Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1162/16.0BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:06/09/2021
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:IRC – SOCIEDADE EM LIQUIDAÇÃO
ACTIVIDADE ECONÓMICA
Sumário:I - As sociedades em liquidação estão sujeitas ao regime previsto no IRC.
II - Estão sujeitas a IRC quando exerçam actividade económica.
III - Se não ocorrer qualquer actividade económica não poderá haver lugar a tributação, por inexistência de facto tributário, não sendo aplicável à liquidação de bens da massa insolvente as regras do art.º 79º e segs. do Código do IRC.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I.          RELATÓRIO

M….., Lda, melhor identificada nos autos, deduziu IMPUGNAÇÃO Judicial contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), relativa ao ano de 2013, no montante de € 343.449,17.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por decisão de 11 de Fevereiro de 2019, julgou procedente a impugnação.

Inconformada, a FAZENDA PÚBLICA, veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:

            «A.       Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial interposta por M….., LDA., com o NIF ….., contra o despacho de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação oficiosa de IRC e de juros compensatórios, referente ao exercício de 2013, no valor total de € 343.449,17.

            B.         O Tribunal a quo determinou a anulação do actos de liquidação de IRC de 2013,baseado no entendimento de que “…a impugnante, no ano de 2013, não exerceu qualquer actividade lucrativa, tendo sido declarada insolvente e estando a decorrer o processo com vista à sua liquidação e encerramento. Não estando a sua actividade cessada, a impugnante teria de submeter a declaração modelo 22 de IRC, relativa ao exercício. O incumprimento deste dever declarativo, muito embora justifique a aplicação do disposto no art.º 90.º do CIRC, não permite manter uma liquidação oficiosa, na qual se apure imposto a pagar, quando, comprovadamente, a impugnante não desenvolveu qualquer actividade lucrativa no referido exercício.”

            C.        Não pode a Fazenda Pública, e com o devido respeito, conformar-se com a douta sentença, aqui recorrida, face ao entendimento de que a mesma procede a um desacertado julgamento da matéria de facto, incorrendo em consequente erro de julgamento de direito, com violação do disposto nos artigos 79.º e 90.º do CIRC e 74.º da LGT.

            D.        A recorrida foi declarada insolvente por sentença proferida, em 2010/12/29, no âmbito do processo nº ….., que correu termos no 1º Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa, foi nomeada a administradora de insolvência, mas não foi apresentada a registo a dissolução e o encerramento da liquidação daquela sociedade.

            E.         A recorrida, foi considerada faltosa em sede de IRC relativamente ao exercício de 2013, uma vez que não apresentou a declaração Modelo 22, nos termos e prazos estabelecidos nos artigos 117.º n.º 1, al.b) e 120.º, ambos do CIRC, razão pela qual a AT submeteu, em 2014/11/30, a declaração oficiosa de rendimentos validada com o nº ….., que determinou a emissão, para aquele exercício, da liquidação de IRC nº ….., que apurou imposto a pagar no montante de € 343.449,17.

            F.         Inconformada com a liquidação oficiosa de IRC, referente ao exercício de 2013, a Impugnante apresentou, em 2015/07/22, reclamação graciosa que foi instruída sob o processo nº …...

            G.        Posteriormente, em 2015/11/04, foi submetida uma declaração de rendimentos Modelo 22, (nº …..), relativa ao exercício de 2013, onde foi declarado um prejuízo fiscal de € 80.831,67 e uma matéria colectável nula, sendo, também nulo o montante do imposto apurado, declaração que não foi liquidada face à existência de liquidação oficiosa já liquidada.

            H.        Assim, a questão a deslindar no caso sub judice, e que terá implicações ao nível da legalidade ou ilegalidade da liquidação de IRC impugnada, consiste, em saber se uma sociedade dissolvida, na sequência de processo de insolvência, continua ou não a existir enquanto sujeito passivo de IRC, até à data do encerramento da liquidação, mantendo-se, assim, vinculada a obrigações fiscais, nomeadamente declarativas.

            I.          Compulsadas as normas contidas no Código das Sociedades Comerciais (CSC), podem ser várias as causas de dissolução das sociedades, porém, qualquer que seja a causa de dissolução, ela acarreta uma fase de liquidação do património societário conducente à extinção da sociedade, pois, como decorre do disposto no art.º 160º, nº 2, do CSC, a sociedade só é considerada extinta após o registo do encerramento da liquidação, mantendo até lá a personalidade jurídica, sendo sujeito de direitos e obrigações, a quem continua a ser aplicável, embora com as necessárias adaptações e em tudo que não for incompatível com o regime processual de liquidação, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas (cfr. art.º 146º do CSC).

            J.  Este tem sido o entendimento unânime da jurisprudência dos Tribunais Superiores e encontra- se vertido, nos Acórdãos supra citados, Acórdão do STA, de 24/02/2011, proferido no recurso nº 01145/09; Acórdão do STA de 24/09/2008, recurso nº 0199/08; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de 02/07/1996, recurso nº 423/96 e Acórdão do STJ de 12/10/2006, processo nº 06P2930.

            K.         Por conseguinte, em termos fiscais e designadamente para a aplicação dos mecanismos estruturais do IRC, o que é decisivo é a cessação de actividade, a qual só ocorre nas situações, expressamente, previstas no aludido nº 5, do art.º 8º do CIRC, ou seja, na data do encerramento da liquidação.

            L.         Isto é, inexistindo qualquer excepção prevista na lei, todas as sociedades dissolvidas, qualquer que seja a causa da dissolução, mantêm as obrigações fiscais e obrigações declarativas, sendo a sua responsabilidade do liquidatário ou do administrador da insolvência, conforme expressamente referido pelo nº 10, do art.º 117º do CIRC.

            M.        As sociedades em fase de liquidação mantêm a personalidade jurídica, ainda que exista a liquidação do património societário no sentido da extinção da sociedade, sendo que nos termos do nº 2 do art.º 160º do CSC, a sociedade só se considera extinta após o registo do encerramento da liquidação e até lá mantém a personalidade jurídica e continuam a ser-lhes aplicáveis, com as necessárias adaptações as disposições que regem as sociedades não dissolvidas.

            N.        O processo de insolvência não afasta a necessidade de as sociedades que vierem a ser declaradas insolventes possuírem contabilidade organizada, que deverá reflectir todas as operações com relevo contabilístico, e que será a base das declarações fiscais a apresentar.

            O.        Considerou o Tribunal a quo que a impugnante ao ter apresentado “a sua declaração de rendimentos para além do prazo legal” e aí ter declarado “uma matéria tributável nula, esta declaração ainda que não gozasse da presunção de veracidade consagrada no art.º 75.º da LGT, impunha que a AT realizasse as diligências necessárias ao correcto apuramento da matéria. Não o tendo feito, a AT violou o principio da tributação pelo rendimento real (art.º 104, n.º 2 da CRP)”.

            P.         Não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido, porquanto considera que da prova produzida não é de extrair a conclusão que serviu de base à decisão proferida, padecendo a mesma de erro na análise da matéria de facto e na aplicação do direito.

Vejamos,

            Q.        Refere o art. 16.º, n.º 1 do CIRC, que a matéria tributável é, em regra, determinada com base em declaração do contribuinte, sem prejuízo do seu controlo pela Administração Fiscal, e o n º 2 daquele artigo que, na falta de declaração, compete à Autoridade Tributária e Aduaneira, quando for caso disso, a determinação da matéria colectável.

            R.        A competência atribuída pelo n.º 2 do art. 16.º, nos casos em que se aplica, é confirmada pela al. b) do art. 89.º que prevê que, quando a liquidação não seja efectuada pelo próprio contribuinte, na declaração periódica de rendimentos, a liquidação é efectuada pela Autoridade tributária e aduaneira.

            S.         In casu, considerando a falta da declaração periódica de rendimentos, a AT, ao abrigo do art. 90º, nº 1, al. b), do CIRC, teve por base a totalidade da matéria colectável, (€ 1.270.553,95), do exercício mais próximo que se encontrava determinada, que in casu foi o exercício de 2012, na sequência de procedimento de inspecção tributária realizado a coberto da ordem de serviço nº …...

            T.         Como é sabido e é doutrina e jurisprudência aceites, o sistema fiscal português consagra a declaração do contribuinte como método regra de apuramento dos rendimentos tributáveis - art. 75º da LGT, na medida em que ali se estabelece a presunção legal de que a escrita/contabilidade dos contribuintes correspondia à verdade dos factos, se organizada segundo a lei comercial ou fiscal.

            U.        Desenvolvendo este princípio, os n.ºs 1 e 2 do art. 59º do CPPT estabelecem que “o procedimento de liquidação instaura-se com as declarações dos contribuintes ou, na falta ou vício destas, com base em todos os elementos de que disponha ou venha a obter a entidade competente”, e que ”o apuramento da matéria tributável far-se-á com base nas declarações dos contribuintes, desde que estes as apresentem nos termos previstos na lei e forneçam à administração tributária os elementos indispensáveis à verificação da sua situação tributária” negrito nosso.

            V.         Assim, não tendo sido apresentada nos termos da lei a declaração com base na qual far-se-ia o apuramento da matéria tributável em IRC para o ano em questão, deixa de operar a presunção de verdade que aproveitava ao contribuinte se tivesse cumprido pontualmente a obrigação acessória de entrega da declaração de rendimentos, retornando-lhe o ónus de demonstrar que a sua matéria tributável é efectivamente inferior à oficiosamente apurada.

            W.        E na situação que ora se coloca, tributação em IRC daquele que seria o rendimento normal para o exercício em causa, segundo os valores declarados pela impugnante para efeitos de IRC, é exactamente a consequência de uma actuação estritamente vinculada à lei (designadamente ao art. 90º, n.º1, al. b), do CIRC), conforme o princípio da legalidade (pois, de acordo com o disposto no art. 266º, nº 2, da CRP, a Administração só pode agir nas condições em que a lei lho autoriza).

            X.         Estando fundamentado o critério utilizado na quantificação, é sobre o contribuinte que recai o ónus de demonstrar o erro ou manifesto exagero dessa quantificação.

            Y.         Como se doutrinou no Acórdão do TCA Norte de 11.04.2004, processo n.º 2257/04.9BEPRT, que aqui nos permitimos citar: “1.Efectuada liquidação oficiosa ao contribuinte por falta de apresentação da respectiva declaração de rendimentos, esta não pode ser simplesmente anulada por liquidação efectuada com base em declaração apresentada posteriormente pela recorrente e que deu origem a imposto de valor zero.”(realce e sublinhado nosso)

            Z.         Continuando: “É que, uma liquidação só pode ser anulada nos termos legais, nomeadamente por via oficiosa, por via de reclamação graciosa ou de impugnação judicial e nunca por mera iniciativa do contribuinte, como a acima descrita.”. (realce nosso).

            AA. A simples apresentação tardia de uma declaração de rendimentos da qual vem a resultar inexistência de imposto ou imposto inferior ao anteriormente liquidado não anula automaticamente a anterior liquidação, não existindo qualquer confirmação por parte da AF, uma vez que a mesma, sendo de valor nulo, não produziu quaisquer efeitos no ordenamento jurídico, e tal,

            BB. com o devido respeito, é imediatamente perceptível, uma vez que a produzir efeitos acarretaria a anulação da liquidação controvertida, o que, de acordo com a lei, e como resulta dos autos, não ocorreu.

            CC. Decorre então que, a liquidação oficiosa controvertida só pode ser anulada por inexistência de facto tributário ou excesso de liquidação, se a impugnante demonstrar concludentemente que se verificou inexistência ou excesso de liquidação, pelo que,

            DD. a simples apresentação tardia de uma declaração de rendimentos da qual vem a resultar inexistência de imposto não anula automaticamente a anterior liquidação, por tal não resultar do CIRC, nomeadamente do seu art. 103.º.

            EE. A entender-se como entendeu o Tribunal a quo, de que a mera entrega tardia de declaração de rendimentos modelo 22, com valor de matéria colectável nula, sem mais nenhuma prova do declarado deturpa o estipulado pelo legislador, uma vez que, claramente não é esse o sentido da lei, nem o entendimento da nossa jurisprudência.

            FF. Para a demonstração do erro de quantificação da matéria tributável da liquidação oficiosa, importava então, pela impugnante, a apresentação e prova de factos dos quais se pudesse concluir que no exercício de 2013, a impugnante não obteve o rendimento apurado pela AF, mas antes o prejuízo por si apresentado na declaração tardiamente apresentada, designadamente apresentando todos os elementos contabilísticos necessários à demonstração da credibilidade do apuramento do valor dos prejuízos do ano de 2013.

            GG. Deste modo, apenas se pode concluir que a impugnante nenhuma prova documental ofereceu para além da declaração modelo 22 apresentada após a liquidação controvertida, e isso mesmo resulta dos factos dados como provados pelo Tribunal a quo, pelo que,

            HH. não pode considerar-se a declaração de rendimentos – modelo 22 apresentada fora de prazo, como entendeu o Tribunal a quo, por si só, suficiente para demonstrar os factos susceptíveis de conduzir à anulação da liquidação, uma vez que a mesma não tem a força probatória que o Tribunal a quo lhe atribuiu, designadamente no que concerne ao valor probatório dos prejuízos ai meramente declarados, sem qualquer outra prova concludente que os mesmos efectivamente existiram e afastavam o apuramento de colecta a pagar.

            II. A douta sentença incorreu, pois, em erro de julgamento de facto, por ter considerado que o acto de liquidação oficioso do IRC de 2013, ilegal, ao invés de considerar que o aquele acto tributário não feriu qualquer um dos preceitos legais e parâmetros constitucionais invocados pela Impugnante, (e estabelecidos nos art.ºs 15º e 18º da LGT e 2º, nº 2 do CIRC - personalidade tributária e sujeito passivo; art.ºs 103º, nº 3 e 104, nº 4 – da CRP - princípio da tributação pelo lucro real).

            JJ. Padece, ainda de erro a douta sentença a quo, na medida em que desconsiderou o facto de a impugnante não ter feito, como lhe incumbia, prova da veracidade da declaração modelo 22 apresentada fora de prazo, nomeadamente documental, que atestasse a veracidade dessa Declaração e, daí, infirmasse a factualidade e, ademais, o cálculo apurado pela AT, no estrito cumprimento da lei, nos termos conjugados dos artigos 74.º, da LGT, e 16º, 79.º, 89.º al.b), e 90.º n.º 1 al,b),  todos do CIRC.

            KK. Destarte, decidindo da forma como decidiu, a douta sentença enferma de erro de julgamento de facto e de direito.

 

            Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., concedendo-se provimento ao recurso, deverá a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por acórdão que julgue a impugnação totalmente improcedente.

Sendo que, V. Exas. Decidindo, farão a Costumada Justiça.»


****

A MASSA INSOLVENTE DE M….., LDª, veio apresentar as suas contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:

«1 - Veio a Fazenda Nacional interpor recurso da douta sentença proferida a fls, que julgou procedente a impugnação oportunamente deduzida pela aqui recorrida.

2 - Diga-se, desde já, que nada existe a censurar na douta sentença proferida não assistindo qualquer razão á Fazenda Nacional.

3 - Ora a questão essencial (dizer-se-á mesmo a única questão) em apreço nos presentes autos é saber se uma sociedade anteriormente declarada insolvente é ou não sujeito passivo de IRC.

4 - Para tanto vem a Fazenda Nacional alegar que a declaração de insolvência da recorrida não acarreta a sua extinção mantendo-se obrigada a cumprir as suas obrigações declarativas fiscais

5 - Pelo que a mesma seria sujeito de passivo de IRC.

6 - Ora e ao contrário do que a Fazenda Nacional afirma, tentando escamotear a verdade, nunca a recorrida afirmou que a sociedade declarada insolvente se extinguia por via dessa declaração.

7 - O que a recorrida alega é extremamente simples a saber: Uma Massa Insolvente não é sujeito passivo de IRC

8 - Nem pode ser tributada em sede de IRC por meio de liquidações oficiosas porquanto

9 - Não exercendo, como no caso vertente, qualquer actividade económica não está sujeita a este imposto.

 10 - Com efeito uma Massa Insolvente que não exerça actividade comercial ou industrial depois de ser declarada insolvente e cuja única actividade, como sucedeu no caso vertente, consiste em liquidar o património e pagar, no possível, aos credores não é sujeito passivo de IRC.

11 - Dispõe o artº 2º do Código de IRC que são sujeitos passivos de imposto as sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, as cooperativas, as empresas públicas e as demais pessoas colectivas de direito público ou privado

12 - Sendo que nenhuma referência é feita nessa norma às Massas Insolventes.

13 - Nem sequer se pode afirmar que uma massa insolvente preenche os requisitos previstos nos artºs 15 e 18 nº nº 3 da LGT para ser considerada sujeito passivo da relação tributária pois

14 - Uma massa insolvente, uma vez declarada a insolvência da sociedade e encerrada a actividade, como ocorreu no caso vertente, prosseguindo para liquidação, só tem um fim ou actividade que consiste

15 - Única e exclusivamente na venda do património da insolvente (saliente-se, da insolvente e não dela, massa insolvente) para liquidar as dívidas, na medida do possível, da mesma insolvente.

16 - Admitir-se este tipo de tributação em sede de IRC onde não existem lucros constitui clara violação às normas vertidas nos artºs 103 nº 3 e 104 nº 2 da CRP na medida em que a tributação deve ser efectuada com base no rendimento real.

17 - Doutro passo o Código de IRC ao adoptar a menção de “ rendimento acréscimo “ quer abranger não só os ganhos resultantes da actividade produtora como também outros ganhos alheio a ela e por conseguinte as mais valias realizadas.

18 - Aquele conceito impede que as mais valias e lucros por si só possam ser tributadas autonomamente e desintegradas do rendimento global.

19 - Por outro lado o produto da venda dos bens que integram a massa insolvente não preenchem o conceito de mais ou menos valia estatuído no artº 46 do código do IRC (CIRC)

20 - Pelo que a tributação sem lucros como pretende a Administração Fiscal é inconstitucional por violação dos artºs 103 e 104 da CRP.

 21 - Não pode existir para uma massa insolvente o mesmo tratamento fiscal que para uma sociedade comercial pois estamos perante realidades jurídicas e jurídico-fiscais totalmente diversas.

22 - Sendo que por esta via que foram postos em causa os princípios da capacidade tributiva, da igualdade fiscal e da legalidade consignados nos artºs 103, nº 3 e 104 nº 2 da Constituição.

23 - Todos estes fundamentos estão e de um modo muito mais douto sufragados por jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Administrativo ver entre outros o Acordão proferido em 2 de julho de 2014 pelo Supremo Tribunal Administrativo

24 - E sobretudo o recente e douto Acordão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no processo 0876/15 em 8/11/2017 no qual é fixado que( em caso de sociedade declarada insolvente e encerrada a actividade ) se não ocorrer actividade económica não pode haver lugar à tributação, por inexistência de facto tributário, não sendo aplicável á liquidação de bens da massa insolvente as regras dos artº 73 e sega co CIRC..

25 - Perante estes factos, e reiterando que a recorrida não é sujeito passivo de IRC, e, por isso, a liquidação em causa deve ser anulada, no entanto, à cautela, e sem conceder, invoca-se a ilegalidade no apuramento da matéria coletável fixada pela AT.

26 - Com efeito na determinação do rendimento real a AT deve recorrer à avaliação indireta ou liquidação oficiosa apenas e unicamente quando estiverem reunidas condições que não permitem o recurso às regras da avaliação direta e a lei assim o estabelecer.

27 - Doutro passo o rendimento determinado pela AT, com recurso a métodos indiretos ou liquidação oficiosa, ao ter por base a realidade económica, contabilística e fiscal, bem como um conjunto de pressupostos identificáveis, não é mais do que o rendimento real presumido, pois o que se pretende obter é o valor mais aproximado do rendimento real e efetivamente obtido pelo contribuinte.

28 - Por fim e sem conceder, a liquidação oficiosa tendo como no caso vertente por base uma avaliação indireta, sendo subsidiária da avaliação directa, visa, no entanto, o mesmo objetivo que esta: a tributação do rendimento real, de acordo com o nº2 do art.104º da CRP.

29 - Só que, pela avaliação indireta e consequente liquidação oficiosa esse desiderato é efetuado através do apuramento de um rendimento presumido, mas sempre perspetivado como o rendimento real (é, na verdade, um rendimento real, ainda que presumido).

30 - E este entendimento é unanimemente sufragado quer pela jurisprudência quer pela doutrina.

31 - Nesse sentido, veja-se, por exemplo, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), Proc.0422/09, de 07/10/2009.

32 - Ora no caso vertente nada disso aconteceu pois a Autoridade Tributária fixou uma matéria coletável com base em rácios e margens de lucro inaplicáveis à recorrente, como se esta “ainda estivesse a operar no mercado concorrencial próprio do seu objeto de negócio, uma vez que tal rácio de rentabilidade tem como pressuposto que as empresas se encontrem a operar em condições normais, ou seja, nas condições mais frequentes nessa época e lugar com a diligência, técnica e preços geralmente praticados” e não curou de saber qual o rendimento presumido que se aproximaria do rendimento real. (Acórdão do STA de 02/07/2014).

33 - Desse modo, e reiterando que a recorrida não é sujeito passivo de IRC, e, por isso, a liquidação em causa deve ser anulada, no entanto, à cautela, e sem conceder, invoca-se a ilegalidade no apuramento da matéria coletável fixada pela AT.

34 - Não é devido qualquer imposto constante da liquidação notificada à recorrente porque, desde logo, a recorrida não é sujeito passivo de IRC

35 - E porque, mesmo que assim não se entenda, não havia razão para o recurso à aplicação da liquidação oficiosa.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis deve ser julgado improcedente o recurso interposto pela Fazenda Nacional e ser mantida a douta sentença recorrida como é de inteira JUSTIÇA.»

****

            O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

****

Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.

****


II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1. De facto
A sentença recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:      
          «A. A Impugnante foi declarada insolvente por sentença proferida a 29.12.2010, no âmbito do processo n.º ….., que correu termos no Tribunal de Comércio de Lisboa (cfr. fls. 30 do PRG apenso);
          B. No ano de 2013, a Impugnante não se encontrava cessada para efeitos de IRC, nem dissolvida ou encerrado o seu processo de liquidação (cfr. fls. 20 a 26 do PRG apenso);
          C. A Impugnante não apresentou a declaração modelo 22 de IRC referente ao exercício de 2013 (facto não controvertido);
          D. Em 30.11.2014, foi validada a declaração oficiosa de IRC n.º ….., relativa ao exercício de 2013, no valor de € 343.449,17 (cfr. fls. 13 do PAT apenso);
          E. Na sequência da fixação de rendimentos fixada considerando a totalidade da matéria colectável determinada para o exercício de 2012, no valor de € 1.270.553,95, em 21.01.2015, foi emitida, em nome da Impugnante, a liquidação oficiosa de IRC n.º ….., relativa ao exercício de 2013, com o valor a pagar de € 343.449,17 (cfr. fls. 16 do PRG apenso);
          F. Em 22.07.2015, a Impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação de IRC referida na alínea antecedente (cfr. fls. 1 a 8 do PRG apenso);
          G. Em 04.11.2015, a Impugnante submeteu uma declaração de rendimentos modelo 22 de IRC, relativa ao exercício de 2013, declarando um prejuízo fiscal de € 80.831,67 e uma matéria colectável nula, sendo nulo o montante de imposto apurado (cfr. fls. 12 a 17 do PAT apenso);
          H. A declaração referida na alínea antecedente ficou na situação de “Doc. Não Liquidável” (cfr. fls. 19 do PAT apenso);
          I. Por despacho de 23.06.2016, da Chefe de Divisão Administrativa da Direcção de Finanças de Lisboa foi indeferida a reclamação graciosa apresentada pela Impugnante (cfr. fls. 43 a 50 do PRG apenso).

*
FACTOS NÃO PROVADOS
          Não há factos que importe registar como não provados.
*
MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO
          O Tribunal julgou provada a matéria de facto, com relevância para a decisão da causa, com base na análise conjugada das informações, despachos e documentos, constantes dos autos e do PAT apenso, conforme referido em cada uma das alíneas do probatório.»

****

II.2. De Direito

Em sede de aplicação de direito, a sentença recorrida julgou a presente impugnação judicial procedente, por provada, e anulou a liquidação oficiosa de IRC, referente ao exercício de 2013.

Inconformada, a Fazenda Pública veio interpor recurso da referida decisão invocando que a sentença recorrida procede a um desacertado julgamento da matéria de facto, incorrendo em consequente erro de julgamento de direito, com violação do disposto nos artigos 79º e 90º do CIRC e 74º da LGT [conclusão de recurso C.]

Antes de mais, importa realçar que a recorrente não impugna a matéria de facto pelo que a mesma se encontra estabilizada.

Apreciando.

Alega a recorrente que a questão a deslindar consiste, em saber se uma sociedade dissolvida, na sequência de processo de insolvência, continua ou não a existir enquanto sujeito passivo de IRC, até à data do encerramento da liquidação, mantendo-se, assim, vinculada a obrigações fiscais, nomeadamente declarativas. [conclusão H.]

Vejamos.

Na apreciação do presente recurso iremos seguir de perto o já decidido no Acórdão deste TCAS, Proc. 107/15.0BESNT, em 13/05/2021, disponível em www.dgsi.pt, onde se apreciou questão idêntica da mesma impugnante, mas relativa a liquidação de IRC do exercício de 2012. No referido Acórdão escreveu-se o seguinte:

«Prosseguindo, a questão que agora nos propomos averiguar é saber se uma sociedade em processo de liquidação falimentar está ou não sujeita a obrigações fiscais, declarativas e de imposto.

O STA chamado a pronunciar-se, decidiu, em vários acórdãos que a sujeição ao regime do IRC continua a existir, com as necessárias adaptações, enquanto não se encerrar a liquidação, pois uma sociedade apenas se extingue após o registo do encerramento da liquidação (art. 160º/2 do CSC)[1].

Até lá, mantém a personalidade jurídica, sujeito de direitos e obrigações, a quem continua a ser aplicável, embora com as necessárias adaptações e em tudo que não for incompatível com o regime processual de liquidação, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas (cfr. artigo 146.º do CSC).

Com efeito, inexistindo qualquer exceção prevista na lei, todas as sociedade dissolvidas, qualquer que seja a causa da dissolução, mantém obrigações fiscais (nomeadamente a de possuir contabilidade organizada conforme a lei comercial e fiscal, embora com a derrogação de alguns princípios contabilísticos, como, por exemplo, o da «continuidade» ou o da «especialização do exercício») e obrigações declarativas, sendo a sua responsabilidade do liquidatário ou do administrador da insolvência, conforme expressamente é referido pelo nº 10 do artigo 117.º do CIRC.

E mesmo que se conclua ser inaplicável às sociedades em liquidação decorrente da declaração de insolvência do prazo de dois anos previsto no art. 79º/4 do CIRC para a dedução ao lucro tributável dos prejuízos anteriores à dissolução, tal não implica necessariamente que todo o regime contido na Subsecção V do Código do IRC, subordinada à epígrafe ―”Liquidação de sociedades e outras entidades, tenha de ser afastado relativamente a essas sociedades, e que elas não estejam obrigadas à determinação do lucro tributável e ao cumprimento das inerentes obrigações declarativas fiscais.

A declaração de falência e a entrada em período de liquidação não determina, por si só, a cessação em Imposto sobre o Rendimento.

Isto porque, durante o período de cessação progressiva da existência da sociedade, ou período de liquidação, pode existir alguma atividade económica geradora de rendimentos sujeitos a IRC (fruto, por exemplo, de negócios jurídicos que se continuaram a realizar, mormente negócios de execução duradoura que tiveram início antes da declaração de falência, ou fruto da confirmação de negócios do falido posteriores à declaração de falência - artigo 155.º, nº 2 do CPEREF), podendo o «Resultado da Liquidação», evidenciado pelo respetivo ―«Balanço», apresentar lucro.

Até porque o facto de uma sociedade entrar em fase de liquidação falimentar, não obsta a que possa retomar a sua atividade comercial após ter sido declarada insolvente (artigos 230.° a 234.° do CIRE).

Verificada, pois, a continuidade da sua qualidade de sujeito passivo de IRC, nos termos do artigo 2º do respetivo Código, o lucro tributável destas sociedades é, porém, determinado com referência a todo o período de liquidação do património societário como estipulado pelo n.º 8 do artigo 8.º e 79º/1 ambos do CIRC.

A sociedade em liquidação não só está vinculada ao cumprimento das obrigações declarativas fiscais como pode também ser sujeito passivo de IRC uma vez que, como também referiu o STA no ac. 0876/15 08-11-2017[2] a circunstância de se estar em presença de uma situação jurídica de falência e de liquidação do património não impede, como referimos, que se possam verificar ganhos fortuitos e inesperados, vendas de bens por valores que podem não só solver todas as dívidas como gerar sobras, incrementos patrimoniais esses para os quais nenhuma razão subsiste para se furtarem a tributação em sede de IRC.

Ou seja, se na sociedade insolvente ocorrer atividade económica geradora de rendimentos tributáveis em IRC eles encontram-se sujeitos às regras previstas nos arts. 73º e segs. do CIRC (correspondente ao art.º 79º na redação vigente em 2012).

Neste particular, é de acolher a posição assumida no referido acórdão do STA nº 01145/09: «decretada a falência, cessa a prossecução do objeto social da empresa e, portanto, a obtenção de lucros que é a base do IRC — cfr. artºs 1º e 3º do CIRC — deixando de existir ativo imobilizado, como tal, uma vez que todos os bens da pessoa coletiva são apreendidos e passam a integrar a chamada massa falida, constituída por um acervo de bens e direitos retirados da disponibilidade da sociedade e que serve exclusivamente, depois de liquidado, para pagar os créditos reconhecidos”.

Como se destacou no referido acórdão nº 01079/03 a propósito da venda do ativo imobilizado, mas cuja doutrina nos parece aplicável aos restantes bens do ativo, com a declaração de falência não há mais activo imobilizado, qua tale, sendo, antes, todos os bens apreendidos, passando a constituir um novo património, a chamada ―”massa falida, que constitui um acervo de bens e direitos retirados da disponibilidade da sociedade e que serve exclusivamente, depois de liquidado, para pagar, primeiramente, as custas processuais e as despesas de administração e, depois, os créditos reconhecidos[3].

Isto sem ignorar que durante o período de cessação progressiva da existência da sociedade, ou período de liquidação, pode existir alguma atividade económica geradora de rendimentos sujeitos a IRC, como acima se referiu (fruto, por exemplo, de negócios jurídicos que se continuaram a realizar, mormente negócios de execução duradoura que tiveram início antes da declaração de falência, ou fruto da confirmação de negócios do falido posteriores à declaração de falência – artigo 155.º, nº 2 do CPEREF), podendo o «Resultado da Liquidação», evidenciado pelo respetivo ―«Balanço», apresentar lucro tributável.

Porém, se não ocorrer qualquer atividade económica não poderá haver lugar a tributação, por inexistência de facto tributário, não sendo aplicável à liquidação de bens da massa insolvente as regras do art.º 79º e segs. do Código do IRC, como se explicitou no acórdão do STA de 29/10/2003, no recurso nº 01079/03.

No mesmo sentido decidiu o douto acórdão do STA proferido em 3/11/2016 no recurso nº 0448/14, que «Com base na falta de apresentação de declaração de rendimentos e impossibilidade de comprovação e quantificação directa do lucro tributável, poderia a Administração Tributária proceder à determinação do lucro tributável com recurso a métodos indirectos, se, tendo em conta a sua declaração de falência e a sua declaração de que cessou a sua actividade comercial em 1991, apenas relativamente às condições que subsistam de sujeição ao IRC, para além das que derivam do exercício de uma actividade económica, como sejam os negócios jurídicos que se possam ter continuado a realizar seja por serem de execução duradoura que se protelou para além da declaração de falência, ou por terem resultado da confirmação de negócios do falido posteriores à declaração de falência, ou, até pelo que sobrou do produto da venda dos bens que integravam a massa insolvente depois de pagas as dívidas da massa e os créditos reconhecidos.»[4].

No caso concreto, a AT apurou proveitos ou ganhos como se fossem derivados de operações inerentes a uma atividade normal da empresa, a coberto dos artigos 20.º/1-a), e art. 3º do CIRC e refletiu os gastos incorridos tendo por base os rácios disponíveis na Base de Dados da AT, mais especificamente o indicador do valor acrescentado bruto da actividade (R17-MBII) que relaciona as prestações de serviços/transmissão de bens com custo das mercadorias vendidas e das matérias consumidas (CMVMC) e fornecimentos e serviços externos (FSE) dos contribuintes pertencentes ao universo (CAE 41200), deduzindo encargos financeiros idênticos aos contabilizados em 2010.

Acrescentando que uma vez que a maioria das frações referentes ao imóvel foram alienadas por um valor de venda inferior ao seu valor patrimonial assim, nos termos da alínea a) do n.º 3 do art.º 64º do CIRC, temos a acrescer ao rendimento presumido € 554.463,00...”. .

Assim, a AT apurou a matéria coletável no montante de € 1.270.553,95 à qual aplicou a taxa normal de IRC - 25% - liquidando imposto no montante de € 317.638,49 (cfr. art. 87º/1 CIRC, na redação vigente à data).

Como se depreende da matéria de facto fixada, a sociedade já não desenvolvia a atividade própria daquele que foi o seu objeto social tendo-se limitado o liquidatário judicial a alienar o património apreendido para a massa falida para dar pagamento aos credores reclamantes.

E apesar não terem sido cumpridas obrigações fiscais declarativas –que se mantinham conforme doutrina acolhida no referido acórdão nº 01145/09 – permitindo à Administração Tributária averiguar, através de ação inspetiva (como aconteceu) se a empresa tinha ou não continuado a exercer atividade económica e, no caso afirmativo, proceder à determinação do lucro tributável em sede de IRC, esta omissão não integra, sem mais, fundamento para a tributação em imposto sobre o rendimento.

A venda que teve lugar é uma venda de bens de um património autónomo (massa falida) que visa a satisfação dos credores em concurso universal.

Não é uma venda de bens do seu ativo circulante com vista à obtenção de lucro, nem do imobilizado para realização de mais, ou menosvalias. É uma venda de bens apreendidos para a massa falida visando a satisfação dos credores, cujo resultado não integra o conceito de lucro sobre o qual possa incidir IRC (cfr. art. 3º/1-a) CIRC).

Dito de outro modo, a alienação dos imóveis não resulta da atividade da Impugnante, não visou a obtenção do lucro, não resultou de negócios jurídicos que se tenham continuado a realizar seja por serem de execução duradoura que se protelou para além da declaração de falência. Nem é resultado da confirmação de negócios do falido posteriores à declaração de falência, ou, até pelo que sobrou do produto da venda dos bens que integravam a massa insolvente depois de pagas as dívidas da massa e os créditos reconhecidos.

Portanto, a venda não se insere na atividade da insolvente e o capital realizado não está sujeito a IRC.

Entraríamos agora na questão de saber se estão reunidos os pressupostos para a avaliação indireta e se o contribuinte provou o excesso na quantificação, para além da questão de saber quais os efeitos da apresentação da declaração mod. 22 no procedimento de revisão da matéria tributável.

No entanto, uma vez que a liquidação não resulta de qualquer atividade da Impugnante, como deixámos exposto, nem das restantes circunstâncias acima referenciadas suscetíveis de tributação em IRC, a apreciação destas questões fica necessariamente prejudicada (art. 608º/2 "ex vi" do art. 663º/2 CPC).»

No caso concreto dos presentes autos, na sequência da fixação de rendimentos fixada considerando a totalidade da matéria colectável determinada para o exercício de 2012, no valor de € 1.270.553,95, em 21.01.2015 foi emitida liquidação oficiosa de IRC relativa ao exercício de 2013, com o valor a pagar de € 343,449,17, cfr. alínea E) do probatório.

Isto é, a liquidação oficiosa de IRC do exercício de 2013, foi emitida na sequência da fixação de rendimentos fixada considerando a totalidade da matéria colectável para o exercício de 2012 que foi o exercício apreciado e decidido pelo Acórdão que temos vindo a citar, pelo que tem inteira aplicação ao caso dos presentes autos.

Deste modo, naquele, como neste caso, uma vez que a liquidação não resulta de qualquer actividade da Impugnante, nem das restantes circunstâncias acima referenciadas suscetíveis de tributação em IRC, a apreciação das restantes questões fica necessariamente prejudicada (art. 608º, nº 2 ex vi do art. 663º, nº 2, do CPC).

Termos em que improcede o presente recurso e se mantém a sentença recorrida.


***

Uma pequena nota final relativamente à dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, nº 7 do RCP, tendo em consideração que o valor da causa foi fixado em € 343.449,17.

No caso concreto, ponderado o comportamento processual das partes litigantes, a complexidade do processo, e atendendo a que as questões decidendas não exigiram do julgador especiais e diversos conhecimentos técnicos e jurídicos, consideramos ser de dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 7, do RCP.


****

III – DECISÃO

Termos em que, acordam os Juízes da 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida.

Custas pelo recorrente, com dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 7, do RCP.

Registe e notifique.

                                                             Lisboa, 9 de Junho de 2021

[O relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo art. 03.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, os Desembargadores Maria Cardoso e Catarina Almeida e Sousa]

______
[1] Com a devida vénia, seguimos neste segmento a doutrina do ac. do STA proferido no processo n.º 01145/09 de 24-02-2011 Relator: DULCE NETO 

[2] Ac. do STA n.º 0876/15 de 08-11-2017 Relator: DULCE NETO

Sumário: I - A circunstância de se estar em presença de uma situação jurídica de falência e de liquidação do património não impede que se possam verificar ganhos fortuitos e inesperados, vendas de bens por valores que podem não só solver todas as dívidas como gerar sobras, incrementos patrimoniais esses para os quais nenhuma razão subsiste para se furtarem a tributação em sede de IRC.
II - Por conseguinte, se na sociedade falida ocorrer actividade económica geradora de rendimentos sujeitos a IRC, tais rendimentos encontram-se sujeitos às regras de tributação previstas nos arts. 73º e segs. do CIRC; todavia, se não ocorrer actividade económica não pode haver lugar a tributação, por inexistência de facto tributário, não sendo aplicável à liquidação de bens da massa insolvente as regras do art.º 73º e segs. do Código do IRC. 

[3] Ac. do STA 01079/03 29-10-2003 Relator: BRANDÃO DE PINHO

Sumário: I - A venda de bens que integravam o activo imobilizado de uma sociedade entretanto declarada falida, efectuada nos autos de liquidação do respectivo activo, não integra o conceito de mais-valias e menos-valias previsto no artº 43º do CIRC.
II - Com efeito, com a declaração de falência, não há mais activo imobilizado, qua tale, sendo, antes, todos os bens apreendidos, passando a constituir um novo património, a chamada "...": um acervo de bens e direitos retirados da disponibilidade da sociedade e que serve exclusivamente, depois de liquidado, para pagar, primeiramente, as custas processuais e as despesas de administração e, depois, os créditos reconhecidos. 

[4] Ac. do STA n.º 0448/14 de 03-11-2016 Relator: ANA PAULA LOBO

Sumário: I - A Administração Tributária não pode proceder à determinação da matéria tributável, por métodos indirectos, em sede de IRC, para o exercício de 2004 de uma empresa declarada falida em 1991, que cessou imediatamente a sua actividade, facto comunicado à 3ª Repartição de Finanças do Concelho de Sintra - Cacém em 6-1-91, com base exclusivamente nos proveitos auferidos pela venda de imóveis levada a cabo pelo gestor e liquidatário da falência.
II - A venda que tem lugar nos autos de liquidação do activo da empresa, que foi declarada falida não é uma venda de bens do seu activo imobilizado, mas a venda de bens da referida massa falida com vista à satisfação dos credores, em concurso universal.
III - Com base na falta de apresentação de declaração de rendimentos e impossibilidade de comprovação e quantificação directa do lucro tributável, poderia a Administração Tributária proceder à determinação do lucro tributável com recurso a métodos indirectos, se, tendo em conta a sua declaração de falência e a sua declaração de que cessou a sua actividade comercial em 1991, apenas relativamente às condições que subsistam de sujeição ao IRC, para além das que derivam do exercício de uma actividade económica, como sejam os negócios jurídicos que se possam ter continuado a realizar seja por serem de execução duradoura que se protelou para além da declaração de falência, ou por terem resultado da confirmação de negócios do falido posteriores à declaração de falência, ou, até pelo que sobrou do produto da venda dos bens que integravam a massa insolvente depois de pagas as dívidas da massa e os créditos reconhecidos.