Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2348/09.0 BELSB
Secção:CT
Data do Acordão:03/02/2023
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:SEGURANÇA SOCIAL
PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO
ÓNUS DA PROVA
DÉFICE INSTRUTÓRIO
INDEFERIMENTO EXPRESSO DE RECURSO HIERÁRQUICO
INIMPUGNABILIDADE 
CONVOLAÇÃO
Sumário:I. Em sede de impugnação judicial, é possível reagir a um indeferimento expresso de recurso hierárquico (mesmo que facultativo e mesmo que depois de decorrida a formação de indeferimento tácito) que se tenha pronunciado sobre a legalidade das correções efetuadas pela administração, atento o disposto nos art.ºs 76.º, n.º 2, 97.º, n.º 1, al. d), 102.º, n.º 1, al. e), do CPPT, disciplina própria que se distancia da do CPTA.

II. Tal indeferimento expresso do recurso hierárquico que se tenha pronunciado sobre a legalidade das correções efetuadas é, nos termos do CPPT, diretamente impugnável, não sendo de aplicar a disciplina em torno dos atos confirmativos, constante do CPTA, dada a disciplina própria prevista no CPPT.

III. A pertinência do depoimento prestado, em sede de audiência de inquirição de testemunhas, por um funcionário que esteve na origem da fundamentação dum ato impugnado nunca pode ser de modo tal a que, por essa via, seja possível aditar ao ato fundamentação que dele não consta.

IV. Sendo as contribuições para a Segurança Social um tributo, no âmbito das relações jurídico-tributárias respeitantes a tais contribuições é aplicável, designadamente, a LGT, sem prejuízo da existência de legislação especial que prevaleça.

V. Por referência aos anos pertinentes no caso dos autos, são aplicáveis, no âmbito do procedimento tributário em causa, as regras procedimentais e as atinentes à distribuição do ónus da prova, previstas na LGT.

VI. Considerando o referido em IV. e V., não há lugar à aplicação da presunção prevista no art.º 249.º, n.º 3, do Código do Trabalho então em vigor, uma vez que o quadro legal, específico dos tributos e procedimentos aos mesmos respeitantes, contém disciplina própria que se sobrepõe, inexistindo qualquer lacuna a este propósito que necessite de ser preenchida.

VII. Inerente ao respeito pelo princípio do inquisitório, que impende sobre a administração, encontra-se a necessidade de prossecução do interesse público subjacente ao alcance da verdade material.

VIII. Os mapas de remunerações apresentados pelas entidades contribuintes, depois de validados nos termos legalmente previstos, equivalem a autoliquidações e presumem-se verdadeiros, nos termos do disposto no art.º 75.º, n.º 1, da LGT.

IX. Quando o défice instrutório conduza a que não estejam cabalmente identificadas as concretas situações objeto de correção, está condicionado o exercício do direito de defesa por parte do administrado, não sendo exigível a este último a junção de documentos adicionais, dada a falta de identificação adequada e completa das situações em causa, impeditiva da aferição de quais os concretos documentos a apresentar.

Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I. RELATÓRIO

O Instituto da Segurança Social, IP (doravante 1.º Recorrente ou ISS) e a L. T. – E.T. T., S.A. (doravante 2.ª Recorrente ou Impugnante) vieram recorrer a segunda do despacho proferido a 16.02.2018, que convolou a ação administrativa especial primitivamente apresentada em impugnação judicial, e a primeira também do mencionado despacho e da sentença proferida a 16.07.2022, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada pela Impugnante, que teve por objeto a Deliberação n.º 73/2009 do Conselho Diretivo da Segurança Social, que indeferiu o recurso hierárquico interposto do Despacho da Diretora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes da Segurança Social, de 23.12.2009, que considerou a Impugnante devedora de contribuições à Segurança Social, no valor de 5.961.687,61 Eur.

A Impugnante, nas suas alegações, formulou as seguintes conclusões:

A. Vem o presente recurso interposto do despacho saneador proferido a fls. dos autos,

B. O Tribunal a quo decidiu existir excepção de impropriedade do meio processual, determinado a convolação da acção em impugnação judicial;

C. Tal decisão é ilegal por violação do disposto no artigo 97.º, alíneas d) e p), do CPPT;

D. A delimitação geral do âmbito de aplicação do processo de impugnação judicial e da acção administrativa especial para impugnação de actos em matéria tributária, resulta, no essencial, do disposto no referido artigo 97.º, n.º 1, alíneas d) e p), do CPPT;

E. Nos termos do previsto na alínea d) da sobredita disposição legal, o processo judicial tributário compreende a “impugnação dos actos administrativos em matéria tributária que comportem a apreciação da legalidade do acto de liquidação”;

F. Por seu turno, a alínea p) prevê que é compreendido no processo judicial tributário o “recurso contencioso do indeferimento total ou parcial ou da revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, quando dependentes de reconhecimento da administração tributária, bem como de outros actos administrativos relativos a questões tributárias que não comportem apreciação da legalidade do acto de liquidação”.

G. Da interpretação do elemento literal das previsões relevantes resulta com meridiana clareza que a fronteira entre os meios de defesa em confronto reside na circunstância de estar, ou não, em causa a apreciação da legalidade de acto de liquidação;

H. Nas conclusões do procedimento de averiguações, o Instituto da Segurança Social I.P., afirmou que iria promover a liquidação oficiosa das contribuições que considerava em dívida;

I. Na deliberação em que se decidiu o procedimento administrativo que antecede, o Instituto da Segurança Social afirmou que o seu direito a receber as contribuições que considera em dívida, e o correlativo dever de pagar por parte da Recorrente, emergem dos actos de liquidação respectivos;

J. Na peça processual de fls. 977 dos autos, o Instituto da Segurança Social I.P., afirma que não praticou qualquer acto de liquidação;

K. Mais se indica na referida peça processual que apenas foram praticados, sete anos após o terminus do procedimento de averiguações, actos internos de registo das declarações de remunerações em conta corrente;

L. Conclui-se, pois, que no caso vertente não foi praticado qualquer acto de liquidação;

M. Sendo a fronteira entre o presente meio processual e a impugnação judicial o facto de estar, ou não, em causa a apreciação da legalidade de um acto de liquidação, é evidente o erro de julgamento em que incorreu o Tribunal a quo;

N. Não existindo acto de liquidação, não pode estar em causa a contestação da sua legalidade;

O. A decisão judicial em apreço violou, pois, o disposto no artigo 97.º, alínea d) e p), do CPPT, não se podendo manter.

Termos em que, e nos mais de direito, sempre com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso proceder, porque provado, determinando-se a revogação do despacho saneador proferido, após o que o processo deverá tramitar como Acção Administrativa especial até prolação de Sentença”.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O recurso foi admitido, com subida a final.

Por seu turno, o ISS, nas suas alegações, concluiu nos seguintes termos:

I. O Tribunal a quo considerou que houve défice instrutório no procedimento inspetivo, por violação do princípio do inquisitório, e, deste modo, deu como procedente a impugnação referente ao ato de liquidação respeitante a contribuições dos trabalhadores internos e aos trabalhadores com contratos de trabalhos temporários, a título de “ajudas de custo”, “subsídio de alimentação”, “subsídio de deslocação”, “subsídio de transporte”, “indeminização por férias não gozadas”, “Prémios”, “Gratificações” e “Compensação Pecuniária Global – Compensação por não renovação”.

II. Discordando da douta Sentença, vem o Recorrente interpor Recurso, alegando muito respeitosamente que para o efeito a Sentença prolatada pelo Tribunal a quo padece de Erro de julgamento de facto e de direito, de nulidade, nos termos da al. b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, e, suscita-se, ainda, a Inimpugnabilidade do ato, exceção dilatória oficiosa que deveria ter sido conhecida pelo Tribunal, e, recorre-se do despacho saneador julgou como não procedente a exceção de caducidade do direito de ação, invocada pelo Recorrente, quando se pronunciou sobre a convolação da ação administrativa em impugnação tributária. Mas, considera o Recorrente que a exceção se verifica quanto à interposição da ação propriamente dita, e apesar de não ter invocado a mesma em sede de contestação, sendo de conhecimento oficioso, tinha o Tribunal o dever de conhecê-la.

III. O erro de julgamento (error in judicando) resulta de uma distorção da realidade factual (error facti) ou na aplicação do direito (erro juris), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou normativa. O erro consiste num desvio da realidade factual ou jurídica, por ignorância ou falta representação da mesma. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.

Quanto aos Factos

IV. A Sentença, aqui em crise, estabeleceu, com interesse para a decisão a proferir, 32 factos dados como provados, entre os quais os factos N), P), estes com especial relevância para o presente recurso, cujo teor se transcreve, por facilidade de leitura, a saber:

«N) Todos os elementos e documentação que foram solicitados à ora impugnante pelos serviços de fiscalização do ISS, IP., foram sempre facultados – cf. Depoimento da testemunha C. S. D. P..»

«P) No âmbito do PROAVE n.º 200701193162, os serviços de fiscalização elaboraram os mapas de vencimento por amostragem, constantes de fls. 273 a 379 do PA, em relação aos períodos em análise, os quais aqui se dão por reproduzidos – cf. Fls. 273 a 379 do PA, Pasta 1, e depoimento da testemunha C. S. D. P..».

V. Ora, salvo melhor e douta opinião, dever-se-iam ter fixado como factos provados para a boa decisão da causa, os seguintes:

1) Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “ajudas de custo” com caracter regular;

2) Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “subsidio de alimentação” sobrepondo-se com pagamentos de “ajudas de custo”;

3) Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “subsidio de deslocação” sobrepondo-se com pagamentos de “ajudas de custo”;

4) Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, receberam duplicação de valores, por receberem mensalmente, a título das seguintes rubricas “ajudas de custo”, “subsídio de alimentação” e “subsídio de deslocação”;

5) Dos processamentos salariais é possível concluir que os trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, receberam no mesmo ano civil, verbas pagas a título de “subsídios de férias” e posteriormente “indemnizações por férias não gozadas”, evidenciando que esses montantes não seriam indemnizatórios, pois as férias já tinham sido pagas anteriormente.

6) Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “prémios e gratificações” com regularidade;

7) Dos procedimentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “compensação por cessação” que efetivamente não correspondiam a cessações de contratos de trabalho por os seus montantes serem inferiores;

8) O Recorrido entregou todo o seu processamento salarial dos anos em averiguação à Recorrente;

9) O Recorrido nunca requereu quaisquer diligências complementares;

10) Os mapas de apuramento não precisavam de estar divididos pela dicotomia trabalhadores temporários ou trabalhadores da estrutura interna da empresa;

11) A falta de divisão nos mapas de apuramento entre trabalhadores temporários e trabalhadores da estrutura interna da empresa trata-se apenas de uma questão meramente organizativa dos mapas de apuramento, sendo irrelevante, face ao conhecimento que o Recorrido possui dos seus trabalhadores internos e dos trabalhadores temporários, podendo o mesmo perscrutar os valores aquilatados pelo Recorrente, confrontando-os com a sua informação contabilística.

VI. Pelo exposto, nomeadamente das transcrições dos minutos 7:51 a 7:56; 9:11 a 9:40; 10:16 a 10:21, do depoimento da testemunha C. P., permite-se a conclusão que foram entregues toda a documentação referente aos processamentos salariais, sendo que o processamento salarial é o espelho dos recibos de vencimentos.

VII. Em termos contabilísticos, o processamento salarial é o documento que nos permite ver o que o trabalhador recebeu, e a comparação entre o recibo de vencimento e o processamento salarial tem de ser exatamente igual. Transcreve-se a passagem da testemunha da Inspetora C. P., que versa sobre este ponto: «9:11 a 9:40 Sim, recibo de vencimento, neste os processamentos de vencimento, que é no fundo o que está na base da elaboração do recibo. Em termos contabilísticos é o documento que nos permite ver, e fizemos essa comparação entre o recibo de vencimento e o mapa de processamento tem de ser exatamente igual. Portanto, porque o recibo de vencimento sai do mapa de processamento da contabilidade.».

VIII. Os factos que deveriam ter sido dados como provados elencados pelo Recorrente, do ponto 1) a 5) destas alegações e conclusões deveriam ter sido dados como provados devido à análise dos processamentos salariais, tendo havido, inclusive, um erro na apreciação da prova.

IX. Especificamente quanto ao ponto 4) em que o Recorrente alega que a duplicação dos valores, que deveria ter sido dada como provada, tal deriva quer da análise dos processamentos salariais, quer do depoimento da testemunha inspetora C. P.: «24:47 a 24:50 – mandatário do Recorrente – Mas todos eles recebiam esses subsídios?

24:51 a 27:53 – inspetora C. P.a – Sim, a maioria receberia. E, mesmo os próprios trabalhadores, portanto da estrutura, digamos, da empresa, também verificámos essa situação, deslocações de ajudas de custo também, as ajudas de custo, sim, verificámos até que havia acumulação, muitas das vezes, portanto era pago, ajudas de custo e simultaneamente subsídio de alimentação, subsídios de deslocação que concorrem todos um pouco para o mesmo, digamos, a base da ajuda de custo é para fazer face à despesa de transporte, alojamento, alimentação, e na mesma altura em que atribuíam essa ajuda, não retiravam a alimentação, portanto era na mesma, era mais uma duplicação, mais nos deu a ideia que de facto aquilo não estaria correto, porque se recebe uma coisa já não poderia receber outra, não é? E, ainda, para mais se a empresa também tinha na sua contabilidade, considerava na sua contabilidade, custos da empresa, como custos da empresa, o pagamento contra recibo e entrega de recibo muitas das vezes de refeições ou de outra situação qualquer, portanto isso era considerado como custo da empresa, portanto ainda além dessas situações todas que estavam na conta do pessoal e que vinham nos recibos de vencimento, ainda além, na contabilidade da empresa estavam a considerar como custo também cumulativamente o ressarcimento de despesas de, portanto de faturas, recibos, não é? E, a empresa considerava isso como seu custo, portanto ainda mais nos deu essa indicação de que não estava mesmo correto e que a empresa estava a pagar em duplicado, neste caso mais do que duplicado, pronto e essa situação, não mexemos nos custos da empresa, mas fizemos essa averiguação. Tivemos que ir à parte que ia ao trabalhador, portanto o que está no recibo de vencimento, é que a Segurança Social pode dizer ou não se está correto ou não, portanto havendo essa situação das duas faces entre os custos da empresa e o pagamento ao trabalhador, consideramos que o pagamento ao trabalhador está em duplicado e daí esse apuramento

27:55 a 27:57 – mandatário do Recorrente – As despesas foram então assumidas nos custos da empresa?

27:57 a 27:58 – inspetora C. P. – Exatamente.».

X. Quanto ao facto que deveria ter sido dado como provado que o Recorrente alega em 6) destas alegações: «6) Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “prémios e gratificações” com regularidade, e o seu modo de atribuição não estava previsto em nenhum documento do Recorrido.», devendo este facto ter sido dado como provado face ao processamento salarial, como também no facto de a sua atribuição não estar prevista sequer pelo Recorrido, veja-se quer o Relatório Final, quer a transcrição do depoimento da inspetora C. P.:

«42:03 a 42:06 – mandatário da Recorrente – Havia algum regulamento, estavam previstos?

42:06 a 42:11– inspetora C. P. – Não. Pedimos o regulamento, o critério de atribuição.».

E, ainda, se transcreve os seguintes minutos:

«42:20 a 42:32 – inspetora C. P. – Não nos foi dado a conhecer nenhum critério, nenhuma atribuição, com que base, ahh, portanto, nenhum documento escrito, não tivemos nenhum documento escrito.», e, ainda aos minutos: «42:40 a 42:47 – inspetora C. P. – Questionámos o porquê da atribuição, mas não nos foi dado a conhecer qual foi o critério.».

Transcreve-se ainda os minutos:

«43:10 a 43:20 – inspetora C. P. – E, também chegou a dizer que muitas vezes era a própria empresa, portanto a L. T. que achava por bem fazer esse pagamento, mas também não nos foi entregue esse critério (…)».

XI. Quanto ao seguinte facto que deveria ter sido dado como provado «7) Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “compensação por cessação” que efetivamente não correspondiam a cessações de contratos de trabalho por os seus montantes serem inferiores», este encontra fundamento quer da analise do processamento salarial, como do testemunho da inspetora C. P., que se transcreve:

«30:45 a 30:50 – mandatário da Recorrente – Fala-se também aqui de uma compensação pecuniária global.

30:50 a 31:13 – inspetora C. P. – Ah, sim. Esse também é outra situação um pouco sui generis, porque essa compensação tem em vista portanto ressarcir o trabalhador quando há uma cessação de contrato, só que o que nós acabámos por averiguar e o que nos foi dado a conhecer pela documentação é que havia até esse pagamento embora de valor que uma compensação normal nem sequer seria aquele valor, seria muito maior porque com base na remuneração do trabalhador, portanto aqueles pagamentos a que o trabalhador teria direito seriam superiores aos valores que estavam em causa, tanto essa até foi uma situação que vimos logo. E, depois ainda constatámos que por vezes em meses posteriores, portanto aquele pagamento num determinado mês, em mês posterior estavam pagos, outros, outros remunerações, digamos, até vimos alguns prémios e algumas situações pagas aos trabalhadores posteriormente a essa atribuição desse complemento

32:14 a 32:20 – mandatário da Recorrente – Portanto havia um pagamento de uma compensação pelo facto de haver uma cessação do contrato…

32:20 a 32:30 – inspetora C. P. – Seria para compensar, não é, a cessação do contrato, mas depois também se verificava que havia pagamentos posteriores.

32: 30 a 32:31 – mandatário da Recorrente – Ao mesmo trabalhador?

32:32 a 32:34 – inspetora C. P. – Sim. Exatamente, nos meses seguintes.».

XII. Quanto ao facto que deveria estar como provado, elencado no ponto 9) destas alegações, «9) O Recorrido nunca requereu quaisquer diligências complementares», este está firmado quer da leitura da pronúncia do Recorrido em audiência prévia, (que juntou com a petição inicial como doc. n.º 3), quer como também se retira do depoimento da inspetora C. P., especificamente:

«19:12 a 19:27 – mandatário da Recorrente – Exato, portanto, e nessa altura, do direito de pronúncia, a empresa veio juntar mais alguma documentação? Mais alguma documentação de suporte? De Despesas justificativas?

19:28 a 19:41 – inspetora C. P. – Não, não. Foi feito uma resposta por escrito só a refutar portanto o que acharam que não estava…Não, não

19:42 a 19:58 – mandatário da Recorrente – Foi aqui afirmado, portanto, que a Segurança Social teria negado alegadas diligências de instrução para, … foram negadas diligências instrutórias adicionais que a Autora achava imprescindíveis para?

19:58 a 20:10 – inspetora C. P. – Não, não. Nem temos, nem temos, nessa resposta algum pedido de novas diligências.

20:11 a 20:14 – mandatário da Recorrente – Portanto, houve sempre, a Segurança Social colaborou sempre?

20:15 a 21:44 – inspetora C. P. –Sim, exatamente, desde. Isto de termos dado logo acesso inicialmente à consulta do processo e que foram tiradas fotocopias do documento do relatório em que estava em fase de averiguação, foram solicitados esclarecimentos, haveria sempre essa disponibilidade da empresa de responder, mas nunca nos foi facultado digamos nenhum documento por escrito considerando por exemplo porque é que atribuíam aquela verba, com que intuito, e a que trabalhadores, não nos foi dado. Na altura referiam que eram as empresas utilizadoras, que às vezes indicavam ou então era a própria empresa que achava por bem esse pagamento aos trabalhadores e à administração, mas não nos foi entregue digamos umas condições de atribuição de alguma verba, de alguma rubrica, que nós tivéssemos posto em causa.».

XIII. O ponto 126. do Recurso Hierárquico interposto pelo Recorrido contra o ato de liquidação (doc. n.º 4 junto com a petição inicial) refere apenas o seguinte: «(…) se requer a V. Exa. que revogue o mesmo, porque se afigura ilegal, se necessário for, recorrendo a prova complementar face àquela realizada pelos serviços da Entidade Recorrida e no sentido de efectivamente conhecer algumas rubricas (…)», e o ponto 127. do Recurso hierárquico refere que: «A Recorrente manifesta-se desde já, inteiramente disponível para colaborar em tal prova, designadamente testemunhal apenas necessitando que V. Exas. Indiquem, com precisão, quais os casos concretos (trabalhadores) em que entendem ter a Entidade Recorrida fundado a sua convicção sobre a regularidade e obrigatoriedade (…)».

XIV. No entanto, o Recorrido nunca requer que sejam realizadas específicas diligências, refere apenas se necessário for, recorrendo a prova complementar”.

XV. O Recorrido nunca requereu que fossem ouvidos quaisquer trabalhadores em concreto, nem indicou nenhum dos seus nomes. O Recorrido tinha sido notificado dos mapas de apuramento, perscrutava os mapas de apuramento, via o mês em que determinada quantia estava a ser imputada como contribuição em falta a um trabalhador concreto, confrontava com a sua contabilidade (processamento salarial) e chegava à conclusão que tinham sido pagos naquele mês “indemnização por cessação” juntamente com os duodécimos de “subsídio de férias”, e, requeria que aquele trabalhador fosse ouvido ou juntava a cessação do contrato do trabalhador. E, este raciocínio aplica-se às situações das outras “rubricas”, por exemplo no caso das “ajudas de custo”, confrontavam com os processamentos salariais os mapas de apuramento mês a mês, e viam que determinado trabalhador em mês tal, tinha recebido “ajudas de custo” e naquele mês o trabalhador tinha recebido a título de “subsídio de alimentação”, “subsídio de deslocação”, e apresentava os recibos das despesas que os trabalhadores tinham apresentado ao Recorrido, ou que a entidade utilizadora tinha enviado ao Recorrido, para os trabalhadores serem ressarcidos, e, indicava os trabalhadores para serem ouvidos, até em sede judicial.

XVI. A genérica indicação da falta de instrução ser patente em fase das afirmações genéricas de: «Em relação a alguns trabalhadores; Havendo também na maior parte; A alguns trabalhadores (…)» do Relatório Final também não colhe, uma vez que o Recorrido analisou os mapas de apuramento, e em sede de audiência prévia, veio referir que havia verbas erroneamente imputadas. Então se o Recorrido fez essa análise dos mapas de apuramento, podia muito bem ter indicado que fossem ouvidos em concreto trabalhadores, em face de outras “rubricas”.

XVII. Dever-se-iam ter fixado como factos não provados para a boa decisão da causa, os seguintes:

1) Não ficou provado que a informação enviada pelas entidades utilizadoras à Recorrida, tivesse alterado as conclusões do procedimento inspetivo, nem ficou provado a sua relevância para a qualificação jurídica das “rubricas”;

2) O teor da informação enviada pelas entidades utilizadoras à Recorrida ou outra informação de suporte não alteraria as conclusões extraídas do processamento salarial entregue pelo Recorrido ao Recorrente.

Da Nulidade da Sentença por falta de fundamentação nos termos da al. b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC

XVIII. A Sentença padece de Nulidade por falta de fundamentação nos termos da al. b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, uma vez não especifica quais os fundamentos de facto que em que baseou a decisão, violando o dever de motivação ou fundamentação da decisão.

XIX. Caso os Venerandos Juízes Desembargadores, sejam de opinião, que apenas se trata de uma motivação deficiente, isto é, que apenas esteja em casa uma insuficiência ou mediocridade da motivação afetando o valor doutrinal da Sentença, então que apreciem a questão à luz de ser revogada ou alterada neste recurso.

XX. O Recorrente alega falta de fundamentação, porque o Tribunal a quo decidiu que há défice instrutório, mas, no entanto, não logra fundamentar nem justificar, porque é que eram necessárias outras diligências, ou de outra documentação de suporte seria necessária recolher e analisar, nem como a falta destes é um défice instrutório!

XXI. A Sentença não menciona de que forma é que esses tais elementos, que não especifica quais são, e que estão supostamente em falta, descaracterizariam a qualificação jurídica das quantias como complementos remuneratórios, que tinham sido qualificadas pelo Recorrido de “ajudas de custo”, “prémios e gratificações”, “indemnizações por férias não gozadas”, “compensação pecuniária global”.

XXII. Após menção na Sentença que foram analisados balancetes e mapas de processamento, não há fundamentação explicando como os balancetes ou mapas de processamento de vencimentos são insuficientes para averiguar a qualificação jurídica dos montantes pagos aos trabalhadores.

XXIII. O que o Recorrente pretende é perceber como é que outras diligências contribuiriam para o apuramento das concretas circunstâncias de facto que determinaram o pagamento daqueles montantes. Isto é, porque é que as características e a factualidade apurada sobre aqueles montantes analisados através dos processamentos de vencimentos, não eram suficientes para provar a sua qualificação.

XXIV. No caso dos montantes pagos a título de “ajudas de custo”, que eram pagos com regularidade, e, inclusive, nalguns casos em meses com pagamento simultâneo de “subsídios de férias”, “subsídio de alimentação”, “subsídio de deslocação”, “subsídio de transporte”, porque razão esse apuramento através do processamento de salários, não é, à luz do pensamento do Tribunal a quo suficiente para fortificar que são complementos remuneratórios. Não há qualquer fundamentação que explique ou fundamente a falta de instrução dos serviços do Recorrente.

XXV. Conforme o Relatório Final evidencia na sua fundamentação, certos trabalhadores recebiam cumulativamente “subsídio de alimentação”, “subsídios de transporte”, “subsidio de deslocação” e “ajudas de custo”, havendo patentemente uma duplicação de valores, que decorre da análise dos processamentos salariais.

XXVI. O testemunho da inspetora C. P. frisa a duplicação de valores, aos minutos 24:51 a 27:53 – «Sim, a maioria receberia. E, mesmo os próprios trabalhadores, portanto da estrutura, digamos, da empresa, também verificámos essa situação, deslocações de ajudas de custo também, as ajudas de custo, sim, verificámos até que havia acumulação, muitas das vezes, portanto era pago, ajudas de custo e simultaneamente subsídio de alimentação, subsídios de deslocação que concorrem todos um pouco para o mesmo, digamos, a base da ajuda de custo é para fazer face à despesa de transporte, alojamento, alimentação, e na mesma altura em que atribuíam essa ajuda, não retiravam a alimentação, portanto era na mesma, era mais uma duplicação, mais nos deu a ideia que de facto aquilo não estaria correto, porque se recebe uma coisa já não poderia receber outra, não é? E, ainda, para mais se a empresa também tinha na sua contabilidade, considerava na sua contabilidade, custos da empresa, como custos da empresa, o pagamento contra recibo e entrega de recibo muitas das vezes de refeições ou de outra situação qualquer, portanto isso era considerado como custo da empresa, portanto ainda além dessas situações todas que estavam na conta do pessoal e que vinham nos recibos de vencimento, ainda além, na contabilidade da empresa estavam a considerar como custo também cumulativamente o ressarcimento de despesas de, portanto de faturas, recibos, não é? E, a empresa considerava isso como seu custo, portanto ainda mais nos deu essa indicação de que não estava mesmo correto e que a empresa estava a pagar em duplicado, neste caso mais do que duplicado, pronto e essa situação, não mexemos nos custos da empresa, mas fizemos essa averiguação. Tivemos que ir à parte que ia ao trabalhador, portanto o que está no recibo de vencimento, é que a Segurança Social pode dizer ou não se está correto ou não, portanto havendo essa situação das duas faces entre os custos da empresa e o pagamento ao trabalhador, consideramos que o pagamento ao trabalhador está em duplicado e daí esse apuramento.».

XXVII. Por tudo o exposto, a Sentença não logra fundamentar de todo porque razão outras diligências deveriam ter sido realizadas pelos serviços do Recorrente, quando a análise do processamento salarial permitiu robustecer as conclusões vertidas no Relatório Final.

XXVIII. Não se entende como é que a informação de suporte, que o Recorrido, teria ou têm, ou que estaria com as empresas utilizadoras, permitiria modificar as conclusões dos serviços de inspeção do Recorrente.

Da exceção de inimpugnabilidade do ato

XXIX. Por ofício de 23/12/2008, o Recorrido foi notificado do Relatório Final e do apuramento de contribuições. Posteriormente, em 06/02/2009, o Recorrido deduziu recurso hierárquico contra o despacho de 23/12/2008. Através de ofício de 21/08/2009, o Recorrido foi notificado da deliberação n.º 73/2009 do Conselho Diretivo da Segurança Social, I.P. que negou proveniente ao recurso, ato este que foi impugnado (cfr. ponto BB), CC), DD) e EE) dos factos dados como provados na Sentença).

XXX. O ato de decisão do recurso hierárquico é somente um ato confirmativo.

XXXI. Há uma exceção de inimpugnabilidade do ato, que tanto nos termos da al. c) do n.º 1 do artigo 89.º do anterior CPTA/2014, como nos termos da al. i) do n.º 4 do artigo 89.º do CPTA de 2015, a exceção dilatória de inimpugnabilidade do ato, obsta ao prosseguimento do processo.

XXXII. Tenha-se em conta que artigo 53.º do CPTA/2014 dispunha que «Uma impugnação só pode ser rejeitada com fundamento no carácter meramente confirmativo do ato impugnado quando o ato anterior:

a) Tenha sido impugnado pelo autor;

b) Tenha sido objeto de notificação ao autor;

c) Tenha sido objeto de publicação, sem que tivesse de ser notificado ao autor.».

XXXIII. Os requisitos do artigo 53.º do CPTA/2014, não são de aplicação cumulativa, mas alternativa, sendo que, cada alínea, por si só, continha uma previsão autónoma das restantes.

XXXIV. Já na interpretação do preceito do artigo 53.º do CPTA/2014, referia Mário Esteves de Oliveira, in Direito Administrativo, Volume I, 1980, pág. 411: «Para que o acto confirmativo se considere contenciosamente inimpugnável necessário se torna que estejam preenchidos diversos requisitos, de que a nossa jurisprudência e doutrina se têm feito eco.

Em primeiro lugar é necessário que o acto confirmado e o acto confirmativo hajam sido praticados ao abrigo da mesma disciplina jurídica: se, entre a prática de um e de outro, se verifica uma alteração legal ou regulamentar dessa disciplina, o acto posterior não se considera confirmativo e é susceptível de impugnação contenciosa. O mesmo se diga para a modificação das condições fácticas que rodeiam a prática do acto. Em segundo lugar, o acto confirmativo só não pode ser impugnado se o particular já tivesse conhecimento (por qualquer dos modos referidos no art.º 52º do RSTA) do acto confirmado antes da interpretação do recurso contra o acto confirmativo. O terceiro requisito para que o acto confirmativo se diga impugnável é a total correspondência entre os seus diversos elementos – efeitos jurídicos, interessados, fundamentos de facto e de direito (art. 140º nº 2 do Projecto do CPAG) – e os do acto confirmado; se assim não acontecer, o acto só será de considerar como parcialmente confirmativo e então torna-se susceptível de impugnação contenciosa, podendo arguir-se contra ele todas as ilegalidades concretas (não vícios em abstracto) que não pudessem ser deduzidas contra o acto parcialmente confirmado.» (sublinhado nosso).

XXXV. Assim sendo, para que um ato administrativo seja confirmativo de outro, é necessário, além da identidade dos sujeitos, que os dois atos tenham os mesmos pressupostos, a mesma fundamentação e o mesmo regime jurídico (cfr. neste sentido o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, do Processo n.º 0614/06 de data de 11-10-2006).

XXXVI. O ato comunicado ao Recorrido por ofício de 23/12/2008 e a decisão sobre o recurso hierárquico notificado através de ofício de 21/08/2009, assentam nos mesmos fundamentos de facto e de direito.

XXXVII. Alude-se, ainda, ao defendido por Mário Aroso de Almeida, in O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, 4.ª edição revista e atualizada, pág. 163: “…o ato meramente confirmativo também não pode ser impugnado por quem, estando constituído no ónus de impugnar o ato anterior dentro dos prazos legais, não o tenha feito, na medida em que, de outro modo, se estaria a permitir que o litígio fosse suscitado sem observância dos prazos legais. Neste sentido, as alíneas b) e c) do artigo 53.° estabelecem que o ato meramente confirmativo não pode ser impugnado se o ato anterior tiver sido notificado ao interessado ou, em alternativa, se o ato anterior tiver sido publicado, nos casos em que o interessado não tivesse de ser notificado e, por isso, bastasse a publicação para que ele se lhe tornasse automaticamente oponível (cfr., a propósito, artigo 59.” (negrito nosso).

XXXVIII. Um ato confirmativo nada inova na esfera jurídica do destinatário que não vê alterado o “status quo ante”, limitam-se a manter uma situação (lesiva) anteriormente criada, sem produzir qualquer efeito — cfr. Rogério Soares, in “Direito Administrativo (Lições)”, pág. 346; Sérvulo Correia, in “Noções de Direito Administrativo”, página 347.

XXXIX. O Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul do Processo n.º 688/15.8BELSB de data de 04-07-2019 do relator Luís Migueis Garcia, que reflete: «I. A decisão proferida no âmbito do procedimento administrativo de segundo grau, decidindo o recurso hierárquico facultativo no sentido do seu indeferimento, mantendo a decisão recorrida, constitui um ato meramente confirmativo do ato primário impugnado administrativamente.

II. A decisão administrativa objeto de impugnação administrativa facultativa, constitui um ato administrativo imediatamente lesivo e impugnável contenciosamente, sendo ele que define inovatoriamente a situação do caso concreto.

III. A utilização dos meios impugnatórios suspende a contagem do prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo, o qual retoma o seu curso com a notificação proferida ou com o decurso do respetivo prazo legal de decisão, segundo o n.º 4 do artigo 59.º do CPTA.

IV. Estando a ação sujeita ao prazo de impugnação dos atos anuláveis, de três meses, previsto no n.º 1 do artigo 58.º do CPTA, contado nos termos do seu n.º 2, determina a procedência da exceção de caducidade do direito de ação, configurada como uma exceção dilatória, que acarreta a absolvição da entidade demandada da instância.».

XL. Inclusive, nomeia-se, ainda, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul do Processo n.º 01089/06, de data de 06-06-2006 do relator Eugénio Sequeira, que asseverou que: «1. Em matéria tributária, os recursos hierárquicos, salvo disposição em contrário, têm natureza meramente facultativa e efeito meramente devolutivo; 2. Pelo que nestes recursos em regra, não ocorre indeferimento tácito ou acto tácito de indeferimento, porque desde logo os interessados têm a faculdade de reagir contenciosamente contra o ato objeto daqueles, não havendo necessidade do apelo a acto legalmente ficcionado que nestes se deva produzir;

3. Interposto recurso contencioso contra pretenso ato tácito de indeferimento ocorrido em recurso hierárquico facultativo, deve o mesmo ser rejeitado por ilegal interposição.» (sublinhado nosso).

XLI. A inimpugnabilidade do ato é uma exceção dilatória de conhecimento oficioso, resultando da sua verificação a absolvição da entidade demandada da instância, de acordo com o artigo 89.º, n.º 1, alínea e) do CPTA, ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT.

XLII. A inimpugnabilidade do ato é uma exceção dilatória é de conhecimento oficioso, e sobre isto versa o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, do Processo n.º 4637/16.8T8ENT-D.E1 de data de 11-02-2021 da relatora Conceição Ferreira, que estabelece: «É lícito ao demandado apresentar, depois da contestação (oposição, impugnação), os meios de defesa de que o tribunal pode conhecer oficiosamente.», e, dispõe, ainda, o referido Acórdão, que:

«(…) temos de reconhecer que a lei também permite exceções à concentração da defesa, atento o disposto no n.º 2 do artigo 573.º do CPC, designadamente a apresentação de meios de defesa de que o tribunal possa conhecer oficiosamente, como sucede com quase todas as exceções dilatórias (artigo 578.º do CPC) e com grande parte das exceções perentórias (artigo 579.º do CPC), ou seja, quando estamos perante a apelidada defesa oficiosa (…) Com efeito, é lícito ao demandado apresentar depois da contestação (oposição, impugnação) os meios de defesa de que o tribunal pode conhecer oficiosamente. Pois podendo e devendo o tribunal conhecer oficiosamente de factos constitutivos de exceções (cfr. artigo 608.º, n.º 2, do CPC), não faria sentido que tais questões não pudessem ser invocadas pelo demandado em momento posterior ao termo do prazo para a contestação/impugnação (v. Jorge Pais do Amaral in Direito Processual Civil, 13ª edição, 241).» (negrito e sublinhado nosso).

XLIII. Ademais, as exceções dilatórias no processo administrativo, são sempre de conhecimento oficioso, de acordo com o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul do Processo n.º 106/12.3BECTB de data de 06-12-2017 da relatora Ana Celeste Carvalho, que assinala que:

«(…) II. O CPTA regulou a matéria das exceções no artigo 89.º, em termos não inteiramente coincidentes com o regime previsto no CPC, sendo a aplicação do regime processual civil meramente subsidiária em relação ao processo administrativo.

III. Segundo o artigo 89.º, n.º 2 do CPTA as exceções dilatórias são de conhecimento oficioso do tribunal, sem que se proceda a qualquer distinção de regime ou à ressalva de qualquer exceção dilatória que pudesse obedecer a outro regime, como se verifica nos termos da lei processual civil, pelo que, são todas de conhecimento oficioso. (…)»

(sublinhado nosso).

XLIV. Sendo a exceção de inimpugnabilidade do ato de conhecimento oficioso, quer dizer que independentemente de terem sido trazidos a juízo ou não pelo Recorrente ou pelo Recorrido, o juiz deve conhecer da exceção e julgar em função da sua eficácia, e sobre o mesmo veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, do Processo n.º 07P656 de data de 11-04-2007 do relator Oliveira Mendes, pauta que: «I - Constitui princípio elementar em matéria processual o de que o tribunal de recurso deve conhecer todas as questões que, tendo sido ou devendo ter sido objeto de decisão no tribunal recorrido, sejam submetidas à sua apreciação, isto é, constituam objeto da impugnação, o qual em processo penal se define e delimita através das conclusões formuladas na motivação de recurso.

II - Tal princípio comporta, porém, uma ampliação e uma limitação, as quais decorrem dos poderes e deveres de cognição do tribunal de recurso.

III - A ampliação verifica-se perante questões que a lei impõe sejam conhecidas (sempre) pelo tribunal de recurso. Trata-se de todas aquelas questões de conhecimento oficioso, ou seja, que o tribunal tem obrigação de conhecer independentemente de alegação, isto é, sejam ou não invocadas, e independentemente do concreto conteúdo da decisão recorrida, quer elas digam respeito à relação processual quer à relação material controvertida.

Assim, perante uma questão de conhecimento oficioso, o tribunal terá de a conhecer mesmo que ela não tenha sido abordada na decisão recorrida (certo é que se o não foi, devia ter sido (…)» (sublinhado e negrito nosso).

XLV. A exceção dilatória impede a apreciação do mérito da ação, e deve ser dada como procedente.

Da exceção de caducidade do direito de ação

XLVI. Verifica-se, ainda, a exceção de Caducidade do direito de ação. O Recorrente havia invocado a exceção de Caducidade do direito de ação, ao pronunciar-se sobre a convolação do processo na forma processual adequada, porém, o Tribunal a quo manifestou-se no despacho saneador no sentido que a exceção não se verificava, e, não sendo o recurso de despacho saneador um recurso de apelação autónoma nos termos do artigo 644.º do CPC, o Recorrente apresenta recurso face à mesma.

XLVII. A exceção da caducidade de direito de ação é de conhecimento oficioso, e, sobre isto, pronuncia-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul do Processo n.º 132/14.8BEALM de data de 21-03-2019 do relator José Gomes Correia, que assegurou que:

«I) - O prazo fixado para a dedução da ação, porque aparece como extintivo do respetivo direito (subjetivo) potestativo de pedir judicialmente o reconhecimento de um certo direito, é um prazo de caducidade.

II) - E a caducidade do direito de ação é de conhecimento oficioso, porque estabelecida em matéria (prazos para o exercício do direito de sindicar judicialmente a legalidade do ato administrativo) que se encontra excluída da disponibilidade das partes (art.º 333.º do CC) e determina o indeferimento liminar da petição. É, pois, um pressuposto processual negativo, em rigor, uma exceção peremtória que, nos termos dos art.ºs 576.º n.º 3 e 579.º do CPC, consistindo na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos factos articulados pelo autor, o não conhecimento de meritis pela existência de obstáculos que o impeçam na disponibilidade do recorrente, importando a absolvição oficiosa do pedido. III) - Mesmo que se considere que se trata de uma exceção dilatória por assim ser qualificada especialmente no CPTA (cfr. art.º 89.º n.ºs 1, 2 e 4 al. k), tal implicaria que o tribunal não conhecesse do mérito da causa e se absolvesse o réu da instância, o que, em termos práticos, implicava que a apreciação da questão de fundo ficasse prejudicada pela verificação daquela exceção, pelo que, de todo em todo, não existe a pretendida omissão de pronúncia, pois, segundo essa conceituação, verifica-se uma exceção dilatória, de conhecimento oficioso e a qual obsta ao conhecimento do objeto do processo. (…)» (sublinhado nosso).

XLVIII. Relembremos que por ofício de 23/12/2008, o Recorrido foi notificado do Relatório Final e do apuramento de contribuições. Posteriormente, em 06/02/2009, o Recorrido deduziu recurso hierárquico contra o despacho de 23/12/2008. Através de ofício de 21/08/2009, o Recorrido foi notificado da deliberação n.º 73/2009 do Conselho Diretivo da Segurança Social, I.P. que negou proveniente ao recurso, ato este que foi impugnado em Novembro de 2009 (segundo carimbo de entrada aposto na petição inicial) (cfr. ponto BB), CC), DD) e EE) dos factos dados como provados na Sentença).

XLIX. O recurso hierárquico constitui um meio de impugnação de um ato administrativo, que tenha sido praticado por um órgão subalterno, perante o respetivo superior hierárquico, a fim de obter deste a sua revogação, modificação ou a substituição por outro e, sendo necessário ou facultativo consoante aquele ato seja ou não suscetível de impugnação contenciosa.

L. No caso em apreço, está-se perante um recurso hierárquico de um ato em matéria tributária cujo regime legal é regulado pelo CPPT.

LI. Ora, já advinha do Código de Processo Tributário que os recursos hierárquicos tinham natureza meramente facultativa, mormente veja-se o artigo 92.º, n.º 1 do CPT, que dispunha que “os recursos hierárquicos, salvo disposição em contrário das leis tributárias, têm natureza facultativa e efeito meramente devolutivo.”.

LII. Neste seguimento, o n.º 1 do artigo 67.º do CPPT, continuou a dispor: «Os recursos hierárquicos, salvo disposição em contrário das leis tributárias, têm natureza meramente facultativa e efeito devolutivo.», sendo claro que o recurso hierárquico previsto no n.º 1 do artigo 67.º do CPPT reveste natureza facultativa, a não ser que estivesse previsto um recurso hierárquico necessário. Estando em causa um ato de liquidação oficiosa, não há exigência alguma de recurso hierárquico.

LIII. No caso sub judice, deveria ter ocorrido recurso contencioso do ato do subalterno pois o recurso hierárquico interposto para o superior hierárquico é meramente facultativo.

LIV. Com efeito, esta tem sido a orientação jurisprudencial, como se pode verificar, pelo Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo do Processo n.º 022066 de 21-04-1999 do relator Brandão de Pinho, que dispôs que: «I - Dada a natureza facultativa e efeito meramente devolutivo do recurso hierárquico previsto no artigo 92.º n.º 1 do C.P.T., os atos em matéria tributária praticados pelo subalterno são, desde logo, contenciosamente recorríveis, por emanados no exercício de uma competência própria reservada.

II - Aquele efeito devolutivo, por contra-posição ao efeito suspensivo, não tem o sentido de devolução inteira, ao superior hierárquico, da competência decisória do subalterno, significando, antes, que o recurso hierárquico não suspende os efeitos do ato recorrido, isto é, a decisão do subalterno é, desde logo, executória ou exequível. (…).» (sublinhado nosso).

LV. O Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo do Processo n.º 0193/05 de data de 25-05- 2005 do relator Lúcio Barbosa, que «I – No domínio do CPT, e salvo disposição expressa em contrário das leis tributárias, o recurso hierárquico é facultativo – art. 92.º do CPT.

II – No caso de recurso hierárquico facultativo, o interessado não tem que esgotar a via graciosa como condição de interpor um recurso contencioso.

III – Assim, interposto, para o Director Geral das Contribuições e Impostos, recurso hierárquico (facultativo) de uma decisão do Director Distrital de Finanças, o interessado pode simultaneamente interpor recurso contencioso de tal decisão desfavorável.»

(sublinhado nosso).

LVI. Deste modo, o Recorrido deveria ter impugnado contenciosamente o ato notificado por ofício de 23/12/2008, e não o indeferimento do recurso hierárquico facultativo interposto, pelo Recorrido. Conclui-se, deste modo, que o indeferimento objeto dos presentes autos não é recorrível pelo que devia ter sido rejeitado, dada a ilegalidade da sua interposição.

LVII. Sempre que a lei assegure de imediato, meio judicial de recurso contencioso da decisão, e em que o recurso hierárquico seja assim, meramente facultativo, não existem as razões justificativas para não recorrer aos meios judiciais. Neste sentido, vide o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 25-05-2005, recurso n.º 193/05-30.

LVIII. No entanto, caso os Venerandos Juízes Desembargadores tenham a convicção que o recurso hierárquico in casu era obrigatório, antes do recurso aos meios contenciosos, sempre se diga, que continua a verificar-se a caducidade do direito de ação, por causa da formação do ato de indeferimento tácito, e tendo o prazo da impugnação contenciosa precludido, antes da impugnação judicial do Recorrido.

LIX. Ora, já dispunha o n.º 5 do artigo 66.º do CPPT à data dos factos, que «Os recursos hierárquicos serão decididos no prazo máximo de 60 dias.», e, se o recurso não for decidido nesse prazo, forma-se a presunção de indeferimento tácito findo esse prazo, podendo o interessado impugnar tal indeferimento no prazo referido na alínea d) do n.º 1 do artigo 102.º do CPPT, que dispõe que: «A impugnação será apresentada no prazo de 90 dias contados a partir dos factos seguintes: (…) d) Formação da presunção de indeferimento tácito; (…)».

LX. Neste sentido, veja-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul do Processo n.º 333/08.8BEALM de data de 27-01-2022 da relatora Tânia Meireles da Cunha, que assinalou que: «I. Para efeitos de cômputo do prazo para formação de indeferimento tácito de recurso hierárquico apresentado, o prazo aplicável é o de 60 dias, previsto no n.º 5 do art.º 66.º do CPPT, contado nos termos do art.º 279.º do Código Civil.

II. O indeferimento, expresso ou tácito, de recurso hierárquico, que teve por objeto o indeferimento, total ou parcial, de reclamação graciosa, é um ato autonomamente impugnável.» (sublinhado nosso).

LXI. Tendo em conta que em 06/02/2009, o Recorrido deduziu recurso hierárquico contra o despacho de 23/12/2008. Ora, o ato de indeferimento tácito surgiu, começando a contar-se o prazo de 90 dias para impugnação do mesmo. E, era este que deveria ter sido impugnado.

LXII. O Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo do Processo n.º 01954/13 de data de 19-06- 2014 da relatora Fernanda Maçãs, em matéria administrativa, firmou o seguinte: «I - Terminado o prazo de decisão da impugnação administrativa facultativa e constituída a situação de inércia, o acto primário objeto daquela impugnação converte-se em ato final do procedimento, iniciando-se o decurso do prazo para a utilização do meio contencioso, tendo em conta a redação dada ao n.º 3 do art. 175.º do CPA, sob pena de caducidade do direito de ação, nos termos do regime dos arts. 171.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, e 175.º, n.º 3, do CPA, conjugado com os arts. 58.º, nº 2, alínea b), e n.º 4 do art.º 59.º do CPTA. (…).» (sublinhado nosso).

Da fase de instrução e da alegada violação do princípio do inquisitório e défice instrutório no apuramento das contribuições

LXIII. Com todo o devido respeito, mal andou o Tribunal a quo ao decidir que se verificava um défice instrutório no apuramento das contribuições em dívida à Segurança Social, nomeadamente decidindo: «O défice instrutório é de tal modo patente, em violação do disposto nos artigos 58.º da LGT e 6.º do RCPIT, que não se mostram minimamente externados no relatório os fundamentos de facto que conduziram aos mapas de apuramento oficioso de remunerações, no montante total de € 5.961.687,61, violando, também o n.º 1 do artigo 62.º do RCPIT.» (pág. 28 da Sentença).

LXIV. O processo administrativo comporta várias fases concatenadas, sendo que a que está aqui em causa trata-se da fase de instrução, que se destina a averiguar os factos que interessem à decisão final, sendo uma fase de produção de prova regida pelo princípio do inquisitório. Na fase de instrução, a administração pública, não está dependente da vontade dos interessados, podendo requer factos e esclarecimentos que mais facilmente levem à tomada da melhor decisão – artigo 58.º CPA. Nesta fase ocorre uma delimitação dos factos relevantes e, do próprio Direito aplicável à tomada da decisão final.

LXV. O regime procedimental da inspeção tributária é regido pelo Decreto-Lei n.º 413/98 – Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (doravante RCPIT). E, estabelece o artigo 62.º do RCPIT que:

«1 - Para conclusão do procedimento é elaborado um relatório final com vista à identificação e sistematização dos factos detetados e sua qualificação jurídico-tributária.

(…)

3 - O relatório deve conter, tendo em atenção a dimensão e complexidade da entidade inspeccionada, os seguintes elementos: a) Identificação da entidade inspeccionada, designadamente denominação social, número de identificação fiscal, local da sede e serviço local a que pertence;

b) Menção das alterações a efectuar aos dados constantes dos ficheiros da administração tributária;

c) Data do início e do fim dos actos de inspecção e das interrupções ou suspensões verificadas;

d) Âmbito e extensão do procedimento;

e) Descrição dos motivos que deram origem ao procedimento, com a indicação do número da ordem de serviço ou do despacho que o motivou;

f) Informações complementares, incluindo os principais devedores dos sujeitos passivos e dos responsáveis solidários ou subsidiários pelos tributos em falta;

g) Descrição dos factos susceptíveis de fundamentar qualquer tipo de responsabilidade solidária ou subsidiária;

h) Acréscimos patrimoniais injustificados ou despesas desproporcionadas efectuadas pelo sujeito passivo ou obrigado tributário no período a que se reporta a inspecção;

i) Descrição dos factos fiscalmente relevantes que alterem os valores declarados ou a declarar sujeitos a tributação, com menção e junção dos meios de prova e fundamentação legal de suporte das correcções efectuadas;

j) Indicação das infracções verificadas, dos autos de notícia levantados e dos documentos de correcção emitidos;

l) Descrição sucinta dos resultados dos actos de inspecção e propostas formuladas;

m) Identificação dos funcionários que o subscreveram, com menção do nome, categoria e número profissional;

n) Outros elementos relevantes. (…)».

LXVI. Como refere Joaquim Freitas da Rocha e João Damião Caldeira, em Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT) Anotado e Comentado, pág. 196 e 197, em anotação ao artigo 62.º do RCPIT, que sobre o Relatório Final: «Do ponto de vista substancial, deve conter as mais significativas incidências do procedimento inspectivo concluído, designadamente a identificação e sistematização dos factos detectados e sua qualificação jurídico-tributária e, mais especificamente a menção das alterações a efectuar aos dados constantes dos ficheiros da administração tributária, as data do início e do fim dos actos de inspecção e das interrupções ou suspensões verificadas, a descrição dos motivos que deram origem ao procedimento, a descrição dos factos fiscalmente relevantes que alterem os valores declarados ou a declarar sujeitos a tributação e a indicação das infracções verificadas e dos autos de notícia levantados. (…)».

LXVII. O Relatório Final elaborado pelo Recorrente descreve, identifica e sistematiza os factos detetados e sua qualificação jurídico-tributária. Por exemplo, no caso das rubricas dos montantes de “ajudas de custo”, a sua qualificação como complementos remuneratórios foi concluída com base em vários trabalhadores terem recebidos, conforme análise dos processamentos salariais, montantes a título de “ajudas de custo”, e simultaneamente “subsídio de alimentação”, “subsídio de deslocação”, “subsídio de transporte”.

LXVIII. Dispõe a anotação à al. i) do n.º 3 do artigo 62.º do RCPIT que: «As alíneas h) e i) constituem aquela que deverá ser a fundamentação das correcções que servirão de fundamento ao acto de liquidação, com destaque para os factos fiscalmente relevantes que alterem os valores declarados pelo contribuinte ou por este deveriam ter sido declarados e sujeitos a tributação, factos esses que deverão ser suportados de facto e de direito, ou seja, através dos meios de prova apurados no decurso da prática dos actos de inspecção e da fundamentação jurídica.» in Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT) Anotado e Comentado, pág. 198, de Joaquim Freitas da Rocha e João Damião Caldeira.

LXIX. O Recorrente analisou a contabilidade do Recorrido, mormente os processamentos salariais dos quais os montantes a título de várias rubricas podem ser subsumíveis à qualificação jurídica de remuneração.

LXX. Ao longo do Relatório Final, foi havendo a descrição dos factos em face da análise da prova recolhida e a sua subsunção ao direito. Elucida-se com o caso das rubricas das “indemnizações por férias não gozadas”, em que aquelas eram pagas a certos trabalhadores coincidentemente com o pagamento de “subsídios de férias” recebidos em duodécimos, ora, tendo o trabalhador já recebido o subsídio de férias, os outros montantes auferidos pelos trabalhadores a título de “indemnizações por férias não gozadas”, só podem ser considerados complementos remuneratórios. Ou, ainda, explane-se que no caso das rubricas de “ajudas de custo” muitas vezes eram pagos em simultâneo com “subsídio de alimentação” e “subsídio de deslocação”, verificando-se duplicação de valores.

LXXI. O princípio do inquisitório, a que se reporta o artigo 58.º do CPA, foi observado pela Recorrente, desde logo, porque quanto a factos sujeitos a prova (cfr. artigo 115.º do CPA) os responsáveis pelo procedimento averiguaram todos os factos que se mostravam necessários e adequados à prolação de uma decisão célere, justa e em conformidade com o direito no sentido de ser concluído sem dúvidas nenhumas sobre a qualificação das rubricas identificadas como complementos remuneratórios.

LXXII. O Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte do Processo n.º 00687/09.9BEBRG-S1 de data de 15-11-2019 do relator Ricardo de Oliveira e Sousa, que versa sobre o princípio do inquisitório no processo judicial, apresenta uma resolução importante para o caso nos autos:

«(…) II- Assim, e porque o pedido do Recorrente foi formulado já após o terminus da audiência em análise, temos que a admissibilidade das diligências probatórias ali requeridas deverá ser apreciada em função, para além da (i) sua obrigatória mais valia para a descoberta da verdade, da (ii) demonstração da impossibilidade da sua produção em momento anterior (…)». As diligências probatórias deverão ser apreciadas em função das suas mais valias para a descoberta da verdade.

LXXIII. As diligências probatórias que os serviços de inspeção realizaram eram aquelas que se afiguravam como relevantes para a correta averiguação da realidade factual. Atente-se que no domínio do procedimental, impõe-se à Administração Tributária que deva «ela própria tomar a iniciativa de realizar as diligências que se afigurem como relevantes para a correta averiguação da realidade factual em que deve assentar a sua decisão» in LGT – Anotada e Comentada – Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues, Jorge Lopes de Sousa – anotação ao artigo 58.º, anotação 2.

LXXIV. Quanto às diligências a realizar, deve-se «(…) nomeadamente, ter em atenção que não poderá significar a obrigatoriedade de realizar todas as diligências que sejam requeridas ou mais tarde reclamadas, nem a admissibilidade absoluta e inquestionável de todos os meios probatórios, mas apenas a vinculação da Administração a realizar as diligências tendentes a alcançar o apuramento da realidade e da verdade dos factos, admitindo e valorando as provas com as quais os interessados podiam razoavelmente confiar como provas atendíveis, para em seguida decidir sobre essa base», cfr. Joaquim Freitas da Rocha, Lições de Procedimento e Processo Tributário, pág. 104.

LXXV. A admissão de qualquer meio de prova haverá de ter em conta a utilidade e a necessidade desse meio de prova para a descoberta da verdade material.

LXXVI. O Tribunal a quo não fundamentou qual a necessidade e utilidade de outros meios de prova.

LXXVII. Segundo Paulo Marques in «Elogio do Imposto» – pág. 95, a aferição passará por determinar se os factos levados ao procedimento tributário são “pertinentes e relevantes”, mais definindo os primeiros como aqueles que «diz[em] respeito à matéria em causa» e os segundos como aqueles «capaz[es] de influir na futura decisão da Administração Tributária».

LXXVIII. Elisabete Louro Martins, in «O Ónus de Prova no Direito Fiscal» pág. 79 – Rui Duarte Morais, Manual de Procedimento... pág. 66-67: «antes de valorar a prova produzida, há que aferir – como questão autónoma – da suficiência da investigação feita, se era razoavelmente possível e exigível que a Administração [Tributária], por ser iniciativa ou no seguimento de pedido do interessado, levasse mais longe a actividade investigatória». Ora, não é razoável exigir ao Recorrente, que fosse requerer a informação referente aos trabalhadores, a todas as entidades utilizadoras. A Sentença do Tribunal a quo parece ao Recorrente, exigir-lhe a averiguação de toda a informação que as entidades utilizadoras tivessem sobre os trabalhadores.

LXXIX. Em momento algum, foram requeridas diligências complementares pelo Recorrido, tendo aquele a possibilidade em várias alturas do procedimento inspetivo de consultar o processo administrativo, e, participado na fase da audiência prévia – altura em que podia ter entregue elementos, que infirmassem as conclusões do Projeto Relatório, não o fazendo.

LXXX. Ademais, o ponto 126. e, 127. do Recurso Hierárquico interposto pelo Recorrido contra o ato de liquidação (doc. n.º 4 junto com a petição inicial) refere apenas o seguinte: «(…) se requer a V. Exa. que revogue o mesmo, porque se afigura ilegal, se necessário for, recorrendo a prova complementar face àquela realizada pelos serviços da Entidade Recorrida e no sentido de efectivamente conhecer algumas rubricas (…)», e o ponto 127. do Recurso hierárquico refere que: «A Recorrente manifesta-se desde já, inteiramente disponível para colaborar em tal prova, designadamente testemunhal apenas necessitando que V. Exas. Indiquem, com precisão, quais os casos concretos (trabalhadores) em que entendem ter a Entidade Recorrida fundado a sua convicção sobre a regularidade e obrigatoriedade (…)».

No entanto, nunca requereu o Recorrido que fossem realizadas específicas diligências, nunca requereu que fossem ouvidos quaisquer trabalhadores em concreto, nem indicou nenhum dos seus nomes.

LXXXI. Atente-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães do Processo n.º 14/15.6T8VRL C.G1 de data de 20-03-2018, do relator João Diogo Rodrigues, que ainda que o Acórdão referido seja sobre o principio do inquisitório na instrução do processo judicial, o raciocínio aplica-se ao caso nos presentes autos. Ora, o sobredito Acórdão marcou que: «(…) 3- Neste contexto, a investigação oficiosa não deve ser exercida com a finalidade da parte poder contornar a preclusão processual decorrente da sua inércia.» (sublinhado nosso).

LXXXII. Não cabe à Administração Tributária, nem ao Tribunal, incumbido também de um dever de inquirir, como decorre do artigo 99.º, n.º 1 da LGT, sanar a inércia de um sujeito passivo que não colaborou e nem sequer requereu diligências complementares.

LXXXIII. Elisabete Louro Martins, defende, que «(…) o Tribunal não pode sanar a inércia de um dos intervenientes no processo, através da aplicação do princípio do inquisitório (…)», in O Ónus de Prova no Direito Fiscal pág. 105-106.

LXXXIV. O dever de a administração tributária descobrir, por si própria, a verdade factual no âmbito do procedimento tributário, não se sobrepõe ao ónus da prova dos factos que cabem aos contribuintes, nem exclui ou limita o dever de colaboração dos contribuintes para com a administração tributária, dentro do espírito da boa-fé, conforme resulta do artigo 59.º da LGT.

LXXXV. O Recorrente agiu neste procedimento inspetivo sempre com base na prossecução do interesse público e tendo sempre em consideração os direitos e interesses legítimos dos cidadãos, e, atuou com vista à defesa das carreiras contributivas dos trabalhadores visados, que sairão prejudicados em futuras pensões de reformas, além de prejudicar os trabalhadores em outras pensões de caracter social.

LXXXVI. Não é admissível nem aceitável, que o Recorrente tivesse de analisar os documentos enviados pelas entidades utilizadoras ao Recorrido, nem consegue-se compreender que caso fossem analisados, como inviabilizariam a qualificação jurídica de complementos remuneratórios dos montantes pagos a diversos, porque quem pagava as remunerações era o Recorrido, e, o reflexo do que os trabalhadores recebiam está espelhado no processamento salarial do Recorrido. É irrelevante que se estivesse perante numa relação tripartida (empresa de trabalho temporário, empresa utilizadora e trabalhador), porquanto quem era responsável pelos vencimentos dos trabalhadores, era o Recorrido.

LXXXVII. O Recorrido também não ofereceu qualquer prova, ou mesmo contraprova que permitisse fundamentar qualquer indício de que aqueles valores em causa não seriam remuneratórios.

Das “Ajudas de Custo”

LXXXVIII. O Relatório Final estipula no ponto 5.2.7 que: «No que se refere ao pagamento de ajudas de custo a trabalhadores da estrutura interna da empresa e também aos administradores, verifica-se, que, nos casos por nós considerados, as ajudas de custo são pagas mensalmente, ou na quase totalidade dos meses, têm valor fixo ou aproximado e sobrepõem-se com o pagamento de subsídio de refeição, havendo também na sua maior parte pagamento em simultâneo, de subsídios de deslocação mensal ou subsídio de transporte.».

LXXXIX. Passou a competir ao Recorrido demonstrar que os rendimentos em causa têm carácter compensatório de despesas efetuadas pelos trabalhadores em favor da entidade patronal. Sobre isto, veja-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul do Processo n.º 06910/02 de data de 13-05-2003 do relator Francisco Rothes, que decidiu: «(…) III - Tendo a AT considerado que os montantes auferidos pelo trabalhador da sua entidade patronal a título de ajudas de custo não tinham carácter compensatório com base em factos-índice que, apreciados à luz das regras da experiência comum, permitem tal conclusão, satisfez o dever de investigação que sobre ela impendia em sede de procedimento administrativo-tributário, estando assim legitimada a correção dos rendimentos declarados (nos quais se omitiu tais montantes) e a consequente liquidação adicional de IRS.

IV - Passa então a competir ao contribuinte demonstrar que os rendimentos em causa têm carácter compensatório de despesas por ele efetuadas em favor da sua entidade patronal.

V - «A prova dos factos necessários para concluir sobre a natureza de ajudas de custo de pagamentos efetuados a trabalhadores por conta de outrem pode ser efetuada por qualquer meio admissível em direito, não sendo imprescindível que sejam emitidos boletins itinerários com conteúdo semelhante aos previstos para os funcionários do Estado» (cfr. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Novembro de 2002).

VI - Se a prova produzida nos autos de impugnação judicial não permite pôr em causa a conclusão dita em III, não merece censura a liquidação referida no mesmo número, não sendo caso de aplicação da regra do art. 121.º do CPT.» (sublinhado e negrito nosso).

XC. No ponto 5.2.9. do Relatório Final, estipulou-se que: «Verificaram-se, igualmente, situações de processamento de valores por ajudas de custo todos os meses do ano, incluindo o mês das férias.». E, sobre isto veja-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul do Processo n.º 06910/02 de data de 13-05-2003 do relator Francisco Rothes, transcreve-se que:

«A declaração fundamentadora dessa correção refere, não só um fundamento, mas antes uma conjugação de fundamentos; a saber: (…) - no mesmo exercício, são processadas ajudas de custo e subsídios de deslocação nos meses de férias, subsídios de férias e subsídios de Natal;

- não existem documentos justificativos das ajudas de custo e subsídios de deslocação pagos aos gerentes e trabalhadores, designadamente qualquer documento individual, onde se encontre discriminado diariamente a hora de saída, local da realização do trabalho, hora de chegada e motivo da deslocação. (…)Na verdade, estes factos-índice, apreciados à luz das regras da experiência comum e conjugados uns com os outros, permitem a conclusão, com um grau de certeza que ultrapassa o da mera verosimilhança ou probabilidade, de que os montantes abonados a título de ajudas de custo não se destinam a compensar os trabalhadores de quaisquer despesas efetuadas por estes em favor da sua entidade patronal, sendo antes um complemento da remuneração. Com interesse, veja-se ALBERTO PINHEIRO XAVIER, Conceito e Natureza do Acto Tributário, págs. 151 a 156, sob a epígrafe «verdade material e prova indiciária». A não ser assim, como se justifica o abono de “ajudas de custo” em período de férias e até com os subsídios de férias e de Natal? Assim, a AT cumpriu com o dever de investigação que sobre ela impendia em sede de procedimento administrativo-tributário, estando assim legitimada a correção dos rendimentos declarados (nos quais foram omitidos os referidos montantes) e a consequente liquidação adicional de IRS.

Perante a prova produzida pela AT em sede do procedimento administrativo-tributário, que justifica a sua atuação, passou a competir ao Contribuinte fazer prova de que os montantes que recebeu da sua entidade patronal a título de ajudas de custo se destinavam a compensar despesas por ele efetuadas em favor daquela. (…)» (sublinhado nosso).

XCI. Cabia ao Recorrido juntar documentos justificativos das ajudas de custo e subsídios de deslocação pagos aos gerentes e trabalhadores, designadamente qualquer documento individual, onde se encontre discriminado diariamente a hora de saída, local da realização do trabalho, hora de chegada e motivo da deslocação, recibos para os trabalhadores serem ressarcidos.

XCII. Ainda é de lograr mencionar a conclusão do ponto 7.22 do Relatório Final que versa especificamente sobre os trabalhadores com contrato de trabalho temporário: «De igual modo se constata a existência de vários trabalhadores com processamento de ajudas de custo, sem que às mesmas corresponda uma efetiva deslocação do local de trabalho, uma vez que os trabalhadores com contrato de trabalho temporário, são contratados especificamente para executarem um determinado trabalho e para um local previamente definido (…) pelo que por regra, não haverá deslocação que dê lugar ao pagamento de ajudas de custo.». Sendo indiferente que seja em território nacional ou no estrangeiro, porquanto como trabalhadores com contrato de trabalho temporário, são contratados especificamente para executarem um determinado trabalho no local previamente definido. Estando em causa, uma empresa de trabalho temporário, o local de trabalho será sempre aquele para o qual a utilizadora o “contratou”, quer seja em território nacional, quer território internacional.

XCIII. Sobre o Recorrente recai o ónus, de demonstrar a verificação dos requisitos que lhe permitem alterar a qualificação jurídica dos montantes, sobre os quais deveriam ter incidido contribuições, ou seja, que os montantes recebidos pelo contribuinte da sua entidade patronal a título de “ajudas de custo” não reuniam as características essenciais das ajudas de custo, mas uma vez feita essa demonstração, passará a competir ao contribuinte a demonstração de que esses montantes foram abonados aos trabalhadores para os compensar de despesas por aqueles suportadas ao serviço da entidade patronal e de que, por isso, não constituíam um elemento integrante da respetiva remuneração.

XCIV. O Recorrente logrou demonstrar a verificação dos requisitos que lhe permitissem a alteração do da qualificação jurídica dos montantes pagos a título de “ajudas de custo”, não se podendo supor que o Recorrido possa suportar e pagar rubricas, cumulativamente, a título de ajudas de custo, a título de despesas de transporte, subsídio de deslocação, e a título de subsídio de alimentação do trabalhador, e acrescente-se que as “rubricas” a título de “ajudas de custo” eram pagas com regularidade, e até mensalmente.

XCV. As ajudas de custo só podem ter carácter temporário. Apurou-se que os valores de “ajudas de custo” eram pagos com regularidade e sobre isto veja-se, ainda, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, do Processo n.º 220/14.0TTTVD.L1-4 de data de 15-12- 2016, do relator Alves Duarte, que determinou: «(…) II. Cabe ao empregador o ónus de alegar e provar a natureza compensatória de custos aleatórios dos valores regularmente pagos (art.º 234.º, n.º 2 do CC).» (sublinhado nosso).

Dos “Subsídios de alimentação”

XCVI. Como já ficou referido, aquando dos montantes pagos a títulos de “ajudas de custo”, esses montantes eram pagos sobrepostos com um montante a título de “subsídio de alimentação” – ponto 5.2.7 do Relatório Final. O pagamento de montantes a título de ajudas de custo em simultâneo com o subsídio de alimentação, faz percecionar uma duplicação de valores.

XCVII. Sobre o subsídio de alimentação, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo do Processo n.º 01037/15 de data de 22-03-2018, do relator Fonseca da Paz, que nota o seguinte: «(…) IV - Sendo o montante diário da ajuda de custo processada pela totalidade, nele está incluído o custo das refeições, pelo que, atento à proibição da duplicação de pagamentos com a mesma causa, haverá que deduzir a esse montante o quantitativo pago a título de subsídio de refeição.» (sublinhado nosso).

Dos “Subsídios de transporte” e “Subsídio de deslocação”

XCVIII. O “subsídio de transporte”, tal como a deslocação mensal, constata-se que são pagos mensalmente à generalidade dos trabalhadores. O “subsídio de transporte” é um subsídio atribuído à partida aos trabalhadores no ato de recrutamento, conforme 5.2.11. «O subsídio de transporte é um subsídio atribuído à partida aos trabalhadores no ato de recrutamento, conforme averiguámos. É pago regularmente, com periodicidade mensal, de valores iguais ou similares, revestindo, em alguns dos casos, uma percentagem considerável relativamente ao salário base.».

XCIX. Transcreve-se parte do depoimento da inspetora C. P.:

«22:07 a 22:08 – mandatário da Recorrente – Que tipo de subsídio era este?

22:08 a 22:45 – inspetora C. P. – Portanto o que na altura nos disseram, era que era dado, logo à partida, isso até foi visto por nós na averiguação, que quando era o colaborador requisitado, digamos, mesmo quando era o anúncio na internet já estava lá referido que era pago ao trabalhador ou ao candidato, ao possível candidato uma verba de subsidio de deslocação, subsidio de transporte, pronto, exatamente. E depois vimos

22:46 a 22:47 – mandatário da Recorrente – Na internet?

22:48 a 22:56 – inspetora C. P. – Sim, de recrutamento de pessoas portanto para trabalhar.

22:59 a 23:00 – mandatário da Recorrente – E, eles tinham direito?

23:00 a 23:04 – inspetora C. P. – Que davam essa regalia. Sim. Era referido logo à partida.»

Das “indemnizações por férias não gozadas”

C. Certos trabalhadores receberam uma acumulação de subsídio de férias, pago mensalmente em duodécimos, com um outro montante descrito sob a rubrica “indemnização por férias não gozadas”. Sobre estas “indemnizações por férias não gozadas”, o Relatório Final estipulou que «5.2.3. Aliás, se se tratasse de verdadeiras indemnizações impostas por qualquer entidade que houvesse responsabilizado e respondente pelo seu pagamento, certamente este teria apresentado prova do agora alegado (…)».

CI. O testemunho da Inspetora C. P. foi aquilatador, e, que seguidamente se transcreve:

«28:03 a 28:06 – mandatário da Recorrente – Além dessas verbas, também fala aqui em indemnizações por férias não gozadas.

28:08 a 29:40 – inspetora C. P. – Isso foi uma situação que é assim, não é normal, porque essa indemnização de férias não gozadas tem haver quando um trabalhador é no fundo um pouco impedido de gozar férias pela empresa. Se a empresa não deixa o trabalhador não deixa o trabalhador gozar férias, a empresa tem de lhe pagar uma indemnização porque não o deixou gozar férias, mas o que estava a acontecer não era isso, é que o trabalhador não gozava férias, quer dizer gozava férias, no próprio processamento, estava processado o subsídio de férias e as férias, e depois ainda, tinha a indemnização, e, portanto, ainda questionamos, mas a empresa nunca nos deu nenhuma documentação, sei lá, poderia ter havido um litígio entre o trabalhador e a empresa que tivesse levado aquele pagamento de indemnização, mas não nos foi dito que, não nos foi documentado, digamos, que era essa a situação que estava a ser, que estava em causa, e daí, nós achamos que aquilo que é uma indemnização, mas é sim, um pagamento pelo trabalho, o trabalhador se não estava de férias, estava a trabalhar, e aquela indemnização era para pagar o trabalho e não uma indemnização. Diga, diga.» (negrito nosso).

Da Compensação Pecuniária Global – Compensação por não renovação – Compensação por caducidade

CII. Quanto aos montantes indicados nas rubricas de “Compensação Pecuniária Global” constantes no processamento salarial, a equipa inspetiva procedeu ao apuramento que tais montantes não podiam corresponder: «5.2.4. (…) a verdadeiras cessações de contratos de trabalhos (…) não só pelos valores remuneratórios mensais envolvidos, os quais teriam de ser muito superiores aos considerados, tendo em conta o salário mensal de referência, mas porque em boa parte dos casos verifica-se a continuidade da prestação do trabalho, e até, em relação a alguns dos trabalhadores, o processamento de prémios em meses seguintes aos da alegada cessação do contrato.».

CIII. Ainda se verificou que «7.15. Nos casos em que se verifica o pagamento destes valores, que nem sempre correspondem ao último mês de trabalho, consta cumulativamente o processamento de outros valores, a título de caducidade do contrato, como por exemplo: a compensação por caducidade atribuída mensalmente em duodécimos» (negrito e sublinhado nosso).

Dos “Prémios” e “Gratificações”

CIV. Sobre as rubricas “Prêmios e Gratificações”, o Relatório Final dispôs que: «5.2.18. (…) tendo-nos sido referido que tais pagamentos eram efetuados de acordo com a retribuição paga pela empresa utilizadora a trabalhador de igual categoria, embora em alguns dos casos fossem processados por decisão da administração, não obstante não haver qualquer determinação escrita sobre o assunto que determinasse e justificasse as razões dessa atribuição.».

CV. Conclui, ainda, a equipa inspetiva no Relatório Final que: «5.2.19. Assim, e dado o caracter de regularidade com que são pagos, conforme comprovativos de processamentos de vencimentos anuais e mensais, criam no trabalhador a expectativa legítima do seu recebimento devido ao uso em vigor na empresa e evidenciam o carácter retributivo destas prestações sendo, consequentemente, possíveis de incidência contributiva para a segurança social, independentemente de serem pagos por determinação da empresa utilizadora.».

CVI. O Recorrente defende que os prémios recebidos pelos trabalhadores eram prémios ordinários por causa da sua característica da regularidade. Como já se mencionou nestas alegações, na parte do erro de julgamento de facto, deveria ter sido dado como provado que os prémios eram recebidos com regularidade pelos trabalhadores.

CVII. Nos termos do artigo 258.º do Código do Trabalho (doravante CT), considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho. Assim sendo, a retribuição pode ser definida como a) uma prestação com valor patrimonial, b) paga de forma regular e periódica, c) devida pela entidade patronal aos trabalhadores c) como contrapartida da sua força de trabalho.

CVIII. Constituirão retribuição todas as gratificações que o trabalhador tem legítima e fundada expectativa de receber, quer por a sua atribuição estar prevista no contrato ou nas normas que o regem, quer em virtude da regularidade com que são atribuídas durante um período significativo (Abílio Neto, Contrato de Trabalho. Notas Práticas, 8ª edição, Lisboa).

CIX. O n.º 2 do artigo 258.º CT estipula que a retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie.

CX. Dispõe-se na al. b) e c) do n.º 1 do artigo 260.º do CT que não se consideram retribuição:

b) As gratificações ou prestações extraordinárias concebidas pelo empregador como recompensa ou prémio dos bons resultados obtidos pela empresa;

c) As prestações decorrentes de factos relacionados com o desempenho ou mérito profissionais, bem como a assiduidade do trabalhador, cujo pagamento, nos períodos de referência respetivos, não esteja antecipadamente garantido”.

CXI. Estabelece as alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 260.º CT que:

a) Às gratificações que sejam devidas por força do contrato ou das normas que o regem, ainda que a sua atribuição esteja condicionada aos bons serviços do trabalhador, nem àqueles que, pela sua importância e carácter regular e permanente, devam segundo os usos, considerar-se como elemento integrante da retribuição daquele;

b) Às prestações relacionadas com os resultados obtidos pela empresa quando, quer no respetivo título atributivo quer pela sua atribuição regular e permanente, revistam carácter estável, independentemente da variabilidade do seu montante.”.

CXII. A regularidade das Entidades Empregadoras ao nível da relação jurídica contributiva, aferia-se à data dos factos pelo Decreto-Lei n.º 8-B/2002 de 15-01, (entretanto revogada pela Lei n.º 110/2009 de 16/09, que aprovou o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social).

CXIII. À data dos factos aplicava-se o seguinte diploma: o Decreto-Regulamentar n.º 12/83 de 12/02. Dispunha o artigo 1.º do referido Decreto-Regulamentar n.º 12/83 de 12/02 que: «Os trabalhadores abrangidos pelo regime geral de segurança social e as respetivas entidades patronais concorrerão para as instituições gestoras do regime com as percentagens que se encontrem legalmente estabelecidas sobre as remunerações devidas pagas.».

CXIV. O artigo 2.º do mencionado diploma, dispõe: «Para os efeitos do disposto no artigo anterior, consideram-se remunerações as prestações a que, nos termos do contrato de trabalho, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito pela prestação do trabalho e pela cessação do trabalho, designadamente: (…) d) Os prémios de rendimento, de produtividade, de assiduidade, de cobrança, de condução, de assinatura dos contratos, de economia e de natureza análoga; (…)».

CXV. Os preceitos atinentes à obrigação contributiva, designadamente à entrega e inclusão nas Declarações de Remunerações dos valores pagos mensalmente que constituíam base de incidência contributiva, constavam na redação em vigor à data, dos artigos 13.º a 23.º do Decreto-Lei n.º 8-B/2002 de 15-01.

CXVI. Há a acrescentar que o artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 8-B/2002 de 15-01 que estabelece que

Constituem elementos essenciais da declaração de remunerações, para efeitos de apuramento do montante de contribuições a pagar, o valor da remuneração, os tempos de trabalho que lhe correspondam, a taxa contributiva aplicável e o montante da totalidade das contribuições correspondentes às remunerações declaradas.”.

CXVII. A gratificação será, no entanto, considerada ordinária e, portanto, parte integrante da remuneração do trabalhador sempre que: os usos assim o determinem em função da sua importância e caráter regular e permanente; ou, as prestações relacionadas com os resultados obtidos pela empresa assumam um carácter estável, quer pelo respetivo título atributivo quer pela sua atribuição regular e permanente.

CXVIII. Entende e bem, o Recorrente que os prémios assumem inequívoco carácter regular. A regularidade da atribuição destes prémios e gratificações permite defini-la como prática da empresa, fazendo parte dos usos, repetindo-se com tal estabilidade que os seus beneficiários detêm a legítima expetativa do seu recebimento.

Do ónus da prova do artigo 342.º do Código Civil e do ónus de ilidir da presunção do n.º 3 do artigo 249.º do Código do Trabalho

CXIX. Cabia ao Recorrido ter demonstrado «os factos e as razões de direito que fundamentam o pedido», como se diz na norma contida no n.º 1 do artigo 108.º do CPPT, para obter a almejada anulação do ato de liquidação com base em “vício de violação de lei com fundamento em défice de atividade instrutória” relativos aos valores pagos aos trabalhadores a títulos de diversas “rubricas”, e ainda, devia ter demonstrado, sem margem para dúvidas, que, haveriam outros elementos que obstariam à qualificação jurídica de remuneração das “rubricas” assinaladas no processamento de salários. E, somente assim demonstraria que, de facto, existiriam outros elementos que deveriam ter sido analisados pelo Recorrente.

CXX. Só assim o Recorrido poderia destruir os pressupostos em que assentou o ato de liquidação oficioso, de acordo com a norma geral em matéria de ónus da prova refletida no artigo 342.º do Código Civil, que dispõe que «àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado». Tal princípio encontra expressa guarida na norma do n.º 1 do artigo 74.º da Lei Geral Tributária, que dispõe: «O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.».

CXXI. O Recorrido tem o ónus de demonstrar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito que se arroga a Administração. Não tendo feito tal prova em contrário, nem sequer tendo colocado em dúvida séria e fundada a conclusão tirada pela Administração Fiscal baseada nos indícios colhidos dos processamentos salariais, tem de improceder as alegações do Recorrido.

CXXII. A sentença recorrida, ao entender de forma diferente, enferma de erro na apreciação da prova e em manifesto rota de colisão com a jurisprudência produzida pelos Venerandos TCA Norte e TCA Sul cuja factualidade melhor se adequa à dos presentes autos, não merecendo, por isso, a sua confirmação.

CXXIII. Ora, conforme foi decidido no Acórdão do Processo n.º 437/18.9BECBR do Tribunal Central Administrativo Norte, de data de 11-11-2021, da veneranda relatora Cristina da Nova, que pleiteia o seguinte: «(…) Cremos que, no caso, é à sociedade recorrente que cabe o ónus [arts. 342º, do C. Civil, 100.º, n.º 1 do CPPT e 74.º, nº 1 da LGT] de provar que os montantes por si pagos a título de prémios ou gratificações de balanço não revestem a natureza de retribuição, não consubstanciando rendimentos que proporcionam ao trabalhador um acréscimo de capacidade contributiva e, como tal, suscetíveis de tributação pois que nos termos do n.º 3 do art.º 249.º do Código do Trabalho, existe uma presunção de que toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador constitui retribuição, pelo que, nos termos dos artigos 344.º e 350.º do Código Civil tem a Administração, no caso em questão, uma presunção a seu favor o que determina que não tenha de fazer prova do facto que invoca, sendo, contudo, ilidível esta presunção, que entendemos competir à impugnante, ora recorrente, mas que não logrou fazer com êxito. A recorrente não logrou demonstrar o caráter aleatório ou casual e não regular do pagamento destas quantias pelo que improcede o recurso. (…)» (sublinhado nosso).

CXXIV. Ainda, no mesmo sentido, veja-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, do Processo n.º 648/09.8BEALM de data de 13-05-2021 do relator Vital Lopes, que deliberou:

«1. É à entidade patronal que cabe o ónus (cf. artigos 342.º, do C. Civil, 100, n.º 1 do CPPT e 74.º, n.º 1 da LGT) de provar que os montantes por si pagos a título de Prémios ou ajudas de custo TIR revestem a natureza de ajuda de custo, não consubstanciando rendimentos que proporcionam ao trabalhador um acréscimo de capacidade contributiva e, como tal, suscetíveis de tributação pois que nos termos do n.º 3 do art.º 249.º do Código do Trabalho, existe uma presunção de que toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador constitui retribuição, pelo que, nos termos dos artigos 344.º e 350.º do Código Civil beneficia a Administração Fiscal de uma presunção a seu favor o que determina que não tenha de fazer prova do facto que invoca, sendo, contudo, elidível esta presunção pela entidade patronal pagadora daqueles “prémios TIR”.

2. Nessa tarefa, cabia à entidade patronal (impugnante e recorrente) provar que as quantias abonadas sob aquela designação constituíam ajudas de custas, pela demonstração de que correspondiam a despesas suportadas pelos beneficiários ao serviço e em favor da entidade patronal e que a esta competia reembolsar, não constituindo, assim, um elemento integrante da respetiva remuneração.

3. Não lhe bastava, pois, alegar, como se limitou a fazer, que os referidos prémios constituíam ajudas de custo, até porque a utilização dessa designação não assegura que as importâncias abonadas a título de "ajudas de custo" não integrem o conceito de retribuição para efeitos contributivos.» (sublinhado nosso).

CXXV. Nesta linha, veja-se ainda o Acórdão do Processo n.º 380/13.8BELLE do Tribunal Central Administrativo Sul, de data de 14-01-2021 da excelentíssima colenda Catarina Almeida e Sousa, que decidiu: «(…) III - O artigo 100.º, n.º 1 do CPPT não afasta a aplicação do artigo 74.º da LGT, pelo que não deve ser convocada se, no procedimento e processo, é atribuído o ónus da prova ao contribuinte e ele não o cumpre; neste caso, não podem considerar-se dúvidas fundadas com efeitos invalidantes do ato, determinantes da sua anulação.» (sublinhado nosso).

CXXVI. Constate-se, ainda, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, do Processo n.º 220/14.0TTTVD.L1-4 de data de 15-12-2016, do relator Alves Duarte, que determinou: «I. As ajudas de custo não configuram uma contrapartida do modo específico da execução do trabalho, antes têm como finalidade compensar despesas feitas pelo trabalhador por causa do trabalho; daí que, a não ser na parte em que as exceda, não constituem retribuição (art.os 71.º, n.º 1 da LAT de 2009 e 259.º, n.º 1 e 260.º, n.º 1 do CT 2009).

II. Cabe ao empregador o ónus de alegar e provar a natureza compensatória de custos aleatórios dos valores regularmente pagos (art.º 342.º, n.º 2 do CC).» (sublinhado nosso).

CXXVII. Tanto o artigo 249.º do CT de 2003 e o artigo 258.º do CT de 2009, considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho, compreendendo a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie, presumindo-se, até prova em contrário, constituir retribuição toda e qualquer prestação devida pelo empregador ao trabalhador.

CXXVIII. O Recorrido não logrou ilidir a presunção do n.º 3 do artigo 249.º do CT.

CXXIX. Por conseguinte, relativamente às demais questões sindicadas dependentes do conhecimento da presente questão prejudicial, mantém-se o entendimento já oportunamente perfilhado em sede contestação e alegações finais.

CXXX. Considerando os referidos elementos probatórios constantes do processo instrutor, que atestam que os trabalhadores receberam quantias a título de “ajudas de custo”, “subsídio de alimentação”, “subsídio de transporte”, “subsídio de deslocação”, “indemnizações por férias não gozadas”, “Prémios” e “Gratificações”, e, concluído pela qualificação jurídica desses montantes como complementos remuneratórios, devendo todas as importâncias pagas aos trabalhadores a esses título, integrar a base de incidência contributiva para a segurança social.

CXXXI. Atento o supra exposto, daqui resulta a absoluta regularidade do procedimento administrativo que conduziu à prolação da decisão impugnada, pois, demonstrou-se ter sido recolhida prova suficiente para fundamentar as conclusões extraídas do processo de averiguações. Pelo que, deve o ato impugnado ser considerado absolutamente válido e legal, deve ser mantido “qua tale”.

CXXXII. Atenta a toda a prova produzida, constante do Relatório Final, que aqui se dá por inteiramente reproduzido, conclui-se que houve a omissão de contribuições devidas no montante de €5.961.687,61, conforme mapas de apuramento anexos ao relatório final e que se dão, mais uma vez, como integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, com o douto suprimento de V. Exa., deverá o presente Recurso proceder, e ser declarada a Nulidade da Sentença do Tribunal a quo, como também deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a douta sentença recorrida que anulou o ato impugnado mantendo-se o ato impugnado “qua tale” tudo com as devidas e legais consequências.

Tudo com as devidas e legais consequências, como é de inteira,

Justiça!”.

A Recorrida contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:

A) Vem o presente recurso interposto pela Entidade Impugnada da Sentença proferida no processo n.º 2348/09.0BELSB, que correu termos junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra;

B) A Sentença julgou a impugnação totalmente procedente dado que a Recorrente violou o princípio do inquisitório.

C) É elemento evidenciador de que a Sentença não merece qualquer censura o depoimento da testemunha S. D. P., arrolada pela Recorrente, a instâncias do próprio Tribunal:

“A minha pergunta seguinte é se conseguiram singularizar casos, porque é quer no relatório inicial, final e na decisão do recurso hierárquico não apresentam nenhuns casos concretos que ali se tenham passado, (…) se aconteceu nalguns casos, aconteceu em muitos casos, se os Srs. já em 2007 conseguiam singularizar porque é que isso não passou para o relatório, no relatório também não tem nenhuma singularização?”

“Porque isso está patente nos mapas de apuramento.”

“A Sra. não percebeu a minha pergunta, a minha pergunta é, porque é que os Srs. não singularizaram os casos?”

“Porque eram extensíssimos porque estamos a falar de quatro mil e tais pessoas (…)”

“É assim, não.”

D) Inexistem, pois, dúvidas que a Recorrente se limitou a fazer amostragens e a extrapolar resultados ao invés de analisar individual e circunstanciadamente cada situação concreta, como a Lei impõe.

E) O procedimento de averiguações centrou-se, apenas, na análise de mapas e de documentos contabilísticos, não obstante os pedidos por parte da Recorrida, para realização de diligências de prova adicionais, sempre negadas pela Recorrente;

F) A prova produzida demonstrou que a apreensão da realidade sempre implicaria a análise de documentação de suporte, contratos, instruções de entidades utilizadoras, de forma a compreender a natureza de cada item analisado, os quais nunca foram solicitados, e diligências junto das entidades utilizadoras que nunca foram realizadas;

G) É manifesto o desrespeito pelo princípio do inquisitório e da prossecução do interesse público, pois que os serviços de inspeção da Recorrente:

a) não inquiriram os trabalhadores da Recorrida;

b) não solicitaram e não quiseram analisar os documentos subjacentes aos lançamentos contabilísticos, designadamente os contratos e instruções de pagamento transmitidas pelas entidades utilizadoras;

c) não solicitaram às entidades utilizadoras explicações sobre a relação com os trabalhadores temporários e as instruções de pagamento;

d) não se reuniram sequer com a Recorrida para que pudesse explicar os factos e dar o devido enquadramento, quando esta lhe pediu por duas vezes para o fazerem,

H) No procedimento foi violado o Princípio da Boa-fé, previsto no artigo 6.°-A do CPA e de deficit instrutório, e o dever essencial de fundamentação, pois que nada é apresentado que demonstre um iter cognoscitivo que leve às conclusões retiradas – desde logo porque houve claro deficit instrutório;

I) Não tendo o órgão instrutor averiguado todos os factos necessários à tomada de decisão, é patente a existência de vício de forma, por violação do disposto no artigo 87.º, n.º 1, do CPA;

J) Como o Tribunal a quo decidiu impunha-se que a Recorrente demonstrasse que em todos os casos, estaria correta e que apreciara corretamente quando determinara que existiam valores sujeitos a contribuições, o que resulta não pode ser verdadeiro, seja por uma lógica de experiência comum, seja porque é mencionado no Ato Impugnado e anterior Relatório que haveria dever de contribuições sobre a “generalidade” dos casos, o que implica que saiba que em vários (muitos) casos a sua conclusão e exigência de contribuições esteja errada;

K) No Relatório de Averiguações não são explicitados os fundamentos que determinaram a sua emissão, sendo, apenas, indicado um conjunto global de valores, sem qualquer identificação quanto à sua natureza e origem, impercetíveis para um destinatário normal, e também para a Recorrida;

L) A Recorrente, não discrimina, trabalhador a trabalhador, pagamento a pagamento, como se impunha, a que realidades se refere, pelo contrário limita-se a formulações genéricas que não permitem apreciar criticamente as correções efetuadas pois não são identificadas os concretos trabalhadores, períodos de tributação e pagamentos em causa;

M) A Recorrente usou consecutivamente expressões genéricas em conjugação com a ideia de regularidade na atribuição das verbas aos trabalhadores temporários e internos da Recorrida, mas a mesma matéria de facto demonstrou a ausência de prova nesse sentido em todas as fases procedimentais, cumulada com os testemunhos, no sentido que não existia o imputado carácter de regularidade na atribuição das verbas;

N) Tal tem por efeito que todas as correções promovidas e, consequentemente, todo o Ato Impugnado tenha de cair por vício nos pressupostos de facto, já que a realidade (de facto) que o mesmo descreve, para fins de aplicação de normas, não se verifica, implicando a sua invalidade, como se requer desde já seja declarada;

O) Não existindo fundamentação adequada resultam violados os artigos 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa e 77.º da Lei Geral Tributária);

P) A impugnação da matéria de facto impõe ao Recorrente ónus específicos:

Q) Porém, a Recorrente não discrimina de forma circunstanciada os factos que pretende ver julgados de forma distinta;

R) Desde logo, o que indica como factos a adicionar à matéria de facto não o são, mas meros juízos conclusivos e considerações jurídicas;

S) Factos são acontecimentos da vida real e não termos jurídicos;

T) Mas mais: não estão aqui em causa quaisquer factos, mas apenas os factos relevantes, numa perspetiva processual e do processo em concreto;

U) A páginas 4 e 5 das suas alegações a Recorrente refere que:

“Ora, salvo melhor e douta opinião, dever-se-iam ter fixado como factos provados para a boa decisão da causa, os seguintes:

1)Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “ajudas de custo” com caracter regular;

2)Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “subsídio de alimentação” sobrepondo-se com pagamentos de “ajudas de custo”;

3)Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “subsídio de deslocação” sobrepondo-se com pagamentos de “ajudas de custo”;

4)Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, receberam duplicação de valores, por receberem mensalmente, a título das seguintes rubricas “ajudas de custo”, “subsídio de alimentação” e “subsídio de deslocação”;

5)Dos processamentos salariais é possível concluir que os trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, receberam no mesmo ano civil, verbas pagas a título de “subsídios de férias” e posteriormente “indemnizações por férias não gozadas”, evidenciando que esses montantes não seriam indemnizatórios, pois as férias já tinham sido pagas anteriormente.

6)Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “prémios e gratificações” com regularidade e o seu modo de atribuição não estava previsto em nenhum documento do Recorrido;

7)Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “compensação por cessação” que efetivamente não correspondiam a cessações de contratos de trabalho por os seus montantes serem inferiores;

8)O Recorrido entregou todo o seu processamento salarial dos anos em averiguação à Recorrente;

9)O Recorrido nunca requereu quaisquer diligências complementares;

10)Os mapas de apuramento não precisavam de estar divididos pela dicotomia trabalhadores temporários ou trabalhadores da estrutura interna da empresa;

11)A falta de divisão nos mapas de apuramento entre trabalhadores temporários e trabalhadores da estrutura interna da empresa trata-se apenas de uma questão meramente organizativa dos mapas de apuramento, sendo irrelevante, face ao conhecimento que o Recorrido possui dos seus trabalhadores internos e dos trabalhadores temporários, podendo o mesmo perscrutar os valores aquilatados pelo Recorrente, confrontando-os com a sua informação contabilística”

V) O que vem identificado nos pontos 1); 2); 3); 4); 5); 7); 10); 11), não são factos, são conclusões jurídicas e/ou conceitos jurídicos;

W) Em qualquer um destes pontos não estão em causa factos da vida real mas o que a Recorrente considera ser a solução jurídica da aplicação do direito a factos concretos que não identifica.

X) Para além do referido, nos “factos” (e sempre sem conceder sobre se tratarem de factos, que não tratam) elencados como 1); 2); 3); 4); 5); 6); 7); a Recorrente insiste em fórmulas vagas, imprecisas e, como tal, obscuras;

Y) Se a Recorrente queria adicionar algum facto teria (em sede de inspeção e tendo sido refletido no relatório de conclusões, o que não fez, nem sucedeu) que:

a) identificar o concreto trabalhador;

b) identificar o valor pago;

c) identificar as circunstâncias da vida real cuja verificação implica a incidência de segurança social;

d) identificar o período de tributação.

Z) Fazer alusão a “certos” trabalhadores não é um facto é um boato, um palpite que é irrelevante para a decisão da causa por não ser possível sindicar.

AA) No que respeita aos “factos” 1) a 5) também não se vislumbra como os mesmos podem resultar do depoimento identificado;

BB) Nesses excertos a testemunha limita-se a dizer que todos os elementos pedidos lhe foram entregues (como não poderia deixar de ser porque a Recorrida é pessoa de boa-fé e cumpridora), e que constituem documentos contabilísticos da empresa.

CC) O que não diz é se se verificaram os pressupostos de incidência estavam ou não verificados – que não estavam como a Recorrida demonstrou nos autos embora a apreciação de tal questão tenha ficado prejudicada pela (correta e inatacável) solução jurídica dada a uma outra questão;

DD) Quanto à circunstância de a testemunha C. P. ter dito “sim, verificámos até que havia acumulação, muitas das vezes, portanto era pago, ajudas de custo e simultaneamente subsídio de alimentação, subsídios de deslocação”, a verdade é que tal afirmação em nada contribui para a decisão da causa;

EE) Desde logo porque descontextualizada dado que no depoimento a testemunha confirmou ter promovido a análise por amostragem;

FF) Não obstante, a verdade é que daquele depoimento não resulta o “facto” (não é facto é uma conclusão jurídica, uma alegação), que a Recorrente pretende adir aos factos dados como provados;

GG) E o mesmo sucede por referência ao alegado “facto” indicado em 6), sendo que nada do que é dito, permite concluir que “certos” trabalhadores (quais?) receberam prémios (quando, que valor tinham?);

HH) Quanto ao facto identificado em 9) as testemunhas inquiridas foram perentórias em afirmar o contrário: Como bem referiu a testemunha L. C.:

“(00:07:38) Testemunha: Não, nós quando aliás, quando disse á pouco que tinha havido uma redução do valor de algumas questões que eles reformularam e retiraram do ofício inicial, nós próprios, a Administração, a L. T. pediu reuniões para com eles, com a segurança social, com o Presidente do Conselho Distrital, creio, para demonstrar com prova documental e até testemunhal se quisessem, os elementos de suporte àquilo que estava processado e que tinha sido processado.

(00:08:19) Mandatário da L. T.: ...

(00:08:21) Testemunha: Mas eu acho que essa reunião nunca aconteceu, se aconteceu nós.

(00:08:24) Mandatário da L. T.: ...

(00:08:25) Testemunha: Eu acho que essa reunião nunca aconteceu, eles responderam a dizer que, que tinham recebido, sim senhora, mas foram sempre relegando para momento posterior e depois não, nem houve reunião, nem pediram os documentos.

No mesmo sentido a testemunha O. R. referiu que:

aqui, eu vou dar conhecimento do teor dos documentos, pode ser?

(00:20:36) Mandatário: …

(00:20:38) Juíza: pronto, então como o Sr. Dr. estava aqui a dizer, em 8 de maio de 2009, por fax, o Instituto da Segurança Social notificou a L. T. na pessoa do seu mandatário presente, o Dr. P. M. O assunto do fax é Recurso Hierárquico e diz o seguinte “acusamos a receção da vossa comunicação datada de 5 de maio de 2009, que mereceu a nossa melhor atenção, lamentando o lapso de tempo decorrido por fatores alheios à nossa vontade entre esta resposta e a anterior missiva. Manifestamos a nossa inteira disponibilidade para um melhor e mais eficaz apuramento dos factos que podem contribuir para o esclarecimento da matéria objeto do presente recurso. Encontra-se, neste momento, em análise pelo Presidente do Conselho Directivo deste Instituto a posição sustentada pelo autor do acto decorrido, pelo que entendemos reservar para momento futuro a eventual realização da reunião proposta”.

(00:21:40) Mandatário:

(00:21:43) Juíza: quer já o dois, Sr. Dr.?

(00:21:45) Mandatário:

(00:21:47) Juíza: então, o documento número 2 refere-se a 3 de março de 2009, também dirigido ao Dr. P. M., na qualidade de mandatário da L. T. e também enviado pelo Instituto da Segurança Social e diz “acusamos a receção da vossa comunicação de 17/12/2009” e, portanto, eu presumo que haja aqui algum erro de datas, “que mereceu a nossa melhor atenção. Manifestamos, desde já, a nossa inteira disponibilidade para melhor e mais eficaz apuramento dos factos que podem contribuir para o esclarecimento da matéria objeto do presente recurso. Encontra-se, neste momento, em análise pelo Presidente do Conselho Directivo deste Instituto a posição sustentada pelo autor do acto recorrido, pelo que entendemos realizar para momento futuro a eventual realização da reunião proposta.” Sr. Dr.!

(00:22:38) Mandatário: muito obrigado. … nos dois documentos … fazendo referência à comunicação exigida quando a L. T. se dirigiu à Segurança Social a dizer “bom, nós queremos uma reunião para solicitar … aqui, em ambos os fax, está a Segurança Social a dizer … “bom, reservamos para momento futuro essa reunião, essa análise de elementos”. Alguma vez a chamaram …, mesmo depois da decisão do recurso hierárquico para apresentar os tais elementos …?

(00:23:18) Testemunha: não.

(00:23:20) Mandatário:

(00:23:22) Testemunha: não.

II) De todo o modo, a verdade é que sempre seria irrelevante dado que quem tem o ónus de motivar e fundamentar as correções promovidas é a Recorrente;

JJ) Quanto aos demais “factos” na verdade juízos conclusivos, a verdade é que o depoimento das testemunhas inquiridas infirma a história que a Recorrente pretende reescrever. Nesta matéria, L. A. M. C., diretora jurídica da L. T., S.A. à data dos factos disse:

Nos atos de fiscalização da empresa esteve presente, em alguma reunião com os Srs. inspetores da Segurança Social?”.

Eu creio que acompanhei a administração nalguma reunião, sim, mas não foi no momento da fiscalização inicial”.

Nessas reuniões em que estava presente, a L. T. em algum momento disse à Segurança Social «eu acho que vocês deviam ver outros elementos que são relevantes, nós podemos dar outros elementos para vocês compreenderem o que está aí …»?”.

Sim, claro, n vezes, muitas vezes, muitas vezes. Aliás, tínhamos imensa documentação, tanto quanto sei eles na altura nem pediram, não pediram nada de documentos, eles fizeram uma análise documental daquilo que pediram em termos contabilísticos, que pediram à empresa.”.

“O que é que pediram à empresa?”.

A parte contabilística eu percebo muito pouco, mas acho que pediram balancetes, pediram os extratos das contas, da contabilidade, pediram os extratos das remunerações dos trabalhadores, portanto, a relação dos trabalhadores com as respetivas remunerações.”.

E pediram documentos de suporte?”.

“Nada, não, nada.”.

“Documentos de suporte em relação ao conteúdo dos recibos? Não.”.

E mesmo os recibos, eu não tenho a certeza (…) acho que eles não pediram os recibos.”.

E a testemunha O. R. referiu que:

Essa e qualquer outra. Tudo o que nos foi solicitado nós entregámos. Nunca houve qualquer tipo de restrição na entrega de documentação que nos tinha sido solicitada. Da mesma forma que entregámos toda aquela quantidade, também teríamos entregue outros mapas ou outros documentos de suporte se nos tivessem sido solicitados.”.

(…) em ambos os faxes, está a Segurança Social a dizer: «bom, reservamos para momento futuro essa reunião, essa análise de elementos». Alguma vez a chamaram, mesmo despois da decisão do recurso hierárquico, para apresentar os tais elementos?”.

Não.”.

O que houve foi apenas; na fase inicial fomos questionados, foram algumas perguntas genéricas sobre as rúbricas. Estranhámos todo esse tempo que não nos tivessem sido pedidas as notas de suporte, que eram básicas e elementares para a análise.

KK) Ou seja, quaisquer mapas sem os documentos de suporte não são, por si só, suficientes para demonstrar o pretendido pela Recorrente.

LL) Considera a Recorrente que na Sentença proferida o Tribunal a quo não faz uma especificação dos fundamentos de facto da decisão, o que não é verdade;

MM) Desde logo, é manifesto que o Tribunal a quo especificou e elencou os factos (relevantes) julgados provados;

NN) Como cristalinamente já decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, em Acórdão de 3 de Março de 2021, proferido no processo 3157/17.8T8VFX.L1.S1 só se verifica a nulidade em causa se inexistir completamente a especificação dos factos – o que manifestamente não é o caso;

OO) Vem a Recorrente afirmar, de forma incompreensível, que o acto em causa seria inimpugnável;

PP) Estando em causa uma impugnação judicial, a Lei processual relevante é o Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), assumindo particular relevância o disposto no artigo 76, n.º 2;

QQ) É, pois, evidente, que no processo tributário da decisão de recurso hierárquico é sempre suscetível de impugnação judicial;

RR) A Recorrente insiste na verificação da excepção de caducidade do direito de ação; exceção essa que o Tribunal a quo considerou – bem-, logo no despacho saneador, que não se verifica, decisão esta que não merece qualquer censura sendo tecnicamente perfeita e representando a correta aplicação das normas e princípios jurídicos vigentes;

SS) Desde logo deve ser afirmado que a jurisprudência citada pela Recorrente neste segmento nada tem que ver com o caso vertente;

TT) Nos termos do disposto no artigo 595.º, do CPC, a decisão sobre a exceção em análise, ínsita no despacho saneador, fez caso julgado formal não podendo ser agora objeto do recurso;

UU) De todo o modo, a verdade é que, como se deixou referido, do disposto no artigo 76.º, n.º 2, do CPPT cabe sempre impugnação judicial, sendo a impugnação judicial que lhe sucedeu, tempestiva;

VV) Ademais, como unanimemente tem vindo a ser decidido pela jurisprudência o indeferimento tácito configura uma possibilidade e não uma obrigação de apresentação de impugnação;

WW) Com efeito, se o visado optar por aguardar pela decisão a que tem direito, o prazo de impugnação contar-se-á da notificação da decisão expressa que seja proferida. (Acórdão da Conferência do Tribunal Central Administrativo Sul – Secção do Contencioso Tributário, proferido em 19 de Janeiro de 2011, no processo 3889/10 disponível em https://www.direitoemdia.pt/search/show/725e61a9fc4295ed133e4ab0e59adfca69c60ebfd215e3dd0362bd99fd9849e9).

XX) Por fim, e uma vez que a Recorrente aludiu a diversas questões não apreciadas na Sentença (cujo conhecimento ficou prejudicado pela solução alcançada), a Recorrida, por cautela fá-lo-á também;

YY) Por reporte ao período analisado em sede de fiscalização - Novembro de 2003 a Dezembro de 2006 - resulta do Relatório de averiguações, que deveriam englobar a base de incidência contributiva da Segurança Social os montantes pagos pela Recorrida aos seus trabalhadores a título de:

a) "Indemnização por férias não gozadas";

b) “Compensação pecuniária global";

c) "Ajudas de custo".

ZZ) No que respeita às férias não gozadas, a Recorrente considerou, que se tratam de remunerações, pois constituem o pagamento de trabalho em período de férias – nada mais errado, facto contrariado pelas testemunhas, pois que os valores pagos por referência a férias não gozadas referem-se a compensações (legalmente previstas) por a entidade patronal (as entidades utilizadoras do trabalho temporário) não terem permitido que os trabalhadores gozassem o período de férias;

AAA) Esse pagamento foi esclarecido pelas testemunhas que não se confunde com o subsídio de férias, pago em duodécimos;

BBB) Como salientado nos depoimentos prestados, a Recorrida não pôde fazer prova de cada pagamento porque, pura e simplesmente, a Recorrente não individualizou, por trabalhador, período, e montante, ao que se refere nesta correção;

CCC) Tais indemnizações encontram-se excluídas da base de incidência contributiva para a Segurança Social, ao abrigo do disposto na alínea c), do artigo 3.º, do Decreto-Regulamentar n.º 12/83, de 12 de Fevereiro, onde se prevê expressamente que: "Para efeitos do artigo 1.º não se consideram remunerações: ( ... ) c) as indemnizações pela não concessão de férias".

DDD) Quanto à compensação pecuniária global, essa diz respeito aos pagamentos efetuados no cumprimento dos acordos de cessação de contratos de trabalho, celebrados por mútuo acordo, em fase pré-contenciosa ou contenciosa;

EEE) Tais compensações são indemnizações e encontram-se também excluídas da base de incidência contributiva para a Segurança Social, ao abrigo do disposto na alínea b), do artigo 14.º, do Decreto-Lei n.º 140-D/86, de 14 de Junho, onde se prevê que: "Deixam de ser considerados base de incidência contributiva: (...) b) As quantias pagas aos trabalhadores em cumprimento de acordos de cessação de contrato de trabalho.".

FFF) A Recorrente insurge-se quanto ao facto, de em algumas situações (uma vez mais, não é possível saber quais), os trabalhadores receberem a compensação e alguns meses mais tarde estavam ao serviço da “empresa”, mas falha, a Recorrente, em não perceber que o “voltar” a estar ao serviço da empresa é, na verdade, estar ao serviço de uma outra entidade utilizadora, através de uma nova e distinta relação jurídica;

GGG) Quanto aos pagamentos efetuados a título de ajudas de custo, estas dividem-se em nacionais e internacionais. As primeiras (ajudas de custo nacionais) correspondem aos montantes esporadicamente pagos pela Recorrida aos trabalhadores da sua estrutura interna, sobretudo afetos ao departamento comercial e jurídico, tendo em vista compensar os custos associados à deslocação e estadia temporária de tais trabalhadores, ao serviço da entidade patronal, na fase de abertura das várias delegações da Recorrida designadamente no Porto e no Funchal. As segundas (ajudas de custo externas) estão relacionadas com as deslocações dos seus trabalhadores, em regime de trabalho temporário, para a sede das respetivas UT's, em Espanha;

HHH) Ambas as situações encontram-se devidamente documentadas na contabilidade da Recorrida, através dos mapas de deslocação legalmente exigidos, sendo, em todos os casos, os valores de referência ao cálculo do montante das ajudas de custo pagas inferiores aos limites máximos diários previstos para os servidores do Estado – factos que a Recorrente nunca questionou e, portanto, deverão ser dados como assentes;

III) Da natureza concreta das ajudas de custo pagas pela Recorrida, decorre que as mesmas não integram o conceito de remuneração, porquanto apenas visaram compensar os encargos derivados de uma deslocação pontual a várias localidades fora da área de residência e de trabalho dos trabalhadores em questão;

JJJ) No que se refere às ajudas de custo externas, a Recorrente considerou que os trabalhadores já sabiam que iriam trabalhar em Espanha e, sendo esse o seu local de trabalho, não seriam devidas ajudas de custo, mas tais contratos reportam-se ao local da sede dos Clientes;

KKK) Atenta a atividade prosseguida por esses clientes – construção civil -, os trabalhadores exerciam as suas funções em estaleiros, não na sede, pelo que se impunha a respetiva compensação com as despesas incorridas nas deslocações para os efetivos locais de trabalho, como demonstrado;

LLL) Atentas as regras de distribuição do ónus da prova, é sobre a Recorrente que recaia a obrigação de demonstração dos factos que alega – o que não fez, não obstante, ser evidente o erro em que incorre a Recorrente, impondo-se a conclusão de que as ajudas de custo não podem, porque não representam qualquer acréscimo patrimonial dos beneficiários, ser incluídas no conceito de remuneração e sujeitas a segurança social;

MMM) No que se refere aos subsídios de transporte e de deslocação, é manifesto que a inclusão deste tipo de pagamentos na respetiva base de incidência contributiva é ilegal;

NNN) Tais pagamentos corresponderam ao reembolso de despesas feitas pelos trabalhadores da Recorrida ao serviço e por exigência das respetivas UT's, não se encontrando preenchidos os requisitos tipo que permitem integrar tais valores no conceito de remuneração;

OOO) A Recorrida recompensou os seus trabalhadores por esse tipo de encargos extraordinários imposto pelas UT's, reembolsando as despesas suportadas, sendo que o montante atribuído aos referidos trabalhadores nunca ultrapassou os valores previstos para os servidores do Estado – como também as testemunhas afirmaram e não vem infirmado pela Recorrente -, não estando por isso sujeitos a liquidação de IRS;

PPP) Em face dos factos que caracterizam o caso concreto e do disposto no artigo 260.º, do Código do Trabalho, não se pode considerar haver qualquer acréscimo patrimonial para o trabalhador e não havendo acréscimo patrimonial, inexiste retribuição;

QQQ) Por último, relativamente às importâncias pagas pela Recorrida aos seus trabalhadores a título de "prémios e gratificações", a Recorrente considera que os mesmos deviam integrar a base contributiva por "(...) terem os serviços de fiscalização detectada a regularidade dessas atribuições ao longo dos quatro anos no período em análise, o que, nos termos do artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 12/83, de 12 de Fevereiro, importa a sua consideração como base de incidência contributiva;"

RRR) É falso que tenha existido regularidade no pagamento ou que os trabalhadores tivessem expectativa a receberem os mesmos, e isso fico manifestamente provado em sede de audiência, pois que as testemunhas apresentadas pela Recorrida foram unânimes e claras nesse ponto;

SSS) Por oposição, a testemunha principal da Recorrente assumiu que haviam apenas detetado que havia uma suposta “regularidade” no pagamento de tais verbas;

TTT) Poderão ter existido diversos prémios pagos em cada ano civil, mas a Recorrida tinha ao seu serviço, cerca de, 4.000 trabalhadores por ano, num total de, cerca de, 15.000, pelo que seria normal que mesmo que se apenas uma pequena percentagem desses trabalhadores tiver direito a prémio, ainda assim, serão umas centenas;

UUU) Em primeiro lugar, os prémios de assiduidade, produtividade e produção acima referidos corresponderam, no período em causa, aos pagamentos efetuados pela Recorrida aos seus trabalhadores, em regime de trabalho temporário, por indicação das respetivas entidades UT's, com o objetivo de incentivar a produção e a assiduidade desses trabalhadores, ao serviço daquelas entidades;

VVV) Ou seja, uma vez mais, é importante enfatizar que o pagamento destes prémios aos trabalhadores temporários é determinado pelas respetivas entidades utilizadoras, no âmbito das suas (de cada entidade utilizadora) políticas internas;

WWW) O denominado "Prémio Anual do Ano Anterior" traduziu-se no pagamento de um prémio aos trabalhadores da estrutura interna da Recorrida;

XXX) Que, não sendo sequer inicialmente expectável o seu recebimento, por parte dos seus trabalhadores, a sua atribuição;

YYY) Foi determinada de acordo com os resultados anuais da empresa e o desempenho individual de cada um;

ZZZ) Importa também esclarecer que as gratificações pagas pela Recorrida aos seus trabalhadores, no mesmo período, tiveram o único objetivo de premiar os seus trabalhadores responsáveis pela angariação de novos clientes e novos trabalhadores para determinadas funções, o que, na ótica da Recorrida, foi merecedor de um incentivo pecuniário;

AAAA) Em face das dificuldades sentidas na contratação de trabalhadores para algumas obras (em face da localização geográfica ou duração), a Recorrida procurou que os colaboradores que “convencessem” outros a aceitar o posto de trabalho, seriam recompensados pecuniariamente por isso;

BBBB) A atribuição de prémios era, como é evidente, casuística e dependia de índices de desempenho coletivos e individuais. Não eram regulares, nem existiam expectativas de recebimento. Não eram remuneração;

CCCC) Na verdade a mera leitura dos mapas e elementos contabilísticos, infirma a conclusão da Recorrente de que existia “regularidade”;

DDDD) Nos termos da alínea g), do artigo 2.º, do Decreto-Regulamentar n.º 12/83, de. 12 de Fevereiro, na redação introduzida pelo Decreto-Regulamentar n.º 53/83, de 22 de Junho, apenas devem integrar a base de incidência contributiva da Segurança Social: "Os prémios de rendimento, de produtividade, de assiduidade, de cobrança, de condução, de economia e outros de natureza análoga, que tenham carácter de regularidade.".

EEEE) Porque os prémios e as gratificações pagas pela Recorrida aos seus trabalhadores, sempre por indicação das UT's sublinhe-se, em nenhum caso revestiram o carácter de regularidade (como bem explicado pelas testemunhas que prestaram depoimento), não poderão tais valores integrar a base de incidência contributiva para a Segurança Social. Deve, pois, também esta correção ser anulada em conformidade.

FFFF) Em face do hiato temporal que medeia entre a data da verificação de cada um dos, supostos, factos tributários e a presente data, a dívida já se encontra prescrita;

GGGG) Ao longo do tempo sucederam-se diversas leis que, com referência às dívidas por contribuições e quotizações à Segurança Social, determinaram diversos prazos relevantes e, bem assim, diversos critérios de contagem desses mesmos prazos;

HHHH) De acordo com o previsto no n.º 1 do artigo 298.º do Código Civil, “estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição”;

IIII) A existência do instituto jurídico da prescrição prende-se com razões de certeza e de segurança jurídicas, uma vez que não seria concebível a hipótese de a exigibilidade coerciva de dívida se protelar indefinidamente;

JJJJ) A prescrição extingue o direito do credor tributário de poder exigir o cumprimento da obrigação tributária (o tributo) constituída com a ocorrência dos factos tributários;

KKKK) No caso concreto, o prazo de prescrição aplicável será o de 5 anos, previsto no n.º 1 do artigo 49.º, da Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro;

LLLL) Respeitando as, supostas e alegadas, conclusões do procedimento de averiguações ao período compreendido entre Janeiro de 2003 e Dezembro de 2006, a prescrição ter-se-ia por verificada nos meses de Janeiro de 2008 a Dezembro de 2011;

MMMM) A Recorrida foi objeto de um procedimento de averiguações que culminou com o relatório de conclusões, notificado em 24 de Dezembro de 2008, com o que, por referência às correções relativas aos períodos de Janeiro a Novembro de 2003, já se tinha consumado o prazo de prescrição;

NNNN) Nos termos do disposto no artigo 49.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária: “Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar”, pelo que o Relatório de Averiguações sempre seria o único facto com relevância interruptiva da contagem do prazo de prescrição;

OOOO) O efeito interruptivo, nos termos do disposto no artigo 326.º, n.º 1, do Código Civil, tem por efeito inutilizar para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo com o que reiniciar-se-ia a contagem do prazo de prescrição em 25 de Dezembro de 2008, para todos os períodos ainda não cobertos pela prescrição – Dezembro de 2003 a Dezembro de 2006 – pelo que se consumou em 25 de Dezembro de 2013;

PPPP) Por efeito do decurso do tempo e do seu efeito nas relações jurídicas, a suposta dívida perdeu a sua característica de cobrabilidade coerciva, não sendo pois, exigível por prescrição.

Nestes termos,

Deve o presente Recurso ser julgado improcedente e mantida a Sentença proferida nos seus exatos termos, sendo a Recorrente condenada em custas, procuradoria condigna e o mais que for de lei,

Assim se fazendo a costumada

Justiça!”.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do art.º 288.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais (art.º 289.º, n.º 2, do CPPT), vem o processo à conferência.

São as seguintes as questões a decidir:

Quanto ao despacho de convolação:

a) Na perspetiva da Impugnante: há erro de julgamento, na medida em que o meio próprio é a então designada ação administrativa especial?

b) Na perspetiva do ISS: há erro de julgamento, por caducidade do direito de ação?

Quanto à sentença

c) Há erro na decisão proferida sobre a matéria de facto?

d) Há nulidade da sentença, por falta de fundamentação?

e) O ato é inimpugnável?

f) Verifica-se caducidade do direito de ação?

g) Há erro de julgamento, por errada interpretação dos factos e da subsunção ao direito aplicável, na medida em que não houve qualquer défice instrutório nem foi preterido o princípio do inquisitório e na medida em que é de atentar à presunção prevista no então art.º 249.º, n.º 3, do Código do Trabalho?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

A) A impugnante é uma empresa de trabalho temporário, cuja atividade consiste na cedência de mão-de-obra cujas empresas utilizadoras operam, essencialmente, na área da construção civil – facto não controvertido.

B) No período em análise (2003-2006), a ora impugnante tinha cerca de 4000 trabalhadores em regime de trabalho temporário, para efeitos de cedência de mão de obra, e cerca de 80 trabalhadores afetos ao funcionamento interno da sociedade – facto não controvertido e cf. depoimentos das testemunhas O. R., L. C. e C. S. D. P..

C) Em 19.03.2007 deu entrada no Gabinete do Ministro do Ministério do Trabalho e da Segurança Social, uma denúncia anónima, posteriormente remetida aos serviços de fiscalização da Segurança Social, referindo irregularidades na empresa L. T. – E. T. T., SA, invocando “fugas ao fisco e à segurança social”, anexando dez recibos de remunerações, sem a identificação dos trabalhadores em causa – cf. fls. 4 a 14 do Processo Administrativo apenso (PA), Pasta 1.

D) Na sequência da denúncia referida na alínea que antecede foi desencadeado pelo Serviço de Fiscalização de Lisboa e Vale do Tejo do ISS, IP, à ora impugnante, o processo de averiguações (PROAVE) n.º 200701193162, com abertura a 03.10.2007 – cf. fls. iniciais, não numeradas do PA apenso, Pasta 1.

E) A 17.10.2007 os Serviço de Fiscalização do ISS visitaram as instalações da ora impugnante – facto não controvertido e cf. fls. 94 e 98 do PA, Pasta 1.

F) A 23.10.2007 a ora impugnante foi notificada, no âmbito da ação inspetiva referida em D), para apresentação da seguinte documentação: mapas resumo de vencimentos mensais com todos os abonos e desconto do pessoal ao serviço nos anos de 2003, 2004, 2005, 2006 (com exceção de fevereiro), e 2007 até à data da notificação; balancete analítico em 31 de dezembro de 2003, 2004, 2005 e 2006 e balancete analítico em julho de 2007 – cf. fls. 92 e 93 do PA, Pasta 1.

G) Por carta datada de 23.10.2007, e na sequência da visita referida em E), a ora impugnante solicitou aos Serviço de Fiscalização do ISS a realização de uma reunião “com carácter de urgência, […] para serem analisados alguns aspectos respeitantes a esta notificação”, mais referindo que desde 18.10.2007 solicitavam a realização da mesma, sem resposta – cf. fls. 94 do PA, Pasta 1.

H) Por fax de 20.10.2007, a ora impugnante solicitou prorrogação de prazo para entrega da documentação a que se refere a notificação mencionada em F), a qual foi concedida, até ao dia 31.10.2007 – cf. fls. 95 a 98 do PA, Pasta 1.

I) A 31.10.2007 as inspetoras do Serviço de Fiscalização do ISS deslocaram-se à empresa para recolha da documentação referida no ofício de 23.10.2007 – cf. fls. 106 do PA apenso, Pasta 1.

J) A 03.12.2007 teve lugar uma reunião, nos Serviços de Fiscalização da Segurança Social, com a presença da diretora dos recursos humanos da impugnante, O. S., e com o administrador C. S., com vista ao esclarecimento de dúvidas suscitadas pelo serviço de inspeção sobre o processamento de remunerações, numa altura em que havia sido efetuada a análise “de seis meses, de Janeiro a Junho de 2006”, tendo sido os representantes da ora impugnante questionados sobre as rubricas de “subsídio eventual para despesas médicas” e “subsídio de transporte e de deslocação” – cf. fls. 118, 119 do PA, Pasta 1, e depoimento da testemunha C. S. D. P.

K) Na reunião referida na alínea que antecede a impugnante tomou conhecimento da extensão das correções até então apuradas pelo Serviço de Fiscalização da Segurança Social – cf. fls. 118, 119 do PA, Pasta 1, e depoimento da testemunha C. S. D. P.

L) Na mesma reunião foi solicitado aos Administradores da impugnante o envio do processamento anual dos vencimentos, por trabalhador, em suporte informático – cf. fls. 118, 119 do PA, Pasta 1, e depoimento da testemunha C. S. D. P.

M) A 12.12.2007 as inspetoras os serviços de fiscalização do ISS, IP., descolocaram-se novamente à sede da ora impugnante, onde se reuniram com diretora dos recursos humanos da impugnante, O. S., e com o responsável da área financeira, N. G., no âmbito da qual, além do mais, aquela informou da inexistência de um “regulamento” sobre o processamento de subsídios, e que cada situação era analisada caso a caso, tendo ainda sido facultados os ficheiros informáticos relativos ao processamento dos vencimentos – cf. fls. 120 do PA, Pasta 1, e depoimento da testemunha O. R. e C. S. D. P.

N) Todos os elementos e documentação que foram solicitados à ora impugnante pelos serviços de fiscalização do ISS, IP., foram sempre facultados – cf. depoimento da testemunha C. S. D. P.

O) Constam do PA, como documentos de instrução, a fls. 28 a 50, três contratos de utilização de trabalho temporários, celebrados em 02.01.2006, 28.03.2005 e 06.06.2005, entre a ora impugnante e, respetivamente, as sociedades “L. E. e C., SA”, “B., S. C., SA” e “F. A., SA” e três contrato de trabalho temporário, entre a ora impugnante e os trabalhadores aí mencionados, datados de 05.01.2006, 18.07.2005 e 25.07.2005 – cf. fls. 28 a 50 do PA, Pasta 1.

P) No âmbito do PROAVE n.º 200701193162, os serviços de fiscalização elaboraram os mapas de vencimentos por amostragem, constantes de fls. 273 a 379 do PA, em relação aos períodos em análise, os quais aqui se dão por reproduzidos – cf. fls. 273 a 379 do PA, Pasta 1, e depoimento da testemunha C. S. D. P.

Q) Os mapas a que se refere a alínea que antecede não discriminam entre trabalhadores temporários ou trabalhadores da estrutura interna da ora impugnante – cf. fls. 273 a 379 do PA, Pasta 1.

R) No âmbito do PROAVE n.º 200701193162, os serviços de fiscalização elaboraram os mapas de apuramento constantes de fls. 380 a 895 do PA, em relação aos períodos em análise, os quais aqui se dão por reproduzidos, e cuja síntese de valores é a seguinte:

– cf. fls. 380 a 895 do PA, Pastas 1 e 2.

S) Os mapas de apuramento a que se refere a alínea R), não discriminam entre trabalhadores temporários ou trabalhadores da estrutura interna da ora impugnante e foram elaborados sem que tenham sido analisados os contratos de trabalho dos respetivos trabalhadores e respetivos contratos de utilização de trabalho temporário – cf. fls. 380 a 895 do PA, Pastas 1 e 2.

T) Na elaboração dos mapas a que se refere a alínea R), relativamente às correções relativas a “compensação pecuniária global”, o serviço de fiscalização conclui que os valores pagos a esse título não correspondiam efetivamente à cessação do contrato de trabalho porque foram detetados pagamentos em data posterior à da referida compensação e porque os valores em causa eram inferiores àqueles que os trabalhadores teriam efetivamente direito – cf. ponto 5.2.4. do Relatório junto à p.i. sob Doc. 2 e depoimento da testemunha C. S. D. P.

U) Na elaboração dos mapas a que se refere a alínea R), relativamente às correções relativas a “compensação pecuniária global”, o serviço de fiscalização não verificou os contratos de trabalho vigentes à data do pagamento daquela compensação dos trabalhadores em causa nem se era o mesmo o vigente à data em que foram detetados pagamentos posteriores de remunerações – depoimento da testemunha C. S. D. P.

V) A 31.10.2008 foi superiormente sancionado, pela Diretora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes, D. G., o projeto de Relatório no âmbito do PROAVE n.º 200701193162, no qual se refere, além do mais, o seguinte:

“[…]

4. Recolha e descrição dos elementos documentais

A empresa apresentou a documentação solicitada, nomeadamente:

[…]

Foram ainda facultados pela empresa, conforme solicitado, resumos anuais dos processamentos de vencimentos, em suporte informático, do período em análise.

5. Resultado da acção inspectiva:

A empresa NISS 200….3 L. T. – E. T. T., SA, contabilizou e pagou regularmente e de forma sistemática, pelo menos, ao longo dos anos de 2003 a 2007, à generalidade dos trabalhadores e administradores, e com carácter de regularidade diversos valores além da remuneração base, não os incluindo nas declarações de remunerações entregues na segurança social, no período de 2003 a 2007, nomeadamente:

- Subsídio transporte, subsidio eventual de risco, subsídio eventual de trabalhos penosos, subsídio eventual de residência, subsidio de responsabilidade temporária, subsidio de deslocação mensal e subsidio eventual de deslocação mensal, gratificação eventual de gerência, prémio anual - ano anterior, prémio de assiduidade, prémio de produtividade, gratificação eventual, prémio de produção e compensação pecuniária global.

5.1. Descrição dos Factos:

[…]

Após notificação, a L. T. – E. T. T., SA. apresentou a documentação solicitada, julgada necessária para averiguar a situação contributiva relativamente à totalidade das remunerações pagas aos seus trabalhadores e administração.

Os processamentos de vencimentos incluem valores diversos para além da remuneração base, pagos à generalidade dos trabalhadores, de modo regular e continuado, e que não foram incluídos nas declarações de remunerações entregues na segurança social.

Verificou-se também que constam valores pagos aos administradores além da remuneração base, que não foram declarados à segurança social.

[…]

De igual modo se apurou, que os recibos de remuneração dos diversos trabalhadores correspondiam aos mapas de processamento de vencimentos mensais.

[…]

5.1.3 Análise contabilística:

Procedeu-se à análise da documentação disponibilizada pela empresa, nomeadamente os balancetes analíticos em 31 de Dezembro (cf. fls. 53 a 78 e 156 a 208) e os mapas resumo de processamentos de vencimentos mensais e anuais por trabalhador e administradores, para os anos de 2003, 2004, 2005, 2006 e 2007 (até Julho).

A análise incidiu mais especificamente nos montantes que constam contabilizados nas contas 62 e 64 da contabilidade da empresa.

[…]

Elaborou-se o seguinte mapa resumo das remunerações e contribuições para o referido período tendo por base os mapas de apuramento efectuados por este serviço e em que ao valor das remunerações foi aplicada a taxa que corresponde ao regime geral dos trabalhadores por conta de outrem, de 34,75%, conforme folha anexa aos mapas de apuramento (cf. fl. 896):




[…]

5.3. Apreciação da matéria e da prova produzida:

De toda a matéria colhida ao longo da averiguação, podemos extrair a violação de diversos normativos, por parte do contribuinte L. T. – E. T. T.. SA., ao pagar à quase totalidade dos seus trabalhadores, bem como aos membros da Administração, verbas a título de prémios e subsídios diversos, sem que sobre os mesmos tenha feito incidir o pagamento da respectiva TSU, à Segurança Social […].

[…]

6. Conclusões

[…]

Com base nos elementos em poder deste Serviço preencheram-se mapas de apuramento referentes a essas verbas, que totalizam € 17.161.600,43 de remunerações a que equivalem € 5.963.656,15 de contribuições, para o período de Janeiro de 2003 a Dezembro de 2006. Verbas estas contabilizadas para a taxa do regime dos trabalhadores por conta de outrem, 34.75%.

Os montantes em causa abrangem todos os trabalhadores e membros da Administração identificados nos respectivos mapas de apuramento, elucidativos dos montantes apurados e que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.

[…] – cf. fls. 897 a 917 do PA, Pasta 2.

W) Por ofício de 31.10.2008, a impugnante foi notificada para exercer o direito de audição prévia sobre o projeto de correções a que faz referência a alínea que antecede – cf. fls. 919 a 921 do PA, Pasta 3.

X) Por despacho de 12.11.2008 foi deferida a prorrogação de prazo requerida pela ora impugnante para exercício do direito de audição prévia, até ao dia 28.11.2008 – cf. fls. 925 a 931 do PA, Pasta 3.

Y) Em 28.11.2008 a impugnante exerceu o direito de audição prévia, nos termos constantes de fls. 970 a 1048 do PA (Pasta 3), cujo teor aqui se dá por reproduzido, onde conclui, no essencial, que os serviços de inspeção não cuidaram de desenvolver a atividade necessária ao apuramento da verdade material, limitando-se a retirar conclusões dos mapas contabilísticos (“e mal”) “sem cuidar de indagar sobre o seu significado”; que ocorreu a prescrição das dívidas reportadas ao período entre janeiro e outubro de 2003; que as correções projetadas padecem de “manifestos erros de apuramento”, especificando que não ocorre a invocada regularidade nas prestações excluídas da base de incidência contributiva – cf. fls. 970 a 1048 do PA apenso.

Z) Ato impugnado: Por despacho de 23.12.2008, foi superiormente sancionado o Relatório referente ao PROAVE n.º 200701193162, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, que procedeu à alteração da proposta de correção em relação aos “abonos para falhas” relativos a 2005 e ao “subsídio eventual para despesas médicas”, considerados nos mapas de apuramento para 2006, cujos valores foram subtraídos na sequência do exercício do direito de audição prévia, reduzindo para € 5.961.687,61 o valor em dívida relativo a contribuições e quotizações, com base nas seguintes “Conclusões”:

«[…]

Perante o descrito e apreciado é possível extrair as seguintes conclusões:

a) Quanto à empresa

7.1. A empresa NISS 200….3 L. T. – E. T. T., SA, contabilizou e pagou regularmente e de forma sistemática, pelo menos, ao longo dos anos de 2003 a 2007, à generalidade dos trabalhadores e administradores, e com carácter de regularidade diversos valores além dá remuneração base, não os incluindo nas declarações de remunerações entregues na segurança social, no período-de 2003 a 2007, nomeadamente:

- Subsídio transporte, subsídio eventual de risco, subsídio eventual de trabalhos penosos, subsídio eventual de residência, subsidio de responsabilidade temporária, subsidio de deslocação mensal e subsidio eventual de deslocação mensal, gratificação eventual de gerência, prémio anual - ano anterior, prémio de assiduidade, prémio de produtividade, gratificação eventual, prémio de produção e compensação pecuniária global.

[…]

7.4. Após notificação, a L. T. – E. T. T., SA. apresentou a documentação solicitada, julgada necessária para averiguar a situação contributiva relativamente à totalidade das remunerações pagas aos seus trabalhadores e administração

7.5. Os processamentos de vencimentos incluem valores diversos para além da remuneração base, pagos à generalidade dos trabalhadores, de modo regular e continuado, e que não foram incluídos nas declarações de remunerações entregues na segurança social

7.6. Verificou-se que os recibos de remuneração dos diversos trabalhadores e administradores correspondem aos mapas de processamento de vencimentos mensais.

b) Quanto aos Administradores:

7.7. Da análise documental apresentada constatou-se que foram pagos valores aos administradores além da remuneração base, que não foram declarados à segurança social.

7.7.1. No que se refere às remunerações pagas aos Administradores da empresa, M. F. S., M. B. R. S., C. A. R. S. e O. C. R. S., verificou-se que além da remuneração base, são igualmente processados outros valores de modo regular e continuado e que são designados por: Subsídio de Transporte, Subsídio de Alimentação - valor fixo, Gratificação da Gerência, Prémio Anual - ano anterior, e Subsídio de Deslocação Mensal, valores estes que não foram incluídos nas declarações de remunerações entregues na segurança social.

7.7.2. Verificou-se ainda, que os valores pagos através dos subsídios atrás citados estão conjugados por forma a que permitiam o recebimento de um valor de remuneração líquida similar em todos os meses e em dobro nos meses referentes ao subsidio de Férias e de Natal, nomeadamente nos anos de 2003, 2004 e 2005.

7.7.3. Constam, igualmente, valores pagos a título de ajudas de custo que se sobrepõem com o subsídio de alimentação, em alguns dos casos (cf. fls. 353 a 371).

7.7.4. Pelo averiguado, constatou-se que, usualmente, a empresa fazia pagamentos regulares continuados das verbas acima designadas. Este procedimento confere-lhes regularidade pelo que os mesmos revestem carácter remuneratório, constituindo base de incidência contributiva para a segurança social.

c) Quanto aos Trabalhadores:

- Subsídio de transporte:

7.8. A empresa L. T. – E. T. T., SA, paga mensalmente à generalidade dos trabalhadores subsídio de transporte, cujo valor não é incluído nas declarações de remunerações entregues na segurança social.

Das averiguações efectuadas resulta que, a empresa, usando a Internet para fazer recrutamento de pessoal, informa publicamente que os trabalhadores recrutados terão direito a um subsídio de transporte.

- Subsídio de deslocação mensal e subsídio eventual de deslocação mensal:

7.9. Verificou-se que é, também, pago mensalmente aos trabalhadores efectivos da empresa, um subsídio de transporte tal como foi confirmado pela Directora dos Recursos Humanos, O. C. R. S.

Pelo averiguado, os referidos subsídios, fazem parte das normas em vigor na empresa e tem periodicidade mensal, donde resulta o carácter retributivo, dos mesmos (cf. fls. 282 a 293).

- Subsídio eventual de risco, subsídio eventual de trabalhos penosos, subsídio de responsabilidade temporária, e subsídio eventual de residência:

7.10. Foi ainda possível constatar que a atribuição destes subsídios está sujeita à prática de trabalhos mais pesados ou de maior grau de dificuldade, sendo que aos trabalhadores que os executam e, durante o período de laboração, é-lhes concedido um “subsídio eventual de trabalhos penosos”;

Aos trabalhadores expostos a trabalho com percentagem de riscos acima da normalidade é-lhes atribuído “subsídio eventual de risco”;

Aos trabalhadores que têm a seu cargo a condução de veículos, temporariamente, ou a responsabilidade pelas ferramentas recebem “subsídio de responsabilidade temporária”.

7.11. Todos estes subsídios são pagos sem que haja determinações escritas para a sua atribuição, dependendo das empresas utilizadoras, ou de decisões da gerência da “L.”, vistas caso a caso, consoante as condições especiais que revestem a prestação do trabalho, de acordo com a explicação dada pela Administradora e Directora dos Recursos Humanos, O. C. R. S.

7.12. Dado o seu carácter regular, são também passíveis de contribuições para a segurança social.

- Prémio de assiduidade, prémio de produtividade, gratificação eventual, prémio de produção, gratificação eventual de gerência, prémio anual - ano anterior.

7.13. No período em análise verificou-se ainda o processamento de verbas assim designadas, à generalidade dos trabalhadores que, segundo nos foi referido, eram atribuídos de acordo com a retribuição paga pela empresa utilizadora a trabalhador de igual categoria, enquanto que em alguns dos casos eram processados por decisão da administração, não havendo qualquer orientação escrita sobre o assunto.

7.14. Dado o carácter de regularidade na atribuição destes subsídios são passíveis de contribuições para a segurança social, conforme comprovativos de processamentos anuais e mensais juntos aos autos (cf. fls. 301 a 315).

- Compensação por não renovação, compensação por caducidade - acerto, e compensação pecuniária global:

7.15. Nos casos em que se verifica o pagamento destes valores, que nem sempre correspondem ao último mês de trabalho, consta cumulativamente o processamento de outros valores, a título de caducidade do contrato, como por exemplo: a compensação por caducidade atribuída mensalmente em duodécimos (cf. fls. 301, 316 a 346).

7.16. Relativamente ao pagamento aos trabalhadores dos subsídios referidos, a Directora dos Recursos Humanos, O. C. R. S., esclareceu que a sua atribuição dependia do trabalho a desenvolver, embora tais valores não tivessem sido mencionados nem nos contratos de trabalho temporário com os trabalhadores, nem nos contratos com as empresas utilizadoras.

7.17. No Regulamento Interno da Empresa não existem quaisquer referências à possibilidade de atribuição dos subsídios e prémios acima mencionados.

7.18. As referidas prestações, assumem a natureza de retribuição, porquanto, integram o conjunto de valores que segundo o uso e costume da empresa, são pagos aos trabalhadores, com regularidade, como contrapartida do trabalho prestado, neles criando a legítima expectativa do seu recebimento, sendo consequentemente, considerados pelos trabalhadores que, dos mesmos auferem, como parte integrante da sua remuneração.

7.19. A regularidade advém da continuidade do procedimento da empresa na atribuição destes valores aos seus trabalhadores, o que se verifica, sempre que surgem determinados condicionalismos no exercício da actividade, como contrapartida do trabalho desenvolvido, pelo trabalhador quer nas empresas utilizadoras quer na própria empresa.

7.20. Averiguou-se também constarem outros valores pagos aos trabalhadores e não declarados à segurança social, por:

- Isenção de horário de trabalho: no caso de um trabalhador em que este valor não foi incluído nas declarações de remunerações no ano de 2003, conforme comprovativo do processamento anual e mensal (cf. fls. 347 e 348);

- Férias não gozadas - indemnização por férias não gozadas:

7.21. Relativamente a este item verifica-se, em relação a diversos trabalhadores, a cumulação do subsidio de férias, pago mensalmente em duodécimos, conforme decorre no processamento dos salários de cada trabalhador temporário, com a designada “indemnização por férias não gozadas”.

- Ajudas de custo:

7.22. De igual modo se constata a existência de vários trabalhadores com processamento de ajudas de custo, sem que às mesmas corresponda uma efectiva deslocação do local de trabalho, uma vez que os trabalhadores com contrato de trabalho temporário, são contratados especificamente para executarem um determinado trabalho e para um local previamente definido, conforme previsto no Decreto Lei n.º 358789, de 17 de Outubro, aplicável à data dos factos e na Lei n.º 19/2007, de 22 de Maio, pelo que por regra, não haverá deslocação que dê lugar ao pagamento de ajudas de custo.

7.23. Todos os montantes remuneratórios abonados são pagos com carácter de regularidade, integrando, assim, o conceito de remuneração, conforme determinação legal;

7.24. Dispõe a legislação invocada e, concretamente a da Segurança Social, que são base de incidência de TSU todas as prestações pagas aos trabalhadores, de modo continuado e com carácter de regularidade, a título de remunerações e independentemente da natureza das mesmas, como contrapartida da força de trabalho posta à disposição da sua entidade empregadora;

7.25. Apesar de ter sido o contribuinte convidado a regularizar, voluntariamente, as suas obrigações para com a Segurança Social, este não se mostrou disponível, pelo que serão as mesmas elaboradas oficiosamente, caso este não use ainda dessa faculdade, em sede de audiência prévia.

[…]

7.27. Com base nos elementos em poder deste Serviço preencheram-se mapas de apuramento referentes a essas verbas, que totalizam € 17.155.935,56 de remunerações a que equivalem € 5.961.687,61 de contribuições, para o período de Janeiro de 2003 a Dezembro de 2006.

7.28. Os montantes em causa abrangem todos os trabalhadores e membros da Administração identificados nos respectivos mapas de apuramento, elucidativos dos montantes apurados e que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.

[…]» – cf. Doc. 2 junto à p.i.

AA) As alterações efetuadas pelo serviço de fiscalização na sequência do exercício do direito de audição apresentado pela ora impugnante, tiveram por base a alegação constante do respetivo requerimento – depoimento da testemunha C. S. D. P.

BB) Por ofício 33780 de 23.12.2008, a ora impugnante foi notificada do Relatório elaborado no âmbito do PROAVE n.º 200701193162, constando do mesmo que os serviços procederiam à elaboração oficiosa das competentes declarações de remunerações – cf. Doc. 2 junto à p.i.

CC) Em 06.02.2009 a ora impugnante deduziu recurso hierárquico para o Conselho Diretivo do ISS, IP, contra o despacho de 23.12.2008, da Diretora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes, Setor Lisboa I, acima mencionado, que sancionou superiormente o Relatório referente ao PROAVE n.º 200701193162 – cf. Doc. 4 junto à p.i.

DD) Ato impugnado: Por Deliberação n.º 73/2009, do Conselho Diretivo do Instituto da Segurança Social, IP datada de 12 de agosto de 2009, foi negado provimento ao Recurso Hierárquico a que se refere a alínea que antecede, resultando da mesma, além do mais, o seguinte:

“[…]

7. […]

a) Os montantes constantes da contabilidade da Recorrente e por ela reconhecidos, como subsídio de deslocação mensal (33 322,61 €) e subsídio eventual de deslocação mensal (6 144,94 €), dado não merecer este tipo de retribuição um tratamento diferenciado, nem tendo sequer sido provados os pressupostos – prévia transferência do local de trabalho e acréscimo de custos de deslocação – de que depende a atribuição de subsídio de deslocação;

b) Os montantes de 6.078.083,51 €, constantes da contabilidade da Recorrente e por ela reconhecidos como subsídio de transporte e os montantes de 17.776,45€, constantes da contabilidade da Recorrente como ajudas de custo, por inexistir suporte documental que permita aferir a concreta afectação dos pagamentos realizados, e a decorrente natureza compensatória dos mesmos, incumbido esse ónus (…) à entidade empregadora;

c) Os montantes constantes da contabilidade da Recorrente e por ela designados como férias não gozadas (437.878,6€), por não ter sido feita prova da sua atribuição a esse título nem tampouco de que tais atribuições possuam caráter compensatório por se enquadrarem no disposto no artigo 222.º do Código do Trabalho, que pressupõe que, por culpa do empregador, o trabalhador tenha sido impedido de gozar férias;

d) Os montantes constantes da contabilidade da Recorrente e por ela assumidos como compensação pecuniária global (102 052,12€), por não ter sido feita a adequada prova dos acordos de cessação que teriam justificado os pagamentos, importando, nos termos do artigo 249.º, n.º 3 do Código do Trabalho, classificá-los como remuneração para os efeitos previstos no Decreto Regulamentar n.º 12/83, de 12 de Fevereiro;

e) Os montantes constantes da contabilidade da Recorrente e por ela assumidos como prémios e gratificações (2.603.316,72 €), por terem os serviços de fiscalização detectado a regularidade dessas atribuições ao longo dos quatro anos no período em análise, o que, nos termos do artigo 2.º, alínea d) do Decreto Regulamentar n.º 12/83, de 12 de Fevereiro, importa a sua consideração como base de incidência contributiva;

[…]

15. Da matéria compulsada para o processo, resulta que os serviços de fiscalização, na fase instrutória que precedeu a prática do acto, se ativeram aos dados que a contabilidade da empresa evidencia, o que vem criticado na petição de recurso apresentada.

[…]

17. No procedimento em recurso, porque as empresas estão obrigadas a possuir contabilidade séria e credível, foi adequadamente dada prevalência à prova documental, não se encontrando patente qualquer violação do princípio da proporcionalidade ou preclusão das regras que norteiam a actividade instrutória;

[…]” – cf. Doc. 1 junto à p.i.

EE) Por ofício de 21.08.2009, foi a ora impugnante foi notificada da Deliberação que antecede – cf. Doc. 1 junto à p.i.

FF) Os factos que deram origem ao processo de averiguações instaurado no Serviço de Fiscalização do ISS, IP., foram comunicados ao Ministério Público, por aquela entidade, dando origem ao processo de inquérito n.º 1758/11.7.TAOER – cf. fls. 1232/1233 dos autos.

II.B. Relativamente aos factos não provados, refere-se na sentença recorrida:

“Não resultam dos autos outros elementos, com relevo para a decisão do mérito da causa, que importe julgar como provados ou não provados”.

II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“A decisão da matéria de facto provada efetuou-se com base na análise crítica dos documentos referenciados em cada uma das alíneas do probatório, que constam dos autos e do processo administrativo apenso, bem como da posição assumida pelas partes nos respetivos articulados, nos casos em que foi julgada não controvertida.

Relativamente à prova testemunhal, quer as testemunhas arroladas pela impugnante quer a testemunha da entidade impugnada – o ISS, IP. –, C. S. P., foram unânimes no sentido de que o serviço de fiscalização do ISS, IP obteve da ora impugnante toda a documentação que lhe foi solicitada, e que essa documentação se cingiu aos mapas contabilísticos (Balancetes) e aos mapas de vencimentos. A testemunha C. S. P. confirmou, ainda, que as diligências instrutórias efetuadas corresponderam às mencionadas no relatório, ou seja, recolha interna de informação, nomeadamente, certidão do registo comercial da ora impugnante e declarações fiscais, e que começaram por fazer uma análise por amostragem, que verificaram alguns contratos de trabalho relativos a trabalhadores temporários e contratos celebrados com os utilizadores de trabalho temporário – os que constam do PA –, tendo depois, com base nos mapas contabilísticos e mapas de processamento de vencimentos, procedido à elaboração dos mapas de apuramento. Relativamente ao facto refletido na alínea U), sobre as correções relativas a “compensação pecuniária global”, a testemunha C. S. P. foi perentória a afirmar a afirmar que o serviço de fiscalização (as inspetoras encarregues do PROAVE) “[viram] originalmente alguns contratos de trabalho de alguns trabalhadores”, mas “[n]ão nessas situações em específico”.”.

II.D. Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto

O Recorrente ISS insurgiu-se contra a decisão proferida sobre a matéria de facto. No entanto, considerando parte das questões suscitadas, que entendermos serem de conhecer previamente, relega-se para momento ulterior a sua apreciação.

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Do erro de julgamento, quanto à impropriedade do meio processual

A 2.ª Recorrente, Impugnante, recorreu do despacho de convolação, proferido a 16.02.2018, considerando ser meio próprio para a apreciação da sua pretensão a ação administrativa (especial, à época).

Vejamos então.

Nos termos do art.º 97.º do CPPT:

“1 - O processo judicial tributário compreende:

a) A impugnação da liquidação dos tributos, incluindo os parafiscais e os atos de autoliquidação, retenção na fonte e pagamento por conta;

b) A impugnação da fixação da matéria tributável, quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo;

c) A impugnação do indeferimento total ou parcial das reclamações graciosas dos atos tributários;

d) A impugnação dos atos administrativos em matéria tributária que comportem a apreciação da legalidade do ato de liquidação;

(…)

p) O recurso contencioso do indeferimento total ou parcial ou da revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, quando dependentes de reconhecimento da administração tributária, bem como de outros atos administrativos relativos a questões tributárias que não comportem apreciação da legalidade do ato de liquidação”.

No âmbito do procedimento tributário da Segurança Social não existe a emissão de um ato de liquidação, nos termos em que, por exemplo, existe no âmbito dos procedimentos que correm junto da autoridade tributária e aduaneira.

Existe, sim, um ato de determinação dos valores corrigidos, havendo ulterior preenchimento oficioso dos mapas de remuneração [equiparado a liquidação, para efeitos, designadamente, de caducidade do direito à liquidação – cfr., v.g., o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 04.05.2022 (Processo: 098/17.2BEALM)].

Esta particularidade procedimental implica que, frequentemente, o sujeito passivo reaja diretamente do despacho que seja proferido sobre o relatório de inspeção, que é um ato que fixa a matéria tributável [cfr. art.º 97.º, n.º 1, al. b), do CPPT], ou sobre decisão de segundo grau que sobre o mesmo recaia, ato também ele diretamente impugnável [cfr. art.º 97.º, n.º 1, al. d), do CPPT].

Como refere o Tribunal a quo, “o acto que a A. pretende impugnar é a decisão que determina que a mesma é devedora de contribuições adicionais à Segurança Social, no valor de € 5.961.687,61, e por força do qual foi elaborada a declaração oficiosa de remunerações (cfr. requerimento do ISS, a fls. 977 dos autos), sendo o seu objeto imediato a decisão de indeferimento do recurso hierárquico apresentado (a referida deliberação n.º 73/2009)”.

Nesse seguimento, é meio próprio de reação a impugnação judicial.

Como tal, não assiste razão à 2.ª Recorrente, não padecendo a decisão recorrida do vício que lhe é assacado.

III.B. Do erro de julgamento quanto à caducidade do direito de ação

Alega o 1.º Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, na medida em que se verifica caducidade do direito de ação, tendo invocado tal circunstância quer considerando o despacho de convolação, quer considerando a sentença.

A este respeito, a Impugnante, em sede de contra-alegações, invoca a ocorrência de caso julgado formal.

E de facto assim é.

Explicitemos.

In casu, foi apreciado o erro na forma do processo e convolados os presentes autos em impugnação judicial. Nesse despacho foram expressamente apreciados todos os pressupostos da convolação, incluindo a tempestividade do meio próprio, considerando que a mesma se verificava.

Ademais, foi ainda proferido despacho, a 18.04.2008, na sequência da apresentação da contestação pelo ISS, articulado no qual expressamente se invocou a caducidade do direito de ação (cfr. documento com o n.º de registo no SITAF neste TCAS 003496040). No mencionado despacho de 18.04.2008, inequivocamente se refere que a exceção de caducidade de direito de ação alegada já não pode ser apreciada (daí que nunca tenha sido invocada a existência de omissão de pronúncia), por ter sido objeto de apreciação no momento da convolação e não ter sido objeto de recurso.

Nenhuma destas situações foi posta em causa à época, sendo que era suscetível de recurso de apelação autónoma, o que não ocorreu na concreta parte atinente à tempestividade [cfr. o art.º 285.º do CPPT, então em vigor].

Como se refere no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 09.11.2017 (Processo: 00552/11.0BEVIS):

“[T]endo o Tribunal a quo reconhecido a existência de erro na forma processo e apreciado os requisitos de que dependia a possibilidade de haver lugar à convolação do processo para a forma processual adequada, com vista a que os autos pudessem prosseguir, avançando depois para a ordenada convolação, (…) tem de entender-se que o Tribunal validou o entendimento de que era possível o prosseguimento do processo na forma de processo adequada, nomeadamente em função do facto de a petição ter sido tempestivamente apresentada para efeitos da nova forma processual, constituindo-se sobre esta última questão, na medida em que tal decisão não mereceu reparo de qualquer das partes, caso decidido ou caso resolvido, consolidando-se a decisão na ordem jurídica” (sublinhado nosso).

Como tal, nesta parte, formou-se, nos termos do art.º 620.º do CPC, caso julgado formal.

Sempre se acrescente que o alegado pelo ISS estaria votado ao insucesso, porquanto, em sede de impugnação judicial, é possível reagir a um indeferimento expresso de recurso hierárquico (mesmo que facultativo e mesmo que depois formada a presunção de indeferimento tácito) que se tenha pronunciado sobre a legalidade das correções efetuadas, nos termos ocorridos in casu, atento o disposto nos art.ºs 76.º, n.º 2, 97.º, n.º 1, al. d), 102.º, n.º 1, al. e), todos do CPPT, disciplina própria que se distancia da do Código do Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) [v., v.g., o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 08.07.2015 (Processo: 0389/15) e ampla jurisprudência no mesmo citada: “[O] CPPT rege os prazos para a impugnação judicial, e, por conseguinte, na ausência de lacuna legal nesta matéria, é totalmente deslocada a invocação das regras contidas no art. 58º do CPTA”).

Tendo a decisão do recurso hierárquico sido notificada por ofício datado de 21.08.2009 (cuja notificação se presume efetuada no terceiro dia seguinte – 24.08.2009 – cfr. n.º 1 do art.º 39.º do CPPT) e tendo a petição inicial sido remetida via correio postal registado a 23.11.2009, primeiro dia útil a seguir ao 90.º dia, foi respeitado o prazo previsto no art.º 102.º, n.º 1, do CPPT.

Face ao exposto, carece de razão o Recorrente ISS.

III.C. Da inimpugnabilidade de ato

Considera o ISS que o ato em causa (deliberação n.º 73/2009 do Conselho Diretivo da Segurança Social, que indeferiu o recurso hierárquico interposto) é inimpugnável, por se tratar de mero ato confirmativo.

Vejamos.

Em matéria de impugnabilidade de atos, no contencioso tributário, há que considerar que o CPPT contém disciplina própria, como já deixamos evidenciado no ponto que antecede.

Assim, como resulta, desde logo, do então nº 2 do art.º 76.º do CPPT, a decisão do recurso hierárquico é passível de impugnação, sendo o mesmo o ato imediato deste meio processual e sendo ato mediato aquele que deu origem à decisão de indeferimento impugnada.

Ou seja, se, na reação a liquidações de tributos ou atos de determinação da base de incidência (veja-se que, in casu, a Impugnante sempre alegou não ter sido notificada de quaisquer mapas de apuramento de declarações oficiosas de remunerações e que, de facto, isso não foi posto em causa e não resulta dos autos, onde apenas é referido que foi feito um mero ato material de registo das declarações de remunerações na conta corrente do contribuinte – cfr. fls. 917 dos autos em suporte de papel), os sujeitos passivos tiverem lançado mão de meios graciosos (mesmo que facultativos) e se a decisão proferida pela administração, apreciando a legalidade das correções efetuadas, tiver sido de manutenção do decidido em sede inspetiva, esta decisão de segundo grau é impugnável [cfr. art.º 97.º, n.º 1, al. d), do CPPT], sendo considerado, nestes casos, como objeto mediato da impugnação o ato que esteve na origem da reação pelas vias graciosas [cfr., v.g., os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 12.06.2007 (Processo: 0341/07), de 11.09.2013 (Processo: 01138/12) e de 18.06.2014 (Processo: 01942/13)].

Daí que, nas palavras de Jorge Lopes de Sousa (Código de Procedimento e de Processo Tributário – Anotado e Comentado, Vol. II, 6.ª Ed., Áreas Editora, Lisboa, 2011, p. 152):

“Não se prevê neste art. 102.º do CPPT qualquer prazo especial para a impugnação judicial de decisão proferida em recurso hierárquico, pelo que o prazo adequado será o de 90 dias, previsto na alínea e) do n.º 1 deste art. 102.º”.

Considerando esta específica disciplina, não há que atentar no alegado quanto à disciplina constante do CPTA, cuja aplicação seria meramente subsidiária, carecendo, pois, de relevância tudo o alegado em torno dos atos confirmativos.

Face ao exposto, carece de razão o ISS nesta parte.

III.D. Da nulidade da sentença, por falta de fundamentação

Alega, por outro lado, o Recorrente ISS que a sentença sob escrutínio padece de nulidade, por não especificação dos fundamentos de facto em que baseou a decisão.

Vejamos.

Quanto ao julgamento da matéria de facto, é de ter em consideração o disposto no art.º 123.º do CPPT, nos termos do qual “[o] juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões”, em termos similares ao que resulta do n.º 3 do art.º 607.º do CPC.

Nos termos do art.º 125.º, n.º 1, do CPPT, constitui nulidade da sentença a não especificação dos fundamentos de facto e de direito [cfr. igualmente o art.º 615.º, n.º 1, al. b), do CPC].
A nulidade por não especificação dos fundamentos de facto e de direito abrange as situações de falta absoluta de fundamentação de facto ou de direito.(1)

A lei processual exige, com efeito, que a sentença esteja cabalmente fundamentada, de facto e de direito, como resulta, desde logo, do disposto no art.º 123.º, n.º 2, do CPPT, bem como no art.º 607.º, n.ºs 3 e 4, do CPC, por forma a que seja perfeitamente apreensível o itinerário cognoscitivo percorrido, fundamental para a sua adequada compreensão e eventual impugnação.
Nas palavras de Alberto dos Reis, (2) “[u]ma decisão sem fundamentos equivale a uma conclusão sem premissas; é uma peça sem base”.

Não obstante, cumpre distinguir a não especificação dos fundamentos de facto e de direito, que se configura como nulidade da sentença, nos termos já referidos, da existência de algumas insuficiências ou deficiências na fundamentação de facto e de direito.
“O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.// Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto (3)

Ora, in casu, não se pode afirmar que haja omissão dos fundamentos de facto ou de direito em que decisão assenta.

Com efeito, do ponto de vista dos fundamentos de facto, foram elencados os factos provados, indicado que não existem factos não provados relevantes para a apreciação do litígio, bem como explanada a motivação subjacente a esse julgamento de facto, como, aliás, foi transcrito – v. pontos II.A, II.B e II.C, supra.

Desta análise resulta que o Tribunal a quo identificou, no caso da matéria de facto provada, junto a cada facto, a prova que fundou a sua convicção, identificando os concretos documentos e a prova testemunhal relevados, em termos aceitáveis.

Ademais, resulta explanado, de forma suficiente, o itinerário cognoscitivo percorrido pelo Tribunal a quo, para se concluir pela insuficiência de diligências em sede de ação de fiscalização, afirmando-se que o ISS se limitou à análise de um conjunto limitado de elementos (que são identificados) e esclarecendo-se que diligências era imprescindível fazer, para sustentar qualquer conclusão (por exemplo, audição de trabalhadores e análise dos elementos de suporte aos balancetes e mapas de processamento de vencimentos). E explica-se que, sem tais diligências, o teor do relatório ficou com um défice patente em termos de externação dos fundamentos de facto em que se sustentou.

Como tal, a sentença não padece de qualquer nulidade.

Coisa diferente é a discordância do Recorrente ISS com o que foi decidido, mas tal, quando muito, configura erro de julgamento, o que será oportunamente apreciado. No fundo, o que resulta do alegado é que o Recorrente entende que não foi violado o princípio do inquisitório.

Como tal, não se verifica a nulidade assacada pelo ISS à sentença recorrida.

III.E. Do erro na decisão proferida sobre a matéria de facto

O Recorrente ISS insurge-se quanto à decisão proferida sobre a matéria de facto, entendendo que deveriam ser dados como provados os seguintes factos (cfr. a conclusão V):

1) Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “ajudas de custo” com caracter regular;

2) Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “subsidio de alimentação” sobrepondo-se com pagamentos de “ajudas de custo”;

3) Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “subsidio de deslocação” sobrepondo-se com pagamentos de “ajudas de custo”;

4) Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, receberam duplicação de valores, por receberem mensalmente, a título das seguintes rubricas “ajudas de custo”, “subsídio de alimentação” e “subsídio de deslocação”;

5) Dos processamentos salariais é possível concluir que os trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, receberam no mesmo ano civil, verbas pagas a título de “subsídios de férias” e posteriormente “indemnizações por férias não gozadas”, evidenciando que esses montantes não seriam indemnizatórios, pois as férias já tinham sido pagas anteriormente;

6) Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “prémios e gratificações” com regularidade, e o seu modo de atribuição não estava previsto em nenhum documento do Recorrido (cfr. a este respeito a conclusão X);

7) Dos procedimentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “compensação por cessação” que efetivamente não correspondiam a cessações de contratos de trabalho por os seus montantes serem inferiores;

8) O Recorrido entregou todo o seu processamento salarial dos anos em averiguação à Recorrente;

9) O Recorrido nunca requereu quaisquer diligências complementares;

10) Os mapas de apuramento não precisavam de estar divididos pela dicotomia trabalhadores temporários ou trabalhadores da estrutura interna da empresa;

11) A falta de divisão nos mapas de apuramento entre trabalhadores temporários e trabalhadores da estrutura interna da empresa trata-se apenas de uma questão meramente organizativa dos mapas de apuramento, sendo irrelevante, face ao conhecimento que o Recorrido possui dos seus trabalhadores internos e dos trabalhadores temporários, podendo o mesmo perscrutar os valores aquilatados pelo Recorrente, confrontando-os com a sua informação contabilística.

Entende ainda que deveriam ser julgados não provados os seguintes factos (cfr. a conclusão XVII):

1) Não ficou provado que a informação enviada pelas entidades utilizadoras à Recorrida, tivesse alterado as conclusões do procedimento inspetivo, nem ficou provado a sua relevância para a qualificação jurídica das “rubricas”;

2) O teor da informação enviada pelas entidades utilizadoras à Recorrida ou outra informação de suporte não alteraria as conclusões extraídas do processamento salarial entregue pelo Recorrido ao Recorrente”.

Refere ainda que houve um vício de apuramento da matéria de facto, mas que, no fundo, se reconduz a um erro de julgamento, no sentido de a matéria de facto apurada não poder conduzir à conclusão extraída (o que será apreciado infra – cfr. ponto III.F).

Vejamos.
Considerando o disposto no art.º 640.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão.(4)

Assim, o regime vigente atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. a), do CPC];

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC], sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 640.º do CPC;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. c), do CPC].

Especificamente quanto à prova testemunhal, dispõe o n.º 2 do art.º 640.º do CPC:

“2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”.
Como tal, não basta ao Recorrente manifestar de forma não concretizada a sua discordância com a decisão da matéria de facto efetuada pelo Tribunal a quo, impondo­-se-lhe os ónus já mencionados.(5)

Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, cumpre aferir do cumprimento das exigências legalmente impostas.

Vejamos, proposta a proposta, não sem antes referir que nada há a mencionar a propósito do referenciado para explicar em que consiste um documento de processamento salarial (cfr. conclusão VII).

Assim, quanto aos factos provados propostos 1) a 3) e 5), é apenas referido, em bloco, que tal deveria ser considerado provado, devido à análise dos processamentos salariais, o que, de modo algum, responde às exigências prescritas pelo art.º 640.º do CPC, que exige uma concreta e específica identificação do meio de prova. Com efeito, constando dos autos diversos mapas de apuramento, elaborados com base nos documentos de processamentos de salários, urgia indicar, com rigor, a que trabalhadores se refere o ISS e em que concreto elemento documental se sustenta, o que não sucede. Ademais, a própria formulação é de tal forma vaga (“certos trabalhadores”) que não é compatível com a admissão da análise do proposto. Como tal, rejeita-se o recurso nesta parte.

No tocante ao facto 4), o mesmo padece das mesmas limitações indicadas, quanto aos factos 1) a 3) e 5). É certo que há uma menção adicional correta a um concreto meio de prova, nos termos legalmente prescritos, especificamente ao depoimento da testemunha C. P., trabalhadora do Recorrente e que integrou a equipa que procedeu à ação de fiscalização. No entanto, há aqui dois aspetos a sublinhar. Em primeiro lugar, a pertinência do depoimento prestado por um funcionário que esteve na origem da fundamentação dum ato impugnado nunca pode ser de modo tal a que, por essa via, seja possível aditar ao ato fundamentação que dele não consta (dado que a fundamentação tem de ser contemporânea do ato e não é, em situações como a presente, admissível fundamentação a posteriori). Em segundo lugar, também o depoimento da testemunha foi vago, não acrescentando nada ao que decorre do relatório, aliás. Como tal, face à formulação vaga proposta, que não é passível de ser circunscrita, mesmo atendendo à prova testemunhal referida, indefere-se o requerido.

Quanto ao facto provado proposto 6), são discerníveis duas vertentes.

Com efeito, nas suas alegações, o Recorrente começa por propor a seguinte redação: “6) Dos processamentos salariais é possível concluir que certos trabalhadores elencados nos mapas de apuramento junto ao Relatório Final, efetivamente, receberam montantes com a rubrica “prémios e gratificações” com regularidade” (cfr. conclusão V). No entanto, na conclusão X, já propõe uma redação ligeiramente distinta, na medida em que adita uma segunda parte ao facto proposto, com o seguinte teor: “e o seu modo de atribuição não estava previsto em nenhum documento do Recorrido”.

Porque nos parece que devem ser apreciadas separadamente as duas partes da proposta efetuada, comecemos pela primeira, ou seja, pela redação proposta na conclusão V. Assim, o alegado padece de insuficiências, quando remete para o processamento salarial, nos termos já explanados. Ademais, comporta um juízo conclusivo (“com regularidade”). Nada é alegado, em termos factuais, que permita sequer circunscrever esse juízo conclusivo. É certo que, nas alegações, há uma remissão para o relatório e para a prova testemunhal produzida minimamente correta, do ponto de vista do cumprimento das exigências previstas no art.º 640.º do CPC. No entanto, voltamos a debater-nos, adicionalmente, com as limitações já referidas a propósito da análise do facto proposto 5). Logo, indefere-se o requerido nesta parte.

Já quanto à segunda parte da proposta de redação, que resulta da conclusão X (“e o seu modo de atribuição não estava previsto em nenhum documento do Recorrido”), o que de essencial releva já decorre do facto M). Atentando nas transcrições efetuadas, atinentes ao depoimento da já mencionada testemunha C. P., cumpre apenas referir que não foi sublinhado pelo Recorrente o explanado pela Impugnante, quanto à inexistência de tal documento. Com efeito, as testemunhas O. R., à época administradora da Recorrida, T. F. (que foi funcionária da Impugnante entre 2004 e 2008, ainda desempenhando funções no grupo) e L. C. (que desempenhou funções junto da Impugnante, entre 2005 e 2019), todas elas coerentes e congruentes, revelando conhecimento direto dos facto, sublinharam que, no caso dos trabalhadores temporários, os pagamentos que houvesse, de prémios ou gratificações, eram feitos em função das instruções das entidades utilizadoras, que eram quem controlava o desempenho do concreto trabalhador. Aliás, esta relevância do papel das entidades utilizadoras é mencionada no relatório (por tal ter sido referido pela Impugnante durante a ação de fiscalização) e nunca foi posta em causa pelo ISS.

Assim, por se considerar que a decisão proferida sobre a matéria de facto dá resposta à segunda parte do facto proposto 6), indefere-se o requerido.

Quanto ao facto proposto 7), a menção feita aos elementos documentais padece das mesmas limitações a que já nos referimos supra, quanto aos demais factos, ou seja, é uma remissão genérica, não contextualizada e não densificada. Ademais, contém, na segunda parte, uma formulação conclusiva, que não se compadece uma formulação factual. Como já referimos supra, o depoimento da testemunha C. P. não é aqui suficiente, dado também o seu caráter genérico e não circunstanciado, que contém em si mesmo conclusões, não tendo especificado concretamente os factos que as sustentam. Ademais, colide com o depoimento das testemunhas da Impugnante O. R. e T. F., já referidas, que explanaram, de forma convincente, que as mencionadas compensações tinham a ver com situações pontuais detetadas, precedidas de averiguações, e que muitos dos trabalhadores voltavam, em momento ulterior, a querer trabalhar para a Impugnante, depois de terem de lá saído. Assim, indefere-se o requerido.

Quanto ao facto proposto 8), não é indicado qualquer meio de prova pelo Recorrente. Ademais, já decorre dos factos M) e N). Como tal, rejeita-se o recurso nesta parte.

No tocante ao facto proposto 9), o que é referido pelo Recorrente tem a ver com o conteúdo da pronúncia em sede de direito de audição (sendo, pois, irrelevante a prova testemunhal), o que decorre do facto Y). Tendo o Tribunal a quo dado o mesmo como integralmente reproduzido, é pela respetiva análise que se devem extrair conclusões sobre o seu conteúdo. Logo, indefere-se o requerido.

No que respeita aos factos propostos 10) e 11), além de não ter sido indicado qualquer meio de prova, não se trata de factos, mas de conclusões, que cabe ao Tribunal extrair. Como tal, rejeita-se o recurso nesta parte.

No tocante aos propostos factos não provados, não se trata de formulação de factos, mas de meras conclusões, pelo que se rejeita o requerido. Com efeito, cabe ao Tribunal apreciar e decidir se a situação concretamente em causa exigia um maior nível de diligências, sendo tal uma conclusão a extrair e não um facto (provado ou não provado) a fixar.

Assim, a decisão proferida sobre a matéria de facto, pelos motivos já explanados, não sofre alterações face ao decidido pelo Tribunal a quo.

III.F. Do erro de julgamento, no tocante à violação do princípio do inquisitório

Considera o Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, porquanto:

a) O procedimento inspetivo não padece de défice instrutório;

b) O relatório contém descrição retirada do processamento salarial suficiente para sustentar as suas conclusões;

c) Os serviços de fiscalização apuraram as concretas circunstâncias de facto que determinaram a liquidação;

d) Em momento algum foram requeridas diligências complementares pela Impugnante;

e) Não cabe ao Recorrente sanar a inércia do sujeito passivo;

f) Refere, ainda, por rubrica, os motivos que, para si, justificam a respetiva tributação;

g) É aplicável a presunção prevista no então n.º 3 do art.º 249.º do Código do Trabalho.

Vejamos então.

Estamos, in casu, perante correções atinentes a contribuições à Segurança Social, relativas aos períodos compreendidos entre janeiro de 2003 e dezembro de 2006.

Nos termos do art.º 45.º, n.º 1, da Lei n.º 32/2002, de 20 de dezembro (Lei de Bases da Segurança Social de 2002; cfr. no mesmo sentido o art.º 56.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro):

“Os beneficiários e, no caso de exercício de atividade profissional subordinada, as respetivas entidades empregadoras, são obrigados a contribuir para os regimes de segurança social”.

A base de incidência contributiva, atento o disposto no então art.º 46.º da Lei n.º 32/2002, de 20 de dezembro, consubstancia-se nas remunerações dos trabalhadores (cfr. no mesmo sentido o art.º 57.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro).

Para efeitos de densificação do conceito de remuneração (e considerando que não há coincidência entre conceitos de direito fiscal, direito da segurança social e direito do trabalho), o então Decreto Regulamentar n.º 12/83, de 12 de fevereiro, no seu art.º 2.º, dispunha que “… consideram-se remunerações as prestações a que, nos termos do contrato de trabalho, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito pela prestação do trabalho e pela cessação do contrato…”, seguindo-se uma enumeração exemplificativa de situações passíveis de enquadrar o mencionado conceito.

A este respeito, seguimos o entendimento plasmado no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 18.11.2020 (Processo: 02342/12.3BELRS 0400/18), onde se refere, a propósito do Decreto Regulamentar n.º 12/83, de 12 de fevereiro:

“Esta regulação é autónoma e auto-suficiente, não sendo dependente de remissão ou densificação obrigatória para a legislação juslaboral, que prossegue, em princípio, um desiderato próprio e nem sempre sobreponível com aquele visado pelo Direito Tributário” [v. igualmente os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 07.04.2022 (Processo: 01186/14.2BEAVR), de 10.11.2021 (Processo: 0484/11.1BECTB 0677/18) e de 25.01.2023 (Processo: 0850/10.0BEALM)].

Como referido no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 29.11.2013 (Recurso n.º 1038/10.5BEAVR, inédito):

“No regime contributivo, obrigatório e geral, dos trabalhadores por conta de outrem a base de incidência contributiva é constituída pelas remunerações dos trabalhadores. É o que resulta da Lei de Bases do Sistema da Segurança Social (artigo 46.º da Lei n.º 32/2002, de 20/12, entretanto revogada pelo artigo 109.°, n.º 1, da Lei n.º 4/2007, de 16/01, que, todavia, manteve a mesma regra no seu artigo 57.°).

(…) Sendo notória a aproximação do conceito de remuneração, para efeitos contributivos, ao conceito de retribuição, para efeitos laborais (…), tal não significa, porém, que o legislador da segurança social tivesse pretendido a equiparação entre ambas. De um lado, porque não existe nenhuma disposição que remeta o conceito de remuneração que constitui a base de incidência contributiva para o que na legislação laboral se prevê a respeito de retribuição. De outro lado, porque o conceito de remuneração, para efeitos contributivos, é, nalguns casos, mais estreito e, noutros, mais amplo, que o conceito de retribuição, para efeitos laborais (…).

O conceito de remuneração deve, por isso, ser determinado a partir da legislação própria da segurança social, ainda que na interpretação dos termos jurídicos adotados nas normas que a compõem se deva, por vezes, apelar ao sentido que lhes é atribuído no ordenamento jurídico-laboral- artigo 11.°, n.º 2, da Lei Geral Tributária”.

Assim, é desde logo de sublinhar que decorre do mencionado art.º 2.º do Decreto Regulamentar n.º 12/83, de 12 de fevereiro, que um determinado valor só é considerado remuneração, para efeitos contributivos, quando o trabalhador tenha direito a ele pela prestação do trabalho ou pela cessação do contrato.

Concretamente quanto a alguns prémios há que atender ao disposto na al. d) do art.º 2.º do Decreto Regulamentar n.º 12/83, de 12 de fevereiro, na redação que lhe foi conferida pelo Decreto Regulamentar n.º 53/83, de 22 de junho, nos termos do qual são designadamente remunerações:

“d) Os prémios de rendimento, de produtividade, de assiduidade, de cobrança, de condução, de economia e outros de natureza análoga, que tenham carácter de regularidade”.

Sobre o conceito de regularidade, chama-se à colação o já mencionado Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 18.11.2020 (Processo: 02342/12.3BELRS 0400/18). Ali se escreveu:

“V. Estão, assim, claramente fixados os termos de que, à data dos factos, dependia a incidência em sede de descontos para a Segurança Social, quando nos encontrássemos diante prémios de rendimento ou produtividade, apenas sendo os mesmos tributados se:

i) forem devidos por força do contrato de trabalho ou lei,

ii) forem regulares.

VI. A primeira condição – as prestações serem devidas por força do contrato ou por lei - está directamente ligada à constituição de um direito ou, ao menos, uma expectativa juridicamente tutelada e encontra-se largamente sufragada na jurisprudência dos tribunais superiores da Jurisdição Fiscal.

É o que se extrai do acórdão proferido no Processo n.º 0646/06, de 10 de Janeiro de 2007, por este Supremo Tribunal: “As gratificações extraordinárias pagas aos trabalhadores, não sendo devidas por força do contrato de trabalho ou das normas que o regem e não tendo natureza análoga às comissões e bónus nem consubstanciando participação nos lucros, não constituem remunerações sujeitas a descontos para a Segurança Social.”; ou do acórdão proferido no Processo n.º 079/09, de 9 de Dezembro de 2009, também deste Supremo Tribunal: “I - Nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 300/89, de 4 de Setembro e da alínea d) do artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 12/83, de 12 de Fevereiro, integram a base de incidência objectiva de contribuições para a Segurança Social as importâncias efectivamente pagas a jogadores profissionais e treinadores de futebol a título de "prémios de classificação, de permanência e de jogo", previstos nos respectivos contratos como podendo ser pagos, se e quando forem efectivamente pagos” (sublinhados nossos) – acórdãos disponíveis em www.dgsi.pt.
(…) VII. A segunda condição de que dependia, à luz da anterior legislação, a tributação dos quantitativos aqui em causa passava pela demonstração da respectiva
regularidade.

Também a este respeito, já se fixou uma razoável conformidade jurisprudencial no sentido de entender este requisito como equivalendo a, na falta de melhor expressão, previsibilidade ou não arbitrariedade.

Nesta leitura, as prestações seriam sujeitas a tributação em Segurança Social quando não fossem imprevisíveis ou arbitrárias, mas antes sujeitas a um evento verificável. Para haver tributação, teria assim de ocorrer um (ou mais) condicionalismos certus an, ainda e mesmo que incertos na formação do quantum concreto e respectivo da prestação a pagar. Mas já nunca ocorrerá a formação de um facto tributário em sede de Segurança Social quando o pagamento de tais remunerações for feito depender de condições que são meramente eventuais ou arbitrárias, portanto feitas depender de um condicionalismo incertus an.

É o que se extrai, por exemplo, do acórdão proferido no Processo n.º 1038/10, de 29 de Novembro de 2013 [inédito] (…): “A regularidade das prestações tem a ver com outra característica das prestações já acima referida: a de que são atribuídas em regra (são ordinárias) e com regras (não arbitrárias).

Quer dizer, a atribuição de tais valores não pode estar, designadamente, sujeita a eventos dependentes, em última análise, da vontade do empregador ou de circunstancialismo aleatório; e é assim, porque só em tais circunstâncias se pode falar da formação de “uma expectativa do seu recebimento no ano seguinte e com a repetição dos respectivos pressupostos” (cfr. acórdão proferido no Processo n.º 1038/10, de 29 de Novembro de 2013).

Mais vem esclarecendo aquela jurisprudência que tais prestações não deixam de ser regulares pelo facto de serem variáveis no seu quantitativo, continuando ainda a integrar aquela base de incidência tributária por serem previsíveis quanto à sua verificação. É o caso típico das remunerações variáveis, parcelas remuneratórias contratualmente estabelecidas, e indexadas à verificação de certos objectivos de facturação ou lucro – neste sentido, vd. o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte, no Processo n.º 00254/11, de 23 de Janeiro de 2020: “3. Constituem remunerações, sujeitas a contribuições para a segurança social, os prémios de produtividade que tenham carácter de regularidade. 4. Deve considerar-se regular e periódica e, consequentemente, passível de integrar o conceito de retribuição, para os efeitos de cálculo da retribuição de férias e dos subsídios de férias, a atribuição patrimonial cujo pagamento ocorra todos os meses de actividade do ano. A regularidade das prestações que constituem a retribuição exprime o seu carácter não arbitrário, sugerindo que seguem uma regra permanente, que se caracterizam pela sua constância. … Com efeito, ainda que as prestações que configuram prémio de produtividade tenham valores distintos, tal facto, de per se, não afasta o carácter regular do prémio, pois o carácter regular previsto da lei reporta-se às prestações que constituam prémios de produtividade, e não aos montantes destas prestações.”, ou o acórdão proferido no Processo n.º 1872/08, de 8 de Março de 2018: “I. Consideram-se remunerações sujeitas a contribuições para a segurança social, para efeitos do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, os prémios de produtividade que tenham carácter de regularidade; II. O carácter de regularidade do prémio de produtividade deverá ser aferido casuisticamente, atendendo às circunstâncias do caso concreto; III. Uma prestação terá carácter regular quando assume a mesma natureza e se repete num intervalo de tempo (contínuo ou periódico) podendo esses montantes ser constantes ou variáveis; IV. Assumem carácter regular para os efeitos do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, os prémios de produtividade com as características dos autos, designadamente, que são contratualizados aquando da admissão do trabalhador com a designação de “remuneração variável anual”, cujos valores são actualizados anualmente, e que são pagos durante vários anos, e em regra, em determinados meses do ano, podendo abranger em alguns casos os 12 meses do ano, sendo pagos por adiantamento. (…)”.

Citando o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 29.11.2013 (Recurso n.º 1038/10.5BEAVR, inédito):

“… [O] facto destas prestações serem atribuídas todos os anos (…) e nos mesmos meses não significa que sejam prestações regulares, mas que são prestações periódicas, no sentido de que têm sido atribuídas em momentos temporais recorrentes. A regularidade das prestações tem a ver com outra característica das prestações já acima referida: a de que são atribuídas em regra (são ordinárias) e com regras (não arbitrárias).

Uma prestação pode, assim, ser periódica e não ser regular, se for atribuída de forma reiterada mas com pressupostos distintos ou até sem pressuposto algum. E pode ser regular e não periódica, se for atribuída sempre que se verifique o mesmo pressuposto e este não ocorra no mesmo período ou no mesmo intervalo de tempo.

Relevava, por isso, saber se para a atribuição da prestação em causa tinham sido pré­-estabelecidas regras e se essas regras eram as mesmas ou substancialmente equivalentes, em termos que, de ano para ano, viessem como tal a ser reconhecidas, gerando uma expetativa do seu recebimento no ano seguinte e com a repetição dos respetivos pressupostos” (sublinhado nosso).

Cumpre, agora, por outro lado, aferir a disciplina aplicável em termos procedimentais e em termos de ónus da prova.

Como se sabe, a Lei Geral Tributária (LGT) foi aprovada pelo DL n.º 398/98, de 17 de dezembro, entrando em vigor a 01.01.1999.

A mesma aplica-se à generalidade das relações jurídico-tributárias (cfr. o n.º 1 do art.º 1.º), aplicando-se, pois, ao tipo de relação tributária que se constituiu entre o ISS e os sujeitos passivos, dado que estamos sempre perante tributos (cfr., sobre a classificação dos tributos, o art.º 3.º da LGT).

Com efeito, apesar das já antigas discordâncias, designadamente entre a doutrina, em termos de configuração dogmática destes tributos (imposto, tributo parafiscal, taxas), não há dúvidas quanto à sua qualificação como tributo e, como tal, quanto à aplicabilidade da LGT.

Como referido, v.g., no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 16.05.2012 (Processo: 0212/12):

“[Q]uer a Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto (art. 24.º), quer a Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto (arts. 60.º e 62.º), quer a Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro (arts. 45.º e 47.º, n.º1), quer finalmente a Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro (arts. 56.º, n.º 1, e 59.º, n.º 1) impõem a obrigação de contribuição para os regimes de Segurança Social aos beneficiários e, no caso de exercício de actividade profissional subordinada, às respectivas entidades empregadoras, estabelecendo mesmo a responsabilidade destas pelo pagamento das quotizações dos trabalhadores ao seu serviço, pelo que devem, para o efeito, proceder, no momento do pagamento das remunerações, à retenção na fonte dos valores correspondentes, e fazer o respectivo pagamento juntamente com a contribuição própria.

A obrigação contributiva da entidade empregadora constitui-se – como também decorre dos diplomas citados – com o início do exercício da actividade profissional dos trabalhadores ao seu serviço.

Está, assim, delineada, nestes diplomas, uma relação jurídica bilateral, de natureza contributiva, que impõe à entidade empregadora a obrigação de efectuar uma prestação pecuniária (a contribuição), correspondendo a tal obrigação o direito da Segurança Social a essa prestação. Embora fundada na relação laboral, esta relação jurídica contributiva não se confunde com ela, e apenas incide sobre um dos sujeitos da relação laboral, a entidade empregadora, pois que, como vimos, é esta a responsável pelo pagamento, mesmo na parte respeitante ao trabalhador.

Como tem vindo a ser referido pela jurisprudência do Tribunal dos Conflitos, no âmbito desta relação jurídica contributiva a entidade empregadora não está constituída perante o trabalhador em qualquer dever jurídico; é perante as instituições de Segurança Social, que integram a chamada administração indirecta do Estado, pois são entidades públicas, revestidas de autoridade pública, designadamente tendo poderes para intervenções coactivas, que as entidades empregadoras têm de cumprir a sua obrigação contributiva.

Ademais, hoje, após uma longa discussão doutrinária sobre a natureza das contribuições para a Segurança Social, é inequívoco que estas constituem verdadeiros impostos (…)”.

Portanto, é de apelar à LGT, no âmbito de relações jurídico-tributárias como a presente, sem prejuízo da existência de legislação especial que prevaleça – o que, aliás, está inequivocamente previsto hoje no art.º 3.º, alínea a), do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.

Nos termos do DL n.º 214/2007, de 29 de maio (orgânica do ISS de 2007), concretamente do seu art.º 20.º, n.º 1, al. f), os funcionários do ISS, designadamente no exercício de funções de fiscalização, gozam, designadamente, da prerrogativa de “… [r]equisitar para exame, consulta e junção aos autos livros, documentos, registos, arquivos e outros elementos pertinentes em poder das entidades cuja atividade seja objeto da sua ação de controlo e auditoria”

Não dispondo os diplomas que, à época, disciplinavam estas relações jurídico contributivas outras normas em termos procedimentais e de distribuição do ónus da prova, há que atentar ao disposto na LGT.

Assim, nos termos do seu art.º 58.º, “[a] administração tributária deve, no procedimento, realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido”.

Ao nível da ação inspetiva, também o legislador sentiu necessidade de fazer constar o princípio do inquisitório no art.º 6.º do então Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT), que, sob a epígrafe verdade material, dispõe o seguinte:

“O procedimento de inspeção visa a descoberta da verdade material, devendo a administração tributária adotar oficiosamente as iniciativas adequadas a esse objetivo”.

Assim, de uma maneira global, pode afirmar-se que, inerente ao respeito pelo princípio do inquisitório que impende sobre a administração, se encontra a necessidade de prossecução do interesse público subjacente ao alcance da verdade material. Veja-se que o interesse público, ao nível tributário, não se resume nem se circunscreve a um mero interesse na arrecadação de receitas. Passa, sim, pela arrecadação de receitas efetivamente devidas e tal entendimento sublinha a importância de se alcançar a verdade material.

Portanto, sem dúvida que o respeito pelo princípio do inquisitório deve nortear a administração na sua atuação [v., a título meramente exemplificativo, os seguintes acórdãos do TCAS, sobre o princípio do inquisitório (vertente procedimental): de 17.03.2016 (Processo: 06178/12), De 10.11.2016 (Processo: 07207/13), de 11.01.2018 (Processo: 08652/15), de 22.02.2018 (Processo: 08959/15), de 08.03.2018 (Processo: 321/17.3BEBJA), de 25.06.2019 (Processo: 506/14.4BEBJA), de 20.02.2020 (Processo: 751/11.4BELRS), de 14.01.2021 (Processo: 469/09.8BESNT), de 15.04.2021 (Processo: 1097/20.2BELRS), de 29.04.2021 (Processo: 1410/14.1BELRS), de 29.04.2021 (Processo: 477/13.4BELRS), de 09.06.2021 (Processo: 689/20.4BEALM), de 08.07.2021 (Processo: 742/20.4BEALM), de 16.09.2021 (Processo: 722/14.9BEALM), de 14.10.2021 (Processo: 41/17.9BCLSB), de 28.10.2021 (Processo: 328/05.3BEALM), de 11.11.2021 (Processo: 1067/09.1BEALM), de 07.12.2021 (Processo: 6983/13.3BCLSB), de 07.12.2021 (Processo: 1489/21.0BELRS), de 10.03.2022 (Processo: 1002/17.3BELRA)].

Naturalmente que o âmbito do princípio do inquisitório se alia às regras de distribuição do ónus da prova.

Como tal, a este propósito, prevê o art.º 74.º da LGT, no seu n.º 1, que “[o] ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque”.

É ainda de ter em conta o disposto no art.º 75.º da LGT, que, à época, dispunha:

“1 - Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal.

2 - A presunção referida no número anterior não se verifica quando:

a) As declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo;

b) O contribuinte não cumprir os deveres que lhe couberem de esclarecimento da sua situação tributária, salvo quando, nos termos da presente lei, for legítima a recusa da prestação de informações;

c) A matéria tributável do sujeito passivo se afastar significativamente para menos, sem razão justificada, dos indicadores objetivos da atividade de base técnico-científica previstos na presente lei.

d) Os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos, sem razão justificativa, dos padrões de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestações de fortuna evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89.º-A”.

Consideramos, pois, neste seguimento, com o maior respeito por opinião diversa, que não há aqui lugar à aplicação da presunção prevista no art.º 249.º, n.º 3, do Código do Trabalho então em vigor (nos termos do qual, “[a]té prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador”), norma, aliás, prevista visando a relação trabalhador/empregador e com o objetivo de reforçar a posição do trabalhador (cfr. Pedro Romano Martinez et al., Código do Trabalho Anotado, 13.ª Ed., Almedina, Coimbra, 2020, p. 644).

Com efeito, entendemos que o quadro legal a que fizemos referência, específico dos tributos e procedimentos aos mesmos respeitantes, contém disciplina própria que se sobrepõe, inexistindo, pois, qualquer lacuna a este propósito que necessite de ser preenchida.

A este respeito, chamamos à colação o entendimento plasmado no já citado Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 18.11.2020 (Processo: 02342/12.3BELRS 0400/18), onde se refere, a propósito do Decreto Regulamentar n.º 12/83, de 12 de fevereiro (mas cujo princípio consideramos transponível para as matérias procedimentais e de distribuição do ónus da prova):

“Esta regulação é autónoma e auto-suficiente, não sendo dependente de remissão ou densificação obrigatória para a legislação juslaboral, que prossegue, em princípio, um desiderato próprio e nem sempre sobreponível com aquele visado pelo Direito Tributário” [v. igualmente os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 07.04.2022 (Processo: 01186/14.2BEAVR), de 10.11.2021 (Processo: 0484/11.1BECTB 0677/18) e de 25.01.2023 (Processo: 0850/10.0BEALM)].

Como referido no já citado Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 29.11.2013 (Recurso n.º 1038/10.5BEAVR, inédito):

“O conceito de remuneração deve, por isso, ser determinado a partir da legislação própria da segurança social, ainda que na interpretação dos termos jurídicos adotados nas normas que a compõem se deva, por vezes, apelar ao sentido que lhes é atribuído no ordenamento jurídico-laboral- artigo 11.°, n.º 2, da Lei Geral Tributária.

Do que aqui vai dito decorre também que não vale nas relações contributivas entre o empregador e o trabalhador, de um lado, e a segurança social, do outro, a presunção de que constitui remuneração qualquer prestação do empregador ao trabalhador” (sublinhado nosso).

Assentando neste nosso entendimento, tal afasta o alegado, no sentido de que o ISS beneficia da referida presunção, sendo, sim, aplicável o art.º 74.º da LGT (que, aliás, o Recorrente entende aplicável à Impugnante, como decorre das alegações). Logo, consideramos que cabe em primeira linha àquela entidade demonstrar os pressupostos da sua atuação, sendo que, só depois desse momento, caberá ao administrado demonstrar que as conclusões extraídas de forma sustentada na ação inspetiva não são as corretas.

Entendemos, ademais, que, tendo apresentado a Recorrida os seus mapas de remunerações, que equivalem a autoliquidações [cfr. o Acórdão deste TCAS de 2904.2021 (Processo: 207/10.2BEPDL)], os mesmos, depois de validados nos termos legalmente previstos, presumem-se verdadeiros, atento o disposto no art.º 75.º, n.º 1, da LGT, porquanto são as declarações legalmente previstas para as entidades patronais declararem os valores que são devidos à segurança social. Logo, caberá ao ISS afastar, cabalmente, essa presunção de veracidade, nos termos consagrados no n.º 2 do art.º 75.º da LGT.

Com efeito, nos termos do DL n.º 8-B/2002, de 15 de janeiro, então em vigor, concretamente no seu Capítulo III, está prevista a obrigação da declaração de remunerações em modelo próprio, que cabe às entidades contribuintes, que, sendo validadas, nos termos do art.º 16.º, não podem deixar de gozar da presunção de veracidade a que fizemos menção. In casu, nunca foi posto em causa que tais mapas foram apresentados e validados no tempo oportuno, tendo apenas havido intervenção subsequente do ISS, na sequência de denúncia anónima recebida, como decorre do relatório.

Finalmente, cumpre ainda salientar que o n.º 1 do art.º 62.º do então RCPIT prevê que o relatório final da ação inspetiva deva identificar e sistematizar os factos detetados e, bem assim, a sua qualificação jurídico-tributária, refletindo o que já decorre do art.º 77.º da LGT, em termos de dever de fundamentação.

Feito este enquadramento, cumpre apreciar.

Atentando na prova produzida, podemos, desde já, assentar no seguinte:

a) A Impugnante apresentou à equipa de inspeção todos os elementos que lhe foram solicitados;

b) Os elementos referidos em a) foram, designadamente:

b.1. Mapas resumo de vencimentos mensais com todos os abonos e descontos do pessoal ao serviço nos anos de 2003, 2004, 2005, 2006 (com exceção de fevereiro), e 2007 até à data da notificação; balancete analítico em 31 de dezembro de 2003, 2004, 2005 e 2006 e balancete analítico em julho de 2007;

b.2. Documentos de processamento anual dos vencimentos, por trabalhador;

c) Foi ainda informado pela Impugnante inexistir qualquer regulamento sobre o processamento de subsídios, informando que cada situação era analisada caso a caso;

d) Foram elaborados mapas de vencimentos por amostragem, sem discriminação entre trabalhadores temporários e trabalhadores da estrutura interna da Impugnante;

e) Foram elaborados mapas de apuramento, que igualmente não discriminam trabalhadores temporários e trabalhadores da estrutura interna da Impugnante;

f) Foi ouvida a Impugnante em sede de direito de audição, momento em que a mesma alegou, designadamente, que “os serviços de inspeção não cuidaram de desenvolver a atividade necessária ao apuramento da verdade material, limitando-se a retirar conclusões dos mapas contabilísticos (“e mal”) “sem cuidar de indagar sobre o seu significado”.

Por outro lado, e perscrutando especificamente o teor do relatório, verifica-se que do mesmo resulta o seguinte:

a) O ISS considerou que a documentação solicitada foi a suficiente (aliás, atentando nas respetivas alegações de recurso, continua mantendo tal entendimento);

Refere-se no relatório mencionado em Z) que a Impugnante “contabilizou e pagou regularmente e de forma sistemática, pelo menos, ao longo dos anos de 2003 a 2007, à generalidade dos trabalhadores e administradores, e com carácter de regularidade diversos valores além da remuneração base, não os incluindo nas declarações de remunerações entregues na segurança social, no período de 2003 a 2007, nomeadamente:

- Subsídio transporte, subsídio eventual de risco, subsídio eventual de trabalhos penosos, subsídio eventual de residência, subsídio de responsabilidade temporária, subsídio de deslocação mensal e subsídio eventual de deslocação mensal, gratificação eventual de gerência, prémio anual - ano anterior, prémio de assiduidade, prémio de produtividade, gratificação eventual, prémio de produção e compensação pecuniária global”;

b) As suas conclusões sustentaram-se na análise tout court dos mapas de processamento de vencimento e mapas extraídos da contabilidade.

Como é referido pelo Tribunal a quo, desde já se antecipe que a própria redação do relatório evidencia o défice instrutório inerente à ação de fiscalização. Tal défice impede, desde logo, sequer a identificação das situações concretas relativas aos concretos trabalhadores – o que sempre condicionaria o exercício do direito de defesa por parte da Impugnante.

Daí que o alegado, no sentido de que a Impugnante não solicitou diligências ou não juntou documentos adicionais, padece de uma limitação de partida: não são cabalmente percetíveis as situações concretas em causa e a fundamentação respetiva.

Veja-se que o ISS não cuidou de analisar caso a caso os valores que, de forma não sustentada, reputa de regulares e continuados, designados por “Subsídio transporte, subsídio eventual de risco, subsídio eventual de trabalhos penosos, subsídio eventual de residência, subsidio de responsabilidade temporária, subsidio de deslocação mensal e subsidio eventual de deslocação mensal, gratificação eventual de gerência, prémio anual - ano anterior, prémio de assiduidade, prémio de produtividade, gratificação eventual, prémio de produção e compensação pecuniária global”. Não cuidou de apurar a que situações respeitavam, não cuidou de ouvir os trabalhadores (internos ou temporários), não cuidou de ouvir os administradores, não cuidou sequer de caraterizar o que estaria aos mesmos subjacente.

Demonstrativa disso é a circunstância de o ISS ter lançado mão de diversas expressões evidenciadoras do carater genérico da abordagem que fez, falando em generalidade dos trabalhadores, nunca os identificando, ou referindo que a Impugnante usualmente (…) fazia pagamentos regulares continuados, sem os esclarecer. Conclui, sem base factual que a sustente, pelo carater de regularidade dos pagamentos – sendo que, naturalmente, o grande volume dos elementos documentais apresentados pela Impugnante, a pedido do ISS (e ao qual, aliás, a testemunha C. P. fez menção no seu depoimento), não pode de modo algum justificar uma análise menos cuidada e menos rigorosa.

E tal carater genérico não é suprido pelos mapas de apuramento anexos ao relatório, nos quais, sem se distinguir sequer se estamos perante um trabalhador interno, um trabalhador temporário ou um membro do órgão de administração, são listados, sem mais, apenas os valores corrigidos, sem que dali resulte qualquer análise específica por trabalhador e suas concretas situações. Ora, o próprio regime jurídico inerente ao trabalho temporário revela a importância de analisar, separadamente, cada uma das situações, porquanto o trabalho temporário tem caraterísticas muito específicas, que não podem simplesmente ser minimizadas – daí a importância da distinção entre cada um dos trabalhadores e entre cada tipo de trabalhadores.

Ou seja, o que resulta evidenciado é que o ISS se limitou a analisar os processamentos de vencimento, com alguma análise complementar de elementos contabilísticos, e a corrigir todas as rubricas com uma determinada nomenclatura, sem tratar de aferir o que estava subjacente a essa mesma nomenclatura.

Ora, tal não é compatível com o cumprimento dos deveres adstritos à atuação da administração tributária, que se deve pautar pela descoberta da verdade material, situação ainda mais clara quando lhe cabe o ónus de demonstrar o que afirma.

Aliás, em bom rigor, isso foi suscitado em sede de exercício do direito de audição (ponto 25), no qual a Impugnante sublinha que as correções propostas evidenciam essa falta de preocupação de aferição da verdade material, tanto mais que estamos perante uma sociedade cujo objeto tem caraterísticas muito próprias e em que, por exemplo, seria fundamental obter informação por parte das entidades utilizadoras, ouvir trabalhadores, analisar os respetivos contratos de trabalho, entre outros aspetos.

Refere-se, pois, em sede de exercício do direito de audição no âmbito da ação de fiscalização: “25. Com efeito, durante o trabalho inspectivo realizado não houve a preocupação por parte dos serviços de fiscalização da Segurança Social em descobrir a verdade material dos subsídios, prémios, assim como todos os outros tipos de pagamentos que agora consideram susceptíveis de fazer parte da base de incidência das contribuições para a Segurança Social”; “os serviços de fiscalização da Segurança Social responsáveis por este processo de averiguações limitaram-se a reproduzir, com erros materiais, inclusive, os elementos contabilisticos que haviam sido disponibilizados, de boa-fé pela Exponenete e sem que esta conhecesse ou pudesse saber que os mesmos serviriam para os fins a que estes serviços os aplicaram agora, mais, sem qualquer tipo de análise cuidada aos mesmos, nem procurando esclarecer o verdadeiro sentido e natureza das respectivas rubricas”.

Posteriormente, em sede de recurso hierárquico, refere, designadamente, a Impugnante:

¾ “[O]s serviços de fiscalização da Segurança Social limitaram-se a reproduzir (…) a informação contabilística disponibilizada pela Recorrente, enquadrando alguns dos "conceitos" utilizados na contabilidade da Recorrente como estando sujeitos a obrigações de Segurança Social quando, nos termos da lei, não o estão, tendo utilizado de modo inapropriado informação que recolheram, com interpretação própria sobre esses dados e sem cuidar de indagar sobre o seu significado, optando por retirar ilações de modo, não raras vezes, abusivo”;

¾ “Ao invés de investigar se os factos existentes, designadamente ao nível da relação entre empregador e trabalhador permitiam a qualificação de certos pagamentos como remuneração fixa e devida e se a convicção criada ou fomentada na empresa era a de que os trabalhadores teriam direito às mesmas, ou se os trabalhadores haviam compreendido quando teriam ou não direito, segundo a lei, a receber certos subsídios”;

¾ “(…) [B]astaram-se com a leitura de dados contabilisticos, não exercendo uma única acção de prova que não fosse documental, (…) nunca lhes tendo ocorrido —aparentemente- que fosse sua obrigação, ao nível do princípio do inquisitório, averiguarem que a qualificação ou mesmo as menções escritas em documentos teriam de ser confrontadas com provas a recolher da efectiva relação laborai, pois que de outro modo não poderiam concluir se estavam ou não perante remunerações, já que essa qualificação parte de uma convicção de regularidade e obrigatoriedade na percepção de certas verbas pelos trabalhadores”;

¾ “[N]ão pode haver uma decisão de pagamentos baseada no nomen juris que entidades apelidam contabilisticamente, mas sim na prova que efectivamente as situações se configuram como tal”;

¾ “A Recorrente manifesta-se, desde já, inteiramente disponível para colaborar em tal prova, designadamente testemunhal, apenas necessitando que V. Exas. indiquem, com precisão, quais os casos concretos (trabalhadores) em que entendem ter a Entidade Recorrida fundado a sua convicção sobre a regularidade e obrigatoriedade de percepção dos valores em causa”.

Resulta, para nós, claro que a Impugnante desde cedo no procedimento se insurge contra o défice de diligências efetuadas, terminando, em sede de recurso hierárquico, a disponibilizar todos os elementos, desde que fossem indicados os concretos trabalhadores. Porque, como referimos, não se consegue cabalmente percecionar o que foi corrigido em relação a que trabalhador e por que motivo.

Se esta situação é flagrante nos trabalhadores ditos cedidos, não é diferente em relação aos trabalhadores internos: de um lado, não resulta a sua identificação inequívoca do âmbito dos mapas de apuramento, nem qualquer análise do tipo de funções desempenhadas, com indicação de quais delas, por exemplo, exigiam deslocações, se essas deslocações abrangiam todo o mês ou apenas parte do mesmo. Não foram pedidos quaisquer mapas relativos às deslocações, entendendo o ISS, como resulta do relatório, que os documentos de que dispunha eram suficientes, o que não corresponde à realidade.

Ora, apenas se pode aferir uma situação concreta analisando todos os elementos passíveis de a caraterizar ou pelo menos solicitando esses mesmos documentos à entidade inspecionada. O que não sucedeu.

Não é, pois, possível, face aos elementos constantes do relatório, aferir a situação concreta por trabalhador, o que deita por terra o alegado quanto ao facto de a Impugnante não ter juntado elementos: a Impugnante, expressamente no recurso hierárquico, pede que lhe indiquem a informação precisa por trabalhador, para poder apresentar prova, porque, de facto, não era possível fazê-lo sem um grau de concretização adicional.

Assim, as situações foram elencadas de tal forma genérica que nem seria exigível à Impugnante juntar, de mote próprio, os documentos que o ISS, devendo, não solicitou, dada a falta de identificação cabal, por trabalhador, das situações em causa.

Em que casos terá havido duplicação de ajudas de custo com outros subsídios, designadamente de alimentação? Não se sabe. Foram tributados os valores totais de ajudas de custo ou só a diferença entre estas e os subsídios de alimentação pagos? Não se sabe. Quem recebeu subsídio de transporte ou de deslocação em termos de complemento remuneratório? Não se sabe. Em que casos terá havido pagamento de ajudas de custo em período de férias? Não se sabe. Em que casos houve pagamento de ajudas de custo sem que ao mesmo corresponda efetiva deslocação ao local de trabalho? Não se sabe. Quais as concretas situações de ajudas de custo em que não houve deslocação? Não se sabe, uma vez que o ISS se limitou a extrapolar uma conclusão genérica, considerando o regime do contrato de trabalho temporário. O que estava subjacente à rubrica “indemnização por férias não gozadas” e à “compensação pecuniária global / por não renovação / por caducidade”? Não se sabe, apenas se extrapola que, pelos valores mensais em causa, que nem se explicitam quais são nem qual o valor de comparabilidade, não podiam ser cessações de contrato de trabalho. Quais os pressupostos dos pagamentos inerentes aos designados “prémios”? Não se sabe, sendo certo que foi informado o ISS que, no caso dos trabalhadores temporários, tal era determinado pelos utilizadores, como é referido no relatório. Consta do processo administrativo um regulamento interno da Impugnante, onde se invoca a questão de os eventuais prémios dependerem dos resultados da empresa, mas nada é referido a esse respeito. Aliás, nem se distinguem nos mapas os trabalhadores internos dos demais. Por que eram regulares os ditos prémios? Não se explana.

Como poderia a Impugnante contrapor-se a estas conclusões, se nem se sabe que situações concretas são estas? Não é possível, dado que, a montante, a situação deveria estar caraterizada e não está, porque o ISS nem tratou de o fazer nem pediu e obteve elementos que o permitissem, porque entendeu que não necessitava dos mesmos.

O que se sabe é que nem no processo administrativo estão elementos que permitam sustentar e caraterizar cabalmente as correções efetuadas, o que leva à conclusão que, de facto, as diligências efetuadas ficaram muito aquém do exigível.

Dever-se-ia ter analisado concretamente as situações, caso a caso, não apenas com base no mapa de processamento de vencimentos, elemento claramente insuficiente para extrair conclusões sustentadas. Cumpria ter-se procedido ao exame dos elementos de suporte a tais mapas (ainda que com necessidade de contacto com as entidades utilizadoras e/ou ouvindo os próprios trabalhadores), o que não ocorreu, dado que, como resulta do próprio relatório, o ISS entendeu que os mapas de processamento de vencimentos eram elemento suficiente. Aliás, como até consta do relatório, a própria Impugnante informou o ISS que muitos dos pagamentos feitos eram-no de acordo com as indicações das entidades utilizadoras, o que reflete a impreterível necessidade de aferir que situações foram essas e quais as suas caraterísticas, o que não ocorreu, dado que o ISS entendeu (e entende, considerando a posição assumida no presente recurso) não se justificar levar a efeito esse tipo de diligências.

Finalmente sublinhe-se, em linha com o que referimos supra a este propósito, que, havendo regras, em termos de distribuição do ónus da prova, aplicáveis à administração tributária em sentido amplo, onde se inclui o ISS, regras essas previstas na LGT, não há que apelar às regras constantes do Código Civil nem tão-pouco à presunção prevista do art.º 249.º, n.º 3, do Código do Trabalho então em vigor, nos termos que já explanamos supra.

Assim, caberia ao ISS demonstrar cabalmente os pressupostos em que sustentou a sua atuação, o que, a montante, implica a necessidade de realização das diligências suficientes para o efeito, só sendo exigível à Impugnante fazer contraprova se o ISS tiver cumprido o ónus a que está adstrito.

Não o tendo feito, não é exigível à Recorrida contraprova sobre factos que nem estão cabalmente caraterizados e identificados – não se podendo aqui, pois, falar na existência de inércia da Impugnante.

Esta situação abrange a globalidade das correções efetuadas, pelo que carece de pertinência a apreciação dos aspetos referidos em relação a cada uma das rubricas, quando, na realidade, temos défices no procedimento de tal forma significativos que nem se conseguem caraterizar as situações concretas, invalidando, consequentemente, a sua configuração em termos dogmáticos. Há uma manifesta falta de caraterização de cada uma das situações concretas e essa deficiência impede qualquer análise mais particular, por não serem configuráveis os aspetos de todos e cada um dos pagamentos efetuados aos trabalhadores.

Aliás, refira-se, a este propósito, que na sentença recorrida se afirma “[o] défice instrutório é de tal modo patente, em violação do disposto nos artigos 58.º da LGT e 6.º do RCPIT, que não se mostram minimamente externados no relatório os fundamentos de facto que conduziram aos mapas de apuramento oficioso de remunerações, no montante total de € 5.961.687,61, violando, também, o n.º 1 do artigo 62.º do RCPIT”, afirmação com a qual concordamos, pelos motivos já explanados. Com efeito, as exigências de fundamentação não se compadecem com afirmações globais e não concretizadas, impeditivas da concreta aferição do itinerário cognoscitivo, sendo particularmente pertinente, in casu, a necessidade de identificação das concretas situações nos termos que já referimos.

Face ao exposto, não assiste razão ao Recorrente ISS.

Considerando a decisão proferida, nada há a apreciar quanto às questões cujo julgamento resultou prejudicado pelo Tribunal a quo, designadamente as referidas nas contra-alegações apresentadas pela Impugnante.


Vencidas cada uma das Recorrentes no respetivo recurso, são as mesmas responsáveis pelas custas na presente instância (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC), calculadas tendo em consideração o disposto no art.º 12.º, n.º 1, al. c), do Regulamento das Custas Processuais.(6)



IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

a) Negar provimento a ambos os recursos;

b) Custas por cada uma das respetivas Recorrentes;

c) Registe e notifique.


Lisboa, 02 de março de 2023

(Tânia Meireles da Cunha)

(Susana Barreto)

(Patrícia Manuel Pires)





1) V., neste sentido, a título ilustrativo, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 24.01.2018 (Processo: 01411/16), de 25.11.2015 (Processo: 0162/15) e de 04.03.2015 (Processo: 01939/13) e os deste TCAS, de 15.11.2018 (Processo: 1339/10.2BELRA) e de 15.05.2014 (Processo: 07508/14)
2) Alberto dos Reis, Código de Processo Civil, Vol. V, p. 139
3) Alberto dos Reis, ob. cit., p. 140
4) Cfr. António dos Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2018, p. 169.
5) V., a título exemplificativo, o Acórdão deste TCAS, de 27.04.2017 (Processo: 638/09.0BESNT) e ampla doutrina e jurisprudência no mesmo mencionada.
6)Cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 20.03.2015 (Processo: 00295/12.7BEAVR-A).