Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 376/09.4BELRA |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 01/14/2021 |
Relator: | ANA PINHOL |
Descritores: | IRC; AVALIAÇÃO INDIRECTA; PRESSUPOSTOS; AUTORIDADE DO CASO JULGADO. |
Sumário: | I.Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à Administração Tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT).
II. As irregularidades da contabilidade não conduzem automaticamente à aplicação de métodos indirectos. III.Não basta a existência de irregularidades na contabilidade para que a Administração Tributária possa recorrer ao apuramento da matéria colectável com recurso a métodos indirectos, é ainda necessário demonstrar de que forma essas irregularidades inviabilizaram a avaliação directa. IV.A Autoridade do caso julgado visa vincular as partes e o Tribunal evitando, dessa forma, que a relação ou situação jurídica já definida por decisão transitada em julgado seja novamente apreciada para o efeito de decidir o objecto da segunda acção. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO I.RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença proferida no TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DE LEIRIA que julgou procedente a Impugnação Judicial deduzida pela sociedade denominada «J.........., S.A.», na sequência do indeferimento do recurso hierárquico que, por sua vez, havia sido interposto da decisão de indeferimento de reclamação graciosa apresentada contra o acto de liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios, referente ao ano de 2003. Termina as suas alegações com a formulação das seguintes conclusões: «A. Vem-se apontar erro de julgamento na decisão proferida pelo Tribunal recorrido, porquanto na mesma se deu como integralmente provado o teor do RIT e da decisão do procedimento de revisão da matéria tributável, onde ficou bem demonstrada a motivação das correcções com recurso a métodos indirectos efectuadas à impugnante e, bem assim, a fundamentação para a aplicação da avaliação indirecta, concluindo, ao arrepio desse probatório, pela ilegalidade da utilização da avaliação presuntiva. B. É admissível que a decisão judicial se aproprie do teor do RIT como elemento probatório e de fundamentação, como se retira da lição desse Tribunal Central Administrativo (processo n°02800/08): C. Já não será de aceitar que tal força probatória seja ignorada quando criticamente confrontada com as alegações da impugnante, desconsiderando ainda o acréscimo de fundamentação que foi conferido ao acto tributário sindicado, por via das conclusões a que chegou a AT em sede de procedimento de revisão da matéria tributável, verdadeiro 2° grau de fundamentação (art°91°da LGT). D. Só assim se justifica uma significativa alteração da quantificação da matéria tributável inicialmente vertida no RIT, passando tal valor de €1.424.062,86 para €1.093.396,83 e assim moldando decisivamente o resultado final da liquidação de IRC impugnada. E. Postula-se no aresto impugnado o obstinado axioma de não bastar a contabilidade do sujeito passivo evidenciar plúrimas irregularidades - reconhecidas aliás pelo Tribunal -, sendo essencial a AT provar tais irregularidades não permitirem a correcção por métodos directos. F. É ponto assente que tal é o quadro delimitador da actuação da AT nos presentes autos, como definido nos artigos 87°, nº1, al. b) e 88°, als. a) e b) da LGT e no art°52°, n°1 do Código do IRC. G. No entanto, importa atentar nos concretos elementos que suportam a necessidade da AT aqui recorrer à utilização de métodos indirectos para o apuramento da matéria tributável: H. Cumular de circunstâncias que se afiguram ser a eloquente expressão da "impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável' por "insuficiência de elementos de contabilidade", ao invés do que postula a impugnante e se firmou com menos clarividência na sentença sob recurso. l. Ao invés igualmente da decisão vertida no processo de impugnação n°25/11.0BELRA, vindo aí a redundar num juízo merecedor do nosso aplauso e concordância, porquanto «Pelo exposto, conclui estarem reunidos os pressupostos legais para o recurso a métodos indirectos, face às insuficiências e contradições evidenciadas na contabilidade da impugnante relativa ao ano de 2003.». J. Circunstância com que se legitima assacar novo erro de julgamento ao aresto recorrido, desta feita por via da violação do princípio ou da autoridade do caso julgado, uma vez que decidiu em sentido oposto ao da sentença proferida no citado processo n°25/11.0BELRA, julgado no mesmo Tribunal Administrativo e Fiscal e intentado pela recorrida para sindicar liquidações adicionais de IVA relativas a 2003, fundamentadas nos mesmos procedimentos de inspecção tributária e de revisão da matéria tributável. K. Se é verdade que não estamos perante um caso julgado material ou formal, devia não obstante a sentença impugnada ter norteado o seu sentido decisório no respeito pelo que o mesmo Tribunal anteriormente julgara, evitando-se a existência de duas apreciações contraditórias tendo por objecto uma idêntica situação fáctico-jurídica - a ilegalidade ou legalidade do recurso à avaliação indirecta pela AT neste caso concreto. L. Do mesmo passo, tal teria igualmente acautelado a salvaguarda do princípio da uniforme interpretação e aplicação do Direito, o qual sai algo mais que beliscado do confronto entre os dois arestos que se trazem agora à colação. M. Adicionalmente, indeferiu o Tribunal a quo o pedido formulado pela Fazenda Pública para que fosse dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça, como admitido pelo art°6, n°7 do RCP, por «No caso dos autos não ocorreram quaisquer factos ou circunstâncias determinantes de uma simplificação da tramitação processual ou de complexidade inferior à comum que justifiquem a dispensa de pagamento solicitada.». N. Reputa-se que tal interpretação da Lei, no sentido de se exigir para tal redução ou dispensa de pagamento a verificação de uma menor complexidade da causa e de uma simplificação da tramitação processual, vai contra a formulação e o espírito da norma. O. O preceito parece antes apontar para a ponderação casuística duma situação-padrão, a qual teria o seu contraponto inibidor nas situações elencadas no n°7 do art°530° do CPC onde se indicam as acções de "especial complexidade"; nessas sim, sendo desde logo de afastar a possibilidade de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça. P. Em apoio de uma interpretação e aplicação mais benignas do regime contido no RCP, chama-se à colação a jurisprudência sobre a matéria firmada no Supremo Tribunal Administrativo (Acórdão n°01953/13, de 2014-05-07): «A norma constante do n°7 do art.6° do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade. Nestas circunstâncias a nosso ver e ao invés do decidido, que considerou não estarmos numa situação de simplicidade jurídica, reafirmamos, também por atenção ao disposto no art° 447-A n° 7 do CPC (actualmente art° 530° n° 7), a não complexidade da(s) questão(ões), pelo que estão reunidos os pressupostos para a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça nos termos impetrados, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas nos autos.» Q. Tendo o Tribunal a quo incorrido no vício de error in judicando em mais de um segmento decisório, estima-se dever ser revogada a sentença impugnada, com o concomitante juízo de improcedência para o pedido anulatório da liquidação adicional de IRC que ali, a nosso ver indevidamente, se anulou. Nestes termos e nos demais de Direito que V. Ex.as douta e sapientemente suprirão, pugna a Fazenda Pública para que se dê provimento a este recurso, revogando-se a sentença em crise e, julgando em substituição, se decrete a improcedência desta impugnação tributária e determine a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça para a recorrente, com o que se fará a sempre desejada Justiça!» ** A recorrida apresentou contra-alegações aí concluindo do modo que segue: «1ª) A liquidação de IRC e de juros compensatórios, referentes ao ano de 2003, impugnada no presente processo, resultou da fixação da matéria tributável por métodos indirectos; 2ª) A Administração Tributária (AT), considerou que havia uma impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável; 3ª) Para demonstrar a referida impossibilidade de comprovação e quantificação directa da matéria tributável, a AT invocou, em primeiro lugar, a circunstância de a ora recorrida não possuir inventário permanente; 4ª) A exigência de as empresas terem um inventário permanente foi estabelecida pelo Decreto-Lei n°49/99, de 12/1 e apenas para algumas empresas; 5ª) O que quer dizer que, antes de tal diploma, e, após ele, em relação a muitas empresas, havia contribuintes que, legalmente, não tinham inventário permanente e tal nunca impediu a Administração Tributária de efectuar uma quantificação directa da matéria tributável; 6ª) Aliás, como é dito na Circular n°8/01, de 25 de Janeiro, da Câmara dos Revisores Oficiais de Contas, "a não adopção do sistema de inventário permanente não é, porém, determinante para a formação da opinião do revisor/auditor, visto que, em variadas circunstâncias, o controle das existências e o razoável apuramento dos saldos relacionados com as mesmas podem ser assegurados por outras formas "; 7ª) E se é certo que a AT invoca que a falta do referido inventário permanente a impossibilitou de realizar uma avaliação directa, uma vez que o sistema contabilístico do contribuinte "não fornece todos os elementos que consideramos necessários, nomeadamente, as quantidades entradas, saídas, existências e respectivas valorizações", a verdade é que a AT não aponta uma única ilegalidade ou irregularidade no referido sistema contabilístico da empresa; 8ª) A AT, por outro lado, não faz qualquer prova de que a invocada inexistência das referidas "quantidades, entradas, saídas, existências" a impossibilitaram de realizar uma avaliação directa da matéria tributável; 9ª) A AT, para justificar o recurso aos métodos indirectos, invocou, também, a existência de informações divergentes fornecidas pelo contribuinte quanto ao sistema de custeio e relativas ao apuramento do custo industrial dos produtos; 10ª) Também aqui, a AT não fez qualquer prova, isto é, demonstração, que a existência das invocadas informações divergentes a impossibilitaram de fazer uma avaliação directa; 11ª) Sendo certo que não existem informações divergentes, mas sim uma posterior informação do contribuinte, corrigindo os lapsos constantes da primeira informação, sendo que a AT, durante todo o procedimento inspectivo, nunca suscitou qualquer dúvida sobre o conteúdo das referidas informações; 12ª) A AT indica, também, como elemento que demonstraria a impossibilidade de realizar uma avaliação directa, a existência de incongruências na prestação de informações relativas à produção de determinados bens, sem indicar que incongruências seriam essas, nem, muito menos, demonstrar que tais incongruências a impossibilitaram de realizar uma avaliação directa; 13ª) A AT invoca, também, a circunstância de o contribuinte utilizar, em sede valorimetria das existências, o método dos "preços de venda deduzidos da margem normal do lucro" o que seria contrário às regras estabelecidas no Plano Oficial de Contabilidade; 14ª) Porém, o referido método estava expressamente previsto no Código do IRC (art°26°, nº1, c)), além de que a Administração Tributária não fez prova de que a utilização de tal método a impossibilitava de realizar o controle directo da matéria tributável; 15ª) Aliás, o Tribunal Central Administrativo Sul já teve ocasião de se pronunciar sobre uma situação de desrespeito pelas disposições do POC quanto à valorimetria das existências, concluindo que tal apenas podia fundamentar "correcções técnicas e já não o recurso a métodos indiciários, posto que, ostensivamente, é possível apurar a matéria colectável por via directa, com os elementos que constam da contabilidade do sujeito passivo " (Acórdão de 25/1/2005, Processo n° 330/04); 16ª) A AT invocou, também, como justificação para a aplicação dos métodos indirectos a exigência de indícios de omissão de vendas no chamado "sector dos móveis"; 17ª) Para tanto, utilizou uma amostra constituída por 13,76% dos produtos vendidos pelo contribuinte; 18ª) Sendo certo, por um lado, que uma amostra de 13,76% está longe, muito longe, de representar o "universo" em causa e, por outro, nessa amostra não se tornou em consideração a existência de diversos tipos de produtos que são vendidos pelo contribuinte, cujas margens de comercialização são, entre si, muito diferentes; 19ª) Aliás, sobre esta questão, em sede de Comissão de Revisão, o perito independente constatou e demonstrou os erros lapidares cometidos pela AT; 20ª) A AT invocou, também, a existência de indícios de vendas não declaradas no chamado "sector dos estofos"; 21ª) Porém, em sede de Comissão de Revisão, o referido perito independente constatou e demonstrou os erros lapidares cometidos pela AT na tentativa da demonstração da existência de indícios de vendas não declaradas; 22ª) O mesmo ocorreu no chamado "sector dos colchões", com o perito independente a constatar e a demonstrar os referidos erros lapidares cometidos pela AT; 23ª) Assim, é patente, como julgou a douta sentença recorrida, que a AT não demonstrou a existência de muitas irregularidades na escrita do contribuinte, nem, muito menos, demonstrou que as invocadas irregularidades a impediram de efectuar uma avaliação directa à matéria tributável; 24ª) A douta sentença recorrida aplicou, exemplarmente, a orientação jurisprudencial, segundo a qual "cabendo à AT (...) o ónus de alegação e prova da ocorrência em concreto dos pressupostos legais legitimadores do recurso à metodologia indiciaria (...) não se pode limitar a expor as razões para a falta de credibilidade dos valores contabilizados, antes tem, ainda, e também, de explicitar as razões porque é que tal ausência de credibilidade implicou a impossibilidade de quantificação directa, ainda que por correcções técnicas" (Acórdão do TCA Sul de 14/7/2010, Processo n°03784); 25ª) Mas ainda que fosse legal a aplicação dos métodos indirectos, sempre o valor da matéria tributável assim fixado é patentemente ilegal; 26ª) Como constatou e demonstrou, na Comissão de Revisão, o perito independente, essa fixação baseou-se, ilegalmente, em amostras de 13,6% das vendas, na não discriminação entre os diversos tipos de produtos vendidos que têm, pela sua diferente natureza, diferente margem de lucro e em patentes erros técnicos e financeiros; 27ª) Ao invés do defendido pela recorrente Fazenda Pública, não há, na douta sentença recorrida, qualquer erro de julgamento; 28ª) E que, a sentença recorrida não considera provados os pressupostos constantes do Relatório da Inspecção Tributária, mas sim, e apenas, dando como provado que houve uma inspecção e qual o conteúdo dessa inspecção; 29ª) Como inexiste, de todo em todo, na sentença recorrida, qualquer erro de julgamento por violação do caso julgado, já que a sentença do TAF de Leiria, invocada pela recorrente, além de dizer respeito a um outro imposto que não o que está em causa na presente impugnação, não transitou em julgado; 30ª) Por tudo isto, deve improceder o recurso da Fazenda Pública. Termos em que o presente recurso deve ser julgado improcedente, mantendo-se a douta sentença recorrida como é de Justiça». ** Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e a Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso e confirmada a sentença recorrida. ** Colhidos os vistos aos Exmos Juízes Desembargadores adjuntos, cumpre apreciar e decidir. ** II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO De acordo com o disposto no artigo 635º, nº 4 do Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação do Recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. As questões a decidir, tendo em conta o teor das conclusões formuladas pela Recorrente, são as seguintes: - Autoridade do caso julgado; - Se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao concluir que não estavam verificados os pressupostos da fixação da matéria tributável com recurso a métodos indirectos; - Dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do artigo 7.º, nº6, do Regulamento das Custas Processuais (RCP). ** III. FUNDAMENTAÇÃO DOS FACTOS Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto nos seguintes termos: «A) Em 20-03-2007, os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Santarém, elaboraram relatório final de procedimento de inspecção, efectuado à ora Impugnante, ao exercício de 2003, onde consta, designadamente, o seguinte:“[…] Capitulo I – Conclusões da acção inspectiva Capitulo II - Descrição sucinta das conclusões da acção de inspecção. II.1. Objectivos, âmbito e extensão da acção inspectiva II.1.2- Motivo, âmbito e incidência temporal II.1.3- Descrição da empresa Capitulo III - Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável Capitulo IV - Motivo e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos IV.1 - Análise da actividade produtiva da empresa IV.1.1 -Inexistência de Inventário Permanente IV.1.2 – Informações divergentes em sistema de custeio IV. 1.3. Carácter subjectivo das informações dadas IV.1.4. Incorrecta valorização dos Produtos em Vias de Fabrico e dos Produtos Acabados IV.1.4.1. Sector dos Móveis IV.1.4.2. Sector dos Estofos IV.1.4.3. Gastos Gerais de Fabrico – Incorrecta imputação de custos IV.1.4.4. Divergência entre Inventário Final/Fichas Técnicas IV.1.4.5. Incongruências transversais na valorização dos Inventários IV. 2 Sectores de Actividades – Confronto Vendas / Stocks IV.2.1.Sector de Estofos IV.2.1.1– Compras Brutas de matérias primas IV.2.1.1.1 Camas de Réguas - Divergências IV.2.1.1.2 Nidos (Estrados Elevatórios) para Sofás Lagos - Divergências IV.2.1.1.3. Análise industrial ao sector estofos Tecidos - Cascos e camas de réguas – Incorrecta valorização nas fichas técnicas IV. 2.1.1.4. Conclusão da análise ao Sector Estofos IV. 2.2. Sector de Móveis IV. 2.2.1. “Compras Brutas” de Matérias-Primas IV. 2.2.2. Cadeiras de Madeira – Divergências IV. 2.2.3. Estrados Metálicos – Divergências IV. 2.2.4. Conclusão da análise ao Sector Móveis IV. 2.3. Sector dos Colchões / Sommiers e N*Sommiers / Tapis – N*Tapis IV. 2.3.1. Colchões IV. 2.3.2. Sommiers e N*Sommiers IV. 2.3.3. Tapi’s e N*Tapis IV.3. Pressupostos para aplicação de Métodos Indirectos Capítulo V – Critérios de cálculo dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos V.1 – Análise Geral Percentagem de Vendas Brutas Por Sectores
Imputação dos Descontos e Devoluções aos Vários Sectores
Deste modo o valor das vendas líquidas no sector dos estofos e no sector dos móveis, estofos estofos e colchões são as seguintes: Vendas líquidas
V.1.1. Sector dos Estofos Sabendo que as compras líquidas ascenderam a 6.162.810,98€, foi efectuado o cálculo do CEVMC como segue:
Tendo em conta aquela Margem Bruta I de 33,85%, ponderada e corrigida, apurada na mostragem e considerando que o CEVMC declarado pelo Sujeito Passivo foi de € 327.382,15 as vendas de estofos ascenderiam a € 9.565.203,55. (…) Aplicando a fórmula e calculando as vendas apurou-se um valor superior ao montante das vendas declaradas pelo Sujeito Passivo em cerca de 208.736,46€ (9.565.203,55€ -9.356.467,09€) Considerando tudo o que anteriormente se expôs, e atendendo à exiguidade da mostragem bem como ao empolamento de valorização de algumas matérias-primas, nomeadamente cascos e camas de réguas e à falta de elementos que permitam aferir com rigor, a margem obtida efectivamente optou-se por efectuar correcções não com base na margem Bruta, mas sim com base na valorização das faltas em vendas registadas em Sofás Lagos, Sofás e Conjunto de Cantos com Camas de Réguas, conforme anteriormente descrito. Este critério parece-nos mais rigoroso e conduz a valores sensivelmente semelhantes. V.1.1.1.– Correcções no Sector dos Estofos: V.1.1.1.1. Estrados Elevatórios (Nidos) para Sofás Lagos Relativamente a este sector e após análise às compras, vendas e aos inventários inicial e final do ano de 2003 constatou-se a existência de irregularidades que se consubstanciam na falta de 46 Estrados elevatórios (Nidos), que se consubstanciaram na falta de Vendas de igual numero de Sofás Lagos (Anexo 9) Deste modo apurou-se o preço médio de cada Sofá Lagos vendido (Anexo 9), tendo-se procedido ao apuramento das vendas em faltas no montante de 10.838,06€, (…) Assim teremos em falta:
V.1.1.1.2. Camas de réguas em Sofás e Conjuntos de Canto Relativamente a este sector e após análise às compras, vendas e aos inventários inicial e final do ano de 2003 constatou-se a existência de irregularidades que se consubstanciam na falta de 727 Camas de réguas, que se consubstanciaram na falta de Vendas de igual número de Sofás/Conjuntos de Canto com incorporação deste produto. Deste modo apurou-se o preço médio de cada sofá/conjunto de canto vendido 305,79€ (Anexo 8) tendo-se procedido ao apuramento das vendas em faltas no montante de 222.309,33€ (…). V.1.2. – Correcções no Sector dos Móveis: (…) Vol. Negócios Corrigido = 18.225.760,87 (…) V.1.3. – Outros Produtos Comercializados V.1.3.1. – Colchões / N*Colchões Relativamente a este sector e após análise às compras, vendas e aos inventários inicial e final do ano de 2003 constatou-se a existência de irregularidades que se consubstanciam quer na falta de vendas/compras de colchões, já anteriormente referidas, pois a empresa comprando colchões de um determinado modelo e dimensão, deverá vendê-los com a mesma designação, já que cada um deles é referenciado fisicamente com uma etiqueta. Deste modo iremos presumir quer os valores das compras quer das vendas do seguinte modo: - Ir-se-á proceder ao cálculo do valor médio da compra de cada colchão (para este cálculo iremos ter em conta os valores identificados neste relatório, onde está registado a quantidade de colchões adquiridos bem como o respectivo valor de compra; -Relativamente às vendas iremos ter em conta as vendas de colchões registadas automaticamente para o cálculo do preço médio de venda. (…) Assim teremos em falta:
V.2.– Correcções Globais V.2.1.– IRC – Determinação do lucro tributável corrigido Em face dos valores de vendas e compras, presumidos em falta, apurado nos 1.1.1, 1.2. e 1.2 deste Capítulo V, apurou-se o seguinte valor global sobre o resultado fiscal declarado: (…) Total 1.424.062,86 € Deste modo, apura-se o seguinte Lucro Tributável Corrigido pelos Serviços de Inspecção Tributária: Lucro Tributável Declarado 555.280,99 € Correcções por Métodos Indirectos 1.424.062,86 € Correcções Meramente Aritmética 9.297,80 € Lucro Tributável Corrigido 1.988.641,65 € V.2.2.– IVA (…) Capítulo IX – Direito de Audição - Fundamentação O Sujeito Passivo foi notificado pessoalmente no dia 06 de Março de 2007, na pessoa o seu Director Financeiro Dr. J........., NIF ........., para exercer o direito de audição, nos termos previstos no artigo 60.º da Lei Geral Tributária no artigo 60.º do Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária, tendo-o exercido, mediante remessa postal, o qual deu entrada nestes serviços no dia 20 de Março de 2007. Com referência ao Direito de Audição em anexo a este relatório e que faz parte integrante do mesmo (anexo 10), a posição da Administração Tributária é a seguinte: Relativamente aos pontos 1°, 2°, 3° e 4° do Direito de Audição a Administração Tributária reitera os pressupostos invocados no Projecto de Relatório e que estiveram na base das correcções efectuadas com recurso a métodos indirectos, pois o contribuinte não apresenta dados concretos que inviabilizassem os pressupostos e consequentemente a aplicação de métodos indirectos. Mais, o próprio sujeito passivo reconhece que o relevante volume de negócios a que se dedica e as várias áreas de actuação dificultam “ … um exacto e rigoroso conhecimento da situação da empresa.” Sector dos Móveis No tocante aos pontos 5° e 6° do Direito de Audição a Administração Tributária importa salientar que em 11 de Janeiro de 2007, foi notificado o Sujeito Passivo para apresentação das fichas técnicas de produção em termos de matérias-primas dos produtos mais vendidos. Mediante os elementos facultados foi elaborada uma amostragem que em termos de valor representa 13,76%, tendo sido a mesma considerada representativa, uma vez que foi elaborada com base em dados fornecidos pelo próprio Sujeito Passivo. Relativamente aos pontos 7° e 8,° importa referir que o quadro inserido na página 3 de 12 do Direito de Audição apresenta erros quer quanto ao valor indicado para as compras, quer ao valor indicado para as vendas, uma vez que incluem outro tipo de produtos (estrados de aglomerado, estrados elevatórios, etc) e não apenas os estrados metálicos como refere o Sujeito Passivo, Assim, a margem apurada de 16,57% está desvirtuada verificando-se que foi calculada aplicando um raciocínio circular que conduziria a um preço médio de incorporação de 22,786€ (97.395,90€ / total unidades incorporadas) e a um preço médio de venda de 22,099€. A estar certo, tal quadro, e considerando as quantidades vendidas directamente de 25.521 então o preço unitário de venda seria de 22,099€, e que conduziria a uma margem de 37,055% o que também não corresponde à realidade. Além disso, o Sujeito Passivo não demonstra o cálculo do valor de incorporação do qual se serviu para determinar o custo médio de venda a partir do qual calcula a margem, ou seja fez depender o custo de incorporação do custo das mercadorias vendidas do valor de incorporação e este daquele, sem base em qualquer documento contabilístico ou extra-contabilístico que forneça o valor dos items. Deste modo, no que respeita a estes pontos, não assiste razão ao Sujeito Passivo, nos termos em que o apresentou. Relativamente ao ponto 9° alega o Sujeito Passivo que vendeu igualmente lareiras, platex, radiadores e fórmica, sendo que tais bens são produtos com menor incorporação de MOD e GGF, comparativamente aos restantes produtos produzidos no sector dos móveis. No entanto, não junta elementos que permitam aferir da veracidade da quantificação dessa imputação. Por outro lado, os preços constantes no inventário final da matéria-prima não tem correspondência com a matéria-prima utilizada para o fabrico do produto “FMxx” que é a FMxx - PLACAS 930X930 e, como tal a valorização indicada pelo Sujeito Passivo não pode ser validada. Não obstante, e tentando analisar o valor indicado, foi efectuada análise exaustiva ao inventário tendo-se verificado que eventualmente a FMxx” estaria designada por MDFxxx*xxx*xx. Mesmo assim, todos os valores encontrados foram menores que os indicados no anexo “Doc 1” apresentado pelo Sujeito Passivo, à excepção dos MDFxxx*xx em faia e cerejeira, não sendo possível chegar aos mesmos valores das matérias-primas indicado pelo Sujeito Passivo. Importa referir ainda o facto de o Sujeito Passivo não ter junto qualquer documento e/ou elemento demonstrativo que permitisse a comprovação dos valores apresentados em sede do Direito de Audição, designadamente facturas de compra das matérias primas em causa. Acresce ainda salientar, relativamente a este ponto 9° que, o quadro apresentado na página 4 de 12 do Direito de Audição está incorrecto quanto ao Custo das Existências Vendidas e Consumidas que é de 10.842.505,14€ e não do valor indicado. Face ao exposto anteriormente, conclui-se que o Sujeito Passivo não apresentou quaisquer elementos relevantes, concretos e sustentados, pelo que se mantém o descrito no ponto “ V. 1.2.2. - Cálculo da Margem Bruta I do Sector dos Móveis” do Projecto de Relatório desta acção inspectiva que transita na íntegra para o presente Relatório Final. Sector dos Estofos Relativamente aos pontos 10° a 12° informa o Sujeito Passivo no Direito de Audição a venda de mais 880 camas de réguas, porém não apresenta nenhum quadro que sirva de confronto ao quadro pelos Serviços de Inspecção apresentado na página 30 do Relatório Projecto, não podendo ser efectuada a validação dos dados agora apresentados, com a nota de que tais dados incluem elementos referentes a camas tela nylon, matéria- prima que não foi por nós considerada, pelo que os 880 não são comparáveis com os nossos valores. Tendo sido notificado no dia 11 de Janeiro de 2007 para informar relativamente à matéria-prima “Camas de Réguas” quais os produtos em que são incorporados e/ou resposta, que foram possivelmente vendidos a terceiros alguns exemplares de camas de réguas mas em pequena expressão. O restante das camas de réguas foram englobadas em sofás diversos. Nunca foi a Administração Fiscal informada de que os sofás vendidos para a Inglaterra continham camas de réguas. Também a análise efectuada à base de dados (anexo 11) relativamente às referências vendidas aos clientes mencionados no Doc. 2 do Anexo ao seu Direito de Audição não revela sofás com réguas. Assim sendo, não podemos validar os elementos apresentados pelo Sujeito Passivo seu Direito de Audição, pelo que se mantém as correcções propostas no Projecto de Relatório que transitam na íntegra para o presente relatório. Relativamente aos pontos 13º e 14º do Direito de Audição importa salientar que os produtos em vias de fabrico com a designação “Cascos Sofá Lagos 3L c/Elev,” referem-se a cascos destinados a Sofás Lagos 3L C/ Elev. e não a cascos com estrados elevatórios incorporados. Seria impensável estofar um casco com um estrado elevatório lá dentro! Não podemos validar o quadro final do ponto 13° do Direito de Audição uma vez que não concordamos com o facto de os cascos conterem já estrados elevatórios. Assim sendo, mantém-se a Administração Fiscal. Sector dos Colchões Relativamente aos pontos 15° a 28° do Direito de Audição, verifica-se o seguinte: Refere o sujeito passivo que não deve existir uma total correspondência entre os códigos indicados nas facturas de aquisição e os códigos indicados nas vendas de colchões. De facto a contabilidade deve estar organizada de modo a que se consiga obter um resultado fiável e perante o que o contribuinte afirma, ao comprar um produto com uma referência e ao vende-lo com uma designação diferente, deveria ter esses factos identificados na sua contabilidade de modo a despistar quaisquer erros de análise e avaliação, o que não sucedeu. Afirma por outro lado que se efectuasse uma soma de todos os colchões vendidos com a soma das existências, não se encontravam as divergências do relatório. Tal não corresponde à realidade pois nos mapas que anexámos ao Anexo n.º 5 do Projecto de Relatório e anexamos neste Relatório Final, constata-se perante a soma algébrica de todas as diferenças (positivas ou negativas), uma falta de 1.462 colchões em compras. Refere também o sujeito passivo no cálculo que efectua nos pontos 18° e 19° do Direito de Audição, que existem 2.068 colchões consumidos em sofás lagos. De facto no Projecto de Relatório não foram considerados consumos de colchões em sofás, no entanto o sujeito passivo apenas invoca o consumo dos mesmos nos sofás lagos, não apresentado qualquer prova documental que corrobore tais afirmações, pelo que não poderemos considerar na sua plenitude. Ainda relativamente ao ponto 18° do Direito de Audição, o sujeito passivo apresenta um mapa com quantidades diferentes das apresentadas no Projecto de Relatório. Perante a análise que efectuámos á base de dados da facturação, bem como aos valores constantes nos inventários, reiteramos os nossos valores os quais referem-se apenas a Colchões e Ncolchões, não se tendo tido em consideração as compras/vendas de Colchonetas e de Norcolchão. Apresentando o contribuinte valores diferentes dos por nós calculados, deveria consubstancia-los com elementos concretos quanto ao tipo de produtos e modo de cálculo dos mesmos, afim de podermos identificar as diferenças, o que não aconteceu, pelo que será de manter as quantidades por nós calculadas. Refere ainda o Sujeito Passivo, vários casos em que a compra de um colchão com uma determinada descrição não corresponderá a uma descrição idêntica na venda, sentando um mapa relativamente ás designações de compra/venda. Tomemos como exemplo o colchão adquirido com o nome Soflex que foi vendido (segundo o sujeito passivo) com as designações: Artiflex, Clássico, Ibérico, Iberpluma, Orto. Especial, Super Africa e Salmon.
Ao analisarmos o Mapa atrás elaborado, perante os dados que o Sujeito Passivo indicou no Direito de Audição, verificamos que deixa de existir uma venda em falta de 5.294 colchões, passando a existir uma compra em falta de 2.078 colchões, factos estes que retiram credibilidade aquilo que o sujeito passivo apresenta, pois a diferença entre as vendas em falta e as compras em falta seria nula, o que não sucede. Afirma também o sujeito passivo que os colchões adquiridos com o nome Mónaco, são vendidos com a designação Ncol Dermoflex e Iberolatex. Relativamente aos Colchões Mónaco não detectamos qualquer irregularidade. Quanto aos colchões Ncol Dermoflex, apresenta uma diferença de 18 colchões em falta de venda e os colchões Iberolatex apresentam uma falta de compras de 37 unidades. Assim, perante as afirmações do sujeito passivo, passaríamos a ter diferenças em falta nas compras nos colchões Mónaco e eventualmente deixaríamos de as ter no Ncol Dermoflex e no Iberolatex, facto este retira credibilidade ao que o sujeito passivo apresenta, pois segundo as suas afirmações as diferenças seriam nulas. Tomemos ainda como exemplo o colchão adquirido com o nome Ncol Ortopedico que foi vendido (segundo o sujeito passivo) com as designações: Euromola, Ort. Sup. Conf., Sanperflex, Tecniflex, Douroflex, Orto. Conf. e Supermacia:
Ao analisarmos o Mapa atrás elaborado, perante os dados que o sujeito passivo indicou no Direito de Audição, verificamos que deixa de existir uma venda em falta de 5.603 colchões, passando a existir ainda uma venda em falta de 3.053 colchões. Atendendo às explicações do sujeito no Direito de Audição nos parágrafos 20º, 21º, 22º e 23º, seria lógico pensar que relativamente aos colchões identificados no quadro do parágrafo 24º, não existiriam compras destes colchões, facto que não se verificou pois foram identificadas nas compras contabilizadas, aquisições de todos aqueles modelos e referências. Fica assim por explicar, por parte do sujeito passivo a razão e as situações em que a substituição das referências se fez posteriormente à compra. Deste modo, e perante o atrás exposto não se afigura existir razão ao sujeito passivo nos argumentos apresentados no direito de audição, pelo que se mantém as correcções apresentadas no Projecto de Relatório que transitam na íntegra para o presente Relatório Final. - (cfr. fls. 127 a 187 do processo de reclamação graciosa apenso). B) Em 06-07-2007, o Director de Finanças de Santarém, por inexistência de acordo entre os peritos na comissão de revisão, proferiu decisão com o seguinte teor:“PEDIDO DE REVISÃO DA MATÉRIA COLECTÁVEL NOS TERMOS DO ARTIGO 91° A 94° DA LEI GERAL TRIBUTÁRIA RECLAMANTE: J.........., SA NIPC: ………….. SEDE: Rua …………..(Amiais de Cima) –……..ABRÃ Perito Nomeado pelo contribuinte: P......... Do teor da Acta nº10/2007:
A amostragem apresenta-se distorcida pelo efeito que nela tem o peso do produto FM, 70,5% contra 51,66% na realidade produto em que se apurou uma margem de comercialização mais pequena, enquanto os produtos com margens de comercialização maiores, F e RC, têm, na amostragem, um peso claramente inferior ao da realidade. Por outro lado, o sujeito passivo seleccionou de FM 91,3% do total das vendas deste produto, com a nota de que se fosse estudado o universo FM a margem seria de 20,44% e não de 21,92%, ou seja, existe uma parcela de produtos (100 - 91,3%) que é responsável pela queda da margem e então, também por esta razão, a amostragem FM/F/RC não é representativa da realidade. De facto: 21,92 x 91,3 = 20,01 X x 8,7 = 0,43 20,44 X teria de assumir o valor de 4,94% como margem de comercialização. Face a isto, colocam-se então questões: -Que produtos FM fornecem a margem de 4,94%? -Porque não foram incluídas na amostragem inicial? Estas e outras dúvidas poderão ser explicadas pela simples e plausível possibilidade da matéria prima Laminite e Fórmica ser usada noutros produtos, designadamente em interiores de móveis, cozinhas, para além do produto designado FM. E essa possibilidade, que o contribuinte não explicou na sua petição, levaria a que o quadro apresentado no seu esclarecimento de 11/06/2007 fosse corrigido a nível do CMVC para FMs, não se determinando, consequentemente, a margem de 20,44%, mas uma qualquer outra, afastada ou não da de 21,92%, tudo dependendo do rigor técnico, agora sim, das fichas técnicas apresentadas, que, por não terem sido facultadas aos serviços de inspecção tributária, não foram testadas como foram as respeitantes ao sector estofos. Igualmente, não se determinaria para os 8,7% de produtos FM, não considerados na amostragem, mas incluídos no quadro referido acima, uma margem residual de 4,94%. Nesta conformidade: -não representatividade da amostra; -fichas técnicas não testadas; -inconsistência nos elementos fornecidos quanto ao CMVC deste sector, entendemos que falta ao sujeito passivo apresentar elementos que refutem, de forma objectiva e inequívoca, a margem no sector exportação, pelo que concluímos que se deve manter como representativa a apurada pelos serviços de inspecção tributária. • Estrados Quanto aos estrados, a amostragem apresentada pelo contribuinte, no doc 1/3 do pedido de revisão, evidencia uma margem de 22,09%, constatando-se que nela foram incluídos os tipos de produtos contabilizados no mesmo subgrupo estrados: -Estrados de aglomerado, estrados metálicos, estrado elevatório para estúdio e estrado metálico com pés redondos, pés, abraçadeiras, divãs. Desdobradas as vendas totais deste subgrupo, obtém-se o quadro seguinte, que fornece em paralelo os resultados da amostragem.
a) Margem LBN obtida com base no quadro apresentado pelo sujeito passivo no seu pedido de revisão, no doc página 1/3 e 2/3. Estatisticamente foi determinada a média X dos dados distribuídos por grupos. Relativamente aos estrados metálicos, os serviços de inspecção indicam estar em falta 3.308 unidades. O Sujeito passivo refuta este dado, apresentando para comparação não só estrados metálicos mas também estrado aglomerado e produtos - outros, o que, por ser globalmente considerado, inviabiliza qualquer comparação, antes se diluindo a diferença indicada na falta de rigor e inexistência de elementos objectivos e fiáveis. Além disso, aquela divergência serviu à inspecção tributária apenas como fundamento de aplicação de métodos indirectos e não, na prática, a qualquer aderência aos critérios previstos no artigo 90.º da Lei Geral Tributária. Dos elementos contabilísticos se retira também a informação de que foram adquiridos 35.762 estrados metálicos, pelo valor global de 497.359,94€, determinando-se um preço médio de 13,907 €. Da comparação deste valor com o preço médio de venda resulta uma MLBN de 18,81%, valor este que também não coincide com o fornecido pela amostragem do sujeito passivo. Mas a questão da amostragem não se esgota aqui, pois há que ponderar, sempre, a margem fornecida pelos estrados incorporados e que o sujeito passivo aí considera ser aceitável a de 40,51%. Além disso, pretender que um subsector tenha um determinado peso na amostra, com base nas suas próprias vendas registadas, é relevar a omissão de 3.308 unidades que, ao preço médio de 17,13 €, perfaz 56.666,00 € e, existindo omissões nas vendas, qualquer ponderação das margens será enviesada em razão dessas omissões. Efectuada uma ponderação, obtém-se uma margem de 22,23%: Vendas Declaradas 443.089,23 € Omissões + 56.666,00 € Total Est.metálicos 499.755,23 € ……..... 80,52 … .. 18,81% = 15,15 Vendas Est.Aglomerado 5.558,52 € ……… 7,34 …… 42,16% = 3,09 Vendas outros 75.347,71€ …….... 12,14 … 32,88% = 3,99 Total subsector 620.661,94 € 100% 22,23 Apenas o conhecimento do preço médio de compra e do preço médio de vendas permitirá determinar, na natural presunção de que as omissões, se as houver, se fizeram nas mesmas condições de mercado, a MB de LB/V. Todavia, considerando a aproximação entre o valor aqui encontrado e o indicado pelo sujeito passivo, aceita-se que este subsector gera a MLB/V de 22,09%. Concluindo:
Determina-se, assim, uma margem de 39,73% para o sector dos móveis. Face ao exposto, afigura-se-nos que as correcções mais justas serão: - CEVG sector móveis - 10.842.505,14 € - Margem LB/V - 39,73 -Vendas corrigidas = 10.842.505,14 € x 100 = 100 - 39,73 = 17.989.887,00 € -Vendas declaradas = 17.049.941,90 € -Vendas em falta: 934.945,10 € - Vendas em falta anteriormente apuradas = 1.175.819,67 € . Estofos Foram controladas as quantidades físicas das camas de réguas tendo por base o programa de facturação e os inventários, tomando para controlo todos os artigos cuja referência contém as combinações dos dígitos indicados a folhas 28/66 do relatório da inspecção, não existindo dúvidas quanto ao item controlado. Da análise deste produto, o sujeito passivo apresenta um mapa para confronto com o apresentado pela inspecção tributária. Nele é indicado que não foram consideradas as camas de tela nylon. Inclui uma linha "sofá 2L Inglaterra" que não consta do mapa elaborada pela inspecção tributária. No mapa inserto a folhas 11/19 relativamente às vendas, o valor inclui as camas de régua com telas, e destaca as vendas "Sofás 2L Inglaterra". Ora o sujeito passivo não refere qual o código do produto que, sem equívocos, indica a inclusão de cama de réguas, ou seja qual a combinação de dígitos que a Inspecção não controlou, uma vez que no mapa da inspecção (folha 30/66) o código 24 respeita a sofás vendidos para Inglaterra e para os clientes identificados no doc. 5, concluindo-se que os serviços de inspecção os consideraram no mapa de folhas 30/66, do respectivo relatório. O contribuinte inclui na sua análise camas de régua e camas tela nylon, quando a da inspecção versa, unicamente, sobre cama de réguas. Concluímos, portanto, que o sujeito passivo não desdobra, em quantidade, as camas de réguas, as camas tela nylon e o produto "sofás 2L Inglaterra". Na sua petição, a folhas 12/19, quando refere: " .... O negócio de exportação não tem um comportamento estável nas vendas, pode ocorrer num determinado ano e nos seguintes já não existir .... ", afasta-se do sentido de rigor de informação, pois deveria ter indicado o código do produto e esclarecer a razão da designação da facturação não identificar os componentes. Importa reforçar que os cálculos efectuados pela Administração Fiscal consideram as vendas de sofás 2L Inglaterra identificados com o código 24 SF, desconhecendo-se a que outros sofás 2L Inglaterra se refere o contribuinte na sua petição. Nidos (estrados elevatórios) Este produto, que foi controlado fisicamente com base nos elementos contabilísticos, também não merece a concordância do sujeito passivo quanto às divergências encontradas justificando que, relativamente ao estrado elevatório (Nido) 180 x 80 existe, por parte da inspecção, lapso na análise dos inventários ao não considerar que os cascos têm cama elevatória incluída na fase de produtos em vias de fabrico (PVF). Esse facto justifica, de acordo com o sujeito passivo, as diferenças encontradas pelos serviços de inspecção tributária. Quanto às diferenças que ainda assim subsistem, mas de sinal contrário (-16), resultam "de venda de sofás Lagos com código diferente 2SFLV38", e da eventualidade de existir cascos em PVF sem terem ainda o estrado incluído. Mais uma vez, não são fornecidas, por parte do sujeito passivo, informações rigorosas quanto aos seus Inventários, sendo possível haver cascos para sofás Lagos com estrado elevatório e sofás Lagos sem estrado elevatório, sem que nada os possa distinguir. Todavia, entende a Administração Fiscal que, pelo menos a valorização destes artigos, como PVF, deveria, inequivocamente, indicar se estava ou não incluído estado elevatório. Concordamos, assim, com a posição da Administração Fiscal quanto ao estrado elevatório não Incluído nos PVF. Quanto às vendas de sofás Lagos com código diferente, afigura-se-nos legítima a argumentação do sujeito passivo, pelo que, quanto à diferença estimada será abatido o total de 24 unidades vendidas com o código 2SFLV38, que efectivamente não foram considerados no relatório da inspecção tributária: Assim: 24 unidades x 235,61€ = 5.654,64 €, a abater ao total corrigido de 10.838,06 € sendo o valor a considerar na correcção de 5.183,42 € -Colchões No que respeita a colchões refere o sujeito passivo, na sua petição que a Administração Fiscal não considerou a incorporação de colchões em outros produtos, no total de 2.068, designadamente nos Sofás Lagos, que, de acordo com as fotografias juntas, incluem 2 colchões Ecoflex. Nada acrescenta quanto às dimensões do colchão usado. Atendendo ao estrado utilizado, 180 x 80, supõe-se que o colchão terá medidas que lhe sejam aproximadas. Quanto aos outros produtos que incorporam colchões, é em 11 de Junho de 2007 que o contribuinte faz referência a "Sommiers" e "Tapis" mas para destacar que a Administração Fiscal não considerou, na sua análise, compras de produtos com estas referências. Relativamente aos valores indicados na sua petição, a folhas 15/19, desconhece-se a origem de algumas referências, que não foi possível aos serviços de inspecção identificar nas compras da J……… à L........., pelo que as quantidades referenciadas no respectivo relatório como adquiridas se confirmam. Além disso, a existir referências diversas, globalmente tal não influencia as quantidades compradas, o mesmo se referindo em relação às vendas, no total de 129.354,00 €, líquido de devoluções. Igualmente se confirma, da análise efectuada, o que a inspecção tributária conclui na apreciação do direito de audição, folhas 64 a 66 do relatório, sobre os parágrafos 15.º a 28.º da petição através da qual o contribuinte exerceu tal direito. A divergência entre os valores indicados pela Administração Tributária e pelo sujeito passivo resulta também do facto de ter sido afastado da análise as colchonetas e os norcolchões, sendo que as colchonetas são produtos completamente diferentes em termos de fabrico e, quanto à designação em Espanha, reafirma-se também que o produto "COLCHONETA" é diferente do produto "COLCHÃO", bastando uma breve consulta a uma qualquer revista de decoração para o confirmar. É assim importante destacar que o universo que o sujeito passivo pretende confrontar é diferente do seleccionado pela Administração Fiscal, e deveria ter sido neste que poderia e deveria justificar e contrariar as conclusões quanto às faltas em compras e em vendas. Quanto à alegacão de que nos Sofás Lagos são incluídos 2 colchões, permitimo-nos tecer as seguintes considerações: 1. Desconhece-se as medidas usadas, porque nada foi indicado quanto a esse aspecto; 2.Em mapa anexo à sua petição, fornece-se a indicação de que o tipo de colchão que foi, alegadamente incorporado, se identifica como colchão Soflex; 3. No parágrafo 19 do esclarecimento prestado em 11/06/2007, efectua uma rectificação ao total dos colchões incorporados, calculados agora num total de 2.264 e não 2.068, como consta da sua petição inicial, justificando ".... admitindo-se que se tenham vendido alguns sofás lagos em que a pedido do cliente não se tenham incorporado os colchões …"; 4.No código do produto "Sofá Lagos", elemento da facturação emitida, não é possível obter, para a globalidade das vendas, qualquer dado quanto à incorporação ou não dos colchões; 5.Não se entende a extensão da afirmação quanto à possibilidade de terem sido vendidos sofás lagos sem incorporação de colchões. Deveria o sujeito passivo dispor, na sua contabilidade, de elementos que, inequivocamente, permitissem identificar essas situações e comparar preços entre sofás lagos vendidos com e sem colchão; 6.Mais uma vez o contribuinte pretende comparar situações não comparáveis, pois o controlo às quantidades se fez para o produto "COLCHÕES" e não para colchonetas e norcolchão, tapis e sommiers. As faltas encontradas são de "COLCHÕES". Alargado o universo dos itens controlados outras seriam as conclusões, mas e indiscutível que não pode um colchão ser vendido como yapi, ou como sommier ou mesmo até como uma colchoneta; 7.A terem sido incorporados colchões em tapis e sommiers, falta ao sujeito passivo fazer a identificação destes. Ainda e assim e por outro lado da análise e comparação possível dos preços facturados para Sofás Lagos com e sem cama elevatória, recolhidos na base de dados do sujeito passivo e que este facultou, conclui-se que as diferenças de preço, salvo outra explicação, podem incluir o preço de custo do colchão adicional para a cama elevatória. Face a estas considerações, objectivamente parece poder a Administração Fiscal admitir que poderá existir alguma razão na argumentação do sujeito passivo. Assim do total de 976 Sofás Lagos vendidos, verifica-se que 6 foram devolvidos, 7 foram vendidos sem cama elevatória e 5 foram vendidos sem estrado e sem colchão. Pelo que podemos concluir que temos 1.928 colchões incorporados em Sofás Lagos assim determinados: - 970 - 12 = 950 Sofás Lagos c/ 2 Colchões ……….. 1.916 colchões incorporados - 12 Sofás Lagos c/ 1 colchão………………………… 12 colchões incorporados TOTAL ......................................................................1.928 colchões incorporados Sendo o preço médio de venda calculado pela inspecção tributária, para o conjunto controlado (exclui colchonetas e norcolchão) confirmadas as compras e as vendas apuradas, de 43,64€ (página 56/66 do relatório), o valor da correcção que se encontra excessiva é de: - 43,64€ x 1.928 = ............... 84.137,92 € pelo que as vendas em falta são de 623.441,04€ - 84.137,92€= 539.303,12 €. Em face do exposto, conclui-se que os valores a fixar são, em IRC e IVA, os abaixo determinados: IRC - DETERMINACÇÃO DO LUCRO TRIBUTÁVEL CORRIGIDO
LUCRO TRIBUTÁVEL FIXADO Lucro Tributável declarado 555.280,99€ Correcções por métodos indirectos 1.093.396,83€ Correcções meramente aritméticas 9.297,80€ Lucro tributável corrigido 1.657.975,62€ (…). – (cfr. fls. 190 a 203 do procedimento de reclamação graciosa apenso). C) D) E) F) G) H) I) J) Consta da sentença recorrida a título de «Factos não provados» que: «Não se vislumbram outros factos alegados cuja não prova seja relevante para a decisão dos presentes autos» e, lê-se ainda na mesma sentença, sob a epigrafe «Motivação de decisão da matéria de facto», que: «A convicção do Tribunal que permitiu dar como provados os factos acima descritos assentou na análise dos documentos constantes dos autos e nos processos administrativos apensos, conforme se refere em cada uma das alíneas do probatório.» ** B.DE DIREITO Em causa no presente recurso jurisdicional está sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRC do exercício de 2003, resultante da determinação da matéria tributável por aplicação de métodos indirectos. Para assim decidir, julgou-se que a Administração Tributária não demonstrou impossibilidade de que as irregularidades detectadas na contabilidade da Impugnante (doravante recorrida) impedissem a correcção à matéria colectável por métodos directos. A Fazenda Pública (doravante recorrente) opõe-se a esta perspetiva, entendendo em primeira linha que com base na fundamentação aposta no Relatório de Inspecção e respectiva Decisão da Comissão de Revisão deveria o Tribunal «a quo» ter sustentado o juízo de legalidade reflectido no acto tributário sindicado. Ponderando a argumentação exposta, a qual se mostra melhor desenvolvida nas Conclusões C. a D., desde já, adiantamos que não nos revemos nessa posição. Com efeito, no que concerne ao valor probatório do Relatório de Inspecção Tributária (RIT), cabe notar que o artigo 76.º nº 1 da LGT aponta que «as informações prestadas pela inspecção tributária fazem fé, quando fundamentadas e se basearem em critérios objectivos, nos termos da lei», sendo que o artigo 115.º nº 2 do CPPT dispõe que «as informações oficiais só têm força probatória quando devidamente fundamentadas, de acordo com critérios objectivos», respeitando a aludida fundamentação a elementos objectivos e exteriores que comprovam as asserções produzidas pela Inspecção Tributária. (Neste sentido vide, Acórdão do TCA Sul de 26.06.2014 proferido no processo n.º 07148/13 e Acórdão do TCA Norte de 14.07.2014, proferido no processo n.º 02390/09, ambos disponíveis no endereço www.dgsi.pt) E, como se entendeu no primeiro dos Acórdãos citados: « (…)o valor probatório do relatório de inspecção está condicionado pela aplicação do princípio do contraditório, sob pena de directa violação do art.º 20.º, n.º 4, da CRP, que postula um processo judicial tributário equitativo e subordinado a critérios de legalidade (due process of law), o que requer plena igualdade de armas entre ambas as partes, como de resto é reconhecido pelo art.º 98.º da LGT. Actuado esse princípio e não sendo o relatório impugnado, este passa a ter força probatória plena. Sendo impugnado o que sucede? Valem para esta situação as judiciosas palavras de Manuel de Andrade: “Se a parte a quem incumbe o ónus probandi fizer prova de per si suficiente (prova principal) o adversário terá, por seu lado, de fazer prova que invalide aquela; que a neutralize, criando no espírito do juiz um estado de dúvida ou incerteza (convicção negativa). Não carece de persuadir o juiz de que o facto em causa não é verdadeiro (convicção positiva); cfr. artigo 346.º do Código Civil”». Baixando agora ao caso concreto, o que claramente verificamos é que o facto de o Tribunal «a quo» levar ao probatório o Relatório de Inspecção e a Decisão da Comissão de Revisão, não significa que os factos descritos ou alegados naquelas declarações se mostrem provados. Isto é assim porque o Tribunal «a quo» deu como provado nas alíneas A) e B) do probatório foi, tão só, a existência do Relatório de Inspecção e a Decisão da Comissão de Revisão com concretos conteúdos, que no caso, foram impugnados em sede de petição inicial (vide artigos 16º a 128º do respectivo articulado). E, como melhor veremos adiante, quanto ao teor das declarações corporizadas naqueles documentos, entendeu-se na sentença sob recurso (pelas razões melhor nela indicadas) que a Administração Tributária não demonstrou que as irregularidades da contabilidade da recorrida foram de tal modo graves que impossibilitam o apuramento por métodos directos. A questão está, pois, em saber se a Administração Tributária cumpriu o ónus de provar os pressupostos da tributação por métodos indirectos, demonstrando que a liquidação não pode assentar nos elementos fornecidos pela recorrida e que o recurso àquele método se tornou a única forma de calcular o imposto, externando os elementos que a levaram a concluir nesse sentido. Vejamos, então. Em primeiro lugar, convém recordar que no regime legal vigente, a declaração de rendimentos sujeitos a tributação compete ao contribuinte, impondo a lei à Administração Tributária o dever de fiscalizar tal declaração com a consequente possibilidade de recurso a meios alternativos de fixação da matéria tributável, nos termos também definidos na lei. Isto porque se presume a veracidade dos dados e apuramentos constantes da contabilidade, caso o contribuinte disponha de contabilidade organizada segundo a lei comercial e fiscal e porque essa presunção de veracidade só cessa se se verificarem erros, inexactidões ou outros fundados indícios de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva do contribuinte (cfr. artigo 75.º da LGT). Mas, neste caso, cabe à Administração Tributária o dever de demonstração da ocorrência dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável), impendendo, ao invés sobre o administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados esses pressupostos. Este entendimento, no entanto, tem de ser temperado com o princípio da descoberta da verdade material e, por consequência, também, com o da oficiosidade de investigação e indagação das provas, que rege o procedimento tributário. Em bom rigor «A matéria tributável é avaliada ou calculada directamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indirecta nos casos e condições expressamente previstos na lei.» (cfr. artigo 81.º, n.º1 da LGT). Quer dizer, a avaliação directa é o modo de avaliação que a lei elege; a avaliação indirecta só nos casos previstos na lei e sempre de forma subsidiária da avaliação directa (cfr. artigo 85.º, n.º1 da LGT), que só pode ter lugar quando o contribuinte não cumpra os deveres a que está obrigado, já que vigora no nosso ordenamento jurídico, como já o dissemos, o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável. E, por isso, a Administração Tributária tem de utilizar elementos de facto conhecidos que, segundo as regras da experiência, pautadas por critérios de razoabilidade e de normalidade e tendo em linha de conta as especificidades próprias da actividade do contribuinte, conduzam à extrapolação dos factos conhecidos ou à aproximação da realidade que se procura alcançar. No caso vertente, conforme se extrai do Relatório de Inspecção (cfr. al.A) do probatório) a correcção aqui sindicada teve como suporte legal a alínea b) do artigo 87.º e alíneas a) e d) do artigo 88.º, ambos da LGT e artigo 52.º do Código do IRC, justicando-se por isso, que se relembre o que delas emana. Sob a epígrafe «Realização da avaliação indirecta» determina a alínea b) do artigo 87º, da LGT: «A avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de: a) (…); b) Impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto;(…)» E, sob a epígrafe «Impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável» as alíneas a) e d) do artigo 88º da LGT, que determinam: «A impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indirectos, referida na alínea b) do artigo anterior, pode resultar das seguintes anomalias e incorrecções quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável: a)Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais; b) (…) c) (…) d) Existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços, bem como de factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada.». Reportando-nos ao caso presente e feito este breve enquadramento quanto à avaliação da matéria tributável por métodos indirectos, as circunstâncias que segundo a Administração Tributária implicaram o recurso aos métodos de avaliação indirecta são as seguintes: a) Inexistência de Inventário Permanente com a consequente não observância da Normalização Contabilística na sua plenitude e impossibilidade de quantificação directa e exacta da matéria tributável, já que o sistema contabilístico que a empresa dispõe, não fornece todos os elementos que consideramos necessários, nomeadamente, quantidades entradas, saídas, existências e respectivas valorizações no que respeita quer a matérias-primas; produtos em vias fabrico; produtos acabados. b) Informações divergentes relativas ao sistema de custeio relativas ao apuramento do Custo Industrial dos Produtos. c) Indícios de falta de vendas, apuradas quantitativamente, de diversos produtos seleccionados no “Sector de Estofos” (Ao nível dos produtos com incorporação de camas de réguas e também dos produtos com incorporação de estrados elevatórios (nidos) de dimensão 180x080. d) Indícios de falta de vendas apuradas quantitativamente, de diversos produtos seleccionados no “Sector de Móveis” (Cadeiras e estrados de metálicos). e) Indícios de falta de vendas de outros produtos comercializados (Colchões), por análise integral das compras, vendas e devoluções de existências. f) Incongruências na prestação de informação relativa à produção de Tapis e Sommiersg) Incongruências dos elementos relativos à actividade produtiva da empresa, nomeadamente a não concordância da valorização do produto acabado com o indicado nas fichas de produção. E foi também a partir de tais factos que a Administração Tributária se considerou impossibilitada para a comprovação directa e exacta da matéria colectável questionada. Sucede, que a nosso ver, não demonstrou suficientemente que as apontadas irregularidades na contabilidade, inviabilizam o apuramento da matéria colectável por métodos directos, porque não basta que a inspecção tributária aponte que a contabilidade da recorrida padece de irregularidades, sendo, outrossim, imperativo, dado o carácter subsidiário da avaliação indirecta, que se demonstre que essas irregularidades são de tal forma graves que não permitem a correcção por métodos directos, sendo seguro que para tal são insuficientes meras conclusões. Na verdade, não se retira do discurso fundamentador aduzido pela Administração Tributária essa demonstração, na medida em que não explicou, como lhe competia, que irregularidades apontadas à contabilidade da recorrida inviabilizam, impossibilitam o apuramento da matéria tributável por métodos directos. Na verdade, como se escreveu na sentença recorrida: «Apenas inexiste controvérsia em relação à inexistência de inventário permanente. Mas esta inexistência não impede o recurso a métodos directos. Com efeito, quanto às margens, não ficou devidamente fundamentada a invocada incorrecta valorização e divergência em produtos do mesmo sector, não resultando claro se estão em causa margens calculadas de diferente forma, pois que uma margem por sector ou por produto, como foi calculada no relatório aqui em causa, não é o mesmo do que uma margem média. Nem se consegue aferir como foram construídas as amostras e constatar o seu peso relativo, impossibilitando, sequer, verificar a margem média das diversas margens elencadas no relatório. O que aliás, foi questionado pela Impugnante em sede de Comissão de Revisão e foi reconhecido que as mesmas são excessivas. Depois, quanto ao sistema de custeio das matérias primas, apesar das informações fornecidas pela própria Impugnante em sede procedimental serem divergentes, importava mais uma vez, face a essa divergência explicitar o porquê do não recurso a correcções de natureza aritmética. Não resulta, pois, seguro que as comparações efectuadas pela inspecção tributária fossem de realidades comparáveis, nos termos em que o foram,sendo certo que este fundamento não é transversal, pois não foi invocado, relativamente ao sector dos colchões. Para além disso, tal como referido pela impugnante, nesta parte o próprio relatório entra em contradição ao referir que o inventário apresenta irregularidades na valorização e, em simultâneo, considera que esses mesmos inventários não revestem valor exagerado. Ademais, veja-se que apesar da inexistência de um Inventário Permanente não é somente pela sua falta que se mostra legitimado o recurso a métodos indirectos de tributação, antes se impondo a demonstração cabal de que essa falta inviabiliza a quantificação directa da matéria tributável, o que não foi feito. Aliás, conforme refere a impugnante, aplicando-se a obrigatoriedade legal da adopção do sistema de inventário permanente (por força do Decreto-Lei n.º 49/99, de 12-01) apenas a algumas empresas, quanto às demais que não o detinham por a tal não serem obrigadas, não seria possível o controlo e cálculo da matéria tributável por métodos directos. No que respeita à utilização pela impugnante de critérios referentes à valorimetria das existências contrárias às regras da normalização contabilística, tal não implica, do mesmo modo, o recurso a métodos indirectos, impondo-se também neste particular a prova por parte da inspecção tributária de que o método utilizado pela impugnante não permitia ou impossibilitava a utilização do controle directo da matéria tributável. Quanto à divergência entre a margem de comercialização declarada pela impugnante e a que foi apurada pelos serviços de inspecção, no chamado "sector dos estofos", também aqui não vem indicada a onde reside a impossibilidade da determinação da matéria colectável. Não se compreende, aliás, o motivo da análise dos produtos ter sido apenas parcelar, calculando com base nos tipos seleccionados (Estofos, Móveis e Colchões) a margem de comercialização e concluindo que essa margem era diferente da declarada pelo contribuinte para demais tipos de matérias primas sem esclarecer, porém, como se impunha, porque motivo se ignorou a análise dos demais. Para além disso, perante os invocados indícios da falta de vendas de diversos produtos, ficou também por demonstrar que pelos dados apurados não era possível o uso de métodos directos para a determinação da matéria tributável.».P Concorda-se com esta posição, visto que, a nosso ver, a inexistência de inventário permanente não tem a virtualidade de inviabilizar o apuramento directo e exacto da matéria tributável nem justifica que a Administração Tributária se demita da obrigação legal de demonstrar que essa irregularidade contabilística inviabiliza o apuramento da matéria tributável. É certo, que reconhecemos que o sistema de inventário permanente permite o controlo efectivo das existências e assume um papel central na determinação da exacta medida da matéria tributável das empresas, porém, no caso concreto, cabe referir que todos os cálculos foram efectuados pela Administração Tributária com base nos elementos constantes na contabilidade da recorrida, o que demonstra, como bem refere a recorrida que não existe a referida impossibilidade de quantificação directa da matéria tributável. Para além do mais, a Administração Tributária limita-se a invocar como fundamento da aplicação da avaliação indirecta uma série de situações sem que se mostrem acompanhadas da mínima fundamentação que permite extrair a conclusão que extraiu. Ora, não pode esquecer-se que o apuramento do lucro tributável por esta via (métodos indirectos), se traduz sempre na extracção de uma conclusão indirecta e derivada, pois que tal método de tributação só se aplica por existir escassez ou ausência de dados que permitam apurar de forma directa e exacta a base tributável. Repete-se assim que, a impossibilidade de quantificação do facto tributário não é o mesmo que a ocorrência de irregularidades de escrita ou métodos inapropriados de inventariação das existências. Assim sendo, impõe-se concluir pela ilegalidade da liquidação quanto ao segmento decorrente da ilegal determinação da matéria tributável que lhe subjaz, por a Administração Tributária não ter demonstrado, como lhe competia, a verificação dos pressupostos de que a lei faz depender o recurso aos métodos indirectos de avaliação. Improcede, pois, o recurso nesta parte. Invoca a recorrente, ainda que o Tribunal «a quo» violou a autoridade do caso julgado, uma vez que decidiu em sentido oposto ao da sentença proferida no processo n° 25/11.0BELRA, julgado no mesmo Tribunal Administrativo e Fiscal e intentado pela recorrida para sindicar liquidações adicionais de IVA relativas a 2003. Mas carece de razão. A força e a autoridade atribuídos à decisão transitada em julgado visa evitar que a questão decidida pelo órgão jurisdicional possa ser validamente definida em termos diferentes, por outro ou pelo mesmo tribunal. A excepção de caso julgado assenta na força e autoridade da decisão transitada, destina-se ainda a prevenir o risco de uma decisão inútil, já que havendo duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, cumprir-se-á a que passou em julgado em primeiro lugar (artigo 625.º do CPC), o que significa que a instauração do segundo processo, ou a nova arguição da questão no mesmo processo, «(…) representaria um gasto inútil de tempo, de esforço e de dinheiro, além de constituir um perigo para o prestígio da administração da justiça, que cumpre naturalmente prevenir» (Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, Coimbra Editora, 1983, pp. 309/310) . Pode dizer-se então, que a Autoridade do caso julgado visa vincular as partes e o Tribunal evitando, dessa forma, que a relação ou situação jurídica já definida por decisão transitada em julgado seja novamente apreciada para o efeito de decidir o objecto da segunda acção. Retomando o caso dos autos, verificamos que embora os actos de liquidações impugnados em cada um dos processos (IVA e IRC) decorram do mesmo Relatório de Inspeção e com referência ao mesmo exercício, o certo é o Tribunal «a quo» não estava vinculado ao decidido no processo n.º 25/11.0BELRA. E isto pela simples razão de que à data em que foi proferida a sentença recorrida, o que ficou decido no processo n.º 25/11.0BELRA, não havia transitado em julgado, de resto nem transitou até à presente data (consulta ao SITAF). Assim, e nesta parte improcede também o recurso. Uma última questão que a recorrente submete à apreciação deste Tribunal Central é a de saber se a sentença recorrida fez correcto julgamento ao considerar que não deve dispensar-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça. Vejamos, então. Estabelece o artigo 6.º, nº 7 do RCP, que «nas causas de valor superior a € 275 000 o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento». Conforme entendimento expresso no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 07.05.2014, proferido no processo n.º 01953/13, a que aderimos sem reservas, «A norma constante do nº7 do artigo 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de 275.000€ (no presente caso o valor da acção é 420.55.16€) consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt) . Considerando que o valor da presente causa ultrapassa o patamar de 275.000€ e que a mesma não assumiu especial complexidade nem a conduta assumida por qualquer uma das partes, em recurso, pode considerar-se num nível reprovável, tendo-se limitado, como referido, grosso modo, à discussão da questão da quantificação da matéria tributável com recurso a métodos indirectos nem tendo havido lugar à produção de prova testemunhal. Neste contexto, nada obsta que a recorrente seja dispensada, do pagamento do remanescente da taxa de justiça, atendo o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade. Idêntico, entendimento aqui aplicável em sede de recurso. IV.CONCLUSÕES I.Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à Administração Tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT). II. As irregularidades da contabilidade não conduzem automaticamente à aplicação de métodos indirectos. III.Não basta a existência de irregularidades na contabilidade para que a Administração Tributária possa recorrer ao apuramento da matéria colectável com recurso a métodos indirectos, é ainda necessário demonstrar de que forma essas irregularidades inviabilizaram a avaliação directa. IV.A Autoridade do caso julgado visa vincular as partes e o Tribunal evitando, dessa forma, que a relação ou situação jurídica já definida por decisão transitada em julgado seja novamente apreciada para o efeito de decidir o objecto da segunda acção. V.DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes que integram a 1.ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento parcial ao recurso, revogando a sentença recorrida no segmento decisório quanto a custas, mantendo-se, no mais, o decidido.
Custas a cargo da Recorrente, com dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º n.º7, do RCP para ambas as partes.
Lisboa, 14 de janeiro de 2021
[Ana Pinhol]
[Isabel Fernandes]
[Jorge Cortês] |