Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 725/11.5BELLE |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 05/12/2022 |
Relator: | ISABEL FERNANDES |
Descritores: | EXECUÇÃO FISCAL EMBARGOS DE TERCEIRO PENHORA; CONTRATO DE SEGURO TITULARIDADE. |
Sumário: | Padecendo a sentença de deficit instrutório deverão os autos baixar à primeira instância a fim de que, em cumprimento do preceituado nos artigos 99.º da LGT e 13.º do CPPT, sejam realizadas diligências ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhe seja lícito conhecer, com vista à cabal averiguação da realidade alegada pelos Embargantes, ampliando-se a matéria de facto e proferindo-se nova sentença que, ao caso, couber. |
Aditamento: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO Z…, na qualidade de representante legal dos menores B… E B…, veio, contra a exequente FAZENDA PÚBLICA e contra o executado H…, deduzir embargos de terceiro relativamente à penhora de aplicação financeira - apólice de seguro - efectuada no âmbito da execução fiscal nº 1112200901099191. O Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, por decisão de 29 de Abril de 2015, julgou procedentes os embargos. Nas suas alegações, a recorrente FAZENDA PÚBLICA, formula as seguintes conclusões: «Deve ser dado provimento ao presente recurso, porquanto: A, aliás douta sentença recorrida, enferma de erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa. Uma vez que 1 - Os factos apurados pelo tribunal a quo são insuficientes para aplicar o regime jurídico que entendeu como adequado. 2 - Na verdade, impunha-se fixar como provado o facto de que o valor penhorado advinha do contrato de seguro de que os embargantes fossem os tomadores/segurados. 3 - Por outro lado, do documento apresentado pela parte em 24/06/2013 sob o n.º 2, apura-se que o tomador segurado é Z…, facto que não foi devidamente valorado pelo Tribunal recorrido, e, impunha-se outra solução do caso concreto. Assim, pelo exposto, e, principalmente, pelo que será suprido pelo Douto Tribunal, deve ser revogada a sentença recorrida, como é de JUSTIÇA» * Os recorridos, apresentaram as suas contra alegações, tendo formulado as seguintes conclusões: «1ª A penhora recaiu sobre um investimento financeiro feito no Banco S…- Companhia de Seguros de Vida S.A, e que se encontra em nome do Embargante, conforme Docs já juntos aos Autos. 2ª Não tendo o Embargante nada a ver com a divida da Executada para com a Exequente. 3ª Não tendo assim, juridicamente qualquer responsabilidade perante as dívidas da Executada à Exequente. 4ª Pela presente penhora foi a posse do Embargante ofendida. 5ª A Douta Sentença proferida a fls. 117 a 121, julgou procedentes os Embargos de Terceiro, dado que se considerou que o Embargante tem um Direito ou posse incompatível com a penhora feita. NESTES TERMOS E NOS DE MAIS DE DIREITO QUE V. EXª DOUTAMENTE SUPRIRÁ, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO IMPROCEDENTE, MANTANDO-SE A DECISÃO PROFERIDA EM PRIMEIRA INSTANCIA E EM CONSEQUÊNCIA, SER ORDENADA O LEVANTAMENTO DA PENHORA SOBRE A APLICAÇÃO FINANCEIRA.» * O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu douto parecer no sentido da procedência do recurso. * Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência desta 1ª Sub-Secção do Contencioso Tributário para decisão. * II – FUNDAMENTAÇÃO - De facto A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: «A) Em 20/10/2011 foi emitida, pelo Banco S…, informação onde consta que “B… (…) é o único titular da conta NIB 001…, sendo representado na conta pelos seus progenitores / Representantes Legais (…) e D. Z… (…) sendo a conta de movimentação individual.” (cfr. fls. 10 dos autos); B) Em 20/10/2011 foi emitida, pelo Banco Santander Totta, informação onde consta que “B… (…) é a única titular da conta NIB 001…, sendo representado na conta pelos seus progenitores / Representantes Legais (…) e D. Z… (…) sendo a conta de movimentação individual.” (cfr. fls. 110 dos autos); C) Em 19/09/2009 foi instaurado processo de execução fiscal a A…, LDA, que foi revertido contra H… e Z… (cfr. fls. 17 a 25 e 33 dos autos); D) O Banco S… celebrou contrato de seguro denominado “RND SEMESTRAL MAR10-ICAE NN” com Z…, com uma duração de 6 anos - 26/03/2010 a 26/03/2015 e onde consta como NIB: 001… (cfr. fls. 88 dos autos); E) Em 19/09/2011, foi feita penhora de contrato de seguro associado à conta bancária nº 001…, pertencente a B…., no valor de €2.652,77 (cfr. fls. 26, 87 e 88 dos autos); F) Os Embargantes são filhos da Executada (cfr. 12 e 13 dos autos); III-2. Factualidade não provada: Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados. Fundamentação do julgamento: Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na documentação junta com os articulados.» * - De Direito Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo Recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer. Assim, lidas as conclusões da alegação de recurso podemos concluir que a Recorrente não se conforma com a sentença recorrida, entendendo padecer de erro de julgamento na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa. Vejamos, então. A penhora foi efectuada no âmbito de processo de execução fiscal revertido contra H… e Z…, sendo devedora originária a sociedade A…, Ldª. A sentença recorrida considerou procedentes os embargos, tendo para tanto considerado o seguinte: “(…)Resta agora apreciar e decidir se a penhora do valor de €2.652,77 depositado na conta cujo 1º titular é B…, valor esse que decorre de contrato de seguro “REND SEMESTRAL MAR10-ICAE NN” - celebrado com a mãe deste e ora sua representante legal, ofende a posse ou direito incompatível pertencente ao Embargante. Do contrato referido, resulta um rendimento semestral, desde 26/03/2010 a 26/03/2015 a ser depositado na conta em que é único titular o seu filho menor. Da leitura dos documentos juntos aos autos, nomeadamente, da declaração do Banco S… sobre os titulares das contas bancárias e mais concretamente, da conta bancária onde foi penhorado o valor em causa, em confronto com o facto de serem menores e de a mãe, Z…, ser a sua representante legal e em simultâneo, a executada, conclui-se que o valor penhorado, é um rendimento que pertence ao menor B… e não à executada. De facto, logrou o Embargante demonstrar, através de prova documental – cfr. al. A) do probatório - que as quantias ali depositadas, por conta do contrato de seguro, são suas e que a revertida e mãe do menor, apenas figura como representante na conta por favor ao embargante que, atenta a sua idade, não pode dispor, por si, da quantia ali depositada – neste sentido – Acórdão do TCA Norte, proc. nº 0361/11.6BEBRG, de 17- 05-2012.(…)” Dissente a Recorrente do decidido por entender, em síntese, que os factos apurados são insuficientes para a sentença aplicar o regime jurídico que entendeu adequado, que se impunha fixar como provado o facto de que o valor penhorado advinha do contrato de seguro em que os embargantes figurassem como tomadores/segurados. E que, do documento apresentado pelos Recorridos em 24/06/2013, sob o nº2, apura-se que o tomador segurado é Z…, facto que não foi devidamente valorado pelo Tribunal recorrido. Comecemos por dizer que não vem posta em causa a qualidade de terceiros dos Embargantes, ora Recorridos. A questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se, face à matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, era possível chegar à conclusão de que o contrato de seguro alvo de penhora, no qual figura como tomador/segurado Z…, ainda assim, pertencia a sua titularidade ao então menor B…, bem como as quantias depositadas na conta referida na alínea e) do probatório. Do probatório resulta, para o que aqui importa, que: - foi emitida declaração pelo Banco S… atestando que o recorrido B… é o único titular da conta com o NIB 001…, sendo representado na conta pelos seus progenitores/representantes legais, nomeadamente, por Z…, sendo a conta de movimentação individual – cfr. alínea a); - o Banco S… celebrou contrato de seguro denominado “RND SEMESTRAL MAR10-ICAE NN” com Z…, com uma duração de 6 anos; - em 19/09/2011 foi efectuada a penhora de contrato de seguro associado à conta bancária nº 001…, pertencente ao embargante B…, no valor de € 2.652,77; - e que os embargantes são descendentes da Executada. Entendemos, como a Recorrente, que a factualidade fixada na sentença recorrida é insuficiente para as conclusões a que esta chegou, no que concerne à titularidade do rendimento respeitante ao contrato de seguro. Não oferece dúvida que a conta bancária em causa é titulada pelo embargante B…, e que, na mesma, este é representado pelos seus progenitores, nomeadamente pela executada Z… . Porém, se é certo que foi celebrado o contrato de seguro entre a instituição bancária e a Z…, não se sabe em que qualidade esta interveio, se em nome próprio, se em representação do menor. O documento constante dos autos apenas permite a afirmação de que no contrato de seguro figura como tomador de seguro a Z… e que o NIB que ali vem indicado é o da conta do embargante B… . Ora, contrariamente ao decidido, entendemos que a matéria de facto fixada é insuficiente para a procedência dos presentes embargos. Não se desconhece que foi dispensada a inquirição da testemunha arrolada pelos Embargantes, sendo possível que o seu depoimento pudesse trazer algum esclarecimento adicional à factualidade que cumpria demonstrar e provar, pelo que a sua inquirição se pode revelar pertinente. Assim, no caso, deve concluir-se que a ausência da realização da diligência de inquirição das testemunhas arroladas é susceptível de influenciar decisivamente o exame e a decisão da causa e que, nesta linha de raciocínio, a decisão de dispensa da produção da prova testemunhal encerra um erro de julgamento do Tribunal a quo que, nesta sede, importa reparar. Assim, devem os autos baixar à primeira instância, para que aí se levem a cabo as diligências elencadas supra e, eventualmente, se fixem factos pertinentes que delas resultem. Razão para que se considere procedente o recurso e se conclua pela anulação da sentença por défice instrutório. * III- Decisão Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em julgar procedente o recurso, anular a sentença recorrida e ordenar a remessa do processo à 1ª instância para nova decisão, com preliminar ampliação da matéria de facto, depois de realizada as diligências supra indicadas. Sem custas. Registe e Notifique. Lisboa, 12 de Maio de 2022 (Isabel Fernandes) (Jorge Cortês) (Hélia Gameiro Silva) |