Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:715/12.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:01/28/2021
Relator:ANTÓNIO ZIEGLER
Descritores:IVA: OPERAÇÕES MISTAS: PRO RATA .
OPERAÇÕES ISENTAS COM DIREITO Á DEDUÇÃO DO IMPOSTO SUPORTADO, RELATIVO À APROVAÇÃO DE CRÉDITO AO EXTERIOR E DE CRÉDITO À EXPORTAÇÃO – SUA INCLUSÃO NO NUMERADOR DA PERCENTAGEM DE DEDUÇÃO QUE CONFEREM O DIREITO À DEDUÇÃO .
NECESSÁRIO REGISTO CONTABILÍSTICO DO VALOR DAS OPERAÇÕES ISENTAS COM DIREITO À DEDUÇÃO, DISCRIMINADAS DAS RESTANTES OPERAÇÕES SUJEITAS E NÃO ISENTAS E DAS OPERAÇÕES ISENTAS SEM DIREITO À DEDUÇÃO. SUA DOCUMENTAÇÃO.
OBRIGAÇÃO DE FACTURAÇÃO E SUA RELEVÂNCIA TRIBUTÁRIA- CFR ALÍNEA B), DO Nº 3, DO ARTº 29º, DO CIVA, “IN FINE.
Sumário:I) Os s.p. que pratiquem operações mistas e quer por esse facto, podem deduzir parte do imposto suportado nas suas aquisições, deverão apurar o pro rata de dedução de acordo com o apuramento de uma percentagem , que contém no numerador o cômputo das operações efectivamennte efectuadas , que conferem o direito à dedução de imposto , e não a consideração de uma percentagem do total das operações sujeitas e das operações isentas.

II) No apuramento de tais operações a considerar no numerador, apenas relevam as operações efectuadas pelo s.p. , que conferem o direito à dedução do imposto , devidamente evidenciadas e comprovadas nas contas de proveitos da sua contabilidade.

III) Ainda que não evidenciadas na contabilidade o valor das operações isentas com direito à dedução do imposto , sendo possível apurar as mesmas com base na respectiva facturação do s.p. ,quais as operações efectuadas com tais entidades estranhas a U.E., o principio da descoberta da verdade material e do inquisitóro, impõe que se indague de tais elementos comprovativos das operações em causa, as quais foram invocadas pelo s.p, tendo-se prestado a apresenta-las se instado para tal, sendo que o Tribunal “A Quo” e a Adm. Fiscal nada indagaram a seu propósito, constata-se défice instrutório nos autos, devendo ser efectuadas as diligências necessárias ao apuramento dos factos, sendo ampliada a mesma para os ditos efeitos.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório

O Representante da Fazenda Pública e o N....., S.A., que legalmente sucedeu nos direitos em causa nos autos que cabiam ao B....., S.A.com os sinais nos autos, vieram interpor recurso da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, a qual julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida por B....., S.A., contra a liquidação adicional de IVA do período de 07/12T n.º ....., e de juros compensatórios relativos ao mesmo período com o n.º ....., e anulou os referidos atos de liquidação. Mais, aquela sentença, condenou as Partes em custas na proporção do decaimento, fixada em 86,5% para o Impugnante e em 13,5% para a Autoridade Tributária e Aduaneira.

O recurso do Representante da Fazenda Pública sustenta as seguintes conclusões:

“1 - Na Douta Sentença proferida no âmbito do processo identificado em epígrafe, a qual, julgou parcialmente procedente a presente impugnação e, consequentemente, anulou, também parcialmente, a decisão de indeferimento parcial da Reclamação Graciosa (RG) apresentada contra a liquidação adicional de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA) nº ....., relativa ao período 07/12, e a liquidação de juros compensatório nº ....., relativas ao mesmo período, ambas de 09.02.2010.), considerando: “[p]arcialmente procedente a Impugnação deduzida (…) e anulo os atos de liquidação de juros compensatórios impugnada.”;

2 – Com todo o respeito, que é muito, como se demonstrará infra, não podemos concordar com a decisão proferida pelo tribunal recorrido, nesta parte, por a mesma padecer de “excesso de pronuncia”, causadora da sua nulidade (art,º 125., n.º 1 do CPPT), ou, caso assim não se entenda, o que por mera hipótese académica se admite, sem conceder,

3 - ainda assim, a decisão quanto à matéria objeto do presente recurso não poderá ser mantida por a mesma enfermar, também, do vício de violação de lei (art.º 96.º, do Código do IVA e 35.º da LGT) e da sua aplicação aos factos dados como provados e, consequentemente, errónea aplicação do direito, como se demonstrará;

4 – Como se retira-se do n.º 1, “in fine” do artigo 125º, do CPPT, constitui causa de nulidade da sentença, entre outras, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar (omissão de pronúncia) ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer ou tomar conhecimento (excesso de pronúncia);

5 - Como escreve Jorge Lopes de Sousa, in: Código de Procedimento e Processo Tributário anotado de Jorge Lopes de Sousa, 6ª edição, Áreas Editora, vol. II, pag. 366:

“Esta nulidade está conexionada com a segunda parte do n.º 2 do art. 660.º do CPC, em que se estabelece que o juiz não pode ocupar-se senão de questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

Haverá, pois, excesso de pronúncia se o tribunal, apesar de se limitar a apreciar um pedido que foi formulado, exceder os seus poderes de cognição quanto à causa de pedir, violando a regra da identidade de causa de pedir de causa de julgar, por exemplo, anulando um acto com base em vício não invocado.”

6 - Resulta claro, que “in casu”, tendo presente o fundamento (causa de pedir) invocado pela Impugnante, causador da ilegalidade dos juros compensatórios liquidados, e os utilizados pelo tribunal a quo, na fundamentação da sua decisão ora recorrido. Não no vicio invocado pela Impugnante, mas sim, num vicio formal, como sendo o facto de a AT, apesar de demonstrar o percurso cognitivo da liquidação dos juros (“[N]essa demonstração (…), não fazer referência aos diplomas legais que preveem as taxas aplicadas.”, firmando inclusive, que: “(…), a Autoridade Tributária e Aduaneira nada diz quanto a este tema, limitando-se a indicar a quantia sobre o qual os mesmos incidem, o período de tempo considerado para a liquidação não fazendo referência à taxa aplicável.”).

7 - Incorreu aquele tribunal num “excesso de pronúncia”, vício causador da nulidade da sentença, como se extrai do n.º 1 “in fine” do artigo 125.º do CPPT, não podendo a mesma ser mantida, nesta parte, o que se requer.

8 - Porém, caso assim não se entenda, o que por mera hipótese académica se admite sem conceder, da mesma forma não poderá permanecer a sentença ora recorrida por a mesma não enfermar do vício que lhe é assacado pelo tribunal a quo, na fundamentação que originou a decisão ora recorrida.

9 - Como se disse já, face à causa de pedir invocada pela Impugnante, não se entende a decisão formulada pelo tribunal a quo, que, depois de considerar “[p]arcialmente procedente a Impugnação deduzida (…) e anulo os atos de liquidação de juros compensatórios impugnada.”., com o fundamento formal, de que a AT, não fazer referência, na notificação efetuada ao contribuinte, “à taxa aplicada”;

10 - Com o máximo de respeito, lamentamos, mas não podemos concordar com a decisão formulada pelo tribunal a quo, por a mesma enfermar do vicio de violação da lei, em concretos dos artigos art.º 96.º, do Código do IVA e 35.º da LGT;

11 - No que respeita aos fundamentos dos atos de liquidação, tem sido defensável pela jurisprudência mais recente que se verifica a mínima fundamentação exigível desde que indiquem diretamente a quantia sobre a qual incidem os juros, o período de tempo considerado para a liquidação, e a taxa aplicada, para além das normas legais em que assenta a liquidação desses juros, tal como definido no n.º 9 do Artigo 35.º da LGT;

12 - Verificados que estão esses elementos no ato liquidação que foi notificado à Impugnante, e no documento de notificação consta “para além da informação sobre o valor do imposto em atraso e sobre o qual incidiam juros compensatórios, o período de tempo a que se reportam esses juros, o valor dos mesmos, contém também que a “Taxa de Juro aplicável ao período” é, “a equivalente à taxa dos juros legais fixada nos termos do n.º 1 do artigo 559.º do Código Civil”, como é exigível, não pode proceder o alegado vício de falta de fundamentação, invocado na sentença recorrida;

13 - Nesse mesmo sentido, JORGE DE SOUSA, em acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2009.01.01, proferido no âmbito do Processo n.º0871/08, afirma concretamente que: “Mostra-se suficientemente fundamentado o acto de liquidação que, para além da informação sobre o valor do imposto em atraso e sobre o qual incidiam juros compensatórios, o período de tempo a que se reportam esses juros, o valor dos mesmos, contém também o valor da taxa dos referidos juros, que é a equivalente à taxa de juros legais fixada nos termos do artigo 559º, nº 1 do CC, tal, aliás, como determina o artigo 35º, nº 10 da LGT.”

14 - A liquidação dos juros compensatórios em crise nos presentes autos não se encontra inquinada de qualquer vício suscetível de gerar a sua invalidade, muito menos por falta de fundamentação, dado que muito embora não indique o quantitativo da taxa aplicada, indica que a mesma é a equivalente à taxa dos juros legais fixada nos termos do n.º 1 do artigo 559.º do Código Civil, não podendo a Impugnante desconhecer o seu valor.

15 - Logo, por assim não o entender, deve a sentença colocada em crise nos presentes autos se revogada e substituída por outra que espelhe uma correta aplicação do direito, tendo presente os inalienáveis princípios da legalidade e do interesse público, consagrados constitucionalmente.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e, em consequência, determinara a nulidade parcial da sentença, ou caso assim não se entenda, subsidiariamente, seja a douta sentença ora recorrida anulada e substituída por douto Acórdão que julgue totalmente improcedente a presente impugnação, na parte objeto do presente recurso, por não provada, tudo com as devidas e legais consequências.

Mais se requer, desde já, atendendo a que o valor da ação é superior a € 275.000, seja a RFP dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do artigo 6º n.º 7 do Regulamento de Custas Processuais, tendo em consideração o valor e a natureza da causa.”

No seu recurso, o n....., S.A., alcança as conclusões seguintes:

“1.ª A douta sentença recorrida julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra o despacho de deferimento parcial, datado de 03.02.2012, proferido pelo Exmo. Senhor Diretor da Unidade dos Grandes Contribuintes, o Sr. Dr. João Paulo Pereira Morais Canedo, que recaiu sobre a reclamação graciosa n.º ....., apresentada contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) n.º ....., de 09.02.2010, referente ao período de 0712, no valor de € 2.087.866,22, e da liquidação adicional de juros compensatórios n.º ....., de 09.02.2010, referente ao mesmo período, no valor de € 155.360,13, e bem assim contra as referidas liquidações adicionais;

2.ª O Tribunal a quo considerou que a liquidação adicional de juros compensatórios não se encontrava devidamente fundamentada, por não fazer referência aos diplomas legais que preveem as taxas aplicadas e por esse motivo concedeu razão aos Recorrentes, e determinou a anulação do ato de liquidação adicional de juros compensatórios identificado;

3.ª No entanto, o Tribunal a quo manteve a liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) n.º ....., de 09.02.2010, referente ao período de 0712, no valor de € 2.087.866,22, por entender, em suma, que “atendendo aos dados de facto apurados em sede de fiscalização, incumbia ao Impugnante demonstrar que, não obstante, as aludidas transações haviam realmente sido realizadas, com aquelas características da contraparte estar estabelecida ou domiciliada fora do território da Comunidade (…).

Para o efeito e em sede de impugnação judicial, o Contribuinte apenas trouxe prova testemunhal, que não convenceu quanto a esta questão”;

4.ª Salvo o devido respeito, a sentença recorrida padece dos vícios de omissão de pronúncia e de falta de valoração da prova, o que determinará a sua nulidade, nos termos do artigo 125.º, n.º 1, do CPPT;

5.ª Em primeiro lugar, entendem os Recorrentes que a sentença recorrida se encontra ferida de nulidade em virtude de omissão de pronúncia por parte do Tribunal a quo, que não se pronunciou sobre a questão essencial suscitada nos autos: o valor considerado no cálculo do pro rata encontra correspondência na contabilidade dos Recorrentes?

6.ª De facto, a administração tributária, em sede inspetiva, desconsiderou a inclusão do valor de € 2.075.672,33 no numerador da fração utilizada pelos Recorrentes para cálculo do seu pro rata por entender que “Não sendo os montantes mencionados – considerados na fracção em causa – evidenciados e devidamente comprovados por registos em contas de proveitos com respectivos documentos comprovativos, que justifiquem objectivamente as contrapartes, os mesmos não podem ser aceites, pelo que se corrige o seu efeito no cálculo da taxa do pro-rata” (cf. p. 64 do doc. n.º 1 junto com a reclamação graciosa);

7.ª Perante este entendimento, vertido no relatório de inspeção tributária, e a emissão das liquidações adicionais ora em crise, os Recorrentes apresentaram reclamação graciosa contra as mesmas invocando a sua ilegalidade, e peticionando a sua anulação, essencialmente porque, em face da documentação por ela apresentada – em especial os docs. n.º 6, 7, 8 e 9 da reclamação graciosa – é evidente que os valores considerados se encontram refletidos na sua contabilidade, e em consequência as correções da administração tributária violam o artigo 23.º, n.º 4, do Código do IVA;

8.ª A decisão da reclamação graciosa negou provimento à pretensão dos Recorrentes por concordar com os fundamentos da correção expressos no relatório final de inspeção tributária e por considerar que os valores utilizados na fórmula não se encontravam comprovados nem com a documentação apresentada em sede inspetiva, nem com a documentação apresentada em sede de reclamação graciosa;

9.ª Ora, em face desta decisão da administração tributária, os Recorrentes apresentaram a impugnação judicial que originou a sentença ora recorrida e que não se pronunciou sobre a suficiência (ou insuficiência) da sua contabilidade, no que concerne especificamente ao registo dos valores por si utilizados no cálculo do pro-rata nas contas de Proveitos na sua contabilidade!

10.ª Neste contexto, afigura-se claro que a sentença recorrida padece de vício de nulidade, por incorrer em omissão de pronúncia, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 125.º do CPPT e na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º do CPPT, devendo, por esse motivo, o presente recurso ser julgado procedente e determinada a revogação da sentença recorrida, proferindo-se nova decisão que julgue procedente a impugnação judicial;

11.ª Para além do exposto, entendem os Recorrentes que, nos termos dos artigos 123.º, n.º 2, e 125.º do CPPT e dos artigos 154.º e 607.º do CPC, aplicáveis ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT, a sentença recorrida é também nula por falta de apreciação crítica da prova;

12.ª Sucede que na reclamação graciosa, apresentada previamente à impugnação judicial no âmbito da qual foi proferida a sentença ora recorrida, foram anexados diversos documentos que demonstram que os montantes de € 78.550.534,23 e de € 2.392.147,00 se encontram devidamente evidenciados na contabilidade dos Recorrentes e têm documentação de suporte que os comprove e identifique com maior detalhe. Na sua p.i. de impugnação judicial os Recorrentes remeteram por diversas vezes para a referida documentação que integra os autos e requereram, a final, “a junção aos autos do processo administrativo instrutor, do qual faz parte o procedimento de reclamação graciosa, cujos termos correram na Unidade dos Grandes Contribuintes, sob o número de processo .....” – o que já é uma obrigação da administração tributária e do representante da Fazenda Pública, decorrente do disposto nos artigos 110.º, n.os 3, 4 e 5 e 111.º do CPPT e portanto nem sequer seria exigível aos Recorrentes tal pedido;

13.ª Em face da sentença recorrida, é evidente que o Tribunal a quo não considerou a documentação apresentada pelos Recorrentes e junta aos autos com o processo administrativo instrutor, tendo baseado a sua decisão apenas na prova testemunhal produzida;

14.ª Não sendo feita qualquer referência expressa, nem tão-pouco qualquer juízo sobre documentos relativos ao método de apuramento do pro-rata juntos aos autos tanto em sede inspetiva como no âmbito do procedimento de reclamação graciosa, conclui-se que a sentença recorrida padece de manifesta nulidade por falta de fundamentação de facto decorrente da falta de apreciação crítica da prova junta aos autos, pelo que, com este fundamento, deve ser revogada;

15.ª Para além disso, em virtude do disposto no artigo 662.º do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT, caso o Tribunal ad quem considere que a decisão recorrida é omissa / deficiente em sede de probatório quanto à matéria de facto (provada ou não provada), deve ordenar a remessa dos autos ao Tribunal a quo para que, então, fixando novo probatório, emita nova decisão, devendo, por isso, para além da revogação da sentença recorrida ordenar-se a baixa dos autos à 1.ª instância para a ampliação da matéria de facto e para fixação de um novo probatório;

16.ª Não obstante, entendem os Recorrentes que a sentença proferida pelo Tribunal a quo e ora recorrida incorre ainda em erro de julgamento da matéria de facto e de direito na apreciação da legalidade da correção realizada pela administração tributária quanto ao apuramento do pro-rata, devendo, nesta parte, ser objeto de anulação;

17.ª No que concerne, em primeiro lugar ao erro de julgamento da matéria de facto, os Recorrentes entendem que de toda a prova produzida resulta que as operações de “Crédito ao exterior com dedução” e de “Crédito à exportação com dedução” se encontram devidamente evidenciadas e comprovadas nas contas de Proveitos da sua contabilidade, tal como lhes é legalmente exigido. Não obstante, os Recorrentes assumem que os serviços de inspeção tributária pretendiam que os montantes anuais das referidas operações económicas com direito à dedução estivessem evidenciados de uma forma mais direta no balancete analítico. Isto é, que o sujeito passivo tivesse contas de proveitos específicas no que se refere ao crédito ao exterior, ou seja, uma conta em que se segregasse o valor do crédito comunitário e uma outra em que se segregasse o valor do crédito não comunitário.

Mas a verdade é que tal segregação no balancete analítico não é exigida pelo Plano de Contas para o Sistema Bancário (PCSB) / Normas de Contabilidade Ajustadas (NCA) e muito menos por qualquer normativo do Código do IVA!

18.ª Para além da documentação apresentada, como esclareceu a testemunha inquirida, os valores referentes a estas operações encontram-se evidenciados na contabilidade pelos seus totais, que, aliás, eram comunicados através das estatísticas ao Banco de Portugal (cf. suporte áudio do depoimento da testemunha P....., minuto 04, segundo 58).

Acresce que, todas as operações de crédito em apreço se encontram devidamente documentadas, pois, como referiu a testemunha inquirida “existem necessariamente contratos que identificam os clientes e os clientes são inscritos na base de dados” (cf. suporte áudio do depoimento da testemunha P....., minuto 07, segundo 00);

19.ª Na decisão da reclamação graciosa (cf. página 15 do doc. n.º 3 da p.i.) a administração tributária, refere ainda que os Recorrentes acabaram por aderir ao entendimento vertido no relatório final de inspeção, pois que, analisado o exercício seguinte - o de 2008 -, facilmente se constata que o procedimento adotado pelos Recorrentes é idêntico ao que aqui se descreveu. No entanto, esta afirmação não pode ser considerada como verdadeira, uma vez que, no exercício de 2008, e no que concerne às operações de mercado monetário interbancário, o procedimento adotado assentou em documentação idêntica à que os Recorrentes disponibilizaram em sede da reclamação graciosa quanto ao exercício de 2007, ora em discussão, (cf. docs. n.ºs 6 a 11 da reclamação graciosa que integra o processo administrativo instrutor), a qual, aquando da inspeção tributária ao exercício de 2008, foi considerada válida e aceite pela mesma equipa que realizou a ação inspetiva ao exercício de 2007!

20.ª Para além disso, como explicou a testemunha inquirida, o procedimento sob análise vem sendo adotado pelos Recorrentes desde a entrada em vigor do Código do IVA (cf. suporte áudio do depoimento da testemunha P....., minuto 08, segundo 08). Este procedimento apenas foi objeto de correção pela administração tributária no exercício de 2007 e, como referido, não obstante objeto de análise na ação inspetiva ao exercício de 2008 não foi objeto de qualquer correção nesse exercício, nem nos exercícios subsequentes (cf. suporte áudio do depoimento da testemunha P....., minuto 07, segundo 45). Como referiu a testemunha, a própria administração tributária desde cedo reconheceu a complexidade no apuramento do pro rata com referência a estas operações, tendo, inclusivamente, em momento anterior validado o procedimento adotado pelos Recorrentes (cf. suporte áudio do depoimento da testemunha P....., minuto 17, segundo 30);

21.ª Pelo que, em face de todo o exposto, conclui-se que o procedimento utilizado no ano de 2007 para o cálculo do pro-rata é um procedimento comum e aceite devido à complexidade das operações em causa, que não colide com o disposto no artigo 23.º, n.º 4, do Código do IVA;

22.ª Adicionalmente, invocam os serviços de inspeção tributária que “Não sendo os montantes mencionados [“Crédito à exportação com dedução” e “Crédito ao exterior com dedução”] considerados na fracção em causa – evidenciados e devidamente comprovados por registos em conta de Proveitos com respectivos documentos comprovativos, que justifiquem objectivamente as contrapartes, os mesmos não podem ser aceites, pelo que se corrige o seu efeito no cálculo da taxa do pró-rata.” (cf. página 64 do doc. n.º 1 da reclamação graciosa que integra o processo administrativo instrutor). Nestes termos, os serviços de inspeção tributária sustentam, em suma, a impossibilidade de relevação, por falta de suporte documental, dos montantes correspondentes àquelas operações para efeito de apuramento do pro-rata. Pelo que procederam à total desconsideração ao montante do “Numerador” dos valores respeitantes a “Crédito ao Exterior com Dedução” (€ 78.550.534,23) e “Crédito à Exportação com Dedução” (€ 2.392.147,00), apurando, por conseguinte, um pro-rata de 4%. Face ao recálculo do prorata promovido pelos serviços de inspeção tributária, procederam os mesmos à correção do IVA a favor da administração tributária no montante de € 2.075.672,33;

23.ª Contudo, contrariamente ao que alegam os serviços de inspeção tributária, mediante a análise dos documentos 6, 7, 8 e 9 juntos com a reclamação graciosa, e bem assim a sua contabilidade, é possível concluir que os montantes relevados ao apuramento do pro-rata, i.e. os montantes do “Crédito à exportação com dedução” e os montantes do “Crédito ao exterior com dedução”, estão efetivamente evidenciados em termos objetivos;

24.ª Acresce também que o PCSB não estabelece nenhuma obrigatoriedade para os Recorrentes de contabilizar os proveitos que resultem de operações efetuadas com entidades não residentes na União Europeia em contas separadas dos demais proveitos do exterior. Como se demonstrou, a contabilização é efetuada pelos Recorrentes com base na totalidade dos Proveitos, estando devidamente evidenciados por elementos contabilísticos as operações de “Crédito ao exterior” e “Crédito à exportação” resultantes de operações com entidades não residentes na União Europeia e que, por conseguinte, atento o disposto no n.º 27) do artigo 9.º e do parágrafo V) da alínea b) do nº 2 do artigo 20.º, ambos do Código do IVA, conferem direito à dedução do imposto suportado;

25.ª Asseverou a testemunha inquirida que os valores das operações em questão estão inscritos na contabilidade pelo total, uma vez que “era impraticável ter um detalhe” para cada operação/cliente, “há um saldo espelhado em rúbricas contabilísticas (…) que espelha o que é crédito concedido ao exterior, isso é inequívoco” (cf. suporte áudio do depoimento da testemunha P....., minuto 08, segundo 10). Mais afirmou a testemunha que todos os clientes são identificáveis através dos respetivos documentos de suporte das operações, designadamente através dos contratos e da base de dados dos Recorrentes. (cf. suporte áudio do depoimento da testemunha P....., minuto 07, segundo 00, minuto 10, segundo 00). No mesmo sentido, caso o Tribunal a quo entendesse pertinente a análise de documentação adicional detida pelos Recorrentes poderia – rectius deveria – tê-la solicitado!

26.ª Com efeito, é inquestionável que os Proveitos dos Recorrentes estão devidamente suportados por documentos que obedecem aos requisitos legais, contendo a identificação da operação, a sua natureza e o beneficiário da mesma, documentos estes que, aliás, sempre estiveram ao alcance dos serviços de inspeção tributária, não tendo sido porém alguma vez solicitados ou examinados (cf. doc. n.º 11 da reclamação graciosa que integra o processo administrativo instrutor);

27.ª Em face do exposto, afigura-se claramente demonstrado que: i) por um lado, as operações respeitantes a “Crédito ao Exterior com Dedução” (€ 78.550.534,23) e a “Crédito à Exportação com dedução” (€ 2.392.147,00) se tratam de operações que conferem direito à dedução e, por esse motivo, devem ser incluídas no apuramento do prorata; e ii) por outro lado, que os valores a que estas operações respeitam estão devidamente evidenciados e documentados contabilisticamente;

28.ª Em face de tais conclusões, inexiste qualquer fundamento para excluir os referidos valores do cálculo do pro-rata, devendo considerar-se que o cálculo realizado pelos Recorrentes – no qual os mesmos se encontravam inscritos no “Numerador” da fração – se afigura correto;

29.ª É evidente, portanto, o erro de julgamento da matéria de facto em que incorreu a sentença recorrida, impondo-se a sua revogação e a anulação da correção efetuada pela administração tributária, concretamente da declaração de anulação da decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa, bem como o consequente ato de liquidação adicional de IVA ora em apreço;

30.ª Assim, deverá o Tribunal ad quem anular a sentença recorrida e ampliar a matéria de facto dada como provada, e, em conformidade com o exposto, ser proferida nova decisão que julgue a impugnação judicial deduzida pelos Recorrentes procedente;

31.ª Acresce que, em face do artigo 662.º do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º do CPPT, admitindo-se que de acordo com o entendimento desse Ilustre Tribunal não constem do processo todos os elementos de prova que serviram de base à decisão proferida e que permitam a esse Ilustre Tribunal a reapreciação da matéria de facto, sempre se impõe no caso sub judice que os autos baixem à 1.ª instância para a ampliação da matéria de facto;

32.ª No que concerne, ao erro de julgamento de direito, em primeiro lugar, a parca fundamentação utilizada na sentença recorrida viola frontalmente o disposto nos artigos 20.º e 23.º do Código do IVA, porquanto ao manter a liquidação adicional emitida pela administração tributária na sequência da ação inspetiva, está a concordar com o entendimento firmado pela administração tributária que desconsiderou totalmente as operações de crédito cuja contraparte se encontrava domiciliada em países fora da Comunidade Europeia. No entanto, caso os serviços de inspeção tributária tivessem procedido, como se lhes impunha, à correção do pro-rata de acordo com o critério que propugnaram, facilmente concluiriam que o pro-rata, com base na origem comunitária ou não comunitária dos proveitos de juros e comissões que resultem das operações de crédito, seria de 8% também;

33.ª Ao proceder como procedeu, a administração tributária desconsiderou totalmente um pagamento da atividade económica dos Recorrentes inequivocamente existente. Na verdade, para fundar o presente ato de liquidação adicional assente na dedução indevida do IVA no montante de € 2.075.672,33, impunha-se que a administração tributária alegasse factualidade que permitisse concluir, ainda que indiciariamente, que os Recorrentes não concederam qualquer crédito ao exterior ou à exportação em que o destinatário fossem países não comunitários, o que não fez;

34.ª Neste contexto, a atuação dos serviços de inspeção tributária, ao desconsiderarem os proveitos de operações de crédito que conferem direito à dedução do imposto no apuramento do pro-rata, fazem uma “reinterpretação” ilegal do método do pro-rata previsto no n.º 4 do artigo 23.º do Código do IVA, pois que excluem do seu cálculo os proveitos de operações de crédito que conferem direito à dedução do imposto;

35.ª Pelo que, em face de todo o exposto, importa concluir que a eliminação no apuramento do pro-rata, dos valores correspondentes aos proveitos que conferem indubitavelmente direito à dedução, e cuja materialidade não se questiona infringe o disposto nos artigos 20.º, n.º 1, alínea b) parágrafo V) e 23.º n.º 1 e 4 ambos do Código do IVA, sendo, por esse motivo, evidente o erro sobre os pressupostos de direito em que incorre a sentença recorrida ao manter as correções efetuadas pela administração tributária, impondo-se, consequentemente, a sua revogação bem como a anulação do ato tributário em crise;

36.ª Ainda no âmbito do erro de julgamento de direito, entendem os Recorrentes ser de sublinhar que nas operações que efetuou, o Recorrente, como contribuinte diligente, cumpriu as obrigações formais que lhe eram exigidas pelo Código do IVA de modo a conferir o respetivo direito à dedução. A própria administração tributária teve oportunidade de o confirmar em sede inspetiva. Para além disso, em fase alguma a administração tributária questionou as faturas emitidas pelo Recorrente, imputando como causa da recusa da inclusão dos montantes referentes a “Crédito ao Exterior com Dedução” e “Crédito à Exportação com dedução” no numerador da fração para a aplicação do método pro rata a falta de evidência dos valores na contabilidade – argumento que, como vimos supra também não colhe;

37.ª Em face do exposto, afigura-se evidente que o tribunal a quo terá feito uma errada interpretação dos requisitos formais do direito à dedução, sendo patente o erro de direito em que incorreu a sentença a quo, devendo a mesma ser revogada com as demais consequências legais;

38.ª Ainda quanto ao erro de julgamento de direito, entendem os Recorrentes que a sentença recorrida viola os princípios de direito da união europeia da neutralidade, da proporcionalidade, efetividade e materialidade sobre a forma, suportados não só pelo próprio sistema europeu do IVA como por jurisprudência do TJUE;

39.ª Assim, considerando que as operações de concessão de crédito existiram, que se encontram devidamente documentadas pelas respetivas faturas (que foram colocadas à disposição da administração tributária em sede inspetiva) e registadas na contabilidade dos Recorrentes de acordo com o que lhe é legalmente exigível, impõe concluir-se que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito por não considerar a aplicação dos princípios da neutralidade, da proporcionalidade, da efetividade e da materialidade sobre a forma. Assim, deverá a referida sentença ser revogada e substituída por outra que declare a ilegalidade da correção realizada pela administração tributária ao cálculo do pro rata dos Recorrentes e bem assim anule o ato tributário de liquidação adicional respetivo;

40.ª Por último, imputa-se ainda à conduta do Tribunal a quo a violação do princípio do inquisitório, previsto no artigo 99.º, n.º 1, da LGT. Sucede que, apesar da prova documental carreada nos autos, o Tribunal a quo baseou a sua decisão apenas na prova testemunhal produzida, tendo concluído que não convenceu quanto à questão em discussão;

41.ª No entanto, considerando que “o tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados ou de que oficiosamente pode conhecer” (cf. referido artigo 99.º, n.º 1, da LGT), permanecendo com dúvidas sobre as questões essenciais a decidir, o Tribunal a quo poderia – rectius deveria – ter solicitado elementos adicionais para conhecer a verdade e produzir uma decisão que refletisse a verdade material da situação em apreço;

42.ª Assim, e em face de todo o exposto, resulta evidente a ilegalidade da sentença recorrida na parte em que julgou improcedente a impugnação judicial. Razão pela qual, deve julgar-se procedente o presente recurso, determinando-se a revogação da sentença recorrida, na parte ora objeto de recurso, e a sua substituição por outra que a julgue integralmente procedente, com as demais consequências legais.

Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com a consequente revogação da sentença recorrida na parte ora objeto de recurso e, por conseguinte:

i) a baixa dos autos a 1.ª instância para ampliação da matéria de facto; ou

ii) a substituição da sentença recorrida por outra decisão que julgue a impugnação judicial procedente na parte ora objeto de recurso, com as demais consequências legais.

Tendo em vista a anulação do ato em crise nos termos peticionados, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA!”

*

O Tribunal Tributário de Lisboa, na sequência das nulidades invocadas pelas Partes nas respetivas alegações de recurso, proferiu despacho, no qual sustenta que a sentença recorrida não padece das nulidades arguidas, mantendo a decisão recorrida.

*

O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto Parecer no qual refere que:

“A douta sentença encontra-se bem fundamentada de facto e de direito. Entendermos ter feito uma correcta e suficiente análise da matéria de facto e correcta foi a sua subsunção jurídica.

A douta sentença em recurso não sofre de qualquer vício, nomeadamente de erro de julgamento, deficiente apreciação dos factos considerados provados ou violação das normas aplicáveis ao caso.

Porque se concorda na íntegra com ele, recordamos aqui o douto despacho de fls. 335 e seg., no qual o tribunal “a quo” esclarece as razões porque a douta sentença em recurso não sofre de qualquer nulidade por excesso ou omissão de pronúncia como os recorrentes defendem.

Pelo exposto, somos do parecer que os recursos apresentados devem improceder, devendo manter-se o julgado por a decisão sob recurso não padecer de quaisquer vícios, nomeadamente os que lhe vêm imputados.”

*

Atento a necessidade de celeridade no julgamento do recurso e obtendo a anuência dos Adjuntos, vão dispensados os vistos legais, cabendo apreciar e decidir. –cfr nº4, do artº 657º, do CPC.

Na sentença proferida nos autos a Mª Juiz apurou os seguintes factos:

A) O Impugnante é uma instituição financeira que exerce normal e habitualmente a atividade de captação de recursos de terceiros, sob a forma de depósitos ou outros, os quais aplica, conjuntamente com recursos próprios, na concessão de crédito, em títulos e ativos (cf. artigo 1° da pi);

B) O Impugnante foi alvo de ação de inspeção externa pelos Serviços de Inspeção Tributária (SIT) da Direção de Serviços de Inspeção Tributária (DSIT) que incidiu sobre o exercício de 2007

C) Do relatório de inspeção tributária elaborado pelos inspetores tributários A..... e A....., em 2009.12.30, constante de fls. 9 a 97 do PA e que aqui se dá por integralmente reproduzido, transcreve-se:

a. (...);

b. 1.4. Conclusões da Ação de Inspeção

c. (...);

d. 1.4.2. Imposto sobre o Valor Acrescentado - IVA

e. (...);

f. 1.4.2.2. IVA Regularizações - Pro-Rata

i. €2 075 672,33 (n° 4, 6 e 8 do Artigo 23° CIVA);

ii. Correção relativa à alteração da taxa do pro-rata definitivo de 8% para 4°/o (ver ponto III.2.2 [do] relatório);

iii. A correção proposta pela Autoridade Tributária e Aduaneira manteve-se após o exercício do direito de audição;

g. (...);

h. II. 3.3.2 Imposto sobre o valor acrescentado

Relativamente ao IVA o sujeito passivo enquadra-se no regime normal de periodicidade mensal, praticando operações isentas sem direito a dedução, nos termos do artigo 9/28 CIVA, operações sujeitas e operações isentas com direito a dedução, nos termos do artigo 20° CIVA;

ii. No exercício de 2007, o sujeito passivo, no apuramento do IVA dedutível, utilizou o método do pro-rata, de acordo com o disposto no artigo 23/1 CIVA, tendo usado um pro-rata provisório de 9% enquanto o pro-rata definitivo se cifrou nos 8%;

i. (...);

j. III. 2 Imposto sobre o Valor Acrescentado - IVA

k. (...);

l. III. 2.2. IVA Regularizações - Pro-Rata

i. € 2 075 672,33 (n° 4,6 e 8 do Artigo 23° CIVA);

ii. Foi solicitado ao B..... para evidenciar todos os cálculos, movimentos contabilísticos e valores que serviram de base ao cálculo do pro-rata definitivo referente a 2007;

iii. Foram entregues mapas resumo que mostram que o B..... na declaração periódica, respeitante ao mês de Dezembro de 2007, procedeu à alteração para 8% do pro-rata utilizado de 9% (calculado em Dezembro de 2007) (...), originando uma regularização a favor do Estado de € 518 918,09 (...);

iv. Na análise dos documentos justificativos da referida regularização, apresentada pelo B..... (...), verificamos que no numerador da fração (...), a que faz referência o artigo 23/4 CIVA, foram considerados na rubrica "operações tributadas e isentas com direito a dedução" os valores de € 78 500 534,23 e € 2 392 147,00, referente a juros de crédito ao exterior, contas 80 e 51 e a "proveitos de crédito à exportação com países não comunitários", contas 80, 82 e 51, respetivamente (...);

v. Verificados os elementos comprovativos apresentados (...), constata-se que o B..... calcula uma proporção, mês a mês, entre o crédito concedido a entidades não residentes, relativamente ao crédito total (...) e do crédito à exportação com dedução relativamente ao total do crédito (...) e aplica, mensalmente essa percentagem ao total contabilizado nas contas juros de crédito ao exterior, 80 e 51 e contas de proveitos de crédito à exportação com países não comunitários, 80, 82 e 51 (...);

vi. O somatório dos valores calculados pela forma mencionada, € 78 550 534,23 (...) e € 2 392 147,00 (...), é considerado no numerador da fração (...);

vii. Face ao descrito verifica-se que o Banco usou uma estimativa (percentagem) como montante, que considerou para efeitos do cálculo do pro-rata, quando os valores a considerar devem ser os efetivos e concretamente evidenciados e comprovados em contas de Proveitos;

viii. Não sendo os montantes mencionados - considerados na fração em causa - evidenciados e devidamente comprovados por registos em contas Proveitos com respetivos documentos comprovativos, que justifiquem objetivamente as contrapartes, os mesmos não podem ser aceites, pelo que se corrige o seu efeito no cálculo da taxa do pro-rata;

ix. Deste modo, o pro-rata definitivo é alterado para 4% (...), pelo que procedemos à correção, nos termos do artigo 23/4.6.8 CIVA, no montante de € 2 075 672,33 (...) de IVA não considerado no Campo 41 da declaração periódica (Regularização a favor do Estado), que é resultante dos seguintes cálculos:

x. Montantes considerados pelo Banco:

Numerador: € 178 353 076,69 / Denominador: € 2 548 734 055,86 = 0,0382904 => 8%

xi. Montantes por nós considerados:

Numerador: € 97 592 395,46 / Denominador: € 2 548 734 055,86 = 0,0382904 => 4%

Diverge do considerado pelo Sujeito Passivo em € 80 942

681,23 relativo às estimativas (percentagens) consideradas e já mencionadas (€ 78 550 534,23 + 2 392 147,00) operações relacionadas com "Proveitos relacionados com Crédito ao Exterior com dedução" e "Proveitos de Crédito à exportação";

xii. Montante da correção:

1. Pro-rata inicial = 9% (Considerado ao longo do ano);

2. Pro-rata definitivo calculado pelo Sujeito Passivo no final do ano = 8%;

3. Regularização efetuada pelo Sujeito Passivo no Campo 41 da DP = € 518 918,09 (...);

4. Pro-rata corrigido = 4% (...);

5. Regularização a efetuar (correção) = € 2 075 672,33 (...);

xiii. Após exercício do direito de audição a Autoridade Tributária e Aduaneira manteve a correção proposta inicialmente;

m. (...);

D) Em 2010.02.09, foi emitida a liquidação adicional de IVA n° ....., relativa ao período de 07/12, com montante a pagar de € 2 087 866,22, e data limite de pagamento de 2010.04.30 (cf. fls. 196 do PA-RG);

E) Em 2010.02.09, foi emitida a liquidação adicional de IVA - juros compensatórios n° ....., constante de fls. 197 do PA-RG e que aqui se dá como integralmente reproduzida, relativa ao período de 07/12, com montante a pagar de € 155 360,13, e data limite de pagamento de 2010.04.30, da qual se transcreve:

a. (..);

b. Fundamentação

c. Juros compensatórios liquidados nos termos do n° 1 do artigo 96° do Código IVA e do artigo 35° da Lei Geral Tributária, por ter sido retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto, por facto imputável ao sujeito passivo;

i. Imposto em falta sobre o qual incidem juros: € 2 087 866,22;

ii. Período a que se aplica a taxa de juro: de 2008.01.11 a 2009.12.21;

iii. Taxa de juro aplicável ao período: a equivalente à taxa de juros legais fixada nos termos do n° 1 do artigo 559° do Código Civil - € 155 360,13;

F) Em 2010.04.30, na Tesouraria da Fazenda Pública, o Impugnante satisfez os montantes de € 2 087 866,22 e €155 360,13 (cf. fls. 196 e 197 do PA-RG);

G) Em 2010.08.30, no Serviço de Finanças de Lisboa-2, deu entrada reclamação contra a liquidação adicional de IVA do período de 07/12t e a liquidação de juros compensatórios, constante de fls. 8 a 50 do PA-RG, que aqui se dá como integramente reproduzida;

H) Em 2011.09.13, foi elaborado projeto de decisão de indeferimento parcial da reclamação comunicado ao Impugnante por carta registada em 2011,09.14 (cf. fls. 59 a 81 do PA-RG);

I) Por despacho de 2012.02.03, do Diretor João Morais Canedo, exarado na informação n° ....., constante de fls. 82 do PA-RG, e que aqui se dá como integralmente reproduzido, a reclamação graciosa foi parcialmente deferida; deste transcreve-se:

a. Concordo com a informação e parecer infra, pelo que defiro parcialmente a reclamação graciosa;

b. (...);

J) Da informação n° ....., constante de fls. 82 a 99 do PA-RG, e que aqui se dá como integralmente reproduzido, transcreve-se:

a. (...),

b. Síntese

i. Quadro "I"

Corrigido Reclamado Deferido (proposta)

Relatório Valor Petição Valor Informação Valor

III 2.1 12 193,89 Art 17° a 24° 9 228.39 Ponto 1V - 1 9 228.39

III -2.2 2 075 672.23 Art. 25 ss 2 075 672.23 Ponto V - 2 0,00

Total 2 087 866,12 2 084 900,62 9 228,39

ii. (...);

iii. V - Da Análise

iv. (...);

v. V - 2 - IVA Regularizações - Pro-rata

vi. (...);

vii. 30. Ora, conforme resulta, aliás, do seu próprio objeto social, a atividade prosseguida pela Contribuinte, ora Reclamante, abarca a título principal, operações que não conferem direito à dedução de imposto sobre o valor acrescentado, nos termos do preceituado na disposição inserta no artigo 9/28 do CIVA, na redação em vigor (...);

viii. 31. Pese embora a isenção incompleta respeitante à sua atividade central, uma parte das operações praticadas pela Contribuinte (...), encontra-se sujeita e não isenta de IVA, conferindo, por tal razão, direito ao exercício do mecanismo da dedução daquele imposto-,

ix. 32. Atento o tipo de operações económicas praticadas, nos casos em que não se demonstra possível a dedução de IVA por via da determinação efetuada por intermédio do recurso ao mecanismo da afetação real, a Contribuinte, enquanto sujeito passivo de imposto, faz uso do método plasmado no artigo 23/1 CIVA - isto é, o processo de determinação de acordo com a percentagem de dedução ou pro-rata;

x. 33. A Contribuinte (...) é, para efeitos de tributação em sede de IVA, considerado sujeito passivo "misto", pois pratica, em simultâneo, quer operações que conferem o direito financeiro ao exercício da dedução quer operações em que tal direito se encontra legalmente vedado por força das disposições insertas no CIVA;

xi. 34. Os sujeitos passivos mistos, para calcular o montante do direito à dedução do imposto suportado na aquisição de bens e serviços, incluindo aqueles bens ou serviços que sejam objeto de utilização exclusiva em operações que não confiram esse direito, têm de utilizar, em alternativa o método da afetação real ou o denominado método da percentagem. E, tanto um como outro, são formas de prosseguir a aplicação prática do direito financeiro da dedução de IVA contido em bens e serviços da chamada utilização promíscua.

xii. (...);

xiii. 42. No âmbito da sua atividade, a Contribuinte (...) realiza operações sujeitas a imposto e operações isentas, umas com direito à dedução e outras sem direito à dedução. E, para efeitos do exercício desse direito utilizava, à data dos factos em apreço, o já referido método da percentagem;

xiv. Para efeitos da determinação da mencionada percentagem de imposto a deduzir, a respetiva fração, no numerador, abarca as operações tributadas e isentas com direito à dedução, contemplando no denominador, o volume de negócios anual do sujeito passivo;

xv. 44. Nestes termos a Contribuinte (...) aquando do ano de 2007, apurou então uma percentagem definitiva de 8, imediatamente resultante da fração composta, no seu numerador, pelo valor de € 178 535 076,69 e, no respetivo denominador, o volume de negócios correspondente ao montante de € 2 548 734 055,86;

xvi. 45. Ora, conforme detetado pelos Serviços de Inspeção Tributária, para o numerador da dita fração, concorreram então, entre operações isentas com direito à dedução, excluindo o respetivo imposto, as importâncias respeitantes a crédito ao exterior com dedução e a crédito à exportação com dedução, no montante, respetivamente de € 78 550 534,23 e de € 2 392 147,00;

xvii. 46. As referidas situam-se no âmbito das isenções completas ou taxa zero, visto que, para além de isentas de imposto nos termos do artigo 9/27. a) CIVA, conferem ainda assim direito à dedução desde que, ao abrigo do artigo 20º, nº 1, alínea b), ponto IV, do CIVA, o destinatário das prestações se encontre estabelecido ou domiciliado fora da União Europeia ou que estejam diretamente ligadas a bens, que se destinem a ser exportados para países terceiros;

xviii. 47. Contudo e quanto aqueles valores, os mesmos não foram materialmente transpostos e imputados à formula em razão da sua efetividade e concretização. Antes pelo contrário, o montante anual das operações de crédito com direito à dedução, efetuadas com referência a não comunitários, assentou, única e somente, numa mera proporção entre aquele e o cômputo do crédito global concedido;

xix. 48. Ou seja, e por outros vocábulos: tudo como se tivesse havido uma pro-ratização prévia quanto a este tipo de contribuem para a fórmula de apuramento do imposto a deduzir não passem de uma mera percentagem, quando, na verdade, deveriam diretamente representar operações concretas e materialmente definidas;

xx. 49. Foi por este fundamento que caminharam os SIT no sentido da efetivação da correção técnica aqui proposta (...). E constando os exercícios posteriores, facilmente se vê que a Contribuinte (...) também seguiu por esse itinerário, aderindo ao entendimento vertido no relatório final;

xxi. 50. Mais: nem se pretenda confundir a aplicação do método do pro-rata e seu desiderato, com a composição dos elementos da fração. São coisas completamente distintas;

xxii. 51. Ainda mais: nem se ouse de modo algum contrapor com a idoneidade do procedimento registral levado a cabo pela entidade analisada. Não foi isso que os SIT questionaram, pois, na verdade, e não mais do que isso, o que importa para estes efeitos - a composição da fração - é direta e inequivocamente representatividade efetiva e material dos montantes que ab initio contribuem para a fórmula;

xxiii. 52. Por último não se diga também (...) que a Contribuinte (...) aquando do procedimento inspetivo, comprovou de forma inequívoca de forma a suportar o que foi por si declarado. Nem perto disso. Aliás, não o fez nem nessa sede nem agora por via do pedido gracioso. Isto, claro está, não obstando ser sabido que se, por um lado, ao sujeito passivo incumbit onus probandi, por outro, para efeitos das atribuições e competências da Autoridade Tributária e Aduaneira, a contabilidade é uma coisa e a fiscalidade outra. É que, in casu, estamos a falar de um procedimento administrativo de inspeção tributária levado a cabo pelos SIT;

xxiv. 53. Posto isto, tendo sn casu, perfeito cabimento o recurso ao método pro-rata, corroboramos do entendimento perfilhado pelos SIT, conforme vertido as conclusões do relatório final, no sentido de proceder ao ajustamento da percentagem de dedução, diminuindo-a dos 8%, antes apurados pela Contribuinte (...), para os 4%, da qual resultou a liquidação adicional de imposto, no montante de € 2 075 672,23 (...), acrescida dos juros compensatórios, determinados (...) em conformidade com o disposto na norma inserta no artigo 350 da LGT;

xxv. (...);

K) 0 despacho de deferimento parcial da reclamação graciosa, identificado na alínea I), foi comunicado ao Impugnante por carta registada em 2012.02.07 (cf. fls. 100 a 101 do PA-RG);

L) Em 2012.02.27, no Tribunal Tributário de Lisboa deu entrada a presente impugnação (cf. fls. 2 do processo em papel).”

A sentença recorrida considerou não existirem factos não provados “com relevância necessária e suficiente à decisão final a proferir, à luz das possíveis soluções de direito.”.

A motivação do Tribunal a quo assentou, nos seus termos, “nos documentos e informações constantes do processo e no depoimento da testemunha ouvida, P..... que ao tempo dos factos trabalhava para a Impugnante, que apesar de convicto, prestou depoimento vago e pouco pormenorizado”.

*

[Fundamentação de direito 1.ª instância]

“1. Da preterição de formalidades legais

Defende a Impugnante a infração aos princípios da transparência e da imparcialidade pelo facto de o Inspetor P..... ter realizado atos de inspeção externa, ter elaborado e subscrito o relatório final da inspeção, tendo depois preparado as informações subjacentes à tomada de decisão de deferimento parcial da reclamação administrativa apresentada.

Sem embargo do dever de os órgãos e agentes administrativos atuarem e se apresentarem sem dúvidas, com justiça e imparcialidade no exercício das suas funções, dever esse que é um princípio fundamental da Administração Pública, com consagração constitucional, desde já adiantaremos que as relatadas circunstâncias, de o Inspetor ter colaborado na feitura do relatório de inspeção e depois elaborado a informação na qual foi exarado o despacho do Diretor de Serviços, nos parecem inócuas para a transparência do procedimento de inspeção e sobretudo para a liquidação efetuada, em face de ter sido o Diretor de Serviços a proferir o despacho que decidiu, por fim, a reclamação graciosa apresentada.

Anote-se que a sanção para a infração ao disposto no artigo 44° do Código de Procedimento Administrativo (CPA), com a redação coeva, era a de anulabilidade do ato (artigo 51/1 CPA), e que em casos, como o dos autos, a anulabilidade do procedimento de reclamação graciosa não arrastaria consigo o ato de liquidação que a antecedeu.

O artigo 44/1.g) do CPA contém outro afloramento e garantia do princípio da imparcialidade administrativa que o Impugnante diz também ter sido violado.

Como é natural, visa evitar que o autor do ato recorrido volte a intervir de forma decisiva no procedimento de 2o grau (na impugnação administrativa), da mesma forma com que o fizera no procedimento de Io grau (no termo do procedimento de inspeção).

Ou seja, tem em vista, não só impedir a sua intervenção direta na decisão da impugnação, mas também evitar ingerências que condicionem ou determinem de forma praticamente irremediável a decisão do recurso em termos tais que impliquem a manutenção do conteúdo decisório do ato objeto do recurso .

Uma coisa é a intervenção da entidade a quo, de forma direta ou relevante, na decisão do recurso, que está vedada por lei, e outra a sua intervenção a título meramente esclarecedor da posição tomada ou da sua sustentação, que nenhum destes casos é atentatório do interesse público que com o impedimento se pretendeu prevenir, [cf. Ac. STA, Pleno da Secção do CA, de 1997.05.14, Proc. n° 029582 (Rei.: Conselheiro Rui Pinheiro) , e Ac. STA, 1.ª Subsecção do CA, de 2004,10.07, Proc n° 01851/03, (Rei.: Conselheiro Cândido de Pinho) , disponíveis em www.dgsi.pt)].

Ora, nada impede a intervenção do autor da informação subjacente ao ato administrativamente impugnado mesmo que o decisor se limite a concordar com o teor da informação subjacente. Tal intervenção não extravasou, pois, o âmbito dos poderes que o artigo 172° do CPA lhe cometia .

Quanto a esta questão não tem, pois, razão o Impugnante.

2. Da carência da fundamentação da decisão que decidiu a reclamação graciosa

A decisão da reclamação graciosa impugnada tem por base os diversos elementos do processo, nomeadamente o relatório dos Serviços de Inspeção Tributária e a informação elaborada pela Unidade dos Grandes Contribuintes que a decisão do Diretor acolhe.

Doutrinária e jurisprudencialmente é certo exigir-se à motivação dos atos tributários um texto suficientemente revelador do percurso cognoscitivo empreendido pelo agente para a sua prática. E não preenche a exigência constitucional e legal qualquer recurso estilístico que não esclareça ou oculte a motivação de facto e de direito presidente à decisão: o Contribuinte terá, em suma, de ficar a saber por linguagem clara as razões que o atingem e lhe impõem um desembolso fiscal.

Equivalem, entretanto, à falta de fundamentação os fundamentos adotados que por insuficiência, obscuridade ou incongruência não esclareçam concretamente os motivos de facto e de direito das decisões.

E em sede de fundamentação dos atos tributários, a lei impõe quer a chamada fundamentação substancial {existência dos pressupostos reais e dos motivos concretos aptos a suportarem uma decisão legítima de fundo ), cuja inexistência fere o ato em causa de vício de ilegalidade relativo ao conteúdo, quer a fundamentação formal do ato administrativo, cuja inexistência ou insuficiência fere o ato em causa de vício de ilegalidade relativo à forma.

No que diz respeito à questão formal da motivação do ato em crise teremos de concluir pela sua suficiência: o ponto de vista relevante para avaliar a suficiência da fundamentação deve ser a do destinatário médio, colocado na situação concreta, devendo dar-se por cumprido o dever legal se a motivação contextual mente externada permite àquele entender as razões de facto e de direito que determinaram o autor do ato a agir e/ou a escolher a medida adequada . Com efeito, os motivos do ato administrativo hão de ser claramente expressos e compreensíveis pelo destinatário, tal como é a própria constituição que o impõe, e articulados entre a previsão normativa e o complexo da situação real do contribuinte que convoca a norma a aplicar, neste caso, a norma que preside à determinação do quantum da liquidação.

Ora, o despacho do Diretor que incorpora a informação de 2012.01.31, embora muito sucinto, é claro e comporta uma decisão que não deixa dúvidas, mas não é apenas nesse sentido que a CRP exige clareza às decisões administrativas: terão de ser inteligíveis e nessa sua inteligibilidade conter enfim os elementos racionais da subsunção à norma invocada.

Contudo, a fundamentação deve também ser adequada à importância e circunstância da decisão. A fundamentação da decisão deve, pois, permitir o exercício esclarecido do direito ao recurso e assegurar a transparência e a reflexão decisória, convencendo e não apenas impondo.

No caso, a Impugnante bem percebeu os atos de liquidação adicional e a decisão que deferiu parcialmente a reclamação apresentada e exerceu o direito a impugnar os mesmos.

Os atos encontram-se, pois, suficientemente fundamentados: não tem, assim, razão o Contribuinte quanto a esta questão.

3. De fundo:

O Impugnante é uma instituição financeira que exercia a sua atividade em território nacional e no estrangeiro, realizando operações sujeitas a IVA, operações isentas sem direito à dedução, nos termos do artigo 9/27 do CIVA e operações isentas com direito a dedução, nos termos do artigo 20° CIVA (na redação conferida pelo DL n° 102/2008, de 20 de Junho).

Nos termos do artigo 12/1.a) CIVA , estes sujeitos passivos podiam renunciar à isenção, optando pela aplicação do imposto às suas operações, exercendo o direito de opção mediante a entrega no Serviço de Finanças competente da declaração de início de atividade ou e alterações, consoante os casos, produzindo efeitos a partir da data da sua apresentação (artigo 12/2 CIVA), enquanto o direito à dedução do imposto obedeceria às regras constantes dos artigos 19° e seguintes, salvo o disposto em normas complementares especiais (artigo 12/7 CIVA).

Por seu turno o artigo 23/1 previa o chamado método de percentagem de dedução ou método pro-rata: quando o sujeito passivo, no exercício da sua atividade, efetue transmissões de bens e prestações de serviços, parte dos quais não confira direito à dedução, o imposto suportado nas aquisições é dedutível apenas na percentagem correspondente ao montante anual de operações que deem lugar a dedução.

A percentagem da dedução era proporcional ao valor das operações tributáveis e isentas com direito à dedução em relação ao volume de negócios total.

O Impugnante, porém, põe em causa precisamente o cálculo da percentagem de dedução utilizado.

Como ensina Clotilde Celorico Palma , tendo em consideração a possibilidade do direito à dedução em sede de IVA temos duas modalidades de isenções: (a) isenções completas, totais, plenas ou que conferem o exercício do direito à dedução do IVA suportado; (b) isenções incompletas, simples, parciais ou que não conferem o direito à dedução do IVA suportado.

Nas isenções completas, o sujeito passivo beneficiário não liquida imposto nas suas operações ativas (transmissões de bens ou prestações de serviços efetuadas) e, tem o direito a deduzir o IVA suportado para a respetiva regularização.

Nas isenções incompletas, o sujeito passivo beneficiário não liquida imposto nas suas operações ativas, mas não tem o direito a deduzir o IVA suportado para a respetiva realização.

Os sujeitos passivos mistos, para efeitos do exercício do direito à dedução do imposto suportado, podem optar pelos seguintes métodos: (a) método pro-rata ou da percentagem da dedução; (b) método da afetação real,

O método pro-rata é o que, em regra, se aplica às empresas mistas com atividades económicas distintas.

De acordo com este método, o sujeito passivo calcula a sua percentagem do direito à dedução através de uma fração que comporta no numerador o montante anual das operações que conferem o direito à dedução com o imposto excluído e, no denominador, o montante anual de todas as operações, com o imposto excluído. O imposto é dedutível apenas na percentagem correspondente ao montante anual de operações que deem lugar à dedução.

O método pro-rata funciona como um mecanismo corretor do direito à dedução, o imposto é dedutível apenas na percentagem correspondente ao montante anual de operações que deem lugar a dedução .

No artigo 9/27 CIVA temos uma regra específica de isenção. Estão isentas do imposto: (a) a concessão e negociação de créditos, sob qualquer forma, compreendendo operações de desconto e redesconto, bem como a sua administração ou gestão efetuada por quem os concedeu; (b) a negociação e a prestação de fianças, avales, cauções e outras garantias, bem como a administração ou gestão de garantias de créditos efetuadas por quem os concedeu; (c) as operações, compreendendo a negociação, relativas a depósitos de fundos, conta-correntes, pagamentos, transferências, recebimentos, cheques, efeitos de comércio e afins, com exceção das operações de simples cobrança de dívidas; (d) as operações, incluindo a negociação, que tenham por objeto divisas, notas bancárias e moedas, que sejam meios legais de pagamento, com exceção das notas e moedas que não sejam normalmente utilizadas como tal, ou que tenham interesse numismático; (e) as operações e serviços, incluindo a negociação, mas com exclusão da simples guarda e administração ou gestão, relativos a ações, outras participações em sociedades ou associações, obrigações e demais títulos, com exclusão dos títulos representativos de mercadorias e dos títulos representativos de operações sobre bens imóveis quando efetuadas por um prazo inferior a 20 anos; (f) os serviços e operações relativos à colocação, tomada e compra firmes de emissões de títulos públicos ou privados; (g) a administração ou gestão de fundos de investimento.

Apesar desta isenção se configurar tecnicamente como incompleta, as operações financeiras isentas conferem direito à dedução do IVA quando o destinatário esteja estabelecido ou domiciliado fora da União Europeia ou quando estejam diretamente ligadas a bens que se destinam a ser exportados para países terceiros .

Por outro lado, a isenção não é suscetível de renúncia e tem natureza objetiva, não dependendo a sua concessão da natureza do prestador (instituição bancária ou financeira), mas sim das caraterísticas da operação efetuada.

Na sequência da inspeção à escrita do Impugnante os Serviços de Inspeção Tributária (SIT) procederam à correção do cálculo do pro-rata, reajustando a percentagem a considerar na dedução,

No caso dos autos, cabia à Autoridade Tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da tributação, e ao contribuinte o ónus de prova da existência dos factos tributários que alega como fundamento do seu direito .

Naturalmente que uma fiscalização tem de versar sobre os elementos contabilísticos dos contribuintes e é daí que se prescreva a obrigação legal de manter uma contabilidade organizada de forma a possibilitar o conhecimento claro e inequívoco dos elementos necessários ao cálculo do imposto, bem como a permitir o seu controle, comportando todos os dados necessários ao preenchimento da declaração periódica do imposto.

Esta obrigação, se constitui um ónus para o contribuinte, comporta também, por outro lado, uma outra faceta: uma contabilidade organizada em tais termos constitui a sua garantia de defesa perante a Autoridade Tributária e Aduaneira.

Em causa está a desconsideração para o cálculo da percentagem, no numerador da fração, das operações relacionadas com "Proveitos relacionados com Crédito ao Exterior com dedução" e "Proveitos de Crédito à exportação".

Todavia, a não-aceitação assentou em que aqueles valores não se encontrarem devidamente documentados e evidenciados na contabilidade, depois, por não se acharem devidamente comprovados por registos em contas proveitos, conforme se pode ler no relatório transcrito supra em III.a).C).

A questão a decidir não se prende, pois, com a qualificação das verbas ou categoria das operações ativas mas antes com cumprimento dos deveres formais do exercício do direito à dedução

Com efeito, atendendo aos dados de facto apurados em sede de fiscalização, incumbia ao Impugnante demonstrar que, não obstante, as aludidas transações haviam realmente sido realizadas, com aquelas características da contraparte estar estabelecida ou domiciliada fora do território da Comunidade. Na verdade, no caso impendia sobre o Impugnante essa comprovação

Para o efeito e em sede de impugnação judicial, o Contribuinte apenas trouxe prova testemunhal, que não convenceu quanto a esta questão.

Não pode, pois, ser dada razão ao Impugnante.

4. Dos juros compensatórios

O Impugnante não se conforma com a liquidação de juros compensatórios, defendendo que a Autoridade Tributária e Aduaneira não carreou factos que demonstrem o nexo de causalidade entre a atuação da Contribuinte e o retardamento da liquidação.

É certo que o relatório da inspeção e a liquidação não se pronunciam sobre os motivos da liquidação dos juros compensatórios, defendendo a Autoridade Tributária e Aduaneira, ao arrepio do alegado pelo Impugnante, que a obrigação de juros decorre da automaticamente da lei e que a decisão sobre juros não necessita de qualquer justificação autónoma.

Vejamos:

São devidos juros compensatórios sempre que, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido (...) ou obtido reembolso indevido, acrescem ao montante do imposto juros compensatórios à taxa e nos termos previstos no artigo 350 da Lei Geral tributária (artigo 89/1 CIVA),

0 artigo 35° da LGT diz:

1 - São devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido (...).

7 - Os juros compensatórios só são devidos pelo prazo máximo de 180 dias em caso de erro do sujeito passivo evidenciado na declaração ou, em caso de falta apurada em ação de fiscalização, até aos 90 dias posteriores à sua conclusão.

8 - Os juros compensatórios integram-se na própria dívida do imposto, com a qual são conjuntamente liquidados.

9 - A liquidação deve sempre evidenciar claramente o montante principal da prestação e os juros compensatórios, explicando com clareza o respetivo cálculo e distinguindo-o de outras prestações devidas (...).

E jurisprudência dos Tribunais Superiores que a responsabilidade por juros compensatórios tem a natureza de uma reparação civil e, por isso, depende do nexo de causalidade adequada entre o atraso na liquidação e a atuação do contribuinte, bem como da possibilidade de formular um juízo de censura à sua atuação (a título de dolo ou negligência) .

A questão colocada pelo Contribuinte relativa à não demonstração do nexo de causalidade entre a sua atuação e o retardamento da liquidação, por derivar de uma divergência de critérios entre a Autoridade Tributária e Aduaneira e o Contribuinte, cumpriria aquela demonstrar a existência da culpa do sujeito passivo nesse retardamento.

Todavia, a responsabilidade por juros compensatórios depende, portanto, de nexo causal adequado entre o atraso na liquidação e a atuação do contribuinte, bem como da possibilidade de formular um juízo de censura à sua atuação (a título de dolo ou negligência) .

Ora, como vimos já, a decisão em causa funda-se nos diversos elementos do processo, nomeadamente no Relatório da Inspeção Tributária, que a decisão do Diretor de Finanças acolhe. Esse relatório e a decisão referida, revelam-se, portanto, os elementos estruturantes da liquidação de juros em crise.

Contudo, a Autoridade Tributária e Aduaneira limita-se a indicar a quantia sobre a qual os mesmos incidem, o período de tempo considerado para a liquidação e a taxa aplicada.

Ora, e continuando a acolher a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, com a qual concordamos e de que citamos o Ac. STA, 2ª Seção, de 2016.03.09, Proc n° 0805/15 (Rei.: Conselheiro Casimiro Gonçalves) , disponível em www.dgsi.pt.: (...) relativamente ao ato de liquidação de juros, a jurisprudência do STA tem firmado entendimento no sentido de que a fundamentação mínima exigível para esses atos de liquidação (juros) deve indicar a quantia sobre a qual os mesmos incidem, o período de tempo considerado para a liquidação e a taxa ou taxas aplicadas, com menção desses elementos no próprio ato de liquidação ou por remissão para documento anexo .

No caso em análise, é patente que na liquidação impugnada, emitida em 2010.02.09, os juros compensatórios são computados no montante de € 155 360,13, nos termos da demonstração de liquidação de juros, transcrita na alínea E) do probatório.

Nessa demonstração de liquidação de juros explica-se que ela diz respeito juros compensatórios de IVA do período 0712, sobre o valor-base de € 2 087 866,22, calculados de 2008.02.11 a 2009.12.21, à taxa anual dos juros legais, não fazendo referência aos diplomas legais que preveem as taxas aplicadas.

Como ensinam Diogo Leite de Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa (...) o conhecimento integral do itinerário valorativo e cognoscitivo seguido peia entidade que liquidar os juros não dispensará:

- a indicação do montante dos juros, separado do montante do tributo, se for liquidado concomitantemente;

- os termos inicial e final da contagem dos juros;

- a taxa ou taxas e os períodos a que se reporta cada uma delas, se não for a mesma taxa aplicada para o cálculo da totalidade dos juros;

- a indicação dos diplomas legais que preveem a responsabilidade por juros compensatórios e os que preveem as taxas aplicadas;

- a situação fáctica violadora da lei que justifica a liquidação dos juros ou os factos que levaram a Administração Tributária a concluir que o atraso na liquidação se deveu a atuação culposa do contribuinte"

Contudo, a Autoridade Tributária e Aduaneira nada diz quanto a este tema, limitando-se a indicar a quantia sobre a qual os mesmos incidem, o período de tempo considerado para a liquidação não fazendo referência à taxa aplicada.

Tem, pois, razão a Impugnante quanto a esta última e subsistente questão.”

*

Começando pelas questões suscitadas pela F.P., importa aquilatar da invocada nulidade da sentença por excesso de pronúncia , a qual, como é consabidamente conhecida , se afere pelo objecto processual colocado pelas partes , por um lado, e em resultado do pedido pelas partes , por outro. Ora, é patente que a causa de julgado em matéria de condenação do ora recorrido em juros compensatórios se identifica com a causa de pedir do mesmo no processo, sendo que o julgado coincide com o pedido formulado nos autos quanto à pretensa ilegalidade dos juros compensatórios apurados pelo recorrente. E tanto é assim que o Tribunal A Quo, pronunciou-se sobre tal questão suscitada nos autos, tendo entendido que tais juros não seriam devidos por padecerem de vício, não apenas de forma, como pretende a F.P., mas de erro sobre os pressupostos de direito da sua percepção, por falta de indicação do cálculo no seu apuramento reportado à indicação das taxas de juro aplicáveis ao período em que se verificou o retardamento da liquidação do tributo por facto imputável ao contribuinte, enquanto elemento aferidor da justa compensação do Estado pelo dano causado ao Estado na liquidação do imposto. Assim, considerado tal problemática, é evidente que o que é assacado à sentença sub Júdice é o erro de julgamento de direito por o Tribunal A Quo ter considerado que padecia de falta de fundamentação substancial no apuramento dos juros compensatórios por não haver indicado qual a taxa de juro devido por aquele retardamento do tributo por facto imputável ao contribuinte.

Atento a que o Tribunal não está vinculado às alegações das partes no que toca à aplicação das regras de direito, nos termos do disposto no nº3, do artº 5º do CPC, sendo que o alegado vício de erro de julgamento só se imporá em caso de se decidir sobre a validade do acto tributário controvertido. Improcede assim a arguida nulidade arguida pela Recorrente.

*

Quanto ao recurso deduzido pela Impte, sustenta-se a mesma na alegada omissão de pronúncia prevista na primeira parte da alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, por não se haver pronunciado sobre a questão suscitada nos autos quanto ao valor considerado no pro rata encontrar correspondência na contabilidade da sociedade, tendo registado tais aplicações financeiras em contas de proveitos e dotadas dos respectivos documentos comprovativos, ao contrário do sustentado pela Adm Fiscal. Ora,

Nessa sede, a 1ª Instância refere-se abundantemente ao relatório da I.T. convocando toda a análise contabilística da empresa, tendo mencionado que tais operações relativas a serviços financeiros prestados pelo s.p., maxime as de concessão de crédito a entidades exteriores à U.E, ou de auxilio à exportação de bens através de operações de seguro e resseguro, não estavam devidamente apoiadas na respectiva contabilidade dos proveitos da empresa, assim como dotadas de documentos de suporte que permitissem a sua consideração para efeitos de direito à dedução dos encargos suportados a montante e relativos às ditas operações isentas de imposto mas com direito à restituição do imposto, em razão dos destinatários estejam estabelecidos ou domiciliados fora da U.E, ou quando se encontrem directamente relacionadas com bens destinados à exportação para países não pertencentes à U.E (as chamadas isenções completas). E por assim ser, improcede a aludida nulidade.

Quanto à falta de fundamentação de facto da sentença em razão da falta efectiva e funcional da decisão de facto quanto à motivação da decisão por omissão da análise critica da prova ( cfr nºs 3 e 4, do artº 607º, do CPC). Ora, como se deixou dito na sentença quanto aos motivos que determinaram o tribunal a considerar tais operações como não excluídas do regime de isenção com direito à dedução de imposto suportado (isenções completas), que as mesmas se sustentam, “…nos documentos e informações constantes do processo e no depoimento da testemunha ouvida, P..... que ao tempo dos factos trabalhava para a Impugnante, que apesar de convicto, prestou depoimento vago e pouco pormenorizado”. É certo que que dos elementos trazidos aos autos e relativo aos extractos das contas de proveitos da Impte, embora se indicasse que determinadas operações foram realizadas com destinatários estabelecidos ou domiciliados fora da U.E. ou que se destinem a ser exportados para países não pertencentes á mesma Comunidade, das mesmas não resultavam a comprovação documental de tal qualidade de tais operadores.

E por assim ser não se verifica a aludida nulidade.

Quanto ao erro de julgamento de facto, e sua concreta impugnação, importa referir que analisados os concretos pontos de facto que a recorrente considera incorrectamente julgados , i.e. o entendimento que no apuramento do pro rata deveria considerar no numerador os valores reais de tais operações que conferem o direito à dedução do imposto e não uma fração do total dos créditos concedidos, não sendo possível determinar com a devida efectividade e concretização das operações que permitiam ser consideradas como operações de crédito ao exterior e de crédito à exportação , assim como os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida reportada aos elementos juntos aos autos em sede de direito de audição e dos documentos apresentados com a reclamação , os quais impunham decisão diversa dos factos assim impugnados, sendo que a decisão a proferir teria de ser no sentido de se constatar a existência de elementos que identificavam correctamente as operações que conferiam o direito á dedução do imposto por se encontrarem devidamente evidenciados as contrapartes de tais operações, as quais sustentam o ónus de impugnação da decisão sobre a matéria de facto, nos termos do disposto no artº 640º do CPC., resulta que , os elementos assim trazidos aos autos apenas permitem afirmar que , na elaboração dos extractos das contas de resultados, faz-se menção da existência de referências apostas em tais elementos contabilísticos que indicam que determinados lançamentos nos extractos das contas de proveitos, foram efectuadas com entidades externas à U.E., sendo que as mesmas não se referem aos respectivos documentos de suporte que as sustentam, nem foram objecto de registo de forma discriminada e necessariamente evidenciadas os valores das operações isentas com direito à dedução do imposto, como o impõe a alínea c), do nº3, do artº 44º do CIVA , que permitissem possibilitar o conhecimento claro e inequívoco dos elementos necessários ao cálculo do imposto e permitir o seu controlo, pelo que tais elementos só por si, desacompanhados dos documentos comprovativos que suportem os lançamentos contabilísticos , não são suficientes para alterar os factos dados como provados quanto á decisão sobre os mesmos.

Questão diferente é se os elementos juntos aos autos, per se, são suficientes para se poder concluir pela improcedência, conforme realizado pelo Tribunal a quo.

E a resposta a esta questão é negativa, porquanto se entende que a decisão recorrida padece de deficit instrutório, conforme se demonstra de seguida”. Note-se que,

Relativamente aos documentos da contabilidade, o Impte alegou, logo na p.i , que caso se entendesse como necessário , poderiam ser juntos os contratos que titulavam aquelas operações , sendo reafirmado em sede de audição das testemunhas que existiam documentos , designadamente facturas e contratos, que titulassem tais operações financeiras com tais contrapartes não residentes na U.E., os quais identificavam devidamente tais mútuos e operações de seguro, os montantes envolvidos , as condições de concessão de crédito acordadas pelas partes , os juros que se venceriam e demais condições apostas em tais acordos, as quais seriam então susceptíveis de sustentar a existência e a necessária quantificação de tais operações que conferiam o direito á dedução do imposto suportado e devidamente considerados no numerador do dito pro rata.

Face ao aludido deficit instrutório não se pode afirmar, sem dúvidas, se da documentação já disponibilizada com a que se encontra no poder da Recorrente é possível a cabal identificação da operação, da natureza, e do beneficiário da mesma.

É certo que, como já evidenciado, a documentação carreada aos autos não se afigura, per se suficiente, mas fica-se sem saber se de acordo com os elementos que a Recorrente alude que estão em seu poder, poderia ser feita uma correspondência cabal e completa como alegado.

Aliás, face à especialização que envolve a documentação em causa, entende-se vital a nomeação de uma Peritagem singular ou colectiva para que possa responder, designada e cabalmente, às seguintes questões:

1)Face à documentação carreada aos autos de reclamação graciosa e a ulteriormente junta é possível transpor da contabilidade dos Recorrentes para os balancetes contabilísticos mensais os valores considerados pelos Recorrentes para o cálculo do seu pro-rata?

2)Todos os lançamentos de proveitos de todas as operações de concessão de crédito encontram correspondência nos documentos de suporte à contabilidade dos Recorrentes?

Assim, dado que tal actividade instrutória tendente a apurar a veracidade dos factos cabia também ao Tribunal , que lhe competia ordenar todas as diligências que considerasse úteis ao apuramento da verdade material, e atento que a sustentação das ditas operações poderiam ser consideradas com base nas ditas referências à necessária facturação de tais operações que permitiam legitimar possíveis razões para alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, por entender que dos factos tidos por assentes , da prova produzida ,ou dos documentos apresentados em sede de reclamação graciosa , poderiam resultar decisão diversa da assim proferida- vd nº1, do artº 662º do CPC.

Assim verifica-se um défice instrutório , por ser certo que tais empresas que pratiquem operações que deem direito à dedução do imposto em tais operações isentas (isenção completa),estavam obrigados, entre outras, a emitir uma factura ou documento equivalente por cada prestação de serviços por si efectuada, bem como dos pagamentos que lhe foram efectuados antes da prestação de serviços, nos termos do disposto na alínea b), do nº 1, do artº 29º, do CIVA, “ ex vii”, do nº3, do mesmo preceito legal, ainda que a contabilidade não contivesse o registo das operações por si efectuadas de forma a evidenciar o valor das operações isentas com direito a dedução, nos termos do disposto na alinea c), do nº 3, conjugado com a alinea a), do nº 2, do artº 44º do CIVA, porquanto a obrigação de facturação é sempre a causa do direito à dedução do imposto nas ditas operações que conferem o direito á respectiva dedução Ora,

Tal verificação cabia à 1ª Instância, de acordo com o principio do inquisitório e da descoberta da verdade material, com fundamento na indagação do cumprimento das obrigações de facturação do recorrente, nos termos do disposto nos artºs 76º e segs, do CIVA, que permitissem verificar ou infirmar quais as operações isentas que conferiam aquele direito á dedução do imposto suportado, que lhe permitissem apurar uma percentagem de dedução tanto quanto possível mais próximo da realidade,.

Na medida em que , não constando do processo todos os elementos que permitissem decidir sobre pontos determinantes da matéria de facto, quanto á realização de tais operações financeiras e de seguros com o exterior da Com. Europeia, considera-se indispensável a ampliação dos factos apurados, nos moldes já evidenciados, solicitando toda a documentação supra evidenciada e a demais que se afigure relevante para o efeito, e ordenando, como já evidenciado anteriormente, e face às especificidades e especialização que a questão reveste, a realização de uma peritagem, sendo, assim, anulada a decisão na 1ª instância. – cfr nesse sentido e em situação similar, o Ac. deste TCA, de 30.10.2007, proferido no processo nº 1625/07.

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Dispositivo:

Nos termos expostos improcede o recurso da F.P. e é dado provimento ao recurso , anulando-se a sentença recorrida , impondo-se proceder á ampliação da matéria de facto por forma a poder apurar –se se se verificaram operações tituladas por contratos de mútuo ou de outras operações financeiras estabelecidas com entidades que se encontrem fora do E.E.E.., que permitissem a fixação de um diferente pro rata das operações assim determinadas.

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Custas pela F.P.

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Atento o valor da causa de valor superior a € 275.000,00 , considerando a que a causa não apresenta especial complexidade e atendendo á conduta processual das partes que não recorreram a quaisquer meios dilatórios, prolixos ou morosas , e no intuito de assegurar o respeito do principio constitucional da proporcionalidade face à utilidade económica da causa, decide-se no sentido da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça superior àquele montante.- cfr nº7, do artº 6º do R.C.P. e nº7, do artº 530º do CPC, e Ac. Do T.C. nº 421/2013 , proferido no recurso nº 907/2012.

Notifique.

[O relator consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Senhores Desembargadores Mário Rebelo e Patrícia Manuel Pires ]