbra).
Foi feito o estudo destas alterações, conjuntamente por técnicos deste Parque Natural e pelos técnicos da Câmara Municipal de Palmela e Sesimbra.
Como há alterações ao Ordenamento Prévio do Parque Natural da Arrábida, aprovado em 17 de Agosto de 1979, por Excelência o Secretário de Estado de Urbanismo e Ambiente, solicito se digne apresentar a proposta a Sua Excelência o Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais, para despacho.
Junta-se a acta do Conselho Geral do Parque Natural Arrábida com a sua deliberação.

(…)

Anexo:
Fotocópia das folhas informativas
das Alterações dos perímetros urbanos de Palmela, Cabanas e Sesimbra Acta nº 32 do Conselho Geral e
Informação nº 119/86.”,

Cfr. fls. Doc.23, fls. 132 a 142 dos autos.

H - Em 1986-12-23, o Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais aprovou a inserção do terreno da Autora, no perímetro urbano, através do despacho “Concordo”, aposto no ofício supra datado de 1986-12-09, cfr. Doc. 23, fls. 132 e Doc. 25, fls. 150 dos autos.

I - A seguir ao despacho acima referido, mais consta no mesmo ofício de 1986-12-09:
Comunique-se o despacho SERN ao PNA e arquive-se. 86.12.23”, cfr. Doc. 23, fls. 132 dos autos.

J - A deliberação do Conselho Geral do PNA constante da ata nº 32 foi comunicada à Câmara Municipal de Sesimbra por ofício de 1986-12-22, cfr. Doc. 9 e 10, fls. 83 a 88 dos autos.

K - Em 1986-12-31 deu entrada nos serviços do PNA o ofício nº 5023 do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza dirigido ao Direto r do Parque Natural da Arrábida, sob o assunto: “Alterações aos perímetros urbanos de Palmela, Cabanas (Palmela) e Pedreiras (Sesimbra)” que remeteu, em anexo: “Fotocópia do v/ofº. …/9.5. de 9 de Dezembro, com o respectivo despacho”, cfr. Doc. 23, fls. 131 e 132 dos autos.

L - Em 1986-12-30, no ofício nº 5023 foi ordenada a comunicação do despacho do Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais às respetivas Câmaras, cfr. Doc.23, fls. 131 dos autos.

M - Em 1987-02-17, Maria ............. apresentou pedido de viabilidade de loteamento para o prédio rústico nº … sito em Pedreiras de Sesimbra, Freguesia do Castelo, em Sesimbra, com a área de 80000m2, cfr. Doc. 5, fls. 73 e 74 dos autos.

N – Em 1987-03-20, o Presidente da Câmara Municipal de Sesimbra proferiu despacho relativamente ao Requerimento nº ........ de 26-02-87 apresentado por Maria ............., cfr. Doc.6, fls.75 dos autos.

O – Em 1987-03-26, o Presidente da Câmara Municipal de Sesimbra dirigiu a Maria ............., o ofício Refª. ........, sob o assunto: “Processo de loteamento nº ........ – Reqtº. ........ de 26.02.87 – Viabilidade de loteamento”, cujo teor é o seguinte:
“Para conhecimento de V. Exª., cumpre-me transcrever o despacho de 20.03.87, que recaiu no processo em epígrafe:
“Transmita-se o parecer técnico, com o qual de concorda.”
PARECER TÉCNICO
1– A parte do terreno representada a tracejado azul na planta anexa encontra-se em zona urbana.
2– Não se vê inconveniente no loteamento na parte do terreno acima referida condicionado a:
2.1– Lotes destinados a moradias unifamiliares isoladas e ou em banda.
2.2– Número máximo de pisos: um ou dois só nos casos em que o declive do terreno o justifique.
2.3. Densidade máxima, referida à parte do terreno abrangida pela zona urbana: 80 habitantes/ha.
3– Esta viabilidade não dispensa outros condicionalismos eventualmente exigidos pelo Parque Natural da Arrábida, quando da apresentação do projecto de loteamento.”
Cfr. Doc. 6 e 7, fls. 75 e 76 dos autos e fls. 1952 do PA.

P - Em 1987-03-26, o Presidente da Câmara Municipal de Sesimbra dirigiu a Maria ............., o ofício Refª. ........, sob o assunto: “Processo de loteamento nº ........ – Reqtº. ........ de 26.02.87 – Viabilidade de loteamento”, com teor idêntico ao ofício supra, cfr. fls. 1951 do PA.

Q – Em 1988-03-18, a Autora requereu a aprovação da operação de loteamento, através de requerimento ao qual foi dado o nº ........ – proc. ........, tendo sido objeto do seguinte Parecer Técnico dos serviços do D.A.U.:
“Apreciação
Considerando que:
1. (…)
2. A parte do terreno que se pretende lotear situa-se em zona urbana segundo os perímetros urbanos do Parque Natural da Arrábida.
3. O loteamento versa a criação de 58 fogos e apresenta uma densidade de 68 habitantes/há.
4. O projecto respeita a viabilidade concedida em 20/3/84 (proc. ........), pela C.M.S. Sugere-se:
(…) ser enviado previamente a DGOT e PNA.”, cfr. Doc. 14, fls. 96 dos autos.

R – Em 1988-06-28, a Comissão de Coordenação da Região de Lisboa e Vale do Tejo, através do ofício nº ........, remeteu ao Presidente da Câmara Municipal de CRLVT a informação DPF ......../88, de 21 de junho de 1988 sobre o Loteamento nos Lugares do P........ e O........, da qual consta “parecer favorável sem prejuízo dos pareceres das demais entidades (…)”, cfr. Doc. 12, fls. 91 a 93.

S – Através do ofício nº ......../SA/DAU, a Câmara Municipal de Sesimbra consultou o Parque Natural da Arrábida (PNA), sobre o “Processo de Loteamento nº ........”, cfr. Doc. 13, fls. 94.

T - A cópia do ofício nº ......../SA/DAU, da Câmara Municipal de Sesimbra que solicitou parecer ao Parque Natural da Arrábida (PNA), não apresenta data do envio, cfr. Doc.13, fls. 94.

U - Em 1988-05-24, o Diretor do Parque Natural da Arrábida (PNA) remeteu ao Presidente da Câmara Municipal de Sesimbra, o ofício Refª. AO/........86, sob o assunto: “Processo de loteamento nº ......... Req. Maria .............”, do qual consta: “…
1 – O loteamento localiza-se em área urbana.
2 – Concordando na generalidade com o projecto de loteamento: no entanto face às características da área a lotear, deverá ser pedido Estudo Prévio de Arquitectura nomeadamente nas zonas de implantação por banda e geminadas, para que a área possa ter uma visão de conjunto.
3 – Assim (…) de autorizar o deferimento da pretensão, (…) condicionando-se à apresentação dos elementos atrás expostos (…) deverá ser o Museu de Arqueologia e Etnografia (…) igualmente consultado.”, cfr. Doc. 14, fls. 95 dos autos.

V – Em 1989-03-02, a Câmara Municipal de Sesimbra deliberou a aprovação do loteamento, cfr. fls. 1949 do PA.

W-A decisão de aprovação do loteamento de 1989-03-02 foi comunicada a Maria ............., através do ofício nº…, sob o assunto: “Proc.º do loteamento nº ......... – Reqtº. ......... de 18.3.88 P......... e O.........”, cujo teor é o seguinte: “…
“Informo V. Exª. que o processo acima referido foi apreciado em reunião de Câmara de 2.3.89, tendo merecido a seguinte deliberação:
A Câmara deliberou, por unanimidade, tendo em vista o parecer do Departamento de Administração e Planeamento Urbanístico, autorizar sob a forma de processo ordinário o licenciamento do loteamento do prédio em causa, de acordo com as condições definidas no mesmo e as que vierem a ser estabelecidas aquando da aprovação do projecto das obras de urbanização.
PARECER DO D.A.P.U.
“…3.1. – Entrega dum estudo-prévio das moradias em banda incluindo variantes para as moradias das extremas das bandas ou apresentação dum regulamento desenhado para as mesmas;
3.2. entrega dos projectos das infraestruturas;
3.3. garantir à E.D.P. a execução das obras de electrificação consideradas necessárias
(…)
3.4. reserva de um lote para instalação de fossa colectiva (…);
3.5.cedência para o domínio público municipal da área de 7.280m2 correspondente a arruamentos e passeios;
3.6. cedência para o domínio privado municipal dos lotes 14 e 15 e 42 a 58 (total de
3.115 m2) calculado de acordo com os pontos 4º e 5º da Portaria 230/85 de 24 de Abril, que estabelece os critérios de compensação ao município pela realização de infraestruturas urbanísticas (…)”, cfr. Doc. 15, fls. 97 e 98 dos autos e fls. 1948 a 1947 do PA.

X - Em 1993-05-28 deu entrada na Câmara Municipal de Sesimbra reclamação de Maria ............. dirigida ao Presidente em que a subscritora apresentou pronúncia após consulta da “Proposta de Plano Director Municipal”, na qual pode ler- se: (…)

10 - Ora sucede que na proposta de Plano Director Municipal apresentada, tais prédios foram excluídos do perímetro urbano, violando assim o direito adquirido pela requerente com a deliberação que autorizou o licenciamento do loteamento dos prédios.
11 – Termos em que deve a proposta de Plano Director Municipal apresentada ser alterada em conformidade com a deliberação de 2/3/89, que aprovou o licenciamento do loteamento da ora requerente.”, cfr. fls. 1956 a 1947 do PA.

Y – Em 2001-01-24 foi proferido acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo que não deu provimento ao recurso interposto pela Câmara Municipal de Sesimbra contra Maria ............., no qual se lê:
“Exposto o quadro factual, cabe referir que o thema decidendum se cinge à controvérsia entre a loteadora e a Câmara Municipal quanto ao segmento do acto administrativo que se reporta à cedência “ para o domínio privado municipal” de determinados lotes, por aplicação da Portaria nº 230/85, de 24 de Abril (…).
Temos, pois, que quanto à autorização, em si, do loteamento requerido, ela escapa, naturalmente, à controvérsia.(…)”, cfr. Doc. 16, fls. 99 a 107 dos autos.

Z – Em 2001-03-27, a Autora requereu a execução do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo tendo exposto o seguinte: “…

6. A referida decisão judicial transitou já em julgado, pelo que, incumbe à Câmara Municipal de Sesimbra proceder à respectiva execução, (…)

7. No caso concreto, o dever de executar a referida sentença passa pela reforma da deliberação de 2 de Março de 1989, na parte relativa à cedência, determinando-se a respectiva compensação em numerário, de acordo com a Portaria nº 230/85, de 24 de Abril, e demais legislação em vigor àquela data, (…).

8. Por outro lado, a requerente deu cumprimento às restantes condições apostas ao acto de licenciamento da operação urbanística, tendo apresentado todos os projectos de infra-estruturas (obras de urbanização) necessários à execução da operação de loteamento. Ora, na parte do acto não impugnada - o deferimento do pedido de loteamento - o recurso contencioso interposto pela requerente não suspendeu os seus efeitos, nomeadamente quanto aos prazos de decisão. Não obstante, nunca foi proferida qualquer decisão no processo em causa. Pelo que, tendo decorrido o prazo previsto no art. 39º, nº1 do Decreto-Lei n.° 400/84, de 31 de Dezembro, as obras de urbanização encontram-se tacitamente aprovadas, requerendo-se desde já, a emissão do competente alvará.

9. A célere execução de sentença por parte da Câmara consubstancia um direito da ora requerente, sem prejuízo de outros, nomeadamente, os relativos à reparação dos prejuízos entretanto sofridos com o atraso na emissão do alvará necessário ao início das obras de execução da operação urbanística aprovada.

NESTES TERMOS:
a) Requer-se seja dado integral cumprimento ao Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24 de Janeiro de 2001, fixando-se a compensação em numerário, devida nos termos das disposições constantes do art. 43° do Decreto-Lei n.° 400/84 e da Portaria nº 230/85;
b) Mais se requer que, em face da aprovação tácita das obras de urbanização, seja emitido o respectivo alvará de loteamento;
c) (…)”.
, cfr. Doc. 17, fls. 108 a 112 dos autos.

AA - Em 2002-06-19 foi proferido acórdão pela formação do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo, transitado em 2002-07-04, que julgou não verificada a alegada oposição de julgados suscitada pela Câmara Municipal de Sesimbra, dizendo-se inconformada com o acórdão da Secção de Contencioso Tributário de fls. 276 e segs, de 24/01/2001, e que deu o recurso por findo, cfr. Doc.18, fls. 113 a 119 dos autos.

AB – Em 2005-04-01, a Câmara Municipal de Sesimbra remeteu a L............. o ofício nº ......../2005/GJ/DAJC, sob o assunto: “Processo de loteamento nº ........ – Cálculo de Taxas”, para pronúncia, no prazo de 10 dias, cfr. Doc. 19, fls. 120 a 121 dos autos.

AC – Em 2005-07-29 foi elaborada a Proposta para deliberação em reunião de câmara de 3 de agosto de 2005, sob o assunto:
“Processo de Loteamento Urbano nº ........ P........ – Castelo – Sesimbra
Reqtº. nº ........ de 20.04.05
A............., S.A.
“Aprovação do projecto das obras de urbanização – condições de alvará”, cujo teor é o seguinte:
“ Em reunião de dois de Março de mil novecentos e oitenta e nove, a Câmara deliberou por unanimidade, autorizar o licenciamento do loteamento do prédio em causa nos termos do parecer técnico e demais condições a fixar aquando da aprovação do projecto das obras de urbanização.
Assim, considerando os pareceres técnicos emitidos relativamente ao projecto, PROPONHO que a Câmara delibere o seguinte:
1 - Aprovar o projecto das obras de urbanização.
2 -Autorizar a emissão do alvará de loteamento do prédio acima referido em conformidade com os elementos constantes da planta síntese, com as seguintes prescrições:
- constituição de 58 lotes, correspondendo a 57 fogos;
- cedência para o domínio público municipal da área de 7280 m2, destinada a arruamentos e passeios;
- cedência para o domínio privado municipal da área de 3950 m2, destinada a equipamentos;
- fixar o prazo de 12 meses para a realização das obras de urbanização;
- deve ser prestada caução nos termos do artigo 54°. do Decreto - Lei n° 555/99, de 16 de Dezembro com a redacção do Decreto - Lei nº. 177/01 de 4 de Junho) no valor de 338.000,00€, destinada a assegurar a boa e regular execução das obras;
pagamento da taxa prevista no artigo 43°. do Decreto - Lei n°. 400/84, de 31 de dezembro, no valor de 84.474,47 €, acrescendo a publicação no Diário da República, conforme ficha de liquidação constante do processo.

3 - As obras de urbanização constam de:
1. Execução de arruamentos constituídos por duas camadas de sub-base e base com 0.15m de espessura cada, pós recalque e revestimento com tapete betuminoso com 0.06m, incluindo rega de colagem;
2. Execução de arruamento em calçada grossa de calcareo;
3. Execução de lancil em calcareo;
4. Execução de passeios em pedra miúda de calcário;
5. Execução da rede de águas, rede de rega e rede de incêndio;
6. Execução da rede de drenagem de águas residuais domésticas;
7. Execução da rede de drenagem de águas residuais pluviais;
8. Execução de sinalização vertical e horizontal em conformidade com especificações camarárias;
9. Execução de arranjos exteriores;
10. Localização e fornecimento de contentores;
11. Execução de rede eléctrica e rede de iluminação pública, devendo ser respeitadas as condições impostas pela SLE;
12. Execução de rede de telecomunicações;
A revisão geral dos projectos das obras de urbanização, em colaboração com os Serviços Técnicos, será entregue no prazo de 6 meses após a emissão do respectivo alvará de loteamento.”, cfr. Doc. 20, fls. 122 a 125 dos autos.

AD - Em 2005-08-03 a proposta supra foi aprovada por unanimidade por deliberação Camarária, tendo a Câmara Municipal de Sesimbra autorizado a emissão do Alvará de loteamento nº …/2005, e aprovado o projeto das obras de urbanização, cfr. idem.

AE - Em 2005-08-04, o Presidente da Câmara Municipal de Sesimbra dirigiu a A............., S,A, o ofício nº ......../2005/DPU sob o assunto:
“Processo de Loteamento Urbano nº ............. P........ – Castelo – Sesimbra Reqtº. nº ........ de 20.04.05
“Aprovação do projecto das obras de urbanização – condições de alvará”, que comunicou a deliberação de 3 de agosto de 2005, cfr. Doc. 20, fls. 122 dos autos.

AF - Em 2005-09-30, a A............., S.A. requereu a passagem do alvará de loteamento, tendo comprovado o pagamento das taxas pela guia nº ............., no valor total de €84.535,07 e junto documentação identificada no requerimento, cfr. Doc.21, fls. 126 e 127 dos autos.

AG - O alvará de loteamento nº …/2005, datado de 24 de novembro de 2005 foi emitido pela Câmara Municipal de Sesimbra, no processo nº ........, e no qual consta:
Nos termos do Decreto-Lei nº 555/99, de 16 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 177/95, de 04 de Junho, em nome de A............., S.A., com sede na Avenida ............., nº 61, 1º, esq., em Lisboa, pessoa colectiva nº ............., é emitido o alvará de loteamento nº …/2005, a que diz respeito o processo nº ........, através do qual é licenciado o loteamento e as respectivas obras de urbanização que incidem sobre os prédios sitos em P........ e O........, freguesia de Sesimbra (Castelo), concelho de Sesimbra, descritos na Conservatória do Registo Predial de Sesimbra sob os n.ºs ............. e ............. da freguesia de Sesimbra (Castelo) e inscritos na matriz sob os artigos ….°, Secção … e ….°, Secção F-…, da mesma freguesia.
O loteamento, aprovado pela deliberação camarária de 02 de Março de 1989, e os projectos definitivos das obras de urbanização, aprovados na reunião camarária realizada em 03 de Agosto de 2005, cumprem o disposto no Plano Director Municipal e apresentam, de acordo com a planta anexa, as seguintes características:
Área total dos prédios - 84.570 m2;
Área dos prédios a lotear - 29.498,50 m2; Área total de construção - 11.422 m2;
Número de lotes - 58 (cinquenta e oito) lotes, correspondendo a 57 fogos, destinados a habitação;
(…)
Condicionantes de licenciamento:
a) Cedência para o domínio público municipal da área de 7.280 m2, destinada a arruamentos e passeios;
b) Cedência para o domínio privado municipal da área de 3.950 m2 destinada a equipamentos;
c) Localização e fornecimento de contentores;
d) A revisão dos projectos das obras de urbanização, em colaboração com os Serviços Técnicos, será entregue no prazo de seis meses após a emissão do presente alvará;
e) Para a conclusão das obras de urbanização é fixado o prazo de 12 meses, após a aprovação da revisão geral dos projectos de especialidades; (…)”, cfr. Doc.4, 71 e 72 dos autos.

AH - Em 2006-09-22, a A............., S.A., interpôs no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, a ação administrativa especial contra o ICN – Instituto de Conservação da Natureza, que tramita sob o nº 841/06.5 BEALM, na qual vem formulado o seguinte pedido:
“…
A) … declarando-se a nulidade ou, assim não se entendendo, anulando-se a deliberação da Comissão Directiva do Parque Natural da Arrábida, datada de 5 de Junho de 2004, que determinou à Autora o embargo “de todas as obras de demolição ou trabalhos de movimentação de terras que estejam a ser realizados em P........ e O........, no concelho de Sesimbra”.
B) Deve ainda o Réu ser condenado a ressarcir a Autora dos prejuízos sofridos com consequência da prática do acto administrativo ilegal, ainda não totalmente apurados e a liquidar em incidente de liquidação de sentença.”, cfr. certidão da petição inicial de fls. 391 a 434.

AI - A ação administrativa especial nº 841/06.5 BEALM está apensa à ação administrativa comum 438/05.7 BEALM interposta por Maria ............. contra o Município de Sesimbra que foi objeto de sentença, atualmente em fase de recurso, e na qual foi formulado o seguinte pedido: “…
A)A título de indemnização por lucros cessantes, a quantia já provisoriamente apurada de 399.653,54€ (trezentos e noventa e nove mil seiscentos e cinquenta e três euros e cinquenta e quatro cêntimos), e a liquidar em sede de incidente de liquidação nos termos do disposto nos artigos 471º/1 b)/2 e do Código de Processo Civil e 569º do Código Civil; B)A título de indemnização por danos patrimoniais, o montante a liquidar, resultante das despesas com o patrocínio do recurso contencioso de anulação, do procedimento de emissão do alvará e da presente acção;
C) A título de indemnização por danos morais, 25.000,00€(vinte e cinco mil euros);
D) Os juros de mora que se vencerem desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.”, cfr. SITAF

AJ - O processo cautelar nº 1792/06.9 BELSB encontra-se apenso à ação administrativa comum nº 438/05.7 BEALM, cfr. SITAF.

AK - Os processos cautelares nºs 841/06.5 BEALM-A e 146/07.4 BEALM, tramitaram por apenso à ação administrativa especial nº 841/06.5 BEALM, cfr. SITAF.

AL - Em 2007-12-03 foi dirigido à Autora, pelos serviços do Parque Natural da Arrábida, o ofício Refª. Proc. AO/……./86, sob registo com aviso de receção, relativo ao assunto: “Reposição do terreno nas condições pré-existentes” com o seguinte teor: “…

1º - A............. SA é proprietária de um prédio rústico sito em P........ e O........, freguesia de Sesimbra (Castelo), concelho de Sesimbra, descrito na Conservatória do Registo Predial de Sesimbra, sob os nºs ............. e ............. da freguesia de Sesimbra (Castelo) e inscrito na matriz sob os artigos …º, Secção … e …º, Secção F-…, da mesma freguesia.

2º - É titular do alvará de loteamento nº …/2005, de 16 de Dezembro, e todavia, o loteamento em questão situa-se em área rural, contrariando o disposto no artigo 14º nº 2 da Portaria 26- F/80, de 9/01, onde apenas se permite a construção de edifícios destinados ao apoio das explorações agrícolas, florestais e ou de recreio, com um índice de utilização fundiário de 0,004/ha, com um máximo de 200m2 reservados para as habitações patronais.

3º - O POPNA (RCM n° 141/2005, de 23/08) não admite loteamentos nas áreas de protecção complementar (arts 18° a 22° do POPNA).

4ª - O loteamento titulado pelo Alvará nº …/2005 viola o regulamento do plano preliminar do Parque Natural da Arrábida (art. 14º, n° 2 da Portaria n° 26-F/80, de 9/01), entretanto revogado pelo POPNA.

5º - E viola o POPNA, plano especial de ordenamento do território, com a consequente nulidade prevista no art. 68º, al. a) do DL nº 555/99, de 16 de Dezembro e art. 2º, nº2, al. c) do DL nº 380/99, de 22/09 e art. 103º do DL nº 380/99, de 22/09.

Assim, em face do que antecede os trabalhos efectuados são insusceptíveis de legalização não restando outra solução, senão a reposição do terreno nas condições pré- existentes.

Pelo que, deverá a A............., SA, repôr as condições do terreno nas condições pré-existentes, no prazo de 45 dias, por os trabalhos efectuados violarem o disposto nos artigos 18º a 22º do POPNA (RCM nº 141/2005, de 23/08).

Esta ordem é precedida da audição da Interessada, a qual dispõe de quinze dias úteis, a contar da data da sua notificação, para se pronunciar sobre o conteúdo da mesma (art. 100º e 101º do CPA). “, cfr. Doc. 2, fls. 55 e 56 dos autos e fls. 1939 e 1938 do PA em apenso.

AM - A Autora apresentou a sua pronúncia dirigida à Diretora do Departamento de Gestão de Áreas Classificadas Litoral de Lisboa e Oeste, cfr. Doc. 3, fls. 57 a 68 dos autos e fls. 1986 a 1975 do PA em apenso.

AN – Em 2008-01-23, foi elaborada a Informação nº 22/2008 pela Consultora Jurídica do Departamento de Gestão das Áreas Classificadas – Litoral de Lisboa e Oeste do ICNB, sob o assunto: “Reposição do terreno nas condições pré-existentes Interessada: A............., SA”, na qual se pode ler:
“…
I. Projecto de decisão de ordem de reposição do terreno nas condições pré- existentes

(…) Tal projecto de decisão continha a seguinte fundamentação de facto e de direito:

1° A............., SA é proprietária de um prédio rústico, sito em P........ e O........, freguesia de Sesimbra (Castelo), concelho de Sesimbra, descrito na Conservatória do Registo Predial de Sesimbra sob os nºs ............. e ............. da freguesia de Sesimbra (Castelo) e inscrito na matriz sob os artigos …º, Secção … e …º, Secção F-…, da mesma freguesia.

2º É titular do alvará de loteamento no…/2005. de 16 de Dezembro, e todavia, o loteamento em questão situa-se em área rural, contrariando o disposto no art.14°. nº2 da Portaria nº26 F/80 de 9/01, onde apenas se permite a construção de edifícios destinados ao apoio das explorações agrícolas, florestais e ou de recreio. com um índice de utilização fundiário de 0,004/ha, com um máximo de 200m2 reservados para as habitações patronais.

3º O POPNA (RCM nº141/2005, de 23/08) não admite loteamentos nas áreas de protecção complementar (arts. 18º a 22º do POPNA).

4° O loteamento titulado pelo alvará nº …/2005 viola o regulamento do plano preliminar do Parque Natural da Arrábida (art.14°, nº2 da Portaria nº 26-F/80 de 9/01) entretanto revogado pelo POPNA.

5° E viola o POPNA, plano especial de ordenamento do território, com a consequente nulidade prevista no art.68°, al. a) do DL nº 555/99, de 16 de Dezembro e art. 2º, nº2, al. c) do DL nº 380/99, de 22/09 e art. 103° do DL nº380/99, de 22/09.

Assim, face ao que antecede os trabalhos efectuados são insusceptíveis de legalização, não restando outra solução, senão a reposição do terreno nas condições pré-existentes.

Assim, deverá a A............., SA, repor as condições do terreno nas condições pré-existentes, no prazo de 45 dias, por os trabalhos efectuados violarem o disposto nos arts. 18º a 22º do POPNA (RCM nº 141/2005, de 23/08).

Deve ainda informar-se de que esta ordem é precedida da audição da interessada (…).

II. Pronúncia da interessada “A............., SA”

Veio, a Exponente, grosso modo, alegar o seguinte:

1º “A licença da exponente data de 1989. Pelo que o POPNA, bem como os diplomas invocados no acto impugnando para fundamentar a nulidade - Decreto-Lei nº555/99 e Decreto-Lei nº 380/99 – não estavam em vigor à data da emissão da licença de loteamento da exponente e não são aplicáveis retroactivamente como é óbvio (...)"

“Assim, e atendendo à data da emissão da licença de loteamento e ao princípio tempus regit actum, uma eventual ordem de reposição fundamentada naquelas disposições legais é totalmente desprovida de sentido, padecendo irremediavelmente de vício de violação de lei por erro nos seus pressupostos de facto e de direito.”

“(...) a alegada ilegalidade da licença por o loteamento se encontrar em área rural teria necessariamente que fundamentar-se numa eventual ilegalidade do despacho do Sr. Secretário de Estado que aprovou a inclusão dos terrenos da exponente no perímetro urbano do PNA. Pois foi nesse despacho que se baseou a aprovação do loteamento e o parecer favorável do PNA emitido no âmbito do processo de loteamento."

“Mesmo admitindo a violação da disposição invocada da Portaria 26-F/80 - o que se impugna e em mera hipótese académica se pondera - tal violação não gera nulidade como aliás decorre do próprio projecto de ordem de reposição do terreno do qual expressamente decorre a alegação de de nulidade apenas por violação do POPNA e não por violação da Portaria 26-F/80."

“Ora, no caso concreto do plano de ordenamento preliminar e do regulamento publicados pela Portaria nº26-F/80, de 9 de Janeiro, esse acto de recondução nunca chegou a ser praticado (cfr. Doc. 1 …). O que significa que estamos perante um plano sectorial ( ... ). Tratando-se de um plano sectorial ele não dispõe de eficácia plurisubjectiva (...) Aliás em coerência com o que se acabou de afirmar, o artigo 68º do RJUE, na sua alínea a), apenas comina com a nulidade, os actos de licenciamento urbanístico que violarem “o disposto em plano municipal de ordenamento do território, em plano especial de ordenamento do território, medidas preventivas ou licença ou autorização de loteamento”, exceptuando, portanto, qualquer eventual violação de plano sectorial.”

“Na esteira do exposto, forçoso se torna considerar que caso o acto de licenciamento camarário eventualmente tivesse implicado qualquer hipotética violação do dito plano preliminar – o que só a título de mera hipótese se pondera, sem conceder, tanto mais que já se logrou demonstrar que a licença de construção não belisca qualquer parâmetro material que deva ser usado para efeitos de aferir a respectiva validade – mesmo nessa hipótese, tal nunca teria por efeito a nulidade desse acto autorizatório (v. art. 68º/a) do RJUE), mas tão só a sua mera anulabilidade (cfr. art. 135º do CPA).”

Finalmente, o projecto de ordem de reposição do terreno padece ainda de ilegalidade ao afirmar que o loteamento não é susceptível de Legalização (...) Assim sendo, o ICNB encontra-se legalmente vinculado a explicitar as razões de facto o de direito que determinam tal impossibilidade de legalização, dever que não cumpriu no caso sob Júdice pois, não só não faz qualquer apreciação sobre os factos que o levam a concluir pela violação do POPNA e da Portaria 28-F/80, como nada diz sobre as razões que o levam a concluir pela insusceptibilidade de legalização da operação de loteamento. Limitando-se a afirmar conclusivamente que “(…) os trabalhos efectuados são insusceptíveis de legalização não restando outra solução, senão a reposição do terreno nas condições pré-existentes."

III. Análise

1- No projecto de decisão ora objecto das considerações da interessada, foram pressupostos de facto e de direito a situação da propriedade em área rural e não área urbana, ao contrário do que entende a A.............. Ou seja, considera-se que tanto a Portaria nº26-F/80 de 9/01, como o POPNA classificaram aquela área como solo rural. O despacho do Secretário de Estado, salvo melhor entendimento, constitui um elemento histórico de interpretação, importante, no entanto esse despacho, por mais considerações que possam ser tecidas, objectivamente nunca passou disso mesmo, um despacho sem eficácia jurídica, por falta de publicação do mesmo. Para que o seu conteúdo aproveitasse à Interessada teria de ter sido publicado (art. 5º do Código Civil), o que não terá sucedido.
2- Quanto à referência tanto à Portaria de 1980, como ao POPNA que segundo a Interessada “se estranha”, “não se compreende” e se trata de “lapso” e que o ICNB “bem sabe ou deveria saber”, convém esclarecer:

A licença de loteamento, do nosso ponto de vista, encontra-se ferida de nulidade, por violação do diploma aplicável à data da prolação do acto autorizativo (in tempus regit actum) e porque a nulidade é expressamente cominada pelo art. 9º do DL nº 622/76, de 28/07. A nulidade dos actos que violem o plano preliminar de ordenamento do Parque Natural é cominada pelo art. 9º, nº2 do DL nº622/76, de 28/07, vício esse que continuou a ser cominado para os actos que não se conformem com os planos especiais de ordenamento do território (art.103° do RJIGT). Assim sendo e ao contrário do que pretende a Exponente, não se trata de uma mera anulabilidade, sanável pelo decurso do tempo, mas sim de nulidade (art. 134° do CPA) da licença de 1989 e de todos os actos sucessivos.

Não ponderar a (in)validade da licença de loteamento, também à luz do POPNA (embora o diploma legal seja posterior ao acto de licenciamento) seria deixar de ponderar a eventual susceptibilidade de legalização do loteamento em apreço. Ou seja, caso o POPNA previsse a possibilidade de lotear em áreas de protecção complementar (art. 18º a 22º do POPNA), evidentemente, não seria projectada a ordem de reposição do terreno nas condições pré- existentes. Este juízo, ao contrário do que pretende a Exponente, não constitui uma aplicação retroactiva do POPNA, mas sim a ponderação da (in) susceptibilidade de legalização do loteamento em causa, precisamente em consonância com o princípio da proporcionalidade, de modo a que a reposição do terreno nas condições pré-existentes, seja adoptada como última ratio.

Mesmo admitindo, o que só em tese se aceita, que o plano preliminar do Parque Natural da Arrábida (Portaria nº 26-F/80, de 9/01) deva ser reconduzido a plano sectorial, a sua violação é cominada com a nulidade (art. 103º do RJIGT), não se convidando na ordem jurídica por força do decurso do prazo de um ano, conforme pretende a interessada, Pois “São nulos os actos praticados em violação de qualquer instrumento de gestão territorial aplicável.” (art. 103º do RJIGT e art. 134º do CPA).

3 - Apesar da análise supra da Exposição da A............. e de o nosso entendimento ir no sentido da plena validade do projecto decisório ora objecto da presente audiência prévia, não deixa de ser relevante, por um lado, o facto de a Exponente ser titular de uma licença de loteamento e por outro o sacrifício que lhe é imposto pela presente ordem de reposição também tendo presente a sujeição aos princípios da proporcionalidade e da boa-fé (arts. 5° e 6º-A do CPA).

4 - Não existindo, ao que sabemos, neste momento, sentença judicial das acções principais e não tendo sido apreciada e decidida e questão da nulidade do licenciamento camarário – questão prévia prejudicial ao presente procedimento de reposição do terreno nas condições pré- existentes - e sendo necessário acautelar o eventual dever de indemnização que venha a recair sobre o ICNB, IP (caso o tribunal venha a entender que a licença de loteamento é válida), considera-se ser aplicável a suspensão do procedimento prevista no art. 31°, nº 1, do CPA.

Face ao exposto e salvo melhor entendimento, nos termos do art. 31º nº 1 do CPA propõe-se que seja declarada a suspensão do presente procedimento de reposição das condições do terreno nas condições pré-existentes, até à decisão judicial da acção principal que corre seus termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada.
(…)”, cfr. Doc.1, fls. 48 a 54 dos autos e fls. 1935 a 1931 do PA.

AO - Em 2008-02-15, foi exarado na informação nº …/2008, supra referida o seguinte despacho pela Diretora do Departamento de Gestão das Áreas Classificadas Litoral de Lisboa e Oeste:
“Visto.
Não se concorda com o proposto, ice, suspensão do procedimento de reposição do terreno nas condições, pré-existentes, pelo, que se reitera o projecto de decisão. Notifique-se a interessada. Conhecimento deste despacho à Exmª Presidência do L…..."
(…)”, cfr. idem.

AP - Em 2008-03-03 foi dirigido à Autora, o ofício Refª. Proc. AO/…../86, sob registo com aviso de receção, relativo ao assunto: “Reposição do terreno nas condições pré-existentes – decisão final” com o seguinte teor: “…
Notifica-se V.Exª de que por despacho da senhora Directora do Departamento de Gestão de Áreas Classificadas Litoral de Lisboa e Oeste, de 15/02/2008, foi tomada a decisão final de reposição do terreno nas condições pré-existentes, após à realização da audiência prévia da interessada e de acordo com a fundamentação de facto e de direito constante de parecer jurídico anexo:
“Visto.
Não se concorda com o proposto, ice, suspensão do procedimento de reposição do terreno nas condições, pré-existentes, pelo, que se reitera o projecto de decisão. Notifique-se a interessada. Conhecimento deste despacho à Exmª Presidência do lCNB."

(…)”, cfr. Doc.1, fls. 47 dos autos.

AQ - Em 2008-05-13 deu entrada no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa a presente ação administrativa e especial, interposta pela A............., S.A., contra o Instituto da Natureza e Biodiversidade, I.P., na qual vem formulado o seguinte pedido:
“…
A) deve ser anulado o despacho da Sra Directora do Departamento de Gestão das Áreas Classificadas Litoral de Lisboa e Oeste, 15.02.2008, que declarou a nulidade da licença de loteamento titulada pelo Alvará nº …/2005 da Câmara Municipal de Sesimbra, declarando, em consequência, a nulidade da ordem de reposição de que é pressuposto aquela declaração de nulidade; e
B) Reconhecida a validade da licença de loteamento datada de 2 de Março de 1989, emitida no processo de loteamento nº ........ da Câmara Municipal de Sesimbra, que deu origem ao Alvará de Loteamento nº …/2005.”, cfr. petição inicial.

AR - Maria ............. é gerente da A............., SA, cfr. fls. 1991, 1992 e 1957 do processo administrativo.

AS - Em 2007-08-29, a CCDRLVT remeteu ao Chefe de Gabinete do Secretário de Estado do Ambiente um ofício no âmbito do Processo nº ….. sob o assunto: “Aprovação do ordenamento preliminar do Parque Natural da Arrábida Carta de M….., Soc. Advogados. Resposta a solicitação de passagem de certidão.”, com o seguinte teor:
“…
Relativamente ao assunto em epígrafe e após recepção, através do Gabinete do Senhor Secretário de Estado do Ambiente do ofício nº …… do Instituto de Conservação da Natureza, que se reporta a uma solicitação para passagem de certidão referente à aprovação do Plano de Ordenamento Preliminar do Parque Natural da Arrábida (aprovado pela Portaria nº 26-F/80, de 9 de Janeiro), informa-se V. Exª. que esta CCDR não praticou o acto previsto no nº 2 do artigo 154° do Decreto-Lei nº 380/99 de 22 de Setembro, na redacção do Decreto-Lei nº 310/2003, de 10 de Dezembro.

Importa, não obstante, salientar que ao longo do processo de acompanhamento da elaboração dos instrumentos de gestão territorial foram, em regra, tidos em conta os instrumentos válidos eficazes anteriores à entrada em vigor do DL nº 380/99.”, cfr. Doc.4, fls. 69 dos autos.

*
Não se provou com relevo para a decisão:

- A publicação do despacho de 1986-12-23, do Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais que aprovou a inserção do terreno em causa, no perímetro urbano referido em H).

- Em 1989-09-11, a ora Autora apresentou pedido de aprovação das obras de urbanização à Câmara Municipal de Sesimbra e que esse pedido não tenha sido objeto de decisão.

Não ficaram por provar outros factos com relevo para a decisão.
*

A prova documental junta aos autos e o processo administrativo apenso junto pelo ICNB constituem a prova necessária e bastante à decisão da causa, não tendo sido determinada a apensação dos demais volumes do processo administrativo que a Entidade Demandada indica na douta contestação – referentes ao ato de loteamento e aos embargos - juntos ao Processo cautelar nº 1792/06.9 BELSB por não serem esses os atos em discussão nos presentes autos.

A convicção do Tribunal formou-se com base na prova documental junta aos autos, conforme referido em cada uma das alíneas do probatório.
*

2.2.- Motivação de Direito

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/013, de 26 de Junho) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA (correspondentes aos artigos 660º nº 2, 664º, 684º nºs 3 e 4 e 690º do CPC antigo).

No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida na sentença a qual julgou totalmente improcedente a acção:
i) padece de nulidade por excesso de pronúncia;
ii) padece de erro de julgamento quanto ao julgamento da matéria de facto e de direito.
Vejamos.

-da nulidade da sentença por excesso de pronúncia:

A recorrente ancora a sua ocorrência (vide conclusões 55ª e ss) em que a decisão do ICNB assentou exclusivamente na consideração dos terrenos da Autora como situados em zona rural do perímetro do PNA e não em qualquer outra circunstância ou ilegalidade porquanto tal invalidade agora imputada ao ato de licenciamento não vem, sequer indirectamente, mencionada na fundamentação do ato recorrido, tendo sido aduzida pelo Réu em sede de contestação, como se pudesse através da presente acção corrigir ou aditar a fundamentação constante dos actos objecto de impugnação nos autos.
Significa que para a recorrente o Tribunal Recorrido não podia julgar improcedente a presente acção pela criação de novos argumentos em favor da tese do Réu sobre a ilegalidade do ato de licenciamento do loteamento, sob pena de estar a aditar a fundamentação de actos administrativos, substituindo-se à administração no exercício de poderes de natureza administrativa.
Donde que, sustenta recorrente, ao considerar, para efeitos de apreciar a legalidade da licença de loteamento, uma questão de invalidade que não foi suscitada por qualquer das partes e que deveria ter sido prima facie objeto de uma decisão administrativa, a sentença recorrida violou o artigo 95º do CPTA e padece de nulidade nos termos do artigo 615º, nº 1, al. d) do novo CPC, por conhecer de questões de que não podia ter conhecido, tendo decidido uma questão sobre a qual não foi dada à Autora, ora Recorrente, a oportunidade de se pronunciar, a sentença recorrida padece de nulidade por excesso de pronúncia.
O recorrido e o EPGA não tomaram posição sobre este vício decisório na sua contra-alegação e Parecer, respectivamente.
Identificando a questão decidenda, à cabeça do seu discurso jurídico a sentença recorrida aponta que a mesma se prende com a aferição da legalidade da licença da Autora deve ser apreciada em função da legislação em vigor à data da sua emissão e não à data do alvará de loteamento, pelo que não são aplicáveis as regras do Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n° 141/2005, de 23 de agosto (POPNA).
Demarcou, depois, as posições das partes sobre o objecto do litígio e enfrentou a questão apreciada decorrendo da fundamentação do aresto que o julgador perfilhou o entendimento de a legalidade do acto teria de ser aferida em função da legislação em vigor à data da sua emissão.
Ora, se bem perscrutamos, para a recorrente a nulidade por excesso de pronúncia existe porque na sentença se conheceu de factualidade (fundamentos de facto) não alegada por nenhuma das partes e muito menos dado como assente, extravasando a matéria assente dos autos e, até, a matéria controvertida, pelo que é a mesmo nulo.
Ora, um dos princípios estruturantes do direito processual civil é o princípio do dispositivo, a que alude o artigo 5º, n.º 1, do CPC, segundo o qual “às partes cabe alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções”.
E a que também se refere o art. 608º, n.º 2, do mesmo CPC, que diz que “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outra. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”.
Conforme este princípio, cabe às partes alegar os factos que integram o direito que pretendem ver salvaguardado, impondo-se ao juiz o dever de fundamentar a sua decisão nesses factos e de resolver todas as questões por aquelas suscitadas, não podendo, por regra, ocupar-se de outras questões.
A sentença ficará afectada de nulidade, quer no caso de o juiz deixar de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, quer quando conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (art. 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC).
Mas importa precisar o que deve entender-se por «questões» cujo conhecimento ou não conhecimento integra nulidade por excesso ou falta de pronúncia.
Como tem sido entendimento pacífico da doutrina e da jurisprudência, apenas as questões em sentido técnico, ou seja, os assuntos que integram o «thema decidendum», ou que dele se afastam, constituem verdadeiras «questões» de que o tribunal tem o dever de conhecer para decisão da causa ou o dever de não conhecer, sob pena de incorrer na nulidade prevista no art. 615º/1/d) do CPC.
Há, assim, que distinguir as verdadeiras questões dos meros “raciocínios, razões, argumentos ou considerações”, invocados pelas partes e de que o tribunal não tenha conhecido ou que o tribunal tenha aduzido sem invocação das partes [Ver Abílio Neto In “Código do Processo Civil”, Anotado, 14.ª ed., pág. 702 e Acórdão da Relação de Lisboa, de 2.07.1969, publicado JR, 15.].
Num caso como no outro não está em causa omissão ou excesso de pronúncia.
No que concerne à falta de pronúncia dizia Alberto dos Reis, que «são na verdade coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão» [In Código de Processo Civil, Anotado, Volume V, pg. 143].
Dentro deste raciocínio do ilustre mestre se poderá acrescentar que quando o tribunal, para decidir as questões postas pelas partes, usar de razões ou fundamentos não invocados pelas mesmas partes não está a conhecer de questão de que não deve conhecer ou a usar de excesso de pronúncia susceptível de integrar nulidade.
Do que se conclui que apenas as questões essenciais, questões que decidem do mérito do pleito ou, convenhamos, de um problema de natureza processual relativo à validade dos pressupostos da instância, é que constituem os temas de que o julgador tem de conhecer, quando colocados pelas partes, ou não deve conhecer na hipótese inversa, sob pena de a sentença incorrer em nulidade por falta de pronúncia ou excesso de pronúncia.
Obviamente sempre salvaguardadas as situações onde seja admissível o conhecimento oficioso do tribunal.
Por último importa não confundir a nulidade por falta ou excesso de conhecimento com o erro de julgamento, que se verifica quando o juiz não decide acertadamente, por decidir «contra legem» ou contra os factos apurados [vd A. dos Reis, In “Código de Processo Civil”, Anotado, Volume V, pg. 130].
Ora, no caso em apreciação, o tribunal recorrido não conheceu de questão de que não devesse conhecer. Precisamente ao conhecer da questão da legalidade do acto impugnado, questão suscitada pela Recorrente nos sobreditos termos e de que cabia conhecer, aduziu a argumentação de que a mesma deveria ser aferida segundo o princípio do “tempus regit actum”.
Independentemente da maior ou menor validade desta argumentação, o certo é que não se está em presença de excesso de pronúncia porque não se acha em causa o conhecimento de questão de que o tribunal não devesse conhecer, mas apenas em face do desenvolvimento de um raciocínio no âmbito da ponderação de determinada questão, no caso a atinente ao regime legal aplicável.
Não se verifica, pois, a nulidade da decisão recorrida por excesso de pronúncia.

*
-do erro de julgamento sobre a matéria de facto:

Neste segmento recursório, afirma a recorrente que deveria ter-se dada como assente determinada matéria a partir da junção do PA.
Porém e na senda da sentença, do douto Parecer do EPGA e do recorrido, também entendemos que os factos relevantes para a decisão da causa foram decididos com base "na prova documental junta aos autos e com o processo administrativo", tanto mais que considerou essa prova suficiente "para os factos em discussão e em causa nos autos - que não eram os actos de loteamento e aos actos de embargo. Pelo que, não pode vir agora a Recorrente alegar os hipotéticos factos que o Tribunal a quo consideraria provados se tivesse ordenado a apensação, inútil e meramente dilatória, diga-se, dos processos administrativos referentes a actos que não estavam impugnados nos autos, sendo que se sabe que na maior parte dos processos relacionados com o mesmo prédio repetem- se a maior parte dos documentos".
E também se entende, em consonância com o EPGA, que o ICNF não haja feito qualquer prova de que os terrenos em causa se situavam em área rural, pois que no despacho impugnado consta que «o loteamento em questão situa-se em área rural... O loteamento titulado pelo alvará nº…/2005 viola o regulamento do plano preliminar do Parque Natural da Arrábida (artg14°,nº2,da Portaria nº26-F/80, de 9/01), entretanto revogado pelo POPNA. E viola o POPNA, plano especial de ordenamento do território, com a consequente nulidade prevista no artº 68, alínea a) do DL n-555/33, de 16 de Dezembro» (POPNA - Plano Especial de Ordenamento, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº141/2005, de 23 de Agosto, em vigor desde 24 de Agosto de 2005; Cfr. fls 1104 do processo administrativo junto à acção administrativa nºg841/06.5BEALM).»
Os concretos meios de prova constantes do processo não impunham decisão diversa da recorrida, sendo que, em matéria de recurso, o respectivo objecto é dado pelas conclusões (artºs. 637º nº 2 e 639º nºs. 1 e 2 CPC) e o erro de julgamento em matéria de facto tem um leque de causas muito vasto, sendo que nem todas implicam a observância do ónus estabelecido no artº 640º nºs. 1 e 2 CPC.
O objecto do presente recurso, tal como apresentado nas conclusões, é reconduzível a erro de julgamento/ impugnação da decisão sobre a matéria de facto levada ao probatório em sede da sentença, o que apenas releva se o alegado incorrecto julgamento feito pelo Tribunal a quo se traduzir em insubsistência probatória de natureza substantiva, isto é, se a decisão do caso concreto declarada na decisão recorrida não tiver suporte probatório juridicamente válido à luz do quadro normativo que disciplina a admissibilidade bem como a força e valor jurídico das várias espécies de meios de prova.
Mas a incorrecção do julgado há-de revelar-se pelos próprios termos da decisão proferida, pela incapacidade jurídica de uma dada fonte probatória formar e sustentar de modo juridicamente válido a convicção expressa pelo julgador no específico sentido consignado, o que vale por dizer que é necessário concluir que o probatório e respectivos meios de prova não constituem suporte jurídico da decisão do caso concreto declarada na decisão recorrida e/ou que outros há que impunham a ampliação do probatório – tal como pretende a recorrente.
Ocorrendo que toda a matéria de facto que a recorrente pretende que seja aditada ao probatório, contrariamente ao que ela sustenta, não encerra factos essenciais e imprescindíveis para a boa decisão da causa, isso sem embargo de os mesmos poderem ser considerados plenamente provados pelos documentos que os suportam.
Termos em que improcede o fundamento recursório em análise.

*
-do erro de julgamento sobre a matéria de direito:

Em substância, esse erro radicará, segundo as atinentes conclusões de recurso, em que os actos impugnados são inválidos porque deve ser reconhecida a conformidade da licença de loteamento emitida em 2 de Março de 2015 com as disposições aplicáveis, nomeadamente as constantes da Portaria nº 26-F/80, e a consequente validade da licença de loteamento em causa.
A acção foi julgada improcedente com base na seguinte fundamentação jurídica:

“(…)
3.1. - A aferição da legalidade da licença da Autora deve ser apreciada em função da legislação em vigor à data da sua emissão e não à data do alvará de loteamento, pelo que não são aplicáveis as regras do Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n° 141/2005, de 23 de agosto (POPNA)?
A Autora alega que:
- Na aferição da legalidade do título do licenciamento e, em concreto, do licenciamento da operação de loteamento, apenas releva a licença de loteamento datada de 1989 e não o alvará de licença de loteamento datado de 3 de agosto de 2005.
- As obras de urbanização foram aprovadas por ato de deferimento tácito que se formou na ordem jurídica, em 14 de novembro de 1989, ao abrigo do artigo 81° n°1 do Decreto-Lei n° 400/84, de 31 de dezembro, pelo que, nessa parte, a deliberação de 3 de agosto de 2005 é meramente confirmativa.
- Conclui a Autora que o licenciamento dos terrenos foi deferido por atos municipais praticados durante o ano de 1989, pelo que o alvará de loteamento n° …/2005, não se encontra sujeito a qualquer controlo de legalidade e de validade, em termos autónomos e dissociados das licenças que o mesmo corporiza.
Vejamos então.
O Plano de Ordenamento Prévio do Parque Natural da Arrábida foi aprovado por despacho do Secretário de Estado do Urbanismo e Ambiente, de 17 de agosto de 1979, ao abrigo do artigo 9o, n° 2 do Decreto n° 4/78, de 11 de janeiro (cfr. G).
Posteriormente, de acordo como o estipulado no mesmo Decreto n° 4/78, os Secretários de Estado da Administração e do Urbanismo e Ambiente aprovaram, mediante a Portaria no 26-F/80, de 9 de janeiro, o Regulamento Geral do Parque Natural da Arrábida.
A Autora iniciou o procedimento de licenciamento em 1987 com um pedido de informação prévia e, em 2 de março de 1989, foi praticado o ato de licenciamento.
Deste modo, as regras aplicáveis ao licenciamento em causa foram o conjunto normativo em vigor em 1989 - data da emissão da licença de loteamento- que era constituído, designadamente, pelo Decreto-Lei n° 622/76, de 28 de julho que criou o Parque Natural da Arrábida e pela Portaria no 26-F/80, de 9 de janeiro, que aprovou o Regulamento Geral do Parque Natural da Arrábida (PNA).
Em concreto, releva o artigo 14°, n° 2 da Portaria no 26-F/80, de 9 de janeiro que veio estabeleceras principais normas a que se encontra sujeita a atividade edificatória nas “áreas rurais" inseridas no Parque Natural da Arrábida.
Resulta do probatório que:
- Por deliberação de 14 de junho de 1984, os terrenos da Autora foram retirados pela Câmara Municipal de Sesimbra do perímetro urbano, cfr. A - Doc. 8, tis. 79 e 80 dos autos.
- Em 21 de novembro de 1986, na sequência de reclamação apresentada pela proprietária, o Conselho Geral do Parque Natural da Arrábida deliberou a inclusão desses terrenos no perímetro urbano, cfr. F - Doc. 10, fls. 83 a 88 dos autos.
- Em 1986-12-09, o Diretor do Parque Natural da Arrábida remeteu ao Presidente do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza, o ofício ref3. CO/…..-86, sob o assunto: “Alterações aos perímetros urbanos de Palmeia, Cabanas (Palmeia) e Pedreiras (Sesimbra)’’, cujo teor é o seguinte:
“Junto envio a V. Ex*. a proposta de alterações dos perímetros urbanos de Palmeia, Cabanas (Palmeia) e Pedreiras (Sesimbra).
Foi feito o estudo destas alterações, conjuntamente por técnicos deste Parque Natural e pelos técnicos da Câmara Municipal de Palmeia e Sesimbra.
Como há alterações ao Ordenamento Prévio do Parque Natural da Arrábida, aprovado em 17 de Agosto de 1979, por Excelência o Secretário de Estado de Urbanismo e Ambiente, solicito se digne apresentar a proposta a Sua Excelência o Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais, para despacho.
Junta-se a acta do Conselho Geral do Parque Natural Arrábida com a sua deliberação.
(...)
Anexo:
Fotocópia das folhas informativas
das Alterações dos perímetros urbanos de Palmeia, Cabanas e Sesimbra
Acta n° 32 do Conselho Geral e
Informação n° 119/86.”, cfr. G - Doc. 23, fls. 132 a 142 dos autos.
Em 1986-12-23, o Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais aprovou a inserção do terreno da Autora, no perímetro urbano, através do despacho “Concordo”, aposto no oficio supra, datado de 1986-12-09, cfr. H - Doc. 23, fls. 132 e Doc. 25, fls. 150 dos autos.
Em 1986-12-31 deu entrada nos serviços do PNA o oficio n° ….. do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza dirigido ao Diretor do Parque Natural da Arrábida, sob o assunto: “Alterações aos perímetros urbanos de Palmeia, Cabanas (Palmeia) e Pedreiras (Sesimbra)” que remeteu, em anexo: “Fotocópia do v/of°. …../9.5. de 9 de Dezembro, com o respectivo despacho”, cfr. K - Doc. 23, fls. 131 e 132 dos autos.
- Em 1986-12-30, no ofício n° ….. foi ordenada a comunicação do despacho do Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais às respetivas Câmaras, cfr. L - Doc.23, fls. 131 dos autos.
Deste modo, e tal como diretamente resulta da factualidade acima referida, ainda que se tenha provado a existência do despacho proferido em 1986-12-23, pelo Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, no sentido da aprovação da inserção do terreno da Autora, no perímetro urbano, através do despacho “Concordo”, aposto no oficio datado de 1986-12-09, e que o mesmo foi comunicado aos serviços do Parque Natural da Arrábida e à Câmara Municipal de Sesimbra, o certo é que não se provou que a esse despacho de 1986-12-23 tenha sido dada a publicidade exigida, pelos artigos 3o e 14° do Decreto-Lei n° 560/71, de 17 de dezembro e em termos gerais, dada a natureza regulamentar da alteração, pelo artigo 5o do Código Civil e pelo artigo 122° n°1 al. h) e n°4 da CRP (na redação da 1a revisão de 1982)
E sendo assim, não se pode sustentar a eficácia da alteração da classificação dos terrenos da Autora como urbanos, em vez de rurais, à data do deferimento do pedido de loteamento da Autora em 1989-03-02, sendo ilegal a execução de tal ato, por falta de um pressuposto de eficácia.
Efetivamente, e acolhendo na presente apreciação, o que já foi ponderado neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada sobre a mesma questão - falta de publicidade do despacho de 1986-12-23 - na ação n° 438/05.7 BEALM e apenso proc. n° 841/06.5 BEALM, passamos a citar:
“O que se pode afmar é que as alterações, para serem eficazes, tinham de ser publicitadas, uma vez que estamos perante alterações a um regulamento - art° 122. °, n° 1, al. h) e n° 2, da CRP, na redacção então em vigor. Os autos nada demonstram quanto a isso.
A publicidade, no caso dos despachos normativos, tinha de fazer-se através de publicação no Diário da República - art.º 3. °, n.º1, al. m) da Lei 6/83, de 24 de Junho. No caso de se tratar de alterações aos “planos de ordenamento" da competência do Secretário de Estado do Ambiente, atribuída pelo n.° 2 do art.º 9. ° do Decreto n.° 4/78, de 11 de Janeiro, o princípio do paralelismo das competências e o princípio do paralelismo das formas, impunham que as mesmas tivessem de ser efectuadas por aquele órgão e através de processo idêntico ao que foi observado aquando da sua elaboração- cfr. Afonso Queiró, in "Teoria dos Regulamentos", Revista de Direito e Estudos Sociais, Ano/n.° 1, Janeiro - Março de 1986, pág. 31.”
(...) Ora, se é verdade que por força do disposto no art. 14. °, n. 1, al. a) da Portaria n. 26-F/80, de 9 de Janeiro, não tinha de intervir o Secretário de Estado do Ambiente, bastando a intervenção da Direcção do Parque, também o é a circunstância de os mesmos não estarem dispensados da observância do regime jurídico aprovado pelo DL n.° 560/71, de 17 de Dezembro, que, entre o mais, impunha a sua publicação por Portaria, para além da intervenção do Ministro das Obras Públicas - cfr. artigos 3.°e 14°deste diploma.
Pelo exposto, entende-se que a alteração ao perímetro urbano que inseriu os terrenos da A. em zona urbana, é, no mínimo, ineficaz. Repare-se que com a publicação da alteração não está apenas em jogo levar o conhecimento da mesma ao proprietário directamente interessado. Estão em jogo interesses ligados ao ordenamento do território e ao ambiente, pelo que as alterações têm de ser levados ao conhecimento de todos, para, se o entenderem, as poderem impugnar. Para defesa desses interesses não pode o Tribunal ter por eficaz alterações a perímetros urbanos que não foram publicadas (...)”.
Da aplicação do princípio tempus regit actum, resulta que a legalidade do ato administrativo afere-se pela realidade fáctica existente no momento da sua prática e pelo quadro normativo então em vigor.
Sendo que a eventual legalização de situação desconforme com o direito à data em que se constituiu, se afere pela lei aplicável à data da legalização, ou seja, em 2008, encontrava-se em vigora Resolução do Conselho de Ministros n° 141/2005, de 23 de agosto.
O que significa que, o ato impugnado declarou a nulidade do ato de loteamento de 1989-03-02, à data em que foi praticado, ou seja, por contrariar os artigos 12° e 14° da Portaria n° 26-F/80, de 9 de janeiro, e a pronúncia constante do mesmo, sobre a possibilidade de legalização dessa situação que ficou sem título jurídico pela precedente declaração de nulidade, foi efetuada à luz do ordenamento vigente em 2008, ou seja, por aplicação da Resolução do Conselho de Ministros n° 141/2005, de 23 de agosto.
E sendo assim, a análise efetuada pelos serviços do Parque Natural da Arrábida e que integra por remissão o ato administrativo impugnado, tal como se levou ao probatório e agora se passa a transcrever, não padece de erro sobre os pressupostos de facto ou de direito, dela constando que:
“Não ponderar a (in)validade da licença de loteamento, também à luz do POPNA (embora o diploma legal seja posterior ao acto de licenciamento) seria deixar de ponderar a eventual susceptibilidade de legalização do loteamento em apreço. Ou seja, caso o POPNA previsse a possibilidade de lotear em áreas de protecção complementar (art. 18° a 22° do POPNA), evidentemente, não seria projectada a ordem de reposição do terreno nas condições pré- existentes. Este juízo, ao contrário do que pretende a Exponente, não constitui uma aplicação retroactiva do POPNA, mas sim a ponderação da (in) susceptibilidade de legalização do loteamento em causa, precisamente em consonância com o princípio da proporcionalidade, de modo a que a reposição do terreno nas condições pré-existentes, seja adoptada como última ratio. ”, Cfr. AN (com sublinhado nosso).
No caso dos autos, há que concluir que, tratando-se de terreno localizado em zona rural e em área do Parque Natural da Arrábida, por ineficácia do despacho de 1986-12-23 do Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais, havia que aplicar, à data do ato de aprovação do pedido de loteamento, ou seja, em 1989-03-02, o Regulamento anexo à Portaria n° 26-F/80, de 9 de janeiro, o que não aconteceu, não havendo qualquer evidência do cumprimento das condicionantes ao tempo impostas pelo Parque Natural da Arrábida, como a seguir se passa a apreciar.
3.2. - A emissão da licença de loteamento cumpriu as normas contidas na Portaria n° 26-F/80, de 9 de janeiro?
A Autora vem alegar que, a única forma de ilegalidade suscitada no despacho impugnando consiste na violação do disposto no artigo 14°, n° 2 do Regulamento anexo à Portaria n° 26-F/80, de 9 de janeiro, situação que não se verifica, uma vez que estamos em presença de uma área urbana e não de uma área rural.
Porém, salvo o devido respeito, não lhe assiste razão.
Como decorre da apreciação precedente, não resulta dos autos que os terrenos se situassem em área urbana, ainda que abrangida pelo Regulamento do Parque Natural da Arrábida.
Efetivamente, por ineficácia do despacho de alteração dos perímetros urbanos e dado o loteamento situar-se em área rural, havia que aplicar o n° 2 do artigo 14° do referido regulamento geral aprovado pela Portaria n° 26-F/80, de 9 de janeiro que não comporta o loteamento em causa, e onde apenas é permitida a construção de edifícios destinados ao apoio de explorações agrícolas, florestais ou de recreio.
Ademais, ainda que, o Parque Natural da Arrábida se tenha pronunciado sobre o Processo de loteamento n° ........, considerando o loteamento em “área urbana” e “Concordando na generalidade com o projecto de loteamento:”, o certo é que, condicionou essa autorização a:
- deverá ser pedido Estudo Prévio de Arquitectura nomeadamente nas zonas de implantação por banda e geminadas, para que a área possa ter uma visão de conjunto;
- deverá ser o Museu de Arqueologia e Etnografia (...) igualmente consultado.”, cfr. U.
E sobre o cumprimento de tais condicionantes, a Autora nada alega, nem dos autos resulta qualquer prova.
Deste modo, não se pode afirmar que a emissão da licença de loteamento tenha cumprido as normas contidas na Portaria n° 26-F/80, de 9 de janeiro como a Autora veio alegar.
3.3 - Admitindo - em mera hipótese - a inobservância do disposto no artigo 14° n°2 do Regulamento anexo à Portaria n° 26-F/80, de 9 de janeiro, única ilegalidade suscitada no ato impugnado, a mesma conduz à anulabilidade do ato e encontra-se sanada?
Alega a Autora, sobre este desiderato que:
- Ainda que se verificasse a violação do disposto no n° 2 do artigo 14° do Regulamento anexo à Portaria n° 26-F/80, de 9 de janeiro como pretende o Réu - o que, por mera hipótese académica, admite tal violação seria insuscetível de gerar a nulidade da licença de loteamento, o que, atendendo ao decurso do tempo, é indispensável para se considerar tal licença inválida e sem efeitos jurídicos e isto porque:
- À data da prática dos atos, 1989, o regime era o da mera anulabilidade, por via do Decreto-Lei n° 100/84, de 29 de março, diploma que guiava as atribuições das autarquias locais e as competências dos respetivos órgãos e do Decreto-Lei n° 400/84, de 31 de dezembro que estabelecia o regime jurídico das operações de loteamento urbano.
- Não está em causa uma nulidade cominada pelo Decreto-Lei n° 622/76, de 28 de julho, pois, não estando em causa a violação de qualquer das normas desse diploma, não se verifica a condição prevista no n° 2 do respetivo artigo 9º.
- Nenhum dos diplomas mencionados sanciona com a nulidade as situações de desconformidade com os planos urbanísticos nem a desconformidade das licenças cornos planos preliminares dos Parques Naturais.
Por sua vez, a Entidade Demandada vem dizer que a violação do disposto no n° 2 do artigo 14° da Portaria n° 26-F/80, de 9 de janeiro integra situação de nulidade prevista no artigo 88°, n° 1, do Decreto-Lei n° 100/84, de 19 de março, e no artigo 65°, n° 1 do Decreto-Lei n° 400/84, de 31 de dezembro, para além do artigo 9o n°2 do Decreto-Lei n° 622/76, de 28 de julho, vigentes à data dos factos.
Vejamos então.
O artigo 65°, n° 1, do Decreto-Lei n°400/84, de 31 de dezembro, estipulava o seguinte:
“1 - São nulos os actos das câmaras municipais respeitantes a operações de loteamento ou a obras de urbanização quando:
a) Não sejam precedidos da audiência das entidades que devam ser consultadas;
b) Não sejam conformes com qualquer dos respectivos pareceres vinculativos ou resoluções,
c) Não tenham sido submetidos a ratificação ou a contrariem, conforme os casos".
O Decreto-Lei n° 62Z76, de 28 de julho, procedeu à criação do Parque Natural da Arrábida, definindo, desde logo, a respetiva área e instituindo, por seu turno, um regime de carácter provisório até à data de entrada em exercício da respetiva comissão instaladora.
Ao que resulta dos autos e em continuidade com o prece d ente mente exposto, o Município de Sesimbra deferiu o pedido de loteamento sem ter observado as condições impostas pelo PNA,o que integra a previsão de nulidade da deliberação, previsto no artigo 65° n°1, al. b) do Decreto-Lei n° 400/84, de 31 de dezembro, e constitui fundamento da nulidade declarada no ato sub judice.
Acresce que, o Regulamento anexo à Portaria no 26-F/80, de 9 de janeiro, no seu artigo 17°, remete para as disposições do Decreto-Lei n° 622/76, de 28 de julho, no que respeita a todas as questões omissas ou suscetíveis de criar dúvidas, bem como no tocante às disposições relativas autorizações, fiscalizações, contravençõese multas, não se descortinando motivo para que tal remissão não abranja o regime de nulidade estabelecido no n°2do artigo 9o do Decreto- Lei n° 622/76, de 28 de julho cuja ratio é a de garantir a proteção das zonas de paisagem protegida, por natureza, áreas que não estão vocacionadas para a construção de loteamentos urbanos, por opção expressa do legislador, através do Decreto-Lei n° 622/76, de 28 de julho que procedeu à criação do Parque Natural da Arrábida.
E sendo assim, portal motivo, ou seja, poro ato de 1989-03-02, declarado nulo, padecer de eventual anulabilidade sanada pelo decurso do tempo, não pode a presente ação proceder.
*
3.4. - A Portaria n° 26-F/80, de 9 de janeiro não é um plano especial de ordenamento do território, de acordo com o princípio da tipicidade dos planos, tendo continuado a vigorar com a natureza de plano sectorial até à aprovação do Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida pela Resolução do Conselho de Ministros n° 141/2005, de 23 de agosto (POPNA)?
A Autora alega que, de acordo com o princípio da tipicidade dos planos, basta atender ao regime dos planos especiais de ordenamento do território, designadamente, em função do que a lei estipula quanto à respetiva noção, ao respetivo conteúdo material e documental e quanto ao respetivo procedimento de elaboração e aprovação, para não fazer sentido pretender qualificar a Portaria n° 26 F/80 de 9 de janeiro, como um plano especial de ordenamento do território, concretamente como um plano de ordenamento de área protegida - v. os arts. 42° e segs. do Decreto-Lei n° 380/99, de 22 de setembro, alterado pelo Decreto-Lei n° 310/2003, de 10 de dezembro, diploma legal que, aprovou o regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial (RJIGT).
Vejamos então.
O regime jurídico do Parque Natural da Arrábida criado pelo Decreto-Lei n° 622/76, de 28 de julho constava da Portaria n°. 26-F/80 alterada pela Portaria n° 51/87, sendo este o regime legal vinculativo à data dos factos, para os destinatários da lei, particulares e entidades públicas.
Na verdade, em 1989-03-02 data da prática do ato, ainda não havia sido publicada a legislação invocada pela Autora, ou seja, o Decreto-Lei n° 380/99, de 22 de setembro, alterado pelo Decreto-Lei n° 310/2003, de 10 de dezembro, diploma legal que, aprovou o regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial (RJIGT).
Porém, sempre se dirá o seguinte:
O Decreto-Lei n° 19/93, criou o novo quadro de classificação das Áreas Protegidas Nacionais, impôs a reclassificação do PNA e estabeleceu, no seu artigo 13°, n° 2, que a classificação de Área Protegida caducaria pelo não cumprimento do prazo de elaboração do Plano de Ordenamento e respetivo regulamento, tendo o Decreto-Lei n° 204/2002 vindo prolongaros prazos de elaboração dos planos de ordenamento e respetivos regulamentos das áreas protegidas.
Por sua vez, o Decreto Regulamentar23/98, de 14 de Outubro que reclassificou o PNA, no seu artigo 18°, n°1 estipulou, expressamente, que, no prazo máximo de 3 anos a contar da sua publicação (14 de Outubro de 1998), o PNA seria dotado de um Plano de Ordenamento do Território, prazo que terminou em 14 de Outubro de 2001, sem que, no decurso do mesmo, tenha sido elaborado e publicado o Plano de Ordenamento do Território do PNA (o que só veio a ocorrer através da Resolução do Conselho de Ministros n° 141/2005, de 23 de Agosto).
O artigo 18° n°3 do Decreto Regulamentar n° 23/98 de 14 de outubro dispõe que:
“3 - Até à aprovação do plano de ordenamento referido no n°1, aplica-se o plano de ordenamento preliminar e o regulamento publicados pela Portaria n° 26-F/80, de 9 de Janeiro, incluindo as interdições e condicionamentos nele previstos, em tudo o que não seja contrário ao disposto no presente diploma. ”
A Autora entende que, não tendo sido praticado o ato de recondução do plano, no prazo fixado no artigo 18°, do Decreto Regulamentar nº 23/98, de 14 de Outubro, estamos perante um plano sectorial que não dispõe de eficácia plurisubjetiva, ao contrário dos planos municipais e dos planos especiais de ordenamento do território (cfr. arf. 11° n°2da Lei n° 48/98, de 11 de agosto e artigo 154° n°4 do Decreto-Lei n° 380/99, de 22 de setembro).
Vejamos.
O Decreto-Lei n° 380/99, de 22 de setembro, estabelece o regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial (RJIGT).
O artigo 2º elenca os planos existentes e o seu âmbito:
“Artigo 2.°
Sistema de gestão territorial
1 - A política de ordenamento do território e de urbanismo assenta no sistema de gestão territorial, que se organiza, num quadro de interacção coordenada, em três âmbitos:
a) O âmbito nacional;
b) O âmbito regional;
c) O âmbito municipal.
2 -O âmbito nacional é concretizado através dos seguintes instrumentos:
a) O programa nacional da política de ordenamento do território;
b) Os planos sectoriais com incidência territorial;
c) Os planos especiais de ordenamento do território, compreendendo os planos de ordenamento de áreas protegidas, os planos de ordenamento de albufeiras de águas públicas e os planos de ordenamento da orla costeira.
3 - O âmbito regional é concretizado através dos planos regionais de ordenamento do território.
4 - O âmbito municipal é concretizado através dos seguintes instrumentos:
a) Os planos intermunicipais de ordenamento do território;
b) Os planos municipais de ordenamento do território, compreendendo os planos directores municipais, os planos de urbanização e os planos de pormenor.
No que à vinculação jurídica dos planos respeita dispõe o artigo 3º que:
“Artigo 3.°
Vinculação jurídica
1 - O programa nacional da política de ordenamento do território, os planos sectoriais com incidência territorial, os planos regionais de ordenamento do território e os planos intermunicipais de ordenamento do território vinculam as entidades públicas.
2 - Os planos municipais de ordenamento do território e os planos especiais de ordenamento do território vinculam as entidades públicas e ainda directa e imediatamente os particulares.
Os artigos 35° e 42° estabelecem seguintes termos: a noção de plano sectorial e de plano especial, nos
« Migo 35.° Noção
1 — Os planos sectoriais são instrumentos de programação ou de concretização das diversas políticas com incidência na organização do território.
(...)
Artigo 42°
Noção
1- Os planos especiais de ordenamento do território são instrumentos de natureza regulamentar elaborados pela administração central.
2- Os planos especiais de ordenamento do território constituem um meio supletivo de intervenção do Governo, tendo em vista a prossecução de objectivos de interesse nacional com repercussão espacial, estabelecendo regimes de salvaguarda de recursos e valores naturais e assegurando a permanência dos sistemas indispensáveis à utilização sustentável do território.
3- Os planos especiais de ordenamento do território são os planos de ordenamento de áreas protegidas, os pianos de ordenamento de albufeiras de águas públicas e os planos de ordenamento da orla costeira. ”
O artigo 103.°, determina que:
“São nulos os actos praticados em violação de qualquer instrumento de gestão territorial aplicável. ”
Em sede de disposições finais e transitórias, estabelece o artigo 154° que:
“Artigo 154°
Outros planos
1 - Todos os instrumentos de natureza legal ou regulamentar com incidência territorial actualmente existentes continuam em vigor até à respectiva adequação ao sistema de gestão territorial estabelecido neste diploma, nos termos previstos nos números seguintes.
2 - Compete às comissões de coordenação regional a identificação no prazo de um ano das normas directamente vinculativas dos particulares a integrar em plano especial ou em plano municipal de ordenamento do território.
3-O Governo e as câmaras municipais devem promover, nos 180 dias subsequentes à identificação referida no número anterior, a correspondente alteração dos planos especiais e dos planos municipais de ordenamento do território.
4- Os instrumentos com incidência territorial não abrangidos pelo disposto nos n.° 2 e 3 continuarão em vigor com a natureza de pianos sectoriais.
Ora, salvo o devido respeito por opinião contrária, o n°1 do artigo 154° é categórico no que respeita à continuação em vigor das normais legais e regulamentares existentes.
E o n°4 deste artigo não tem o alcance que se lhe pretende darde alteração de natureza das normas materialmente suscetíveis de integrarem os planos especiais e os planos municipais de ordenamento do território, (a elaborar), em normas com a natureza de planos sectoriais, apenas e só por não terem sido inventariadas, nos termos do n°2ou por não ter sido cumprido o n°3.
Primeiro, porque tal não decorre da letra do artigo. Na verdade, o n°4 do artigo 154° apenas se aplica aos planos “não abrangidos pelo disposto nos n°2 e 3º do artigo 154º”.
Acontece que as normas dos planos especiais de ordenamento do território, nos quais se integram os planos das áreas protegidas como é a legislação do Parque Natural da Arrábida estão abrangidas pelos n°2 e 3 do artigo 154° e por isso, excluídas dos efeitos do n°4 do mesmo artigo.
Segundo, porque a admissão de tal interpretação e consequente efeito jurídico, assenta num pressuposto contra natura que é o de transformar normas cuja natureza integra os planos especiais de ordenamento do território, que “estabelec(em) regimes de salvaguarda de recursos e valores naturais e assegur(am) a permanência dos sistemas indispensáveis à utilização sustentável do território.” (cfr. art. 42° n°2) em normas que se destinam à “programação ou de concretização das diversas políticas com incidência na organização do território.” (cfr. art°. 35° n°1).
Na verdade, tal desiderato não ocorre, nem o legislador o prevê, apenas e porque a tarefa prevista nos n°2 e 3 do artigo 154° não foi executada, como resulta do probatório, (cfr. AS), não tendo por efeito “a degradação" das normas cuja natureza corresponde à de plano especial, por se destinarem à proteção de áreas protegidas que importa manter, como acontece em relação á legislação do Parque Natural da Arrábida, em normas de plano sectorial que respeitam à programação de objetivos com incidência territorial.
Nem, salvo o devido respeito, tal decorre do artigo 34° n°2, al. c) da Lei n.° 48/98, de 11 de agosto quando dispõe que:
“ c) A integração nas categorias previstas no sistema de gestão territorial deverá fazer-se no prazo de dois anos a contar da entrada em vigor da presente lei, findo o qual deixam de vincular os particulares todos os instrumentos de natureza legal ou regulamentar com incidência territorial que não se enquadrem no elenco típico legalmente estabelecido. ”
E isto porque é manifesto que a legislação especifica aplicável ao Parque Natural da Arrábida (PNA), enquadra-se no "elenco típico legalmente estabelecido" como prevê o artigo 2o n°1, al. c) e o artigo 42° n°3 do Decreto-Lei n° 380/99, de 22 de setembro.
Assim, quer a Administração, quer os particulares encontram-se vinculados à legislação que regula as áreas de paisagem protegida, como é o PNA (Parque Natural da Arrábida), por força dos artigos 9º, n.°4 e 11° n.°2 da Lei n.° 48/98, de 11 de Agosto - Lei de Bases de Ordenamento do Território e Urbanismo (LBOTU), em articulação com os artigos 3 n°2°, 42° n.°3, 103° e 154° n°1 do Decreto-Lei n.° 380/99, de 22 de setembro, sendo nulos os atos praticados em violação de qualquer instrumento de gestão territorial aplicável, dado que, tal como resulte do artigo 42° n°2 do Decreto-Lei n° 380/99, de 22 de setembro, estão em causa “regimes de salvaguarda de recursos e valores naturais e assegurando a permanência dos sistemas indispensáveis à utilização sustentável do território. ”
Por sua vez, artigo 18° n°3 do Decreto Regulamentar n° 23/98 de 14 de outubro dispõe que:
“3 - Até à aprovação do plano de ordenamento referido no n°1, aplica-se o plano de ordenamento preliminar e o regulamento publicados pela Portada n° 26-F/80, de 9 de Janeiro, incluindo as interdições e condicionamentos nele previstos, em tudo o que não seja contrário ao disposto no presente diploma. ”
Ora, tendo em atenção que o legislador consagra as soluções mais acertadas não se descortina motivo para considerar que as normas legais previstas e vigentes no ordenamento jurídico e destinadas à proteção de uma zona de área protegida, desde 1976, seja aplicável o artigo 154° n°4 e que tais normas degradadas em normas de plano sectorial (de natureza distinta) deixem, por isso, de ser vinculativas para os particulares e mesmo para as entidades públicas, que nem sequer as possam aplicar através de ato administrativo.
Deste modo, faz sentido, qualificar a Portaria n° 26-F/80, de 9 de janeiro, como diploma que visa a proteção de área protegida, - o Parque Natural da Arrábida - como expressamente, nele é referido, não tendo este a natureza de plano sectorial, nos termos do artigo 154° n°4 do RJIGT.
Em conclusão e não obstante o exposto, o certo é que a questão levantada pela Autora no que à natureza do Plano respeita é superveniente à data da prática do ato que deferiu o pedido de loteamento de 2 de março de 1989 e cuja legalidade pretende seja reconhecida tendo por referência o princípio do tempus regit actum.
E sendo assim, a alegação da Autora de que a Portaria n° 26-F/80, de 9 de janeiro não é um plano especial de ordenamento do território, não pode alicerçara procedência da presente ação.
*
3.5.- O ICNB suscitou na Autora, através dos anteriores atos administrativos, confiança no sentido de proceder ao loteamento, em área urbana, situação que ocorreu durante 20 anos, peio que o ato deve ser anulado por contrariar o princípio da proporcionalidade, o princípio da boa fé, da segurança jurídica e por constituir abuso de direito?
Alega a Autora que:
- Nos termos do disposto no artigo 5o, n° 2 do CPA, "as decisões da Administração que colidam com direitos subjectivos ou interesses protegidos só podem afectar essas posições em termos adequados e proporcionais aos objectivos a realizar1'.
- O princípio da juridicidade, mais amplo do que o principio da legalidade, limita a atuação administrativa, seja qual fora sua natureza, assim mesmo quando se trate de poderes vinculados.
- Do princípio da juridicidade faz parte integrante o princípio da proporcionalidade, na sua tripla vertente de necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito, as quais deverão verificar-se em toda a atuação administrativa.
-A Autora entende que é manifesta a ausência de qualquer interesse ambiental relevante a tutelar no local.
- Os interesses ambientais que têm vindo a ser alegados pelo ICNB junto das instâncias judiciais, a existirem, foram há muito postos em causa e deixaram de existir em virtude da manifesta pressão urbanística existente à volta do terreno para o qual está licenciada a operação de loteamento, com centenas de construções aprovadas e consentidas ao longo de todos estes anos pelo Parque Natural da Arrábida, o que é facilmente constatável no local e nas fotografias aéreas que junta.
- À declaração de nulidade aplica-se o regime previsto no artigo 134° n°3 do CPA que determina que o regime da nulidade “(...) não prejudica a possibilidade atribuição de certos efeitos jurídicos a situações de facto decorrentes de actos nulos, por força do simples decurso do tempo, de harmonia com os princípios gerais de direito".
- Os atos impugnados violam manifestamente os artigos 5o n° 2 e 134°, n° 3 do CPA, o artigo 106°, n° 2 do RJUE e 266°, n° 2 da CRP.
Vejamos.
Antes de mais importa referir que o princípio da proporcionalidade encontra-se subordinado ao princípio da legalidade ao qual a Administração e os Tribunais se encontram vinculados. Efetivamente, a relevância autónoma do princípio da proporcionalidade, apenas ocorre, em matéria que não se integre nos poderes vinculados da Administração, ou seja, no âmbito do exercício do poder discricionário da Administração, sede em que, na ponderação entre a prossecução do interesse público e a salvaguarda dos interesses privados, deve escolher, na prossecução do interesse público, a solução que menos restrinja os direitos e interesses dos particulares.
Não é este porém, o caso dos autos.
Na verdade, está em causa a aplicação de normas legais, a Portaria n° 26-A/80, de 9 de janeiro, ao ato de licenciamento de loteamento destinado à realização das obras de urbanização para a possibilidade de construção de 58 moradias, em zona rural, verificada a ineficácia do despacho do Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais que deferira o pedido de alteração do perímetro urbano naquele local e não o mero exercício do poder discricionário da Administração.
A Autora mais alega que as decisões administrativas contidas no despacho impugnado padecem, irremediavelmente, de vício de violação de lei, por violação do princípio da boa fé previsto no artigo 6º-A do CPA e merecedor de tutela constitucional nos termos do artigo 266° n°2 da CRP e configura tal situação como abuso de direito.
Vejamos este aspeto.
A dificuldade na consolidação da classificação dos terrenos da Autora de área rural para área urbana e a oscilação da mesma, desde 1983, expressam a característica específica do Direito do Urbanismo no que à “infixidez” ou “instabilidade” das suas normas respeita, como refere o Professor Fernando Alves Correia no seu Manual de Direito do Urbanismo (vd. pág.50, Vol. I., novembro de 2001).
Efetivamente, resulta do probatório que, logo em 1984, os terrenos foram classificados como solo rural e que, só na sequência de requerimento da então proprietária é que foram objeto de apreciação pelo Conselho Geral do Parque Natural da Arrábida, no sentido de voltarem a ser classificados como urbanos e, nesse sentido, tal classificação veio a ser acolhida pelo despacho de 23 de dezembro de 1986 do Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, que porém, não veio a ser publicado (cfr. A, F, G e H).
E, também resultou provado que, após o ato de deferimento do pedido de loteamento em 2 de março de 1989, na proposta de Plano Diretor Municipal de Sesimbra os mesmos terrenos foram classificados como solo rural, tendo a proprietária dos mesmos, em 1993, apresentado reclamação, após consulta da referida proposta (cfr. X).
O certo é que, o Plano Diretor Municipal de Sesimbra veio a ser aprovado e foi publicado no Diário da República n° 27, de 2 de fevereiro de 1998, pela Resolução do Conselho de Ministros n° 15/98 e não integrou os solos em causa em zona urbana.
Ademais, em 2005, a então proprietária Maria ............. interpôs uma ação administrativa comum de responsabilidade civil extracontratual contra o Município de Sesimbra, na qual formulou pedido de indemnização que foi objeto de sentença, atualmente em fase de recurso, e na qual foi formulado o seguinte pedido:"...
A) A título de indemnização por lucros cessantes, a quantia já provisoriamente apurada de 399.653,54€ (trezentos e noventa e nove mil seiscentos e cinquenta e três euros e cinquenta e quatro cêntimos), e a liquidarem sede de incidente de liquidação nos termos do disposto nos artigos 471°/1 b)/2 e do Código de Processo Civil e 569° do Código Civil;
B) A título de indemnização por danos patrimoniais, o montante a liquidar, resultante das despesas com o patrocínio do recurso contencioso de anulação, do procedimento de emissão do alvará e da presente acção;
C) A título de indemnização por danos morais, 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros); (cfr. ação n° 438/05.7 BEALM-AI)).
E, em 2006-09-22, a A............., S.A., interpôs no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, a ação administrativa especial contra o ICN - Instituto de Conservação da Natureza, que tramita sob o n° 841/06.5 BEALM e que foi apensa à ação n°438/05.7 BEALM na qual foi formulado o seguinte pedido:
A) ...declarando-se a nulidade ou, assim não se entendendo, anulando-se a deliberação da Comissão Directiva do Parque Natural da Arrábida, datada de 5 de Junho de 2004, que determinou à Autora o embargo “de todas as obras de demolição ou trabalhos de movimentação de terras que estejam a ser realizados em P........ e O........, no concelho de Sesimbra”.
B) Deve ainda o Réu ser condenado a ressarcir a Autora dos prejuízos sofridos com consequência da prática do acto administrativo ilegal, ainda não totalmente apurados e a liquidar em incidente de liquidação de sentença.”, cfr. certidão da petição inicial de fls. 391 a 434-AH).
Acresce que, como tem sido reiteradamente afirmado pela Jurisprudência dos Tribunais Administrativos, o direito à propriedade não íntegra o direito de construir, não havendo que sobrepor a ponderação de interesses que a Autora faz sobre o local, à escolha efetuado pelo legislador e aplicada pela Entidade Demandada na salvaguarda do enquadramento legal de zona de paisagem protegida.
Atento o exposto, não se pode afirmar, ao contrário do alegado pela Autora, que tenha sido suscitada confiança durante 20 anos no que há classificação dos solos respeita, como urbanos, não havendo que aplicar, face ao caso concreto, o regime do artigo 134° n°3 do Código de Procedimento Administrativo, que não abriga, em última análise, a suscetibilidade de construção ex novo decorrente do ato que deferiu o pedido de loteamento urbano para a constituição de 58 lotes destinados à construção de 58 moradias em 2 de março de 1989, cuja nulidade foi declarada pelo ato impugnado (cfr. QaW).
E, sendo assim, o ato subjudice, praticado em 15 de fevereiro de 2008 pelo agora Réu, ICNB, que declarou a nulidade do ato que deferiu o pedido de loteamento não contraria as normas e os princípios jurídicos invocados pela Autora, nem o artigo 266° n°2 da CRP não sendo, em consequência, suscetível de integrar situação de abuso de direito.”
Acolhe-se, de pleno, o fundamentado e decidido na sentença sob censura, aditando-se, em reforço desse entendimento que se afigura ser patente a partir da sua literalidade que, contrariamente ao afirmado pela Recorrente, o despacho impugnado fundamenta a ilegalidade da obra embargada com base em legislação posterior à data do facto relevante - a licença camarária de 02.03.89 e não o alvará de loteamento n.º …/2005.
Antolham-se como pilares do despacho da Exmª Directora do Departamento de Gestão de Áreas Classificadas Litoral de Lisboa e Oeste que decidiu ordenar a reposição do terreno nas condições pré-existentes, como denota o recorrido na sua contra-alegação, não só o facto de à data da autorização camarária de 02.03.89, ocorrer a violação da Portaria nº26-F/80, de 9 de Janeiro, na parte em que classifica a área em causa como rural, dependente de parecer prévio do Parque Natural da Arrábida, através da remissão expressa do seu art. 17º para o Dec.-Lei n.º 622/76, de 28 de Julho, que criou o Parque Natural da Arrábida e que classifica como rural, no seu mapa anexo, o terreno em causa, mas também o facto de à data da emissão do Alvará n.º …/2005, de 24.11.2005, a violação do Plano Especial de Ordenamento, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 141/2005, de 23 de Agosto, na parte em que classifica a área em causa como rural e de protecção complementar, sendo que as áreas designadas por ''espaços de transição" no Plano Director Municipal de Sesimbra, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 15/98, de 2 de Fevereiro, são igualmente rurais porque não integram os perímetros urbanos definidos (Cfr. Processo Administrativo junto ao processo nº 1792/06.9BELSB -Vol. 2, fls. 103 e fls. 85-86).
Acresce que no PDM (Plano Director Municipal) de Sesimbra, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 15/98, de 2 de Fevereiro, a área em causa continua a ser rural, classificação igualmente conferida pelo Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida.
Por esse prisma, como já salientamos no ponto antecedente conectado com o recurso da matéria de facto, o Recorrido tinha na sua disponibilidade os elementos imprescindíveis para decidir ordenar a reposição do terreno nas condições pré-existentes, como aconteceu.
Assertivamente, o Juiz recorrido ponderou as consequências da aplicação ao caso concreto do princípio tempus regit actum segundo o qual, a legalidade dos actos administrativos afere-se pela situação de facto e de direito existente à data da sua prolação.
E, na verdade, é dentro destes limites que o litígio tem de ser resolvido, sabido que os planos municipais e os demais instrumentos de ordenamento do território, enquanto actos de natureza normativa, se apresentam como importantes instrumentos reguladores da realidade a que se aplicam.
Este é um princípio próprio do Direito Administrativo, segundo o qual as condições de validade de um acto administrativo devem ser apreciadas à luz do direito vigente à data em que o acto é praticado ("tempus regit actus") (cfr. ainda artº 12º nº 2 do CPC e entre outros o Ac. STA de 06.06.2007, rec. 734/06).
O princípio "tempus regit actum" manda aferir a legalidade do acto administrativo pela situação de facto e de direito existente à data da sua prolação – cfr. Acórdão do STA de 03-04-2003, Recurso nº02046/02
Já no acórdão STA de 4.7.02, proferido no recurso 852/02, se assinalava ser "…pacífica a jurisprudência deste Tribunal que afirma, no âmbito do contencioso administrativo, a vigência do princípio “tempus regit actum”, segundo o qual, a apreciação da legalidade dos actos administrativos deve ter em conta, apenas, a realidade fáctica existente no momento da sua prática e o quadro normativo então em vigor” (Acórdãos STA de 6.2.02, no recurso 37633, Pleno, e de 7.2.02, no recurso 48295).
Com efeito, nesta área rege, em regra, o princípio do “tempus regit actus” que, aliás, se trata, em bom rigor, de um princípio geral do direito administrativo, a regra de que os actos administrativos se regem pela lei existente à data da sua prática, princípio esse que se apresenta como uma consequência do princípio da legalidade Administração.
Temos assim, que, em princípio, não é lícito invalidar um acto administrativo com base num quadro legal não vigente à data da sua prática.
Vide, neste sentido, entre outros, os Acs. deste STA, de 20-11-69 (Pleno) - AD 97, a págs. 144, de 22-7-76 (Pleno) AD 160-1672, de 17-12-80 (Pleno) - AD 233-637 e de 23-1-86 (Pleno) - AD 299-1379 e da Secção de 27-9-88 - AD 351-285, de 10-1-89 - AD 303, de 29-1-91 - Rec. 28831, de 2-12-93 - Rec. 31797 e de 30-3-95 - Rec. 26880.
E, isto, sem prejuízo de nalgumas situações ser de aplicar a figura de invalidade sucessiva ou superveniente, que decorre de um acto, originariamente válido, vir a ser invalidado “ex vi” de uma alteração superveniente da situação de facto ou de direito que esteve na base da sua prática.
Cfr., quanto a esta questão, Pedro Gonçalves, in “A nulidade dos actos administrativos de gestão urbanística”, na Revista do Centro de Estudos de Direito do Ordenamento, do Urbanismo e do Ambiente”, Ano, 1, 99, a págs. 34 e seguintes.
Tendo em consideração tudo o que vem de dizer-se e sufragando a fundamentação fáctico-jurídica construída na sentença, impõe-se concluir que a ajuizada licença de loteamento enferma de nulidade, por violação do diploma à data da prolação do acto autorizativo ("in tempus regit actum") e porque a nulidade é expressamente cominada pelo artigo 9º do Decreto-Lei nº 622/76, de 28 de Julho.
Aliás e como enfatiza o recorrido, esse vício continuou a ser cominado para os actos que não se conformem com os planos especiais de ordenamento do território (Cfr. artigo 103° do Decreto-Lei nº 380/99, de 22 de Setembro) e, por assim ser, ao contrário do que pretende a Recorrente, a inobservância do disposto no artigo 14° nº 2 da Portaria no 26-F/80, de 09 de Janeiro não gera mera anulabilidade, sanável pelo decurso do tempo, mas sim nulidade da licença de 1989 e de todos os actos sucessivos.
Ademais, o parecer do Parque Natural da Arrábida e a licença de loteamento da Câmara Municipal de Sesimbra são nulos, na parte em que classificam a área como urbana e em que dispensam, por isso, o respectivo procedimento - nos termos dos arts. 12º e 14° n.º2 e 17° da Portaria nº26-F/80, de 9 de Janeiro, e do Dec.-Lei n.º 622176, de 28 de Julho, e que classificam como rural o terreno em causa.
Na verdade, é incontrovertível que a assacada nulidade está expressamente prevista, à data da emissão daquele parecer do Parque Natural da Arrábida, no art. 9° do mesmo Dec.-Lei n.º 622/76, de 28 de Julho: «2. São nulas e de nenhum efeito as licenças municipais concedidas com violação do regime instituído neste decreto».
Por outro lado, é também uma evidência que a Portaria 26-F/80, de 9 de Janeiro, que aprovou o Regulamento do Parque Natural da Arrábida, se enquadra na noção de Plano Especial e nos seus objectivos, nos termos dos arts. 42° e 43º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, mas a tipicidade que este estipula vigora para o futuro, sendo tal Portaria, à data da ilicitude do acto em causa, o diploma jurídico que condicionava a edificação no Parque Natural da Arrábida - e tanto basta.
Por isso é forçoso por isso concluir, na senda do recorrido, que nessa data, às proibições constantes da Portaria 26-F/80, de 9 de Janeiro, de natureza imperativa, correspondiam as sanções expressas quer do regime geral do art. 294° do Código Civil (nulidade), para os negócios jurídicos de direito privado, quer do regime especial do art. 19° nº 5 do Decreto­ Regulamentar n.º 23/98, de 14 de Outubro (nulidade), para os actos administrativos, sendo que para estes tal regime corresponde à excepção prevista no art. 135° do Código do Procedimento Administrativo - «São anuláveis os actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção».
Como também se acolhe o argumento brandido pelo ICN de que, mas mesmo a entender-se que a Portaria nº 26-F/80, de 09 de Janeiro deva ser reconduzida a plano sectorial, a sua violação é, igualmente sancionada com a nulidade (Cfr. artigos 2° nº 2 alínea b) e 103° do Decreto-Lei nº 380/99, de 22 de Setembro), não se convalidando na ordem jurídica por força do decurso do prazo de um ano.
Isso porque "São nulos os actos praticados em violação de qualquer instrumento de gestão territorial aplicável." (vide artigo 103° e artigo 134º do Código do Procedimento Administrativo, vigente ao tempo).
Daí que não proceda o raciocínio seguido pela recorrente para assacar ao despacho da Sra. Directora do DGACLLO a ilegalidade da obra embargada com base num quadro jurídico posterior à data do facto relevante.
*
Por outro lado, é também pacífico que não resulta da conduta administrativa da ED que esta haja criado na Recorrente a confiança de que poderia proceder ao loteamento e de que se tratava de um loteamento em área rural, não sendo configurável a violação pelo acto impugnado dos princípios da boa fé, da legalidade, da justiça e da proporcionalidade.
*
E também se nos afigura que esteja eivado do vício de falta de fundamentação pelas razões aduzidas na sentença recorrida em que, a respeito, se consigna:
“(…)
3.6. - O ato padece de vício de forma por falta de fundamentação?
A Autora alega que as decisões impugnadas não fazem qualquer alusão aos factos que levam a concluir pela violação do POPNA e da Portaria n° 26-F/80, devendo o PNA explicar porque razão alterou o seu entendimento quanto à inclusão dos terrenos da Autora em área rural, que foi o principal pressuposto da emissão da licença de loteamento, bem como devia, explicaras razões da insusceptibilidade de legalização dos trabalhos efetuados.
Conclui que o ato impugnado, ao não explicitar a razão ou razões pelas quais considerou improcedente, quer os argumentos expendidos pela Autora, em sede de audiência prévia, quer os argumentos constantes do parecer jurídico do PNA, no sentido da suspensão do procedimento, o despacho de 2008-02-15, encontra-se ferido de vício de forma por falta de fundamentação o que contraria o artigo 124° e 125° do CPA.
Vejamos.
No que respeita à fundamentação de facto e de direito do ato administrativo, dispõe o artigo 125° do CPA, o seguinte:
“1 - A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respectivo acto. (...)" (sublinhado nosso).
Ao nível jurisprudencial, tem sido entendido que a fundamentação se reconduz a um conceito de natureza relativa, devendo adequar-se ao tipo de ato e às circunstâncias do mesmo, daí decorrendo a necessidade de maior ou menor extensão da indicação dos motivos que lhe estão subjacentes, para o esclarecimento do seu destinatário.
Neste sentido, por muito esclarecedor, leia-se o sumário do Colendo Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n° 0132/03 de 2003-05-28:
7 - A fundamentação do acto administrativo é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas só é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear dos mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação.
II - A expressão «tendo em conta o parecer...», utilizada num acto administrativo revela adesão aos fundamentos daquele parecer, na parte que no próprio acto não seja afastada. (...)”, in www.dgsi.pt
Igualmente, por se tratar de questão pertinente, tendo em conta a natureza do processo administrativo, que se reconduz a uma sucessão de atos praticados, tendo em vista a produção do ato final, tem sido admitida a fundamentação “por remissão”, e mesmo a possibilidade da “dupla remissão”, obviando assim à necessidade de concentrar todos os motivos que pautaram a decisão, no ato final.
Sobre esta matéria, leia-se ainda o sumário do Acórdão do Colendo Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n° 048239, de 2002-01-31: 7 - A fundamentação "per relationem", expressamente prevista no art. 125°, n° 1 do CPA, consiste na remissão expressa para os termos de uma informação, parecer ou proposta que contenha, ela mesma, a motivação do acto, de tal modo que uma declaração de concordância sobre elas exarada deve ser entendida no sentido de que o acto administrativo absorveu e se apropriou da respectiva motivação ou fundamentação, que, assim, dele ficará a fazer parte integrante.
II-A jurisprudência do STA tem considerado admissível a fundamentação por dupla remissão, ou seja, que o acto remeta para uma peça processual que, por seu turno, remeta para outra, desde que ambas se encontrem no processo, e daí não resulte demasiada complexidade na fundamentação.”, in www.dgsi.pt, (sublinhados nossos).
Ao que resulta do probatório, o ato contém os fundamentos de facto e de direito que permitem à Autora, conheceres motivos da declaração de nulidade ora impugnada e os motivos da insusceptibilidade de legalização da situação face ao enquadramento legal e regulamentar vigentes.
Em síntese, e ao contrário do alegado pela Autora, resulta da fundamentação do ato
que:
- O terreno está em área rural o que decorre das normas da Portaria n°26-F/80 de 9/01, tendo sido ponderado, designadamente, que:
“No projecto de decisão ora objecto das considerações da interessada, foram pressupostos de facto e de direito a situação da propriedade em área rural e não área urbana, ao contrário do que entende a A.............. Ou seja, considera-se que tanto a Portaria n°26- F/80 de 9/01, como o POPNA classificaram aquela área como solo rural. O despacho do Secretário de Estado, salvo melhor entendimento, constitui um elemento histórico de interpretação, importante, no entanto esse despacho, por mais considerações que possam ser tecidas, objectivamente nunca passou disso mesmo, um despacho sem eficácia jurídica, por falta de publicação do mesmo. ”
- Mais foi ponderado no ato sub judice, a suscetibilidade de legalização, nos seguintes termos:
“Não ponderar a (in)validade da licença de loteamento, também à luz do POPNA (embora o diploma legal seja posterior ao acto de licenciamento) seria deixar de ponderar a eventual susceptibilidade de legalização do loteamento em apreço. Ou seja, caso o POPNA previsse a possibilidade de lotear em áreas de protecção complementar (art. 18° a 22° do POPNA), evidentemente, não seria projectada a ordem de reposição do terreno nas condições pré-existentes. Este juízo, ao contrário do que pretende a Exponente, não constitui uma aplicação retroactiva do POPNA, mas sim a ponderação da (in) susceptibilidade de legalização do loteamento em causa, precisamente em consonância com o princípio da proporcionalidade, (...)”. (cfr. AN e AO).
Deste modo, por vício de falta de fundamentação, por não terem sido respeitados os artigos 124° e 125° do CPA, não pode a presente ação proceder.”
Constata-se que todas as questões foram devidamente ponderadas, aduzindo-se, se não uma profícua e exaustiva fundamentação, pelo menos uma fundamentação bastante em face da comedida dificuldade da lide, de modo que o acto impugnado não pode ser havida por não motivada.
E a fundamentação aduzida pelo Administração, ao contrário do que alega o Recorrente, não se configura como uma fundamentação por mera referência para os factos e normas que os subsumam, antes se mostra suficientemente arrazoada, com utilização do silogismo judiciário, onde a conclusão se estriba em premissas explanadas, pelo que se trata de uma fundamentação cabal das normas que a exigem, na interpretação que é feita pela doutrina citada na sentença até porque, como assertivamente assevera o recorrida: "Uma coisa é a Recorrente não concordar com os fundamentos expostos na decisão aqui impugnada, outra coisa, é vir dizer que o Recorrido não fundamentou as suas decisões." 
Não incorre, pois, a decisão recorrida no vício de falta de fundamentação.

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Destarte, improcedem in totum os fundamentos recursórios e improcedem os pedidos de anulação do despacho da Senhora Directora do Departamento de Gestão das Áreas Classificadas Litoral de Lisboa e Oeste, doravante designada por DGACLLO, datado de 15 Fevereiro 2008, que confirmou o projecto de decisão de declaração de nulidade da licença de loteamento a que corresponde o Alvará nº…/2005 de que a Autora é titular, indeferindo simultaneamente a proposta de suspensão do procedimento constante do parecer do serviço jurídico do Parque Natural da Arrábida (PNA) nº22/2008 e do reconhecimento da validade da licença de loteamento, datada de 2 de Março de 1989, emitida no processo de loteamento nº......... da Câmara Municipal de Sesimbra, que deu origem ao Alvará de Loteamento nº …/2005. 
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3.- DECISÃO:

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao presente recurso jurisdicional e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

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Lisboa, 04 -07-2019
(José Gomes Correia)
(António Vasconcelos)
(Pedro Marchão Marques)