Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1260/11.7BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/29/2017
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO E FUNDAMENTAÇÃO A POSTERIORI DO ACTO TRIBUTÁRIO; PRESUNÇÃO DO ART. 10.º, N.º 1 DO CIMI
Sumário:I. Os poderes inquisitórios do juiz consagrado no art. 13.º do CPPT, por um lado, não abrangem todas e quaisquer diligências, mas apenas aquelas que considere úteis, e por outro lado, esses poderes têm por limite “factos que lhe seja lícito conhecer” (n.º 1 art. 13.º do CPPT);
II. Não se reputa útil, e muito menos lícito, conhecer de factos ao abrigo do princípio do inquisitório que consubstanciem fundamentação a posteriori do acto tributário;
III. O disposto no art. 10.º, n.º 1 do CIMI estabelece uma presunção de conclusão ou modificação dos prédios urbanos na mais antiga das datas a que se referem as alíneas a) a d) que poderá não relevar caso o chefe de finanças da área da situação dos prédios disponha de elementos fornecidos pelos serviços da administração fiscal, pela câmara municipal ou resultantes de reclamação dos sujeitos passivos, devendo, nesse caso, fixar a data de conclusão ou modificação dos prédios mediante despacho fundamentado, nos termos estabelecidos no n.º 2 daquele preceito legal.
IV. Inexistindo o despacho a que se refere o n.º 2 do art. 10.º do CIMI deve relevar a presunção prevista no n.º 1.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:



I. RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, que julgou procedente a impugnação apresentada por H..., INVESTIMENTOS HOTELEIROS, S.A., do indeferimento do recurso hierárquico da reclamação graciosa da liquidação adicional de IMI n.º ..., referente ao ano de 2006, na parte respeitante ao artigo matricial n.º 598, da freguesia dos ....


A Recorrente Fazenda Pública apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões:
“Texto no original”








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A Recorrida apresentou contra-alegações e formulou as seguintes conclusões:

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Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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A questão invocada pela Recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir consiste em aferir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto e de direito por violação do princípio do inquisitório (conclusões I a XIII).

II. FUNDAMENTAÇÃO

Para conhecimento dos fundamentos do recurso importa ter presente que a decisão recorrida fixou a seguinte matéria de facto:

A) Em 26-07-2007, foi emitida a favor da Impugnante, pelo Departamento de Projectos Estratégicos, da Direcção Municipal de Gestão Urbanística da Câmara Municipal de ..., a Licença de Utilização Turística N.º ..., da qual consta designadamente que “Por despacho do Director Municipal da Gestão Urbanística, Dr. ..., de 29 de Junho de 2007 foi autorizada a exploração supra mencionada, com tipologia conforme indicado nas fichas anexas ao presente Alvará.” (cfr. fls. 12 e 13 do Processo Administrativo (PA) de Reclamação Graciosa (RG), cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido);
B) Em 17-04-2009 a Impugnante apresentou a declaração Modelo 1 “Declaração para inscrição ou actualização de prédios urbanos na matriz” relativamente ao prédio inscrito sob o n.º 598, da freguesia dos ... (cfr. fls. 64 do PA de RG, idem);
C) Na declaração referida na alínea B), foi mencionado entre outros o seguinte: “Data da Licença de Utilização: 2007-07-26”, não tendo sido preenchido o campo referente à “Data de conclusão das Obras” (cfr. fls. 64 do PA de RG, ibidem);






D) Do documento comprovativo da 1.ª avaliação efectuada ao prédio referido na alínea B), foi mencionado entre outros o seguinte “Data da licença de utilização: 2007-07-26”, não tendo sido preenchido o campo referente à “Data de conclusão da Obra” (cfr. fls. 58 e 59 do PA de Recurso Hierárquico (RH), ibidem);
E) Do documento referido em D) consta ainda “Valor Patrimonial Tributário

– Avaliação Manual – Justificativo: Uma vez que o prédio a que se refere este artigo teve duas ampliações em épocas diferentes, o cálculo do Valor patrimonial total terá em consideração, conforme legislação aplicável, os seus valores parcelares correspondentes às diferentes idades em que as ampliações foram efectuadas.” (cfr. fls. 58 e 59 do PA de RH, ibidem);
F) Por ofício n.º 6254024, de 24-11-2009, do Serviço de Finanças de ... 7, enviado à Impugnante através do registo postal n.º ..., foi a mesma notificada da avaliação efectuada ao prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 598, da freguesia dos ... (cfr. fls. 11 do PA de RG, ibidem):
G) Em 08-10-2010, foi emitida a liquidação adicional n.º ..., com referência ao ano de 2006, com o valor a pagar de €46.235,66, enviada à Impugnante através do registo postal n.º ..., de cujo teor resulta o seguinte:
“imagem no original”
(cfr. fls. 30 do PA de RG, ibidem):

H) Em 05-11-2010, deu entrada no Serviço de Finanças de ... 2, um requerimento apresentado pela Impugnante, do qual resulta o seguinte: “(…) deve ser dado provimento ao presente requerimento e como tal ser anulada a notificação referente ao adicional de IMI do ano de 2006 , uma vez que o Alvará de Licença de Utilização Turística n.º ... do prédio urbano sito na Rua ..., 4, inscrito na matriz predial sob os artigos matriciais 598, 1279 e 1321 , da freguesia dos ..., foi emitido pela Câmara Municipal de ... apenas em 26.07.2007, não devendo existir efeitos retroactivos à data de 2006 e considerando ainda que o referido prédio urbano usufruía de Benefício Fiscal, previsto pelo artigo 47.º do EBF e pelos artigos 16.º e 22.º do D.L. 423/83, de 05 de Dezembro, até 01.05.2006.
Mais requer que lhe seja devolvido o montante de €1.236,36 (Mil duzentos e trinta e seis euros e trinta e seis cêntimos), valor que foi indevidamente cobrado sobre os artigos matriciais 1279 e 1321 nas notificações do adicional de IMI referentes aos anos de 2007 e 2008, uma vez que os artigos 1279 e 1321 sempre foram dois terrenos para construção e nunca foram sujeitos a avaliação nos termos do IMI” (cfr. fls. 4 a 5 do PA de RG, ibidem);
I) Em 30-11-2010, a Impugnante, pagou o imposto constante da liquidação referida na alínea G) supra (cfr. fls. 30 e 31 do PA de RG, ibidem);
J) Em 30-11-2010, a Impugnante apresentou um requerimento no Serviço de Finanças de ... 7, de cujo teor resulta o seguinte: “(…)
7) Dispõe a alínea c) do n.º 1 do artigo 9.º do CIMI que: “O imposto é devido a partir (…) Do ano, inclusive, da conclusão das obras de edificação, de melhoramento ou de outras alterações (sublinhado nosso) que hajam determinado a variação do valor patrimonial tributário de um prédio (…)”,
8) Ora, as respectivas obras de edificação, de melhoramento ou de alteração tiveram o seu término em 2007.
9) E, consequentemente, o Alvará de Licença de Utilização Turística n.º ..., foi emitido pela Câmara Municipal de ... em 26.07.2007, conforme cópia que se junta como Doc. 8.
10) Acresce que, o n.º 1 do artigo 10.º do CIMI diz-nos que: “Os prédios urbanos presumem-se concluídos ou modificados na mais antiga das seguintes datas (sublinhado nosso):
a) Em que for concedida licença camarária, quando exigível;

b) Em que for apresentada a declaração para inscrição na matriz com indicação da data de conclusão das obras;
c) Em que se verificar uma qualquer utilização, desde que a título não precário;

d) Em que se tornar possível a sua normal utilização para os fins a que se destina.”

11) Deste modo, considera o ora Requerente que tendo a avaliação de 2009 efeitos retroactivos, estes deveriam ser apenas contabilizados a partir de 26.07.2007, uma vez que foi no ano de 2007 que foram concluídas as obras e, consequentemente, emitida a respectiva licença camarária.
12) Além de que, o adicional do IMI referente aos anos de 2007 e 2008 já foi cobrado e devidamente liquidado, conforme se pode comprovar pelas cópias das notificações com os n.ºs ... e … que se juntam como Doc. 9 e 10
13) Logo, não faz qualquer sentido à ora Requerente ter recebido um adicional do IMI referente ao ano de 2006, tendo como VPT o valor que foi atribuído no âmbito da avaliação realizada no ano de 2009, ou seja, €11.748.430,00 (Onze milhões setecentos e quarenta e oito mil quatrocentos e trinta euros).
14) Posto isto, a Requerente não entende o porquê da notificação adicional de IMI referente ao ano de 2006 do artigo matricial 598 da freguesia dos ... e, por isso, pretende que a mesma seja anulada e, simultaneamente, lhe seja devolvido o valor entretanto pago, que perfaz a quantia de €46. 235,66 (Quarenta e seis mil duzentos e trinta e cinco mil euros e sessenta e seis cêntimos).
(… )”(cfr. fls. 22 do PA de RG, ibidem);

K) Foi decidido pelo Serviço de Finanças, juntar o requerimento referido na alínea J) aos autos do requerimento referido na alínea H), instaurando, uma única reclamação graciosa, por o segundo requerimento se conter no que se pedira no primeiro (cfr. fls. 62 e 63 do PA de RH, ibidem);

L) Em 17-12-2010, o Serviço de Finanças 7, elaborou proposta de decisão no sentido de indeferimento do requerimento apresentado em 05-11-2010, a qual foi sancionada nessa mesma data, por despacho do Sr. Chefe de Finanças, o qual determinou a notificação da reclamante para efeitos de exercício do direito de audição, nos termos do artigo 60.º da LGT (cfr. fls. 47 a 49, do PA de RG, ibidem);
M) Da informação referida na alínea L) resulta designadamente, o seguinte:

“Texto no original”

(…)”(cfr. fls. 48 do PA de RG, ibidem);
N) Por ofício n.º 012251, de 20-12-2010, foi dado conhecimento à impugnante da decisão referida na alínea K) e para querendo exercer o seu direito de audição (cfr. fls. 50 do PA de RG, ibidem);
O) Em 31-12-2010, o Serviço de Finanças de ... 7, proferiu decisão final no requerimento apresentado em 05-11-2010, no sentido de que a Reclamação Graciosa apresentada fosse indeferida, a qual foi sancionada por despacho proferido em 31-12-2010, pelo Sr. Chefe do Serviço de Finanças, tendo sido indeferido o pedido apresentado (cfr. fls. 53 e 54 do PA de RG, ibidem);
P) Por ofício n.º 000172, de 31-12-2010, recebido em 11-01-2011, foi dado conhecimento à Impugnante da decisão referida em O), e de que daquele despacho a mesma poderia recorrer hierarquicamente, no prazo de 30 dias, a contar da notificação, ou impugnar judicialmente, no prazo de 15 dias, a contar da mesma data (cfr. fls. 55 a 57 do PA de RG, ibidem);
Q) Em 10-01-2011, a Impugnante apresentou requerimento no Serviço de

Finanças de ... 7, em “RESPOSTA” ao ofício referido na alínea N), tendo exercido o seu “direito de audição”, e de cujo teor resulta o seguinte:

“(…) deve ser dado provimento ao presente requerimento e como tal ser anulada a notificação referente ao adicional de IMI do ano de 2006, uma vez que o Alvará de Licença de Utilização Turística n.º ... do prédio urbano sito na Rua ..., 4, inscrito na matriz predial sob o artigo matricial 598 da Freguesia dos ..., foi emitido pela Câmara Municipal de ... apenas em 26.07.2007, não devendo existir efeitos retroactivos à data de 2006.
Mais requer a devolução do valor entretanto pago por conta da referida e reclamada

nota de liquidação.” (cfr. fls. 58 e 59 do PA de RG, ibidem);

R) Em 07-02-2011, a Impugnante apresentou Recurso hierárquico, contra o a decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa n.º ..., referida nas alíneas O) e P) (cfr. fls. 1 a 9 do PA de Recurso Hierárquico (RH), ibidem);
S) No Recurso Hierárquico referido na alínea R), foi proferido projecto de decisão de indeferimento por despacho de 30-03-2011, da Sra. Directora de Finanças de Adjunta, da Direcção de Finanças de ..., concordante com a informação dos serviços, e com o Parecer na mesma aposto (cfr. fls. 60 a 63 do PAT de RH, ibidem);
T) Na informação em que se baseou o projecto de despacho de indeferimento do recurso hierárquico refere-se o seguinte:
“(…)

4. Porém, nos termos do n.º 1 do artigo 10.º do CIMI, a data da emissão da licença de utilização constitui, tão-somente, uma presunção de que o prédio foi concluído ou modificado naquela data. Deverá atender-se a outras datas, se anteriores àquela.
Desde logo, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, a data a considerar é a efectiva conclusão das obras quando o Chefe de Finanças dela tenha conhecimento “com base em elementos de que disponha, designadamente os fornecidos pelos serviços da administração fiscal, pela câmara municipal ou resultantes de reclamação dos sujeitos passivos”.
Por sua vez, o artigo 9.º, alínea c), também do CIMI dispõe que o imposto é devido a partir do “ano, inclusive, da conclusão das obras de edificação, de melhoramento ou de outras alterações que hajam determinado a variação do valor patrimonial tributário de um prédio”.
5. Conforme consta na ficha n.º 2736461 respeitante à avaliação efectuada em 16 -07-2009 ao prédio do artigo 598, onde funciona um hotel, aquela avaliação foi motivada pelo facto de se tratar de um “prédio melhorado/modificado” (fls 58 e 59).
Confirmando o alegado pela contribuinte, resulta também dessa ficha, assim como da própria licença de utilização turística (n.º ...), junta aos autos por fotocópia, que esta foi emitida a 26-07-2007 (fls 42 e 43).
Porém, embora quer a ficha de avaliação, quer a licença de utilização, sejam omissas quanto à data de conclusão das obras, afirma-se nos campos da ficha destinados à “descrição da avaliação” e ao seu “justificativo” que o prédio em questão foi objecto de “duas ampliações efectuadas em diferentes épocas”.
Em conformidade, no “cálculo do Valor patrimonial total” foram tidos em consideração os “valores parcelares correspondentes às diferentes idades em que as ampliações foram efectuadas”, como vem evidenciado na ficha (fls. 58 verso).
6. A confirmar-se que, conforme a contribuinte alega, não foi informada da possibilidade de “atacar” a liquidação adicional, a omissão não seria relevante, visto que, tendo reclamado graciosamente contra esse acto, foi atingido o objectivo daquela formalidade legal.

Com respeito ao facto, também invocado, de ainda não ter obtido resposta à reclamação graciosa que apresentara a 30/11/2010, cumpre referir que foi decidido pelo SF, (e parece que bem), juntar essa petição aos autos da primeira (apresentada a 5/11/2010), instaurando, pois, uma única reclamação graciosa, uma vez que no segundo requerimento se contém o que pedira no primeiro.
De resto, a própria contribuinte afirma no artigo 27.º da petição de recurso que no requerimento de 5/11/2010 solicitara a anulação da liquidação. Também no requerimento apresentado a 30/11/2010 afirmava que já havia solicitado a “anulação da referida notificação” no anterior requerimento (fls. 5 e 22).
Ora, solicitar à administração fiscal que anule uma liquidação é reclamar graciosamente contra ela.
No que toca à invocada violação pelo procedimento da reclamação graciosa do “disposto no

nº 5 do artigo 267º da CRP”, não assiste razão à contribuinte, dado este preceito constitucional não se dirigir à administração pública, mas ao próprio legislador – que o cumpriu aprovando o CPA (fls 8).
(…)”.(cfr. fls. 61 a 63 do PAT de RH, ibidem)

U) A presente impugnação judicial foi apresentada em 24-06-2011, via site ao Tribunal Tributário de ... (cfr. fls. 2 dos autos, ibidem).
Nada mais se provou com interesse para a decisão a proferir.”

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Com base na factualidade supra exposta, a sentença recorrida julgou procedente a impugnação judicial com o fundamento, em síntese, de que a Impugnante ao não fazer constar a data da conclusão das obras do prédio em questão na declaração Modelo 1, e não tendo o chefe do serviço de finanças exercido a faculdade prevista no n.º 2 do art. 10.º do CIMI, deve funcionar a presunção prevista na alínea a) do n.º 1 deste preceito legal.

A Recorrente Fazenda Pública não se conforma com o decido e invoca, desde logo, que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto e de direito por violação do princípio do inquisitório (conclusões I a XIII). Entende a Recorrente que a sentença recorrida errou ao decidir com base na presunção do art. 10.º, n.º 1, alínea a) do CIMI, concluindo que a data da conclusão das obras é a data da emissão da licença de utilização, uma vez que não resultou provado que “seja a mais antiga das datas”, pois a mais antiga é a data 21/08/2002, conforme informação da CML que a aponta como data de conclusão da obra.

Sucede que, desde logo, importa sublinhar que da ficha de avaliação o prédio ora em causa não consta, de modo algum, tal data, mas apenas a data da licença de utilização “26/07/2007”. Por outro lado, a data avançada pela Recorrente também não consta do procedimento de avaliação ou de liquidação, designadamente, não consta do processo administrativo qualquer despacho fundamentado proferido ao abrigo do disposto no n.º 2 do art. 10.º do CIMI.

Assim sendo, não se vislumbra qualquer motivo para que o tribunal a quo dispondo da fundamentação da avaliação da qual resulta uma única data tivesse o dever de averiguar de outras datas que nem sequer foram consideradas para qualquer efeito na fase do procedimento.

Como é demais sabido, a fundamentação do acto tributário é escrita e contemporânea ao mesmo, não sendo admissível fundamentação a posteriori, é a partir da fundamentação que o tribunal afere da legalidade do acto sindicado. A fundamentação constitui o ponto de partida e o limite para aferir da legalidade do acto sindicado.

Os poderes inquisitórios do juiz consagrado no art. 13.º do CPPT, por um lado, não abrangem todas e quaisquer diligências, mas apenas aquelas que considere úteis, e por outro lado, esses poderes têm por limite “factos que lhes seja lícito conhecer” (n.º 1 art. 13.º do CPPT).

Assim sendo, não se reputa útil, e muito menos lícito, conhecer de factos ao abrigo do princípio do inquisitório que consubstanciem fundamentação a posteriori do acto tributário, sob pena do juiz exceder os poderes que dispõe ao abrigo do art. 13.º do CPPT.

Por conseguinte, a Meritíssima Juíza a quo ao ter considerado a data da licença de utilização (26/07/2007) para efeitos da aplicação da presunção do disposto no n.º 1 do art. 10.º do CIMI, não violou o princípio do inquisitório, e portanto não se verifica qualquer erro de julgamento de facto.

Por outro lado, a sentença recorrida também não enferma de erro de julgamento de direito, na medida em que se conjugou, e bem, o disposto no art. 9.º, n.º 1, alínea c) do CIMI que dispõe sobre o início da tributação, com o art. 10.º, n.º 1, alínea a) do mesmo código, que estabelece uma presunção de conclusão ou modificação dos prédios urbanos na mais antiga das datas a que se refere as alíneas a) a d), concluindo que, face à fundamentação do acto tributário, o caso dos autos subsume-se à situação prevista na alínea a), ou seja, a data em que for concedida licença camarária.

Sublinhe-se ainda que, o legislador previu no n.º 2 do art. 10.º do CIMI a possibilidade dessa presunção não relevar. Sucede que, para tal, o chefe do serviço de finanças deveria ter proferido despacho fundamentado com base os elementos que dispusesse.

Portanto, se a AT dispunha de outros elementos da CML com outra data, deveria ter proferido o despacho previsto naquele preceito legal, não o tendo feito, a liquidação impugnada, que não respeitou o início da tributação para efeitos de IMI, enferma de vício de violação de lei, como bem se decidiu na sentença recorrida, e nessa medida, improcedem todas as conclusões de recurso, não merecendo provimento o recurso.

III. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
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Custas pela Recorrente.
D.n.
Lisboa, 29 de Junho de 2017.



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Cristina Flora

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Cremilde Abreu Miranda

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Joaquim Condesso