Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:799/08.6BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:06/09/2022
Relator:VITAL LOPES
Descritores:IRS
REPORTE DE PREJUÍZOS
DECLARAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO
LIQUIDAÇÃO DE ANOS ULTERIORES
PRETERIÇÃO DE FORMALIDADES
Sumário:I - Os prejuízos fiscais apurados em determinado exercício são deduzidos aos lucros tributáveis, havendo-os, de um ou mais exercícios posteriores (art.º 47/1 CIRC e 32.º do CIRS);
II - Quando se efectuarem correcções aos prejuízos fiscais declarados pelo sujeito passivo, devem alterar-se, em conformidade, as deduções efectuadas (art.º 47/4 CIRC).
III - Se a correcção dos prejuízos fiscais resultar de declaração de substituição apresentada pelo próprio contribuinte, a correcção das deduções efectuadas nos exercícios posteriores sendo embora obrigatória para a AT, não deixa de ser oficiosa.
IV - Como assim, não está abrangida pela dispensa de audição prevista no art.º 60/2 da LGT, nem a liquidação correctiva prescinde de adequada fundamentação, que permita apreender as razões jurídicas da correcção das deduções e respectiva quantificação (art.º 77/2 LGT).
V - Não é de conhecer, em substituição, da questão omitida na sentença recorrida, se tal questão (embora inquine a sentença de nulidade parcial) se mostrar prejudicada em vista da solução dada ao litígio na apelação.
VI - Tal é o caso se o vício de que não se conheceu na sentença é unicamente susceptível de inquinar a validade das decisões de reclamação graciosa e de recurso hierárquico, mas não da liquidação objecto desses procedimentos de 2.º grau, liquidação essa que o tribunal de recurso anula por vícios de forma por falta de fundamentação e preterição da audição prévia (revogando a sentença recorrida que em sentido diverso decidira estas questões).
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL


I. RELATÓRIO


B…, veio interpor o presente recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou improcedente a impugnação deduzida contra o despacho de indeferimento do recurso hierárquico interposto da liquidação adicional de IRS do ano de 2004, no montante global de € 78.869,26, alegando para tanto o seguinte:
«
I. A A.T. não teve em conta a declaração de IRS/2004 apresentada pelo contribuinte relativo a esse ano-2004 (vide artigo 1 e 2 da Impugnação que aqui se dão por reproduzidos para todos os legais efeitos ) e ignorou a declaração de substituição do IRS relativa ao ano de 2004 (vide artigo 4º, 5º, 6º, 7º e segs e artigos 15º, 16º e 17º da reclamação graciosa que aqui também se dão por reproduzidos para todos os legais efeitos.), razão pela qual foram assim violados os artigo 65º e 66º do CIRS.

II. Na verdade a determinação do rendimento colectável é feita em primeira linha com base na declaração de sujeito passivo e a A.T. não cumpriu o dever de notificação e fundamentação daquele acto de alteração do rendimento colectável nos termos dos artigos 65º, 66º do CIRS e como o obriga este último preceito.

III. Quanto às questões colocadas, a Mª Juiz de Direito não se pronuncia em concreto, pelo que ocorreu uma omissão de prenuncia e violou ainda o preceituado nos artigos 65º e 66º, a CIRS e como tal a sua Douta Sentença é Nula por omissão de pronúncia nos termos do artigo artigos 668º nº 1 alínea b) e d) da CPC, atualmente artigo 615º nº 1 alínea b) e d) da CPC, nulidade essa que aqui se invoca

IV. Mais, não deu a Mª Juiz como provado que o contribuinte entregou a declaração de IRS de 2004 e a declaração de substituição relativa ao IRS/2004 e que a A.T. e também não teve em conta o que aí era referido. Razão pela qual, deve ser aditado aos factos provados que o contribuinte entregou declaração de substituição relativa ao IRS de 2004, a qual foi apreciada pela A.T.

V. A Mª Juíza aderiu na sua totalidade á justificação da AT, formulada a qual se fundamenta numa declaração de 2002, mas omite e não se pronuncia sobre a relevância dos restantes factos alegados pelos impugnantes aqui recorrentes, e desvaloriza dois Direitos fundamentais, a saber o direito de audição e o direito a ter conhecimento da fundamentação dos Actos que o podem afetar.

VI. Os contribuintes não são juristas e muito menos Fiscalistas razão pela qual o respeito por tais Princípios e Direitos são essenciais ao exercício dos seus direitos e com o devido respeito que é muito, o Mº Juiz ignora por completo a declaração do IRS de 2004 e a declaração de substituição do IRS 2004 aderindo a tese da A.T., que para efeito da liquidação do IRS 2004, teve por base a declaração de IRS/2002 o que sempre foi referido pelo recorrente (vide artigos 7º e 8º que aqui se dão por reproduzidos para todos os legais efeitos.). Sendo que conforme resulta dos factos provados, nomeadamente da informação referida no facto 20 (pág. 6 da Sentença) a Informação de 11/09/2007, explica a complexidade que levou a liquidação do IRS de 2004.

VII. Tal complexidade, não consegue nem podia afastar a aplicação do caso aos autos de dois instrumentos fundamentais:- o Direito da audição prévia, ou seja, o direito de participação dos contribuintes e o - Dever da fundamentação dos Actos de facto e de Direito-

VIII. A Mª Juíza “ a que “ entende que não foram violados tais direitos e deveres e que não foram violados os artigos 267º, nº 5 da Constituição, 8º da C P A , 54º nº 3 e 60º da L G T, 45º da C P P T, 100º A 103º C P A, porque a liquidação do IRS de 2004, teve origem na declaração relativa ao IRS de 2002, conforme resulta do artigo 47º e segs., aplicável por força do 32º do CIRS, sendo que na nossa opinião foram violados tais preceitos na sentença recorrida o que aqui se conclui e se invoca

IX. A Mª Juíza refere que no caso em apreço não existe o direito da audição aderindo à complexa tese de liquidação do IRS 2004 que resultou do IRS de 2002, ignorando por completo quer as declarações efetuadas pelo contribuinte relativo ao IRS de 2004, ou seja aderindo de facto e de Direito à tese da A.T. que violou de forma grosseira o direito da audição prévia, a Mª Juíza afirma no fundo que as contas estão bem feitas, ou de outro modo, o imposto foi bem liquidado, logo não há direito ao exercício da participação do contribuinte através do exercício do Direito e Audição para exercer no fundo a sua defesa e quando este a lavra nomeadamente pela declaração de substituição do IRS de 2004 esta é completamente ignorada, o que salvo melhor e douta opinião de Vossas excelências não está correto

X. Os contribuintes apresentaram a declaração de rendimento anual, vindo a ser fiscalizados no que respeita ao ano de 2002, relativamente ao qual vieram a apresentar declaração de substituição e, não obstante não terem recebido qualquer notificação no que concerne ao ano de 2004, vieram também a ser notificados de uma liquidação adicional deste ano de 2004, como melhor se desenvolveu nos artigos nos artigos 1.º a 5.º da reclamação graciosa que aqui se dá por reproduzida, sendo certo que como resulta dos autos a Administração Fiscal procedeu nos termos do artigo 65.º do CIRS à alteração dos elementos declarados pelos contribuintes, relativamente ao ano de 2004, sem que os tivesse notificado dessa alteração, como impõe o artigo 66.º do mesmo normativo legal, conjugado com o n.º 6 do artigo 77.º da LGT e artigo 36.º do CPPT, sendo por isso tal decisão ilegal, repercutindo-se esta, posteriormente no subsequente acto de liquidação.

XI. Tendo em atenção o preceituado naqueles normativos legais a Administração Tributária não podia proceder, como procedeu, à subsequente liquidação adicional do imposto sem prévia notificação, daquelas alterações, dado que, antes desta, aquela decisão de alteração é ineficaz, como referem os citados normativos legais, isto é, (art.º 65.º n.ºl do CIRS, art.º 77.º n.º 6 da LGT e art.º 36º n.º1 do CPPT). Na verdade, de harmonia com o disposto no artigo 66.º do CIRS, os actos de alteração dos elementos declarados pelos contribuintes, previstos no artigo 65.º do mesmo diploma legal, como têm que ser sempre notificados aos sujeitos passivos com a respectiva fundamentação, se a Administração Fiscal efectua as respectivas alterações não notificando os contribuintes, como a lei impõe, o respectivo acto é ilegal e como tal deve ser anulado.

XII. Aliás, a própria Constituição da República Portuguesa refere no seu artigo 268.º n.º 3, que os actos que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos, carecem de fundamentação a notificar aos interessados, como será o caso de decisões que alteram a situação tributária dos contribuintes, criando-lhe e/ou ampliando-lhe encargos. Porém, não obstante o referido na impugnação, no que respeita à falta de notificação das alterações ao rendimento colectável, vieram os contribuintes a ser notificados de uma liquidação adicional (doc. n.º 3), sem que tivessem sido notificados para exercerem o direito de audição prévia, como impõe o artigo 60º n.º 2 da LGT, dado que a aludida liquidação adicional, não teve por base a declaração dos contribuintes, como melhor se desenvolveu nos artigos 6.º a 11.º da
reclamação graciosa, que aqui se dão aqui por inteiramente reproduzidos.

XIII. A falta de audição prévia dos contribuintes, sendo ela obrigatória, como é o caso, constitui vício de forma do procedimento tributário, devendo por isso a respectiva liquidação ser anulada, o que aqui se pede, já que a preterição do direito de audição, cortou aos interessados a possibilidade de se pronunciarem sobre questões relevantes, para a determinação da decisão final e de apresentarem elementos novos, tais como os mencionados na declaração de substituição entregue com a reclamação graciosa ao abrigo da subalínea II da alínea b) do n.º 3 do artigo 59.º do CPPT, conjugado com o n.º 4 do mesmo preceito legal.

i. A Administração Fiscal e a Mª Juiz defendem, a nosso ver erradamente, que não era de fazer a audição prévia aos contribuintes antes da liquidação adicional em causa, relativa ao ano de 2004, dado que a mesma teve por base uma declaração de substituição respeitante ao ano de 2002, mas a dispensa do direito de audição, com base na declaração do contribuinte a que se refere o nº. 2 do art.º 60.º da LGT, deve ser interpretada com o alcance de apenas dispensar a audição quando a liquidação for efectuada em sintonia com a posição que decorre da declaração do contribuinte nos seus aspectos factuais e jurídicos, daí que, mesmo nos casos em que a liquidação seja elaborada com base nos elementos factuais constantes da declaração do contribuinte, o que não é o caso, (trata-se da declaração de 2002 e está em causa o exercício de 2004), mas com diferente enquadramento jurídico, não pode ser dispensada a audição do contribuinte antes de ser efectuada a liquidação. É este o entendimento de Jorge Lopes de Sousa e perfilhado também pelo STA, nomeadamente nos acórdãos de 14-05-03,
recurso n.º 317/03, AD n.º 508, pág.567 e de 16- 6-2004, recurso n.º 1877/03.

ii. Concluindo-se assim, que era obrigatória a audição dos contribuintes e não tendo a mesma sido efectuada, como resulta dos autos, houve preterição de formalidade legal, do procedimento de liquidação do imposto e juros compensatórios, devendo a mesma ser anulada (artigos 135.º, 136.º da CPA, aqui aplicados por força da alínea c) do artigo 2,º da LGT.

XIV. O ora recorrente, alegou também a falta da pronúncia e a injustiça da liquidação ( vide artigo 25º a 29º da impugnação que aqui também se dão por reproduzidos para todos os legais efeitos) tendo alegado em síntese que tem direito à pronúncia nos termos do artigo 56º LGT e que a A.T. entendeu não se pronunciar acerca da declaração da substituição do IRS 2004 apresentado pelo contribuinte juntamente com na reclamação graciosa, que aqui se dá por reproduzida, nem sobre a injustiça da liquidada conforme se alegou nos artigos 12º a 17º daquela reclamação que aqui se dá por reproduzida, sendo certo que a A.T. deve atuar nos exercícios das suas funções, com respeito pelos princípios da Igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé.

XV. O Mº Juiz na sua Douta Sentença, salvo melhor análise e Douta opinião não se pronunciou sobre a falta da pronúncia acerca da declaração da substituição do ano de 2004, junta à reclamação graciosa e que aqui se dá por integralmente reproduzida.

XVI. Face ao exposto, se invoca a nulidade da sentença nos termos legais por falta de pronuncia (nos termos dos artigos 668º nº 1 alínea b) e d) da CPC, atualmente artigo 615º nº 1 alínea b) e d) da CPC. e artigo 2º da CPPT).

XVII. O recorrente invocou também a falta de fundamentação do acto da liquidação conforme melhor se desenvolveu nos artigos 18º a 26º e 21º a 27º da referida reclamação graciosa e recurso hierárquico que aqui se dão por reproduzidos para todos os legais efeitos referindo que a A.T. não indica as razões ou motivos em que assenta a conclusão das alterações de rendimento colectável que levaram à liquidação adicional ou seja a liquidação não indica a motivação do acto, isto é as razões nas quais a decisão se baseia e a justificação, isto é, a exposição dos pressupostos de facto e de direito (vide artigos 18º a 26º e 21º a 27º da reclamação graciosa e recurso hierárquico que aqui se dão por integralmente reproduzidos)

XVIII. De acordo com o 77º nº 1 e 2º da LGT o acto tributário tem Fundamentação de facto e fundamentos de Direito, são realidades distintas e no o caso em apreço, está provado que não foi efetuada tal fundamentação

XIX. Relativamente a esta questão a Mª juíza depois de referir os preceitos legais que consagram o dever da fundamentação, nomeadamente os artigos 268º nº 3 da CRP, 123º da CPA 77º nº1 da LGT, entende que na hipótese sub judice a liquidação em causa, foi efetuada com base nos documentos fornecidos pelo contribuinte as suas declarações de rendimento relativas ao ano de 2002, 2003 e 2004. Não refere todavia a Mª Juíza que a liquidação do IRS de 2004 não correspondeu à declaração apresentada pelo contribuinte, e que a declaração de substituição de 2004 foi completamente ignorada pela A.T.

XX. Conclui a Mª Juíza, que o acto da liquidação encontra-se fundamentada, ainda que de forma sucinta, ora tal não resulta dos Autos, razão pela qual a Mª Juíza violou o preceituado nos artigos atrás referidos e ainda 77º nº 1 e a da LGT, 268 nº3 da CRP e 123º da CPA Nestes termos e nos melhores de direito e sempre com o Mui Douto Suprimento de V. Exas., deve ser revogada a Douta Decisão, que julgou totalmente improcedente a presente impugnação e em conformidade ser substituída por outra que concedendo provimento ao presente recurso decida que as decisões que recaíram sobre a reclamação e recurso hierárquico são nulas, por falta de Pronúncia nos termos dos artigos 668º nº 1 alínea b) e d) da CPC, atualmente artigo 615º nº 1 alínea b) e d) da CPC.

E mesmo que assim não se entenda, deve o recurso proceder, já que a liquidação impugnada é ilegal por vício de preterição de formalidades legais, violação de Direito da audição prévia, injustiça da liquidação e falta da fundamentação devendo por isso ser anulada, o que se pede por violação dos artigos 65º, 66º de CIRS, 56º , 60º nº1 b) e nº 2 , alínea b e 77º nº1, 2 e 6 da LGT, artigo 36º nº 1 da CPPP.
Assim, se faça Justiça».

A Recorrida não apresentou contra-alegações.

O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu mui douto parecer concluindo que o recurso não merece provimento.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Assim, analisadas as conclusões das alegações do recurso, são estas as questões que importa decidir: (i) se a sentença está inquinada de nulidade por omissão de pronúncia; (ii) se a sentença incorreu em erro de julgamento, de facto e de direito, ao concluir que não foi preterido o dever de fundamentação e de audição prévia no procedimento da liquidação impugnada.
***

III. FUNDAMENTAÇÃO
A) OS FACTOS
Na sentença recorrida deixou-se factualmente consignado:
«
DOS FACTOS PROVADOS

Compulsados os autos e analisada a prova documental apresentada, encontram-se assentes, por provados, os seguintes factos com interesse para a decisão:

1. Em 30/04/2003, os Impugnantes apresentaram a declaração de IRS referente ao exercício de 2002 (cfr. doc. junto a fls. 42 – linha 2 - do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

2. A declaração identificada no ponto anterior deu origem à liquidação nº 3855030 (cfr. doc. junto a fls. 42 – linha 2 – do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

3. Na liquidação nº 5113855030, identificada no ponto anterior, foram apuradas perdas a reportar no montante de € 413.035,96 e apurado um prejuízo fiscal no montante de 315.542,83 – campo 435 do Anexo C (cfr. doc. junto a fls. 46 a 48 do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

4. Em 17/08/2006 foi apresentada a declaração modelo 3 de IRS, de substituição, do ano de 2002, a qual deu origem à liquidação nº 5534552703 de 11/11/2006 (cfr. doc. junto a fls. 42 – linhas 4 e 5 - do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);
5. A declaração identificada no ponto anterior apresentava no Anexo C, um lucro tributável no montante de € 468.463,41, tendo dado origem à liquidação nº 5534552703, com perdas a recuperar no montante de € 97.493,13, sem quaisquer perdas a reportar (cfr. docs. juntos a fls. 29 e 49 do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

6. Em data que se desconhece concretamente, os impugnantes reagiram contra a liquidação nº 5534552703, apresentando reclamação graciosa e nova declaração de substituição apresentada em 28/12/2006 (cfr. doc. junto a fls. 42 – linha 5 -, 43 a 45 do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

7. A Reclamação graciosa identificada no ponto anterior foi deferida parcialmente, em 26/02/2007 (cfr. doc. junto a fls. 43 a 45 do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

8. Em 28/02/2007, na sequência do deferimento parcial da reclamação dos Impugnantes foi elaborado um documento único de correcção nº 658456 – D0041 – que originou a liquidação nº 5330038213 (cfr. doc. junto a fls. 42 – linha 6 - do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

9. Na liquidação nº 5330038213, identificada no ponto anterior, não foram apuradas quaisquer perdas a reportar, tendo sido corrigido o lucro tributável no montante de € 468.463,41 para o montante de € 455.951,68, com perdas a recuperar no montante de €
97.493,13. (cfr. docs. juntos a fls. 30, 50 a 52 do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

10. Em 2004-10-11 os Impugnantes procederam à entrega da declaração modelo 3 de IRS do exercício de 2003, tendo no respectivo Anexo C, apurado um prejuízo fiscal no montante de € 51.008,52 – campo 435 (cfr. docs. junto a fls. 42 – linha 7 – e 53 do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

11. A declaração identificada no ponto anterior deu origem à liquidação nº 5134171771 de 13/10/2004 da qual constavam perdas a reportar de € 464.044,48 (cfr. doc. junto a fls. 42 – linha 7 – e 55 do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

12. Em 21/07/2005, os impugnantes procederam à entrega da declaração modelo 3 de IRS para o exercício de 2004, tendo no seu Anexo C apurado um lucro tributável no montante de € 259.861,54 – campo 436 - (cfr. doc. junto a fls. 42 – linha 9 – e 54 do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

13. A declaração identificada no ponto anterior deu origem à liquidação com o nº 5134152725, onde foi apurada perdas a reportar no montante de € 204.182,94 (cfr. doc. junto a fls. 42 – linha 9 – e 56 do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

14. Em 2006/11/11 foi efectuada a liquidação adicional de IRS do ano de 2003 com o nº 5134553881 onde foi corrigido o montante inicial de perdas a reportar, de € 464.06,48 para € 51.008,52 (cfr. doc. junto a fls. 42 – linha 8 – e 57 do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

15. Em 2006/11/11 foi efectuada a liquidação adicional de IRS do ano de 2004 com o nº 5134554407 onde foi corrigido o montante inicial de perdas a reportar, de € 204.182,94, tendo sido apuradas perdas a recuperar no montante de € 51.008,52, não resultando quaisquer perdas a reportar desse mesmo ano (cfr. doc. junto a fls. 58 do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

16. Em 11/11/2006 foi emitida pela Direcção Geral dos Impostos a Liquidação nº 2006 5004554407, referente ao IRS de 2004 dos Impugnantes, na qual foi apurado imposto no montante de € 81.896,13 (cfr. doc. junto a fls. 23 dos autos);

17. Da liquidação identificada no ponto anterior constam perdas a recuperar no montante de € 51.008,52 (cfr. doc. junto a fls. 23 dos autos e fls. 19 do processo instrutor referente à impugnação);

18. Em 14/11/2006 foi emitida a compensação nº 2006 00009887428 referente aos Impugnantes e ao exercício de 2004 de IRS da qual resultou um imposto a pagar de € 78.869,26 (cfr. doc. junto a fls. 24 dos autos);

19. Em 15/03/2007 foi apresentado pelos Impugnantes um articulado denominado “Reclamação Graciosa” da liquidação adicional de IRS identificada no ponto 1 (cfr. doc. junto a fls. 2 do processo instrutor junto aos autos – Reclamação graciosa);

20. Em 11/09/2007, foi elaborada uma Informação, na Divisão de Justiça Tributária de Setúbal, da qual consta o seguinte:

“(…) III – ALEGAÇÕES 1. Os reclamantes alegam, em resumo útil, que:
2. “(…) apresentaram a sua declaração de rendimentos respeitante àquele ano de 2004, tendo-lhe sido feita pelos serviços da Administração Fiscal a respectiva liquidação com o apuramento do imposto.” 3. “Os contribuintes vieram a apresentar declaração de substituição corrigida, no que respeita aos custos, e vendas, relativamente àquele exercício de 2002, nada tendo feito no que concerne ao ano de 2004”. 4. “Mas, não obstante os contribuintes não terem recebido qualquer notificação no que respeita ao ano de 2004, vieram também a ser notificados, na mesma data, de uma liquidação adicional, relativa àquele ano, do valor referido no inicio desta reclamação, que é manifestamente exagerado e desproporcionado com a realidade em causa, certamente por não havido por parte dos contribuintes um cuidado apuramento dos custos.” .5. “Estranham os contribuintes que tendo a Administração Fiscal procedido oficiosamente a uma liquidação adicional, que não teve por base a declaração dos contribuintes (artigo 60º, nº 2 da LGT), não tenham os mesmos contribuintes sido notificados para exercerem o direito de audição prévia (…)”. (…) 9. “Mesmo que não se entenda que a liquidação deve ser anulada por falta de audiência prévia (…) sempre se dirá que o legislador para casos desta natureza tenha (…) facultado à Administração Fiscal, rever oficiosamente o apuramento do lucro tributável, que se apresente, como é o caso, manifestamente desproporcionado, em termos de criar sérias perturbações na vida do contribuinte.”.
10. “Da declaração de substituição ora apresentada que acompanha a presente reclamação ressaltam alterações em termos de custos que foram possíveis apurar, mas que não reflectem, de modo algum o total dos encargos suportados pela empresa para produzir os serviços declarados (…)” 11. “(…) A Administração Tributária pode e deve rever todo o processo de liquidação, reajustando-o em termos de associação de rendimentos e custos, (…) sendo que, se porventura se entender que se não deve rever a situação na globalidade, que ao menos se considerem os custos ora apresentados, como resulta da nova declaração de substituição, que acompanha a presente
reclamação (…)”

(…) IV – FACTOS Em cumprimento do Despacho nº DI200601725 da DSIT I desta Direcção de Finanças, visando a consulta, recolha e cruzamento de elementos, do ano de 2002, o ora reclamante foi notificado para apresentar diversos elementos contabilísticos no âmbito da actividade exercida, CAE 45211 – construção de edifícios, e em 17/08/2006 apresentou declaração modelo 3 de IRS de substituição, do ano de 2002, (vide anexo 2) a qual deu origem à liquidação nº 5534552703. O sujeito passivo reagiu contra a referida liquidação, apresentando reclamação graciosa, a qual foi apreciada por este órgão, tendo sido objecto de deferimento parcial, em 26/02/2007 (vide anexo 3 a esta informação), dando origem à recolha do documento único de correcção nº 658456, em 2007-02-28. Donde resultou a liquidação nº 5330038213 (vide anexo 2), a qual foi notificada ao ora reclamante em 2007-03-19. Na liquidação nº 5113855030, resultante da declaração de IRS, modelo 3, entregue pelo ora reclamante em 2003-04-30, foram apuradas perdas a reportar no montante de € 413.035,96 (na mesma declaração foi apurado um prejuízo fiscal no montante de 315.542,83 – campo 435) – vide anexo 4.

Diversamente, na supra referida declaração de substituição entregue em 17-08-07, no anexo C à mesma, foi apurado um lucro tributável no montante de € 468.463,41, tendo dado origem à liquidação nº 5534552703, com perdas a recuperar no montante de € 97.493,13, sem quaisquer perdas a reportar (vide anexo 5). Assim, na liquidação nº 5330038213, resultante do supra referido deferimento parcial da reclamação graciosa nº 2160200604001648, não foram apuradas quaisquer perdas a reportar, tendo sido corrigido o lucro tributável no montante de € 468.463,41 para o montante de € 455.951,68 (vide anexo 6), com perdas a recuperar no montante de € 97.493,13. Em 2004-10-11 e em 2005-07-21, respectivamente, o ora reclamante entregou as declarações modelo 3 – IRS, com os respectivos anexos C, onde foi apurado um prejuízo fiscal no montante de € 51.008,52 (vide anexo 7) para o ano de 2003 e um lucro tributável no montante de € 259.861,54 para o ano de 2004 (vide anexo 8). Tais declarações deram origem às liquidações com os nºs 5134171771 e 5134152725, onde foram apuradas, respectivamente, perdas a reportar nos montantes de € 464.044,48 e 204.182,94 (vide anexos 9 e 10). Em 2006-11-11 foi efectuada a liquidação adicional de IRS do ano de 2003 (com o nº 5134553881) onde foi corrigido o montante inicial de perdas a reportar, de € 464.06,48 para € 51.008,52 (vide anexo 11) De igual modo, foi efectuada a liquidação adicional de IRS do ano de 2004 (com o nº 5134554407) onde foi corrigido o montante inicial de perdas a reportar, de € 204.182,94, tendo sido apuradas perdas a recuperar no montante de € 51.008,52 (vide anexo 12), não resultando quaisquer perdas a reportar desse mesmo ano.
V – APRECIAÇÃO DO PEDIDO a) Da alegada falta de notificação para o exercício do direito de audição Vêm alegar os ora reclamantes que, tendo entregue a respectiva declaração de IRS do ano de 2004, e tendo sido notificados da liquidação daí resultante, foram posteriormente notificados de uma liquidação adicional do mesmo ano de 2004, “que não teve por base a declaração dos contribuintes”, sem que os mesmos contribuintes tenham sido notificados para exercerem o direito de audição prévia. Ora vejamos: Conforme supra explanado, os ora reclamantes entregaram uma declaração de rendimentos – IRS – de substituição – referente ao ano de 2002, corrigindo a declaração modelo 3, anexo C, que inicialmente tinham entregue para o mesmo ano, em 2003-04-30, donde resultou a correcção de prejuízo fiscal no montante de € 315.542,83, para um lucro fiscal no montante de € 468.463,41, o qual foi posteriormente também objecto de correcção para o montante de € 455.353,12 resultante do deferimento parcial da reclamação nº 2160200604001648, em 26-02-2007 (vide anexo 3 a esta informação), dando origem à recolha do documento único de correcção nº 658456, em 2007-02-28, donde resultou a liquidação nº 5330038213 (vide anexo 6), a qual foi notificada ao ora reclamante em 2007-03-19, e consequentemente, as perdas a reportar nesse ano de 2002, que inicialmente tinham sido apuradas, foram objecto de correcção, donde resultou a inexistência de quaisquer perdas a reportar. Destarte, a liquidação resultante da declaração de rendimentos – IRS – do ano de 2004 entregue pelos contribuintes, onde foram apurados perdas no montante de € 204.182,94, foi objecto de correcção, na medida em que, mediante a supra referida correcção efectuada ao ano de 2002, onde foi apurado lucro tributável no montante de 455.353,12, ao invés de um prejuízo fiscal inicialmente declarado no montante de € 315.542,83, não resultaram quaisquer perdas a reportar no mesmo ano de 2002.
Assim, resulta claro que, a correcção oficiosa efectuada à liquidação nº 5134152725, do ano de 2004, e que deu origem à liquidação nº 5134554407, agora objecto de reclamação, teve a sua origem na declaração de substituição entregue pelos contribuintes em 2006-11-07, e no deferimento parcial à reclamação graciosa (nº 2160200604001648) do acto de liquidação resultante dessa mesma declaração, em 2007-02-26.
Ora, dispõe o art. 60º, nº 1, al. a), que é dispensada a audição no caso de a liquidação se efectuar com base na declaração do contribuinte, o que, no caso sub judice, conforme supra explanado, assim ocorreu, não se verificando qualquer preterição de formalidade legal, contrariamente ao alegado. b) da alegada falta de fundamentação. Dispõe o artigo 77º, nº 1, da Lei Geral Tributária, que “a decisão do procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.” Por outro lado, o nº 2 do mesmo artigo determina que “a fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumaria, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.” A fundamentação há-de ser expressa, através dum a exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão; clara, permitindo que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide; suficiente, possibilitando ao administrado ou contribuinte, um conhecimento concreto da motivação do acto, ou seja, as razões de facto e de direito que determinaram o órgão ou agente a actuar como actuou; e congruente, de modo a que a decisão constitua conclusão logica e necessária dos motivos invocados como sua justificação, envolvendo entre eles um juízo de adequação, não podendo existir contradição entre os fundamentos e a decisão. Assim, a fundamentação é um conceito relativo que varia em função do tipo legal de acto, visando responder às necessidades de esclarecimento do administrado, pelo que se deve, através dela, informá-lo do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto, permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática e por que motivo se decidiu num sentido e não noutro. Pelo que um acto está fundamentado sempre que o administrado, como destinatário normal, ficar devidamente esclarecido acerca das razões que o determinaram estando, consequentemente, habilitado a impugna-lo convenientemente, não tendo, todavia, a fundamentação de ser exaustiva mas acessível, no sentido de explícita. Cfr., por todos, o Ac. do STA de 26/05/2004, rec. 742/03. Ora, na hipótese sub judice, a liquidação em causa foi efectuada com base nos documentos fornecidos pelo contribuinte – as suas declarações de rendimentos relativas aos anos de 2002, 2003 e 2004, elementos que a Administração aceitou. Com efeito, a liquidação resultante da declaração de rendimentos – IRS – do ano de 2004 entregue pelos contribuintes, onde foram apurados perdas a reportar no montante de € 204.182,94, foi objecto de correcção, na medida em que, mediante a supra referida correcção efectuada ao ano de 2002, onde foi apurado um lucro tributável no montante de 455.353,12, ao invés de um prejuízo fiscal inicialmente declarado no montante de € 315.542,83, não resultaram quaisquer perdas a reportar no mesmo ano de 2004.
Assim, em termos de fundamentação do acto e dadas as expressas circunstâncias em que o mesmo foi praticado, parece-nos que a mesma apresenta-se suficiente – conceito relativo que é, nos apontados termos. (…)” (cfr. doc. junto a fls. 33 a 40 do processo instrutor – Reclamação graciosa);

21. Em 12/09/2007 foi proferido despacho no sentido de a informação identificada no ponto anterior ser considerada como projecto de decisão e como tal serem os Impugnantes notificados para exercerem o seu direito de audição prévia (cfr. doc. junto a fls. 33 do processo instrutor – Reclamação Graciosa);

22. Os impugnantes foram notificados para se pronunciarem sobre o projecto de decisão que recairia sobre a reclamação graciosa (cfr. doc. junto a fls. 59 do processo instrutor – Reclamação Graciosa);

23. Os impugnantes pronunciaram-se sobre o projecto de decisão, nos seguintes termos (cfr. doc. junto a fls.60 a 72 do processo instrutor – Reclamação Graciosa);

24. Em 25/09/2007 foi elaborada uma informação complementar da qual consta que os impugnantes não apresentaram elementos relevantes susceptíveis de alterar o projecto de decisão (cfr. doc. junto a fls. 76 a 79 do processo instrutor – Reclamação Graciosa);

25. Em 27/09/2007, foi proferido, sobre a informação identificada no ponto anterior, o seguinte despacho: “Considerando a informação dada pelos serviços, e tendo sido exercido o direito de audição pelo contribuinte, não trazendo, no entanto, elementos novos ao processo, torna-se definitivo o projecto de decisão e indefere-se o pedido, conforme proposto anteriormente (…)” (cfr. doc. junto a fls. 76 do processo instrutor – Reclamação Graciosa);

26. Em 07/11/2007 foi apresentado pelos Impugnantes um articulado, junto da Direcção de Finanças de Setúbal, denominado “Recurso hierárquico”, no qual é colocado em crise o despacho que recaiu sobre a Reclamação graciosa, e melhor identificado no ponto anterior (cfr. doc. junto a fls. não numeradas do processo de Recurso Hierárquico junto aos autos);

27. Em 07/05/2008, foi elaborada, na Direcção de Serviços de IRS, a Informação nº 914/08 da qual consta o seguinte:
“Vem B…, contribuinte n° 1…, interpor recurso hierárquico do despacho de indeferimento, proferido pelo Director Distrital de Finanças de Setúbal, por delegação, no processo de reclamação graciosa n° 4000331/07, instaurado junto do Serviço do Barreiro, relativo à liquidação de IRS nº 5004554407 de 11.11.2006, do ano de 2004. Cumpre informar:

OS FACTOS 1. Veio o contribuinte apresentar reclamação graciosa contra a liquidação correctiva acima identificada (ano 2004) com a seguinte fundamentação, referida de forma sucinta uma vez que a petição encontra-se junto aos autos. Assim, é alegada a falta de notificação para audição prévia antes da emissão do acto tributário, a injustiça da mesma face à manifesta desproporcionalidade com a realidade tributária do contribuinte e, ainda, a falta de fundamentação.2. Argumenta ter sido entregue, por solicitação dos SIT da Direcção de Finanças de Setúbal que realizavam uma análise incidente sobre o ano de 2002, os diversos elementos pedidos, nomeadamente a relação das escrituras de compra e venda realizadas em 2002, os dados da contabilidade e ainda, porque para tal foram "convidados", uma declaração de substituição respeitante ao IRS/2002, em que foram introduzidas alterações nos custos e nas vendas.
Entendem, por isso, ser incompreensível a emissão da liquidação correctiva do ano de 2004, sem que previamente tenha sido dado conhecimento do facto aos contribuintes. 3. A situação concreta pode descrever-se factualmente: Ano de 2002 - Apresentação da declaração de substituição para o ano de 2002, em Agosto de 2006, de que resulta Iiq. nº 5534552703. Esta é objecto de reclamação, com deferimento parcial em Fevereiro/07, pelo que é emitida a liquidação final nº 5330038213 de 05.03.07. – A liquidação n° 5534552703 (emitida em razão da declaração de substituição) apurou lucro tributável de 468.463,41€ e perdas a recuperar de 97.493,13 € (sendo que a 1ª liquidação de 2002 a partir da declaração de rendimentos entregue pelos SP's havia apurado perdas a reportar de 413.035 € e prejuízo fiscal de 315.542€). - A liquidação final de 2002, emitida após o deferimento parcial da reclamação, determinou menor lucro tributável (455.951,68€) e o mesmo valor de perdas a recuperar.
Ora, em razão da alteração introduzida no exercício de 2002, verificaram-se as alterações aos exercícios seguintes; daí que:
Ano de 2003 - Foi corrigida a liquidação emitida a partir da declaração de rendimentos apresentada pelo contribuinte, introduzindo-se correcção ao montante das perdas a reportar (reduzindo-se o mesmo substancialmente). Ano de 2004 – Pela mesma razão referida para o ano de 2003, também o 1º acto tributário de 2004, emitido a partir da declaração de rendimentos apresentada (liq. nº 5134152725) foi objecto de correcção de que resultou a liquidação ora controvertida; nessa 1ª liquidação havia sido apurado perdas a reportar de 204.182,94€. - Ora, a liquidação contestada nos presentes autos, identificada sob o nº 5134554407 de 11.11.2006, não foram apuradas quaisquer perdas a reportar e as perdas a recuperar foram apenas de 51.008,52€. 4. Em face da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação correctiva do IRS de 2004, foi proferido despacho de indeferimento, notificado ao sujeito passivo em 10.10.2007. 5. Não se conformando com o teor do despacho, vem o contribuinte recorrer hierarquicamente mediante petição com registo de entrada juntos dos serviços em 07.11.2007. Nesta o ora recorrente apresenta argumentação idêntica à já exposta na reclamação e aquando do exercício do direito de audição prévia, e que aqui se dá por reproduzida por razões de economia processual.

APRECIAÇÃO DO PEDIDO 1. O pedido é legal, o recorrente tem legitimidade e o recurso foi feito em tempo, nos termos dos artºs 80° e 65° da LGT e art. 66°, nº 2 do CPPT. 2. O acto tributário de 2004 ora contestado foi apurado tendo em atenção os elementos inscritos pelo contribuinte em sede da sua declaração de rendimentos. A correcção que na mesma foi introduzida refere-se à repercussão do apuramento concretizado relativamente ao ano de 2002 em face da apresentação, voluntária, da declaração de substituição. 3. A correlação entre ambos os factos encontra-se perfeitamente expressa em sede da apreciação concretizada na reclamação graciosa. É óbvio que, se relativamente ao exercício de 2002, após liquidação final, não se apura qualquer prejuízo fiscal e as perdas a recuperar são de 97,493,13€, que a repercussão contabilística ir-se-á manifestar nos exercícios seguintes; sendo esta a factualidade que se verifica no caso concreto. 4. O apuramento da matéria tributável concretiza-se com base nos elementos declarados pelos contribuintes, vigorando a presunção de boa fé e veracidade, e noutros elementos de que os serviços disponham (artº 65° CIRS, anterior artº 66°). Ora, era do conhecimento dos serviços a alteração concretizada em sede das perdas a recuperar e a reportar, pelo que se limitaram a reflectir este facto, introduzindo essa correcção através da concretização da respectiva liquidação de acordo com as regras de liquidação constantes do CIRS ao tempo dos factos tributários (note-se que a alteração concreta inicial, tem na sua base a declaração de substituição apresentada em exercício antecedente). 5. Se existe um desfasamento (relembre-se que o exercício controvertido é de 2004) entre o apuramento concretizado e a realidade tributária do recorrente, razão pela qual o mesmo suscita a consideração de determinados elementos por si não inscritos à data da apresentação da declaração de rendimentos, a verdade é que, a referida presunção de boa fé e veracidade de que gozam os elementos apresentados pelos contribuintes, levam a que a Administração Fiscal presuma a inscrição da totalidade dos proveitos e dos custos, por forma a possibilitar uma correcta tributação, de acordo com as normas legais acessíveis ao conhecimento de todos e traduzindo a realidade contributiva real dos contribuintes. 6. Se a correcção introduzida (e ora contestada) tem na sua base a apresentação de elementos antes não declarados pelo contribuinte relativamente a 2002 e se, relativamente ao ano de 2004 mais não fizeram os serviços que manter os custos e os proveitos inscritos pelo próprio, não deixa de ser curioso que apenas perante o apuramento final, o contribuinte venha a contabilizar mais ou menos prejuízos como tendo sido "esquecidos", ou não, de serem inscritos. 7. Por outro lado, em sede de reclamação não são apresentados fundamentos, nem elementos de prova, que consubstanciem a mera alegação formulada de tributação injusta. 8. Refira-se ainda, que do exercício direito de audição visa a apresentação de argumentos, devidamente fundamentados, de forma a contraditar uma primeira análise que tenha sido formulada sobre determinada situação concreta. Se, ao invés, apenas se reitera o que já antes fora explicitado ou, então, se apenas são tecidas meras alegações, sem substância probatória, a decisão final não poderá ser distinta da que já fora explicitada no projecto de decisão. 9. Mostra-se, pois, correcta, legal e bem explícita a apreciação concretizada em sede da reclamação graciosa cujo despacho é ora objecto de recurso hierárquico. 10. Pelo exposto parece ser de indeferir o presente recurso hierárquico. De acordo com as instruções divulgadas pela Circular n° 13/99, de 08 de Julho, é dispensada a notificação do recorrente, nos termos e para efeitos do disposto no art.º 60° da LGT, uma vez que este já teve oportunidade de se pronunciar anteriormente no âmbito do processo de reclamação e não são invocados factos novos que não tenham sido levados ao seu conhecimento. (…)” (cfr. doc. junto a fls. 17 a 21 dos autos);

28. Em 20/06/2008, foi proferido pela Directora de Serviços do IRS, no âmbito da Informação nº 914/08, o seguinte despacho: “Concordo, pelo que com base nos fundamentos expressos nego provimento ao recurso.” (cfr. doc. junto a fls. 17 dos autos);

29. Por ofício de 25/07/2008, foram os Impugnantes notificados do despacho de 20/06/2008, da Directora de Serviços do IRS, relativamente ao recurso hierárquico por eles apresentado em 07/11/2007 (cfr. doc. junto a fls. 15 dos autos).
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A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.
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DOS FACTOS NÃO PROVADOS

Dos factos constantes da impugnação, todos objectos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.».

B.DE DIREITO

Pretende o Recorrente que a sentença incorreu em nulidade por omissão de pronúncia porquanto e, nomeadamente, nada disse quanto à invocada falta de pronúncia da AT acerca da declaração de substituição do ano de 2004, apresentada juntamente com a reclamação graciosa, nem sobre a injustiça da liquidação.

Como constitui jurisprudência pacifica, as causas de nulidade de sentença (ou de outra decisão), encontram-se taxativamente enumeradas no art.º 615.º do CPC, com correspondência no art.º 125/1 do CPPT, aí se prevendo como fundamento de nulidade “a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar”.

Relaciona-se esta nulidade com o comando do art.º 608/2 do CPC, segundo o qual, «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras».

Como também é pacifico na jurisprudência, a expressão «questões» prende-se com as pretensões que os litigantes submetem à apreciação do tribunal e as respectivas causas de pedir e não se confunde com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os fundamentos, os motivos, os juízos de valor ou os pressupostos em que as partes fundam a sua posição na controvérsia – vd. ac. do STJ, de 03/10/2017, Revista n.º 2200/10.6TVLSB.P1. S1 - 1.ª Secção.

Ora, de facto, há que convir que a sentença nada disse (nem explicou por que nada disse) sobre a falta de pronúncia da AT sobre a pretensa declaração de substituição relativa ao ano de 2004 apresentada com a reclamação graciosa da liquidação desse mesmo ano, nem sobre a injustiça da liquidação.

Tratam-se de verdadeiras questões, que em nada se reconduzem às outras duas invocadas no petitório e tratadas na sentença e que são a falta de fundamentação e a preterição da audição prévia no procedimento de liquidação de IRS do ano em causa de 2004, nem cujo conhecimento se mostra prejudicado pela apreciação feita das demais questões.

Nessa medida, procede a invocada nulidade da decisão, importando conhecer agora dessa questão na apelação se não for prejudicada pela resposta dada às demais questões colocadas no recurso (art.º 665/1 do CPC).

Quanto ao apontado erro de julgamento traduzido na omissão ao probatório, como facto provado, que o contribuinte entregou declaração de substituição relativa ao IRS de 2004 com a reclamação graciosa da liquidação desse ano, trata-se de questão factual que integra a questão omitida pelo que o seu aditamento ao probatório – como facto provado ou «não provado» – depende de se revelar necessário o conhecimento, na apelação, da questão omitida e geradora de nulidade (parcial) da sentença.

Entrando nas questões do recurso de que a sentença conheceu com pretenso erro de julgamento, vejamos.

Invoca o recorrente que não foi observado o direito de participação no procedimento da liquidação de IRS/2004 impugnada.

Em suma e como decorre do probatório, por virtude de correcção, por via declarativa, dos prejuízos fiscais apurados no ano de 2002, veio a ser alterada a dedução dos prejuízos fiscais reportados nos ulteriores exercícios, nomeadamente o de 2004.

No entender da AT, expressado em sede de reclamação graciosa, a audição prévia não se mostra legalmente exigível porquanto e, em síntese, a correcção efectuada aos prejuízos fiscais apurados em 2002 foi originada em declaração de substituição apresentada pelo próprio contribuinte e presume-se verdadeira e de boa fé e foi essa correcção, por via declarativa, dos prejuízos fiscais apurados em 2002 que determinou a correcção dos prejuízos fiscais reportados como dedutíveis no ulterior ano de 2004.

Salvo o devido respeito, não concordamos com este modo de ver, que a sentença recorrida entendeu ser de validar.

Na redacção então vigente, dispunha o n.º 2 do art.º 60.º da Lei Geral Tributária que “é dispensada a audição no caso de a liquidação se efectuar com base na declaração do contribuinte”.

Ora, em bom rigor, a liquidação de IRS/2004 com que o contribuinte se viu confrontado e não se conforma, não é resultante da sua declaração apresentada para esse ano, mas sim, a resultante da correcção da matéria colectável efectuada pela AT em virtude da declaração de substituição apresentada pelo contribuinte com relação ao ano de 2002, em que foram alterados os prejuízos apurados nesse mesmo ano e reportados como dedutíveis nos anos ulteriores.

Como então estabelecia o art.º 47/1 do CIRC (aplicável ao IRS, ex vi do art.º 32.º do CIRS), “os prejuízos fiscais apurados em determinado exercício, nos termos das disposições anteriores, são deduzidos aos lucros tributáveis, havendo-os, de um ou mais dos seis exercícios posteriores”.

E de acordo com o preceituado no seu n.º 4, “Quando se efectuarem correcções aos prejuízos fiscais declarados pelo sujeito passivo, devem alterar-se, em conformidade, as deduções efectuadas (…)”.

Logo por aqui se alcança que a correcção é obrigatória e oficiosa.

E não de natureza declarativa, situação abrangida pela dispensa de audição, prevista no citado n.º 2 do art.º 60.º da LGT.

A AT incorreu em erro nos pressupostos ao subsumir o caso dos autos a uma situação de dispensa de audição, tendo a sentença recorrida que validou tal entendimento incorrido em erro de julgamento.

Questão também suscitada no recurso prende-se com a falta de fundamentação da liquidação impugnada (IRS/2004).
E de facto, compulsada a demonstração de liquidação (consta a fls.73 do apenso instrutor, print a fls. 58, cf. ponto 15 da matéria assente), dela não constam os elementos a que se refere o n.º 2 do art.º 77.º da Lei Geral Tributária, nomeadamente, a menção das disposições legais a coberto das quais a AT corrigiu oficiosamente a matéria colectável declarada para o ano de 2004 (cf. ponto 12 da matéria assente).

A liquidação está também inquinada de vício de forma por falta de fundamentação.

O princípio do aproveitamento do acto, que a sentença trouxe à colação, com o alcance restrito que lhe deve ser conferido, não tem aqui aplicação, pela razão de que, sendo embora obrigatória para a AT a correcção das deduções dos prejuízos fiscais reportados de anos anteriores que venham a ser corrigidos (no caso, os apurados em 2002 e deduzidos em 2004), não é possível ao tribunal afirmar que outro não podia ter sido o apuramento e quantificação das deduções corrigidas.

Procedendo a apelação por erro de julgamento da sentença quanto a vícios de forma da liquidação por falta de fundamentação e preterição da audição prévia, fica prejudicado o conhecimento da questão omitida na sentença, reportada ao vício de falta de pronúncia, na reclamação graciosa, sobre a declaração de substituição que a acompanhava relativamente aos rendimentos de 2004, pela elementar razão de que apenas poderia inquinar a validade da decisão de reclamação graciosa e de recurso hierárquico e nunca a própria liquidação de IRS/2004, objecto da reclamação e do recurso.

Tudo visto, é de julgar parcialmente nula a sentença na parte em que não conheceu da questão da falta de pronúncia da AT sobre a declaração de substituição de IRS/2004 apresentada com a reclamação graciosa e da injustiça da liquidação; conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a impugnação procedente por vício de forma da liquidação; não conhecer da questão omitida por prejudicada em vista da solução dada ao litigio na apelação, ao que se provirá na parte dispositiva do acórdão.

IV. DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em:
1) Julgar parcialmente nula a sentença na parte em que não conheceu da questão da falta de pronúncia da AT sobre a declaração de substituição de IRS/2004 apresentada pelo contribuinte com a reclamação graciosa e da injustiça da liquidação;
2) Conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida;
3) Julgar a impugnação procedente por vício de forma da liquidação e anular a liquidação impugnada;
4) Não conhecer da questão omitida na sentença por prejudicada em vista da solução dada ao litigio na apelação.

Condena-se a Recorrida em custas (que não são devidas no recurso dado não ter apresentado contra-alegações).

Lisboa, 09 de Junho de 2022


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Vital Lopes



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Luísa Soares



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Tânia Meireles da Cunha