Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2200/17.5BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:10/10/2019
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL;
CRÉDITOS LABORAIS;
PRAZO
Sumário:i) Nos termos do n.º 4 do art. 2.º do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril (alterado pela Lei n.º 71/2018, de 31 de Dezembro): “[o] Fundo assegura o pagamento dos créditos previstos no n.º 1 que se tenham vencido nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência ou à apresentação do requerimento no processo especial de revitalização ou do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas”.

ii) Os créditos fora desse período, ainda que existam e estejam reconhecidos, não podem ser pagos pelo Fundo de Garantia Salarial.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

Maria .......... (Recorrente) vem interpor recurso jurisdicional da sentença do TAC de Lisboa que julgou improcedente a acção administrativa que instaurou contra o Fundo de Garantia Salarial (Recorrido), no qual impugnou o despacho de 20.10.2016 do Presidente do Conselho de Gestão daquele Fundo que indeferiu o pedido de pagamento dos créditos laborais à A. em consequência da cessação do contrato de trabalho e declaração de insolvência da sua entidade patronal, bem como a condenação do ora Recorrido no pagamento dos valores/créditos laborais emergentes da cessação do contrato de trabalho (no valor de reclamado de EUR16.600,00).

Em sede de alegações, a Recorrente concluiu do seguinte modo:

A) Por Sentença proferida no âmbito de acção declarativa emergente de contrato individual de trabalho sob a forma de processo comum, foi o despedimento da Recorrente considerado ilícito e a entidade patronal condenada no pagamento de uma indemnização no v alor das retribuições que a Recorrente deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial, acrescido de créditos salariais;

B) Uma vez que a entidade empregadora não se encontrava insolvente, a Recorrente não pode apresentar o Requerimento para Pagamento de Créditos Emergentes do Contrato de Trabalho, junto da Segurança Social, pois tal verificação consubstanciava um dos requisitos para o efeito;

C) Tempestivamente, a Recorrente requereu junto da Segurança Social a concessão de Apoio Judiciário, a fim de lhe ser nomeado(a) oficiosamente um Advogado(a), para requerer a insolvência da entidade empregadora;

D) Resulta do artigo 1.º, alínea a) do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (DL n.º 59/2015, de 21 de Abril que “O Fundo d e Garantia Salarial, abreviadamente designado por Fundo, assegura o pagamento ao trabalhador de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação, desde que seja: Proferida sentença de declaração de insolvência do empregador.”

E) A Recorrente obedecia a todos os requisitos legalmente exigíveis para o ressarcimento dos valores a título de créditos emergentes da cessação do contrato de trabalho, pois tinha um contrato de trabalho com empregador com actividade em Portugal e a entidade empregadora ficou a dever-lhe quantias –– cfr. art 2º, nº 1 cfr. art 2º, nº 1 –– conforme judicialmente reconhecido por Sentença.

F) “O Fundo de Garantia Salarial, abreviadamente designado por Fundo, assegura o “O Fundo de Garantia Salarial, abreviadamente designado por Fundo, assegura o pagamento ao trabalhador de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação, desde que seja: Proferida sentença de declaração de insolvência do empregador.” - 1.º, alínea a) do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (DL n.º 59/2015, 1.º, alínea a) do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (DL n.º 59/2015, de 21 de Abril;

G) A Recorrente requereu o Apoio Judiciário junto da Segurança Social para ser nomeado um(a) Advogado(a) Oficioso(a) para requerer a insolvência da entidade empregadora dentro do período de um ano após a cessação do contrato de trabalho, quer terminou às 24 horas de 28.4.2015

H) A Recorrente apresentou o Requerimento para o pagamento dos créditos junto da Recorrida a 18.8.2016, uma vez que esteve sempre dependente dos procedimentos inerentes à concessão do Apoio Judiciário, caracterizado pela sua morosidade.

I) A Recorrente deu sempre impulso processual tempestivamente e junto das entidades responsáveis para os devidos efeitos

J) Não lhe pode ser recusado um direito que lhe foi reconhecido judicialmente em virtude da morosidade burocrática caracterizadora do acesso à justiça mediante a concessão de apoio judiciário que visa precisamente defender os direitos, liberdades e garantias pessoais, constitucionalmente consagrados

K) Mas que, in casu, se revelou prejudicial para a Recorrente que, embora tendo sempre agido tempestivamente, se viu impedida de reaver a quantia monetária pela qual a Recorrida é responsável.

L) Os créditos da autora venceram se dentro do período legalmente previsto pelo art 2º, nº 4 do DL nº 59/2015, pois é entendimento de que deve ser tido em consideração a data em que a Recorrente requereu a concessão do Apoio Judiciário.

M) “O Fundo de Garantia Salarial (FGS), antes e agora, tem como objetivo assegurar o pagamento ao trabalhador de créditos resultantes do contrato de trabalho ou da violação (despedimento ilícito) ou sua cessação, quando as entidades empregadoras não os podem pagar por estarem em situação de insolvência ou por se encontrarem numa situação económica difícil.”

N) A Recorrente reúne os requisitos legalmente exigíveis, foi lhe reconhecido um crédito emergente da violação de um contrato de um contrato de trabalho, a entidade empregadora foi declarada insolvente e a Recorrente agiu sempre em cumprimento com os respectivos prazos legais e administrativos.

O) Pelo elenco de razões supra arroladas, ressalve se melhor entendimento, infere-se que a Sentença proferida pelo Tribunal “a enferma de erro de julgamento, já que alicerçou a sua fundamentação sem considerar a factualidade concreta e os contornos específicos da situação em análise.

O Recorrido não apresentou contra-alegações



Neste Tribunal Central, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, notificada nos termos do disposto nos artigos 146.º e 147.º do CPTA, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.


Com dispensa dos vistos legais, vem o processo submetido à conferência para julgamento.



I. 1. Questões a apreciar e decidir:

A questão suscitada pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduz-se em saber se a sentença recorrida errou ao não ter reconhecido o direito a receber do ora Recorrido o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, motivados pela insolvência da entidade patronal. O tribunal a quo concluiu que a autora havia requerido o pagamento dos créditos laborais ao Fundo de Garantia Salarial, em 18.8.2016, quando estava volvido o prazo previsto no art. 2.º, n.º 8 do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril, e bem assim o prazo previsto no art. 2.º, n.º 4, do mesmo diploma legal.



II. Fundamentação

II.1. De facto

Pelo TAC de Lisboa foi julgada provada a seguinte matéria de facto, a qual não é sujeita a qualquer impugnação:

A) A autora foi contratada pela sociedade «G.........., Lda», para trabalhar sob as suas ordens, direção e fiscalização em 14.3.2012 – ver docs juntos aos autos.

B) Por sentença proferida, a 25.2.2014, transitada em julgado a 27.4.2014, no processo nº 290/13.9TTALM, do 1º Juízo do Tribunal do Trabalho de Almada, foi reconhecido como ilícito o despedimento da ora autora e condenada a entidade patronal a pagar-lhe uma indemnização no valor das retribuições que a mesma deixou de auferir, desde o despedimento em 17.4.2012 até ao trânsito em julgado da decisão judicial, a liquidar em execução de sentença, fixado tal valor, provisoriamente, em €: 14.323,67, acrescida da quantia de €: 270,94, a título de créditos salariais, acrescido de juros de mora à taxa legal de 4% ano desde 17.4.2012 até integral pagamento – ver docs juntos aos autos.

C) A 22.1.2015 foi pedida a insolvência de «G.........., Lda», processo, nº 2049/15.0T8LSB, que correu termos no Tribunal de Comarca de Lisboa – Inst Central – 1ª secção Comércio – J2 – ver paa.

D) A 21.10.2015 a entidade patronal da autora foi declara insolvente – ver paa.

E) A autora reclamou créditos laborais no processo de insolvência – ver docs 3, 4 e 5 da pi.

F) Em 18.8.2016 a autora requereu ao FGS o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, no valor de €: 16.600,88, com indicação de o contrato de trabalho ter cessado a 17.4.2012 e de a ação de insolvência ter sido proposta – ver docs juntos aos autos e paa.

G) Por ofício de 21.10.2016, o Fundo de Garantia Salarial notificou a autora para se pronunciar, em sede de audiência prévia, sobre o projeto de indeferimento do seu requerimento, com data de 20.10.2016, com fundamento em:

- Os créditos requeridos encontram-se vencidos em data anterior ao período de referência, ou seja, nos seis meses que antecedem a data da propositura da ação de insolvência, previsto no nº 4 do art 2º do DL nº 59/2015, de 21.4;

- o requerimento não foi apresentado no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do nº 8 do art 2º do DL nº 59/2015, de 21.4 – ver paa.

H) Mais constava desse ofício que, na falta de resposta, o indeferimento ocorre no primeiro dia útil seguinte ao termo do prazo de 10 dias úteis para audiência prévia – ver paa.

I) A autora nada disse – ver paa.

J) Por ofício de 10.11.2016, o FGS notificou a autora do indeferimento do seu pedido, por despacho de 20.10.2016, com os seguintes fundamentos:

- os créditos requeridos não se encontram abrangidos pelo período de referência, ou seja, nos seis meses que antecederam a propositura da ação, nos termos do nº 4 do art 2º do DL nº 59/2015, ou após a propositura da mesma ação, nos termos do nº 5 do mesmo artigo;

- o requerimento não foi apresentado no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do nº 8 do art 2º do DL nº 59/2015, de 21.4 – ver fls 31 do paa, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

K) A 11.11.2016 e a 29.11.2016 a autora pronunciou-se no processo administrativo – ver fls 33 e 53 do paa.

L) Por ofício de 18.11.2016 o FGS comunicou à ora autora que a respetiva pronúncia não veio alterar a decisão proferida – ver fls 52 do paa.

M) A presente ação foi intentada a 4.10.2017 – ver pi.

Ao abrigo do disposto no art. 662.º, n.º 1, do CPC, por vir documentalmente comprovado e sobre tal factualidade não existir controvérsia, adita-se o seguinte facto ao probatório:

N) A A. e ora Recorrente, na sequência da sentença proferida no processo nº 290/13.9TTALM, relativa a créditos emergentes de trabalho reconhecidos e não pagos e referida em B) supra, requereu protecção jurídica à Ordem dos Advogados no final de Setembro de 2015, vindo tal pedido a ser deferido em Outubro de 27.10.2015 (cfr. doc. 3 junto com a p.i. e por acordo).



II.2. De direito

No TAC de Lisboa a acção foi julgada improcedente com a seguinte fundamentação:

“(…)

A questão que vem colocada – que o Fundo de Garantia Salarial pague à autora créditos salariais emergentes da cessação do contrato de trabalho, no valor total de €: 16.600,88 – foi resolvida pela Administração à luz do novo regime do Fundo de Garantia Salarial, a saber o DL nº 59/2015, de 21.4.

Nos termos do art 5º do DL nº 59/2015 o novo regime unificado do FGS entrou em vigor a 1 de maio de 2015, sendo aplicável aos requerimentos apresentados depois desta data, como acontece com o da autora (de 18.8.2016).

Tendo sido consequentemente revogados os arts 316º a 326º da Lei 35/2004, de 29.7, alterada pela Lei nº 9/2006, de 20.3, pelo DL nº 164/2007, de 3.5 e pela Lei nº 59/2008, de 11.9, e o DL nº 139/2001, de 24.4.

O Fundo de Garantia Salarial (FGS), antes e agora, tem como objetivo assegurar o pagamento ao trabalhador de créditos resultantes do contrato de trabalho ou da violação (despedimento ilícito) ou sua cessação, quando as entidades empregadoras não os podem pagar por estarem em situação de insolvência ou por se encontrarem numa situação económica difícil.

Nos termos do art 1º, nº 1 do DL nº 59/2015, de 21.4, para aceder ao Fundo de Garantia Salarial tem de ter sido:

proferida sentença de declaração de insolvência do empregador;

i) proferido despacho do juiz que designa o administrador judicial provisório, em caso de Processo Especial de Revitalização (PER);

ii) proferido despacho de aceitação do requerimento proferido pelo IAPMEI – Agência para a Competitividade e Inovação, I.P., no âmbito do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas.

Já o trabalhador, nos termos do art 1º, nº 2, tem de:

i) Ter contrato de trabalho ou uma relação de trabalho subordinado (relação patrão/empregado), com empregador com atividade em Portugal;

ii) Exercer ou ter exercido habitualmente a sua atividade em território nacional, mas ao serviço de empregador com atividade no território de dois ou mais Estados Membros, ainda que o empregador seja declarado insolvente por tribunal ou autoridade competente de outro Estado-Membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu;

iii) A entidade empregadora dever-lhe quantias (salários; subsídios de férias, de Natal ou de alimentação; indemnizações ou compensações por ter terminado o contrato de trabalho ou não terem sido cumpridas as suas condições) – cfr art 2º, nº 1.

O pagamento dos créditos pelo FGS ao trabalhador não é automático, tem de ser requerido, através do Formulário Mod. GS 1 – DGSS - Requerimento - Pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho - Fundo de garantia salarial, e instruído com documentos – cfr art 5º.

De acordo com o art 2º, nº 4, o Fundo de Garantia Salarial cobre os pagamentos que deveriam ter sido feitos ao trabalhador pela entidade empregadora nos seis meses anteriores à data de início do processo de insolvência, da apresentação do requerimento do Processo Especial de Revitalização ou do Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE), até aos limites indicados no art 3º (por mês, o FGS paga até três vezes o valor do salário mínimo nacional que estava em vigor na data em que a entidade empregadora devia ter pago o salário, logo, o limite global garantido é igual a dezoito vezes o salário mínimo nacional que estava em vigor na data de vencimento dos créditos/dívida, não podendo cada salário ser superior a três vezes a remuneração mínima mensal garantida para o ano a que dizem respeito os créditos). Ao abrigo de uma lógica de estabilidade temporal e de segurança jurídica manteve-se no novo regime a regra de que o FGS assegura o pagamento dos créditos que se tenham vencido nos seis meses anteriores: i) à propositura da ação de insolvência ou ii) à apresentação do requerimento no processo especial de revitalização ou iii) do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas (cfr art 3º, nº 1 do DL nº 219/99, de 15.6).

O pagamento dos créditos requeridos apenas é assegurado pelo FGS até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.

Assim, o art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015, de 21.4, dispõe: O Fundo só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.

Trata-se, neste art 2º, nº 8, de uma alteração ao regime previsto no art 319º, nº 3 da anterior Regulamentação do Código do Trabalho, aprovada pela Lei nº 35/2004, de 29.7 (alterada pela Lei nº 9/2006, de 20.3, pelo DL nº 164/2007, de 3.5 e pela Lei nº 59/2008, de 11.9), no qual se estabelecia que o Fundo de Garantia Salarial só assegurava o pagamento dos créditos que lhe sejam reclamados até três meses antes da respetiva prescrição, isto é, 3 meses antes da data em que perde o direito aos créditos emergentes de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação que, de acordo com o disposto no art 337º do Código do Trabalho, prescrevem decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho. Tal regra implicava que o trabalhador tivesse de apresentar o seu pedido antes de terem decorrido nove meses da data de cessação do seu contrato, excepto se fosse interrompida a prescrição (cfr ainda art 7º, nº 2 do DL nº 219/99, de 15.6, com a redação dada pelo DL nº 139/2001, de 24.4). A prescrição podia ser interrompida, nomeadamente, pela instauração de uma ação. No caso pela instauração de ação de insolvência da entidade empregadora, cuja data a considerar é a da entrada da ação em juízo, ou seja, 22.1.2015.

A entidade demandada indeferiu expressamente o pedido da autora, para que lhe fossem pagos créditos emergentes da cessação do contrato de trabalho, no valor total de €: 16.600,88, com fundamento no art 2º, nº 4 e nº 8 do DL nº 59/2015, de 21.4, por os créditos se terem vencido nos seis meses anteriores à instauração de insolvência, a 22.1.2015, e por ter passado mais de um ano sobre a data da cessação do contrato de trabalho da autora, entendendo esse prazo como sendo de caducidade.

Em questão está o pagamento de créditos laborais à autora face ao incumprimento da entidade empregadora.

Porém, sem qualquer margem para dúvidas o regime jurídico que se aplica à situação da autora é o aprovado pelo DL nº 59/2015, de 21.4, porque efetivamente é o que se encontrava em vigor à data em que a autora requereu o pagamento de créditos salariais ao Fundo de Garantia Salarial.

Como em cima deixamos escrito, o art 3º do DL nº 59/2015 dispõe sobre a aplicação deste novo regime, que entrou em vigor a 4.5.2015, no tempo, sendo aplicável aos requerimentos apresentados depois desta data, como acontece com o da autora apresentado a 18.8.2016.

Tendo sido consequentemente revogados os arts 316º a 326º da Lei 35/2004, de 29.7, alterada pela Lei nº 9/2006, de 20.3, pelo DL nº 164/2007, de 3.5 e pela Lei nº 59/2008, de 11.9, e o DL nº 139/2001, de 24.4.

Depois, um dos pontos essenciais do novo regime teve por base a necessidade de proceder à transposição da Diretiva nº 2008/94/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22.10.2008, relativa à aproximação das legislações dos Estados Membros respeitante à proteção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador. O que sucedeu com o pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho dos trabalhadores em situações transnacionais e com o alargamento do âmbito subjetivo dos trabalhadores que podem requerer o pagamento pelo FGS de créditos emergentes de contrato de trabalho. Nos artigos 3º a 5º a Diretiva trata das instituições de garantia. O art 4º da Diretiva permite aos Estados que limitem a obrigação e pagamento das instituições de garantia e, nessa sequência, o art 11º permite aos Estados aplicarem ou introduzirem disposições legislativas mais favoráveis aos trabalhadores assalariados. O que significa que o disposto no art 2º, nº 4 e nº 8 do DL nº 59/2015 está conforme com o art 4º da Diretiva.

Quanto ao prazo previsto no art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015, consideremos o seguinte:

Sobre o tempo e a sua repercussão nas relações jurídicas dispõe o art 298º do Código Civil o seguinte:

1. Estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição.

2. Quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição.

O art 2º, nº 8 estabelece um prazo para o trabalhador pedir o pagamento de créditos laborais ao Fundo de Garantia Salarial, sem dizer expressamente que se trata de prazo prescricional (art 298º, nº 2 do CC).

Uma vez que a lei nada refere acerca da natureza daquele prazo, forçoso é concluir que se trata de um prazo de caducidade e não de prescrição (como por exemplo o previsto no art 337º do Código do Trabalho revogada pelo atual regime do DL nº 59/2015).

Sem entramos em grandes considerações, importa deixar algumas notas essenciais a propósito da caducidade, relevantes para os passos seguintes da apreciação. Na caducidade, o prazo visa preestabelecer o lapso de tempo dentro do qual ou a partir do qual, há-de exercer-se o direito, por imposição da lei ou vontade negocial. O prazo, na caducidade, é condição de admissibilidade e procedibilidade, por ser elemento constitutivo do direito. A caducidade encontra o seu fundamento específico no interesse público da paz familiar e segurança social da circulação, e no interesse da brevidade das relações jurídicas. O prazo de caducidade é um prazo prefixo que, pressupondo o interesse na rápida definição do direito, não se compadece com dilações e, por isso, não comporta a paralisação do direito. Assim, por determinação legal expressa, excepto nos casos em que a lei o determine, os prazos de caducidade não se suspendem nem se interrompem [artº 328º do CC]. E, também por essa razão – o interesse na rápida definição do direito - são sempre mais curtos que os prazos de prescrição. Se a lei não fixar outra data, nos casos em que a lei se limita a fixar o prazo da caducidade, sem fixar a data a partir da qual se conta, começa a correr a partir do momento em que puder ser exercido [artº 329º CC]. O decurso do prazo de caducidade provoca a extinção ou a perda da prerrogativa de exercer o direito. Só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do ato a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo [artº 331º, nº 1 do CC]. Pelo que, a única forma de evitar a caducidade é praticar, dentro do prazo correspondente, o ato que tenha efeito impeditivo.

Pois bem, no caso, o prazo do art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015, de acordo com o art 329º do CC, começa a correr a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho. No caso, tal prazo começa a contar do trânsito em julgado da sentença proferida pelo Tribunal de Trabalho, ou seja, dia 28.4.2014.

O início da contagem do prazo de caducidade vem, assim, expressamente fixado na letra da lei e corresponde ao momento a partir do qual a autora pode pedir ao Fundo o pagamento dos créditos laborais em dívida.

O que significa que o início da contagem do prazo do art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015 não depende da existência de sentença que declare a insolvência do empregador.

Com efeito, a existência de sentença de declaração de insolvência do empregador constitui requisito de pagamento ao trabalhador de créditos laborais pelo Fundo, mas não condiciona a apresentação do requerimento de pagamento.

Também, no caso, nem mesmo se pode defender que o pedido de insolvência do empregador, de 22.1.2015, ou a sentença que, em 21.10.2015, declarou a insolvência tenham efeito impeditivo da caducidade, porque, lembre-se, os créditos laborais da autora venceram-se com a cessação do contrato de trabalho, em 28.4.2014.

A lei – o Código Civil ou o DL nº 59/2015 – não atribuiu à instauração de ação de insolvência, à citação ou notificação judicial efeito interruptivo da caducidade, como a propósito dispõe para a prescrição (art 323º do CC).

Também, apesar dos créditos laborais reclamados pela autora junto do Fundo estarem reconhecidos por decisão judicial transitada em julgado, do Tribunal do Trabalho e do Tribunal do Comércio, a lei não atribui aos direitos reconhecidos em sentença ou título executivo o efeito previsto no art 311º do CC.

E percebe-se, por o prazo de caducidade pressupor a rápida definição do direito e, no caso, o regime do Fundo de Garantia Salarial pretender proteger os trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador, servindo para lhes assegurar um mínimo de proteção, em particular para garantir o pagamento dos seus créditos em dívida.

Aqui chegados, está provado que por força da decisão transitada em julgado a 27.4.2014, se operou a desvinculação da autora, e, nessa data, os créditos laborais (que são os créditos aqui em causa) venceram-se com a cessação do contrato de trabalho.

Assim, a caducidade do direito da autora consumava-se às 24 horas de 28.4.2015.

O TCA Sul, em acórdão proferido a 10.5.2018, no processo nº 690/16, decidiu: «I – O artigo 2º nº 8 do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS), aprovado pelo DL nº 59/2015, de 21 de Abril prevê um novo prazo de caducidade para os trabalhadores requererem ao Fundo de Garantia Salarial o pagamento de créditos salariais: um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho. II - Não pode aplicar-se, sem mais, o novo prazo do artigo 2º nº 8 do NRFGS (DL. n.º 59/2015), apenas por o pedido ter sido apresentado já no âmbito da vigência do novo regime, se o contrato de trabalho havia cessado no âmbito da lei antiga e a norma então vigente (o artigo 319º nº 3 do Regulamento do Código do Trabalho - Lei n.º 35/2004), admitia a apresentação do pedido ao Fundo de Garantia Salarial até três meses antes da prescrição desses créditos. III - Comparado o nº 8 do artigo 2º do NRFGS (DL. n.º 59/2015) com o normativo anteriormente constante do artigo 319º nº 3 do Regulamento do Código do Trabalho (Lei n.º 35/2004) pode resultar, na prática, num encurtamento do prazo, na exata medida em que no regime anterior tal prazo estava dependente do momento em que verificaria a prescrição dos créditos laborais, que importaria sempre apurar, também por referência às causas de interrupção e suspensão que pudessem ocorrer. IV – Se a lei nova estabelece um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior há que chamar à colação o disposto no artigo 297º nº 1 do Código Civil nos termos do qual “…a lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar».

V – Se os créditos laborais do autor não se encontravam prescritos no momento em que entrou em vigor o NRFGS (DL. n.º 59/2015), corria ainda naquele momento o antigo prazo de que o trabalhador dispunha para requerer ao Fundo de Garantia Salarial os seus créditos laborais, pelo que o prazo de um ano previsto no artigo 2º nº 8 só começaria a conta a partir da entrada em vigor da nova lei, se no caso não faltava menos tempo para o prazo se completar de acordo com a lei antiga».

Ainda que assim seja, quando a autora requereu o pagamento dos créditos ao FGS, em 18.8.2016, estava volvido mais de 1 ano sobre a data da entrada em vigor do DL nº 59/2015, de 21.4, que terminou a 1.5.2016.

Ora a presente ação foi intentada a 4.10.2017.

Como tal é evidente que a citação do Fundo de Garantia Salarial foi efetuada depois de se haver completado o prazo de caducidade.

Esta decisão, que acompanha a da entidade demandada, não viola o disposto no DL nº 59/2015, de 21.4, porque o prazo do art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015 e também o do art 2º, nº 4, visam garantir o pagamento de créditos salariais em determinadas circunstâncias, verificados que estejam os pressupostos previstos na lei, e em tempo útil.

Ao prever que o Fundo possa pagar nos termos previstos no art 2º do DL 59/2015 o legislador bastou-se com a exigibilidade do crédito, considerando suficiente que se tenha vencido. Não impôs, portanto, que sobre ele se haja constituído um título executivo.

E bem se compreende que assim seja.

Com efeito, a criação deste Fundo teve como objetivo fundamental garantir, essencialmente em tempo útil, o pagamento das prestações referidas na lei, bem sabendo o legislador que a habitual morosidade dos tribunais é incompatível com a liquidação célere dessas prestações.

E não faria qualquer sentido que, por um lado, previsse o pagamento pelo Fundo, com o objetivo de garantir um rápido acesso às prestações devidas, e depois sujeitasse o interessado à prévia obrigação de obter uma sentença judicial transitada em julgado como sua condição, decisão que amiudadas vezes demora alguns anos.

Por outro lado, ao prever a sub-rogação do Fundo nos direitos do trabalhador (art 4º do DL nº 59/2015) o legislador contemplou, justamente, que pagando o Fundo num primeiro momento, na sequência do vencimento de algumas obrigações laborais, era possível que a entidade patronal viesse a conseguir pagar mais tarde, num segundo momento, voluntariamente, ou por via de ação no tribunal do trabalho, ou, ainda, por via do processo de insolvência (ou similar).

Nesta conformidade, uma vez que os créditos laborais da autora se venceram em 27.4.2014 e a ação de insolvência da sociedade empregadora foi instaurada em 22.1.2015, ainda, é forçoso concluir que o período de referência a que se refere o art 2º, nº 4 do DL nº 59/2015 se situa entre 22.7.2014 e 22.1.2015. E, consequentemente, os créditos da autora venceram-se fora desse período.

A jurisprudência dos tribunais superiores desta jurisdição administrativa tem vindo reiteradamente a entender que, no caso da entidade empregadora vir a ser judicialmente declarada insolvente, o Fundo de Garantia Salarial assegurará os créditos salariais que se hajam vencido nos seis meses que antecederam a data de propositura da ação de insolvência ou da data de entrada do requerimento relativo ao procedimento de conciliação (previsto no DL n.º 316/98) – cfr Acs do STA de 17.12.2008, processo nº 0705/08; de 04.02.2009, processo nº 0704/08; de 07.01.2009, processo nº 0780/08; de 10.02.2009, processo nº 0820/08; de 11.02.2009, processo nº 0703/08; de 25.02.2009, processo nº 0728/08; de 12.03.2009, processo nº 0712/08; de 25.03.2009, processo nº 1110/08, de 02.04.2009, processo nº 0858/08; de 10.09.2009, processo nº 1111/08; Acs do TCA Norte de 15.7.2014, nº 166/11; de 14.2.2014, nº 756/07; 3.5.2013, nº 340/11.

Isto porque, explica o acórdão proferido pelo TCA Norte, em 3.5.2013, no processo nº 340/11, «a finalidade social do Fundo de Garantia Salarial justifica que sejam adotados limites à sua intervenção, não só temporais que decorrem do enquadramento comunitário que lhe está subjacente -Diretiva 80/987/CC, de 20/10 - como também, atinentes às importâncias pagas».

A ratio deste regime legal, máxime do disposto no art 2º, nº 4 e nº 8 do DL nº 59/2015, é fundamentalmente, como já dissemos, a de assegurar, por um lado, o pagamento de créditos não muito dilatado no tempo - e daí o limite temporal cujo recuo máximo se situa no sexto mês anterior à data da entrada da ação ou do requerimento em causa - e por outro, de créditos balizados numa moldura quantitativa máxima garantida - 6 meses de retribuição não superior a 3 salários mínimos nacionais.

Concluindo, na situação em apreço, a autora requereu o pagamento dos créditos laborais ao Fundo de Garantia Salarial, em 18.8.2016, quando estava volvido o prazo previsto no art 2º, nº 8 do DL nº 59/2015, de 21.4, e bem assim o prazo previsto no art 2º, nº 4 do mesmo diploma legal.

(…).”

E o sentido do que vem decidido é de manter, correspondendo à jurisprudência já firmada sobre a matéria (cfr., o acórdão deste TCAS de 1.06.2017, proc. n.º 336/15.6BESNT, e jurisprudência nele citada; também o ac. de 22.06.2017, proc. n.º 1528/15.3BESNT, por nós relatado, bem como o ac. deste TCAS de 10.05.2018, proc. nº 690/16).

A pronúncia do Ministério Público responde à questão jurídica que nos vem colocada no recurso, pelo que passaremos a transcrever a mesma na sua parte relevante:

“(…) cremos que não assiste razão à A/Recorrente, uma vez que apenas se mostra cumprido o prazo previsto no artº 2º nº 8 do DL nº 59/2015 mas não o prazo fixado no artº 2º nº 4 do mesmo diploma.

3 – Dispõe o artº 2º nº 8 do Dl nº 59/2015 que “ o Fundo só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.”

Como ficou provado, o contrato de trabalho da A. cessou em 27/4/2014 e a mesma apresentou o seu pedido ao FGS em 18/8/2016.

Teria, à primeira vista, sido excedido o prazo de um ano fixado no artº 2º nº 8 do DL nº 59/2015.

Contudo, tal norma foi declarada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional no seu acórdão nº 328/18, de 27/6/2018, no qual se decidiu : “ julgar inconstitucional a norma contida no artigo 2.º, n.º 8, do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril1, na interpretação segundo a qual o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, certificados com a declaração de insolvência, cominado naquele preceito legal é de caducidade e insuscetível de qualquer interrupção ou suspensão” Tal declaração de inconstitucionalidade veio a ser seguida em mais 3 acórdãos do Tribunal Constitucional – nº 583/18, de 8/11/2018; nº 251/2019, de 23/4/2019 e nº 270/2019, de 15/5/2019 – embora não tenha ainda sido proferida decisão de inconstitucionalidade com força obrigatória geral.

Todavia, constitui jurisprudência uniforme dos tribunais centrais administrativos o reconhecimento da referida inconstitucionalidade, como pode ver-se entre outros no Acórdão do TCA_Sul de 21/2/2019, proferido no Proc. nº 1202/16.3 BESNT e no Acórdão do TCA-Norte de 28/6/2019, proferido no Proc. nº 00519/17.4BEAVR ( sendo certo que no STA se encontram pendentes sobre esta matéria duas revistas já admitidas em 10/5/2019 e em 1/3/2019, nos procs. nºs 0808/17.8BEBRG e nº 0785/17.5BEPRT).

Atenta a referida inconstitucionalidade, o prazo previsto no artº 2º nº 8 do DL nº 59/2015 tem de considerar-se sujeito a um período de suspensão enquanto decorre a acção de insolvência, tal como o legislador veio a consagrar ao aditar ao artº 2º, através da Lei nº 71/2018, de 31/12, um nº 9º com a seguinte redacção :

“O prazo previsto no número anterior suspende-se com a propositura de ação de insolvência, a apresentação do requerimento no processo especial de revitalização e com a apresentação do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas, até 30 dias após o trânsito em julgado da decisão prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º ou da data da decisão nas restantes situações.”

Por outro lado, a jurisprudência mostra-se igualmente uniforme no sentido de considerar que o prazo previsto no artº 2º nº 8 do DL nº 59/2015 tem o seu início na data da entrada em vigor deste diploma, em 4/5/2015, atenta a alteração do prazo previsto em lei anterior e o disposto no artº 297º do CC, tal como se entendeu no acórdão do TCA-Sul citado na sentença recorrida.

Ora, aplicando o supra exposto ao caso dos autos verifica-se que :

- a) – Em 4/5/2015, quando entrou em vigor o DL nº 59/2015, já o prazo previsto no artº 2º nº 8 se encontrava suspenso, uma vez que a acção de insolvência já tinha sido instaurada em 22/1/2015.

- b) – Tal suspensão manteve-se até 30 depois do trânsito em julgado da declaração de insolvência, a qual foi proferida em 21/10/2015.

- c) – Assim, o referido prazo de uma ano só começou a correr em 5/12/2015, pelo que não tinha ainda expirado quando em 18/8/2016 a A/Recorrente apresentou o seu pedido junto do FGS.

Em consequência, afigura-se-nos que o pedido da A. ao FGS cumpre inteiramente o disposto no artº 2º nº 8 do DL nº 69/2015.

4 – Porém, no que respeita ao cumprimento do prazo de referência previsto no artº 2º nº 4 do DL nº 59/2015, cremos que este tem de considerar-se como não verificado, ao contrário do que defende a A./Recorrente.

Com efeito, dispõe o artº 2º nº 4 do DL nº 59/2015 que “ O Fundo assegura o pagamento dos créditos previstos no n.º 1 que se tenham vencido nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência ou à apresentação do requerimento no processo especial de revitalização ou do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas.”

Tal disposição tem manifestamente como fundamento a imposição de um dever de diligência ao trabalhador/credor, no sentido de este desencadear com celeridade a instauração do processo de insolvência num prazo que não exceda os seis meses posteriores ao vencimento dos seus créditos. Só requerendo a insolvência dentro desse prazo de seis meses, o trabalhador pode garantir que os seus créditos virão a estar abrangidos pelo prazo de referência fixado no artº 2º nº 4 do DL nº 59/2015.

Ora, a A/Recorrente deu início ao processo de insolvência muito para além do prazo de seis meses posteriores ao vencimento do seu crédito, em 27/4/2014.

Na verdade, a A. só requereu à segurança social a concessão do benefício do apoio judiciário para instauração da acção de insolvência no final de Setembro de 2015, mais de um ano depois, como refere no documento que, com o nº 3, juntou à sua petição inicial – onde indica a referência do pedido, com o registo nº APJ ........../2015, o qual terá sido deferido em 27/10/2015.

Defende a A. que a advogada nomeada pela Ordem dos Advogados não propôs a acção de insolvência, como legalmente lhe competia, pelo que tal facto não pode ser imputado à A.

Contudo, essa não propositura mostra-se totalmente irrelevante.

Na verdade, se a advogada nomeada tivesse instaurado a acção de insolvência, a mesma teria de considerar-se como proposta na data em que a A. efectuou o pedido à segurança social, como decorre do disposto no artº 33º nº 4 da Lei nº 34/2004, de 29/7 – “ a acção considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono”. [sublinhado nosso]

Assim, atenta a data desse pedido – em Setembro de 2015 – correspondente à propositura da acção, a A. só veria o seu crédito abrangido pelo disposto no artº 2º nº 4 do DL nº 59/2015 se o mesmo se tivesse vencido nos seis meses anteriores a Setembro de 2015, ou seja, entre Março e Agosto de 2015.

Mas o crédito da A. venceu-se em data muito anterior, em 27/4/2014.

Por outro lado, mesmo considerando a data em que efectivamente o processo de insolvência foi instaurado, em 22/1/2015, ainda assim se não mostra respeitado o prazo de referência previsto no artº 2º nº 4 do DL nº 59/2015 – o qual decorreu entre 22.7.2014 e 22.1.2015, como consta no acto impugnado e na sentença recorrida. [sublinhados nossos]

Em consequência, dado que o crédito da autora se venceu fora desse período, não se mostra verificado o requisito legal previsto no artº 2º nº 4 do DL nº 59/2015.

Tal requisito é de verificação cumulativa com o previsto no artº 2º nº 8, pelo que a falta de qualquer deles determina o indeferimento do pedido de pagamento formulado ao FGS.

Ora, no caso dos autos, face ao não cumprimento do disposto no artº 2º nº 4 do DL nº 59/2015, sempre teria o pedido de ser indeferido, tal como se decidiu no acto impugnado e na douta sentença recorrida.

5- Pelo exposto, emite-se pronúncia no sentido do não provimento ao recurso, sendo de manter a sentença recorrida por subsistir um dos fundamentos que determinaram a improcedência da acção”.

Com efeito, é incontornável que a ora Recorrente deu início ao processo de insolvência muito para além do prazo de seis meses posteriores ao vencimento do seu crédito, em 27.04.2014. Pois que só requereu à Segurança Social a concessão do benefício do apoio judiciário para instauração da acção de insolvência no final de Setembro de 2015, mais de um ano depois, como vem provado no facto por nós aditado.

E também como referido pelo Ministério Público, a circunstância de a advogada nomeada pela Ordem dos Advogados não ter proposto a acção de insolvência atempadamente, nem ter reclamado os respectivos créditos junto do processo, é factualidade que se mostra irrelevante para a sorte do recurso. Na verdade, mesmo se a advogada tivesse instaurado a acção de insolvência, a mesma teria de considerar-se como proposta na data em que o pedido à segurança social tinha sido efectuado, como resulta do disposto no art. 33.º, n.º 4, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho (“a acção considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono”) e atenta a data desse pedido – em Setembro de 2015 –, a A. só veria o seu crédito abrangido pelo disposto no art. 2.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 59/2015 se o mesmo se tivesse vencido nos seis meses anteriores a Setembro de 2015, ou seja, entre Março e Agosto de 2015; o que não ocorre porque o crédito da Autora e ora Recorrente venceu-se em data muito anterior, em 27.04.2014.

Razões pelas quais, tendo todos os créditos reclamados pela Autora e ora Recorrente data de vencimento anterior aos seis meses que antecederam a data da propositura da acção na qual a entidade empregadora foi declarada insolvente, tudo como provado, não lhe assiste o direito a que o Fundo de Garantia Salarial assuma o respectivo pagamento. Nos termos do n.º 4 do art. 2.º do Decreto-Lei n.º 59/2015: “[o] Fundo assegura o pagamento dos créditos previstos no n.º 1 que se tenham vencido nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência ou à apresentação do requerimento no processo especial de revitalização ou do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas”.

Assim sendo, na improcedência do recurso, terá que manter-se a sentença recorrida, com a presente fundamentação.



III. Conclusões

Sumariando:

i) Nos termos do n.º 4 do art. 2.º do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril (alterado pela Lei n.º 71/2018, de 31 de Dezembro): “[o] Fundo assegura o pagamento dos créditos previstos no n.º 1 que se tenham vencido nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência ou à apresentação do requerimento no processo especial de revitalização ou do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas”.

ii) Os créditos fora desse período, ainda que existam e estejam reconhecidos, não podem ser pagos pelo Fundo de Garantia Salarial.



IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar, com a presente fundamentação, a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário concedido.

Lisboa, 10 de Outubro de 2019




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Pedro Marchão Marques

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Paula de Ferreirinha Loureiro

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Jorge Pelicano