Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1117/10.9 BESNT |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 11/10/2022 |
Relator: | HÉLIA GAMEIRO SILVA |
Descritores: | IRC INDISPENSABILIDADE DOS CUSTOS OPERAÇÃO FICTÍCIA MATERIALIDADE ÓNUS DA PROVA |
Sumário: | I - A noção legal de custos ou perdas do exercício (agora gastos), para efeitos de IRC, engloba todas as despesas realizadas pela empresa quando, (i) devidamente comprovadas, (2) forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora da empresa em causa. Trata-se de uma formulação normativa que visa assegurar o apuramento do rendimento real das empresas impondo as regras, que do ponto de vista fiscal devem ser observadas para que as despesas necessárias à formação do rendimento possam ser aceites. II - Não se questionando a indispensabilidade do custo, nem a sua contabilização apoiada em documentos de despesa, a sua não-aceitação apenas pode radicar na sua falta de materialidade (ou verdade). III - Não havendo indícios fundados de que os custos contabilizados pela impugnante assentam em faturação relativa a operação fictícia, fica logo comprometida a legalidade da sua correção pela AT. |
Aditamento: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul l – RELATÓRIO B.... - B....., LDA., deduziu impugnação judicial contra a liquidação adicional de IRC, referente ao exercício de 2004, e correspondentes juros compensatórios na importância de € 95.258,86. O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por sentença de 29 de junho de 2018, julgou totalmente improcedente a impugnação, mantendo, na ordem jurídica, o ato impugnado. Inconformada, a impugnante B.... - B....., LDA., veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões: «A) Com base nos fundamentos de facto e de direito alegados, entende a Recorrente que a douta sentença recorrida encontra-se, de forma irremediável, inquinada dos seguintes vícios: a) está ferida de nulidade por falta de fundamentação, ao omitir a indicação dos elementos de prova utilizados para formar a convicção do juiz, bem como ao não proceder à análise crítica da prova; B) Não se mostra, desde logo, devidamente fundamentada a sentença recorrida, incorrendo em nulidade (artigos 125.º nº 1 do CPPT e 607.º n.º 4 do CPC), pois revela-se deficiente, ambígua e obscura inviabilizando qualquer juízo inteligível sobre o seu conteúdo, razão pela qual não consegue a Recorrente descortinar que matéria de facto foi dada como provada, bem como o seu cabal exame crítico, adequado a fundamentar a improcedência da impugnação. C) Sobre a questão da fundamentação da decisão da matéria de facto, vem lapidarmente afirmando a nossa doutrina: “(...) a discriminação rigorosa dos factos provados e não provados e uma motivação clara, adequada e consistente são essenciais para a justa composição do litígio, são essenciais para a realização da justiça fiscal. (…) julgar implica também uma tarefa delicada e complexa que consiste em seleccionar e valorar os factos relevantes para a decisão da causa e enuncia-los como provados ou não provados, motivando a decisão” (3), sendo que, “os enunciados de facto devem ser expressos numa linguagem natural e exacta, de modo a retratar com objectividade a realidade a que respeitam, e devem ser estruturados com correcção sintáctica e propriedade terminológica e semântica.” (4) D) No mesmo sentido avança a jurisprudência, remetendo a Recorrente para o decidido no Acórdão do TCAN de 28-01-2016, proferido no Proc. n.º 00479/09.5BEPRT, decisão que quer pela pertinência do raciocínio, quer pela clareza e pelo acerto da decisão, não pode deixar de se acompanhar de perto e secundar a sua respectiva fundamentação, pouco mais se podendo acrescentar. E) Porquanto, esta exigência que concerne à matéria de facto provada “de modo algum se satisfaz com a colagem de diversos elementos que nem sequer internamente se mostram ordenados”, sendo que “com facilidade se encontram exemplos de uma deficiente metodologia na elaboração de decisão judiciais (...) em que é usual a mera transcrição dos factos assentes”. Mais, “o facto provado por documento não corresponde ao próprio documento. Em vez de o juiz se limitar a “dar por reproduzido o teor do documento X”, importa que extracte do mesmo o segmento ou segmentos que sejam concretamente relevantes, assinalando, assim, o específico meio de prova em que se baseou. Imposição que obviamente colide com a pura reprodução de todo o documento (…).” (5). F) Confrontada a Recorrente com a douta sentença recorrida, de imediato se evidencia que a Juiz a quo na sua elaboração não cumpriu a exigência de indicação da matéria de facto, optando por seguir a prática censurável de verter nos factos provados o conteúdo do RIT, apresentando nas alíneas j) e l) como “factos provados” não “factos” mas “documentos” que integram o PAT, nomeadamente a fotocópia integral dos pontos II-2, III-2, III-3.1, III-3.2, III-4.1.1, III-4.1.2 e IX do RIT e Anexo 22 do RIT, os quais deu “por inteiramente reproduzido”, sem indicar, sem discriminar, sem especificar os factos que esses documentos comprovam (conforme resulta do teor de fls. 6 a fls. 34 da douta sentença recorrida, ou seja, um total de 27 das 47 páginas da mesma). G) Como se sabe, o RIT não está organizado sob a forma de “factos” que permita a sua automática transposição para a sentença, sendo antes uma informação elaborada pelos serviços inspectivos do órgão da execução fiscal, inserida num procedimento administrativo com uma estrutura e uma lógica próprias onde cabem factos, investigações, opiniões, presunções, raciocínios, diligências, conclusões, etc. H) Pelo que, ficou a Recorrente sem saber, com clareza e objectividade, quais os factos provados e não provados, apenas se vendo confrontada, de novo, desta feita pela douta sentença recorrida, com a amálgama incontrolada e indiscriminada, sem nexo lógico ou temporal, das investigações, opiniões, presunções, meros raciocínios, diligências, conclusões do inspector tributário, N.....(quinta testemunha do processo), relativamente a operações que este considerou simuladas, e que disseminou no RIT que elaborou na sequência da inspecção tributária aos exercícios da Recorrente dos anos de 2002, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008, em sede de IRC e IVA. I) Secundando o Acórdão do TCAN de 28-01-2016, acima citado, que aqui, salvo o devido respeito, se impõe reproduzir: “A prática de verter nos factos provados o conteúdo do relatório da inspecção é uma prática censurável que não cumpre dever de seleção da matéria de facto que deve constar na sentença. J) Uma outra observação que se impõe respeita à circunstância da alínea j) e l) dos factos provados se apresentar como uma exposição claramente desordenada, sem qualquer nexo ou sequência lógica ou temporal relativamente à antrcedente alínea j) e subsequente alínea l) – o que não pode igualmente deixar de beliscar o imperioso “dever de clareza” simplicidade e lógica da sentença. K) É, indiscutivelmente, nula a sentença recorrida por omissão relevante de factos, pois não só não foram estes especificamente autonomizados na decisão da matéria de facto, como também não se encontram os mesmos referenciados e analisados na discussão jurídica da causa. L) Porquanto, quando na análise crítica da prova o Tribunal a quo não demonstrou o empenho minimamente exigido na sua explicitação, evidenciando um deficiente grau de convencimento sobre a prova produzida, limitando-se a confessar que adere na íntegra à “tese” plasmada no RIT reproduzindo-a e escudando-se em fórmulas vazias destituídas de qualquer densidade que nada dizem e que nada fundamentam. Ou seja: M) Dá eco deste entendimento a jurisprudência, podendo citar-se, a título ilustrativo, os Acórdãos do TCAN de 28-01-2016, Proc. n.º 00831/06.8BEPEN, Relatora P……, e de 25-05-2016, Proc. n.º 00724/04.3BEVIS, Relator M…... N) Por sua vez, no que em concreto diz respeito à prova testemunhal, meio de prova cuja motivação deve ser clara e inequívoca, que P) Não se pode, por conseguinte, aceitar que o Tribunal a quo: R) Padece igualmente de nulidade a sentença recorrida por se encontrar o julgamento da matéria de facto inquinado por défice instrutório, na medida em que, com o devido respeito, tudo se passa como se tal prova não tivesse sido produzida nos autos: (9) S) Sendo nula a sentença recorrida, vem a Recorrente perfilhar o entendimento da modificabilidade da decisão de facto pelo TCA (10), ao abrigo do disposto no artigo 665.° n.° 1 do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.° alínea e) do CPPT, devendo, em cumprimento dos deveres imposto ao abrigo do princípio do inquisitório e em busca da verdade material, ser alterada a matéria de facto da douta sentença recorrida, apreciada livremente a prova documental e testemunhal produzida (artigo 607.° n.° 5 do CPC) e conhecido o objecto do presente recurso. T) Sem prescindir, padece a douta sentença em recurso de evidentes erros decisórios, de facto e de direito, desde logo, incorre em ERRO DE JULGAMENTO de facto, por falta absoluta de discriminação dos factos não provados (11), em violação do artigo 123.° n.° 2 do CPPT (cf. fls. 34 da sentença recorrida), discriminação (12) que no processo tributário é absolutamente essencial na sentença, pois que não existe outra peça processual que concretize tal julgamento da matéria de facto.(13) U) Incorre também em ERRO DE JULGAMENTO na fixação da matéria de facto, quanto aos factos que dá como provados e não provados e que impunham diversa solução de Direito, tal como vem ora a Recorrente, quanto à matéria de facto, cumprir o seu ónus de especificação não só dos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também dos concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida.(14) V) Preliminarmente, cumpre referir que a ordem jurídico-fiscal parte do pressuposto de validade das declarações do contribuinte, presumindo verdadeiras e de boa fé as declarações por este declaradas (artigo 75.° n.° 1 da LGT e artigo 16.° n.° 1 do CIRC), tornando necessário o incumprimento de um qualquer dos deveres de cooperação para que se possa impedir a sua normal produção de efeitos. Todavia, em virtude de (ao contrário do que ocorre habitualmente) estarmos perante situações em que é a Recorrente que pretende afirmar a existência do facto tributário (consubstanciado nas operações passivas - aquisições de bens e serviços e celebração de um contrato de leasing com o .....P, SA) que está na origem da dedução dos custos fiscais na sua contabilidade, no que respeita à comprovação das operações declaradas implica reequacionar a esta luz a repartição do ónus probatório. W) Assim, a conclusão a extrair não pode ser outra: incumbe, prima facie, à AT demonstrar a verificação dos pressupostos legais que legitimaram a sua atuação (15) e que, necessariamente, correspondem a indícios sérios de falsa representação da realidade nos elementos declarados pelo contribuinte (atento o princípio da legalidade administrativa e em termos correspondentes ao disposto no artigo 342.° do Código Civil), cabendo ao contribuinte, nesse caso, provar a veracidade das operações em causa,(16) ou seja, a veracidade das seguintes facturas das quais resultaram as correcções à matéria tributária da Recorrente, referente ao período de IRC de 2004, no total de €274.70,73 (cf. fls. 99/101 do RIT), sendo: X Donde, suportando-se a AT em argumentos facciosos e fracos, com base numa fundamentação completamente alheia à Recorrente (entre os quais se destacam os factos dos fornecedores indiciados não possuírem estrutura física de suporte à prestação daqueles serviços e da titularidade da Recorrente e da sociedade B....., como empresas familiares que são, serem detidas por A..... e, mulher, E.....), ficou provado não ter a AT demonstrado indícios fortes da falta de correspondência com a realidade do teor das declarações, contabilidade e da escrita, de modo a descredibilizar a presunção de verdade de que gozam, são as faturas contabilizadas como custos da Recorrente consideradas verdadeiras.(17) Y) À luz da prova produzida nos autos, todos os apontados indícios caíram necessária e totalmente por terra, ficando, de forma cabal, demonstrado que: Z) Em suma, de modo clarividente, a tese defendida pelos serviços de inspeção da AT, no sentido preconizado, é totalmente destituída de sentido, não se vendo como possam todos estes elementos e colaboração disponibilizados pela Recorrente aos serviços da inspecção não permitir à AT desenhar o circuito económico/financeiro de forma a sustentar a efetividade e materialidade das operações que as faturas em questão titulam. AA) Assim sendo, face ao que fica dito, conclui-se, ao contrário do que entende a sentença recorrida: • não só que a AT não logrou cumprir com o seu ónus probatório, pois não recolheu indícios suficientes e objectivos, os quais traduzem uma probabilidade séria de que as facturas, ora em causa, não titulam operações reais, BB) Choca o erro ostensivo em que incorre o julgamento da douta sentença em crise a fls. 40 - o desacerto é tal que refere fornecedores sequer estão causa nos presentes autos. CC) Em conclusão, são imprescindíveis os custos para efeitos de IRC constantes das facturas emitidas no período em análise, designadamente, Facturas n.° 115, 110, 111 e 109 emitidas no exercício de 2003 e Facturas n.° 245 e 228 emitidas no exercício de 2004, por C..... LDA. (cf. fls. 68/101 do RIT e Anexo 2 do RIT), referentes a trabalhos efectuados nas “acessibilidades ao novo Estádio da Luz” e “obra do IP5” e aluguer de equipamento de obra, conforme respectivos descritivos que constam das facturas, bem assim como das rendas pagas no ano de 2004 no contrato de locação financeira n.° …..55, no valor total de €36.657,52 (cf. fls. 67/101 e 73/101 do RIT e Anexo 17 do RIT).
DD) No que, particular, respeita à factualidade do contrato de locação financeira celebrado com o .....P e facturas emitidas por esta instituição bancária, desconsideradas pela AT, desde já se diga, que nitidamente a douta sentença recorrida, a fls. 42, assume as vestes da AT (esta com o claro objectivo claro de anular os custos em sede de IRC relativos às rendas pagas ao Banco no âmbito do contrato de locação financeira em questão, para assim, deste modo, fazer aumentar as receitas fiscais), porém, sem nunca colocar em causa a intervenção do .....P - ora, seguindo a tese da AT teria o .....P como entidade emitente estar indiciado de facturação “falsa” nos moldes anteriormente abordados, pois, como defende a AT e corrobora a juiz a quo, as facturas das rendas titulam operações simuladas. O que não foi o caso, nem poderia ser! EE) Nos autos, neste ponto, a Recorrente fez prova, reportando-se ao período de 2004/2008, não só que o tipo de bens em causa (i.e., as máquinas que usava nas prestações de serviços aos seus clientes, que eram equipamentos já usados “(...) 90% ou 95% ...detidas em leasings...”), objecto de valorização em virtude dos trabalhos de recondicionamento a que esses equipamentos são submetidos (cf. depoimento da testemunha D.....), mas também à razão de ser dessa valorização, dissipando qualquer simulação. FF) Por outro lado, caso tivesse a Mma. Juíza a quo procedido à correcta análise da prova produzida (não a negligenciando aprova do Proc. n.° 1349/10.0 BESNT que foi aproveitada para os presentes autos e que era imprescindível para o julgamento), não teria concluído, como refere a fls. 45, que “um jogo de correntes para um escavadora tem um preço de cerca de €20.000,00” não prova e é insuficiente para a variação do valor dos equipamentos entre o momento da alienação e o da aquisição titulada pelas facturas do .....P em crise (reitere-se, curiosamente, não colocadas sob suspeita nem de forma alguma indiciadas). GG) E aqui evidente que omitiu o Tribunal a quo o julgamento de factos essenciais para a boa decisão da causa, porquanto: II) Porquanto, o montante pelo qual os equipamentos em causa foram transmitidos e que consta das facturas emitidas, cujo valor a AT considera empolado e a Mma. Juiz a quo corrobora, corresponde ao valor que lhes foi atribuído em ambos processos de avaliação realizados pela empresa de peritagem contratada pelo .....P - a F......, LDA - e, ainda, pela A.... - E......, LDA (cf. Relatório junto como Doc. 20 da p. i.), que lhes atribuiu valor semelhante, aceite pela AT para constituição da garantia prestada para suspensão da execução fiscal - evidencia, de novo, a Mma. Juíza a quo desconhecer a prova produzida no Proc. n.° 1349/10.0 BESNT, aproveitada para os presentes autos e da qual consta que os bens em questão foram sujeitos a uma segunda avaliação, facto que, pelo contrassenso, não pode deixar de causar a maior perplexidade não só à Recorrente, mas a qualquer pessoa. JJ) Em suma, é forçoso notar o grosseiro e ostensivo o erro na apreciação da prova e na aplicação do Direito em que incorre a sentença recorrida em flagrante desconformidade com as provas indicadas pela Recorrente, evidenciando um atropelo da justiça, impõem decisão diversa da proferida(18), impondo-se ao Tribunal ad quem que controle a bondade do julgamento realizado nos autos(19). KK) Nestes termos, perante a demonstração de uma actuação ilegal, assente numa confabulação da realidade, tendo por base circunstâncias inverídicas e ideias pré- concebidas não consistentes com a realidade e, por isso, totalmente carente da verificação dos pressupostos que legitimem a actuação correctiva que deu lugar às liquidações adicionais impugnadas, e em face da prova da efectividade e imprescindibilidade das operações subjacentes a todas as facturas e operações em causa nos autos, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento de facto, por erro grosseiro na apreciação crítica da prova, em especial dos depoimentos prestados, e por erro na fixação dos factos declarados como não provados, e por conseguinte, em erro de julgamento de direito. LL) Deve, por conseguinte, ser concedido provimento ao presente recurso e revogada a douta sentença recorrida que mal andou incorrendo em erro de julgamento sobre a matéria de facto e consequente errónea aplicação do Direito, nomeadamente do artigo 23.º do Código do IRC, dos artigos 74.º n.º 1 e 76.º n.º 1 da LGT, bem como dos artigos 104.º n.º 2 e 268.º n.º 3 da Constituição da República Portuguesa. Termos em que, em face do que se alega, da fundamentação exposta e porque a douta sentença em crise mal andou, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, julgando-se: a) Nula a sentença recorrida por falta de fundamentação, devendo o Venerando Tribunal, em substituição, conhecer do objecto do presente recurso, que é de apelação, já que os autos fornecem todos os elementos de prova (quer documental, quer testemunhal) para o efeito, nos termos do artigo 715.º n.º 1 e 2 do CPC, ou, caso assim, não se entenda, sem conceder, ordenada a remessa dos autos ao tribunal recorrido para que seja proferida nova decisão, ficando assim prejudicado o conhecimento dos demais vícios invocados b) Nula a sentença recorrida por erro de julgamento de facto e de direito e, em consequência, declarados ilegais e nulos o acto de liquidação impugnado e respectivos juros compensatórios, com as devidas consequências legais, conforme peticionado na presente impugnação judicial. Como é legal e justo!» »« A recorrida, Fazenda Pública (FP), devidamente notificada para o efeito, não apresentou contra alegacões. »« A Exma. Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal, nos termos do artigo 289.º, n. º1 do CPPT, veio oferecer o seu parecer no sentido da improcedência, pelo menos parcial do presente recurso. »« Com dispensa dos vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta 1.ª Subsecção do Contencioso Tributário para decisão. »« II – OBJECTO DO RECURSO Como sabemos, independentemente das questões que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente é pelas conclusões do recorrente nas alegações de recurso que se determina o âmbito da sua e intervenção (cfr. artigos 635.º, n.º 4 e 639.º n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil). Acresce dizer que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo. »« III – FUNDAMENTAÇÃO De facto A sentença recorrida considerou como provados e não provados os seguintes factos: «a) A 17/02/2010, foi emitida a liquidação de IRC, à impugnante, com o n.º …..172, relativa ao exercício de 2004, que tomou em consideração matéria colectável no valor de 412.740,73euros, e um valor a pagar de 95.250,84 euros (cfr. documento de fls. 66 dos autos); b) A 12/03/2010 foi emitida demonstração de liquidação de juros, onde se lê (cfr. documento de fls. 67 dos autos):
c) A 22/04/2008 foi emitida carta aviso, relativa a acção de inspecção, dos anos 2002, 2003, 2004 e 2005, em IRC e IVA (cfr. documento de fls. 69 dos autos); d) A 27/07/2008 foi proferido despacho de prorrogação do prazo de procedimento de inspecção à impugnante, por três meses, relativa aos exercícios de 2002 a 2005(cfr. documento de fls. 87 dos autos); e) A 28/10/2008 foi proferido despacho onde se lê “autorizo a prorrogação do prazo de procedimento de inspecção por mais três meses” (cfr. despacho de fls. 84 dos autos); f) A 11/03/2009, A..... foi constituído arguido, no NUIPC: 1596/03.0JFLSB (cfr. documento de fls. 89 dos autos); g) A 3/08/2009 foi lavrada certidão de notificação pessoal da impugnante, relativo ao projecto de conclusões do relatório da Inspecção Tributária, para os exercícios de 2002, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008 (cfr. certidão de fls. 76 dos autos); h) A 03/12/2009 foi emitido ofício de notificação, no sentido da impugnante exercer o direito de audição prévia (cfr. documento de fls. 78 dos autos); i) A 10/02/2010 foi lavrada “certidão de notificação pessoal”, onde se lê “(…) certifico que notifiquei hoje, dia 10/02/2010, (…) o sujeito passivo B… (…) do conteúdo do Ofício n.º10507 de 05/02/2010 da Direcção de Finanças de Lisboa, relativo à notificação do Relatório Final das Conclusões da Acção de Inspecção (…) para os exercício de 2002, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008 (…)” (cfr. documento de fls. 80 dos autos); j) Lê-se daquele relatório final das conclusões da acção de inspecção, que se dá por inteiramente reproduzido, além do mais, o seguinte (cfr. documentos de fls.210 e ss. do PAT): “(texto integral no original; imagem)” (…)
“(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” (…)
(…) “(texto integral no original; imagem)”
(…) “(texto integral no original; imagem)” (…) “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)”
(…) “(texto integral no original; imagem)”
(…)
“(texto integral no original; imagem)”
(…) k) Na sequência da Ap. 19/1984-07-25 foi registada a constituição da sociedade B…. Lda., sendo o seu capital dividido em duas quotas iguais, uma das quais de A..... (cfr. cópia de certidão de fls. 91 dos autos); l) Ao relatório de inspecção, encontra-se anexado o seguinte (anexo 22, A fls. 389):
“(texto integral no original; imagem)” Não há factos alegados e não provados com interesse para a decisão da causa. Os factos provados assentam na análise crítica dos documentos juntos aos autos e não impugnados, conforme se indica em cada alínea do probatório. No que respeita à prova testemunhal produzida, importa destacar: - Quanto à primeira testemunha, a mesma demonstrou não ter conhecimento directo dos factos relativamente aos quais testemunhou, sendo o seu conhecimento um conhecimento indirecto, de ouvir dizer a seu pai, gerente da sociedade aqui impugnante, Alcino. m) A.....e a sua mulher, E....., são igualmente sócios-gerentes da sociedade B..... – B…, LDA., que tem como objeto social a “Indústria de exploração de pedreiras e comércio de britas” – cfr. cópia da certidão permanente a fls. 93 e 94 dos autos (doc. 154 junto à pi) n) Ambas as sociedades identificadas supra têm sede social no mesmo local (Aldeia Galega) – cfr. Consta das respetivas certidões permanentes o) A Impugnante detém licença que lhe foi concedida pela Camara Municipal de Tavira em 17/06/1989 “para exploração de pedreira e Central de Britagem em prédio rústico situado em Malhão, freguesia de Santo Estevão, Município de Tavira, denominado Mato” – cfr. fls. 95 e 96 dos autos (doc. 16 junto à pi) p) No extrato de conta de fornecedores da impugnante n.º 2210378, referente a C.....Lda., foi inscrito no exercício de 2004, o seguinte:
q) Em 06.08.2004 foi celebrado entre a Impugnante e o Banco Comercial Português, um contrato designado “CONTRATO DE LOCAÇÃO FINANCEIRA N.° 400012955”, de cujo teor, para além do mais, consta o seguinte: CONDIÇÕES PARTICULARES l. Descrição do Bem, objecto do Contrato:SEIS DUMPERS VOLVO A 40. TRES ESCAVADORAS DE RASTOS VOLVO/SAMSUNG, USADOS, N° SERIE _____ _____ _____ ____, _______ _______ _______ _______ _______ _______ factura proforma n° 0018/04 de 14/07/04. CENTRAL DE BRITAGEM PRIMARIA, QUATRO MOINHOS CONICOS DA MARCA NEYRTEC, USADAS, N°S SERIE ________ ________ ________ ________ _______, conforme factura proforma n° 0017/04 de 03/06/2004. 2. Identificação do Fornecedor do Bem C…& M… LDA (...) 4.Preço do (s) Bem(s): Euro 1.397.000,00 (...), a que acresce IVA à taxa legal em vigor. [...] 6. Valor global da Locação: Euro 1.496.204,92, a que acresce IVA à taxa legal em vigor (…)”. — cfr. Anexo 17 ao RIT, a fls. 508 a 513 do PAT. r) A impugnante, enquanto tomador, celebrou com a Fidelidade Mundial, um contrato de seguro no ramo Avaria “Máquinas, Equipamento e Instalações (Casco)”, com data de início de apólice reportada a 10/08/2004, referente aos seguintes bens: “01 - 3 ESCAVADORAS DE RASTOS (1 VOLVO NS 3170 e 2 SAMSUNG NS.KCX 45 E GDY 113., (…) 02 - 6 DUMPERS NS: 1253; 1257; 1258; 1259; 1260; 1078. (…)” - cfr. doc. 19 a fls. 192/193 dos autos s) A sociedade C..... Lda., emitiu em 06/08/2004 ao Banco Comercial Português as faturas e recibos n.ºs 121 e 122/04 referentes a: Fatura n.° 121/04 1-Central de britagem primária composta por ________________ TOTAL S/ IVA 425,000.00€ IVA 19% 80,750.00€ TOTAL 505,750.006 Recibo n.° 121/04, no valor de € 505.750,00 com o descritivo da referida fatura n.° 121/04;
Fatura n.° 122/04 1-VOLVO DUMPER A 40 série nr°1253 Ano 1997 _________________________ 97,500.00€ t-VOLVO DUMPER A 40 série nr°1257 Ano 1997 __________________________ 97,500.00€ 1-VOLVO DUMPER A 40 série nr»1258 Ano 1997 _________________________ 97,500.00€ 1-VOLVO DUMPER A 40 série nrº1259 Ano 1997 __________________________ 97,500.00€ 1-VOLVO DUMPER A 40 série nrº 260 Ano 1997 __________________________ 97,500.00€ 1-VOLVO DUMPER A 40 série nr°1078 Ano 1997 __________________________ 97,500.00€ 1-ESCAV. DE RASTOS VOLVO EC460 Série 3170 Ano 2001 _________________ 152,000.00€ 1-ESCAV. DE RASTOS SAMSUNG SE 450 Série UCX 0045 Ano 1999 ___________ 133,000.00€ 1-ESCAV. DE RASTOS SAMSUNG SE 280 Série HDY 0113 Ano 1999 ___________ 102,000.00€ ___________ TOTAL S/IVA ________972,000.00€ IVA 19% ____________184,680,00€ TOTAL _____________1.156,680.00€ Recibo n.° 122/04, no valor de € 1.156.680,00 cujo descritivo referido na fatura n.° 122/04. - Tudo conforme consta dos anexos 15 e 16 do RIT fls. 368 a 373 do PAT em anexo t) Por cartas datadas de 06/08/2004 e 12/08/2004 a sociedade C....., Construção Civil e Obras Públicas, Lda., endereçou ao Banco Comercial Português, S.A., identificando como assunto “DECLARAÇÃO REFERENTE [ÀS] FACTURAS N.° 121/04 E 122/04”, dá conta de que recebeu da empresa B… Lda., o montante global que consta das mesmas (faturas) e ao mesmo tempo autoriza o Banco a proceder ao pagamento do referido valor à referida sociedade (B…, Lda.) - cfr. Anexo 18 ao RIT, 382/383 do PAT aqui em apenso. u) O valor do crédito de locação financeira de € 1.662.430,00 foi creditado na conta da sociedade Impugnante (B…) e posteriormente transferido para a conta do sócio-gerente, A..... - facto não controvertido - cfr. artigos 117 e 118 da pi e Anexo 19 do RIT, a fls. 384v do PAT apenso. v) A Impugnante cumpriu integralmente o pagamento do contrato de locação financeira n.° 40001295597 – cfr. Anexo 17 do RIT, a fls. 380v a 381v do PAT em apenso. x) Em 18.08.2004 a Impugnante emitiu à sociedade C....., Lda., um recibo, no valor de € 51.765,00, referente a “LIQ DA N/FACTA 4919” - cfr. Anexo 11 ao RIT, fls. 359v do PAT apenso. y) Na mesma data a sociedade B....., LDA. emitiu um recibo à sociedade C....., Lda., no valor de € 107.100,00 referente a “LIQ DA N/FACTA 036” - cfr. Anexo 14 do RIT, a fls. 366v do PAT aqui em apenso. z) Em 2004 a sociedade C....., Lda. emitiu os seguintes documentos à Impugnante:
- cfr. fls. 53/75, 59/75, 71/75 e 72/75 do Anexo 2 do RIT, a fls. 295v, 298v, 304v, 305 do PAT apenso aos autos. »« De direito
Conforme resulta dos autos, a impugnante, aqui recorrente, foi objeto de uma ação de inspeção, movida pelos serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa, face à qual foram efetuadas correções à matéria coletável em sede de IRC e IVA nos exercícios de 2002 a 2008. Como se disse, nos presentes autos está em causa a liquidação adicional n.º 2010 8310001172, de IRC do ano de 2004 no valor total de € 95.258,86 e respetivos juros compensatórios e de mora. Em sede de aplicação de direito a sentença recorrida, considerou, em suma, que os indícios recolhidos pela AT são de molde a concluir como esta o faz e negou provimento à impugnação. Inconformada a impugnante, aqui recorrente apresentou o presente recurso jurisdicional, com os fundamentos que deixamos autonomizados na delimitação do objeto do recurso e que aqui passamos a dissecar. Porém, encetamos por dizer que, em parte, as questões aqui colocadas relativamente à nulidade da sentença são as mesmas que foram arguidas, pela recorrente no âmbito recurso que interpôs ao processo n.º 981/10.6BESNT, apreciado e decidido por acórdão neste Tribunal em 23/04/2020, em que a, aqui relatora, assinou como adjunta, sendo que aqui estava em causa IRC de 2003, apurado pela AT em face das correções propostas na mesma ação inspetiva que dá origem às correções impugnadas e que constituem o objeto do recurso que nos presentes autos, sendo por conseguinte o mesmo, o Relatório de Inspeção Tributária (RIT). a. Nulidade por falta de fundamentação, por falta de indicação dos elementos de prova e de análise crítica da mesma; Sustenta a recorrente que a sentença recorrida se revela “… deficiente, ambígua e obscura inviabilizando qualquer juízo inteligível sobre o seu conteúdo, razão pela qual não consegue a Recorrente descortinar que matéria de facto foi dada como provada, bem como o seu cabal exame crítico, adequado a fundamentar a improcedência da impugnação.” Considera ainda que, que não foi cumprida a exigência de indicação da matéria de facto provada e não provada tendo, outrossim, optado por “… seguir a prática censurável de verter nos factos provados o conteúdo do RIT,”. Conclui dizendo que “… a Mma. Juíza a quo não procedeu à análise da prova, negligenciando manifestamente a prova que foi aproveitada para os presentes autos e que era imprescindível, e assim omitindo o julgamento de factos essenciais para a boa decisão da causa.” Como se deixou expresso no acórdão que nos propomos acompanhar(1), seguindo o entendimento que repetidamente tem vindo a ser propugnado pelos nossos Tribunais Superiores e, como decorre do «(…) preceituado no citado artº.615, nº.1, al. b), do C.P.Civil, é nula a sentença, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade” – cfr. acórdão deste TCA, de 28/09/17, no processo nº 105/17.9BCLSB. Relativamente a conclusões em tudo idênticas a estas (formuladas, aliás, pela mesma Recorrente) afirmou-se no processo deste TCA nº 1116/10.0BESNT, de 05/03/20, o seguinte: “Porque a decisão não é, nem pode ser, um acto arbitrário, mas a concretização da vontade abstracta da lei ao caso particular submetido à apreciação jurisdicional, as partes, «maxime» a vencida, necessitam de saber as razões das decisões que recaíram sobre as suas pretensões, designadamente para aquilatarem da viabilidade da sua impugnação. // (…) // A exigência da fundamentação, prende-se, obviamente, com a necessidade de sindicar a bondade da decisão de facto, a qual, regra geral, determina a sorte da acção. // Certo é que, apesar de tudo, não é exigível que se proceda a uma fundamentação minuciosa e atomística exarando-se todo o percurso lógico e o raciocínio que incidiu sobre a prova e que levou à formação da convicção do julgador (…) // Mas também não é suficiente e admissível que se fique por uma referência e fundamentação genérica e mais ou menos abstracta, do tipo: «as respostas fundaram-se na prova produzida ou nos depoimentos das testemunhas inquiridas.». // Pois que tal poderia dar azo à formulação de um juízo arbitrário ou intuitivo sobre a realidade ou não de um facto, quando o que se pretende é que a convicção adquirida se faça através de um processo racional, ponderado e maturado, alicerçado e objectivado na análise crítica e concatenada dos diversos dados e contributos carreados pelas provas produzidas. // Assim sendo há limites que não é exigível que sejam ultrapassados, mas também existem mínimos que têm de ser atingidos. // E no que tange à prova testemunhal, sufragando-se a decisão, total ou parcialmente nela, para que a fundamentação seja aceitável, importa, pelo menos, que seja indicada a sua razão de ciência, os motivos por que mereceram, ou não, a credibilidade do Tribunal, as razões justificativas da opção feita e a articulação dos depoimentos prestados com os resultados de outras provas produzidas, sem o que não é cumprida a exigência do segmento normativo supra citado (…)» . Mais se refere que a nulidade em apreço «abrange não só a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo n.º 2 do artigo 123.º do CPPT, como a falta do exame crítico das provas, previsto no [artigo 607.º/4, do CPC]. (…) // Na previsão desta norma, a indicação da matéria de facto não provada deve ser feita indissociavelmente da indicação da matéria de facto provada, como se depreende da expressão «o juiz discriminará também a matéria provada da não provada», o que supõe que essa discriminação seja feita concomitantemente. Sendo assim, a falta de discriminação da matéria de facto não provada (…) será equiparável à falta de discriminação da matéria de facto provada, para efeitos da nulidade prevista no art.º 125.º, n.º 1, do CPPT» - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 29.05.2007, P. 1384/2007-1” Dito isto e regressando ao caso em apreço damo-nos conta que na sentença recorrida, veem detalhadamente especificadas as razões em que assenta a convicção do julgado probatório, quer quanto aos “factos provados”, quer quanto aos que foram dados por “não provados”, estes por considerar que, com interesse para a decisão da causa, são inexistentes nos autos e quanto aos primeiros, afirma que os mesmos “assentam na análise crítica dos documentos juntos aos autos e não impugnados”, sendo que no que respeita à prova testemunhal elucida as razões que justificam a decisão da matéria de facto, bem como a ponderação ou valoração efetuada sobre os documentos e depoimentos, assim e independentemente de se concordar ou não com a decisão encontrada, a verdade é que a sentença é esclarecedora quanto ao modo em que se formou a convicção do julgador quer face à prova documental, quer testemunhal, tendo, neste caso, em conta os factos a que respondeu cada uma das testemunhas inquiridas sem deixar de ter presente a respetiva razão de ciência e relevância (ou não), de cada um dos depoimentos, descrevendo os motivos que valorizou ou não, o respetivo depoimento. Dito isto e regressando ao salvatério e às conclusões recursivas, damos conta que a sustentação do vício em análise se reporta também e em síntese, ao facto de na sentença ter sido levado ao probatório a transcrição de parte do relatório da inspeção (RIT), considerando a recorrente que a discriminação da matéria de facto não se pode limitar a dar por reproduzidos documentos que constem do processo. A este propósito, louvamo-nos no acórdão deste Tribunal e Secção, de 13/04/10, proferido no processo nº 2800/08, também citado no aresto que vimos seguindo onde se diz que: «… em sede da matéria de facto julgada por provada, o juiz apenas tem que levar ao probatório aquela que se revele essencial à aplicação do direito. No mesmo sentido, o acórdão já aqui enunciado e parcialmente acolhido de 05/03/20, deste TCA Sul, vem enunciar que “… «[a]s informações prestadas pela inspecção tributária fazem fé, quando fundamentadas e se basearem em critérios objectivos» (artigo 76.º/1, da LGT e artigo 115.º/2, do CPPT), pelo que nada tem de censurável a especificação na matéria de facto de parte do RIT relevante para a instrução da causa, tornando assim transparente ao destinatário médio, colocado na posição da impugnante/recorrente, as razões que sustentam o acto tributário impugnado. Sem prejuízo, obviamente, do direito à alegação e prova dos factos contrários”. Dito isto, forçoso se torna concluir, na trajetória do que também ali foi decidido que, não se verifica a apontada nulidade da sentença por falta de fundamentação decorrente da transcrição de parte do RIT, a propósito da verificação dos indícios de faturação falsa, outra coisa é saber se, decidindo com base na materialidade assim apurada, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, situação que analisaremos em sede própria. Termos em que improcede a conclusão que vimos de analisar. b. Nulidade por défice instrutório Argumenta a recorrente que no dizer da sentença, “… tudo se passa como se tal prova não tivesse sido produzida nos autos, / por não constar do Proc. n.° 1349/10.0 BESNT qualquer decisão de remessa aos presentes autos das cópias das actas da audiência e respectivas gravações / por verificarmos que os termos em que foi tomada a decisão em crise são reveladores de que a Magistrada a quo, porque não leu as transcrições dos depoimentos, não tinha o suficiente e adequado conhecimento do processo, para poder entrar e conhecer da matéria de facto e a proferir uma sentença de mérito; concluindo-se que a Mma. Juíza a quo não procedeu à análise da prova, negligenciando manifestamente a prova que foi aproveitada para os presentes autos e que era imprescindível, e assim omitindo o julgamento de factos essenciais para a boa decisão da causa. Consideramos, na esteira do que, nesta matéria temos vinda a assumir que a asseveração reproduzida, salvo melhor e mais douta apreciação, não assume autonomia enquanto questão a tratar, pois, como resulta do teor das conclusões seguintes, o que se verifica é que a Recorrente entende, face à prova produzida (testemunhal e documental), que o julgamento da matéria de facto deveria ter conduzido a outro resultado. Nestes termos e porque assim pensamos, remetemos esta matéria para analise em sede própria, ou seja, como erro de julgamento da matéria de facto de que, de seguida nos iremos ocupar juntamente com o que se mostra enunciado na conclusão T) e seguintes. Porém, aludimos, desde já, que lidas conjugadamente as conclusões e as alegações de recurso, resulta, para nós claro, que a recorrente deu cumprimento ao ónus de impugnação da matéria de facto que sobre si impende, nos termos previstos no artigo 640º do CPC. Mas vejamos: c. Erro de julgamento por falta de discriminação dos factos não provados, bem como por erro na fixação da matéria de facto, que impunham diversa solução de Direito Ora lidas as alegações e conclusões recursivas resulta destas últimas - V) a AA) – temos que a recorrente dissente do decidido por considerar que quanto à desconsideração dos custos a que se referem as faturas emitidas por C..... Lda., e ao contrato de leasing celebrado com o .....P, SA a AT não logrou cumprir com o ónus probatório, que sobre si impedia, não tendo recolhido indícios suficientemente objetivos, capazes de traduzir uma probabilidade séria de que os documentos em causa não traduzem operações reais. Prosseguindo (i) Quanto ao valor probatório das declarações da Recorrente Como temos vindo a arcar, a presunção de veracidade das declarações dos contribuintes e bem assim a da sua contabilidade, impõe à AT a demonstração da falta de correspondência entre o teor dessas declarações e o seu conteúdo, sem o que terão as mesmas que considerar-se verdadeiras. Neste sentido dizem-nos, Diogo Leite Campos Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa(2), “[S]se as declarações ou a contabilidade e escrita apresentarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem a matéria tributável real do sujeito passivo, deixam de valer aquelas presunções. Sendo que emana do n.º 1 daquele normativo legal (artigo 74.º da LGT) que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque. Dito isto, forçoso se torna concluir que atento as regras do ónus da prova supra enunciadas cabe, em primeira linha, à AT pôr em causa de forma sustentada a presunção de veracidade das declarações apresentadas pelos contribuintes. Afastada a presunção, passa a competir ao sujeito passivo, naquelas situações em concreto, o ónus da prova de que o declarado corresponde à realidade. (ii) Quanto à distribuição do ónus da prova na comprovação das operações declaradas Face ao alegado recordemos o rumo reiteradamente assumida pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores em matéria de ónus da prova nas circunstâncias em que, como aqui, a AT desconsidera operações contabilísticas por as refutar como falsas. Nestes casos aplicando as regras implícitas no artigo 74.º da LGT, temos que compete à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que as operações constantes dos documentos suporte, não corresponde à realidade. Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da sua veracidade(3). Dito isto, importa também realçar, como aliás o faz a jurisprudência citada, que não se exige da Administração a prova direta da simulação, na verdade, em muitas situações não há como não recorrer à prova indireta, nomeadamente a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova”(4)– Assim e acolhendo aqui, por facilidade o que se deixou dito acórdão do TCAN, proferido em 23/11/2012 no processo 1523/05.0BEVIS-Aveiro, também citado no aresto de 23/04/2020, que vimos seguindo, dir-se-á, em suma, que “… no que concerne à prova que compete à Administração - na repartição do ónus da prova de que demos nota supra -, o que é imprescindível é que aquela a faça de factos suficientes indiciadores a que o Tribunal possa concluir, “em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” (expressão de Castro Mendes citado por Saldanha Sanches), pela elevada probabilidade (ou até certeza) de que o negócio declarado por aquelas partes não corresponde à realidade materializada naquela factura”. Vejamos, então, não perdendo de vista o enquadramento jurídico gizado, no intuito de dar resposta à questão de saber se, in casu, se extraí que a AT fez prova da verificação de indícios que lhe permitiam concluir, como o faz, isto é,se as operações (faturas e contrato de leasing) relativamente às quais os correspondentes custos foram desconsiderado não tiverem subjacentes quaisquer operações económicas realizadas entre os intervenientes. Em caso afirmativo, importará saber se a Impugnante logrou demonstrar em Tribunal que, não obstante os indícios colhidos, são reais, isto é, existiram efetivamente, tais operações económicas entre os sujeitos envolvidos. Antes de ingressar na questão a apreciar, importa referir que a mesma foi já colocada a este Tribunal em vários outros processos interpostos quer pela aqui impugnante/recorrente quer pela sociedade B..... – B….., Lda., da qual, como deixamos claro no probatório, os sócios-gerentes, são os mesmos, sendo que os contornos do contrato de locação financeira aqui em causa, bem como a questão a que se reporta a emissão de faturação alegadamente falsa e bem assim as considerações tecidas pela administração tributária (serviços de inspeção tributária) em relação ao mesmo, e consequentes correções em sede de IRC, em tudo idênticas àquelas que fundamentaram as correções a que se referem os autos. São disso exemplo os acórdãos deste TCAS proferidos em 05/06/2019 e em 17/10/2019, nos processos n.ºs 906/10.9BESNT e 903/10.4BESNT respetivamente, referentes ambos a IRC, o primeiro do exercício de 2006 e o segundo do exercício de 2005, um e outro deduzidos pela aqui, impugnante, onde, além do mais, para o que aqui releva foi apreciada, a legalidade da correção efetuada pelos serviços de inspeção relativamente à aceitação aos custos suportados, nomeadamente com, as rendas de contrato de locação financeira de aquisição de equipamentos, em tudo semelhante àquele que está em causa nos presentes autos. Porque assim é e tendo presente o disposto no n.º 3 do artigo 8.º do Código Civil que impõe ao julgador o dever de considerar na decisão todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito. Em suma, verificando-se, como vimos que se verifica, a identidade das situações, a decisão proferida nos arestos citados é aplicável aos presentes autos e porque não vimos motivos para dela discordar, iremos, no essencial, a seguir transcrevendo, quando for o caso, o que se deixou dito no proc. n.° 906/10.9BESNT, considerando que o proc. n.° 903/10.4BESNT já seguiu aquela decisão. Antes de mais, importa referir que nesta sede, ou seja, no âmbito do alegado erro de julgamento, a apelante referencia nas suas alegações de recurso e sintetiza na conclusão Y) que se encontram cabalmente demonstrados nos autos factos que, considera relevantes na apreciação do litígio, nomeadamente para demostrar que logrou provar os pressupostos de que depende o seu direito. Com isto, atento o rol de situações ali elencadas pretende, segundo entendemos, que este Tribunal Central Administrativo proceda à reapreciação da prova produzida nos autos, porém, e de acordo com o que vem exposto a recorrente não impugna a matéria de facto fixada, queda-se por dizer que: “ … da prova produzida nos autos, todos os apontados indícios caíram necessária e totalmente por terra, ficando, de forma cabal, demonstrado que:”, sendo certo que o elenco factual que se segue não cumpre o ónus probatório imposto no artigo 640.º do CPC, nomeadamente quanto aos concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (n.º 3), o que de resto, já tínhamos adiantado. Ora, dito isto, e não olvidando que como Tribunal de Recurso, este tribunal tem o poder/dever de alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa (artigo 662.º do CPC). Com efeito, o poder/dever atribuído ao tribunal ad quem, em sede de reapreciação da matéria de facto, restringe-se aos casos de manifesto erro na apreciação da prova e de flagrante desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e/ou pela insuficiência de factos fixados face à prova existente nos autos, contudo, dentro dos limites e com o respeito pelo princípio da livre apreciação das provas, atribuído ao decisor em 1.ª instância. Diga-se ainda, que, in casu, em sede de análise da prova documental, este tribunal, por considerar insuficiente a materialidade fixada na sentença e por se encontrarem documentalmente provados e não contestados, aditou, ao probatório, os elementos que em seu entender seriam, ou são, úteis ao apuramento da verdade material, mostrando-se suscetíveis de conduzir a decisão diversa daquela a que chegou a sentença em análise. Dito isto avancemos Vem assacada à sentença erro de julgamento por erro nos pressupostos subjacentes à liquidação adicional de IRC na parte correspondente à não aceitação dos custos constantes das faturas emitidas pela C....., Lda., e bem assim, as faturas emitidas pela instituição bancária referentes ao contrato de locação financeira n.° …..55 celebrado com o .....P. Com efeito, em síntese a IT explica no RIT (ponto III-4.1.2) estas as correções da seguinte forma; 1. A sociedade “B……, Lda.” faturou à “C....., Lda.” a venda de equipamento básico (três escavadoras de rastos de marca Volvo e Samsung), através da fatura n.º 4919 de 30/06/2004, pelo valor de 51 765,00€ (incluindo IVA); Ora a AT desconsiderou os custos com os encargos do contrato de locação financeira e as faturas emitidas pela sociedade C..... Lda., por ter considerado que se tratava de operações falsas e a sociedade (C..... Lda.) era um falso emitente sobre quem recaem indícios fortes dessa pratica, termos em que, retirando-a do circuito económico documentado, ficcionou uma transferência direta de titularidade dos bens em causa da B..... Lda., para a B....., Lda., cujos sócios, com posição dominante, são os mesmos. (conforme resulta do probatório. Tudo, deve dizer-se, por via de correções técnicas. Como vimos, a recorrente alega que estão em causa as faturas emitidas pela C....., Lda., e o contrato de locação financeira n.° …..955 celebrado com o .....P e faturas emitidas por esta instituição bancária, desconsideradas como custo pela AT no apuramento do seu lucro tributável. Ora, nesta sede, assume relevância o disposto no n.º 1 artigo 23.º do CIRC, que, na sua redação coeva, vem eleger como “… custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora…” Em suma, a noção legal de custos ou perdas do exercício, para efeitos de IRC, engloba todas as despesas realizadas pela empresa quando, (i) devidamente comprovadas, (2) forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora da empresa em causa. Trata-se de uma formulação normativa que visa assegurar o apuramento do rendimento real das empresas impondo as regras, que do ponto de vista fiscal devem ser observadas para que as despesas necessárias à formação do rendimento possam ser aceites. Ora, “[O]os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico.” -Vide ac. do deste Tribunal proferido em 19/02/2015 no proc. N.º 08317/14. Em suma temos que, para que o custo seja aceite fiscalmente necessita por um lado de estar comprovado/documentado e por outro de ser indispensável para a realização dos proveitos. Ora na situação em apreço damos conta que nunca foi questionada a indispensabilidade dos custos, sendo certo que, como resulta da materialidade dada por provada os mesmo não são estranhos à atividade da impugnante e que os mesmos foram contabilizados por esta com base nos respetivos documentos de suporte, pelo que a sua não aceitação como custo fiscal do exercício, só poderia assentar, como é o caso na falta de materialidade (ou verdade) das operações refletidas nas nos respetivos documentos. Ora, conforme dissemos, presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal (artigo 75.º n.º1 do da LGT na redação coeva). Resulta ainda da alínea a) do n.º2 do citado preceito que cessa tal presunção de veracidade quando “[A]as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo”. O que significa que os indícios fundados de falta de verdade do declarado e contabilizado pela impugnante radicam essencialmente na falsidade da operação de venda a montante realizada. Deste modo forçoso se torna concluir, como aliás o fazem os arestos que vimos citando, no sentido de que a sentença não podia ter concluído como o fez, ou seja, com a afirmação de que “… os indícios recolhidos são se molde a concluir nos termos em que a AT concluiu.”, pois isso seria fazer recair sobre a impugnante o ónus de demonstrar a realidade de operações fictícias em que não participou e de que não beneficiou. Na verdade, os indícios fundados de falta de verdade do declarado e contabilizado pela impugnante quanto ao valor das rendas de locação financeira radicam essencialmente na falsidade da operação de venda a montante realizada entre a “C....., Lda.” e o Banco. Assim, como se diz no aresto que vimos acompanhando, tendo sido “ … quebrado pela AT o circuito económico documentado da operação desde a venda da B…. até à locação dos equipamentos à impugnante pelo B…, fica por apurar afinal através de que efectiva operação e por que valor foram os bens adquiridos pelo B… e posteriormente objecto de locação à impugnante. Ora, nada disso é coerente e factualmente explicado no relatório de inspecção tributária, a não ser, como alega a Recorrente, através de considerações, asserções e conjecturas que, acrescentamos nós, ainda que substanciadas, em nada se apresentam compatíveis com o método directo de correcção utilizado pela AT. Com efeito, como pode a AT afirmar com a segurança que o método directo exige, que o valor por que os bens foram adquiridos pelo B… e colocados à disposição da impugnante através de locação financeira correspondem ao valor de (…) por que a B.., a montante, os facturou à “C....., Lda.”? E isto, repare-se, sem nunca questionar a credibilidade do B…. quer como eventual beneficiário de facturação falsa, quer como eventual falso emitente. Teria a B….. facturado a venda dos equipamentos à “C....., Lda.” pelo valor real (que a AT aceitou por bons) ou abaixo do valor de mercado para subvalorizar os proveitos contabilizados? Não há, pois, nos autos, indícios fundados e seguros de que o custo contabilizado pela impugnante com rendas de locação financeira esteja suportado em facturas relativas a operação fictícia (de leasing), o que torna a correcção daquele custo e das amortizações dos equipamentos dele objecto, ilegal por erro nos pressupostos. Sem necessidade de maiores considerandos, logo se alcança que a douta sentença recorrida, ao validar o juízo da AT quanto à sobrevalorização dos bens locados e correcção dos custos contabilizados pela impugnante com rendas de locação financeira na proporção da diferença de 470.200,00€ (apurada entre o valor da factura 286-A emitida pela C....., Lda.” ao B… e da factura 5304 emitida pela B…. à C....., Lda.”), incorreu em erro de julgamento, não podendo manter-se na ordem jurídica, assim se concedendo provimento ao recurso.” – fim de citação Aqui chegados, concluímos que, como ali, os indícios apontados pelos serviços de inspeção sobre a falta de verdade do declarado, radicam essencialmente na eventual falsidade da operação de venda ocorrida a montante entre a “C....., Lda.” e o Banco C….. e, quanto muito, entre a Impugnante e a C….., suportada na fatura n.º 4919 de 30/06/2004, que a AT não logrou questionar. Por fim, resta dizer que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento, e nessa medida não se poderá manter, devendo ser revogada. Termos em que o recurso merece provimento, devendo ser anulada a liquidação de IRC de 2004 objeto dos presentes autos, com as respetivas consequências legais, nomeadamente quanto a juros compensatórios e de mora, enquanto atos consequentes de atos administrativos anteriormente anulados (artigo 133.º, n.º 2, alínea i) do CPA).
IV- DECISÂO Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida, julgando-se procedente a impugnação judicial, anulando-se a liquidação de IRC do exercício de 2004 objeto dos presentes autos, sendo nulas as respetivas liquidações de juros compensatórios e de mora. Custas pela recorrida, sem lugar ao pagamento da taxa de justiça nesta instância pela Fazenda Pública nesta instância porque não contra-alegou. Registe e Notifique
Hélia Gameiro Silva - Relatora Ana Cristina Carvalho – 1.ª Adjunta Lurdes Toscano – 2.ª Adjunta (Com assinatura digital) (3) CRISTINA FLORA, in “A Prova no Processo Tributário”, texto publicado na Revista do Centro de Estudos Judiciários n.º 2016-II (4) MANUEL TOMÉ SOARES GOMES, in “O novo processo civil - textos e jurisprudência (Jornadas de Processo Civil – Janeiro 2014 e jurisprudência dos tribunais superiores sobre o novo CPC)”, Centro de Estudos Judiciários, Caderno V, 2015, p. 347 (5) ABRANTES GERALDES, in Sentença Cível, http://www.stj.pt/ficheiros/estudos/Processo- Civil/asentencacivelabrantesgeraldes.pdf, p. 7 (6) CRISTINA FLORA (ob. cit.) (7) JORGE LOPES DE SOUSA in Código de Procedimento e de Processo Tributário 6.ª edição 2011, Anotado e Comentado, Vol. II (8) Neste sentido, veja-se o Acórdão do TCAN de 28-01-2016, proferido no proc. n.º 00831/06.8BEPEN, disponível em www.dgsi.pt, cuja fundamentação é relevante para o presente recurso. (9) Neste sentido, o Acórdão do TCAN de 15-01-2015, proc. n.º 00171/09.9BEAVR, Relator Pedro Vergueiro, disponível em www.dgsi.pt (10) Acolhido por CRISTINA FLORA, in “A Prova no Processo Tributário”, texto publicado na Revista do Centro de Estudos Judiciários n.º 2016-II (11) Neste sentido o Acórdão do TCAN de 24-01-2017, Proc. n.º 01744/07.1BEPRT, Relatora Ana Patrício, disponível em www.dgsi.pt (12) Nos termos em que decidiu o Acórdão do TCAN de 28-01-2016 no processo n.º 00831/06.8BEPEN, ou seja, “não exige uma descrição textual e exaustiva de cada facto não provado, bastando-se com uma simples remissão que permita identificar com exactidão o facto ou os factos a que respeita, por exemplo para os artigos das peças processuais, que possibilite às partes ou a qualquer destinatário da sentença apreender com facilidade os factos que o julgador considerou não provados, visto que a falta da sua descrição textual pode facilmente ser suprida pela sua leitura/visualização na peça ou documento processual para onde a remissão é feita. Obedecendo aos cânones impostos pelo art.º 9.º, n.º 2, do Código Civil a norma é passível de interpretação no sentido de que o legislador do CPPT quis autonomizar a matéria provada da não provada, não impondo que esta seja obrigatoriamente descrita, ao prescrever que “o juiz discriminará também a matéria provada da não provada” (negrito nosso). Se outra fosse a sua intenção, isto é, se o fim visado com a norma fosse a discriminação da matéria provada e não provada, então por certo que a redacção que teria sido utilizado seria esta: “o juiz discriminará também a matéria provada e a não provada”. A discriminação é, pois, entre uma e outra e não uma discriminação das duas.(…) – Neste sentido, cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 30/01/2014, proferido no âmbito do processo n.º 07160/13.” (13) Cf. JORGE LOPES DE SOUSA, in «Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado» II volume, Áreas Editora, 2011, pág. 320, citando a declaração de voto do Senhor Conselheiro Dr. Brandão de Pinho proferida no acórdão do Pleno da Secção do Contenciosa Tributário do STA de 07/05/2003, no proc. N.º 0869/02 (14) Acórdão do TCAN de 24-01-2017, Proc. N.º 01744/07.1BEPRT, Relatora Ana Patrício, disponível em www.dgsi.pt (15) Neste sentido refere-se VIEIRA DE ANDRADE, in A Justiça Administrativa (Lições), 2ª. edição, pág. 269 (16) Cf. Acórdãos TCA Norte de 07-05-2002, proc. n.º 3266/00, de 24-01-2008, proc. n.º 01834/04, de 24-01-2008, proc. n.º 2887/04, de 27-01-2011, proc. n.º 455/05.7BEPNF e de 18-03-2011, proc. n.º 456/05BEPNF, disponíveis em www.dgsi.pt (17) Neste sentido Diogo Leite de campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in Lei Geral Tributária - Anotada e Comentada. 4.º Ed., Vislis, 2012 p. 664 (18) Acórdão da Relação de Lisboa de 15-09-2015, Proc. N.º 61/14.5 e Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 06-07-2006, Proc. n.º 220/06, ambos integralmente disponíveis em www.dgsi.pt (19) Cf. Acórdão do TCAS, de 22-10-2015, Proc. N.º 08238/14, disponível em www.dgsi.pt
(4)Conforme nos diz Alberto Xavier, in “Conceito e Natureza do Acto Tributário”, pág. 154. (5)Cfr. Acórdão do STA proferido em 27/10/04, no processo 0810/0 |