Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1933/14.2BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:11/07/2024
Relator:LUÍSA SOARES
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
ILEGITIMIDADE
CULPA
ILISÃO DA PRESUNÇÃO
Sumário:I- À luz do disposto na alínea b) do nº1 do artigo 24º da LGT, o apuramento da responsabilidade subsidiária tem subjacente o juízo de culpa pela falta de pagamento da obrigação tributária, podendo ser afastado se o gerente/administrador comprovar que foram feitas as diligências que se lhe impunham em razão do exercício de tais funções (diligência devida a um gestor criterioso - art. 64º do Código das Sociedades Comerciais e art. 32º da LGT) e foram tomadas todas as medidas no sentido de acautelar os interesses dos credores, designadamente do credor tributário.
II – Se do probatório resulta que o oponente tomou várias medidas com vista a superar as dificuldades financeiras e económicas da sociedade e a acautelar os interesses dos credores, que desenvolveu esforços para evitar a insolvência tendo procurado obter financiamentos bancários, reestruturação das empresas do grupo, bem como apoios financeiros através do I....., diligências que se revelaram infrutíferas, dando origem ao PER e depois à insolvência, pode concluir-se que o oponente logrou ilidir a presunção de culpa quanto à falta de pagamento da dívida exequenda
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contra-Ordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I – RELATÓRIO

Vem AT- AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que deferiu a oposição à execução fiscal deduzida por J......com referência ao processo executivo n.º 2208201201132431 e apensos instaurado em nome da sociedade G...... – Sociedade Imobiliária, S.A., por dívidas de IMI dos anos de 2011 e 2012 no montante de € 3.562,75.

A Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos:

“I. Sem quebra do devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o decidido na aliás douta sentença do Tribunal “a quo” que julgou procedente a presente oposição e absolveu o Oponente da presente instância executiva;

II. No caso concreto, salvo devido respeito por entendimento diverso, analisando a matéria de facto provada, deve reconhecer-se que o Opoente não produziu prova que permita concluir que não teve culpa no ato de não pagamento da dívida exequenda, respeitante ao período de 2011.

III. Aliás, o que se constata é que o Oponente não cumpriu diligentemente com os seus deveres de gerência, aparentemente conformando-se com a atuação de terceiros.

IV. O Oponente não deixa de ser responsável pelo destino da sociedade e por todos os atos/omissões de gestão e administração da mesma.

V. Segundo António Pereira de Almeida, em Sociedade Comerciais e Valores Mobiliários, Coimbra Editora, 2008. Pág. 235, “A obrigação de acompanhar e vigiar a actividade social não significa que o administrador deve saber tudo o que se passa no dia a dia em cada departamento e secção da sociedade, mas impõe o dever de instalar sistemas adequados de vigilância e controlo de informação (monitoring procedures) e eventualmente realizar uma investigação quando tome conhecimento de factos anómalos (duty of inquiry). A obrigação de obter a informação apropriada para o processo de decisão deverá ser avaliada, por um lado, em função da complexidade, do grau de risco da decisão e, por outro lado, da urgência e necessidade da rapidez de decisão”.

VI. E o mesmo Autor, quanto ao dever de diligência, obra citada, pág. 237: “O dever de diligência, está associado à obrigação de gestão, mas repare-se que o padrão de referência não é o “bónus pater familiae” do direito civil (art.ºs 487.º n.º 2, e 799.º n.º 2, do C Civ.), mas a figura abstracta de um “gestor criterioso e ordenado”, naturalmente com maior discricionariedade, mas mais exigente, tendo em atenção as importantes incumbências atribuídas aos administradores (art.º 64.º n.º 1, al. A), in fine). Este padrão de referência tem particular importância no que respeita à avaliação de justos motivos para a destituição, ou da culpabilidade para efeitos de responsabilidade civil (…) Porém, no nosso sistema judicial, vigora o principio da insindicabilidade do mérito das decisões de gestão, pelo que os tribunais se devem circunscrever a averiguar dos pressupostos da responsabilidade civil, nomeadamente se os administradores procederam com o cuidado e a diligência devidas”.

VII. Está o gerente ou administrador obrigado a dever de cuidado. Deve empregar a diligência de um gestor criterioso e ordenado. E tal implica, no mínimo, uma obrigação de conhecimento quanto à documentação que assina em representação da sociedade, bem sabendo que é a sua a assinatura que a vincula perante terceiros.

VIII. Não pode considerar-se que o Oponente tenha logrado ilidir a presunção de culpa pelo não pagamento da dívida exequenda que sobre si impendia. Ao não fazer tal prova, deve considerar-se improcedente a Oposição e julgar parte legítima para a execução fiscal o Oponente quanto a tais dívidas, contra si devendo prosseguir a citada execução enquanto responsável subsidiário.

IX. O Oponente é nessa medida responsável pelo pagamento das dívidas de imposto e deve ser considerado parte legítima na presente execução, mantendo-se o Despacho que contra ele decretou a reversão;

X. Ao não o fazer, fez o Tribunal errada interpretação da factualidade que fixou, ou seja, existe erro de julgamento de facto;

XI. Pelo que, forçoso será concluir que estão verificados todos os pressupostos legalmente erigidos à responsabilização do Oponente, nos termos do artigo 24.º, n.º 1, alínea b) da LGT.

XII. Nada, pois, há a censurar na reversão em causa devendo a mesma manter-se na ordem jurídica do Oponente, o qual é, nessa medida, responsável pelo pagamento das dívidas de imposto e deve ser considerado parte legítima na presente execução, mantendo-se o despacho que contra ele decretou a reversão.

XIII. Ao não o fazer, fez o Tribunal errada interpretação da factualidade que fixou, ou seja, existe erro de julgamento de facto;

XIV. Ao decidir, como decidiu, a Douta Sentença incorreu, também, em erro de julgamento de direito, tendo violado o disposto no art.º 23.º e alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º, ambos da LGT.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e em consequência ser a douta Sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que julgue a Oposição totalmente improcedente.”.
* *
O Recorrido apresentou contra-alegações tendo formulados as seguintes conclusões:

“1. A Sentença recorrida padece desde logo de erro de julgamento, ou até, no limite de uma fundamentação contraditória, ao reconhecer que as questões administrativas e financeiras da devedora originária eram exclusivamente decididas pelo Presidente do Conselho de Administração da devedora originária.

2. Contudo, alega, sem qualquer prova, que não ficou demonstrado que o Recorrido não era gerente de facto da devedora originária.

3. Pelo que, quanto ao referido entendimento a Sentença não poderá manter-se.

4. Não deve ser dado provimento ao Recurso interposto pela Fazenda Pública contra a decisão proferida nos autos de procedência da Oposição, em virtude da respectiva fundamentação não apresentar qualquer elemento susceptível de abalar o sentido da decisão recorrida.

5. É notória a incongruência da posição defendida pela AT para justificar a falta de prova na ausência de culpa do Recorrido no não pagamento da divida exequenda.

6. A AT não impugnou os vários documentos juntos aos autos pelo Recorrido, em particular os documentos de reestruturação do grupo G...... e o contrato P..... celebrado com o Estado Angolano, no entanto pretende de forma “encapotada” colocar em causa o seu teor.

7. Nos documentos intervieram variadas instituições independentes do grupo G......, tais como Governo Português, Governo de Angola, Instituições Públicas (I....., PME Investimentos SA, F....., etc), consultoras (E... & Y..., P....., etc), instituições financeiras (BCP, BES, etc).

8. O Bussiness Plan foi dado a conhecer à AT em sede de procedimento de reversão sem que em nenhuma altura o seu conteúdo fosse posto em causa.

9. É manifesto da documentação junta aos autos a exposição do Grupo G...... Portugal a Angola.

10. Pelo que, pelo antecedente não merece qualquer censura a decisão recorrida tão pouco nos termos pretendido pela AT.

11. Fica demonstrado que bem andou o Tribunal a quo na valoração da prova testemunhal e na matéria dada por provado.

12. É patente o esforço da AT em circunscrever a análise da prova testemunhal e documental para defender o indefensável, ou seja, que o Recorrido poderá ser responsabilizado pelo não pagamento da dívida revertida.

13. Contudo, o depoimento das testemunhas inquiridas, bem como da documentação junta aos autos foi esclarecedor sobre o sucedido.

14. É óbvio o esforço argumentativo da AT em causar confusão com vista a fragilizar a decisão recorrida que, reitere-se, não merece censura.

15. Pelo que, deverá improceder o recurso e ser confirmada a decisão recorrida.

16. Ao contrário do alegado pela AT, quer da documentação junta aos autos, quer da prova testemunhal, verifica-se que: i) a exposição do Grupo G...... ao projecto Angolano; ii) a dependência do Grupo G...... do projecto Angolano; iii) a intervenção de entidades públicas - I....., PME Investimentos, F..... - no processo de reestruturação do Grupo G...... implementado após o corte abrupto do projecto Angolano; iv) a intervenção de consultoras independentes – E... & Y..., P....., Delloit, etc, no plano de reestruturação do grupo G...... após o corte abrupto do projecto Angolano; v) a intervenção de várias instituições financeiras – BCP, BES, Banif, Banco Popular, etc – nos plano de reestruturação do grupo G...... após o corte abrupto do projecto Angolano; vi) as diligências desencadeadas pelo Recorrido para fazer face à recuperação do Grupo G...... e honrar os seus compromissos perante todos os credores, privilegiando o Estado.

17. Por muito que a AT pretenda não pode “passar uma borracha” sobre a realidade!

18. O Recorrido não é culpado pela ausência de pagamento das dívidas exequendas.

19. Do ponto de vista material, se tudo mais faltasse, está demonstrada à saciedade que a ausência de pagamento de quaisquer dívidas pela SOCIEDADE não resulta de má gestão, ou insensibilidade para com o pagamento das dívidas fiscais.

20. A ausência de pagamento das dívidas fiscais resulta de factores externos que se impuseram inelutavelmente à SOCIEDADE e ao grupo G...... e que levaram à respectiva insolvência, como é reconhecido no relatório do Administrador da Insolvência.

21. Até 2010, o grupo G...... tinha uma situação imaculada.

22. Em 2010 ocorre a nacionalização em Angola e as sociedades do perímetro G...... ficam privadas de mais de 17 milhões de euros, ocorre um evento que inesperadamente altera toda a realidade do grupo, incluindo da SOCIEDADE.

23. O Recorrido imediatamente procurou inverter a situação, com um arrojado plano de reestruturação, mas foi ultrapassado por factores que não dependiam de si.

24. Foi celebrado um contrato de confirming com a Banca para pagar aos fornecedores.

25. Esse contrato não foi celebrado por vontade do Recorrido, foi obrigado a isso pois tal era exigido pelo plano de negócios gizado para reestruturar o Grupo.

26. E note-se no detalhe do plano de negócios apresentado com intervenção da P..... e cuja execução foi supervisionada e acompanhada pela E....., que corroboram a viabilidade do Plano de Negócios.

27. Questões burocráticas da Banca, conforme atestado por entidades auditoras externas, colocaram em causa o plano de recuperação gizado, prejudicando a viabilidade da empresa.

28. E mais uma vez foi logrado pelo Recorrido alterar o Plano de reestruturação e contratados financiamentos com a Banca.

29. O Presidente do Conselho de Administração da devedora originária bem como o Recorrido foram arredados contratualmente das decisões de efectuar pagamentos quando celebrou o contrato de financiamento umbrela grupado e em, 2011, a SOCI-EDADE passa a pagar apenas o que é aceite pela Banca.

30. Foi imposto um CFO que passou a controlar todos os pagamentos realizados.

31. O CFO indicou que Presidente do Conselho de Administração da devedora originária e o Recorrido não tinham poder de decisão sobre os pagamentos a realizar. Eles eram determinados pela Banca.

32. Na sequência das limitações impostas pela Banca o pagamento das dívidas fiscais era uma prioridade e, mesmo na escassez de fundos foram requeridos, aceites, contratados e iniciados planos prestacionais de pagamentos das dívidas exequendas.

33. Foram feitos acordos com o grupo SONAE e pedida a intervenção da PME INVEST que apresenta as condições para financiar a reestruturação no âmbito do F......

34. Por problemas de mudança de governo não é assinado o contrato com o F..... e a SOCIEDADE é empurrada para um PER em Abril de 2012 (momento em que ainda estavam a ser feitos os pagamentos prestacionais).

35. Até esse momento a situação tributária estava regularizada, mediante os acordos prestacionais.

36. Porém, no momento de prosseguir os pagamentos o Administrador Judicial que havia, entretanto, sido nomeado no PER indica que os planos prestacionais e demais pagamentos ao Estado, devem ser suspensos a partir desse momento.

37. O Presidente do Conselho de Administração da devedora originária e Recorrido colocam a questão à AT de o Administrador Judicial Provisório não pretender manter os pagamentos ao Estado, mas não obtém qualquer resposta.

38. Face às obrigações estatutárias da devedora originária a comunicação remetida à AT foi igualmente subscrita pelo Recorrido na qualidade de administrador.

39. Como pode ser imputada culpa na ausência de pagamentos ao Estado? Não pode.

40. E contra o exposto de nada valem os argumentos da AT a imputar culpa ao Recorrido na gestão da SOCIEDADE.

41. A AT tenta indicar que há culpa ao Recorrido na falta de pagamento das dívidas da SOCIEDADE, em virtude de má gestão.

42. Porém, a argumentação que a AT utiliza é totalmente alheia da realidade e da vida empresarial, que demonstra desconhecer em absoluto.

43. A AT indica que o grupo G...... quando investiu em Angola descapitalizou-se, ficando sujeito ao risco da perda de todo o investimento realizado, bem como perda de 50% do respectivo volume de negócios, sendo que o plano de reestruturação resultou desses maus investimentos fora do país e daí a falta de pagamento ao Estado.

44. Ora, antes de prosseguir alerta-se que é falso que o grupo tenha descapitalizado as empresas para investir em Angola. Aliás nem a AT prova que a SOCIEDADE tenha tirado um cêntimo de Portugal para enviar para Angola.

45. O Grupo faz investimentos em Portugal para suportar a operação em Angola e faz vendas para as forças armadas Angolanas que não foram pagas ao Grupo, tal como foram não foi paga a estrutura criada em Portugal para suportar as operações em Angola.

46. Para além do investimento realizado ter sido efectuado em Portugal – com a reestruturação do grupo, a verdade é que as empresas não se encontravam descapitalizadas, de tal forma que operaram de 2006 a 2010.

47. E note-se que o risco assumido pelo grupo foi um risco equivalente ao das dezenas de grupos económicos com investiram e continuam a investir em Angola: Banca, grupo SONAE, grupo MOTA-ENGIL, grupo Jerónimo Martins, BDO etc.

48. As empresas veículo em Angola foram nacionalizadas e o estado Angolano deve 17 milhões de euros ao grupo G.......

49. Em 2009, o grupo facturou 40.000.000,00 € nos negócios com Angola.

50. A conclusão de má gestão da AT e consequente culpa do Recorrido na falta de pagamento das dívidas é primária e sem qualquer substância, não podendo valer.

51. O Recorrido foi um gestor criterioso, diligente, que perante adversidades procurou manter um grupo de milhões de euros de pé, rodeou-se dos melhores auditores, fez tudo para que ocorresse a reestruturação.

52. A gestão dos fundos passa para a Banca – só esta podendo determinar pagamentos – com um elemento que os controlava a fazer parte da gestão – CFO – e vão sendo feitos pagamentos prestacionais – até ocorrer um problema informático da AT, durante 3 meses.

53. O problema informático é ultrapassado pela AT, mas na altura já havia sido nomeado um Administrador Judicial, que ordena suspender os pagamentos prestacionais das dívidas exequendas.

54. O Recorrido procura junto da AT argumentos para solicitar ao Administrador que se mantenham os pagamentos prestacionais e a AT nada responde.

55. Donde, pelo exposto deverá improceder o recurso em apreciação e ser confirmada a Sentença recorrida.”.
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O Exmº. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu douto parecer defendendo seja concedido provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II – DO OBJECTO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cfr. artigo 635°, n.° 4 e artigo 639°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.

Assim, delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente, importa decidir se a sentença ora recorrida padece de erro de julgamento de facto e de direito ao ter considerado o oponente/recorrido parte ilegítima na execução fiscal.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO E DE DIREITO

O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“Compulsados os autos e analisada a prova documental, encontram-se assentes, por provados, os seguintes factos com interesse para a decisão de mérito:

1. O Oponente era vogal do conselho de administração da sociedade G...... – Sociedade Imobiliária, S.A. desde 20/12/2004 até 31/01/2013 (cfr. doc. junto a fls. 25 a 27, do doc. de fls. 1215, numeração do SITAF, e fls. 1 a 10 do doc. de fls. 1242, numeração do SITAF);

2. A sociedade G...... – Sociedade Imobiliária, S.A. faz parte do grupo de sociedade designado por G......, do qual fazem parte as sociedades G...... – Gestão de Comércio Total, SGPS,S.A., a G..... – Gestão de Plataformas e Transportes, S.A.., G...... – On-Line Distribuição Alimentar, S.A., P......– Supermercados, S.A. e a sociedade G..... – Sociedade Imobiliários, S.A. (cfr. doc. de fls. 2 a 30 do doc. de fls. 206, numeração do SITAF);

3. O grupo empresarial G......, acima descrito, dedica-se à actividade de logística e distribuição, por grosso e a retalho, nas áreas alimentares e não alimentares (facto que se retira do relatório da E... & Y..., de fls. 14 a 30 do doc. de fls. 268, numeração do SITAF);

4. Entre 2006 e 2010 o grupo empresarial G...... desenvolveu, também, a sua actividade em Angola (facto que se retira dos relatórios da E... & Y...);

5. Em 10/10/2007 foi celebrado entre o Grupo de Coordenação do P..... – Nova Rede Comercial, criado por despacho do governo de Angola e o Grupo G....../P..... – Consultores e Serviços, Lda. e EAA – Entreposto Aduaneiro de Angola, E.P. um contrato de Gestão Integrada Por Objectivos, relativo à conceptualização, implementação e gestão da Rede Integrada de Logistica e Distribuição, de uma nova rede de comercial de proximidade, das lojas pedagógicas para o sector do comercio e do desenvolvimento da produção interna (cfr. doc. junto a fls. 2 a 27, do doc. de fls. 641 e doc. de fls. 2 a 30 do doc. de fls. 672, numeração do SITAF);

6. O negócio de Angola significava 50% do volume de negócio do grupo G...... (depoimento das testemunhas T..... e J.....);

7. O negócio em Angola obrigou à criação de infra-estruturas em Portugal, bem como à contratação de mais pessoal (depoimento das testemunhas T....., M..... e J.....);

8. Em Agosto de 2010 o Estado Angolano rescindiu unilateralmente o contrato identificado no ponto anterior com o grupo G...... que operava em Angola (depoimento das testemunhas T....., M..... e J.....);

9. O Estado angolano ficou a dever ao grupo cerca de dezasseis milhões de euros (depoimento das testemunhas M..... e J.....);

10. Logo após a rescisão unilateral dos contratos por parte do Estado angolano o grupo apresentou um plano de negócio de forma a reestruturar toda a actividade do grupo (depoimento das testemunhas T....., M..... e J..... e doc. de fls. 107 a 141 da cópia do processo executivo junto aos autos.);

11. Este plano de reestruturação implicava um financiamento na ordem dos treze milhões de euros (depoimento das testemunhas M..... e J.....);

12. O grupo tentou renegociar os pagamentos aos fundos de investimento imobiliário (facto que se retira do relatório da E... & Y..., doc. de fls. 8 a 27 do doc. de fls. 197, numeração do SITAF, relatório de Janeiro);

13. No âmbito do contrato de confirming os montantes apenas eram disponibilizados pelos bancos após a apresentação das facturas (depoimento das testemunhas T....., M..... e J.....);

14. A gestão do grupo tinha a possibilidade de realocar os montantes de plafond que tinham sido estabelecidos para os fornecedores (facto que se retira relatório da E... & Y..., de fls. 4 a 30 do doc. de fls. 199, numeração do SITAF, relatório de Fevereiro);

15. A banca não disponibilizava, nos prazos estabelecidos no plano de reestruturação, os montantes dos empréstimos concedidos nas datas acordadas o que dificultava a gestão (facto que se retira relatório da E... & Y..., de fls. 4 a 30 do doc. de fls. 199, numeração do SITAF, relatório de Fevereiro);

16. Era a administração do grupo quem indicava à banca as instruções de pagamento à medida que ia celebrando acordos de fornecimento com os seus fornecedores, no âmbito do contrato de Confirming e esta tinha de aprovar (facto que se retira relatório da E... & Y..., de fls. 4 a 30 do doc. de fls. 199, numeração do SITAF, relatório de Fevereiro);

17. No mês de Março de 2011 já se tinha detectado uma necessidade de reforço dos empréstimos concedidos pela Banca (facto que se retira do relatório da E... & Y..., de fls. 38 a 47 do doc. de fls. 244 e doc. de fls. 2 a 30 doc. de fls. 361, numeração do SITAF, relatório de Março);

18. Foi acordado com o I..... a participação do Estado através da PME Investimentos, S.A. e do Fundo Autónomo à Concentração e Consolidação de Empresas (F.....), no apoio à tesouraria do grupo G...... (facto que se retira do Memorando de entendimento junto a fls. 10 a 30 do doc. de fls. 450, numeração do SITAF);

19. Em 31/08/2011 foi assinado um Memorando de Entendimento entre C....., G..... – Sociedade Imobiliária, S.A., a G...... – Gestão de Comércio Total, SGPS,S.A., a G...... O........ – Distribuição Alimentar Directa, S.A., G..... – Gestão de Plataformas e Transportes, S.A., P......– Supermercados, S.A. e a sociedade G...... – Sociedade Imobiliários, S.A. e os Bancos Banco Comercial Português, S.A., Banco Espirito Santo, S.A., Banco Popular Portugal, S.A. e Banif – Banco Internacional do Funchal, S.A. tendo em vista regulamentar os financiamentos existentes e financiamentos a contratar, do qual consta, designadamente, que o grupo de empresas se candidatou ao “Fundo Autónomo de Apoio à Concentração e Consolidação de Empresas” gerido pela PME Investimentos, S.A. (cfr. doc. junto a fls. 10 a 30 do doc. de fls. 450, numeração do SITAF);

20. Todos os esforços foram centrados nas sociedades operativas, a saber: G...... online, P......e G..... (facto que se retira do relatório da E... & Y..., de fls. 2 a 30 do doc. de fls. 361, numeração do SITAF, relatório de Março);

21. Em Março de 2011 já se tinha detectado ser necessário um reforço da linha de conforming (facto que se retira do relatório da E... & Y..., de fls. 2 a 30 do doc. de fls. 361, numeração do SITAF, relatório de Março);

22. A banca, para garantir o financiamento, obrigou a que uma empresa externa fizesse o controlo de tesouraria, bem como que um CFO (chief financial officer) fosse nomeado para todas as empresas do grupo (depoimento das testemunhas M....., J..... e J......);

23. Os pagamentos ficaram todos dependentes da aprovação do CFO e da E... & Y... (depoimento da testemunha J......);

24. Todas as disponibilidades financeiras do grupo eram controladas pela banca (depoimento das testemunhas M....., J..... e J......);

25. O oponente não tinha autonomia para decidir que pagamentos fazer e a quem (depoimentos das testemunhas T....., M....., J....., J...... e C......);

26. Todos os pagamentos efectuados por ATM’s eram direccionados para a banca (depoimento das testemunhas M....., J..... e J......);

27. Em 09/11/2011 a PME Investimentos, S.A. informou a G...... – Gestão de Comercio Total, SGPS, S.A. dos termos e condições em que estavam dispostos a financiar o grupo na quantia de € 1.800.000,00 (cfr. doc. junto a fls. 14 a 21 do doc. de fls. 543, numeração do SITAF);

28. Em 17 de Novembro de 2011 foi celebrado entre a G...... – Gestão de Comercio Total, SGPS, S.A. e a S......, SGPS; S.A. um Acordo de Parceria (cfr. doc. de fls. 6 a 19 do doc. de fls. 512, numeração do SITAF);

29. Em 25/11/2011 foi celebrado entre a devedora originária e a sociedade E... & Y... A.... & Associados – SROC, S.A. um contrato de prestação de serviços do qual resulta que a segunda entidade passaria a desenvolver as funções de Revisor Oficial de Contas da devedora originária (cfr. doc. junto a fls. 11 a 18 do doc. de fls. 574, numeração do SITAF);

30. Todas as empresas do grupo G...... foram obrigadas pela banca a nomear um CFO (depoimento das testemunhas M....., J..... e J......);

31. Todas as empresas do grupo G...... foram obrigadas a celebrar contratos de prestação de serviço com a sociedade E... & Y... A.... & Associados – SROC, S.A. no sentido de esta passar a desenvolver as funções de Revisor Oficial de Contas das empresas do grupo (cfr. docs. junto a fls. 28 a 30 do doc. de fls. 512, numeração do SITAF);

32. Em 28/12/2011 foi celebrado um aditamento ao Contrato de Abertura de Crédito – Contrato Umbrella Grupado - celebrado em 29/12/2004, entre o Banco Comercial Português, S.A., a G...... – Gestão de Comercio Total, SGPS, S.A., a G..... – Sociedade Imobiliária, S.A., a G...... O........ – Distribuição Alimentar Directa, S.A., G..... – Gestão de Plataformas e Transportes, S.A., P......– Supermercados, S.A. e a sociedade G...... – Sociedade Imobiliária, S.A., sendo disponibilizado um crédito de € 10.000.000,00 que se vence em 31/12/2013, podendo ser prorrogado por prazos sucessivos de noventa dias, sendo que todas as utilizações de crédito terão de ser autorizadas pelo Banco (cfr. doc. junto a fls. 4 a 12 do doc. de fls. 999, numeração do SITAF);

33. A G...... – Sociedade Imobiliária, S.A. intentou um processo especial de revitalização que correu termos sob o nº 1522/12.6TYLSB junto 3º Juízo do Tribunal do Comercio de Lisboa (facto que se retira do doc. de fls. 19 a 21 do doc. de fls. 1269, numeração do SITAF);

34. Em 03/09/2012 foi nomeado administrador provisório da J........ (cfr. doc. junto a fls. 19 a 21 do doc. de fls. 1269, numeração do SITAF);

35. Por carta datada de 11/09/2012 a devedora originária comunicou ao serviço de finanças que o entendimento do administrador da insolvência era no sentido de deixarem de ser cumpridos os acordos prestacionais e solicita uma posição sobre a questão (cfr. Doc. Junto a fls. 24 do doc. de fls. 1053, numeração do SITAF);

36. Em 31/01/2013 o oponente renunciou ao cargo de vogal do conselho de administração da sociedade G...... – Sociedade Imobiliária, S.A. (cfr. doc. junto a fls. 25 a 27, do doc. de fls. 1215, numeração do SITAF, e fls. 1 a 10 do doc. de fls. 1242, numeração do SITAF);

37. Em 05/04/2013 foi proferida sentença a declarar a insolvência da sociedade G...... – Sociedade Imobiliária, S.A. tendo sido nomeado administrador da insolvência J........ no proc. nº 638/13.6TYLSB (cfr. doc. junto a fls. 1 a 6 do doc. de fls. 1292, numeração do SITAF);

38. No âmbito do processo de insolvência nº 638/13.6TYLSB foi elaborado um relatório pelo Administrador da Insolvência do qual consta que a sociedade em questão tentou a recuperação mas tal não foi possível, que a sociedade não tem qualquer actividade, bem como que a sociedade possui um passivo substancialmente superior ao seu activo (cfr. doc. junto a fls. 14 a 19 do doc. de fls. 1379, numeração do SITAF e fls. 1 a 3 do doc. de fls. 1398, numeração do SITAF);

39. Em 22/10/2012 foi autuado o processo de execução fiscal nº 2208201201132431 que corre termos no Serviço de Finanças de Palmela, por dívidas IMI de 2012 da sociedade G...... – Sociedade Imobiliária, S.A. no valor de € 1.181,59, com data limite de pagamento de 30/09/2012 (cfr. doc. junto a fls. 61 do doc. nº 1 do SITAF);

40. Ao processo identificado no ponto anterior foram apensos os processos de execução fiscal nº 2208201301090330, 2208201301112775 e 2208201301176811 em que é executada a G...... – Sociedade Imobiliária, S.A. por dívidas de IMI, com datas limite de pagamento voluntário de 30/04/2013, 01/08/2013 e 30/11/2013 ficando a dívida a valer por € 3.562,75 (cfr. doc. de fls. 6 do doc. de fls. 841, numeração do SITAF);

41. Em 26/03/2014 foi elaborada uma informação no serviço de finanças de Palmela da qual consta que a devedora originária se encontra em processo de insolvência, que desde 05/04/2013 são seus administradores o Oponente e outros (cfr. doc. junto a fls. 7 a 17 do doc. de fls. 816, numeração do SITAF);

42. Em 26/03/2014 foi proferido despacho no sentido de ouvir o Oponente e outros sobre a intenção de contra si reverterem as dívidas exequendas, afirmando-se que, muito embora existam bens em nome da devedora originária, a sociedade tem uma situação liquída negativa e foi declarada a sua insolvência (cfr. doc. junto a fls. 19 a 25 do doc. de fls. 816, numeração do SITAF e doc. de fls. 1 a 5 do doc. de fls. 841, numeração do SITAF);

43. O Oponente foi notificado para se pronunciar sobre a intenção de contra si reverterem as dívidas exequendas (facto que se retira do doc. de fls. 10 do doc. de fls. 841, numeração do SITAF);

44. O Oponente exerceu o seu direito de audição prévia (cfr. doc. junto a fls. 24 e 25 do doc. de fls. 841, numeração do SITAF e 1 a 3 do doc. de fls. 866, numeração do SITAF);

45. Foram ouvidas as testemunhas arroladas pelo Oponente no seu direito de audição prévia no âmbito do processo de execução fiscal nº 2208201301065980 e apensos (facto que se retira dos docs. de fls. 11 a 25 do doc. de fls. 866, e docs. de fls. 1 a 25 do doc. de fls. 891, numeração do SITAF);

46. Em 13/06/2014 foi proferido despacho a ordenar a reversão do processo executivo contra o oponente e outro (cfr. doc. junto a fls. 63 a 86 do doc. nº 1 do SITAF);

47. Do despacho identificado no ponto anterior consta o seguinte:
(IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS)








(IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS)

(…)” (cfr. doc. junto a fls. 63 a 86 do doc. nº 1 do SITAF);

48. Sempre houve uma separação entre o património do oponente e das várias empresas do grupo (depoimento das testemunhas T....., M....., J..... e R........);

49. O Oponente assinou todos os contratos identificados neste probatório na qualidade de vogal do conselho de administração da devedora originária;

50. O oponente tinha a responsabilidade de administrar e gerir os imóveis do grupo de sociedades (depoimento das testemunhas J....., R........ e C......);
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B) DOS FACTOS NÃO PROVADOS
a) Não ficou provado que o oponente permanecesse à frente dos destinos da devedora originária após 31/01/2013;
*
Dos factos constantes da oposição, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.
*
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, bem como dos depoimentos das testemunhas arroladas. A primeira testemunha inquirida, T....., declarou ser responsável de controlo de gestão. Declarou ter trabalhado no grupo “G...... – Gestão de Comércio Total, SGPS, S.A.” desde Agosto de 2007 até Novembro de 2011. Esclareceu que o grupo era um grupo de distribuição alimentar, tendo referido que a devedora originária fazia a gestão do parque imobiliário do grupo. Afirmou ainda que o grupo tinha negócios em Portugal, Espanha e Angola. Ainda esclareceu qual a natureza e objectivos do contrato celebrado com Angola. O projecto consistia em implementar cerca de dez mil pequenos supermercados em Angola. As empresas do grupo cederiam o Know-how, bem como produtos que importava para serem vendidos nas lojas. Mais esclareceu que esteve em Angola e teve conhecimento que o Estado Angolano rescindiu unilateralmente o contrato com o grupo. Mais esclareceu que o volume de negócio com Angola significava cerca de 50% do volume de negócios do grupo. Esclareceu ainda que tinha grande peso o fornecimento as forças armadas e que era feito pela G...... portuguesa, nada tendo a ver com a empresa G...... angolana. Logo a seguir a esta situação, o grupo teve de se reestruturar e foi o que aconteceu logo em finais de 2010. Teve de ocorrer uma renegociação com os fornecedores, nomeadamente porque as compras iriam diminuir. O grupo teve de se socorrer de uma linha de conforming, em que os Bancos apenas efectuavam os pagamentos mediante a apresentação das facturas dos fornecedores e depois de os aprovarem. Mais esclareceu que a própria E........ afirmou que se não ocorressem financiamentos até Março a sociedade entraria em incumprimento. Declarou saber que a banca, numa fase inicial, apoio o grupo, mas entretanto, não sabe dizer quando, voltou atrás. Afirmou ainda que havia uma total separação entre o património do grupo e o património do Oponente. Também afirmou que as empresas tinham a sua tesouraria separada embora a gestão da mesma fosse efectuada centralmente. Mais afirmou que a devedora originária não tinha quaisquer interesses directos em Angola. O depoimento desta testemunha foi credível, seguro, isento, descomprometido e convicto, tendo a testemunha demonstrou ter conhecimento directo dos factos a que depôs. A segunda testemunha inquirida, M....., advogada, afirmou ter trabalhado no grupo “G...... – Gestão de Comércio Total, SGPS, S.A.” desde 2005 até 2013. Tinha a seu cargo a acessória jurídica ao grupo e ao conselho de Administração. Afirmou que a devedora originária, e outra empresa do grupo, detinha o património imobiliário do grupo. Esta empresa arrendava os seus imóveis às outras empresas do grupo. Esclareceu que a actividade em Angola foi iniciada a convite do governo angolano. O que aconteceu foi que o grupo foi exercer a sua actividade lá. Durante cerca de 4 anos os negócios correrem sem percalços. Foi por isso inesperado o terminus do negócio. Logo após esta situação foi, de imediato, apresentado um plano de reestruturação do negócio. Afirmou que em Setembro de 2011, não existiam quaisquer dívidas fiscais. O plano de reestruturação implicava um apoio financeiro na ordem dos treze milhões de euros. Os bancos não disponibilizaram a linha de conforming antes de Janeiro/Fevereiro de 2011. Isto fez com que não fosse possível tirar partido da época natalícia prejudicando o plano de negócios. Esclareceu também que a banca para garantir o financiamento obrigaram a que uma empresa externa fizesse o controlo de tesouraria, bem como um CFO (chief financial officer) que foi nomeado para todas as empresas do grupo. Afirmou que o trabalho foi feito de forma global, ou seja, os recursos eram distribuídos por todas as empresas de modo a que nenhuma ficasse prejudicada. A determinada altura, foi decidido pelo CFO que os impostos seriam pagos parceladamente para permitir cumprimento de várias obrigações. Esclareceu ainda que no âmbito do PER, foi a própria banca que nomeou o Dr. J........como administrador judicial. O que se pretendia com o PER era ganhar tempo e para evitar que os fornecedores viessem pedir a insolvência da sociedade. Durante todo o processo a administração do grupo teve uma atitude pro-activa no sentido de recuperar a actividade do grupo. Nunca houve um cruzar de braços. O PER tinha também como pressuposto vir a ser celebrado um contrato de parceria de negócio, mas com todas as demoras decorrentes do próprio PER, o parceiro de negócio, que no caso era a Sonae, acabaram por desistir o que levou ao fracasso do PER. Afirmou ainda, de forma muito peremptória, que nunca houve nenhuma retirada de património da sociedade para o seu administrador. Esclareceu ainda que a dívida da empresa angolana ao grupo ascendia a cerca de dezasseis milhões de euros. Esta dívida resulta do incumprimento das cláusulas do contrato, nomeadamente de remunerações resultantes dos serviços prestados pelo grupo. Ainda esclareceu que com a nomeação do administrador da insolvência aí foram dadas instruções directas que os impostos não seriam para pagar. O depoimento desta testemunha foi seguro, coerente, claro e isento, descomprometido e convicto, tendo a testemunha demonstrou ter conhecimento directo dos factos a que depôs. A terceira testemunha inquirida, J....., revisor oficial de contas, declarou ter trabalhado na sociedade desde cerca de 2000 até cerca de 2012. Era o responsável pela revisão de contas do grupo. Esclareceu que o negócio em Angola obrigou à criação duma estrutura em Portugal, para satisfazer a estrutura angolana, bem como à deslocação de trabalhadores do grupo para Angola, onde tinham também uma infra-estrutura logística. Confirmou que o negocio em Angola representava cerca de 50% do volume de negócios do grupo. Foram montados, em Portugal, estruturas informáticas e outras, para sustentar as operações em Angola. A necessidade de cessar contratos de trabalho, com os colaboradores do grupo que se encontravam em Angola, criou custos muito relevantes. Teve de ser criado um centro de logística que teve de ser construído para fazer face à actividade de Angola que, de repente, ficou completamente sem actividade e préstimo. Afirmou que logo em seguida, a administração entrou em contacto com a banca e foi elaborado um plano de negócios por forma a reestruturar o negócio. Toda esta negociação com a banca demorou muito tempo o que originou ao incumprimento do grupo para com fornecedores. Esclareceu ainda que todos os pagamentos dos clientes ficavam logo nos bancos. Afirmou também que os bancos obrigaram à contratação dum CFO que era quem controlava tudo, no que respeitava aos meios financeiros do grupo. Na opinião da testemunha foram os atrasos no financiamento por parte da banca que acabou por determinar a insolvência do grupo e das empresas do grupo. Mais afirmou que todos os fundos gerados eram sempre canalizados para o negócio, até porque era um grupo que se encontrava em permanente crescimento. Também esclareceu que foi já no âmbito do PER que deixaram de ser feitos os pagamentos, ainda que prestacionais, à AT. Esclareceu que esse foi o entendimento do administrador judicial, tanto assim que foi pedido um esclarecimento à AT se esse seria o entendimento correcto. Esclareceu ainda que, pelo menos, os valores pagos em TPA’s eram imediatamente direccionados para a banca. No que respeita ao oponente esclareceu que este era responsável pelo património do grupo. Afirmou que o verdadeiro administrador era o Dr. C...... nunca tendo tido qualquer conversa com o oponente sobre as questões das contas, da situação da empresa e dos impostos. Dos seus contactos com o grupo o oponente não tinha qualquer poder de decisão sobre questões administrativas e financeiras. Havia um conjunto de normas de funcionamento da sociedade que tinham de ser seguidas por todos os funcionários e administradores pelo que não era possível alterar. Eram normas de controle interno que eram escrupulosamente cumpridas até porque eram auditadas pelos auditores externos. Na feitura destes procedimentos afirmou que o oponente não teve qualquer interferência. Ainda confirmou que a devedora originária vinha cumprindo os planos prestacionais no âmbito deste processo executivo e os mesmos deixaram de ser feitos com a entrada do administrador da insolvência. Também este depoimento foi claro, coerente, seguro, isento, convicto e descomprometido, tendo a testemunha demonstrou ter conhecimento directo dos factos a que depôs. A quarta testemunha inquirida, R........, contabilista certificada, disse ter prestado serviços para o grupo “G...... – Gestão de Comércio Total, SGPS, S.A.” desde Setembro de 2001 até Fevereiro de 2011. Esclareceu que trabalhava na sociedade que fazia a contabilidade de todas as empresas do grupo. Afirmou que depois do pagamento aos funcionários, mesmo antes dos pagamentos aos fornecedores, eram sempre pagos todos os impostos. Mais esclareceu que até ao momento em que deixou a sociedade os impostos estavam todos regularizados. Esclareceu que no momento em que os impostos que se encontram aqui a ser exigidos a empresa já se encontrava em dificuldades financeiras. Afirmou que o oponente tinha a seu cargo a parte imobiliária do grupo, abertura de lojas, obras nos edifícios e tudo com isto relacionado. O oponente era uma pessoa da confiança do administrador C...... e por isso foi nomeado administrador de algumas sociedades do grupo. Esclareceu que nunca falou com o oponente sobre questões fiscais. Também este depoimento foi claro, coerente, seguro, isento, convicto e descomprometido, tendo a testemunha demonstrou ter conhecimento directo dos factos a que depôs. A quinta testemunha inquirida, J......, disse ter trabalhado para o grupo “G...... – Gestão de Comércio Total, SGPS, S.A.” desde meados Novembro de 2011, como supervisor financeiro, nomeado pelos Bancos Millenium e BES, de algumas empresas do grupo. Esclareceu também que toda e qualquer disponibilização de meios financeiros por parte dos bancos para o grupo dependia de dois pareceres favoráveis, um da própria testemunha e outro da E... & Y.... Durante o curto período que esteve a desempenhar as suas funções, não havia impostos em incumprimento. De duas uma, ou estavam a ser pagos no âmbito de planos prestacionais, ou seriam impostos que se encontravam a ser discutidos. Durante cerca de um mês e meio, dois meses, houve tesouraria e por isso os impostos iam sendo pagos. Depois deixou de haver tesouraria. Na opinião da testemunha a situação de insolvência apenas se ficou a dever a insegurança no envolvimento da banca no grupo e que a injecção de capital foi mínima e com isso ocorreu o incumprimento do grupo. A banca hesitou e isso resultou na insolvência da sociedade. Esclareceu que a banca, quando a testemunha começou a exercer as suas funções, controlava a totalidade das entradas de capital nas empresas do grupo. Também este depoimento foi absolutamente isento, coerente, claro, seguro, convicto e descomprometido, tendo a testemunha demonstrou ter conhecimento directo dos factos a que depôs. A sexta testemunha inquirida, C....., empresário e consultor, declarou conhecer o oponente da sua actividade profissional. O depoimento desta testemunha confirmou a existência de negócios com Angola e o desaparecimento do mesmo devido a uma nacionalização por parte do governo Angolano. Afirmou que não era possível aos administradores e vogais do conselho de administração não tinham possibilidade de intervir nos pagamentos que eram efectuados pelo que o Oponente não tinha nenhuma capacidade de decisão. Mais esclareceu que muitas vezes o oponente assinava o que lhe era pedido sem que houvesse a possibilidade de lhe explicar tudo o que estava em causa. O depoimento desta testemunha foi claro, coerente e seguro.
*
Nenhum elemento foi junto aos autos pelo órgão de execução fiscal que prove que após a renúncia o Oponente continuasse a praticar actos de gestão da devedora originária”.

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IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada considerou que o oponente, ora recorrido, era administrador de facto da sociedade devedora originária, tendo, no entanto, logrado ilidir a presunção de culpa prevista na alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT e como tal julgou procedente a oposição à execução por provada a ilegitimidade do oponente, tendo para o efeito vertido o seguinte discurso fundamentador:

“(…) resulta provado que a devedora originária se dedicava à distribuição alimentar, sendo que a devedora originária era uma das duas empresas do grupo onde se encontravam os imóveis utilizados pelas empresas do grupo.

Ficou provado que o grupo expandiu a sua actividade para Angola e, muito embora a empresa angolana não tivesse capital do grupo, a verdade é que o grupo teve necessidade, para apoiar a actividade da empresa angolana, de contratar mais pessoal e mesmo de expandir infra-estruturas e contratar mais pessoal. Esta actividade em Angola significava cerca de 50% do volume de negócios do grupo. Com o fim abrupto da actividade em Angola, com as dívidas que ficaram dessa actividade, bem como dos contratos de fornecimentos celebrados por força daquela actividade, o grupo ficou numa situação difícil em termos financeiros.

Também resultou provado que logo após esse revés, a administração do grupo, na qual se incluía o oponente, procurou, de imediato, reestruturar a actividade do grupo e obter junto da banca financiamentos por forma a permitir a recuperação do mesmo. A banca, numa primeira fase, apoiou o esforço de reestruturação do grupo embora sempre impondo regras apertadas nos pagamentos a efectuar pelas várias empresas do grupo, sendo sempre privilegiados os pagamentos aos fornecedores, mediante a apresentação das facturas. Todas as entradas de meios financeiros eram canalizadas para os bancos. Ficaram dependentes da autorização da banca todos os pagamentos a efectuar pela devedora originária não tendo os seus administradores capacidade decisória para efectuar outros pagamentos.

Ora, como já se referiu acima, a obrigação de boa gestão que impende sobre os gerentes das sociedades não é uma obrigação de resultados mas sim uma obrigação de meios. Significa isto que a obrigação do gerente é desenvolver todas as diligências necessárias à manutenção da boa gestão e laboração da sociedade, não estando obrigado a obter resultados. O que releva para aferir do cumprimento dos seus deveres de bom gestor e de um gestor criterioso, são os meios por si empregues para evitar a derrocada da sociedade e a frustração dos créditos.

Voltando ao caso concreto, podemos concluir que o Oponente desenvolveu todos os esforços para evitar a insolvência da sociedade e a frustração dos créditos dos seus credores. Desde logo, o oponente procurou obter todos os financiamentos possíveis para manter o grupo em laboração, através da obtenção de meios de financiamento bancários, reestruturação das várias empresas do grupo, procurando o envolvimento do Estado através do I....., bem como o estabelecimento de parcerias que lhe permitissem manter o negócio a funcionar e de forma a ir pagando as diversas dívidas que possuía.

O Oponente procurou que, com o funcionamento dos negócios do grupo, este fosse gerando meios financeiros para cumprir todos os compromissos que tinha assumido com os seus clientes, fornecedores e credores. No entanto, como foi afirmado por todas as testemunhas, as delongas nos processos burocráticos, quer junto dos bancos quer junto do I....., bem como a hesitação da banca no suporte ao negócio do grupo, originaram constrangimentos diversos em sede de tesouraria que levaram as várias empresas do grupo ao PER e, mais tarde, à insolvência.

Em todo este processo ficou claro o empenho do Oponente e do presidente do conselho de administração em recuperar as várias empresas do grupo, entre as quais a aqui devedora originária, procurando que estas mantivessem a sua actividade de modo a gerar meios financeiros para pagar aos seus credores em face da sobejamente provada difícil situação económica e financeira do grupo e, naturalmente, da devedora originária. Não se pode esquecer, como resultou provado, que durante todo este período de apoio financeiro, o grupo tinha todos os seus pagamentos a credores sujeitos à aprovação da banca, do CFO e da E... & Y... que priorizavam o pagamento de salários e dos fornecedores. De salientar, ainda, que não obstante a escassa liquidez da devedora originária esta efectuou pagamentos de impostos no âmbito de planos prestacionais.

No caso dos autos, o Oponente, como ficou sobejamente provado, não tinha poder de decisão relativamente aos destinos das disponibilidades financeiras que a devedora originária e o grupo de empresas ia gerando, e que tudo fez para procurar manter a sociedade e o grupo em laboração, procurando apoios ao crédito e novas parcerias. No entanto, com a rescisão unilateral e abrupta do contrato com Angola e as dificuldades de financiamento junto da banca, pouco havia a fazer para manter a sociedade e o grupo.

Acresce ainda que, após a entrada da devedora originária no PER o administrador judicial considerou que os impostos não deveriam ser pagos senão em sede de acordo de credores.

Assim logrou o oponente provar que desenvolveu todas as diligências necessárias para procurar manter a sociedade a funcionar e para procurar solver as dívidas da mesma e, consequentemente, temos de concluir que não foi por culpa sua que os impostos em falta não foram pagos.” (fim de citação).

Dissente do assim decidido vem a AT apresentar recurso jurisdicional defendendo que o oponente não produziu prova que permita concluir que não teve culpa na falta de pagamento da dívida exequenda, afirmando que o oponente não cumpriu diligentemente com os seus deveres de gerência, conformando-se com a atuação de terceiros, sendo nessa medida responsável pelo destino da sociedade e por todos os atos/omissões de gestão e administração, e como tal deve ser considerado parte legitima na execução por estarem verificados todos os pressupostos para a sua responsabilidade nos termos da alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT.

A questão a decidir nos presentes autos centra-se em determinar, face à prova produzida, se o Recorrido logrou ou não ilidir a presunção de culpa constante da al. b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT.

O regime de responsabilidade subsidiária previsto no art. 24º, nº 1 da Lei Geral Tributária consagra o seguinte:

1 - Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:

a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;

b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento”.

A jurisprudência dos Tribunais Superiores tem afirmado em vários Acórdãos (entre outros Acórdão do STA, de 10/16/2013, proc.º 0458/13 e Acórdão do TCA Sul de 15/04/2021, procº 614/15.4BELRA), que de acordo com as regras de repartição do ónus da prova aplicáveis às distintas situações previstas no nº 1 do art. 24º da LGT:

i)- incumbe em qualquer dos casos à AT comprovar a alegação do exercício efetivo do cargo e a culpa do revertido na insuficiência do património da pessoa coletiva ou ente fiscalmente equiparado para a satisfação da dívida tributária, quando esta se tenha constituído no período de exercício do cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado após aquele exercício (al. a) do nº 1 do art. 24º da LGT);

ii) incumbe ao revertido comprovar que não lhe é imputável a falta de pagamento pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do cargo (al. b) do nº 1 do art. 24º da LGT).

No caso em apreço resulta do probatório que o despacho de reversão fundou-se na alínea b), do n.º 1, do artigo 24.º da LGT, não sendo controvertido que o Recorrido fazia parte do conselho de administração da sociedade devedora originária, quer no período em que as dívidas se constituíram, quer no período em que se venceram, pelo que o Oponente, ora Recorrido encontrava-se onerado com a respetiva presunção de culpa imputando-se-lhe a falta de pagamento dos tributos.

Como se afirma no Acórdão do TCA Sul de 15/04/2021 – proc. 614/15.4BELRA no qual a ora Relatora foi 1ª Adjunta “O acto ilícito culposo que se presume praticado pelo gestor não se fica pela omissão de pagamento do imposto vencido. O que se presume é que o gestor não actuou com a diligência de um “bonus pater familiae”, com a observância das disposições legais aplicáveis aos gestores, em especial a do art.º 64.º do Código das Sociedades Comerciais, que lhe impõe a observância de deveres de cuidado, de disponibilidade, de competência técnica, de gestão criteriosa e ordenada, de lealdade, no interesse da sociedade e dos sócios, que sejam relevantes para a sustentabilidade da sociedade – cf., entre muitos, o Acórdão do TCA Norte, de 23/11/2011, proferido no proc.º 00972/09.0 BEVIS.”.

Apesar da dificuldade que existe na prova de um facto negativo, como é o caso da ausência de culpa, para afastar a responsabilidade subsidiária por dívidas de impostos cujo prazo de pagamento terminou durante a gestão, o gestor tem, pois, que demonstrar que a devedora originária não tinha fundos para pagar os impostos e que a falta de meios financeiros não se deveu a qualquer conduta que lhe possa ser censurável.

Note-se que, embora esta alínea b) se refira meramente a imputação, e não a culpa, a jurisprudência tem vindo a interpretá-la reiteradamente no sentido de que é sempre exigível a culpa do gestor, entendida esta como a inobservância ou violação de uma regra de conduta previamente estabelecida.

Assim, demonstrada que seja a falta de pagamento ou de entrega da dívida tributária por parte da sociedade originária devedora, recairá sobre o gestor o ónus da prova da falta de culpa por tal facto, sendo certo que a lei impõe a quem exerça funções de administração em pessoas coletivas ou entes fiscalmente equiparados “o cumprimento dos deveres tributários das entidades por si representadas” (art.º 32.º da LGT).

Da interpretação que a doutrina e a jurisprudência fazem sobre os termos da responsabilidade dos administradores e gerentes à luz do disposto na alínea b) do nº1 do artigo 24º da LGT, resulta que o apuramento dessa responsabilidade tem subjacente o juízo de culpa pela falta de pagamento da obrigação tributária, o qual pode ser afastado se comprovarem que efetuaram as diligências que se lhe impunham em razão do exercício de tais funções (diligência devida a um gestor criterioso - art. 64º do Código das Sociedades Comerciais e art. 32º da LGT) e tomaram todas as medidas para acautelar os interesses dos credores, designadamente do credor tributário.

Importa referir que, o êxito na gestão ou a falta dele, não se confunde com a culpa, para efeitos de cumprimento do dever de diligência de um gestor criterioso e ordenado. Para que seja afastada a presunção de culpa torna-se necessário demonstrar que, no caso em concreto, as opções de gestão do Recorrido foram as mais adequadas, de acordo com padrões de diligência de um gestor médio, não tendo a sua conduta contribuído, de modo algum, para a situação de falta de pagamento da dívida tributária.

Vejamos o que resulta da prova produzida nos presentes autos:

- A sociedade devedora originária estava inserida num grupo empresarial denominado G...... que desenvolveu nos anos de 2006 a 2010 atividade em Angola, no âmbito do qual celebrou com o Grupo de Coordenação do P....., criado pelo governo angolano, um contrato de gestão integrada por objetivos com vista à criação e implementação de uma rede integrada de logística e distribuição;

- Em 2010 o Estado Angolano rescindiu unilateralmente o referido contrato, ficando a dever cerca de 16 milhões de euros;

- O grupo G...... após a rescisão apresentou um plano de reestruturação de toda a atividade do grupo que implicava um financiamento de cerca de 13 milhões de euros, tentando renegociar os pagamentos aos fundos de investimento imobiliário, sendo que, no âmbito do contrato de confirming, os pagamentos eram disponibilizados pelos bancos mediante a apresentação das faturas;

- Foi celebrado acordo com o I..... para apoio à tesouraria do grupo G......;

- Em 2011 foi assinado um memorando de entendimento entre as sociedades integrantes do grupo e diversas instituições bancárias tendo em vista regulamentar financiamentos existentes e a contratar;

- As instituições bancárias, para garantir o financiamento, determinaram a necessidade de um controlo de tesouraria por uma empresa externa e a nomeação de um CFO para todas as empresas do grupo, sendo os pagamentos dependentes da sua aprovação e da E... & Y..., sendo as disponibilidades financeiras do grupo controladas pelas instituições bancárias;

- O Oponente não tinha autonomia para decidir sobre os pagamentos;

- A sociedade devedora originária G...... Sociedade Imobiliária, S.A., intentou um PER, tendo sido nomeado em 2012 um administrador provisório;

- O oponente renunciou em 31/01/2013 ao cargo de vogal do conselho de administração da sociedade devedora originária;

- Em 05/04/2013 foi proferida sentença a declarar a insolvência da sociedade devedora originária e a nomeação do administrador de insolvência.

Tendo presente que o dever de boa e criteriosa gestão que recai sobre os gerentes das sociedades não é uma obrigação de resultados mas de meios, isto é, a obrigação do gerente é efetuar todas as diligências necessárias à manutenção da boa gestão e laboração da sociedade, não estando obrigado à obtenção de resultados. Para que se possa aferir do cumprimento daquele dever, o que releva são os meios empregues para manter a sociedade e impedir a frustração dos créditos, designadamente dos tributários.

Ora face à prova produzida resulta que a situação económica e financeira da sociedade devedora originária foi alterada face à rescisão unilateral pelo Estado Angolano do contrato celebrado, tendo a administração da sociedade (o oponente e o presidente do conselho de administração) encetado diversas diligências no sentido de recuperar as sociedades integrantes do Grupo, designadamente através de um plano de reestruturação, tentando renegociar os seus pagamentos, os quais, face ao contrato de confirming eram controlados pelos bancos, assim como os recebimentos. A administração tentou ainda acordos com o I..... de apoio à tesouraria e assinou um memorando com diversas instituições bancárias no sentido de obter financiamentos, tendo aquelas determinado a nomeação de um CFO que aprovava os pagamentos e controlava as disponibilidades financeiras.

Contudo estas diligências revelaram-se infrutíferas, conduzindo ao PER da sociedade devedora originária e posterior insolvência com a consequente nomeação do administrador judicial.

Resulta do exposto que a situação de incumprimento do pagamento dos tributos, deve-se essencialmente a fatores externos à sociedade, sendo que as decisões referentes à área financeira e de tesouraria não estavam na disponibilidade do oponente podendo afirmar-se que a conduta dos administradores não contribuiu para a falta de pagamento da dívida tributária, ao invés, tentaram a recuperação económica e financeira da sociedade desenvolvendo esforços no sentido de evitar a sua insolvência, visando o cumprimento das suas obrigações.

Importa referir que relativamente a esta matéria e a este oponente, com conclusões semelhantes às dos presentes autos foi já proferido Acórdão pelo STA de 08/11/2023 no proc. 0709/14.1BEALM e em 20/12/2023 no proc. 0722/14.9BEALM (disponíveis em www.dgsi.pt), cujo entendimento jurisprudencial seguiremos de perto por concordarmos com o seu teor, com as necessárias adaptações, e que de seguida se transcreve:

3 Daí que importe analisar os termos como a jurisprudência e a doutrina têm enquadrado a questão da responsabilidade dos administradores e gerentes à luz do disposto na alínea b) do nº1 do artigo 24º da LGT, de modo a melhor interpretar o disposto no acórdão recorrido.

1.1.14 Como se sabe, os quadros legais da questão da responsabilidade dos administradores e gerentes têm sofrido alterações, mas para este efeito importa apenas considerar as diferenças entre o disposto no artigo 24º da LGT e o disposto no artigo 13º do revogado CPT, atento que alguma da jurisprudência citada (designadamente no acórdão recorrido) tem subjacente o quadro jurídico deste último preceito legal.

1.1.15 Assim, enquanto no artigo 13º do CPT o legislador estabeleceu um presunção juris tantum quanto à verificação dos pressupostos da responsabilidade tributária, fazendo recaír sobre os gerentes e administradores o ónus de prova que não praticaram qualquer acto ilícito, culposo e causal da insuficiência do património da sociedade (Cfr. neste sentido, Paulo de Pitta e Cunha e Jorge Costa Santos, in “Responsabilidade Tributária dos Administradores ou Gerentes”, LEX, 1999,pág. 93.), no artigo 24º da LGT o legislador distinguiu duas situações de responsabilidade tributária: (i) A primeira, em que o facto constitutivo se verificou no período de exercício do cargo de administrador/gerente ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, em que está em causa a culpa pela insuficiência patrimonial da devedora, cujo ónus de prova recai sobre a Fazenda Pública; (ii) A segunda, em que o prazo legal de pagamento ou entrega terminou no período do exercício do cargo, e recai sobre o administrador/gerente o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento.

1.1.16 Dado que no caso dos autos estamos perante a segunda situação, configurada na alínea b) do nº1 do artigo 24º da LGT, importa analisar em que termos tem a jurisprudência e doutrina interpretado o âmbito da responsabilidade dos administradores e gerentes à luz desta norma.

1.1.17 Na doutrina, Sérgio Vasques, refere a este propósito que «ao impor ao gestor o ónus de provar que “não lhe foi imputável a falta de pagamento” o que se lhe exige, afinal, é que demonstre que não foi por culpa sua que o património da empresa se tornou insuficiente para satisfazer a dívida tributária» (Manual de Direito Fiscal, 2ª edição, pág. 407) e que «A ilicitude está, numa e outra disposições, não na mera falta de pagamento, mas na violação das normas dirigidas à protecção dos credores da empresa. E, numa e outra disposições, essa violação haverá de ser culposa também. Só assim faz sentido o conjunto do art. 24.º» (in “A Responsabilidade dos Gestores na Lei Geral Tributária”, Fiscalidade, nº1(Jan.2000), pág.47-66).

Por sua vez, António Lima Guerreiro (in “LGT Anotada”, Rei dos Livros, pág.143) considera que «o fundamento da falta de culpa no não pagamento que o administrador ou gerente tem de provar é a insuficiência dos recursos que administre para o efeito, sem prejuízo de a administração fiscal poder provar que essa insuficiência do património se deve ao próprio responsável subsidiário, caso em que se mantém a responsabilidade subsidiária» (Para este Autor, se a mesma pessoa tiver desempenhado funções de administração ou gerência simultaneamente nos momentos do facto gerador e do termo do prazo de pagamento, a reversão pode fundamentar-se, cumulativamente, nas alíneas a) e b) do nº1 do artigo 24º da LGT.).

Também Joana Patrícia de Oliveira Santos (in “Responsabilidade dos Corpos sociais e Responsáveis técnicos”, Estudos de Direito Fiscal, pág. 35, FDUP, Almedina, 2006) perfilha o entendimento de que «o que está em causa na al.b) do artigo 24º, ºn1, da LGT, é a prática de actos (ilícitos) pelo gestor, que, por sua vez, motivou a falta de pagamento da obrigação tributária, ou seja, a prática de actos que levaram a que o património da devedora originária se tornasse insuficiente para a satisfação da referida obrigação».

1.1.18 Na jurisprudência deste tribunal tem-se considerado que na elisão da presunção consagrada na alínea b) do nº1 do artigo 24º da LGT o administrador/gerente tem que demonstrar que “usou da diligência de um bónus pater familiae, não violando quaisquer regras de gestão (designadamente as do art. 32º da LGT e 64º do CSC)” ou “da diligência devida a um gestor criterioso, ordenado e empenhado na sustentabilidade da empresa”(acórdão de 20/06/2012, proc. 01013/11)., e que “O facto ilícito susceptível de fazer incorrer o gestor na responsabilidade prevista na alínea b) do nº 1 do artigo 24º da LGT não se consubstancia apenas na falta de pagamento da obrigação tributária, mas também numa actuação conducente à insuficiência do património da sociedade” (acórdão de 11/07/2012, proc. 0824/11) (Sobre este tema se pronunciaram igualmente os acórdãos de 29/09/2010, proc.0498/10, e de 14/02/2013, proc. 0648/12, mas sem contributos pertinentes para o caso dos autos.).

1.1.19 Na jurisprudência dos TCA’s, em que a matéria é mais vezes analisada (por em regra estar em causa matéria de facto), é entendimento de que recai sobre o administrador/gerente o ónus da prova sobre as diligências tomadas para cumprir a obrigação tributária ou as medidas tomadas para garantir esse pagamento, nomeadamente requerendo o seu pagamento em prestações, recorrendo a meios de financiamento ou apresentar a devedora à insolvência (cfr. acórdãos do TCA de 11/01/2013, proc. 844/12.0BEALM, de 20/12/2022, proc. 775/10.9BELRS) e de que «a insuficiência do património da sociedade devedora para satisfazer as dívidas exequendas não procedeu de culpa sua, ou seja, demonstrar que a sua atuação, enquanto gerente, não foi idónea, segundo um juízo de causalidade adequada, à ocorrência da insuficiência patrimonial» (ac. do TCA Norte de 27/10/2021, proc. 02921/06.8BEPRT), para além de que «Embora esta alínea b) se refira meramente a imputação, e não a culpa, a jurisprudência tem vindo a interpretá-la no sentido de que é sempre exigível a culpa do gestor, entendida esta como a inobservância ou violação de uma regra de conduta previamente estabelecida” (ac. do TCA Norte de 29/10/2009, proc. 00228/07.2BEBRG).

1.1.20 Da interpretação que a doutrina e a jurisprudência fazem sobre os termos da responsabilidade dos administradores e gerentes à luz do disposto na alínea b) do nº1 do artigo 24º da LGT, resulta que o apuramento dessa responsabilidade tem subjacente o juízo de culpa pela falta de pagamento da obrigação tributária, o qual pode ser afastado se comprovarem que efetuaram as diligências que se lhe impunham em razão do exercício de tais funções (diligência devida a um gestor criterioso - art. 64º do Código das Sociedades Comerciais e art.32º da LGT) e tomaram todas as medidas para acautelar os interesses dos credores, designadamente o credor tributário.

1.1.21 Ora, que relevância tem neste âmbito a medida da apresentação da devedora à insolvência? Para Rui Duarte Morais, num apontamento a que aderimos, «A questão que nos interessa aqui considerar coloca-se quando as disponibilidades de tesouraria não existem ou não são suficientes para integral pagamento das dívidas de imposto vencidas. Em tal situação, a obrigação legal que impende sobre os titulares dos órgãos executivos (gerentes, administradores, etc.) é a de apresentar a sociedade (a pessoa coletiva, melhor dizendo) à insolvência. Tal obrigação decorre, desde logo, do disposto no art. 18.º, n.º 1 do CIRE, do dever de apresentação à insolvência». – Rui Duarte Morais, in “INSOLVÊNCIA DA SOCIEDADE E RESPONSABILIDADE FISCAL DOS SEUS ADMINISTRADORES – ALGUMAS QUESTÕES - REVISTA ELECTRÓNICA DE FISCALIDADE DA AFP (2019) ANO I – NÚMERO 2.

1.1.22 Ou seja, exige-se ao administrador a apresentação da sociedade (pessoa coletiva) à insolvência quando a devedora se encontre numa situação de impossibilidade de cumprir de uma forma geral as suas obrigações vencidas – artigo 3º, nº1, do CIRE.

(…)

1.2.1 Com vimos supra, no acórdão recorrido o TCA considerou que o Requerente, na qualidade de administrador da devedora originária, «não garantiu o cumprimento do crédito tributário exequendo, no decurso do prazo limite de pagamento voluntário» e «não requereu, atempadamente, a insolvência da sociedade devedora originária» e que «Não existem circunstâncias exógenas que justifiquem o incumprimento do crédito tributário». Para depois concluir que «O que sucedeu, no caso, foram um conjunto de decisões gestionárias, nas quais o recorrido participou, como membro do conselho de administração da sociedade devedora originária, que resultaram na oneração do património da mesma e na superação do activo pelo passivo, sem que o recorrido, enquanto gerente da sociedade tenha logrado assegurar o cumprimento da dívida exequenda».

1.2.2 Como referimos supra em rodapé, o acórdão recorrido limita-se a proferir afirmações genéricas sem ter formulado qualquer análise crítica da prova fixada no probatório, motivo pelo qual as referidas afirmações, salvo o devido respeito, ficam sem conteúdo palpável. Das mesmas extrai-se apenas que a situação da devedora originária era deficitária (balanço) e que esta situação resultou da gestão das operações realizadas pelo grupo empresarial em Angola, o que terá criado problemas de tesouraria.

1.2.3 Ora, salvo melhor opinião, tal fundamento não pode constituir a base do juízo de culpa sobre a responsabilidade dos administradores e gerentes, tal como a doutrina e a jurisprudência o têm enunciado, á luz do disposto no artigo 24º da LGT, uma vez que contende com um juízo sobre as capacidades do gestor e com o natural risco da atividade empresarial, e não com a violação dos seus deveres de gestor criterioso e prudente.

1.2.4 Por outro lado de tais afirmações proferidas no acórdão recorrido também não parece resultar que a falta de pagamento da dívida tenha ocorrido por insuficiência patrimonial da devedora originária (que é diversa de incapacidade de pagamento pontual das dívidas) e que relativamente a esta situação tenha sido formulado pelo TCA um juízo de censura sobre a conduta do Recorrente (Ainda que a propósito da questão da “violação do princípio do inquisitório por parte da AT” se tenha feito constar, a nosso ver descontextualizada da questão aprecianda, que «Dos elementos recolhidos no mesmo resulta que o oponente, enquanto gerente da sociedade, não providenciou pelo cumprimento do crédito tributário. Os alegados factores exógenos, consistentes nas dificuldades da operação em Angola ou na outorga de um contrato de confirming com a Banca não logram ilidir a culpa no não pagamento da dívida, dado que o oponente, enquanto gerente, participou na tomada das decisões da sociedade e anuiu na falta de liquidez e na falta de cumprimento do crédito exequendo».).

1.2.5 Ou seja, e salvo melhor opinião, afigura-se-nos que os fundamentos invocados no acórdão recorrido não são de molde a justificar a solução perfilhada no sentido de concluir pela responsabilidade tributária do Recorrente pela dívida revertida, por não ter logrado ilidir a presunção de culpa, motivo pelo qual entendemos que se impõe a sua revogação e confirmação do julgado na 1ª instância.”. (fim de citação).

Atento o exposto consideramos que no caso em apreço, o oponente/recorrido logrou afastar a presunção de culpa vertida na alínea b) do nº 1 do art. 24º da LGT, sendo parte ilegítima da execução. A sentença recorrida que assim também entendeu, não merece qualquer censura.

Perante o exposto entendemos ser de negar provimento ao recurso mantendo-se a sentença recorrida.


* *

V- DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.


Lisboa, 7 de novembro de 2024

Luisa Soares

Susana Barreto

Filipe Carvalho das Neves