Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:538/17.0BECTB
Secção:CA
Data do Acordão:07/04/2019
Relator:PAULO PEREIRA GOUVEIA
Descritores:DECISÃO CAUTELAR
FUNÇÃO ADMINISTRATIVA
PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES
Sumário:
I - O art. 3º-1 do CPTA, repetindo e concretizando o que já resulta dos arts. 111º-1, 1º e 2º da CRP, significa que: (i) a função jurisdicional (assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados), uma das duas funções secundárias do Estado, não pode atuar no âmbito da função política em sentido estrito, da função político-legislativa, da função político-governativa e da função administrativa (atividade pública contínua tendente à satisfação das necessidades coletivas em cada momento selecionadas, mediante prévia opção constitucional e legislativa, como desígnios da coletividade pública ou interesses públicos contingentes); (ii) também significa que os tribunais administrativos não apreciam a atuação – própria - da Adm. P. quanto ao seguinte: (i) utilidade da concreta atuação administrativa para a prossecução do interesse coletivo legalmente definido e (ii) utilidade da concreta atuação administrativa para a prossecução do interesse coletivo legalmente definido à luz dos demais interesses coletivos envolvidos.

II – Não viola aquele princípio a decisão cautelar que, ao abrigo dos arts. 7º-2 e 519º-1 do Código de Processo Civil, solicita a colaboração de entidade administrativa de modo a poder aferir o cumprimento da sua decisão jurisdicional e a, eventualmente, exercitar o que está previsto nos arts. 123º e 124º do CPTA sobre caducidade, alteração e revogação das providências.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul

I – RELATÓRIO

C……….., S.A., melhor identificada nos autos, intentou processo cautelar contra o

MINISTÉRIO DO AMBIENTE.

A pretensão formulada ao T.A.C. foi a seguinte:

- Suspensão da eficácia do despacho do Subinspetor- Geral da Inspeção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (doravante, IGAMAOT), proferido em 21-11-2017, que aplicou várias medidas preventivas por razões ambientais e de saúde pública.

Após a discussão da causa, o T.A.C. decidiu o seguinte:

“Declaro a extinção do processo cautelar relativamente à medida que determinou a proibição da Requerente de rececionar qualquer bagaço de azeitona no seu estabelecimento industrial;

Defiro a adoção da providência cautelar requerida, sob a condição de a Requerente e Interveniente procederem à remoção e encaminhamento das 18.000 toneladas de bagaço de azeitona que se encontram depositadas na lagoa de armazenamento para um local apropriado, até ao dia 31-08-2019, findo o qual o Tribunal procederá a uma reavaliação da situação;

Determino que os serviços técnicos da Entidade Requerida efetuem uma visita às instalações da Requerente, durante a primeira quinzena de setembro de 2019, a fim de verificar no local a situação em que se encontra o bagaço de azeitona e as águas ruças, prestando as informações pertinentes ao Tribunal.”

*

O M.P. interpôs o presente recurso de apelação contra aquela decisão, formulando na sua alegação as seguintes conclusões:

A. Está em causa nestes autos a decisão da providência cautelar, já provisoriamente decretada, no que tange ao despacho do Senhor Subinspetor-Geral da IGAMAOT de 21.11.2017, que impôs à Requerente C………. medidas de polícia que preveniam riscos ambientais derivados do armazenamento de bagaço de azeitona no estabelecimento desta em M…… da O…….

B. Para efeitos do disposto no art.º 639.º do CPC, entende-se que o Tribunal ad quo errou na fixação da matéria de facto, ao omitir a fixação do facto jurídico que se reconduz ao teor do dito despacho, o que se mostra essencial porque, não o fixando, o Tribunal assumiu um conteúdo diverso do teor real desse despacho, dele depois derivando para a errada apreciação dos pressupostos do decretamento da providência, designadamente, do periculum in mora e da ponderação dos interesses.

C. Deve ser aditado ao probatório, porque demonstrado documentalmente – Documento 2 do Requerimento - e porque essencial à decisão da providência, o teor do despacho, que é o seguinte:

«…determino que:

. De imediato:

Cesse toda e qualquer receção de bagaço de azeitona na lagoa utilizada atualmente para a armazenamento de bagaço de azeitona junto à Unidade de secagem;

. No Prazo de 5 dias úteis a contar da data da notificação:

Envie a esta Inspeção-Geral um plano calendarizado de remoção e encaminhamento dos produtos contidos na lagoa utilizada atualmente para a armazenagem de bagaço de azeitona junto à Unidade de secagem, indicados como sendo bagaço de azeitona, bem como das águas ruças contidas no tanque circular de estrutura metálica e na lagoa designada por lagoa quadrada.

. No prazo de 20 dias uteis a contar da data da notificação:

Concretize/implemente as medidas propostas no referido plano, com remessa a esta Inspeção-Geral, no prazo de 3 dias após o fim daquele prazo, de comprovativos da implementação das referidas medidas e do encaminhamento para destinatários autorizados, dos produtos contidos na lagoa utilizada atualmente para o armazenamento de bagaço de azeitona junto à Unidade de secagem, indicados como sendo bagaço de azeitona, bem como das águas ruças contidas no tanque circular de estrutura metálica e na lagoa designada por lagoa quadrada.»

D. Por não ter atendido ao conteúdo real do despacho, o Tribunal a quo procedeu a um erro na apreciação da matéria de facto por ter considerado como pressuposto da sua decisão que havia uma ordem da IGAMAOT de remoção imediata do bagaço de azeitona a que o decretamento da providência devia obstar, conteúdo este que afinal não existe e nunca existiu no despacho sindicado.

E. E por isso definiu mal a situação de facto, tendo configurado erradamente a existência de periculum in mora, e tendo feito uma ponderação de interesses em benefício da Requerente, para o pressuposto errado de que o despacho cuja eficácia suspendeu obrigaria a essa remoção imediata.

F. Independentemente disso, o Tribunal a quo violou o disposto no art.º 120.º n.º 1 e n.º 2.º do CPTA, ao reconhecer os requisitos de periculum in mora e da ponderação de interesses em benefício da Requerente e Interveniente, quando devia ter chegado a conclusão oposta.

G. Isto porque devia ter retirado as consequências jurídicas da circunstância de ter decorrido mais de 1 ano sobre a prolação do despacho sindicado, de a Requerente ter deixado de laborar em abril de 2018 e de a Requente ter um novo estabelecimento em M………, razões pelas quais elas, Requerente e Interveniente, tiveram condições de remover paulatinamente o produto poluente, o que não fizeram na pendência da providência – e fora dos constrangimentos da campanha da azeitona – apenas porque não quiseram.

H. De outra parte, o Tribunal a quo profere uma decisão ferida de nulidade, nos termos do art.º 615.º n.º 1 c) do CPC, em razão de uma contradição de raciocínio, porque decreta a providência com uma decisão que tem um conteúdo afinal idêntico ao do ato administrativo cuja eficácia suspende, a saber, a remoção do bagaço de azeitona armazenado no estabelecimento industrial num dado prazo.

I. Erra ainda porque a decisão tem uma incoerência, já que o Tribunal considera que 6 meses, contados de janeiro de 2019, são suficientes para concluir a remoção, mas depois fixa a obrigação num prazo cujo termo final situa em 31 de agosto de 2019.

J. Erra sobretudo porque o Tribunal não logra dilucidar a distinção entre a prolação de decisão judicial de decretamento de providência cautelar sujeita a condição, com o exercício da função administrativa cujo exercício está vedado ao Tribunal, violando o disposto no art.º 3.º n.º 1 do CPTA.

K. Assim, por um lado, não se tratando aqui de condenação a um ato devido ou a um comportamento devido, por não ser esse o objeto dos autos, o Tribunal não pode dar uma ordem à Requerida - como fez, no sentido de obrigar a uma visita às instalações da Requerente na primeira quinzena de setembro de 2019 -, porque a Requerida, definindo-se na relação processual, é o Ministério do Ambiente e da Transição Energética, compreendido no Governo, cujo titular da pasta depende do Primeiro- Ministro, tendo o Tribunal excedido as suas atribuições.

L. E neste contexto, sendo a intenção a de compelir a IGAMAOT a uma atividade, tão pouco o poderia fazer, por não se encontrar com ela numa relação de hierarquia ou tutela, o que só cabe ao Ministro responsável ou a Inspetor-geral e demais dirigentes, pelo que excedeu as suas atribuições.

M. Errou ainda porque não cabe ao Tribunal fiscalizar o exercício da atividade económica da Requerente, mas apenas julgar a condição da sua decisão verificada ou não verificada, pelo não cabe exigir informações pertinentes ou adicionais à IGAMAOT em setembro de 2019 para reavaliar a situação, como afirma, a coberto de uma ideia de revogação futura da decisão cautelar, novamente violando o art-º 3.º n.º 1 do CPTA.

*

A REQUERENTE contra-alegou, concluindo assim:

A) O Tribunal a quo analisou os elementos de prova trazidos aos autos pelo próprio Requerido e que, com base nesses elementos de prova, firmou a sua convicção de que não havia evidência de escorrência de águas ruças, pelo que conclusão a que o Tribunal a quo chegou encontra-se assim corretamente suportada nos elementos de prova juntos aos autos e observa o preceituado quanto ao seu valor probatório.

B) A decisão do Tribunal a quo não merece qualquer crítica quanto a esta matéria, devendo ser indeferida a pretensão do Recorrente de aditar à matéria de facto o teor do Despacho da IGAMAOT de 21.11.2017, por força da aplicação do princípio da limitação dos atos processuais constante do artigo 130.º do CPC, uma vez que tais factos são irrelevantes (por desnecessários) para as questões a resolver no âmbito da presente providência cautelar.

C) A interpretação que o Recorrente faz do teor do ato suspendendo no que respeita aos seus efeitos imediatos não tem qualquer apoio na letra do despacho da IGAMAOT de 21.11.2017, e o circunstancialismo descrito pela IGAMAOT no despacho de 21.11.2017 reflete uma especial urgência na adoção das medidas a adotar, tendo sido dispensada a audiência prévia com base na urgência da adoção das medidas ordenadas, o que contradiz a interpretação que o Recorrente pretende fazer do ato suspendendo.

D) O Tribunal a quo assumiu corretamente que o ato suspendendo implicaria a remoção imediata do bagaço de azeitona e das águas ruças existentes nas instalações da Recorrida, tendo apreciado corretamente os requisitos do periculum in mora e a ponderação de interesses em benefício da Recorrida, inexistindo qualquer erro na aplicação do Direito.

E) Os factos ocorridos desde a propositura do presente procedimento foram devidamente sopesados pelo douto Tribunal a quo, conforme é afirmado na fls. 17 da Sentença recorrida “(…) a relevância problemática da norma citada [611/1 do CPC] impõe que, na presente decisão, seja atendida a situação de facto tal como a mesma resultou da audiência final, a qual será a que o Tribunal irá valorar.”

F) O Tribunal a quo verificou, conforme lhe competia, se estavam ou não verificados os requisitos de que depende o decretamento da providência cautelar requerida pela Recorrida, tal como se encontram plasmados no artigo 120.º/1 e 2 CPTA, ou seja a existência de (i) periculum in mora, (ii) fumus boni juris e (iii) uma ponderação entre os interesses em presença, pelo que a Sentença recorrida não incorre em qualquer erro de julgamento, devendo ser integralmente mantida.

G) Não resulta da matéria de facto provada que a Recorrida tivesse condições de proceder à transferência do bagaço de azeitona para um novo estabelecimento localizado em M………. antes de janeiro de 2019.

H) Os factos alegados pelo Ministério a artigos 15.º e 16.º das alegações de recurso não revestem qualquer interesse para a decisão da presente providência cautelar em face das possíveis soluções que a questão de direito comporta, sendo absolutamente irrelevantes, não beliscando minimamente a validade da Sentença recorrida, devendo ser totalmente desatendido por força do princípio da limitação dos atos processuais constante do artigo 130.º do CPC.

I) A Sentença recorrida não violou o disposto no artigo 3.º/ 1 do CPTA ao determinar a realização de uma visita às instalações da Requerente na primeira quinzena de Setembro de 2019 por parte da IGAMAOT e a junção de elementos adicionais ao processo, já que aquelas medidas foram determinadas com o acordo das partes, e sempre seriam admissíveis ao abrigo do dever de cooperação para a descoberta da verdade, previsto no artigo 417.º/1 do CPC.

J) A “nulidade do acórdão por contradição entre os fundamentos e a decisão ocorre quando a fundamentação aponta num sentido e a decisão extrai um sentido contrário, e já não quando exista erro de julgamento da matéria de facto, designadamente por se recorrer ao uso de presunções para prova de facto(s) que já constasse(m) dos autos ou que seja(m) contrário(s) a este(s).”(cfr. Ac. STJ de 29.11.2012, Proc. n.º 957/03.0TBCBR.C2. S1, disponível em www.dgsi.pt).

K) No que respeita à fundamentação da decisão, afirma o Tribunal a quo o seguinte:

Apesar de se encontrarem verificados os três requisitos para a adoção da presente providência cautelar, impõe-se acautelar – desde já - que as 18.000 toneladas de bagaço de azeitona sejam efetivamente removidas e encaminhadas para um local apropriado ao respetivo tratamento e aproveitamento.

(...)Daí que, encontra-se em causa assegurar que essas toneladas de bagaço de azeitona não permaneçam nas instalações da Requerente durante um tempo indefinido, dado que, apesar de no curto prazo o Tribunal entender que não representam um perigo para o meio ambiente, no médio prazo já poderá haver alguma perigosidade (derivados de uma eventual fermentação), pelo que importa desde já impor condições de modo a que o Tribunal possa aferir no futuro dessa possibilidade 3e,eventualmente, da necessidade de alterar a providência que irá ser decretada.

De facto, “As providências cautelares podem ser sujeitas a termo ou condição” (artigo 122º, n.º 2 do CPTA) e “A decisão de adotar ou recusar a adoção de providências cautelares, desde que transitada em julgado, pode ser revogada ou alterada, oficiosamente ou mediante requerimento, com fundamento em alteração dos pressupostos de facto e de direito inicialmente existentes” (artigo 124º, n.º 1 do CPTA).

Atendendo à vontade demonstrada pela Requerente e pela Interveniente e ao timing que foi definido pelas mesmas (atemo-nos às declarações de parte do representante legal da Requerente – N………… - e ao depoimento de L……….., diretor comercial da Interveniente, na audiência final), afigura-se que as mesmas necessitarão do prazo de seis meses para finalizar a operação de remoção e encaminhamento das 18.000 toneladas de bagaço de azeitona, sendo que apenas terão os camiões necessários para o efeito a partir de janeiro de 2019.

Deste modo, é razoável impor, como condição para a adoção da presente providência, que até 31 de agosto de 2019 a Requerente e Interveniente procedam a essa operação.” (fls. 30 e 31 da Sentença recorrida)

L) O alcance da condição fixada na Sentença recorrida e do teor do ato suspendendo são significativamente distintos quer quanto às concretas medidas quer quanto ao tempo da sua execução.

M) Não existe qualquer contradição entre os fundamentos invocados e a decisão tomada, nada de ilógico se pode retirar do raciocínio do Tribunal a quo pelo que a Sentença recorrida não padece da nulidade prevista no artigo 615.º/1/c) do CPC (cfr. Acórdão do STJ de 16-11-2003, Proc. n.º 3253/2003-4, disponível em www.dgsi.pt).

N) Não existe qualquer incoerência, inconsistência ou contradição entre o facto de o Tribunal a quo considerar que a Recorrida e a Interveniente necessitam cerca de seis meses para finalizar a operação de remoção das 18.000 toneladas de bagaço de azeitona a partir de Janeiro de 2019 e a decisão de decretar a providência na condição de que a Recorrida procedesse ao reencaminhamento do bagaço de azeitona até 31.08.2019.

O) Por tudo exposto, a Decisão recorrida que não merece qualquer reparo e deve por isso ser mantida na ordem jurídica, sendo o presente recurso julgado totalmente improcedente.

*

Cumpridos os demais trâmites processuais, importa agora apreciar e decidir em conferência.

*

II – FUNDAMENTAÇÃO

II.1 – FACTOS PROVADOS

O tribunal recorrido decidiu estar provada a seguinte factualidade:

A) A Requerente é proprietária de um estabelecimento industrial sito em V…..V…. R….., composto por uma central de produção de energia elétrica e uma instalação de secagem e extração de azeite a partir de bagaço de azeitona;

B) A Interveniente é acionista maioritária da Requerente;

C) Em virtude da situação económica difícil da Requerente, em 31-05-2017 e com início de vigência em 01-06-2017, foi celebrado entre esta e a Interveniente um contrato-promessa de exploração mediante o qual a Interveniente substituía-se à Requerente na aquisição do bagaço de azeitona, depositava o mesmo nas instalações desta, a qual processava o mesmo, pagando-lhe a Interveniente um fee de € 5,00 por cada tonelada processada;

D) A Requerente receciona entre 35.000 a 40.000 toneladas de bagaço de azeitona por ano;

E) O bagaço de azeitona é depositado numa lagoa de armazenamento, através da descarga do mesmo pelos camiões que efetuam o respetivo transporte;

F) Essa lagoa tem uma capacidade de armazenamento entre 35.000 a 40.000 toneladas;

G) Encontra-se impermeabilizada por uma tela PVC de elevada grossura, tendo sido colocada uma nova em setembro de 2017;

H) Enterrado na terra, ao nível da linha de água da Ribeira da Lucriz e ao longo de todo o perímetro da lagoa de armazenamento foi construído um dreno de segurança, com 2 metros de largura, sob o qual existe uma tubagem, protegida com brita e impermeabilizada com uma manta geotêxtil, que encaminha eventuais escorrências da lagoa de armazenamento para depósitos próprios e, desses, para o depósito circular, evitando que haja infiltrações no solo;

I) O bagaço de azeitona é transportado, através de um tubo, dessa lagoa de armazenamento para um tanque localizado dentro do edifício que alberga a unidade de secagem do mesmo, onde é realizado o processo de transformação normal;

J) Atualmente, encontram-se depositados na lagoa de armazenamento 18.000 toneladas de bagaço de azeitona;

K) A Requerente monitoriza permanentemente a acidez desse bagaço de azeitona e procede à respetiva manutenção adicionando, preferencialmente, água limpa à superfície a fim de humedecer o mesmo e, assim, atrasar o processo de fermentação;

L) Durante o Verão são usadas igualmente as águas ruças para irrigar o bagaço de azeitona, dada a falta de disponibilidade de água;

M) As 18.000 toneladas de bagaço de azeitona que se encontram na lagoa de armazenamento tiveram um custo de aquisição de € 740.000,00 e são propriedade da Interveniente;

N) A Interveniente ainda não pagou uma parte substancial desse montante aos fornecedores;

O) A Requerente prevê remover e encaminhar a totalidade dessas toneladas para outra unidade industrial de que é acionista, localizada em M… e designada de Ó….. A….., no início de 2019, altura em que haverá disponibilidade de camiões no mercado, por ter terminado a campanha da apanha de azeitona de 2018/2019;

P) A Ó…… A….. tem capacidade para receber e armazenar 150.000 toneladas de bagaço de azeitona;

Q) Essa operação durará cerca de 6 meses, implicando a utilização de 720 camiões com uma capacidade de 25 toneladas cada, os quais efetuarão 5 ou 6 transportes por dia;

R) É a Interveniente que vai suportar os custos com essa operação de remoção e transporte; as receitas provenientes da valorização desse bagaço de azeitona ascendem a € 1,4 milhões;

T) Existem 6 empresas em Portugal com capacidade para rececionarem bagaço de azeitona (sendo 3 pertencentes ao grupo económico a que pertence a Requerente), e nenhuma encontra-se disponível para o efeito neste momento, dado que estão a receber o bagaço de azeitona resultante da campanha de 2018/2019;

U) Em abril de 2018 a Requerente suspendeu o funcionamento da sua unidade de secagem de bagaço de azeitona;

V) A Requerente não vai receber mais bagaço de azeitona até o seu processo de legalização estar finalizado;

W) Nas instalações da Requerente existe um depósito circular de grande dimensão onde são retidas as águas ruças provenientes do processo de secagem do bagaço de azeitona;

X) Sob a superfície das águas ruças forma-se uma goma, devido aos açúcares dissolvidos na água;

Y) Atualmente, encontra-se a meio da sua capacidade de enchimento;

Z) Nas instalações da Requerente existe uma lagoa quadrada que retém as águas ruças provenientes do processo de secagem do bagaço de azeitona;

AA) Tem uma capacidade para 6.000 toneladas, encontrando-se lá retidas, atualmente, 3.000 toneladas;

BB) Tanto o depósito circular como a lagoa quadrada não se encontram cobertos a fim de não ser impedida a evaporação dessas águas e o ar em movimento sobre a superfície potenciar esse efeito;

CC) Atualmente não são produzidas mais águas ruças nas instalações da Requerente;

DD) As águas ruças retidas no depósito circular e na lagoa quadrada provém de stocks anteriores;

EE) O nível das águas ruças baixa em virtude do processo natural de evaporação, da respetiva utilização no fenómeno de peletização (ou seja, compactação em grãos) e na irrigação do bagaço de azeitona depositado na lagoa de armazenamento, que mais que compensa o aumento do nível provocado pelas chuvas;

FF) Desde a campanha de 2016/2017 que a Requerente efetuou investimentos da ordem dos € 300.000,00 na sua unidade industrial, a fim de melhorar a eficiência ambiental da mesma;

GG) No dia 21-11-2017 o Subinspetor-Geral da Inspeção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, proferiu o despacho cuja suspensão da eficácia foi requerida nos presentes autos;

HH) No dia 24-11-2017 deu entrada neste Tribunal o requerimento inicial da presente providência cautelar;

II) No dia 22-10-2018 realizou-se audiência final no presente processo, após a qual, as Partes apresentaram alegações escritas.

*

Ao abrigo do art. 662º-1 do Código de Processo Civil, aditam-se os seguintes factos provados pelos documentos juntos ao r.i.:

JJ) O cit. despacho de 21-11-2017 tem o seguinte conteúdo decisório:

«…determino que:

. De imediato:

Cesse toda e qualquer receção de bagaço de azeitona na lagoa utilizada atualmente para a armazenamento de bagaço de azeitona junto à Unidade de secagem;

. No Prazo de 5 dias úteis a contar da data da notificação:

Envie a esta Inspeção-Geral um plano calendarizado de remoção e encaminhamento dos produtos contidos na lagoa utilizada atualmente para a armazenagem de bagaço de azeitona junto à Unidade de secagem, indicados como sendo bagaço de azeitona, bem como das águas ruças contidas no tanque circular de estrutura metálica e na lagoa designada por lagoa quadrada.

. No prazo de 20 dias uteis a contar da data da notificação:

Concretize/implemente as medidas propostas no referido plano, com remessa a esta Inspeção-Geral, no prazo de 3 dias após o fim daquele prazo, de comprovativos da implementação das referidas medidas e do encaminhamento para destinatários autorizados, dos produtos contidos na lagoa utilizada atualmente para o armazenamento de bagaço de azeitona junto à Unidade de secagem, indicados como sendo bagaço de azeitona, bem como das águas ruças contidas no tanque circular de estrutura metálica e na lagoa designada por lagoa quadrada.»

*

II.2 – APRECIAÇÃO DO RECURSO

Delimitação do objeto do presente recurso interposto pelo MP:

Os recursos, devendo ser dirigidos contra a decisão do tribunal recorrido, têm o seu âmbito objetivo delimitado pelo recorrente nas conclusões da sua alegação de recurso. Esta alegação apenas pode incidir sobre as questões de facto e ou de direito que tenham sido apreciadas pelo tribunal recorrido ou que devessem ser aí oficiosamente conhecidas; sem prejuízo das especificidades do contencioso administrativo.

Ora, tudo visto, as questões a resolver contra a decisão ora recorrida são as seguintes:

- Omissão de factos provados,

- nulidade da decisão cautelar prevista no art. 615º-1-c) do Código de Processo Civil, porque há uma contradição de raciocínio, já que o TAC decreta a providência com uma decisão que tem um conteúdo idêntico ao do ato administrativo cuja eficácia suspende, a saber, a remoção do bagaço de azeitona armazenado no estabelecimento industrial num dado prazo, e ainda porque a decisão tem uma incoerência, já que o Tribunal considera que 6 meses, contados de janeiro de 2019, são suficientes para concluir a remoção, mas depois fixa a obrigação num prazo cujo termo final situa em 31 de agosto de 2019,

- Erro de julgamento, por o TAC não retirado as consequências jurídicas da circunstância de ter decorrido mais de 1 ano sobre a prolação do despacho sindicado, de a Requerente ter deixado de laborar em abril de 2018 e de a Requente ter um novo estabelecimento em M…….,

- erro de julgamento, porque o TAC não logrou dilucidar a distinção entre a prolação de decisão judicial de decretamento de providência cautelar, sujeita a condição, e a função administrativa cujo exercício está vedado ao Tribunal, violando o disposto no art.º 3.º n.º 1 do CPTA, não cabendo ao Tribunal dar uma ordem à Requerida - como fez, no sentido de obrigar a uma visita às instalações da Requerente na primeira quinzena de setembro de 2019 -, porque a Requerida é o Ministério do Ambiente e da Transição Energética, compreendido no Governo, cujo titular da pasta depende do Primeiro- Ministro, tendo o Tribunal excedido as suas atribuições,

- erro de julgamento, porque não cabe ao TAC fiscalizar o exercício da atividade económica da Requerente, mas apenas julgar a condição da sua decisão verificada ou não verificada, pelo não cabe exigir informações pertinentes ou adicionais à IGAMAOT em setembro de 2019 para reavaliar a situação, como afirma, a coberto de uma ideia de revogação futura da decisão cautelar, assim novamente violando o art-º 3.º n.º 1 do CPTA.

Passemos à análise do recurso de apelação.

1. Da omissão de factos provados

Do acima exposto no probatório, aplicando o consabido art. 662º-1 do CPC, já pudemos concluir que o MP tem razão neste vício apontado à decisão cautelar.

O probatório da decisão cautelar não contém o teor do ato administrativo suspendendo, nem, pelo menos, a sua componente decisória, invocada nos articulados e claramente presente nos documentos juntos ao processo.

Isso significa que o Tribunal Administrativo de Círculo não respeitou integralmente o disposto nos arts. 94º-3 do CPTA e 607º-4 do Código de Processo Civil, quanto ao dever de exposição de todos os factos relevantes provados.

Tal ilegalidade da decisão vai corrigida no lugar próprio, ao abrigo do art. 662º-1 do Código de Processo Civil.

2. Das nulidades da decisão cautelar

A fundamentação de Direito da decisão cautelar é a seguinte:

“Nos presentes autos a Requerente requereu a suspensão da eficácia da decisão da Entidade Requerida proferida em 21-11-2017, que lhe impôs duas medidas:

1) a proibição de rececionar qualquer bagaço de azeitona no seu estabelecimento industrial;

2) a remoção e encaminhamento:

a. do bagaço de azeitona que se encontra depositado no seu estabelecimento industrial para destinatários autorizados;

b. assim como das águas ruças igualmente aí depositadas; enviando à IGAMAOT os respetivos comprovativos da remoção e encaminhamento.

Analisemos cada uma dessas medidas separadamente, começando pela primeira.

Em novembro de 2017, aquando da propositura da presente providência cautelar, encontrava-se a decorrer a campanha da apanha de azeitona de 2017/2018 e, com base nesse como em outros argumentos, o Tribunal entendeu que se justificava o decretamento provisório da providência requerida, o que determinou.

Neste momento, já terminou essa campanha, tendo ficado provado que em abril de 2018 a Requerente suspendeu o funcionamento da sua unidade de secagem de bagaço de azeitona e decidiu que não vai receber mais bagaço de azeitona até o seu processo de legalização estar finalizado.

Daí que, nas alegações escritas que apresentaram, as Partes tenham alegado que “Atendendo ao tempo entretanto decorrido e ao decretamento provisório desta providência em 28.11.2017, a Requerente pôde receber nas suas instalações o bagaço de azeitona relativo à campanha de 2017/2018 pelo que já foi assegurado o efeito útil do processo no que respeita à ordem de cessação da receção do bagaço de azeitona, determinada pelo Despacho de 21.11.2017” (quanto à Requerente) e que “… quanto a esta medida, o objetivo pretendido pela Requerente com esta Providência Cautelar, estando limitado temporalmente (período da campanha da azeitona de 2017/2018 que terminou em janeiro de 2018), já foi conseguido através do seu decretamento provisório que suspendeu os efeitos do despacho de 21/11/2017 durante o período temporal pretendido pela Requerente” (quanto à Entidade Requerida, pugnando, em seguida, pela inutilidade superveniente da mesma).

Ora, prescreve o artigo 123º, n.º 1, alínea d) do CPTA que “Os processos cautelares se extinguem … Se se extinguir o … interesse a cuja tutela a providência se destina”.

E, no caso dos autos, a Requerente já não tem qualquer interesse em suspender a eficácia da medida que lhe determinou a proibição de receção de bagaço de azeitona no seu estabelecimento industrial, dado que suspendeu o funcionamento da sua unidade de secagem de bagaço de azeitona e decidiu que não vai receber mais bagaço de azeitona até o seu processo de legalização estar finalizado.

Deste modo, tendo as Partes já se pronunciado sobre essa circunstância, encontra- se cumprido o disposto nos números 3, 4 e 5, primeira parte do artigo 123º do CPTA, pelo que, deverá ser reconhecido a extinção do processo cautelar relativamente à medida que determinou a proibição da Requerente rececionar qualquer bagaço de azeitona no seu estabelecimento industrial (artigo 123º, n.º 5, segunda parte do CPTA).

***

Analisemos agora, a segunda medida imposta, ou seja, a obrigação de remoção e encaminhamento tanto do bagaço de azeitona, como das águas ruças, da unidade industrial da Requerente para destinatários autorizados.

Os critérios gerais para a adoção ou rejeição das providências cautelares encontram-se plasmados no artigo 120º do CPTA, cujo n.º 1, após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 02-10 (no dia 02-12-2015, de acordo com o estatuído no artigo 15º,n.º 1 do Decreto-Lei mencionado), passou a ter a seguinte redação: “… as providências cautelares são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.

Por seu lado, o n.º 2 do mesmo artigo manteve a mesma redação, prescrevendo que “… a adoção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.”

Daí que, atualmente e tendo em consideração os dois números do artigo 120º do CPTA transcritos, os requisitos do procedimento cautelar administrativo se cinjam aos seguintes:

i. fumus boni iuris – contemplado na segunda parte do n.º 1 do artigo 120º do CPTA, na vertente de juízo positivo de probabilidade da procedência da ação principal;

ii. periculum in mora – estatuído na primeira parte do n.º 1 do artigo 120º do CPTA, e

iii. critério de proporcionalidade e adequação - previsto no n.º 2 do artigo 120º do CPTA.

Analisemos, então, os requisitos referidos pela ordem referida, tendo sempre presente o caso concreto dos autos.

O Requerente e Interveniente assacam à decisão proferida pela Entidade Requerida diversos vícios, especificamente, a violação dos princípios da legalidade, da proporcionalidade, da prevenção e da precaução, a preterição ilegal da audição dos interessados e a falta absoluta de fundamentação.

De entre estes fundamentos, o Tribunal – ao longo do processo – deu especial enfoque à violação dos princípios da prevenção e da precaução, atentos os valores em causa neste processo cautelar.

E, em consonância, igualmente será essa a perspetiva primordial a ter em conta nesta sentença para o requisito sob análise: cotejar as constatações que foram plasmadas no despacho proferido em 21-11-2017 pelos inspetores do IGAMAOT que efetuaram a ação inspetiva às instalações da Requerente com o que resultou dos autos em termos probatórios.

Assim, a primeira constatação prendeu-se com a eventual escorrência de águas ruças da lagoa de armazenamento, o que poderia indiciar falhas estruturais e de impermeabilização nessa estrutura.

Ora, quanto a essa eventual escorrência, mantém-se atual a convicção que o Tribunal já expressou (na sentença proferida no incidente do levantamento da providência cautelar provisoriamente decretada nos presentes autos) quanto à falta de prova desta ocorrência.

De facto, na data em que essa sentença foi proferida, o Tribunal entendeu que não havia sido produzida prova suficientemente firme, para se convencer, ainda que de modo perfunctório, da verificação dessa ocorrência e, mantendo-se essa convicção neste momento e em consonância, esse facto foi igualmente dado como não provado na presente sentença.

Acresce que, após a audiência de julgamento, essa convicção tornou-se ainda mais patente, com a prova que foi produzida com as declarações de parte e depoimentos das testemunhas inquiridas.

Assim, ficou indiciariamente provado que a lagoa de armazenamento se encontra impermeabilizada por uma tela PVC de elevada grossura, tendo sido colocada uma nova em setembro de 2017.

Mais se provou, de modo superficial, que ao longo de todo o perímetro da lagoa de armazenamento foi construído um dreno de segurança, com 2 metros de largura, sob o qual existe uma tubagem, protegida com brita e impermeabilizada com uma manta geotêxtil, que encaminha eventuais escorrências da lagoa de armazenamento para depósitos próprios e, desses, para o depósito circular, evitando que haja infiltrações no solo.

Estas duas circunstâncias, fazem com que o Tribunal considere que a Requerente adotou medidas preventivas suscetíveis de mitigar os eventuais perigos que decorrem da sua atividade, em concreto, evitar que se verifique qualquer contaminação da Ribeira da Lucriz com produtos nocivos para o meio ambiente e a saúde humana.

Acresce que, em abril de 2018, a Requerente suspendeu o funcionamento da sua unidade de secagem de bagaço de azeitona, pelo que não irá receber mais bagaço de azeitona até o seu processo de legalização estar finalizado: deste modo, não se verifica a possibilidade de potenciação dos perigos referidos.

Outra das constatações verificadas, prendeu-se com o facto de tanto o depósito circular como a lagoa q…. não se encontrarem cobertas, pelo que, haveria o perigo de transbordo das águas ruças que nas mesmas se encontram depositadas, na eventualidade de ocorrer uma pluviosidade intensa.

Quanto a esta constatação, ficou indiciariamente provado que essas estruturas não se encontram cobertos a fim de não ser impedida a evaporação dessas águas ruças e de modo ao ar em movimento sobre a superfície potenciar esse efeito.

Ou seja, é a finalidade das mesmas que impõe essa não cobertura.

Ademais, se acaso as preocupações eram prementes ao tempo da ação de inspeção, perderam muito da sua razão de ser face aos desenvolvimentos verificados no último ano.

De facto, atualmente, tanto o depósito circular como a lagoa quadrada encontram-se a meio da sua capacidade de enchimento.

Por outro lado, devido à opção estratégica da Requerente em suspender o funcionamento da sua unidade de secagem de bagaço de azeitona, não são produzidas mais águas ruças nas suas instalações, sendo que as que aí ainda se mantêm, são provenientes de anos anteriores.

Finalmente, provou-se igualmente (superficialmente) que o nível das águas ruças baixa em virtude do processo natural de evaporação, da respetiva utilização no fenómeno de peletização (ou seja, compactação em grãos) e na irrigação do bagaço de azeitona depositado na lagoa de armazenamento, que mais que compensa o aumento do nível provocado pelas chuvas.

Conjugando todos estes fatores, constata-se que o perigo de vazamento e contaminação das áreas envolventes é diminuto.

Por fim, foi igualmente constatado que na superfície do depósito circular era visível uma camada superficial de gorduras.

Ora, como foi dado como indiciariamente provado, essa camada é, afinal, uma goma que se forma devido aos açúcares dissolvidos na água, pelo que nenhum perigo representa. Daí que, o Tribunal entenda que é provável que a pretensão da Requerente, ao fundamentar a anulação do despacho proferido em 21-11-2017 com base na falta de preenchimento dos pressupostos de aplicação dos princípios da prevenção e da precaução (dado que não se encontra demonstrada a probabilidade de ocorrência de danos para o meio ambiente), seja julgada procedente na ação administrativa intentada, o que, independentemente da análise aos restantes vícios imputados a esse despacho, é suficiente para o Tribunal dar como verificado o requisito do fumus boni iuris.

A presente ação foi proposta, inicialmente, apenas pela Requerente, tendo posteriormente sido admitida a intervenção principal espontânea da Interveniente, dado que o Tribunal entendeu que a mesma tinha um interesse direto equivalente ao da Requerente em que a presente ação procedesse.

Daí que, tendo sido admitida a intervenção principal espontânea da Interveniente e atendendo a que “O interveniente principal faz valer um direito próprio, paralelo ao do autor ou do réu, …” (artigo 312º do CPC), o Tribunal atenderá tanto aos prejuízos advenientes para a Requerente como para a Interveniente, dado que ambos são atendíveis para efeitos do requisito sob análise.

Assim, encontra-se indiciariamente provado que a Interveniente é acionista maioritária da Requerente e, em virtude da situação económica difícil desta última, em 31-05-2017 e com início de vigência em 01-06-2017, foi celebrado entre ambas um contrato- promessa de exploração mediante o qual a Interveniente substituía-se à Requerente na aquisição do bagaço de azeitona, depositava o mesmo nas instalações desta, a qual processava o mesmo, pagando-lhe a Interveniente um fee de € 5,00 por cada tonelada processada.

E foi esse o procedimento adotado na campanha de azeite de 2017/2018, com a Interveniente a adquirir o bagaço de azeitona aos lagares de azeite e a depositar o mesmo nas instalações da Requerente.

Ora, das 35.000 a 40.000 toneladas de bagaço de azeitona que foram rececionadas nessas instalações, ainda se encontram depositadas na lagoa de armazenamento 18.000 toneladas, as quais tiveram um custo de aquisição de € 740.000,00, suportados pela Interveniente (dado que é a legítima proprietária), não tendo ainda pago uma parte substancial desse montante aos respetivos fornecedores.

E a intenção da Requerente e da Interveniente é remover e encaminhar a totalidade dessas toneladas para outra unidade industrial pertencente ao mesmo grupo industrial, localizada em M…… e designada de Ó…….. A……, no início de 2019, de modo a valorizar essas toneladas de bagaço de azeitona.

Essa valorização poderá ascender a € 1,4 milhões, o qual será suficiente para amortizar tanto os custos de aquisição como os inerentes à respetiva remoção e transporte, proporcionando ainda algum lucro à Interveniente.

Ou seja, a imposição de uma remoção imediata dessas toneladas de bagaço de azeitona, inviabilizaria qualquer aproveitamento económico das mesmas, com o consequente prejuízo dos € 740.000 do custo de aquisição, o qual afigura-se ser de difícil reparação em caso de procedência da ação principal, dada a indisponibilidade desse montante para a Interveniente no curto prazo e um eventual ressarcimento via ação indemnizatória apenas seria concretizado no médio prazo.

Já quanto à constituição de uma situação de facto consumado, há que ter em conta que “… para o decretamento da tutela cautelar, tem o Tribunal de descortinar indícios de que essa intervenção preventiva é necessária para impedir a consumação de situações lesivas, que, de outro modo, resultariam com a demora do processo principal. Esse juízo judicial terá que ser baseado na análise de factos concretos, que permitam a um terceiro imparcial concluir que a situação de risco é efetiva, e não uma mera conjetura.”(tal como expendido pelo Supremo Tribunal Administrativo no acórdão proferido no processo n.º 0404/15, de 30-04-2015, disponível in www.dgsi.pt ).

Ora,como foi indiciariamente provado, o encaminhamento, neste momento, das 18.000 toneladas de bagaço de azeitona para a unidade industrial Ó…… A……, localizada em M……, afigura-se de muito difícil concretização.

É que se encontra a decorrer a campanha da apanha da azeitona 2018/2019, pelo que, os camiões que poderiam ser utilizados para o efeito, encontram-se afetos a essa campanha, sendo que apenas no início de 2019 é que os mesmos estarão disponíveis, dado ser essa a data para o término da mesma.

E essa operação implicará a utilização de 720 camiões com uma capacidade de 25 toneladas cada, os quais efetuarão 5 ou 6 transportes por dia, pelo que, a duração prevista para a mesma seja de cerca de 6 meses.

Acresce que, das 6 empresas em Portugal com capacidade para rececionarem bagaço de azeitona (sendo 3 pertencentes ao grupo económico a que pertence a Requerente), nenhuma encontra-se disponível para o efeito neste momento, dado que estão a receber o bagaço de azeitona resultante da campanha de 2018/2019.

Ou seja, a imposição de uma remoção imediata dessas toneladas de bagaço de azeitona, implicará que as mesmas sejam depositadas noutro local que não uma unidade industrial especificamente vocacionada para o respetivo aproveitamento, o que poderá implicar a constituição de uma situação de facto adversa para o meio ambiente.

Deste modo, o Tribunal dá como verificado o requisito do periculum in mora, tanto na vertente da produção de prejuízos de difícil reparação como na constituição de uma situação de facto consumado lesiva dos interesses em presença nestes autos.

Por um lado, a probabilidade de ocorrência de um dano para o meio ambiente afigura-se diminuta (pelas razões acima aduzidas quanto ao requisito do fumus boni iuris).

Por outro, os danos para os interesses económicos da Interveniente afiguram-se avultados (como acima foi salientado, na análise do requisito do periculum in mora, na vertente dos prejuízos de difícil reparação).

A estes dois fatores, acrescem outros dois que, embora não decisivos, têm o seu peso relativo nesta ponderação.

O primeiro prende-se com a dificuldade prática em operacionalizar de imediato uma operação com a envergadura e dimensão que a remoção e encaminhamento de uma quantidade de 18.000 toneladas de bagaço de azeitona acarretam.

O segundo atende ao incentivo que a Requerente e Interveniente têm em remover e encaminhar esse bagaço de azeitona para outra unidade industrial, de modo a processá-lo e auferirem algum lucro com essa operação (sendo que os montantes envolvidos não são despiciendos).

E revelaram, nas declarações e depoimentos efetuados, que têm todo o interesse em resolver esta situação a contento de todos os interesses aqui em presença, sejam eles económicos ou ambientais.

Deste modo, tudo sopesado, o Tribunal entende que, em caso de rejeição da presente providência cautelar, os danos advenientes dessa rejeição seriam superiores aos eventuais danos que poderiam resultar para o interesse público com a respetiva adoção, pelo que se impõe a adoção da mesma.

***

Apesar de se encontrarem verificados os três requisitos para a adoção da presente providência cautelar, impõe-se acautelar – desde já - que as 18.000 toneladas de bagaço de azeitona sejam efetivamente removidas e encaminhadas para um local apropriado ao respetivo tratamento e aproveitamento.

As preocupações do Tribunal derivam do facto de a Requerente monitorizar permanentemente a acidez do bagaço de azeitona e proceder à respetiva manutenção adicionando água à superfície a fim de humedecer o mesmo e, assim, atrasar o processo de fermentação.

Daí que, encontra-se em causa assegurar que essas toneladas de bagaço de azeitona não permaneçam nas instalações da Requerente durante um tempo indefinido, dado que, apesar de no curto prazo o Tribunal entender que não representam um perigo para o meio ambiente, no médio prazo já poderá haver alguma perigosidade (derivados de uma eventual fermentação), pelo que importa desde já impor condições de modo a que o Tribunal possa aferir no futuro dessa possibilidade e, eventualmente, da necessidade de alterar a providência que irá ser decretada.

De facto, “As providências cautelares podem ser sujeitas a termo ou condição” (artigo122º, n.º 2 do CPTA) e “A decisão de adotar ou recusar a adoção de providências cautelares, desde que transitada em julgado, pode ser revogada ou alterada, oficiosamente ou mediante requerimento, com fundamento em alteração dos pressupostos de facto e de direito inicialmente existentes” (artigo 124º, n.º 1 do CPTA).

Atendendo à vontade demonstrada pela Requerente e pela Interveniente e ao timing que foi definido pelas mesmas (atemo-nos às declarações de parte do representante legal da Requerente – N……. - e ao depoimento de L……., diretor comercial da Interveniente, na audiência final), afigura-se que as mesmas necessitarão do prazo de seis meses para finalizar a operação de remoção e encaminhamento das 18.000 toneladas de bagaço de azeitona, sendo que apenas terão os camiões necessários para o efeito a partir de janeiro de 2019.

Deste modo, é razoável impor, como condição para a adoção da presente providência, que até 31 de agosto de 2019 a Requerente e Interveniente procedam a essa operação.

Findo esse prazo, sem que se encontre concretizada na totalidade essa operação, tribunal terá de avaliar novamente a situação existente, à luz dos critérios acima referidos.

Para esse efeito (e uma vez que no decurso da audiência final o representante legal da Requerente manifestou a disponibilidade em colaborar com as Autoridades no sentido de facultar o acesso e a prestar as informações necessárias às mesmas no futuro e a Entidade Requerida mostrou igualmente disponibilidade para, caso o Tribunal entendesse conveniente, visitar as instalações da Requerente numa data futura e fiscalizar as condições existentes no local, tendo os meios técnicos e humanos para o fazer ), deverão os serviços técnicos da Entidade Requerida agendar com a Requerente uma visita às respetivas instalações, durante a primeira quinzena de setembro de 2019, a fim de verificar no local a situação existente e prestar ao Tribunal as seguintes informações:

1) Quantidade e estado de conservação do bagaço de azeitona que, eventualmente, ainda se encontre depositado na lagoa de armazenamento;

2) Quantidade de águas ruças que, eventualmente, ainda se encontrem depositadas no depósito circular e na lagoa quadrada;

E juntar todas as informações adicionais que entendam pertinentes a fim do Tribunal, após audição da Requerente e Interveniente, se encontrar habilitado a – caso assim se justifique – alterar a providência que irá ser decretada (e sempre ressalvado o caso de a mesma não ter, entretanto, caducado pela ocorrência de outra causa adequada – artigo 123º do CPTA).”.

2.1. Entende o MP que há uma contradição de raciocínio na decisão cautelar, já que o TAC decretou a providência com uma decisão jurisdicional que tem um conteúdo idêntico ao do ato administrativo cuja eficácia suspende, a saber, a remoção do bagaço de azeitona armazenado no estabelecimento industrial num dado prazo.

O ato administrativo de 21-11-2017 decidiu assim:

- «…determino que:

(I) De imediato: cesse toda e qualquer receção de bagaço de azeitona na lagoa utilizada atualmente para a armazenamento de bagaço de azeitona junto à Unidade de secagem;

(II) No Prazo de 5 dias úteis a contar da data da notificação: envie a esta Inspeção-Geral um plano calendarizado de remoção e encaminhamento dos produtos contidos na lagoa utilizada atualmente para a armazenagem de bagaço de azeitona junto à Unidade de secagem, indicados como sendo bagaço de azeitona, bem como das águas ruças contidas no tanque circular de estrutura metálica e na lagoa designada por lagoa quadrada.

(III) No prazo de 20 dias uteis a contar da data da notificação: concretize/implemente as medidas propostas no referido plano, com remessa a esta Inspeção-Geral, no prazo de 3 dias após o fim daquele prazo, de comprovativos da implementação das referidas medidas e do encaminhamento para destinatários autorizados, dos produtos contidos na lagoa utilizada atualmente para o armazenamento de bagaço de azeitona junto à Unidade de secagem, indicados como sendo bagaço de azeitona, bem como das águas ruças contidas no tanque circular de estrutura metálica e na lagoa designada por lagoa quadrada.»

A decisão cautelar foi a seguinte:

- decreto a suspensão da eficácia do ato administrativo de 21-11-2017, (I) sob a condição de a Requerente e Interveniente procederem à remoção e encaminhamento das 18.000 toneladas de bagaço de azeitona que se encontram depositadas na lagoa de armazenamento para um local apropriado, até ao dia 31-08-2019, findo o qual o Tribunal procederá a uma reavaliação da situação; (II) Determino que os serviços técnicos da Entidade Requerida efetuem uma visita às instalações da Requerente, durante a primeira quinzena de setembro de 2019, a fim de verificar no local a situação em que se encontra o bagaço de azeitona e as águas ruças, prestando as informações pertinentes ao Tribunal.”

Uma das realidades de facto subjacentes a tal decisão é a que consta dos factos provados sob U) e V), ou seja, que em abril de 2018 a Requerente suspendeu o funcionamento da sua unidade de secagem de bagaço de azeitona, e que a Requerente não vai receber mais bagaço de azeitona até o seu processo de legalização estar finalizado.

Nessa parte, portanto, a decisão administrativa já foi executada ou cumprida pela empresa requerente.

Mas, mesmo nesse contexto, o recorrente não tem razão: a cit. decisão cautelar não é igual à cit. decisão administrativa contida no ato administrativo, cuja eficácia o tribunal a quo pretende suspender.

Quer dizer, o tribunal a quo suspendeu a eficácia – atual – do ato administrativo, adotando uma providencia cautelar que, no seu todo, não acaba sendo igual à decisão administrativa cujos efeitos suspende, com os mesmos efeitos presentes.

É o que resulta do tempo dado à empresa para agir, um tempo muito maior do que o tempo dado pela E.D. no ato administrativo emitido.

E esse tempo dado faz parte do ato administrativo e faz parte da decisão cautelar.

Esta é, pois, uma situação que não cabe na previsão do art. 615º-1-c) do Código de Processo Civil.

Pelo que a decisão cautelar, embora parecida ao ato administrativo suspendendo, não é nula.

2.2. Entende, ainda, o MP que a decisão recorrida tem uma incoerência, já que o TAC considerou que 6 meses, contados de janeiro de 2019, são suficientes para concluir a remoção, mas depois fixou a obrigação num prazo cujo termo final situa em 31 de agosto de 2019.

Nesta sede, o tribunal a quo afirmou queAtendendo à vontade demonstrada pela Requerente e pela Interveniente e ao timing que foi definido pelas mesmas (atemo-nos às declarações de parte do representante legal da Requerente – N……… - e ao depoimento de L………, diretor comercial da Interveniente, na audiência final), afigura-se que as mesmas necessitarão do prazo de seis meses para finalizar a operação de remoção e encaminhamento das 18.000 toneladas de bagaço de azeitona, sendo que apenas terão os camiões necessários para o efeito a partir de janeiro de 2019.”.

Portanto, o prazo cit. acaba em 31-07-2019.

Mas o tribunal entendeu que a remoção e o encaminhamento das 18.000 toneladas de bagaço de azeitona, que se encontram depositadas na lagoa de armazenamento para um local apropriado, ocorram até ao dia 31-08-2019.

Não há ali nenhuma incoerência, dado que, num juízo de razoabilidade e equidade, também tendo presente a data da prolação da decisão cautelar, se compreende como razoável a dilação temporal de 4 semanas num todo de cerca de 6 meses.

3. Do erro de julgamento em sede de periculum in mora

Alega o recorrente que o Tribunal Administrativo de Círculo não retirou as consequências jurídicas da circunstância provada de ter decorrido mais de 1 ano sobre a prolação do despacho sindicado, da circunstância provada de a Requerente ter deixado de laborar em abril de 2018 e da circunstância provada de a Requente ter um novo estabelecimento em M……. .

Trata-se aqui do perigo de inutilidade da sentença do processo principal, periculum in mora, ou receio fundado de lesão por causa da demora normal do processo principal: fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado (ou perigo da infrutuosidade) ou fundado receio da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente pretende ver reconhecidos no processo principal (ou perigo do retardamento), dependente de um juízo de prognose judicial.

Ora, aqui o MP tem razão.

Com efeito e como é fácil de ver, tal factualidade (circunstância provada de ter decorrido mais de 1 ano sobre a prolação do despacho sindicado, circunstância provada de a Requerente ter deixado de laborar em abril de 2018 e circunstância provada de a Requente ter um novo estabelecimento em M…….) elimina o cit. receio fundado ou o perigo de inutilidade da sentença do processo principal.

Não há, portanto, periculum in mora, o primeiro dos requisitos exigidos no art. 120º-1 do CPTA para o decretamento das providências cautelares.

Pelo que o pedido cautelar deve improceder.

4. Dos erros de julgamento por violação do princípio estruturante da separação de poderes

4.1. O recorrente invoca que a decisão recorrida violou o art. 3º-1 do CPTA, porque o Tribunal não logrou dilucidar a distinção entre a prolação de decisão judicial de decretamento de providência cautelar, sujeita a condição, e a função administrativa cujo exercício está vedado ao Tribunal, não cabendo ao Tribunal dar uma ordem à Requerida - como fez, no sentido de obrigar a uma visita às instalações da Requerente na primeira quinzena de setembro de 2019 -, porque a Requerida, definindo-se na relação processual, é o Ministério do Ambiente e da Transição Energética, compreendido no Governo, cujo titular da pasta depende do Primeiro- Ministro, tendo o Tribunal excedido as suas atribuições.

O art. 3º-1 do CPTA (“No respeito pelo princípio da separação e interdependência dos poderes, os tribunais administrativos julgam do cumprimento pela Administração das normas e princípios jurídicos que a vinculam e não da conveniência ou oportunidade da sua atuação”), repetindo e concretizando o que já resulta dos arts. 111º-1, 1º e 2º da CRP, significa que:

(i) a função jurisdicional (definida no art. 202º-2 da Constituição: assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados), uma das duas funções secundárias do Estado, não pode atuar no âmbito da função política em sentido estrito, da função político-legislativa, da função político-governativa e da função administrativa (atividade pública contínua tendente à satisfação das necessidades coletivas em cada momento selecionadas, mediante prévia opção constitucional e legislativa, como desígnios da coletividade pública ou interesses públicos contingentes); e vice-versa;

(ii) também significa que os tribunais administrativos não apreciam a atuação – própria - da Adm. P. quanto ao seguinte: utilidade da concreta atuação administrativa para a prossecução do interesse coletivo legalmente definido e utilidade da concreta atuação administrativa para a prossecução do interesse coletivo legalmente definido à luz dos demais interesses coletivos envolvidos (Marcelo Rebelo de Sousa/André S.M., D. Adm. Geral, I, 3ª ed., p. 185).

Ora, no caso em apreço, quando o Tribunal Administrativo de Círculo decidiu determinar que os serviços técnicos da Entidade Requerida efetuem uma visita às instalações da Requerente, durante a primeira quinzena de setembro de 2019, a fim de verificar no local a situação em que se encontra o bagaço de azeitona e as águas ruças, prestando as informações pertinentes ao Tribunal, estava a agir ao abrigo do art. 202º-3 da Constituição e dos arts. 7º-2 e 519º-1 do Código de Processo Civil, solicitando assim a colaboração da E.D., de modo a poder aferir o cumprimento da sua decisão e a eventualmente exercitar aquilo que está previsto nos arts. 123º e 124º do CPTA sobre caducidade, alteração e revogação das providências.

Não há, por isso, invasão jurisdicional do campo reservado à função administrativa, entendida esta como vimos.

4.2. Por outro lado, o recorrente invoca ainda que não cabe ao Tribunal fiscalizar o exercício da atividade económica da Requerente, mas apenas julgar a condição da sua decisão verificada ou não verificada, pelo não cabe exigir informações pertinentes ou adicionais à IGAMAOT em setembro de 2019 para reavaliar a situação, como afirma, a coberto de uma ideia de revogação futura da decisão cautelar, assim novamente violando o art-º 3.º n.º 1 do CPTA.

Valem aqui os considerados feitos em 4.1.

Não há, por isso, invasão jurisdicional do campo reservado à função administrativa, entendida esta como vimos.

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III - DECISÃO

Por tudo quanto vem de ser exposto e de harmonia com os poderes conferidos no artigo 202º da Constituição, os juizes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul acordam em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão cautelar recorrida e indeferir o pedido cautelar.

Custas neste TCAS a cargo da contra-alegante.

Custas a cargo da requerente no Tribunal Administrativo de Círculo.

Lisboa, 04-12-2019


Paulo H. Pereira Gouveia

Catarina Jarmela

Paula de Ferreirinha Loureiro