Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:6/17.0BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:12/13/2019
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:IVA 1994;
TRANSFERÊNCIAS ENTRE A CASA-MÃE E SUCURSAL PORTUGUESA;
COBERTURA DE PREJUÍZOS.
Sumário:I - De acordo com jurisprudência uniforme do Tribunal de Justiça, "uma prestação de serviços só é efectuada «a título oneroso», na acepção do artigo 2°, ponto 1, da Sexta Directiva, e só é assim tributável, se existir entre o prestador e o beneficiário uma relação jurídica durante a qual são transaccionadas prestações reciprocas".

II - Tendo resultado provado nos autos que as transferências realizadas pela casa-mãe da impugnante para a sua sucursal portuguesa visavam, precisamente, cobrir os prejuízos registados por esta última, sempre seria de concluir, então, que a casa-mãe da impugnante suporta o risco económico da actividade da sucursal, não detendo esta a autonomia inerente ao estatuto de sujeito passivo de IVA, nem podendo a respectiva operação, por conseguinte, ser sujeita a imposto.

III – No caso, no que respeita à mencionada transferência para cobrir prejuízos, não existem elementos nos autos que suportem a asserção da realização da prestação de serviços da impugnante em favor da “casa mãe”, mediante o pagamento de uma contrapartida, pelo que soçobra o pressuposto fáctico em que repousa o acto tributário sob escrutínio.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1 – RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA, inconformada com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por F.......... Limited, sucursal em Portugal, do acto de liquidação adicional de IVA nº ..........50 (e respectivos juros compensatórios), relativo ao ano de 1994, perfazendo o montante de 9.378.278$00 (€46.778,65), vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.

Nas suas alegações expende, a final, o sequente quadro conclusivo:

I. O presente recurso visa a decisão proferida no processo em referência, que julgou procedente a presente impugnação judicial apresentada pela Impugnante "F.......... Limited" (doravante designada por Recorrida), e como tal, decidiu pela anulação do acto de liquidação adicional de IVA e de juros compensatórios, referentes ao ano de 1994, no montante total de 9.378.278$00 (€ 46.778,65).

II. Atento a que a decidida ilegalidade da referida liquidação adicional, plasmada na douta sentença, respeita a dois tipos de operações distintas: por um lado, a emissão de facturas pela ora Recorrida à casa-mãe relativas a prestações de serviços de alojamento, nas quais procedeu à liquidação de IVA à taxa reduzida, e por outro lado, a assunção, por parte da casa-mãe, da responsabilidade pelo pagamento de dívidas do estabelecimento estável.

III. Ou seja, o estabelecimento estável F.......... Limited (Recorrida) detém o direito de utilização exclusiva de um aldeamento turístico de 1ª categoria, propriedade da empresa F.......... (Estates) Limited, no qual são prestados serviços de alojamento, restauração e de recreio aos membros do Club.

IV. Sendo que a razão principal da existência desta empresa é a administração do empreendimento, de forma a assegurar a sua manutenção e garantir aos membros do clube, a existência de condições óptimas de utilização dos apartamentos e espaços comuns;

V. Em suma, assenta o motivo da existência deste estabelecimento estável (a Recorrida) como de administração do empreendimento, e não de prestação de serviços de alojamento, uma vez que estes foram adquiridos pelos membros do clube no momento em que adquiriram esse estatuto, conforme se pode confirmar do contrato promessa de arrendamento celebrado entre ambas as entidades.

VI. A Fazenda Pública não pode considerar que sejam prestados serviços de alojamento hoteleiro, uma vez que os seus utilizadores adquiriram esse direito através da compra dos títulos à casa-mãe, estando o acesso ao empreendimento condicionado aos membros do clube, detentores do respectivo título, não basta, assim, que inviabilize a Recorrida de cobrar qualquer importância referente à prestação de serviços de alojamento.

VII. Sendo que, para obtenção desses serviços, os adquirentes das semanas de férias pagam uma quantia anual, referente a cada título adquirido, e que varia em função da tipologia do apartamento em causa, quantia essa que, não consta registada na contabilidade da Recorrida.

VIII. Esta conclusão resultou, do facto de a Recorrida não ter na sua contabilidade registos relativos ao recebimento dos serviços de alojamento e não ter emitido factura, ou documento equivalente, nos termos da al. b) do n.º 1 do art.º 28º do CIVA, pois que o serviço de alojamento já havia sido pago pelos adquirentes à "casa-mãe".

IX. Assim sendo, torna-se evidente que as transferências efectuadas pela casa-mãe correspondem às verbas necessárias à administração do empreendimento, pelo que os valores em causa enquadram-se no conceito residual de prestações de serviços, previsto no n.º 1 do art.º 4° do CIVA, e, como tal, sujeitas à taxa normal.

X. Deste modo, consideram que as transferências efectuadas pela casa-mãe não se destinaram ao pagamento de serviços de alojamento, como é referido pelo sujeito passivo, mas sim para compensar parte dos custos suportados pela sucursal para exercer a sua actividade principal, actividade esta sujeita à taxa normal por resultar da sub-contratação dos seguintes serviços de terceiros, limpeza de apartamentos., lavandaria, custos de administração geral, custos com electricidade não imputáveis aos apartamentos, água, infra-estruturas e jardinagem, custos relativos à gestão de empreendimento, etc.

XI. Em concreto, apesar de não existir uma transferência física do dinheiro para fazer face aos compromissos assumidos pelo estabelecimento estável, dado que o lançamento é efectuado com base num documento interno, existe, contudo, uma desoneração do pagamento de uma dívida através do assumir da mesma por parte da casa-mãe, pelo que se impõe legalmente, o seu tratamento da mesma forma e como tal sujeitas a IVA à taxa normal.

XII. Deste modo, é entendimento da Autoridade Tributária, corroborada pela Fazenda Pública, de que as transferências efectuadas pela casa-mãe à sucursal pressupõem a contraprestação das prestações de serviços de administração, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 4° do CIVA, que se encontram sujeitas a IVA à taxa normal.

XIII. Como tal, deverá ser considerada como sujeito passivo de imposto (abrangida pelas normas de incidência subjectiva), sendo que, nos termos da alínea a) do n.º 1do art.º 1° do CIVA, estão sujeitas a imposto as transmissões de bens e as prestações de serviços efectuadas no território nacional, por um sujeito passivo agindo como tal.

XIV. Pese embora o facto da inexistência em sede de IVA, de qualquer definição de estabelecimento estável, certo é que o Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia vem defendendo que se deve considerar que uma entidade tem estabelecimento estável em determinado Estado­membro quando aí disponha de instalação que reúna, com carácter de permanência, meios humanos e técnicos necessários à realização de operações tributáveis (Acórdão de 02 de Maio de 1996 - processo C- 231/94; Acórdão de 20 de Fevereiro de 1997 - processo C-260/95; Acórdão de 07 de Maio de 1998 - C-390/96).

XV. No que toca à assunção, por parte da casa-mãe da responsabilidade pelo pagamento de dívidas do estabelecimento estável, importa salientar que a casa-mãe havia assumido a responsabilidade pelo pagamento de diversas dívidas do estabelecimento (sucursal), nomeadamente as rendas do empreendimento, que consubstanciam despesas indispensáveis ao exercício da actividade do estabelecimento estável.

XVI. Ora, se a sucursal em Portugal se integra no conceito de estabelecimento estável, e tendo a sede e estabelecimento estável personalidades tributárias distintas, as operações entre si realizadas não poderão considerar-se movimentos internos fora do campo de incidência do IVA como pretende a Recorrida, mas sim prestações de serviços (ou transmissões de bens, consoante o caso).

XVII. Donde resulta de todo o exposto que, não se vislumbra que a liquidação adicional de IVA em crise, padeça de ilegalidade, que invalide a sua manutenção, pelo que será de manter no ordenamento jurídico-fiscal.

Nestes termos, em face da motivação e das conclusões atrás enunciadas, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se, em consequência a douta sentença ora recorrida, com as legais consequências, assim se fazendo por Vossas Excelências a costumada JUSTIÇA.”


*

Contra-alegou a Impugnante e aqui Recorrida, formulando as seguintes conclusões:

I. O recurso jurisdicional é o meio processual adequado para a impugnação de decisões judiciais (artº 627, 1 NCPC; artº 280° CPPT);

II. Na formulação do presente recurso, a Recorrente identifica (nº 5 e conclusão II) como questões a decidir matérias que não foram discutidas na 1ª instância e sobre as quais não houve portanto pronúncia do Tribunal a quo.

III. Em sede de recurso não pode o Recorrente vir introduzir questões novas, que não foram colocadas ao Tribunal a quo e sobre as quais portanto este não se pronunciou, o que determina a improcedência do recurso

Sem conceder,

IV. Para que o tribunal de recurso proceda ao reexame da decisão recorrida recai sobre o recorrente o ónus de alegar e de formular conclusões (art° 639° NCPC) de acordo com o qual deve o recorrente indicar quais os vícios que imputa à decisão recorrida, indicar as razões por que pretende a sua anulação ou revogação e incluir conclusões em que essas razões sejam sintetizadas;

V. A peça processual apresentada pela F.P. como constituindo as suas alegações não faz qualquer critica à sentença recorrida, não indica uma única razão ou fundamento pelos quais pretende a revogação da sentença recorrida e, nas conclusões, limita-se a reproduzir integral e textualmente o teor de vários artigos do corpo das alegações;

VI. A F.P., nas referidas alegações, limita-se a reproduzir resumidamente a fundamentação da AT para as liquidações de IVA impugnadas,

VII. A F.P. não cumpriu assim, ainda que minimamente o ónus de alegar e formular conclusões;

VIII. Não se encontrando formulada qualquer crítica à sentença recorrida e havendo total omissão quanto aos fundamentos pelos quais a FP pede a sua revogação, há que concluir pela falta de alegações, de onde decorre a deserção do recurso;

IX. Não é aplicável a previsão dos nºs 5, 6 e 7 do artº 282° CPPT e nº 3 do artº 639 NCPC, porque o despacho de aperfeiçoamento aí previsto se refere apenas à falta ou irregularidades das conclusões das alegações, o que pressupõe a existência de alegações, o que não se verifica neste caso.

X. Limitando-se a F.P., como única referência à decisão recorrida, a dizer no artº 6 do corpo das alegações que "o tribunal a quo incorre em erro de julgamento consubstanciado na íncorrecta apreciação e valorização da matéria factual' , há lugar à aplicação do disposto no nº 1 do artº 640° NCPC., ex vi da alínea e) do nº 2 do artº 2° CPPT.

XI. Não tendo a F.P. indicado nenhum concreto ponto de facto que considera incorrectamente julgado, nem nenhum concreto meio probatório que imporia decisão diversa da recorrida, nem a decisão que em seu entender deveria ter sido proferida sobre as questões de facto impugnadas - alíneas a), b) e c) do nº 1 do artº 640° NCPC - não cumpriu ainda que minimamente o ónus de impugnação previsto naquela disposição legal, pelo que o recurso tem de ser rejeitado, nos termos do disposto no corpo do nº 1 do artº 640° cit, in fine.

XII. Não pode assim o Tribunal ad quem conhecer do recurso, quer por violação do ónus de alegar e formular conclusões consubstanciada na falta de apresentação de alegações e conclusões nos termos legalmente exigiveis, quer por violação do ónus de impugnação previsto no nº 1 do artº 640° NCPC;

XIII. Acresce que a falta de cumprimento do disposto na alínea b) do nº 1 do artº 640° NCPC impede a Recorrida de dar cumprimento ao disposto na alínea b) do nº 2 do mesmo artigo

Sem conceder quanto à impossibilidade de conhecimento do recurso por violação do ónus de apresentar alegações e conclusões e por violação do ónus de impugnação:

XIV. A Recorrente não pode rebater, em sede de contra alegações, as razões e fundamentos pelos quais a Recorrida pede a revogação da sentença recorrida, porque a Recorrente omitiu por completo qualquer crítica à sentença recorrida e não indicou uma única razão ou fundamento pelos quais entende que a sentença recorrida deve ser revogada.

XV. Limitando-se a F.P., em jeito de alegações, a repetir a fundamentação das liquidações anuladas, mais não pode a Recorrida senão comparar a compatibilidade dessa fundamentação com o que resultou provado nos autos e reiterar a sua posição oportunamente expressa nos autos nas alegações apresentadas em 10.11.2015 ao abrigo do artº 120º CPPT

XVI. Resultando provado nos autos - alíneas N), O) e P) - a razão da existência de prejuízos no exercício de 1994, a existência de transferências da Casa-Mãe para a Recorrida para cobertura desses prejuízos e o registo dessas transferências na contabilidade da Requerida, e não tendo a Recorrente impugnado estes factos, resulta claro que não podia senão proceder a pretensão da Recorrida

XVII. As transferências para cobertura de prejuízos não são tributáveis em sede de IVA, porque não são contrapartida de serviços prestados escapando assim às regras de incidência do IVA - artºs 1º, 1 a) artº 4° CIVA.

XVIII. Em tudo o mais no que a esta questão respeita e tendo em atenção que a Recorrida apenas está em condições de pronunciar-se sobre a fundamentação das liquidações impugnadas, a Recorrida remete para as alegações e conclusões apresentadas nos autos em 10.11.2015 ao abrigo do artº 120 CPPT, que aqui dá por reproduzidas e para as quais remete.

XIX. Face à matéria provada nos autos e não impugnada pela Recorrente, designadamente os pontos N), O) e P) do probatório, verificam-se a improcedência das teses da AT, veiculadas pela F.P. e a total procedência das posições da Recorrida, não merecendo em consequência qualquer censura a douta sentença recorrida, que deve ser mantida.

Nestes termos,

a) deve o presente recurso ser julgado improcedente por delimitar o objecto do recurso a questões novas não discutidas nos autos e sobre as quais portanto o Tribunal a quo não se pronunciou.

Sem conceder

b) deve o presente recurso ser considerado deserto por falta de apresentação de alegações e conclusões nos termos legalmente exigíveis, conforme alínea b) do nº 2 do artº 641 NCPC e nº 4 do artº 282 CPPT

assim não se entendendo

c) deve ser rejeitado o presente recurso, nos termos do artigo 640, 1° NCPC, por violação do ónus de impugnação aí previsto;

sem conceder

d) Deve o presente recurso ser julgado improcedente por não provado e em consequência mantida a douta sentença recorrida


*

A Exma. Magistrada do Ministério Público (EMMP) junto deste Tribunal emitiu parecer onde concluiu no sentido do não provimento do recurso.

*

Colhidos os vistos, vem o processo submetido à Secção de Contencioso Tributário para julgamento do recurso.


*

2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida:

A - A impugnante é uma sociedade de responsabilidade limitada constituída na Ilha de Man (cfr. tradução certificada da certidão de constituição, a fls. 66 a 70 dos autos);

B - Em 6 de Outubro de 1988, foi apresentada a registo a constituição de uma sucursal da impugnante em Portugal, com o objecto "exploração dos serviços de apoio integrados no complexo turístico privado, instalado no aldeamento turístico de primeira categoria sito na Urbanização de Vilamoura, freguesia de Quarteira, propriedade da ''F.......... (Estates) Limited""(cfr. cópia certificada da certidão de registo comercial, a fls. 77 a 82 dos autos);

C - Em 17 de Junho de 1996, a sucursal portuguesa da impugnante foi sujeita a uma acção inspectiva com a duração de dez dias, com base na ordem de serviço n° ....., de 7 de Junho de 1996, com vista a proceder à "Análise contabilístico-fiscal da tributação em IVA e IRC das transferências ditas ''para compensar prejuízos" e que a "Casa-mãe" efectuou para a empresa no período de 1993 a 1995" (cfr. informação da acção inspectiva, a fls. 33 a 39 do procedimento de reclamação graciosa apenso);

D - Em 28 de Junho de 1996, foi elaborada informação final da acção inspectiva, na qual se propõe que "Relativamente ao IVA haverá que proceder ao apuramento do imposto em falta que resultou não liquidação de IVA [sic] sobre o valor das transferências efectuadas para compensação de prejuízos, nos períodos de 1993, 1994 e 1995", nos valores de 10.659.098$00, 7.433.790$00 e 16.016.982$00, respectivamente, com os seguintes fundamentos:


"Texto integral no original; imagem"

"Texto integral no original; imagem"

"Texto integral no original; imagem"

"Texto integral no original; imagem"

E - Em 27 de Agosto de 1997, foi proferido despacho pelo Chefe da Divisão de Prevenção e Inspecção Tributária …, por delegação do Director Distrital de Finanças, sancionando o teor da informação mencionada nas alíneas antecedentes (cfr. fls. 31do procedimento de reclamação graciosa apenso);

F - Em 3 de Setembro de 1997, foi remetido à ora impugnante o ofício n° ....., de 1de Setembro de 1997, da Direcção de Finanças de Faro, com vista a notificá-la das conclusões da informação mencionada nas alíneas antecedentes (cfr. fls. 30 do procedimento de reclamação graciosa apenso);

G - Em 13 de Setembro de 1997, a Direcção de Serviços do IVA emitiu e remeteu à ora impugnante os documentos de cobrança da liquidação adicional de IVA nº ..........50, referente ao ano de 1994, no valor de 7.433.790$00, e das liquidações adicionais de juros compensatórios n°s. ..........46, ..........47, ..........48 e ..........49, referentes a Janeiro, Agosto, Setembro e Dezembro de 1994, respectivamente, nos valores de 523.933$00, 394.462$00, 584.695$00 e 441.398$00, também respectivamente, todas com prazo para pagamento voluntário até 30 de Novembro de 1997 (cfr. fls. 40 a 44 do procedimento de reclamação graciosa apenso);

H - Em 2 de Março de 1998, a impugnante apresentou uma reclamação graciosa junto do Serviço de Finanças de Lisboa …, dirigida ao Director Distrital de Finanças de Lisboa, pela qual peticionava, em suma, a anulação dos actos de liquidação identificados na alínea antecedente, e, bem assim, autorização para a regularização do IVA liquidado, respeitante à prestação de serviços de alojamento, que alegou ter entregue a mais nos cofres do Estado, por força da aplicação da taxa normal de imposto (cfr. p.i. de reclamação, a fls. 2 a 14 do procedimento de reclamação graciosa apenso);

I - Em 29 de Junho de 2000, foi elaborado projecto de decisão pela Direcção de Finanças de Lisboa, pela qual este serviço propõe o "indeferimento das pretensões aduzidas pela reclamante, mantendo-se, para o efeito:

1.A taxa aplicada de 16%, sobre as transferências efectuadas pela casa-mãe (F.......... Estates, Limited) a título de "compensação de prejuízos", de acordo com a previsão do disposto no n° 1, do artigo 4° do CIVA;

2. Assim como, o montante da liquidação adicional de IVA, no valor de 7.433.790$, bem como, os correspondentes juros compensatórios" (cfr. projecto de decisão, a fls. 75 a 82 do procedimento de reclamação graciosa apenso);

J - Em 3 de Julho de 2000, foi proferido despacho pelo Director de Finanças de Lisboa, indeferindo as pretensões da impugnante formuladas em sede de reclamação graciosa e ordenando o cumprimento das diligências necessárias (cfr. despacho, a fls. 76 do procedimento de reclamação graciosa apenso);

K - Em 28 de Julho de 2000, foi proferido despacho pelo Director de Finanças de Lisboa, determinando a conversão do projecto de decisão em definitivo (cfr. despacho, a fls. 85 do procedimento de reclamação graciosa apenso);

L - Em 11 de Agosto de 2000, a impugnante apresentou a petição inicial da presente impugnação judicial no Serviço de Finanças de Lisboa … (cfr. fls. 2 dos autos);

M - Em 7 de Março de 1989, a F.......... (Estates) Limited e a impugnante celebraram um contrato designado "Contrato Promessa de Arrendamento",no âmbito do qual a primeira promete arrendar a esta última o "empreendimento turístico designado por "F.........."", o qual se destina "à exploração e utilização turística do aldeamento por parte da arrendatária e dos membros do seu clube" (com início "logo após a conclusão do empreendimento prometido arrendar" e podendo a impugnante "utilizar e ocupar as instalações existentes e já construídas, desenvolvendo nelas a sua actividade", até à conclusão do empreendimento), mediante o pagamento de uma renda anual de 149.977.935$00, a qual apenas é devida pela impugnante no "início do ano civil após a conclusão de todos os trabalhos de construção civil e empreendimento objecto do presente contrato" (cfr. cópia certificada do contrato, a fls. 85 a 88 dos autos);

N - Em 1994, o aldeamento turístico visado pelo contrato referido na alínea antecedente ainda não se encontrava concluído (cfr. prova testemunhal);

O - Em 1994, a sucursal portuguesa da impugnante registou prejuízos na sua contabilidade (cfr. prova testemunhal);

P - A casa-mãe da impugnante procedeu a transferências para a sua sucursal portuguesa com vista a cobrir os prejuízos registados em 1994 (cfr. prova testemunhal).

Factos não provados

Inexistem factos não provados com relevância para a decisão da causa.

Motivação

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame crítico dos documentos, não impugnados, constantes dos autos e do procedimento de reclamação graciosa apenso, bem como, do teor das alegações produzidas pelas partes, tudo conforme referido a propósito de cada alínea dos factos provados.

Concretamente, os factos constantes de N) a P) supra foram considerados provados pelo depoimento das testemunhas Aníbal .........., técnico oficial de contas da impugnante desde 1997, e João .........., contabilista da impugnante em 1994, cujos depoimentos foram relevados por força do especial conhecimento que as testemunhas mostraram deter da realidade da sociedade impugnante com referência ao thema decidendum, bem como da circunstância de as afirmações que sustentam a factualidade dada como provada não ser infirmada por nenhum meio de prova que as partes tenham carreado aos autos.

2.2. De direito

Comecemos por nos referir ao julgamento de facto.

Relativamente à decisão sobre a matéria de facto, a Recorrente limita-se, no corpo da alegação (cfr. nº 6) a referir que se encontra inconformada com a sentença por considerar que o Tribunal “incorreu em erro de julgamento, consubstanciado na incorrecta apreciação e valoração da matéria factual”.

Não obstante esta alegação não ter sido levada às conclusões que, como sabemos, delimitam o objecto do recurso, sem prejuízo da apreciação das questões de conhecimento oficioso, importa, no entanto, apreciar se tal afirmação tem a virtualidade de, in casu, poder ser considerada, nos termos da lei, como de impugnação da decisão sobre a matéria de facto.

E a resposta terá que ser negativa, pois que, como resulta do nº 1, al. a), b) e c) do artigo 640º do CPC, a impugnação da decisão sobre a matéria de facto implica para o recorrente a obrigatoriedade de especificar os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnada, sendo que nada disso foi observado pelo Recorrente.

Ora, a falta de cumprimento desse ónus implica, in casu, a rejeição da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, por força do disposto no nº 1 do artigo 640º do CPC.

Assim, rejeita-se a pretensa impugnação, por parte da Recorrente, da decisão sobre a matéria de facto, sendo de manter, nos seus precisos termos, o julgamento efectuado sobre a matéria de facto.


*

Avançando.

A decisão recorrida, apreciando a questão de saber qual a qualificação das transferências efectuadas pela casa-mãe à impugnante, julgou procedente a impugnação judicial apresentada pela ora Recorrida dos atos de liquidação adicional de IVA nº ..........50 e respectivos juros compensatórios, relativos ao ano de 1994, perfazendo o montante total de Esc. 9.378.278$00 (a que correspondem € 46.778.65), no entendimento de que a impugnante, ora Recorrida, provou que as transferências efectuadas pela casa-mãe, sobre as quais não fez incidir IVA, se destinavam à cobertura de prejuízos e que tal configuração descaracteriza a operação enquanto operação tributável em sede de IVA.

Na linha de raciocínio seguida pela sentença recorrida, não estando em causa a transmissão de bens, a prestação de serviços a título oneroso, nem a importação de bens ou operações intracomunitárias, não há operações tributáveis para efeitos de IVA, não havendo lugar a liquidação adicional de IVA. Como tal, padecem os actos impugnados de erro nos seus pressupostos, motivo bastante para a sua anulação.

Tal decisão fundamentou-se, essencialmente, no seguinte:

“Assim, e para que a Administração Tributária se pudesse valer das disposições legais por si alegadas para proceder à emissão dos actos tributários de liquidação adicional de IVA e respectivos juros compensatórios - v.g., da alínea a) do nº 1do artigo 1° do Código do IVA que é por si invocada -, sempre lhe incumbiria firmar a pertinente factualidade que se mostrasse subsumível às mesmas, nos termos gerais do artigo 342° do Código Civil e que encontra actualmente consagração expressa no nº 1 do artigo 74º da Lei Geral Tributária (LGT).

Ora, de acordo com o antedito preceito do Código do IVA, são sujeitas a imposto as "transmissões de bens e as prestações de serviços efectuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal".

Esta disposição adstringe, assim, a sujeição a IVA de dada realidade à observância de três níveis de incidência:

(a) Por um lado, a operação deve consubstanciar, entre outras qualificações que não relevam para a situação vertente, como sejam importações ou aquisições intracomunitárias de bens, "transmissões de bens" ou ''prestações de serviços" realizadas a "título oneroso" (incidência objectiva de imposto).

(b) Por outro, a operação deve ser realizada ''por um sujeito passivo agindo como tal", deixando antever a vertente subjectiva da incidência do imposto.

(c) Por outro ainda, a operação deve ser "efectuada em território nacional", apelando-se a um crivo territorial para a incidência da operação.

(…)

Tal como se fez menção, a Administração Tributária estriba os actos de liquidação emitidos na circunstância de as transferências realizadas pela casa­mãe da impugnante à sua sucursal portuguesa pretensamente visarem o ''pagamento dos serviços prestados, em Portugal, no exercício da actividade principal da empresa".

Ora, o n° 1 do artigo 4° do Código do IVA define as prestações de serviços de forma residual e negativa, enquanto "as operações efectuadas a título oneroso que não constituem transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens".

Similarmente, estipula o n° 1do artigo 6° da Sexta Directiva que:

"Por «prestação de serviços» entende-se qualquer prestação que não constitua uma entrega de bens na acepção do artigo 5°.

Essa prestação pode, designadamente, consistir:

- na cessão de um bem incorpóreo representado ou não por um título;

- na obrigação de não fazer ou de tolerar um acto ou uma situação;

- na execução de um serviço prestado em consequência de acto de Administração Pública ou em seu nome ou por força de lei."

(…)

Em face do exposto, e malgrado a abertura com que o legislador português definiu o conceito de prestações de serviços, nos termos do n° 1do artigo 4° do Código do IVA - de resto, em obediência ao nº 1do artigo 6º da Sexta Directiva, como se viu - importa notar que, de acordo com jurisprudência uniforme do Tribunal de Justiça, "uma prestação de serviços só é efectuada «a título oneroso», na acepção do artigo 2°, ponto 1, da Sexta Directiva, e só é assim tributável, se existir entre o prestador e o beneficiário uma relação jurídica durante a qual são transaccionadas prestações reciprocas" (sublinhado nosso), conforme se pode ler, entre outros, no acórdão Tolsma, proferido em 3-3-1994, no âmbito do processo C-16/93.

Ora, de regresso ao caso dos autos, procedendo à transposição para o mesmo das considerações que se vêm fazendo, importa concluir, sem necessidade de particular esforço interpretativo, que a Administração Tributária não logrou demonstrar a existência de um qualquer conjunto de prestações recíprocas que fossem transaccionadas entre a casa-mãe e a sucursal portuguesa da impugnante.

Com efeito, e tal como acima se aludiu, a Administração Tributária limita­se a afirmar, de forma conclusiva, que "as transferências efectuadas pela casa­ mãe (...) não se destinaram ao pagamento de serviços de alojamento nem a compensar prejuízos, como foi contabilizado pelo contribuinte, mas para compensar custos suportados pela sucursal no exercício da sua actividade principal, cuja contrapartida financeira é paga à casa-mãe, na Ilha de Man, pelos membros do clube" e que "Porque estas quantias se destinaram ao pagamento dos serviços prestados, em Portugal, no exercício da actividade principal da empresa, como acima se refere, estão sujeitas a IVA, nos termos da al. a) do artº 1° do CIVA, à taxa normal " - sem que, no entanto, revele as circunstâncias de facto que carrearam a tal conclusão ou identifique, de forma mínima, quais as prestações de serviços, na acepção acima traçada, realizadas pela sucursal da impugnante.

Em qualquer dos casos, e mesmo que se considerasse que a Administração Tributária logrou identificar e caracterizar, in casu, uma relação jurídica existente entre a casa-mãe e a sucursal portuguesa da impugnante no âmbito da qual foram trocadas prestações recíprocas - o que, reitera-se, não sucedeu -, sempre importaria notar que o Tribunal de Justiça desconsiderou já, no passado, a troca de prestações entre a casa-mãe e sucursal de uma dada entidade, por entender que, carecendo a sucursal de falta de autonomia (devendo averiguar-se, para esse efeito, se aquela suporta "o risco económico que decorre da sua actividade'), "os artigos 2°, n° 1, e 9°, n° 1, da Sexta Directiva devem ser interpretados no sentido de que um estabelecimento estável, que não é uma entidade jurídica distinta da sociedade em que se integra, situado noutro Estado-Membro e ao qual a sociedade fornece prestações de serviços, não deve ser considerado sujeito passivo em razão dos custos que lhe são imputados pelas referidas prestações " (acórdão FCE Bank, prolatado em 23-3-2006, no âmbito do processo C-210/ 04).

Ora, tendo resultado provado nos autos que as transferências realizadas pela casa-mãe da impugnante para a sua sucursal portuguesa visavam, precisamente, cobrir os prejuízos registados por esta última - prejuízos, esses, cuja ocorrência, em 1994, foi provada nos presentes autos (cfr. alínea O) supra), e é, de resto, expressamente corroborada pela Administração Tributária, na informação transcrita em D) supra -, sempre seria de concluir, então, que a casa-mãe da impugnante suporta o risco económico da actividade da sucursal, não detendo esta a autonomia inerente ao estatuto de sujeito passivo de IVA, nem podendo a respectiva operação, por conseguinte, ser sujeita a imposto.

Assim, e não tendo a Administração Tributária firmado, como se lhe impunha, em sede de procedimento tributário, os necessários pressupostos de facto para a aplicação das disposições legais de que se pretende fazer valer, resulta demonstrada a ocorrência de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos, que a impugnante assaca aos actos tributários de liquidação adicional de IVA e dos correlativos juros compensatórios impugnados, que assim são ilegais e devem ser anulados”.

Dissente a Recorrente do decidido no entendimento de que a Recorrida detém o direito de utilização exclusiva de um aldeamento turístico de 1ª categoria, propriedade da empresa F.......... (Estates) Limited, no qual são prestados serviços de alojamento, restauração e de recreio aos membros do clube, sendo que a razão principal da existência desta empresa é a administração do empreendimento, de forma a assegurar a sua manutenção e garantir aos membros do clube a existência de condições óptimas de utilização dos apartamentos e espaços comuns. Assenta, pois, o motivo da existência deste estabelecimento estável (a Recorrida) como de administração do empreendimento, e não de prestação de serviços de alojamento, uma vez que estes foram adquiridos pelos membros do clube no momento em que adquiriram esse estatuto, conforme se pode confirmar do contrato-promessa de arrendamento celebrado entre ambas as entidades.

Assim, considera a Recorrente que as transferências efectuadas pela casa-mãe não se destinaram ao pagamento de serviços de alojamento, como é referido pelo sujeito passivo, mas sim para compensar parte dos custos suportados pela sucursal para exercer a sua actividade principal, actividade esta sujeita à taxa normal por resultar da sub-contratação dos serviços de terceiros, limpeza de apartamentos., lavandaria, custos de administração geral, custos com electricidade não imputáveis aos apartamentos, água, infra-estruturas e jardinagem, custos relativos à gestão de empreendimento, etc.

Entende que as transferências efectuadas pela casa-mãe à sucursal (estabelecimento estável) pressupõem a contraprestação das prestações de serviços de administração, nos termos do disposto no n.° l do artigo 4° do CIVA, que se encontram sujeitas a IVA à taxa normal, sendo que as operações entre si realizadas não poderão considerar-se movimentos internos fora do campo de incidência do IVA, como pretende a Recorrida, mas sim prestações de serviços (ou transmissões de bens, consoante o caso).

A Recorrida invoca que, não se encontrando formulada qualquer crítica à sentença e havendo total omissão quanto aos fundamentos pelos quais a FP pede a sua revogação, há que concluir pela falta de alegações e, consequentemente, pela deserção do recurso.

Em todo o caso, sempre seria de manter o decidido.

Começando pela invocada deserção, logo somos levados a concluir pela falta de razão da Recorrida, pois que a Recorrente, na sequência da notificação do despacho de admissão do recurso, atempadamente apresentou alegações com conclusões como se depreende de fls. 375 a 390. Ora, só a falta das alegações é que determinaria a deserção do recurso nos termos do nº 4 do artigo 282º do CPPT.


*

Avançando, agora, para a apreciação do mérito do recurso.

Sobre situação perfeitamente idêntica à dos autos, relativamente à Recorrida, mas do ano de 1995, já teve este Tribunal oportunidade de se pronunciar no rec. nº 80/17.0BCLSB, por acórdão de 22/03/18, já transitado em julgado. As questões aqui suscitadas são idênticas às suscitadas nesse recurso a cuja fundamentação aderimos e que responde plenamente ao suscitado pela ora Recorrente.

Assim, com a devida vénia, e como pronúncia sobre o suscitado pela Fazenda Pública transcreve-se desse acórdão o seguinte:

«As transmissões de bens e as prestações de serviços efectuados no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal estão sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado» (artigo 1.º/1/a), do CIVA).

«São consideradas como prestações de serviços as operações efectuadas a título oneroso que não constituam transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens» (artigo 4.º, n.º 1, do CIVA).

Do probatório resulta o seguinte

i) A correcção à contabilidade da impugnante assente em que: «Da análise da contabilidade dos exercícios de 1992 a 1995, observou-se que o contribuinte registou as seguintes operações tributáveis:

(…)

4.2. Transferências efectuadas pela casa-mãe

A empresa contabilizou periodicamente transferências bancárias efectuadas pela sede. O contribuinte entende que algumas destas transferências se destinam ao pagamento de serviços de alojamento prestados à casa-mãe enquanto outras se destinam a cobrir prejuízos.

4.2.1- Transferências para pagamento de serviços, ditos de alojamento

O suporte contabilístico da contabilização destas transferências é um documento interno, no qual indica o montante recebido, contabilizando aquilo que designa de "serviços prestados" na conta 721-Serviços Prestados e o IVA liquidado à taxa normal, na conta 24331. Para o efeito não emitiu qualquer documento nos termos da al. b), nº 1 do artº 28º do CIVA e com os requisitos mencionados no nº 5 do artº 35º do mesmo diploma, em nome da empresa-mãe, com referência a estas transferências.

4.2.2 - Transferências para compensar prejuízos

A casa-mãe transfere ainda outros valores, em relação aos quais não foi liquidado IVA, por a empresa entender que estes se destinam a cobrir prejuízos, contabilizando essas quantias a crédito da conta 25232.

ii) Em 07-03-1989, a F.......... (Estates) Limited e a impugnante celebraram um contrato designado "CONTRATO PROMESSA DE ARRENDAMENTO", no âmbito do qual a primeira promete arrendar a esta última o «empreendimento turístico designado por "F.........."», o qual se destina "à exploração e utilização turística do aldeamento por parte da arrendatária e dos membros do seu clube", com «início logo após a conclusão do empreendimento prometido arrendar» e podendo a impugnante «utilizar e ocupar as instalações existentes e já construídas, desenvolvendo nelas a sua actividade», até à conclusão do empreendimento, mediante o pagamento de uma renda anual de149.977.935$00, a qual apenas é devida pela impugnante no «início do ano civil após a conclusão de todos os trabalhos de construção civil e empreendimento objecto do presente contrato» .

iii) A casa-mãe da impugnante procedeu a transferências para a sua sucursal portuguesa, que esta contabilizou no ano de 1995, com vista a cobrir os prejuízos referentes aos anos de 1992 a 1994 .

No que respeita às transferências com vista à cobertura de prejuízos ocorridos na impugnante, a recorrente alega que recolheu indícios suficientes que permitem, quer a caracterização da prestação de serviços onerosa entre a sociedade mãe e a impugnante, quer a desconsideração da contabilidade da impugnante. O que justificaria a liquidação adicional de IVA à taxa normal, sustenta.

Sucede, porém, que do probatório acima referido, sem impugnação eficaz por parte da recorrente, resulta o inverso do alegado pela recorrente e constante do RIT.

A impugnante exerce a actividade de exploração de alojamento turístico, o qual foi cedido pela “casa mãe”, através de contrato de arrendamento, pelo qual a segunda recebe da primeira uma contrapartida pecuniária (renda); perante a existência de prejuízos nos exercícios de 1992 a 1994, em 1995, a “casa mãe” determinou a efectivação de transferência com vista a cobertura de prejuízos ocorridos na impugnante.

No que respeita à mencionada transferência para cobrir prejuízos, não existem elementos nos autos que suportem a asserção da realização da prestação de serviços da impugnante em favor da “casa mãe”, mediante o pagamento de uma contrapartida. Pelo que soçobra o pressuposto fáctico em que repousa o acto tributário sob escrutínio. O qual não se pode manter, como se decidiu na sentença recorrida.

A mesma não enferma de erro que necessite de ser reparado”.

No mesmo sentido se pronunciaram, também, sobre a qualificação de transferências idênticas referidas no mesmo relatório de inspecção tributária, os acórdãos deste Tribunal de 18/06/15, proc. Nº 05630/12, e de 19/12/18, proc. Nº 52/17.4 BCLSB, já transitados em julgado.

Assim, com base na fundamentação acabada de transcrever, que tem plena aplicação na situação em apreço, e resultando provado nos autos (cfr. em especial, alíneas M a P do probatório) a existência e a razão da existência de prejuízos no exercício de 1993, a existência de transferências da casa mãe para a Recorrida para cobertura desses prejuízos e o registo dessas transferências na contabilidade da Recorrida, e não tendo a Recorrente impugnado esses factos, resulta claro que não podia senão proceder a pretensão da Recorrida, não sendo, pois, tributáveis em sede de IVA essas transferências para cobertura dos prejuízos, uma vez que não são contrapartida(s) de qualquer prestação de serviço(s).

Improcedem, pois, as conclusões das alegações tendentes à revogação da decisão, decisão esta que é, assim, de manter.


*

3 - DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso.

Sem custas por delas estar isenta a FP, atenta a data de instauração do processo (anterior a 2004).

Lisboa, 13/12/19


*

(Catarina Almeida e Sousa)

(Isabel Fernandes)

(Jorge Cortez)