Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 2186/09.0BELSB |
Secção: | CA |
Data do Acordão: | 11/14/2024 |
Relator: | MARIA HELENA FILIPE |
Descritores: | MILITAR NOMEADO PARA FUNÇÕES DE DIRECTOR TÉCNICO DO PROJECTO Nº 1 – APOIO À ORGANIZAÇÃO SUPERIOR DA DEFESA E DAS FORÇAS ARMADAS, INSCRITO NO PROGRAMA-QUADRO DA COOPERAÇÃO TÉCNICO-MILITAR COM A REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DE SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE, PELO PERÍODO DE UM ANO SEGREDO DE ESTADO – DOCUMENTOS OFICIAIS ERRO NOS PRESSUPOSTOS DE FACTO E ERRO NO JULGAMENTO DA MATÉRIA DE DIREITO DECRETO-LEI Nº 238/96 DE 13 DE DEZEMBRO EMFAR CRP E CPA LEI Nº 6/94, DE 7 DE ABRIL DECRETO-LEI Nº 238/96, DE 13 DE DEZEMBRO LEI Nº 11/89, DE 1 DE JUNHO LEI Nº 46/2003, DE 22 DE AGOSTO DECRETO-LEI Nº 233/96, DE 7 DE DEZEMBRO LEI ORGÂNICA Nº 1-B/2009, DE 7 DE JULHO LEI Nº 2/2004, DE 15 DE JANEIRO ARTº 9º DO CÓDIGO CIVIL |
Sumário: | I - O despacho que determinou a exoneração da comissão do militar fora do país tem de ser devidamente fundamentado e comprovado, o que não sucedeu, pelo que o mesmo enferma de erro nos pressupostos de facto. II - O enquadramento que se atém à opacidade da fundamentação do acto que ordenou o regresso do Recorrido ao Território Nacional, porém qualificada pelo Recorrente como adequada e atingível, justifica para a sua apreciação, não só que não pode estar imbuído dos termos que ofendam os requisitos constantes no artº 125º do CPA, como lançando mão de contrariar o argumento de dever ser observada com absoluta imperiosidade, nos documentos oficiais como os que provêm das Forças Armadas, que a menção aos motivos para se ordenar o supracitado retorno à pátria, deve ser reduzida ou apenas figurar uma ínfima parte, mais abstracta. III - É neste enquadramento que entendemos que o juiz ad quem detém o poder-dever de proceder à requalificação ou reconfiguração normativo-jurídica do caso, desde que observada a condição de ser subsumível dentro da fronteira da factualidade provada e estando cimentada a notificação do recurso às partes, o que estabelece uma função conectiva com os limites do efeito prático-jurídico pretendido. IV - Neste conspecto, o Recorrente podia esgrimir as veras razões para a tomada de decisão de exonerar o Recorrido e que têm de integrar o dever de fundamentação, à luz do artº 123º e do artº 125º, ambos do CPA, com base na Lei nº 6/94, de 7 de Abril, que aprovou o regime do segredo de Estado, conjugando o artº 2º e o artº 5º. V - Não estando face a uma nomeação definitiva não tem cabimento orgânico ser iniciada protocolarmente com uma tomada de posse, pois tratando-se da substituição de um cargo de direcção, por natureza precário e temporário, tem por finalidade assegurar o princípio da continuidade dos serviços já encetados e desenvolvidos pelo anterior substituído militar. VI - O despoletar do desempenho do cargo de direcção técnica pelo Recorrido, implica sempre o despacho em consonância por parte do membro do Governo responsável pela área da Defesa Nacional, nos termos do artº 4º do Decreto-Lei nº 238/96 de 13 de Dezembro e do nº 2 do artº 147º do EMFAR. VII - O ditame do término da comissão em apreço deriva precisamente do estipulado no nº 4 do imediatamente antecedente normativo legal, significando que esse exercício “pode ser dado por findo, a todo o tempo, por iniciativa do membro do Governo responsável pela área da defesa nacional ou a pedido do militar”, na figura da exoneração do cargo. VIII - Não acompanhamos, assim, o entendimento cursado pelo juiz a quo ao contemplar que nem o EMFAR, nem o Decreto-Lei nº 238/96, de 13 de Dezembro, incluem preceito legal respeitante à cessação precoce da comissão de cooperação, amparado no que qualifica como uma lacuna quanto ao regime jurídico da exoneração, dos militares em missão técnico militar, pela figura da comissão de serviço para o exercício de cargos de direcção e chefia, a integrar pela Lei nº 2/2004, de 15 de Janeiro que aprovou o Estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da Administração central, regional e local do Estado, convocando que pela aplicação do nº 2 do artº 25º é desencadeada a cessação a todo o tempo por inadaptação ou deficiente percepção as responsabilidades inerentes ao cargo. IX - Não é aplicável aos militares a Lei nº 2/2004, de 15 de Janeiro, como resulta do seu objecto e âmbito previsto no artº 1º, estipulando o nº 1 do artº 2º, sob a epígrafe ‘Cargos dirigentes’, que estes são “os cargos de direcção, gestão, coordenação e controlo dos serviços e órgãos públicos abrangidos pela presente lei”, considerando que o nº 1 do artº 33º do EMFAR determina que “Os cargos militares são definidos como os lugares fixados na estrutura orgânica das Forças Armadas a que correspondem as funções legalmente definidas”. X - O Recorrido assumiu um cargo militar – Director Técnico do Projecto 1 –preenchido por uma função militar de direcção – Coordenador da Cooperação Técnico-Militar na República de São Tomé e Príncipe – preconizada na alínea b) do nº 2 do artº 34º, em harmonia com o previsto no artº 39º, ambos do EMFAR, que se ajusta com o seu posto de Tenente-Coronel. XI - Nomeado pelo Despacho do Ministro da Defesa Nacional, sob proposta da Direcção-Geral de Política de Defesa Nacional, após indigitação pelo seu Chefe de Estado Maior, correspondendo o respectivo início da comissão de serviço “na data de partida e cessa na data de chegada do militar ao território nacional” – cfr respectivamente nº 1 do artº 4º e nº 3 do artº 6º do Decreto-Lei nº 238/96, de 13 de Dezembro – não restam dúvidas que a nomeação mostra-se correcta e adequadamente efectuada – como foi – por despacho não revestido subsequentemente por uma tomada de posse, e a exoneração cumpriu o estabelecido in fine no nº 3 do artº 33º do EMFAR XII - Assim, a nomeação do Recorrido em comissão normal de serviço como Director Técnico do referido Projecto 1, ao ter sido figurada enquanto titular de uma função imbuída da condição militar, apelando apenas ao despacho de nomeação sem uma tomada de posse, não padece de erro na aplicação do direito, inexistindo qualquer lacuna, quanto ao regime jurídico da exoneração, dos militares em missão técnico militar, contrariamente ao entendido na sentença recorrida. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Indicações Eventuais: | Subsecção SOCIAL |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | I. Relatório Ministério da Defesa Nacional, notificado da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 28 de Junho de 2022, que julgou procedente a acção intentada por J...................anulando a decisão impugnada e condenando o Recorrente a restabelecer a situação hipotética peticionada pelo Recorrido, dela veio interpor recurso para este Tribunal Central Administrativo Sul. Nas suas alegações, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: “A. O presente Recurso vem interposto da Douta decisão que julgou procedente a ação intentada pelo Autor, ora Recorrido e, em consequência, condenou "…o R. a restabelecer a situação hipotética atual do A. como se a decisão anulada não tivesse sido praticada." E, por conseguinte, a pagar ao A., ora Recorrido, "…as remunerações e suplementos, incluindo o de missão, devidas pelo período de um ano, incluindo a contagem do tempo para aposentação prevista no art.º 12.º do Dec.-Lei n.º 238/96, de forma a que, no período de 19.08.2004 a 19.08.2005, o A. não sofra qualquer diferença de remuneração, abono ou regalia relativamente àquilo que auferiria se tivesse completado a comissão." B. No entanto, entende o ora recorrente que a douta sentença proferida incorre em erro de julgamento, por erro nos pressupostos de facto e na interpretação e aplicação do direito. C. Não tem, porém, razão, a douta sentença, por incorrer em erro de julgamento, porquanto: D. Incorre em erro nos pressupostos de facto, ao parecer não ter entendido a situação de facto em presença, e erro nos pressupostos de direito, ao não aplicar corretamente as normas jurídicas invocadas. E. A douta sentença, incorre, ainda em erro na aplicação do direito, ao aplicar regimes jurídicos que não são aplicáveis ao caso concreto. F. De acordo com o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 238/96, de 13 de dezembro, "a cooperação técnico-militar insere-se na política bilateral de cooperação levada a cabo pelo Estado Português. Como instrumento da política externa portuguesa, a cooperação técnico-militar visa contribuir para a paz e o desenvolvimento global." G. Ainda no mesmo preâmbulo é referido que “Para Portugal, a cooperação técnico-militar constitui um importante factor de afirmação no mundo. Para os países seus beneficiários, constitui-se como um vector de desenvolvimento, criando pólos de incremento económico e social, através da formação, especialização e qualificação do pessoal militar." H. E, ainda, que “a cooperação técnico-militar deve ser tida como exercício da função militar, importa definir o estatuto dos militares que participam nas suas acções específicas, concretizadas no território de países estrangeiros”. I. E este contexto está igualmente corretamente explanado no próprio Despacho impugnado, com vista à caracterização das funções correspondentes ao cargo do qual foi exonerado o A., ora Recorrido, resultando da motivação do Despacho impugnado que "…em 2004, cabia ao Director Técnico do Projecto 1 a função de coordenador da Cooperação Técnico-Militar em cada um dos países, numa perspectiva funcional, o que aumentava substancialmente a sua relevância no quadro desta Cooperação sectorial". J. De acordo com o disposto nos artigos 4.º e 5.º do Decreto-Lei n.º 238/96, de 13 de dezembro, para ações de CTM, os militares são nomeados por escolha, por Despacho do Ministro da Defesa Nacional, sob proposta da Direcção-Geral de Política de Defesa Nacional (DGPDN), após indigitação pelo Chefe de Estado Maior respetivo. K. A nomeação para o cargo foi feita por escolha, por indigitação do Ramo, de entre vários miliares que se mostraram disponíveis para o desempenho do cargo, aceite e proposto pela DGPDN ao Ministro da Defesa Nacional, atendendo ao perfil pessoal e profissional pretendido, dado tratar-se de uma função que tem subjacente, uma relação de confiança inerente funções exercidas. L. Mais dispõe o n.º 1 do artigo 6.º do supracitado diploma legal que, exceto no caso de se encontrar na situação de reforma, o militar exerce funções de CTM na efetividade de serviço, sendo que, nos termos do n.º 3, a comissão de CTM se inicia na data da partida e cessa na data de chegada do militar ao território nacional. M. No que respeita à duração da comissão técnico-militar dispõe o mesmo artigo 6.º, no seu n.º 2, que a mesma tem a duração prevista para cada ação de cooperação no respetivo programa-quadro, não podendo exceder o período de um ano. Todavia, e de acordo com o disposto no n.º 4 do mesmo artigo, em casos devidamente justificados e com anuência do militar, a comissão pode vir a ser sucessivamente prorrogada até ao limite máximo de dois anos. N. A exoneração é, nos termos do n.º 3 do artigo 33.º do Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR), o ato pelo qual cessa o exercício do cargo militar, sendo este, no caso em apreço, correspondente ao exercício de ações de cooperação técnico-militar, para o qual o militar foi nomeado, nos termos do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 238/96, de 13 de dezembro. O. Atento o conteúdo das funções inerentes ao cargo, acima enunciadas, verifica-se que o ato de exoneração, ora posto em crise, é exercido no âmbito do poder discricionário da Administração Pública, devendo nestes casos, o ato conter a motivação da decisão. P. De facto, foi o que aconteceu no ato ora impugnado, onde consta a motivação, que conduziu à exoneração do A., ora Recorrido, respeitante à inadequação do respetivo perfil relativamente ao exigido aos titulares dos cargos militares respeitantes ao exercício de ações de CTM concretizadas em território estrangeiro, nos termos do Decreto-Lei n.º 238/96, de 13 de dezembro, conforme pontos 7. 8. e 10. do despacho impugnado, que ora se consideram como integralmente reproduzidos. Q. Ao contrário do que pretende o A., ora Recorrido, não pode deixar de considerar que os atos administrativos, no âmbito do procedimento de nomeação e exoneração para cargos de elevada responsabilidade e específicos como são as missões em causa, têm que ser praticados de modo a não comprometer as relações entre Estados. R. Não pode o MDN ficar limitado na gestão dos seus representantes, em situações em que as respetivas ações ou omissões, coloquem em causa a imagem do país e das instituições militares e diplomáticas. S. Saliente-se ainda que, tratando-se de uma área e relações que relevam da soberania, há que entender, ou que aceitar, que nem todos os motivos podem constar expressamente de documentos oficiais escritos, e muito menos, ser publicados em Diário da República. T. Por tudo o exposto, não se verifica, contrariamente ao entendido na douta sentença, o vício de falta de fundamentação. U. Por fim, e no que tange à alegada violação do princípio da legalidade, rogada pelo A., ora recorrido, segundo o qual, não existe qualquer norma jurídica que habilite a cessação, por exoneração, dos militares em missão técnico militar, mal andou a douta sentença ao entender, que "(…) nem o EMFAR nem o Decreto-Lei n.º 238/96, de 13 dezembro contém qualquer norma legal relativa à situação precoce (antes do termo inicialmente previsto), da comissão de cooperação, pelo importa integrar esta lacuna." V. Desde já se refira que não existe qualquer lacuna, quanto ao regime jurídico da exoneração, dos militares em missão técnico militar. W. Com efeito, os órgãos da Administração Pública devem atuar em obediência à lei, dentro dos limites dos poderes que lhes forem conferidos e em conformidade com os respetivos fins, constituindo uma finalidade premente deste princípio, previsto no artigo 3.º do Código do Procedimento Administrativo, a de que toda a atuação da Administração Pública carece de norma legal habilitante. X. No entanto, não se pode olvidar que a falta de norma expressa que incida sobre cada caso concreto não importa a necessária inexistência de norma aplicável a esse caso concreto e, consequentemente, um vazio legal ou inabilitante. Y. Neste âmbito, determina o Código Civil no seu artigo 9.º que a interpretação jurídica não deve cingir-se à letra da lei, devendo reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta os demais elementos hermenêuticos, como são o elemento histórico, sistemático e teleológico. Z. É, em observância dos referidos normativos legais, que se considera que o termo de uma comissão no âmbito da Cooperação Técnico-Militar, como é a do caso sub judice, deve ser aferido, conjugadamente, com as disposições legais previstas, respetivamente no Decreto-Lei n.º 238/96, de 13 de dezembro e no EMFAR. AA. Com efeito, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 33.º do EMFAR são considerados militares os lugares existentes em qualquer departamento do Estado ou em organismos internacionais a que correspondem funções de natureza militar e de acordo com o n.º 3 do mesmo artigo, o desempenho destes cargos inicia-se com a tomada de posse suspende-se com o afastamento temporário do titular e cessa com a sua exoneração. BB. Assim, o termo do exercício do cargo de diretor técnico-militar, no âmbito da CTM, cessa pelo decurso da comissão, nos termos do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 238/96, de 13 de dezembro, ou pela exoneração do cargo, nos termos do n.º 3 do artigo 33.º do EMFAR. CC. De tais normativos legais resulta, inequivocamente, que qualquer titular de um cargo, civil ou militar, é exonerado se não cumprir a sua missão ou se tiver uma conduta contrária aos interesses que essa função visa defender, não sendo necessário ocorrer o decurso da comissão, nem verificar-se, se findar antes do termo da comissão, causa disciplinar ou impedimento para o efeito. DD. Porém, sempre se diga que, a existir tal lacuna, o que apenas por mera hipótese de raciocino se admite, a mesma não seria suscetível de integração nos termos em que faz a sentença recorrida, que, para o efeito, invoca o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.10.2003 (02s2771, Fernandes Cadilha), que versou sobre a cessação de comissão de serviço em empresa pública bem como o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 64/91, de 4 de abril, que incidiu sobre a cessação da comissão de serviço, no âmbito do direito privado. EE. Ora o desempenho da função de CTM não é subsumível em nenhuma das situações sobre as quais versam tais acórdãos, sendo que tal cargo não preenche nenhum dos tipos de cargos e/ou funções que podem ser exercidas em comissão de serviço, pelo que é totalmente inadequada, para o caso vertente, a invocação dos referidos Acórdãos. FF. É que, como se extrai do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 238/96, de 13 de dezembro "a cooperação técnico-militar insere-se na política bilateral de cooperação levada a cabo pelo Estado Português (…) visa contribuir para a paz e o desenvolvimento global (…) e deve ser tida como exercício da função militar. GG. Do exposto resulta que, sendo a cooperação, tida nos termos do preâmbulo, como exercício da função militar, a qual é regida por um estatuto próprio, em consequência, à exoneração, de uma nomeação no âmbito de CTM, deve ser subsidiariamente aplicável o n.º 3 do artigo 33.º do EMFAR, como se verificou! HH. Pelo que se conclui que não existe qualquer lacuna, quanto ao regime jurídico da exoneração, dos militares em missão técnico militar, contrariamente ao entendido na sentença recorrida, e mesmo que existisse, a mesma nunca seria suscetível de ser enquadrada, nos termos em que faz a douta sentença recorrida. II. Em conclusão, a atuação do R. MDN norteou-se pelo estrito cumprimento da lei e dos princípios vigentes em matéria constitucional e administrativa, a que se encontra vinculada na sua atividade, não se verificando a existência de nenhum ato ilícito, nem a violação do princípio da legalidade. JJ. Em suma, o R. MDN considera que o ato ora impugnado não enferma de qualquer vício, ao contrário do invocado pelo A., tendo sido feita uma correta aplicação da Lei, pelo que deve o mesmo ser mantido nos seus precisos termos. KK. A Sentença ora recorrida padece de erro nos pressupostos de facto e erro no julgamento da matéria de direito, pelo que, em consequência, o presente recurso deve, por isso, ser julgado procedente e, em consequência, deve-se proceder à revogação da decisão recorrida. Nestes termos e nos demais de direito, que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, deve-se proceder à revogação da decisão recorrida, mantendo-se inalterado o ato administrativo praticado”. * Pelo Recorrido foram apresentadas contra-alegações, que nas respectivas conclusões expressou o que segue: “(1ª) As conclusões do recurso apresentadas pelo Recorrente têm a mesma extensão do corpo das alegações, não tendo sido respeitado, por isso, a obrigação de síntese imposta pelo preceito do artigo 639º, nº 1, do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 1º do CPTA, devendo proceder-se ao convite para síntese das mesmas, nos termos do disposto no artigo 639º, nº 3, do CPC; (2ª) Muito embora o Recorrente invoca a existência de invocar erro nos pressupostos de facto, na medida em que a douta sentença recorrida «parece não ter entendido a situação de facto em presença» [conclusão D.] lido o recurso interposto, não se alcança da fundamentação do Recorrente, qual o pressuposto de facto sobre o qual, supostamente, terá errado a douta sentença a quo, limitando-se o Recorrente a invocar supostos erros de julgamento da douta sentença recorrida no que aos pressupostos de direito ou a sua aplicação concerne; (3ª) A motivação do ato de exoneração não consta dos pontos 7. 8. e 10. do despacho impugnado porquanto os mesmos não são efetivamente suficientes para se perceber o iter cognoscitivo que levou à decisão tomada; (4ª) O conteúdo do ponto 7 não permite perceber que tipo de perfil é que o Recorrido tem ou tinha que não se enquadrava no perfil exigido para as funções de que foi nomeado por concurso, que perfil é que era exigido que o Recorrido não tinha e quando foi nomeado não lhe conheciam, que responsabilidades é que o Recorrido não assumiu, que devesse assumir, enquanto Diretor Técnico Militar, que tipo de contacto assumido pelo Recorrido com os interlocutores se mostrava desfavorável ao desenvolvimento da confiança, da credibilidade e da empatia, que embaraços é que o Recorrido criava na cooperação bilateral, a quem é que o Recorrido criava embaraços e quem que pôs em causa a alegada falta de confiança e a falta de credibilidade do Recorrido; (5ª) A mesma fundamentação vaga e genérica consta do citado ponto 8. do despacho impugnado, não esclarecendo, este ponto, em que áreas é que o Recorrido projetava a sua atividade, estando, no entanto, vedado às mesmas, ou que áreas estariam restritas a outros serviços; (6ª) Por outro lado, existe uma manifesta contradição entre o ponto 8. que refere que as funções «eram apenas e só de assessoria» e o ponto 6. que afirma que «[a]cresce que, em 2004, cabia ao Diretor Técnico do Projeto 1 a função de coordenador da Cooperação Técnico-Militar (…), numa perspetiva funcional, o que aumentava substancialmente a sua relevância no quadro desta Cooperação sectorial», contradição que, a par da falta de especificação do que é que englobava a coordenação de toda a assessoria técnico militar e o que é que ficava de fora, tornam o ato impugnado opaco e, por isso, não fundamentado, como bem considerou a douta sentença recorrida; 7ª) Quanto ao ponto 10. do despacho impugnado, nenhum argumento de facto é invocado que, mais uma vez, pudesse ter lançado luz sobre o seu sentido decisório; (8ª) Ainda, assim, porém, é o próprio Recorrente admite que o ato não contém os fundamentos da decisão, mas que tal sucede, porquanto, no seu entendimento, «nem todos os motivos podem constar expressamente de documentos oficiais escritos e, muito menos publicados em Diário da República»; (9ª) O argumento da conclusão anterior, porém, constitui uma questão nova, não suscitada pelo Recorrente em sede de primeira instância, sendo jurisprudência unânime que não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação (cf., a título de exemplo, o recente douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 15-03-2019, proferido no âmbito do processo nº 03476/15.8BEBRG, disponível em www.dgsi.pt); (10ª) Assim, constituindo questão nova o entendimento de que nem todos os motivos podem constar expressamente de documentos oficiais escritos e, muito menos publicados em Diário da República no que respeita aos atos praticados no âmbito da Cooperação Técnico-Militar, deverá tal questão não ser apreciada por este Tribunal Superior; (11ª) Ainda que assim não se entenda e sem conceder, o referido entendimento é perfeitamente contra legem e não tem qualquer respaldo legal ou constitucional, porque o Diploma que regula este tipo de missões e, que regulava, à data, nada dispõe quanto ao suposto segredo em caso de exoneração da missão, o mesmo sucedendo com o EMFAR, aplicando-se a obrigação de fundamentação prevista no artigo 124º do Código de Procedimento Administrativo, aplicável à data – na medida em que se trata de um ato que restringiu um direito ou interesse legalmente protegido – dever de fundamentação este que é, por sua vez, a concretização constitucional do artigo 268º, nº 3, da Constituição da República Portuguesa; (12ª) E essa fundamentação terá de ser, naturalmente, cabal, não havendo margem para deixar-se argumentos escondidos ou não divulgados, o que é essencial no que respeita a atos praticados no exercício de poderes discricionários ou com alguma margem de discricionariedade; (13ª) O entendimento de que a exoneração do cargo de diretor técnico-militar, no âmbito da Cooperação Técnico-Militar, por força da natureza do cargo, não está obrigada a este dever de fundamentação, constitui uma interpretação inconstitucional do regime do estatuto dos militares que participam neste tipo de ações específicas, previsto no Decreto-Lei nº 238/96, de 13 de dezembro, por violação daquele preceito constitucional presente no nº 3 do artigo 268º da CRP (14ª) A entender-se que a fundamentação do ato comprometeria as relações entre Estados, poderia o ato ter sido devidamente classificado, ao abrigo da Lei do Segredo de Estado, à data, a Lei nº 6/94, de 07 de abril, o que não sucedeu, o que impede o Recorrente de se escudar numa pretensa salvaguardar de imagem para sustentar que os motivos da exoneração não poderiam ser expostos; (15ª) Não tem razão o Recorrente quando sustenta que a douta sentença recorrida errou na aplicação do direito, por considerar que não existe lacuna quanto ao regime jurídico da exoneração dos militares em missão técnico militar, aplicando-se antes o nº 3 do artigo 33º do EMFAR; (16ª) Porém, este preceito parece não se aplicar aos cargos da Cooperação Técnico-Militar, na medida em que, para o seu exercício, os militares não tomam posse. Veja-se, no caso em análise, que o Recorrido foi nomeado pelo Despacho nº 18674/2004, publicado em Diário da República, II Série, nº 209, de 4 de setembro de 2004, não tendo tomado posse do cargo para iniciar o exercício de funções correspondentes; (17ª) E inexistindo norma quanto à forma de cessação antes do fim de sua duração – que nos termos do disposto no artigo 6º, nº 2, do Decreto-Lei nº 238/96, de 13 de novembro, corresponde à «duração prevista para cada acção de cooperação no respectivo programa quadro, deve constar expressamente do despacho de nomeação e não pode exceder o período de um ano» - há efetivamente uma lacuna que precisa de ser preenchida com recurso ao lugar paralelo que, neste caso, seria a figura da comissão de serviço, para o exercício de cargos de direção e chefia – com respaldo na Lei nº 2/2004, de 15 de janeiro – aplicando-se, quanto à cessação, o artigo 25º, nº 2, que possibilita a cessação da comissão de serviço a todo o tempo, por «despacho que se fundamente, nomeadamente, na inadaptação ou deficiente percepção das responsabilidades inerentes ao cargo, na não comprovação superveniente da capacidade adequada a garantir a execução das orientações superiormente fixadas, na não realização dos objectivos previstos, na necessidade de imprimir nova orientação à gestão dos serviços, na necessidade de modificar as políticas a prosseguir por estes ou de tornar mais eficaz a sua actuação e na não prestação de informações ou na prestação deficiente das mesmas quando consideradas essenciais para o cumprimento da política global do Governo» (o sublinhado é nosso); (18ª) O referido preceito, admitindo a cessação a todo o tempo por inadaptação ou deficiente perceção das responsabilidades inerentes ao cargo, exige que o despacho que termine a comissão de serviço seja devidamente fundamentado e comprovado; (19ª) Porém, ainda que não haja lacuna, por se entender ser aplicável o artigo 33º, nº 3, do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, nunca se poderia afastar necessidade de fundamentação do ato de exoneração, por força da aplicação dos preceitos de dever de fundamentação dos atos do Código de Procedimento Administrativo que são, por sua vez, a concretização do direito à fundamentação dos atos que afetem os interessados, previsto no artigo 268º, nº 3, da CRP; (20ª) De outra forma, a interpretação do artigo 33º, nº 3, do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, no sentido de que não é necessário fundamentar o ato de exoneração, é inconstitucional por violação daquele preceito da lei fundamental. Termos em que deve o presente recurso ser julgado improcedente, sempre com as legais consequências, com o que V. Exas., Senhores Juízes Desembargadores, farão JUSTIÇA!”. * Notificado nos termos e para efeitos do disposto no artº 146º do CPTA, o Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, não emitiu parecer.* Dispensados os vistos legais, mas com envio prévio de acórdão aos Juizes Desembargadores Adjuntos vem o processo submetido à conferência desta Subsecção da Administrativa Social da Secção do Contencioso Administrativo para decisão.* II. Objecto do recurso (nº 2 do artº 144º e nº 1 do artº 146º do CPTA, nº 4 do artº 635º e nºs 1, 2 e 3 do artº 639º do CPC, aplicável ex vi do artº 140º do CPTA):A questão objecto do presente recurso é a de saber se a sentença recorrida padece de erro nos pressupostos de facto e erro no julgamento da matéria de direito. * III. Factos (dados como provados na sentença recorrida):“Com relevo para o conhecimento do pedido impugnatório, considero provados os factos seguintes: 1 - Por despacho de 16 de agosto de 2004, do então Secretário de Estado da Defesa e Antigos Combatentes, publicado no D.R., 2.ª Série, n.º 209, de 4 de setembro de 2004, no uso de competências delegadas pelo Ministro de Estado e da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, o A. foi nomeado para o desempenho de funções de diretor técnico do Projeto n.º 1 – Apoio à Organização Superior da Defesa e das Forças Armadas, inscrito no Programa-Quadro da Cooperação Técnico-Militar com a República Democrática de São Tomé e Príncipe, pelo período de um ano (docs. a fls. 9 e 11 do processo administrativo e doc. 2 junto à p.i.); 2 - O A. foi nomeado, por escolha, com base em proposta (indigitação) de S. Exa. o Chefe do Estado-Maior do Exército (CEME), apresentada a S. Exa. o Ministro da Defesa Nacional através de comunicação interna escrita com a classificação de “reservado”, em substituição do Tenente-Coronel C..................... (doc. a fls. 1 do processo administrativo); 3 - A coberto do ofício n.º 5575 do Gabinete CEME, dirigido ao Diretor-Geral de Política de Defesa Nacional, foi enviado o curriculum vitae do A. (doc. a fls. 2 a 6 do processo administrativo); 4 - Através do oficio n.º 2255, de 16 de julho de 2004, a Direção-Geral de Política de Defesa Nacional (DGPDN) submeteu à consideração do Secretário de Estado da Defesa e Antigos Combatentes a proposta de despacho de nomeação do A. para o desempenho das funções de diretor técnico do Projeto n.º 1 – Apoio à Organização Superior da Defesa e das Forças Armadas, inscrito no Programa-Quadro da Cooperação Técnico Militar com a República Democrática de São Tomé e Príncipe (doc. a fls. 7 do processo administrativo); 5 - O A. embarcou para São Tomé e Príncipe no dia 19 de agosto de 2004 (doc. a fls. 15 do processo administrativo); 6 - No dia 01.09.2004, pel’o Diretor-Geral de Política de Defesa Nacional, foi assinado o ofício n.º 2564, dirigido ao Chefe de Gabinete do Secretário de Estado da Defesa e Antigos Combatentes, de onde constava que “1. De acordo com o teor da comunicação, pessoalmente feita pelo Chefe de gabinete do Exm.º General CEME, foi solicitado à DGPDN que providenciasse o regresso (urgente) a Lisboa” do ora A. cf. doc. de fls. 14 do processo administrativo); 7 - Por despacho de S. Exa. o Secretário de Estado da Defesa e Antigos Combatentes de “Concordo. Proceda-se em conformidade.”, datado de 2 de setembro de 2009, exarado sobre o ofício n.º 2564, de 1 de setembro de 2004, da Direção-Geral de Política de Defesa Nacional, foi determinado o regresso urgente do A. a Lisboa (doc. a fls. 14 do processo administrativo); 8 - O A. regressou a Portugal a 10 de setembro de 2004 e apresentou-se na DGPDN, onde recebeu guia de marcha para o Estado-Maior do Exército, onde se encontrava colocado antes do início da comissão de cooperação técnico-militar (doc. a fls. 15 do processo administrativo); 9 - Em 17 de janeiro de 2006, o Tenente-Coronel do Exército J...................propôs contra o Ministério da Defesa Nacional, ação administrativa especial, pedindo a condenação à prática do acto ilegalmente recusado, em virtude de o despacho de 2 de setembro de 2004, de S. Exa. o Secretário de Estado da Defesa e dos Antigos Combatentes, estar ferido de nulidade, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 133.º do Código do Procedimento Administrativo, por ofensa do conteúdo essencial de direitos fundamentais, tendo pedido a revogação do mesmo através do requerimento de 14.09.2004, apresentado em 14.10.2004, cf. facto provado E) do acórdão de 14.11.2008; 10 - O Tribunal Administrativo de Círculo (TAC) de Lisboa, por acórdão de 14 de novembro de 2008, julgou procedente o vício de falta de fundamentação do despacho do Secretário de Estado da Defesa e dos Antigos Combatentes, proferido a 2 de setembro de 2004, que determinou o regresso do A. a Lisboa (doc. a fls. 16 a 22 do processo administrativo); 11 - Mais foi determinado pelo Douto Tribunal, na mesma sentença, que “a respeito do pedido de condenação na prática de ato devido, deve ser julgado procedente na medida do que ficou enunciado, ou seja, na medida em que o despacho de 02.09.2004 é inválido por total ausência de fundamentação, devendo a Entidade Demandada apreciar e decidir o requerimento apresentado pelo Autor e identificado na alínea D) dos factos assentes, considerando a referida falta de fundamentação do despacho cuja revogação o Autor requereu”; 12 - A mencionada decisão do TAC de Lisboa transitou em julgado no dia 11 de janeiro de 2009; 13 - Em cumprimento da aludida decisão judicial, S. Exa. o Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar proferiu o despacho n.º 29/SEDNAM/2009, em 21 de maio de 2009, ora impugnado, por via do qual foi determinado o seguinte: i) a revogação do despacho proferido em 2 de setembro de 2004, pelo então Secretário de Estado da Defesa e dos Antigos Combatentes, que determinou o regresso do Tenente-Coronel José Alexandre da Cruz Soares, ora A., a Portugal em 10 de setembro de 2004; ii) a exoneração do A. das funções de diretor técnico do Projeto n.º 1 – Apoio à Organização Superior da Defesa e das Forças Armadas, inscrito no Programa Quadro da Cooperação Técnico-Militar com a República Democrática de São Tomé e Príncipe, com efeitos a partir de 10 de setembro de 2004 (doc. a fls. 24 a 26 do processo administrativo); 14 - A decisão ora impugnada tem o seguinte teor: (IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS) IV. Direito ”. * Sendo o objecto do recurso delimitado pelas respectivas alegações, importa conhecer da pretensão recursiva formulada e que se prende com saber se a sentença recorrida enferma de erro nos pressupostos de facto e erro no julgamento da matéria de direito. Analisando. a) Do erro nos pressupostos de facto Sustenta o Recorrente, em súmula, nas conclusões de recurso que “K. A nomeação para o cargo foi feita por escolha, por indigitação do Ramo, de entre vários miliares que se mostraram disponíveis para o desempenho do cargo, aceite e proposto pela DGPDN ao Ministro da Defesa Nacional, atendendo ao perfil pessoal e profissional pretendido, dado tratar-se de uma função que tem subjacente, uma relação de confiança inerente funções exercidas. (…) O. Atento o conteúdo das funções inerentes ao cargo, acima enunciadas, verifica-se que o ato de exoneração, ora posto em crise, é exercido no âmbito do poder discricionário da Administração Pública, devendo nestes casos, o ato conter a motivação da decisão. P. De facto, foi o que aconteceu no ato ora impugnado, onde consta a motivação, que conduziu à exoneração do A., ora Recorrido, respeitante à inadequação do respetivo perfil relativamente ao exigido aos titulares dos cargos militares respeitantes ao exercício de ações de CTM concretizadas em território estrangeiro, nos termos do Decreto-Lei n.º 238/96, de 13 de dezembro, conforme pontos 7. 8. e 10. do despacho impugnado, que ora se consideram como integralmente reproduzidos. Q. Ao contrário do que pretende o A., ora Recorrido, não pode deixar de considerar que os atos administrativos, no âmbito do procedimento de nomeação e exoneração para cargos de elevada responsabilidade e específicos como são as missões em causa, têm que ser praticados de modo a não comprometer as relações entre Estados. R. Não pode o MDN ficar limitado na gestão dos seus representantes, em situações em que as respetivas ações ou omissões, coloquem em causa a imagem do país e das instituições militares e diplomáticas. S. Saliente-se ainda que, tratando-se de uma área e relações que relevam da soberania, há que entender, ou que aceitar, que nem todos os motivos podem constar expressamente de documentos oficiais escritos, e muito menos, ser publicados em Diário da República. T. Por tudo o exposto, não se verifica, contrariamente ao entendido na douta sentença, o vício de falta de fundamentação”. O Recorrido, em suma, contrapõe que “(4ª) O conteúdo do ponto 7 não permite perceber que tipo de perfil é que o Recorrido tem ou tinha que não se enquadrava no perfil exigido para as funções de que foi nomeado por concurso, que perfil é que era exigido que o Recorrido não tinha e quando foi nomeado não lhe conheciam, que responsabilidades é que o Recorrido não assumiu, que devesse assumir, enquanto Diretor Técnico Militar, que tipo de contacto assumido pelo Recorrido com os interlocutores se mostrava desfavorável ao desenvolvimento da confiança, da credibilidade e da empatia, que embaraços é que o Recorrido criava na cooperação bilateral, a quem é que o Recorrido criava embaraços e quem que pôs em causa a alegada falta de confiança e a falta de credibilidade do Recorrido;”. Vejamos. Resulta do Probatório da sentença recorrida que pelo despacho nº 29/SEDNAM/2009, de 21 de Maio de 2009, o Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, determinou, in fine, o seguinte: “i) a revogação do despacho proferido em 2 de setembro de 2004, pelo então Secretário de Estado da Defesa e dos Antigos Combatentes, que determinou o regresso do Tenente Coronel J…….., ora A., a Portugal em 10 de setembro de 2004; ii) a exoneração do A. das funções de diretor técnico do Projeto n.º 1 – Apoio à Organização Superior da Defesa e das Forças Armadas, inscrito no Programa Quadro da Cooperação Técnico-Militar com a República Democrática de São Tomé e Príncipe, com efeitos a partir de 10 de setembro de 2004”. O Decreto-Lei nº 238/96 de 13 de Dezembro, aprovou o Estatuto dos Militares em acções de cooperação técnico-militar concretizadas em território estrangeiro, dispondo o nº 1 do artº 4º que “Os militares são nomeados para acções de cooperação técnico-militar por despacho do Ministro da Defesa Nacional, sob proposta da Direcção-Geral de Política de Defesa Nacional, após indigitação pelo chefe de estado-maior respectivo”. O Recorrido, foi, portanto, selecionado segundo estes moldes pela hierarquia militar – vide pontos 1. a 4. da matéria de facto da decisão recorrida – para desempenhar uma comissão de cooperação técnico-militar, que ope legis em regra, tem a duração temporal de um ano – cfr nº 2 do artº 6º do citado diploma. Assim sendo, em 19 de Agosto de 2004, quinta-feira, o Recorrido embarcou para São Tomé e Príncipe. Porém, meros doze dias volvidos, em 1 de Setembro de 2004, quarta-feira, foi enviado o ofício nº 2564 pelo Director-Geral de Política de Defesa Nacional ao Chefe de Gabinete do Secretário de Estado da Defesa e Antigos Combatentes, no qual constava: “1. De acordo com o teor da comunicação, pessoalmente feita pelo Chefe de Gabinete do Exm.º General CEME, foi solicitado à DGPDN que providenciasse o regresso (urgente) a Lisboa” do Recorrido. Ao teor deste ofício pelo despacho de 2 de Setembro de 2004 do Secretário de Estado da Defesa e Antigos Combatentes foi dada concordância, procedendo-se em conformidade com a determinação do regresso urgente do Recorrido. Tal efectivou-se em 10 de Setembro de 2004, tendo este último se apresentado na DGPDN, recebido guia de marcha para o Estado-Maior do Exército, onde se encontrava colocado antes do início da comissão de cooperação técnico-militar. Entendemos que o despacho que suportou o regresso urgente a Lisboa daquele militar a escassos dias da sua chegada a S. Tomé e Príncipe, não carece apenas de fundamentação de facto consistente, clara e ineludível, enferma de vício de violação de lei ex vi de não obedecer ao previsto no artº 13º do diploma supracitado: “1 - Compete à Direcção-Geral de Política de Defesa Nacional, no âmbito das suas competências de coordenação das acções de cooperação técnico-militar, apreciar os resultados dos projectos, bem como o desempenho dos militares que intervenham na sua execução. 2 - A apreciação referida no número anterior tem por base as informações prestadas pelo coordenador ou pelo responsável pela execução do projecto e será comunicada ao ramo a que o militar pertence para efeitos da respectiva avaliação individual”. Com efeito, por escolha do Chefe do Estado-Maior do Exército (CEME), apresentada ao Ministro da Defesa Nacional mediante comunicação interna escrita classificada como correspondência reservada, o Recorrido foi indigitado para substituir o Tenente-Coronel C....................., em comissão para o desempenho de funções de director técnico do Projecto nº 1 – Apoio à Organização Superior da Defesa e das Forças Armadas, inscrito no Programa-Quadro da Cooperação Técnico-Militar com a República Democrática de São Tomé e Príncipe. A materialização desta nomeação foi realizada por despacho de 16 de Agosto de 2004, do Secretário de Estado da Defesa e Antigos Combatentes. Não se alcança que o procedimento para a cooperação técnico-militar em causa, rodeado quer de um escrutínio da hierarquia militar quer ministerial, tendo por base o curriculum vitae do indicado, no qual se integra todo o seu percurso profissional que é avaliado em função da respectiva formação, especialização e qualificação, e bem assim com observância do constante no respectivo processo individual, previsto no artº 8º do Decreto-Lei nº 236/99, de 25 de Junho, diploma este que aprovou o Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR), culminando como escolhido, o que significa como adequável para o desempenho visado – acções de cooperação técnico-militar – tenha, em escassos doze dias sido caracterizado como não nomeável para o efeito e convocado o seu regresso à pátria. Nem do despacho sob escrutínio – de 21 de Maio de 2009 –, retiramos em que medida se escorou a motivação do Recorrente para sinalizar, alguma que fosse, desconformidade na actuação do Recorrido para o ter transformado em desqualificado para a função quando era tido como condizente para tal. Destarte, do referido acto destacamos o seguinte: “7. No caso do Tenente-Coronel J...................verificou-se, já em São Tomé e Príncipe e no decurso da missão, que o seu perfil não se enquadrava no perfil exigido pelas funções que ocupava, nem nas responsabilidades que um Director Técnico do Projecto 1 deve ter no contacto com os seus interlocutores, e não era favorável ao necessário desenvolvimento de confiança, credibilidade e empatia junto dos mesmos, o que criava embaraços ao bom e normal desenvolvimento da Cooperação Técnico-Militar luso-santomense. 8. Acresce que o referido Oficial não interpretava devidamente o sentido, alcance e conteúdo real das suas funções, que eram apenas e só de assessoria no âmbito da Cooperação Técnico-Militar, antes pretendendo projectar a sua actividade para áreas que lhe estavam vedadas pela natureza desta Cooperação e pelos requisitos de confiança, transparência e bom senso que a mesma não pode deixar de envolver, áreas essas que se enquadravam na esfera de competência restrita de outros serviços especializados do Estado. 9. Recorda-se que os Países de Língua Oficial Portuguesa, ainda que em fase já muito avançada, estão a concluir processos internos de ajustamento político, social, económico, também ao nível das suas Forças Armadas, sendo essencial que os contributos das assessorias militares em Cooperação Técnico-Militar concorram inequivocamente para os apoiar, consolidar e sustentar. 10. Assim, a permanência do Tenente-Coronel J...................em São Tomé e Príncipe era contrária aos interesses da Cooperação Técnico-Militar, do MDN e do Estado Português no quadro do seu relacionamento com aquele País, tendo por isso regressado a Portugal em 10 de Setembro de 2004, cessando a sua comissão de Cooperação Técnico-Militar nos termos do disposto no nº 3 do artigo 6º do Decreto-Lei nº 238/96, de 13 de Dezembro, mediante despacho nesse sentido, datado de 2 de Setembro de 2004, proferido por Sua Excelência o Secretário de Estado da Defesa e dos Antigos Combatentes. (…) 12. Face ao exposto, e em cumprimento da sentença de 14 de Novembro de 2008, proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, e nos termos do artigo 4º do Decreto-Lei nº 238/96, de 13 de Dezembro e das competências que me foram delegadas pela alínea b) do nº 4 do Despacho nº 18236/2006, de 3 de Agosto de 2006, do Ministro da Defesa Nacional, publicado no D.R., 2a Série, nº 173, de 7 de Setembro de 2006: a) Revogo o despacho de 2 de Setembro de 2004, proferido pelo então Secretário de Estado da Defesa e dos Antigos Combatentes, que determinou o regresso do Tenente-Coronel J...................a Portugal em 10 de Setembro de 2004; b) Com base na fundamentação constante do presente despacho, exonero o Tenente-Coronel J...................das funções de Director Técnico do Projecto nº 1 - Apoio â Organização Superior da Defesa e das Forças Armadas, inscrito no Programa-Quadro da Cooperação Técnico-Militar com a República Democrática de São Tomé e Príncipe, com efeitos a partir de 10 de Setembro de 2004”. Com efeito, na redacção adoptada nos supra elencados pontos 7., 8., 9. e 10., não é minimamente aprofundada a razão concreta que pudesse justificar que o desempenho das funções em causa pelo Recorrido tenha sido desestimado, desabonado pelo Recorrente, desde logo, por duas ordens de razões: i) o procedimento que conduziu o Recorrido para destinatário único para a função foi pautado inclusive por concurso que antecedeu a respectiva escolha; e, ii) por ir precisamente ocupar as funções de outro militar que terminava a mesma comissão, a aptidão do Recorrido para tal foi consubstanciada tendo por matriz aquela última, pelo que a sua especificidade, os seus meandros e desafios eram conhecidos, o que tornava mais apreensível se as caraterísticas profissionais e até pessoais do Tenente-Coronel J...................se apropriavam ao desempenho de Director Técnico do Projecto nº 1 - Apoio à Organização Superior da Defesa e das Forças Armadas, inscrito no Programa-Quadro da Cooperação Técnico-Militar com a República Democrática de São Tomé e Príncipe. Enuncia o EMFAR, designadamente, que aos militares se encontram acometidos os deveres da tutela, de obediência, de dedicação ao serviço e de disponibilidade, respectivamente nos artºs 11º, 12º, 13º e 14º, não sendo permitido saber in casu se um, ou alguns, ou todos eles, foram violados. Por sua vez, o Recorrente ainda sustenta que “tratando-se de uma área e relações que relevam da soberania, há que entender, ou que aceitar, que nem todos os motivos podem constar expressamente de documentos oficiais escritos, e muito menos, ser publicados em Diário da República”. O Recorrido vem sinalizar que o que imediatamente precede “constituindo questão nova o entendimento de que nem todos os motivos podem constar expressamente de documentos oficiais escritos e, muito menos publicados em Diário da República no que respeita aos atos praticados no âmbito da Cooperação Técnico-Militar, deverá tal questão não ser apreciada por este Tribunal Superior;”. É certo que o recurso de apelação serve para sanar eventuais erros de julgamento das decisões recorridas, e não para julgar questões novas que as primeiras não podiam ter conhecido. Todavia, in casu, entendemos que não estamos perante uma questão nova, mas sim na que decorre da dissertação fundamentadora da sentença recorrida, defendendo o Recorrente a particularidade da contenção e da sumariedade que deve englobar a fundamentação de que se apropriou para determinar o pronto regresso à pátria do Recorrido após uma dezena de dias em ter desembarcado em São Tomé e Príncipe, por, em suma, não ter demonstrado perfil para a missão em que tinha sido investido. Salientamos, assim, que o enquadramento jurídico quer no Tribunal a quo quer no ad quem em que ora o presente recurso de apelação tramita não extravasa a factualidade essencial convocada, sublinhando que as partes o conhecem e se pronunciaram em conformidade, pelo que nada obsta a que o juiz participe na indagação do direito sem estar confinado aquela que foi efectuada pelas partes, como emana do disposto no nº 3 do artº 5º do CPC, que consagra o brocardo latino iura novit curia. Dito de outro modo, o Tribunal pode apreciar as questões submetidas à sua análise com base em argumentos ou razões distintas daquelas que foram cogitadas pelas partes, bastando que as mesmas sejam susceptíveis de integrar a causa de pedir. Nas palavras de Miguel Teixeira de Sousa, in Manual de Processo Civil, Volume I, Lisboa, AAFDL Editora, 2022, p 90 “o tribunal conhece do direito aplicável (iura novit curia; da mihi facta; dabo tibi ius; la cour sait le droit: art. 5.º, n.º 3), tanto à admissibilidade do processo, como à admissibilidade e validade dos actos processuais, como ainda à apreciação do mérito da causa. Deste postulado decorrem três corolários: - Um de carácter negativo: o tribunal não pode ser vinculado pelas partes (nem mesmo por um acordo destas) quanto ao direito aplicável na decisão da causa; daí que o tribunal possa corrigir uma deficiente qualificação jurídica fornecida pelas partes; - Um outro igualmente de carácter negativo: as partes não podem afastar a aplicação pelo tribunal das regras de carácter imperativo, apesar de, naturalmente, poderem dispor das regras de natureza supletiva através das estipulações que as substituam; assim, por exemplo, as partes não podem pretender que o tribunal aprecie apenas a justificação para o incumprimento de um contrato se o mesmo for considerado inválido por violação da forma legal: - Finalmente, um outro de carácter positivo: o tribunal deve analisar os factos alegados pelas partes segundo todas as possíveis qualificações legais; este dever de esgotamento das qualificações jurídicas é, em regra, irrelevante quando a acção proceder, porque para o autor é, em princípio, indiferente o fundamento desta procedência, mas é sempre relevante quando a acção houver de ser julgada improcedente, porque, neste caso, há que esgotar todas as possibilidades de procedência da acção”. O enquadramento que se atém à opacidade da fundamentação do acto que ordenou o regresso do Recorrido ao Território Nacional, porém qualificada pelo Recorrente como adequada e atingível, justifica para a apreciação do despacho em causa, não só que não pode estar imbuído dos termos que ofendam os requisitos constantes no artº 125º do CPA (sempre o diploma à data em vigor), como lançando mão de contrariar o argumento de dever ser observada com absoluta imperiosidade, nos documentos oficiais como os que provêm das Forças Armadas, que a menção aos motivos para se ordenar o supracitado retorno à pátria, deve ser reduzida ou apenas figurar uma ínfima parte, mais abstracta. É neste enquadramento que entendemos que o juiz ad quem detém o poder-dever de proceder à requalificação ou reconfiguração normativo-jurídica do caso, desde que observada a condição já supra indicada, ou seja, dentro da fronteira da factualidade provada e estando cimentada a notificação do recurso às partes, o que estabelece uma função conectiva com os limites do efeito prático-jurídico pretendido. Neste conspecto, o Recorrente podia esgrimir as veras razões para a tomada de decisão de exonerar o Recorrido e que têm de integrar o dever de fundamentação, à luz do referido no artº 125º do CPA, com base na Lei nº 6/94, de 7 de Abril, que aprovou o regime do segredo de Estado, sendo que no seu âmbito, estipula o artº 2º que “1 - São abrangidos pelo segredo de Estado os documentos e informações cujo conhecimento por pessoas não autorizadas é susceptível de pôr em risco ou de causar dano à independência nacional, à unidade e integridade do Estado e à sua segurança interna e externa. 2 - O risco e o dano referidos no número anterior são avaliados caso a caso em face das suas circunstâncias concretas, não resultando automaticamente da natureza das matérias a tratar. 3 - Podem, designadamente, ser submetidos ao regime de segredo de Estado, mas apenas verificado o condicionalismo previsto nos números anteriores, documentos que respeitem às seguintes matérias: a) As que são transmitidas, a título confidencial, por Estados estrangeiros ou por organizações internacionais; b) As relativas à estratégia a adoptar pelo País no quadro de negociações presentes ou futuras com outros Estados ou com organizações internacionais; c) As que visam prevenir e assegurar a operacionalidade e a segurança do pessoal, dos equipamentos, do material e das instalações das Forças Armadas e das forças e serviços de segurança; d) As relativas aos procedimentos em matéria de segurança na transmissão de dados e informações com outros Estados ou com organizações internacionais; e) Aquelas cuja divulgação pode facilitar a prática de crimes contra a segurança do Estado; f) As de natureza comercial, industrial, científica, técnica ou financeira que interessam à preparação da defesa militar do Estado”. Conjuga-se com este normativo, o artº 5º do mesmo diploma que sob a epígrafe ‘Fundamentação’, dita que “A classificação de documentos submetidos ao regime de segredo de Estado, bem como a desclassificação, devem ser fundamentadas, indicando-se os interesses a proteger e os motivos ou as circunstâncias que as justificam”. Assim, não se encontrando esmiuçado o não enquadramento do Tenente-Coronel sub juditio no perfil exigido para a referida comissão de serviço, com a particularidade de apenas detectado já quando se encontrava no seu pleno exercício, inexiste fundamentação que permita conhecer, de facto, impreterivelmente, o sentido do despacho que o exonerou daquelas funções, que, aliás, pode ser usado para o caso do Recorrido como para outro qualquer militar, pois não diz nada querendo parecer que diz tudo. Mutatis mutandis, nas palavras do Acórdão do STA, Processo nº 018625, de 22 de Novembro de 1984, in www.dgsi.pt “Enferma de vicio de forma o despacho, não fundamentado, proferido em 29-12-82 pelo Chefe do Estado-Maior do Exercito exonerando um oficial das Forças Armadas das funções de director da Arma de Cavalaria”. Na verdade, não se mostrando individualizada(s) categoricamente a(s) causa(s) de assim ter sido, ou seja, não se discernindo da exoneração o atinente conteúdo enformador nem os respectivos contornos, a mesma enferma de falta de fundamentação, violando o disposto no artº 123º do CPA. Entendemos, pois, como indefectível a verificação do erro de julgamento da matéria de facto. b) Do erro de julgamento de direito O Recorrente, em súmula, refere que “o termo de uma comissão no âmbito da Cooperação Técnico-Militar, como é a do caso sub judice, deve ser aferido, conjugadamente, com as disposições legais previstas, respetivamente no Decreto-Lei n.º 238/96, de 13 de dezembro e no EMFAR. (…) Com efeito, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 33.º do EMFAR são considerados militares os lugares existentes em qualquer departamento do Estado ou em organismos internacionais a que correspondem funções de natureza militar e de acordo com o n.º 3 do mesmo artigo, o desempenho destes cargos inicia-se com a tomada de posse suspende-se com o afastamento temporário do titular e cessa com a sua exoneração. (…) Assim, o termo do exercício do cargo de diretor técnico-militar, no âmbito da CTM, cessa pelo decurso da comissão, nos termos do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 238/96, de 13 de dezembro, ou pela exoneração do cargo, nos termos do n.º 3 do artigo 33.º do EMFAR”. O Recorrido, por sua vez, contra-alega, em síntese, que “(15ª) Não tem razão o Recorrente quando sustenta que a douta sentença recorrida errou na aplicação do direito, por considerar que não existe lacuna quanto ao regime jurídico da exoneração dos militares em missão técnico militar, aplicando-se antes o nº 3 do artigo 33º do EMFAR; (16ª) Porém, este preceito parece não se aplicar aos cargos da Cooperação Técnico-Militar, na medida em que, para o seu exercício, os militares não tomam posse. Veja-se, no caso em análise, que o Recorrido foi nomeado pelo Despacho nº 18674/2004, publicado em Diário da República, II Série, nº 209, de 4 de setembro de 2004, não tendo tomado posse do cargo para iniciar o exercício de funções correspondentes; (17ª) E inexistindo norma quanto à forma de cessação antes do fim de sua duração – que nos termos do disposto no artigo 6º, nº 2, do Decreto-Lei nº 238/96, de 13 de novembro, corresponde à «duração prevista para cada acção de cooperação no respectivo programa quadro, deve constar expressamente do despacho de nomeação e não pode exceder o período de um ano» - há efetivamente uma lacuna que precisa de ser preenchida com recurso ao lugar paralelo que, neste caso, seria a figura da comissão de serviço, para o exercício de cargos de direção e chefia – com respaldo na Lei nº 2/2004, de 15 de janeiro – aplicando-se, quanto à cessação, o artigo 25º, nº 2, que possibilita a cessação da comissão de serviço a todo o tempo, por «despacho que se fundamente, nomeadamente, na inadaptação ou deficiente percepção das responsabilidades inerentes ao cargo, na não comprovação superveniente da capacidade adequada a garantir a execução das orientações superiormente fixadas, na não realização dos objectivos previstos, na necessidade de imprimir nova orientação à gestão dos serviços, na necessidade de modificar as políticas a prosseguir por estes ou de tornar mais eficaz a sua actuação e na não prestação de informações ou na prestação deficiente das mesmas quando consideradas essenciais para o cumprimento da política global do Governo» (o sublinhado é nosso); (…) (20ª) De outra forma, a interpretação do artigo 33º, nº 3, do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, no sentido de que não é necessário fundamentar o ato de exoneração, é inconstitucional por violação daquele preceito da lei fundamental”. Vejamos. O Recorrido foi nomeado para dar o seu contributo de assessoria militar numa função de direcção, no âmbito da Cooperação Técnico-Militar, em comissão de serviço. Os artºs 133º e 134º do EMFAR, respectivamente, dispõem o seguinte: “Artigo 133.º A nomeação dos militares para o desempenho de cargos ou exercício de funções militares, desempenhados em comissão normal, processa-se por escolha, oferecimento e imposição de serviço. Modalidades de nomeação Artigo 134.º 1 - A nomeação processa-se por escolha sempre que a satisfação das necessidades ou o interesse do serviço devam ter em conta as qualificações técnicas e as qualidades pessoais do nomeado, bem como as exigências das funções ou do cargo a desempenhar e é da competência do CEM do respetivo ramo. Nomeação por escolha 2 - A nomeação por escolha de militares na dependência do CEMGFA é feita por despacho do CEMGFA, mediante proposta do CEM do respetivo ramo”. O nº 1 do artº 138º, sob a epígrafe ‘Regras de nomeação e colocação’, estabelece que “As regras de nomeação e colocação dos militares são fixadas por despacho do CEM do respetivo ramo”. De acordo com o previsto na alínea a) do artº 143º e no nº 1 do artº 144º do referido diploma, o Recorrido foi nomeado para prestar as inerentes funções em comissão normal, por se encontrarem compreendidas dentro da estrutura da defesa nacional, embora ex vi de um instrumento de política externa nacional, a cooperação técnico-militar em território estrangeiro, pautada pelo Decreto-Lei nº 238/96, de 13 de Dezembro, que aprova o Estatuto dos Militares em acções de cooperação técnico-militar concretizadas em território estrangeiro, funções aquelas que igualmente se integram no que dita o nº 6 do artº 271º da CRP: “As Forças Armadas podem ser incumbidas, nos termos da lei, de colaborar em missões de protecção civil, em tarefas relacionadas com a satisfação de necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações, e em acções de cooperação técnico-militar no âmbito da política nacional de cooperação”. No contexto da área funcional militar, a Lei nº 11/89, de 1 de Junho estatuiu as Bases Gerais do Estatuto da Condição Militar (BGECM), prevendo no nº 4 do artº 11º que “O desempenho profissional dos militares deve ser objecto de apreciação fundamentada, que, sendo desfavorável, é comunicada ao interessado, que dela pode apresentar reclamação e recurso hierárquico, nos termos fixados nas respectivas leis estatutárias”. Por sua vez, a alínea d) do artº 2º da Lei nº 46/2003, de 22 de Agosto, preconiza que “O acompanhamento do envolvimento de contingentes militares portugueses no estrangeiro abrange, nomeadamente: (…) d) Missões decorrentes de compromissos internacionais assumidos pelo Estado Português no âmbito militar”, na senda do que dita o previsto no nº 5 do artº 275º da CRP: “Incumbe às Forças Armadas, nos termos da lei, satisfazer os compromissos internacionais do Estado Português no âmbito militar e participar em missões humanitárias e de paz assumidas pelas organizações internacionais de que Portugal faça parte”. Ora, o enquadramento da função em que o Recorrido se encontrava na República Democrática de São Tomé e Príncipe assemelha-se ao Estatuto Militar dos militares chamados a desempenhar missões de carácter militar com objectivos humanitários ou destinadas ao estabelecimento, consolidação ou manutenção da paz fora do território nacional, regulado pelo Decreto-Lei nº 233/96, de 7 de Dezembro, mais precisamente ao nº 1 do artº 10º, que sob a epígrafe ‘Participação na missão’, determina: “Para efeitos do presente diploma, a participação na missão considera-se iniciada e finalizada, respectivamente, na data de embarque e desembarque definitivo em Portugal ou outro país, se for o caso”. A Lei Orgânica nº 1-B/2009, de 7 de Julho, aprova a Lei de Defesa Nacional (LDN), prescrevendo o nº 1 do artº 1º que “As Forças Armadas Portuguesas são um pilar essencial da Defesa Nacional e constituem a estrutura do Estado que tem como missão fundamental garantir a defesa militar da República”, aliás, em ordem ao que dita o nº 1 do artº 275º da CRP: “Às Forças Armadas incumbe a defesa militar da República”. Secundando o nº 2 do artº 1º da LDN, “As Forças Armadas obedecem aos órgãos de soberania competentes, nos termos da Constituição e da lei, e integram-se na administração directa do Estado, através do Ministério da Defesa Nacional”, e como é evidente, todos os actos administrativos praticados no seu âmbito além de se regerem por legislação própria, obedecem ainda aos ditames da CRP e do CPA, diplomas transversalmente aplicáveis. Neste enquadramento, escrevem Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e João Pacheco de Amorim, in O Código do Procedimento Administrativo Comentado, Vol. I, Coimbra, Coimbra Editora, 1993, p 117, que no âmbito de aplicação do Código do Procedimento Administrativo vale “determinar quando é que, face a um caso ou situação que se lhes depare para resolver, devem os órgãos da Administração Pública ou outros com funções similares, os seus titulares, pegar num exemplar do Código (...) e adequar os passos ou trâmites do respectivo procedimento àquilo que nele se estabelece”. Salientamos que à luz do nº 2 do artº 22º da LDN, “As Forças Armadas obedecem aos órgãos de soberania competentes, nos termos definidos na Constituição e na lei”, sendo que “As Forças Armadas integram-se na administração directa do Estado através do Ministério da Defesa Nacional” – cfr nº 1 do artº 23º. Ora, o Recorrido no exercício do seu múnus na República Democrática de São Tomé e Príncipe encontrava-se na “efectividade de serviço no activo” e em “comissão normal” – vide alínea a) do nº 1 do artº 151º do EMFAR, investido no poder de autoridade conferido pelo artº 10º deste diploma, nestes termos: “1 - O militar que exerça funções de comando, direcção ou chefia exerce o poder de autoridade inerente a essas funções, bem como a correspondente competência disciplinar. 2 - O exercício dos poderes de autoridade implica a responsabilidade pelos actos que por si ou por sua ordem forem praticados. 3 - O exercício do poder de autoridade tem como limites a Constituição e as demais leis da República, as convenções internacionais e as leis e os costumes de guerra”. O nº 1 do artº 18º do diploma em causa, sob a epígrafe ‘Direitos, liberdades e garantias’, assegura que “O militar goza de todos os direitos, liberdades e garantias reconhecidos aos demais cidadãos, estando o exercício de alguns desses direitos e liberdades sujeito às restrições constitucionalmente previstas, com o âmbito pessoal e material que consta da LDNFA”. Trazemos à colação, em harmonia com o disposto no artº 9º da LDN, que “O Presidente da República representa a República Portuguesa, garante a independência nacional, a unidade do Estado e o regular funcionamento das instituições democráticas e é, por inerência, o Comandante Supremo das Forças Armadas. 2 - Sem prejuízo de outras competências que lhe sejam atribuídas pela Constituição ou pela lei, compete ao Presidente da República, em matéria de defesa nacional: a) Exercer as funções de Comandante Supremo das Forças Armadas; (…) h) Nomear e exonerar, sob proposta do Governo, os comandantes ou representantes militares junto das organizações internacionais de que Portugal faça parte, bem como os oficiais generais, comandantes de força naval, terrestre ou aérea, designados para o cumprimento de missões internacionais naquele quadro”. Ora, constituindo o cargo que o Recorrido desempenhava por nomeação, uma missão militar, atento o preceituado na alínea d) do nº 1 do artº 24º da LDN: “1 - Nos termos da Constituição e da lei, incumbe às Forças Armadas: (…) d) Executar as acções de cooperação técnico-militar, no quadro das políticas nacionais de cooperação; (…)”, tomando em consideração que “No exercício dos seus direitos, os militares na efetividade de serviço estão sujeitos aos deveres decorrentes do estatuto da condição militar, devendo observar uma conduta conforme com a ética militar e respeitar a coesão e a disciplina das Forças Armadas” – cfr nº 1 do artº 27º deste último diploma – sendo que o nº 3 deste normativo consigna que “Aos militares na efetividade de serviço não são aplicáveis as normas constitucionais relativas aos direitos dos trabalhadores cujo exercício pressuponha os direitos fundamentais a que se referem os artigos seguintes, na medida em que por eles sejam restringidos, nomeadamente a liberdade sindical, o direito à criação e integração de comissões de trabalhadores e o direito à greve”, torna-se essencial conhecer da quaestio do erro de julgamento de direito por a sentença recorrida ter definido a existência de uma lacuna legal na legislação militar, no que concerne à imprescindibilidade de se dever encontrar prevista expressamente como se daria a exoneração do militar que ocorreu dias após ter sido nomeado para a função de direcção, partindo do pressuposto que o nº 3 do artº 33º do EMFAR, não se enquadra no caso sub juditio, visto nela não ter sido investido com uma tomada de posse, socorrendo-se do Estatuto do pessoal dirigente da Administração pública para o efeito. É certo que este preceito legal dispõe que “O desempenho de cargos militares inicia-se com a tomada de posse, suspende-se com o afastamento temporário do titular e cessa com a sua exoneração” (sublinhado nosso). Nesta medida e para a aferição sobre o invocado erro de aplicação do direito, cabe atentar no que segue: . Em primeiro lugar, sublinhamos que não pode legalmente ficar coarctado o direito da fundamentação dos actos administrativos, tanto mais proferidos no decurso do procedimento de exoneração que consubstancia um acto de gestão pública, como defende Freitas do Amaral in Curso de Direito Administrativo, Vol. I, Coimbra, Almedina, 3ª Edição, 2011, p150, definida como “a actividade da Administração desenvolvida sobre a égide do Direito Administrativo”, nem se mostra afastada praticar a exoneração. . Em segundo lugar, há que distinguir que o Recorrido foi designado pelo Despacho nº 18674/2004, publicado em Diário da República, II Série, nº 209, de 4 de Setembro de 2004, para uma função militar concreta, ou seja, para o Projecto nº 1 – Apoio à Organização Superior da Defesa e das Forças Armadas, missão esta, no caso, inscrita no Programa Quadro da Cooperação Técnico-Militar com a República Democrática de São Tomé e Príncipe, em regra, de exercício de duração limitada de um ano. Donde, conferida e cessada a comissão em causa por despacho, não se caracteriza o seu começo com um empossamento, antes assenta na designação por nomeação e respectiva colocação, seguindo os termos de uma substituição do militar que antecedentemente o corporalizava pelo Recorrido, sendo que, depois este último será também substituído. . Em terceiro lugar, nesta sucessão ritmada de colocação de militares para o serviço que lhes é destinado, a gestão dos recursos humanos ao mesmo adstrito, é materializada por despacho, podendo ter sido esse poder delegado ou subdelegado pelo superior hierárquico militar, acto esse que a justifica e norteia. . Em quarto lugar, a jurisprudência constitucional, por seu lado, considera que tanto o domínio civil como o militar se encontram inseridos na Administração estadual, com a consequente integração dos militares na mais ampla expressão de funcionalismo público – cfr Acórdão do Tribunal Constitucional nº 662/99, de 7 de Dezembro de 1999, publicado no Diário da República, II Série, nº 46, de 24 de Fevereiro de 2000. Não obstante, apesar de a Administração Pública abranger a administração militar e de o pessoal militar que nesta se integra não deixar de pertencer à Administração Pública, o Tribunal Constitucional tem vindo a expressar que o legislador moldou para os militares um quadro normativo de algum modo fechado, ajustado à especificidade da condição militar, porque a instituição militar é uma “instituição onde a hierarquia e a disciplina assumem, em nome do superior interesse da eficácia e da eficiência da defesa nacional e das Forças Armadas, uma importância sem paralelo na generalidade dos domínios da Administração Pública” – vide exemplificativamente, os Acórdãos do Tribunal Constitucional nº 555/99, de 19 de Outubro de 1999; nº 662/99, de 7 de Dezembro de 1999; 229/2012, publicado no Diário da República nº 100, I Série, de 23 de Maio de 2012; e nº 404/2012, de 18 de Setembro de 2012. . Em quinto lugar, a carreira militar “é o conjunto hierarquizado de postos, desenvolvidos por categorias, que se concretiza em quadros especiais e a que corresponde o desempenho de cargos e o exercício de funções diferenciadas entre si” – vide artº 27º do EMFAR, numa estruturação funcional como a da função pública (carreira, categorias, quadros e/ ou mapas de pessoal), o que vale por dizer que igualmente compreendida intrinsecamente enquanto tal. Na carreira militar, os militares agrupam-se, por ordem decrescente de hierarquia, nas categorias de oficiais, sargentos e praças, e dentro destas em postos, que são a posição que na respectiva categoria o militar ocupa no âmbito da carreira militar, fixada de acordo com o conteúdo e qualificação da função ou funções – cfr nºs 1, 2 e 3 do artº 28º do referido diploma. . Em sexto lugar, in casu, ao não se tratar de uma nomeação definitiva não tem cabimento orgânico ser iniciada protocolarmente com uma tomada de posse, uma vez que – reiteramos – estamos perante a substituição de um cargo de direcção, por natureza precário e temporário, tendo por finalidade assegurar o princípio da continuidade dos serviços já encetados e desenvolvidos pelo anterior substituído militar. . Em sétimo lugar, o despoletar do desempenho do cargo de direcção técnica pelo Recorrido, implica sempre o despacho em consonância por parte do membro do Governo responsável pela área da Defesa Nacional, nos termos do artº 4º do Decreto-Lei nº 238/96 de 13 de Dezembro e do nº 2 do artº 147º do EMFAR. . Em oitavo e último lugar, o ditame do término da comissão em apreço deriva precisamente do estipulado no nº 4 do imediatamente antecedente normativo legal, significando que esse exercício “pode ser dado por findo, a todo o tempo, por iniciativa do membro do Governo responsável pela área da defesa nacional ou a pedido do militar”, na figura da exoneração do cargo. Não acompanhamos, assim, o entendimento cursado pelo juiz a quo ao contemplar que nem o EMFAR, nem o Decreto-Lei nº 238/96, de 13 de Dezembro, incluírem preceito legal respeitante à cessação precoce da comissão de cooperação. A sentença recorrida ampara, pois, a verificação do que qualifica como uma lacuna quanto ao regime jurídico da exoneração, dos militares em missão técnico militar, pela figura da comissão de serviço para o exercício de cargos de direcção e chefia, a integrar pela Lei nº 2/2004, de 15 de Janeiro, que aprovou o Estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da Administração central, regional e local do Estado, convocando que pela aplicação do nº 2 do artº 25º é desencadeada a cessação a todo o tempo, por inadaptação ou deficiente percepção das responsabilidades inerentes ao cargo. Porém, não é aplicável aos militares este último diploma, como resulta do seu objecto e âmbito previsto no artº 1º, estipulando o nº 1 do artº 2º, sob a epígrafe ‘Cargos dirigentes’, que estes são “os cargos de direcção, gestão, coordenação e controlo dos serviços e órgãos públicos abrangidos pela presente lei”. Ora, “Os cargos militares são definidos como os lugares fixados na estrutura orgânica das Forças Armadas a que correspondem as funções legalmente definidas”, em ordem ao nº 1 do artº 33º do EMFAR. O Recorrido assumiu um cargo militar – Director Técnico do Projecto 1 –preenchido por uma função militar de direcção – Coordenador da Cooperação Técnico-Militar na República de São Tomé e Príncipe – preconizada na alínea b) do nº 2 do artº 34º, em harmonia com o previsto no artº 39º, ambos do EMFAR que se harmoniza com o seu posto de Tenente-Coronel. Nomeado pelo Despacho do Ministro da Defesa Nacional, sob proposta da Direcção-Geral de Política de Defesa Nacional, após indigitação pelo seu Chefe de Estado Maior, correspondendo o respectivo início da comissão de serviço “na data de partida e cessa na data de chegada do militar ao território nacional” – cfr respectivamente nº 1 do artº 4º e nº 3 do artº 6º do Decreto-Lei nº 238/96, de 13 de Dezembro – não restam dúvidas que a nomeação mostra-se correcta e adequadamente efectuada – como foi – por despacho não revestido subsequentemente por uma tomada de posse, e a exoneração cumpriu o estabelecido in fine no nº 3 do artº 33º do EMFAR, pelo que não acompanhamos a sentença recorrida que discorreu que “(…) nem o EMFAR nem o Decreto-Lei n.º 238/96, de 13 dezembro contém qualquer norma legal relativa à situação precoce (antes do termo inicialmente previsto), da comissão de cooperação, pelo importa integrar esta lacuna”. Isto porque, o artº 9º do Código Civil, sob a epígrafe ‘Interpretação da lei’, dita que “1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada. 2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”. Donde, ao contrário do que a sentença recorrida considerou, quanto ao termo da comissão sub juditio, isto é, que existe uma lacuna no que toca ao regime jurídico da exoneração dos militares em missão técnico militar, entendemos que esta matéria deve ser conjugadamente avaliada com o consignado nos supra mencionados normativos do Decreto-Lei nº 238/96, de 13 de Dezembro e do EMFAR e não com o Estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da Administração central, regional e local do Estado. Em conclusão, a nomeação do Recorrido em comissão normal de serviço como Director Técnico do Projecto 1 – preenchido por uma função militar de direcção – Coordenador da Cooperação Técnico-Militar na República de São Tomé e Príncipe –, ao ter sido figurada enquanto titular de uma função imbuída da condição militar, apelando apenas ao despacho de nomeação sem uma tomada de posse, não padece de erro na aplicação do direito. Não obstante, sendo exigível que o despacho que determinou a exoneração da referida comissão seja devidamente fundamentado e comprovado, o que não sucedeu, o mesmo enferma de erro nos pressupostos de facto. * V. Decisão Nestes termos, acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção Administrativa Social da Secção de Contencioso Administrativo do TCA Sul, em negar provimento ao recurso e confirmar, com a presente fundamentação, a sentença recorrida. Custas pelo Recorrente. Registe e notifique. ***
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