Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2327/08.4BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:10/10/2019
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL POR FACTO LÍCITO,
IMPUGNAÇÃO DO JULGAMENTO DE FACTO,
LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
Sumário:I. A impugnação do julgamento de facto ocorre perante os pressupostos e exigências previstas no artigo 640.º do CPC, incumbindo ao recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto “obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição” o que dispõem as alíneas a), b) e c) do seu n.º 1 e dar cumprimento às demais prescrições do preceito.
II. Ao Tribunal de recurso assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo Tribunal a quo, desde que ocorram os pressupostos previstos nos artigos 662.º do CPC e 149.º do CPTA, incumbindo-lhe reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada e apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.
III. Não obstante a amplitude conferida a um segundo grau de jurisdição, não se está perante um segundo ou novo julgamento de facto, porquanto, tal possibilidade de conhecimento está confinada aos pontos de facto considerados incorretamente julgados e desde que cumpridos os pressupostos fixados no artigo 640.º, nºs. 1 e 2 do CPC, além de que o controlo de facto, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos não pode aniquilar a livre apreciação da prova do julgador, construída dialeticamente na base da imediação e da oralidade.
IV. A garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não pode postergar o princípio da livre apreciação da prova por parte do julgador, previsto no n.º 5 do artigo 607.º do CPC, intervindo na formação da convicção não apenas elementos racionalmente demonstráveis, mas também fatores não materializados.
V. A valoração de um depoimento não é absolutamente percetível através da gravação e/ou da respetiva transcrição, pois existem inúmeros aspetos comportamentais dos depoentes que não são passíveis de ser registados numa simples gravação e que, como tal, foram apreendidos ou percecionados pelo juiz.
VI. O Tribunal a quo está numa posição privilegiada em termos de recolha dos elementos e sua posterior ponderação, nomeadamente, com a articulação de toda a prova produzida, de que decorre a convicção expressa na decisão proferida sobre a matéria de facto, pelo que, a convicção formada a partir da globalidade dos meios de prova é de difícil destruição, sobretudo ao pretender-se pô-la em crise através de indicações parcelares ou referências genéricas.
VII. Os factos são aqueles que constam como provados nos autos, pelo que, quaisquer outros não podem ser considerados ou valorados pelo Tribunal.
VIII. Na vigência do D.L. n.º 48.051 a obrigação de indemnizar por facto lícito, por encargos ou prejuízos especiais e anormais, abrange os lucros cessantes.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – RELATÓRIO

O Metropolitano de Lisboa E.P., devidamente identificado nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 05/06/2015, que no âmbito da ação administrativa comum, sob a forma ordinária, instaurada pela P..... & S....., Lda., julgou a ação procedente, condenando o Réu no pedido de condenação ao pagamento da indemnização no valor de € 150.982,70, por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa de 4% e devidos desde 30/10/2008 até integral pagamento.


*

Formula o aqui Recorrente nas respetivas alegações as seguintes conclusões que infra e na íntegra se reproduzem:

a) A ora Recorrente não pode aceitar a decisão condenatória proferida por a mesma se afigurar manifestamente infundamentada, tanto por força da matéria de facto dada como provada, como por força da subsunção dessa matéria de facto ao direito.

b) A ora Recorrente entende por isso verificar-se uma situação de erro na Apreciação da Matéria de Facto dada como Provada, porquanto recuperada a prova produzida nos presentes autos, quer testemunhal, quer documental, a Ré ora Recorrente não se pode conformar com a matéria de facto da por provada, sendo evidente que a mesma incorre manifestamente em erro de apreciação e conclusão.

c) Com todo o devido respeito que nos merece o Tribunal a quo, bem como a Sentença proferida, a ora Recorrente não pode aceitar uma tal decisão por a mesma se afigurar manifestamente infundamentada, tanto por força da matéria de facto dada como provada, bem como de matéria de facto que se encontra – com o devido respeito que é muito - erradamente considerada como não provada, e ainda por força da subsunção dessa matéria de facto (provada e a contrário a não provada) ao direito, e bem assim da definição do direito que lhe é aplicável.

d) Quanto ao erro na Apreciação da Matéria de Facto dada como Provada e recuperada a prova produzida nos presentes autos, quer testemunhal, quer documental, a Ré ora Recorrente não se pode conformar com a matéria de facto dada por provada, sendo evidente que a mesma, com o devido respeito pelo Tribunal a quo incorre manifestamente em erro de apreciação e conclusão.

e) Quanto ao Depoimento da Testemunha J.......e a título prévio e sendo uma questão transversal a toda a matéria de facto dada como provada, a Recorrente não pode deixar de relevar e recorrer da valoração que o Tribunal a quo conferiu ao depoimento da Testemunha J…...

f) Porquanto, esta Testemunha começou desde logo o seu depoimento declarando ao Tribunal a quo em resposta aos costumes, bem como aos esclarecimentos pedido pelo Mandatário da Ré, afirmou que era Secretário-geral da ARESP e que nenhuma relação tinha com a A. P….. Lda.

g) Analisada a documentação junta com a PI, verificamos que se encontram juntos os documentos n.º 26, 27 e 28, constantes de cartas remetidas pela referida ARESP à Ré, em defesa dos interesses da A. e subscritas pelo referido Secretário-geral da ARESP, a Testemunha J….., no âmbito das quais diz a determinado momento aquela Testemunha “no caso vertente, das Pastelarias S….. e V….., fazemos questão de salientar que, não obstante serem ambas participadas pelo signatário, não deve as mesmas receber tratamento preferencial”.

h) Percebe-se no entanto agora que aquela Testemunha tinha ou teve manifesto interesse na decisão a proferir nos presentes autos, tendo prestado um depoimento quer como Testemunha arrolada pelo A. quer depois como Testemunha arrolada pelo A., a todos os títulos tendencioso e deturpado da realidade dos factos ocorrido no local, pelo que depôs de forma parcial, não merecendo por isso qualquer credibilidade o seu depoimento.

i) Deve o Depoimento da Testemunha J.......ser nulo e desvalorizado em sede de motivação e fundamentação dos factos sobre os quais depôs, designadamente quanto aos Factos sobre os quais foi o único depoente e que se identificam como os Factos Provados n.º 11, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 28, 30, 31, 32, 34 e 36 da Matéria de Facto Provada (MFP), os quais por esse facto não se encontram provados nos presentes autos.

j) Existem vários Factos Controvertidos considerados como Provados por erro na apreciação da Prova Testemunhal e Documental constante dos autos.

k) Relativamente ao Facto Provado n. 11 o Tribunal a quo não fez uma correta valoração da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, porquanto não corresponde à verdade que este Facto se encontre provado “por acordo entre as Partes”, logo, também não poderia dar como provado o facto constante do n.º 11, porquanto caberia à A., ora Recorrida fazer prova testemunhal ou documental daquele facto, o que não aconteceu, pelo que aquele facto carece absolutamente de produção de prova.

l) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada e o Facto Provado n.º 11 deve passar a Facto Não Provado.

m) Relativamente ao Facto Provado n.º 15, o Tribunal “a quo” não poderia dar como provado o facto constante do n.º 15, porquanto caberia à A., ora Recorrida fazer prova testemunhal ou documental daquele facto, o que não aconteceu, pelo que aquele facto carece absolutamente de produção de prova.

n) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada e o Facto Provado n.º 15 deve passar a Facto Não Provado.

o) Relativamente aos Factos Provados n.º 16 e n.º 17 ficou provado nos presentes autos que as grandes escavações a que a obra obrigou ocorreram no quarteirão da Avenida Duque d’Ávila entre a Avenida Defensores de Chaves e a Avenida da República.

p) Mais, de igual modo, ficou também provado que não existiram quaisquer grandes escavações no cruzamento desta (Av. Duque d’Ávila) com a Avenida de República, mas que nesta avenida apenas ocorreram obras complementares e de pequena dimensão, bem como a influência dos desvios de trânsito, por forma a assegurar que “o trânsito continuasse a fluir sem grandes perturbações”;

q) O Tribunal “a quo” não poderia dar como provado os factos constantes do n.º 16 e 17, porquanto os mesmos não correspondem com exactidão à realidade verificada e testemunhalmente provada nos presentes autos;

r) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada relativamente ao Facto Provado n.º 16, que deve passar a ter a seguinte redação “A obra obrigou a grandes escavações na Avenida Duque D'Ávila, no quarteirão compreendido entre a Avenida Defensores de Chaves e a Avenida 5 de Outubro - cfr. fls. 25-34 e 603-604 dos autos”, sendo que o Facto Provado n.º 17 deve passar a figurar como Facto Não Provado.

s) Relativamente ao Facto Provado n.º 18 ficou provado nos presentes autos que o trânsito automóvel não se encontrava cortado em ambos os sentidos da Avenida Duque D'Ávila, ao longo de toda a extensão desta desde o cruzamento desta com a Avenida Defensores de Chaves, passando pelo cruzamento com a Avenida da República, até ao cruzamento com a Avenida 5 de Outubro, sendo possível circular normalmente desde o inicio do quarteirão da Av. Duque d’ Ávila, a partir da Av. 5 de Outubro e por essa via chegar de automóvel ao estabelecimento da A., junto ao qual efectivamente havia um impasse e os veículos davam a volta e voltavam para trás, pelo que se encontrava apenas impedida a saída para a Av. da República.

t) Logo, para o que aqui interessa, o Tribunal a quo não poderia dar como provado o facto constante do n.º 18, porquanto o mesmo não corresponde com exactidão à realidade verificada e testemunhalmente provada nos presentes autos.

u) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada relativamente ao Facto Provado n.º 18, que deve passar a ter a seguinte redação “A travessia da Av. da República pelo trânsito automóvel que circulava na Avenida Duque D'Ávila foi cortado em ambos os sentidos, sendo que no quarteirão com inicio na Avenida 5 de Outubro e até à Avenida da República o transito automóvel podia circular até ¾ do quarteirão, sem contudo poder sair para o cruzamento com a Avenida da República, mas permitindo chegar por viatura junto do estabelecimento da A.”.

v) Relativamente aos Factos Provados n.º 19, 20, 21 e 23 que não ficou provado nos presentes autos, que a colocação de vedações e tapumes aumentou em muitas dezenas de metros percursos curtos, com exceção e apenas para o período compreendido entre 17/01/2007 e 26/02/2007, isto é cerca de 40 dias, durante os quais os acessos anteriormente existentes não puderam ser utilizados e daí obrigarem aos desvios de circulação dos peões.

w) Ao invés ficou provado que durante todo o demais tempo de decurso das obras, o percurso foi sempre o mesmo, permitindo andar no passeio ao lado da Pastelaria S……, e percorrer a montra de todo o estabelecimento, contornando da Av. Duque d’Ávila para a Avenida da República.

x) Pelo que, por maioria de razão, e na sequência do que se conclui para o Factos Provados n.º 19, 20 e 21, igualmente também não pode ser considerado provado que o referido naqueles factos “torna o percurso confuso”, assim sendo de eliminar o Facto Provado n.º 23.

y) Logo, o Tribunal a quo não poderia dar como provado os factos constantes dos n.º 19, 20, 21 e 23, porquanto os mesmos não correspondem em nada com a realidade verificada e que se encontra provada através da prova documental e testemunhal produzida nos presentes autos.

z) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada relativamente aos Factos Provados n.º 19, 20, 21 e 23 passar a figurar como Factos Não Provados, ou no limite, sem conceder, quanto aos factos n.º 19, 20 e 21, especificar em concreto o período temporal durante o qual o percurso de acesso ao estabelecimento da A. se fez por entre tapumes, remetendo o mesmo para a planta dos desvios de peões aprovada pela CML e junta aos autos.

aa) Relativamente ao Facto Provado n.º 22 encontra-se provado nos autos que os tapumes ali colocado tinha dois metros de altura, sendo o primeiro metro de altura opaco e o segundo metro de altura em grade.

bb) Pelo que o Tribunal “a quo” não poderia dar como provado o facto constante do n.º 22, porquanto nenhuma prova foi produzida pela A., ora Recorrida relativamente a este facto, pelo contrário foi produzida contraprova que indiscutivelmente permite concluir que se trata de matéria de facto não provada.

cc) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada e o Facto Provado n.º 22 deve passar a Facto Não Provado.

dd) Relativamente ao Facto Provado n.º 25, o Tribunal a quo não fez uma correta valoração da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, porquanto não corresponde à verdade que este Facto se encontre provado dado que nenhuma prova foi produzida pela Autora sobre esta matéria.

ee) Logo, o Tribunal “a quo” não poderia dar como provado o facto constante do n.º 25, porquanto caberia à A., ora Recorrida fazer prova testemunhal ou documental daquele facto, o que não aconteceu, pelo que aquele facto carece absolutamente de produção de prova.

ff) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada e o Facto Provado n.º 25 deve passar a Facto Não Provado.

gg) Relativamente aos Facto Provados n.º 24 a 28 e 31 estão os mesmos feridos de imprecisão temporal, porquanto como resulta dos autos todos estes factos tem de ser descritos por referência ao período a partir de 2007.

hh) Logo, relativamente a esta factualidade expressa nos Factos Provados 24 a 28, o Tribunal a quo deveria ter salvaguardado a indicação expressa do período temporal durante a qual ou a partir de que data a mesma se verificou, porquanto a A. invocou nos seus articulados que estes factos se verificaram durante todo o período de 2004 a 2008, o que não pode ser dado como provado, porquanto caberia à A., ora Recorrida fazer prova testemunhal ou documental daqueles factos durante todo aquele período, o que não aconteceu, pelo que aquele facto carece absolutamente de uma especificação temporal de acordo com a produção de prova verificada nos autos.

ii) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada e acrescentado um novo Facto Provado n.º 31-A com a seguinte redação: “Os factos referidos em 24 a 28 e 31 apenas ocorreram após o inico do ano de 2007”.

jj) Relativamente ao Facto Provado n.º 30 o Tribunal a quo não fez uma correta valoração da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, porquanto não corresponde à verdade que este Facto se encontre provado dado que nenhuma prova foi produzida pela Autora sobre esta matéria.

kk) Logo, o Tribunal “a quo” não poderia dar como provado o facto constante do n.º 30, porquanto caberia à A., ora Recorrida fazer prova testemunhal ou documental daquele facto, o que não aconteceu, pelo que aquele facto carece absolutamente de produção de prova.

ll) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada e o Facto Provado n.º 30 deve passar a Facto Não Provado.

mm) Relativamente ao Facto Provado n.º 31 e n.º 32 o Tribunal a quo não fez uma correta valoração da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, porquanto não corresponde à verdade que este Facto se encontre provado dado que nenhuma prova foi produzida pela Autora sobre esta matéria.

nn) Não ficou provado nos presentes autos que tenha efectivamente existido um afastamento da clientela do estabelecimento da Autora, encontrando-se apenas invocada pela A. uma quebra de receitas durante esse período o que não pode ser confundido com a redução de clientela.

oo) Não foi produzida qualquer prova nos presentes autos, não correspondendo de todo à verdade que a referida clientela tenha procurado os serviços de estabelecimentos congéneres, nas imediações, porquanto não foi junto aos autos ou produzida em sede de audiência de julgamento qualquer prova testemunhal relativamente a esse facto.

pp) É forçoso concluir da prova produzida que não se verificou qualquer migração ou perda de clientela em beneficio dos outros estabelecimentos congéneres nas imediações e designadamente da Pastelaria V…., também ela queixosa segundo a ARESP.

qq) Pelo que este o Facto Provado n.º 32 não se encontra provado dado que nenhuma prova foi produzida pela Autora sobre esta matéria, logo, o Tribunal “a quo” não poderia dar como provado os factos constantes do n.º 31 e 32, porquanto caberia à A., ora Recorrida fazer prova testemunhal ou documental daquele facto, o que não aconteceu, pelo que aquele facto carece absolutamente de produção de prova.

rr) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada e os Factos Provados n.º 31 e 32 devem passar a Facto Não Provado.

ss) Quanto ao erro na Apreciação da Matéria de Facto dada como Não Provada, recuperada a prova produzida nos presentes autos, quer testemunhal, quer documental, a Ré ora Recorrente não se pode conformar com a matéria de facto dada por não provada, sendo evidente que a mesma, com o devido respeito pelo Tribunal a quo incorre manifestamente em erro de apreciação e conclusão.

tt) Relativamente ao facto não provado de que apenas no período de 17/01/2007 a 26/02/2007 houve maiores alterações à circulação do trânsito pedonal o Tribunal a quo não quis considerar a prova documental (plantas juntas como Doc. n.º 2), nem tão pouco a prova testemunhal produzida nos autos, e considerou que esse facto não resulta provado nos autos.

uu) Apenas no período em que foi necessário realizar trabalhos complementares junto ao estabelecimento da A. é que o acesso ao estabelecimento sofreu uma alteração temporária e breve no percurso pedonal.

vv) Ficou inequivocamente provado nos presentes autos, que apenas para o período compreendido entre 17/01/2007 e 26/02/2007, isto é cerca de 40 dias, é que houve maiores alterações na circulação do trânsito pedonal de acesso ao estabelecimento, durante o qual os acessos anteriormente existentes não puderam ser utilizados.

ww) Mais ficou provado que durante todo o demais tempo de decurso das obras, o percurso foi sempre o mesmo, permitindo andar no passeio ao lado da Pastelaria S......., e percorrer a montra de todo o estabelecimento, contornando da Av. Duque d’Ávila para a Avenida da República.

xx) Logo, o Tribunal a quo deveria dar como provado este facto, porquanto o mesmo se encontra invocado pela Ré e provado nos autos, em total correspondência com a realidade verificada, designadamente através da prova documental e testemunhal produzida nos presentes autos.

yy) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada e acrescentado como Facto Provado n.º 71 que “Apenas no período de 17/01/2007 a 26/02/2007 houve maiores alterações à circulação do trânsito pedonal”.

zz) Relativamente ao facto não provado de que antes do início das obras não era possível estacionar em frente à "Pastelaria S…..", a qual se situa numa zona em que sempre houve poucos lugares de estacionamento disponíveis, invocado pela Ré esta produziu prova suficiente para que o facto fosse considerado provado.

aaa) Pelo que ficou inequivocamente provado nos presentes autos, que antes do inicio das obras já não era possível estacionar em frente aio estabelecimento da A.

bbb) Logo, o Tribunal a quo deveria dar como provado este facto, porquanto o mesmo se encontra invocado pela Ré e provado nos autos, em total correspondência com a realidade verificada, designadamente através da prova testemunhal produzida nos presentes autos.

ccc) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada e acrescentado como Facto Provado n.º 72 que “Antes do início das obras não era possível estacionar em frente à "Pastelaria S……", a qual se situa numa zona em que sempre houve poucos lugares de estacionamento disponíveis”.

ddd) Relativamente ao facto não provado de que a diminuição de clientela e a consequente retracção de vendas no período considerado de Setembro de 2004 a final de2007 é causada pela conjuntura recessiva, encontra-se provado nos presentes autos, que durante o período em discussão no presente litigio, existiu em simultâneo uma grave crise no sector da restauração e pastelaria, a qual configura uma conjuntura recessiva que evidentemente terá contribuído em muito para a redução do volume de receitas que a A. invoca nos autos.

eee) Logo, o Tribunal a quo deveria dar como provado este facto, porquanto o mesmo se encontra invocado pela Ré e provado nos autos, em total correspondência com a realidade verificada, designadamente através da prova documental produzida nos presentes autos.

fff) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada e acrescentado como Facto Provado n.º 73 que “A diminuição de clientela e a consequente retracção de vendas no período considerado de Setembro de 2004 a final de2007 é causada pela conjuntura recessiva”.

ggg) Relativamente ao facto não provado de que a Autora normalmente só tem uma porta em funcionamento ficou inequivocamente provado nos presentes autos, que o estabelecimento da Autora normalmente só tem uma porta em funcionamento.

hhh) Logo, o Tribunal a quo deveria dar como provado este facto, porquanto o mesmo se encontra invocado pela Ré e provado nos autos, em total correspondência com a realidade verificada, designadamente através da prova testemunhal produzida nos presentes autos.

iii) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada e acrescentado como Facto Provado n.º 74 que “A Autora normalmente só tem uma porta em funcionamento”.

jjj) Relativamente ao facto não provado de que os acessos ao estabelecimento da A. sempre estiveram completamente desimpedidos ficou inequivocamente provado nos presentes autos, apenas com uma ressalva relativa ao período compreendido entre 17/01/2007 e 26/02/2007, isto é cerca de 40 dias, durante o qual foi necessário realizar uma obra defronte do estabelecimento e que por isso foi necessário encerrar a porta principal e criar uma alteração na circulação do trânsito pedonal de acesso ao estabelecimento, pelo que durante esse período os acessos anteriormente existentes não puderam ser utilizados.

kkk) Mais ficou provado que, com excepção daquele curto período, durante todo o demais tempo de decurso das obras, o percurso foi sempre o mesmo, permitindo andar no passeio ao lado da Pastelaria S….., e percorrer a montra de todo o estabelecimento, contornando da Av. Duque d’Ávila para a Avenida da República.

lll) Logo, o Tribunal a quo deveria dar como provado este facto, embora com uma ressalva quanto à situação temporária de impedimento que ocorreu durante os referidos 40 dias, porquanto o mesmo se encontra invocado pela Ré e provado nos autos, em total correspondência com a realidade verificada, designadamente através da prova documental e testemunhal produzida nos presentes autos.

mmm) Por consequência, deve ser alterada a Matéria de Facto Provada e acrescentado como Facto Provado n.º 75 que “Os acessos ao estabelecimento da A. sempre estiveram completamente desimpedidos, com excepção para o período compreendido entre 17/01/2007 e 26/02/2007, isto é cerca de 40 dias, durante o qual foi necessário criar uma acesso alternativo”.

nnn) Quanto à aplicação da Matéria de Direito a questão essencial a decidir tendo em vista os pedidos e a causa de pedir consiste em saber se “a Autora deve ser indemnizada pelos prejuízos alegadamente sofridos decorrentes da realização das obras de ampliação da linha Vermelha do Metro, no trajecto entre a Estação da alameda e o Palácio da Justiça” e, por consequência, se a Ré deve ser condenada a indemnizar a A no valor peticionado de 150.982,70€, acrescidos de juros moratórios comerciais desde 28/10/2008, até efectivo reembolso, calculados à taxa anual de 11,2€.”

ooo) A Recorrente discorda da Mma. Juiz a quo em parte muito significativa da factualidade dada como provada na sentença ora recorrida, o que aqui se reitera, e bem como numa parte da factualidade que entende deveria ser dada como provada.

ppp) A presente apelação quanto à matéria de facto irá certamente, estamos em crer, alterar substancialmente toda a factualidade a ter em consideração nos presentes autos e designadamente em sede de aplicação da matéria de direito e, por consequência, no decisório a proferir.

qqq) Em todo o caso, ainda que assim não fosse, no que não se concede, a Recorrente entende que a sentença recorrida também ela se encontra equivoca precisamente na subsunção dos factos considerado provados ao preenchimentos dos pressupostos legais enunciados.

rrr) A Recorrente não aceita, porquanto não entende que se encontre demonstrado nos autos boa parte da factualidade enunciada pela Mma. Juiz a quo, nos termos em que ora se apela, e como tal não se verifica no caso em apreço uma situação em que se encontre comprovada a verificação de um dano resultante do acto ou actuação.

sss) Dos diversos factos considerados provados e invocados na Douta Sentença a quo, para fundamentar este pressuposto legal, a Recorrente apenas não apelou do facto que julga inequívoco e que sempre reconheceu e que consiste no facto de “em consequência das obras, entre 17/01/2007 e 26/02/2007, a Autora encerrou a porta da "Pastelaria S….." no n.º 1…… de polícia da Avenida da República e organizou o acesso ao seu estabelecimento por uma porta de recurso, mais estreita, sita no n.º 1…. de polícia da Avenida Duque D'Ávila”.

ttt) A Recorrente, quanto ao mais, entende que os factos não se passaram conforme ali estão descritos e se encontram equivocamente provados, pelo que não pode conceder que todas as circunstâncias ali invocadas tenham provocado o afastamento da clientela do estabelecimento da A. ora Recorrida, e muito menos, como supra de apelou, que tenha provocado uma migração para o estabelecimentos congéneres ali vizinhos.

uuu) Não pode igualmente a Recorrente concordar que a quebra de vendas no período de Setembro de 2014 a final de 2007, alegadamente imputada aos actos da Ré, se traduza em si mesmo num dano, porquanto é um facto inequívoco que uma redução da receita não implica necessariamente uma redução dos lucros, sendo até admissível que uma redução na receita possa geral um aumento do lucro, quando acompanhado de uma quebra superior nos custos ou na despesas necessária para gerar a receita.

vvv) A A. preocupou-se muito em apresentar ou fazer representar o seu alegado dano pela correspondente quebra de receitas, no entanto existe como se referiu diferença assinalável entre receitas e lucros, e só estes últimos e a sua redução se traduziriam num efectivo dano para a Autora.

www) Caberia então à Autora invoca o dano existente para poder subsumir a situação de facto no âmbito da responsabilidade civil extracontratual da Ré.

xxx) No entanto não o fez, e duvidas não podem subsistir que a A. não só não invocou os danos como não provou que os tivesse tido.

yyy) O que importaria apurar era do resultado efectivo que a A. teve durante esse período na suas contas, isto é, da diferença verificada entre a alegada quebra de receitas e as despesas na aquisição e produção dos bens que comercializa, o que poderia implicar uma efectiva quebra de resultados.

zzz) Se existiu uma quebra de receitas como alega, também é certo que existiu uma redução nas despesas, como aliás reconhece Testemunha S…. quando esclarece que recebia ordens para produzir menos quantidade de pastelaria, em face das quebras de vendas.

aaaa) Nos 10 anos anteriores à presente acção só por duas vezes a A. não apresentou prejuízos, sendo uma em 2001 (desconhecendo-se o resultado) e outra em 2004, exatamente num dos anos em que reclama danos, e que afinal a A. apresentou lucros, embora muito diminutos de 329,01€.

bbbb) Os prejuízos declarados em 2005 e 2006, outros dois anos em que reclama danos causados pela Ré, são os mais reduzidos faze aos prejuízos declarados nos exercícios dos últimos dez anos.

cccc) Não pode a Recorrente conceder e concordar com a Mma. Juiz a quo quanto a convicção expressa de que se encontra preenchido o pressuposto da verificação de um dano resultante da actuação da Ré, pelo que decai a pretensão da A. pela falta de verificação do pressuposto da verificação de um dano resultante da actuação da Ré.

dddd) Quanto ao nexo de causalidade a Recorrente está em desacordo com as conclusões da Sentença recorrida, porquanto entendendo que por um lado não ocorreu a actuação geradora de dano e por outro não ocorreu o dano, não pode obviamente a Recorrente admitir que se faça o juízo de prognose necessário à obrigação de indemnizar os danos, e que reflecte sobre o lesado provavelmente não teria sofrido tal dano se não fosse a lesão.

eeee) Não admitindo a Recorrente, por não se encontrar provada nos autos, a verificação de um dano, não temos qualquer referência para sustentar o referido juízo de análise.

ffff) Quanto a este pressuposto, faltando a identificação do acto alegadamente lesivo, bem como o dano decorrente da alegada lesão, não podem restar duvidas de que o mesmo não se encontra preenchido, pelo que também por esta optica teria de decair a pretensão da A. pela falta de verificação do pressuposto do nexo de causalidade entre a conduta da Ré e o alegado prejuízo causado.

gggg) A Recorrente não admite que se encontrassem preenchidos os pressupostos quanto a natureza especial e anormal dos alegados prejuízos da A.

hhhh) Os alegados danos causados à A. foram certamente de natureza generalizada, porquanto como certamente se calcula afectaram e condicionaram todos aqueles que na área de influência da obra, não puderam laborar dentro da total normalidade, o que certamente se traduziu num encargo normal exigível a todos aqueles que do mesmo modo hoje, no mesmo local, tem por contrapartida para o seu dia a dia, negocio ou actividade, o beneficio que deriva do alargar do funcionamento do serviço publico de metropolitano a novas estações.

iiii) Não se pode concluir que a A. teve um dano e um prejuízo especial ou anormal, assim qualificável por referência a circunstância particular de a A. alegadamente ter um prejuízo que os demais estabelecimentos congéneres no local não tiveram, porquanto esse facto não se encontra demonstrado.

jjjj) Não parece encontrar-se verificado este pressuposto, carecendo a Sentença recorrida de fundamentação que motive o preenchimento do pressuposto legal da existência no caso de prejuízos especiais e anormais para a Ré.

kkkk) Assim se concluído que não se encontram preenchidos alguns dos mais elementares pressupostos legais para que se possa subsumir o caso dos presentes autos num caso de responsabilidade civil extracontratual da Ré e, por consequência na obrigação desta indemnizar a Autora.

llll) Pelo que tem por isso de decair o invocado direito da Autora a ser indemnizada pela Ré, com fundamento na diminuição de clientela que estaria na origem dos alegados prejuízos.

mmmm) Quanto ao quantum indemnizatório a Recorrente não vai discutir da integração dos lucros cessantes na obrigação de indemnizar em sede da responsabilidade civil extracontratual do Estado, até porque a mesma é matéria largamente discutida e presentemente inequivocamente assente na doutrina, na jurisprudência e na lei, cujo regime vigente consagra a posição que sempre defendemos, isto é, que a indemnização por prejuízos decorrentes de facto licito, como seria o caso dos presentes autos, não abrange os lucros cessantes.

nnnn) A Recorrente faz novamente aqui expressa menção, reiterando a matéria já supra exposta e apelada, de que a quebra de receitas invocada pela A. não tem equivalência com os lucros cessantes e que estes não se encontram reclamados ou sequer identificados nos presentes autos.

oooo) A Douta Sentença a quo condena a Ré no seu decisório a pagar à autora a quantia de 150.982,70€ acrescida de juros desde 30/10/2008, quando erradamente aquela quantia juá contabiliza em si mesmo os juros que a A. havia apurado em sede da sua PI e que não são devidos.

pppp) Deve assim o decisório, sem conceder quanto a toda a demais matéria apelada no presente recurso, ser alterado em conformidade com o valor do capital peticionado, não podendo por isso a Ré ser condenada no pagamento de indemnização com capital superior ao valor de 136.372,53€ (cento e trinta e seis mil trezentos e setenta e dois euros e cinquenta e três cêntimos.

qqqq) Pelo que se requer seja conferido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, na parte em que se refere ao presente recurso.

rrrr) Uma vez alterada a decisão do Tribunal a quo, como se conclui supra, deverá por consequência ser igualmente alterada o decisório proferido em matéria da condenação da A. ora Recorrente no pagamento das custas processuais, devendo a Ré ora Recorrida ser integralmente condenada quanto à totalidade das custas processuais.”.

Termina, pedindo que seja concedido provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida.


*

A ora Recorrida, P..... & S....., Lda., notificada da admissão do recurso, apresentou contra-alegações, não tendo, porém, formulado quaisquer conclusões.

Sustenta que a matéria dada como provada na sentença recorrida não merece censura, devendo por isso ser mantida.

Mais aduz que se encontram preenchidos todos os pressupostos legais da responsabilidade civil extracontratual da Recorrente, a qual, por consequência, está obrigada a indemnizar o Recorrido, abrangendo a mesma os lucros cessantes, por estar em vigor o D.L. n.º 48.051/67 de 21/11.


*

O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não emitiu parecer.

*

O processo vai, com vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

As questões suscitadas pelo Recorrente resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de:

1. Erro de julgamento de facto, quanto à matéria provada e não provada, por erro de apreciação e por estar infundamentada:

1.1. Nulidade do depoimento da testemunha J…….;

1.2. Erro quanto ao facto provado n.º 11, devendo ser dado como não provado;

1.3. Erro quanto ao facto provado n.º 15, devendo ser dado como não provado;

1.4. Erro quanto aos factos provados n.ºs 16 e 17, devendo o primeiro ser alterado na sua redacção e o segundo ser dado como não provado;

1.5. Erro quanto ao facto provado n.º 18, devendo ser dada outra redação;

1.6. Erro quanto aos factos provados n.ºs 19, 20, 21 e 23, devendo ser dados como não provados ou ser especificado o período temporal;

1.7. Erro quanto ao facto provado n.º 22, devendo ser dado como não provado;

1.8. Erro quanto ao facto provado n.º 25, devendo ser dado como não provado;

1.9. Erro quanto aos factos provados n.º 24 a 28 e 31, devendo ser indicado o período temporal e aditamento de um facto 31-A;

1.10. Erro quanto ao facto provado n.º 30, devendo ser dado como não provado;

1.11. Erro quanto aos factos provados n.ºs 31 e 32, devendo ser dados como não provados;

1.12. Erro quanto aos factos não provados, devendo ser dado como provado o facto n.º 71;

1.13. Erro quanto aos factos não provados, devendo ser dado como provado o facto n.º 72;

1.14. Erro quanto aos factos não provados, devendo ser dado como provado o facto n.º 73;

1.15. Erro quanto aos factos não provados, devendo ser dado como provado o facto n.º 74;

1.16. Erro quanto aos factos não provados, devendo ser dado como provado o facto n.º 75;

2. Erro de julgamento de direito, quanto ao pressuposto do dano e do nexo de causalidade e quanto ao quantum indemnizatório, no respeitante à consideração dos lucros cessantes e dos juros vencidos.

III. FUNDAMENTOS

DE FACTO

O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos:
1. A Autora “P..... & S....., Lda.” é uma sociedade comercial por quotas que tem por objecto a exploração de um estabelecimento de restaurante e pastelaria, com fabrico próprio, sito na Avenida da República, n.º 1…. a 1…. tornejando para a Av. Duque D'Ávila, n.º 1…., n.º 1… e n.º 1…, em Lisboa - cfr. fls. 631-641 dos autos.
2. O prédio urbano onde está instalado o estabelecimento da Autora situa-se na esquina da Avenida da República (lado Poente) com a Avenida Duque D’Ávila, em Lisboa.
3. O Réu “Metropolitano de Lisboa, E.P.” é uma empresa pública que explora o Metropolitano de Lisboa.
4. E é dono da obra de prolongamento da Linha Vermelha, no trajecto entre a Estação da Alameda e o Palácio da Justiça.
5. Obra que se iniciou em Setembro de 2004, e ainda prosseguia em 27/10/2008.
6. As escavações da obra implicaram alterações ao trânsito de veículos automóveis, públicos e privados e ao trânsito pedonal na Avenida Duque D'Ávila - cfr. fls. 21-33 e 597-611 dos autos.
7. Bem como, alterações das paragens dos transportes colectivos.
8. E ao encerramento do átrio Norte da estação de Metro do Saldanha.
9. Em consequência das obras, entre 17/01/2007 e 26/02/2007, a Autora encerrou a porta da “Pastelaria S….” no n.º 1…. de polícia da Avenida da República - cfr. fls. 21, 25-30, 32 e 33 dos autos.
10. A Autora organizou o acesso ao seu estabelecimento por uma porta de recurso, mais estreita, sita no n.º 1….. de polícia da Avenida Duque D'Ávila - cfr. fls. 29 dos autos.
11. A Autora tem uma clientela fiel e conservadora.
12. O objecto da Autora materializa-se através da prestação de serviços de restauração, pequenos-almoços, almoços e lanches no “self-service” - cfr. fls. 631-641 dos autos.
13. Bem como, através da prestação de serviços de cafetaria e de produtos de pastelaria que a própria Autora fabrica, cafés e outras bebidas, nas referidas instalações de "self-service" ou ao balcão - cfr. fls. 631-641 dos autos.
14. E, ainda, através da venda dos mencionados produtos de cafetaria e pastelaria por ela fabricados, para consumo fora do estabelecimento.
15. Com especial destaque, no que à venda a retalho concerne, para o bolo-rei, cuja qualidade de fabrico o torna um dos mais procurados por quem vive ou trabalha em Lisboa.
16. A obra obrigou a grandes escavações na Avenida Duque D'Ávila - cfr. fls. 25-34 e 603-604 dos autos.
17. Designadamente, no cruzamento desta avenida com a Avenida da República - cfr. fls. 25-34 e 603-604 dos autos.
18. O trânsito automóvel, foi cortado em ambos os sentidos da Avenida Duque D'Ávila, desde o cruzamento desta com a Avenida Defensores de Chaves, passando pelo cruzamento com a Avenida da República, até ao cruzamento com a Avenida 5 de Outubro - cfr fls. 25-34 e 603-604 dos autos.
19. A colocação de vedações e tapumes aumentou em muitos metros os percursos para alcançar o estabelecimento da Autora, como, por exemplo, alcançar o estabelecimento da Autora, vindo no lado Poente da Avenida da República, no sentido Norte/Sul (Campo Grande/Saldanha), estando o peão já no quarteirão que antecede a Avenida Duque D'Ávila, separado desta apenas pelo edifício do "Colégio Académico" - cfr. fls. 35 dos autos.
20. Nesta hipótese o peão teria de entrar no "labirinto”, virando à esquerda, percorrer uma distância em metros não concretamente apurada, virar à direita, andar mais uns metros, virar à esquerda, palmilhar mais uns metros, virar à direita, calcorrear mais metros, voltar para a esquerda e direita, andar mais uns metros, virar à esquerda e, vislumbrando, ao fundo, a entrada de recurso da "Pastelaria S.......", andar ainda mais uns metros para lá chegar - cfr. fls. 35 dos autos.
21. Estando perto da relojoaria/ourivesaria situada imediatamente a Sul, da "Pastelaria S…..", no mesmo lado Poente da Avenida da República, quem pretendesse deslocar-se ao estabelecimento da Autora, a pé, teria de iniciar uma deslocação de uma distância não concretamente apurada, no sentido Poente/Nascente, virar à esquerda, percorrer mais uns m, no sentido Sul/Norte, virar à esquerda para andar mais uns m no sentido Nascente/Poente, ziguezaguear para a esquerda e direita, andar mais uns m, no mesmo sentido Nascente/Poente, para, finalmente, virar à esquerda e percorrer mais uns m, no sentido Norte/Sul, para aceder à entrada de recurso da "Pastelaria S….." - cfr. fls. 35 dos autos.
22. O espaço por onde circulam os peões está ladeado por tapumes elevados, que diminuem ou eliminam a visão periférica dos transeuntes e que mudavam em função das necessidades da realização da obra - cfr. fls. 23-25 e 597-602 dos autos.
23. O referido em 19 a 22 torna o percurso confuso - cfr. fls. 23-25 e 597-602 dos autos.
24. O Réu instalou e fez circular e manobrar no estaleiro da obra, a poucos metros do estabelecimento da Autora camiões pesados, com betoneiras incorporadas ou destinados ao transporte de materiais de construção ou à retirada de terras e entulhos, gruas, guindastes, tractores, retro escavadoras e outros equipamentos destinados à realização da obra que se propôs executar - cfr. fls. 23-34, 247 e 603-608 dos autos.
25. A Autora protegeu a porta do n.º 1….. da Avenida da República contra possível rebentamento dos vidros, provocado pelas vibrações ou por estilhaços.
26. Os factos referidos em 24 e 25 tornaram as imediações do estabelecimento da Autora num local onde o ruído era por vezes desagradável.
27. As vibrações produzidas pela circulação e manobras de veículos pesados, das gruas e dos guindastes fizeram vibrar o estabelecimento da Autora.
28. Criando nas pessoas, uma sensação de insegurança e de incomodidade impeditiva de qualquer conversa com uma intensidade de som normal.
29. A "Pastelaria S….." é um local que as pessoas procuram para conviver e/ou para, num ambiente calmo e aprazível, consumir os serviços oferecidos e para proceder a encomendas ou adquirir, para consumo no exterior, produtos de cafetaria e de pastelaria.
30. A clientela da "Pastelaria S….." é constituída por pessoas da classe média, de meia-idade e idosos.
31. O corte do trânsito, do estacionamento automóvel e dos transportes colectivos, o encerramento do átrio Norte da Estação de Metro do Saldanha, as dificuldades colocadas ao acesso pedonal, a incomodidade e insegurança emergentes das vibrações e dos ruídos incomodativos e desagradáveis e as dificuldades de acesso afastaram a clientela do estabelecimento da Autora.
32. Levando-a a procurar os serviços de estabelecimentos congéneres, nas imediações, designadamente, a Pastelaria V….., provocando diminuição de vendas no período de Setembro de 2004 a final de 2007.
33. Existem diversos estabelecimentos congéneres localizados na zona da "Pastelaria S.......".
34. A "Pastelaria S......." é um estabelecimento bem equipado, bem dimensionado, bem organizado e bem gerido.
35. A "Pastelaria S......." está aberta ao público desde o início do século XX, tendo vindo a fazer uma actualização de processos de atendimento e de fabrico, de modernização de equipamentos, de formação profissional e aposta na qualidade dos produtos oferecidos e dos serviços prestados.
36. Os clientes fugiram das obras do Metro que causavam barulho, vibrações nos edifícios, impossibilidade do acesso por transportes públicos ou privados e das dificuldades do acesso pedonal e não da "Pastelaria S.......", dos produtos que fabrica, dos serviços que presta ou da equipa que ali trabalha.
37. As poeiras e lixos decorrentes das obras prejudicam a actividade de fabrico e comercialização de produtos e serviços de pastelaria que tem especial preocupação com a higiene das condições de fabrico e laboração.
38. A Autora teve de proteger o estabelecimento das poeiras e lixos provocados pelas obras do Metro.
39. Com especial atenção para os expositores de produtos alimentares e para o transporte desses produtos, para o exterior da "Pastelaria S.......".
40. Em consequência das obras, muitos clientes deixaram de consumir no estabelecimento da Autora as suas refeições (pequeno-almoço, almoço, lanche e jantar), ou de ali se deslocar para tomar a "bica" e comer um rissol ou um croquete ou para ali encomendar (para consumo fora do estabelecimento), bolos de aniversário e outros produtos de pastelaria e de cafetaria.
41. A estação do Metro já existe há muitos anos nas cercanias da "Pastelaria S......." - cfr. depoimentos testemunhais infra referidos.
42. O valor das receitas dos últimos 3 anos, antes do fecho da porta, é o seguinte:
Receitas antes do fecho da porta
08/01/05 a 17/01/05 09/01/06 a 17/01/06 08/01/07 a 17/01/07
Valores em € Média diária Valores em € Média diária Valores em € Média diária
17.938 € 2.242 € 19.300 € 2.413 € 20.569€ 2.285 €
(resposta ao facto 39.º) - cfr. relatório pericial de fls. 318-337 maxime a fls. 321-323 dos autos;
43. O valor das receitas em 2007, após o fecho da porta, é o seguinte:
Receitas depois do fecho da porta
18/01/05 a 10/02/05 18/01/06 a 10/02/06 18/01/07 a 10/02/07
Valores em € Média diária Valores em € Média diária Valores em € Média diária
47.344 € 2.254 € 50.215 € 2.391,19 € 42.610 € 2.029 €

(resposta ao facto 40.º) relatório pericial de fls. 318-337 maxime fls. 323-328 dos autos
44. Os proveitos tiveram uma evolução positiva média diária de 6,07% de 2005 para 2006; Os proveitos tiveram uma evolução negativa média diária de 15,15% de 2006 para 2007, sendo que a variação negativa entre 2% a 3% é explicada pelo facto de em 2007 ter havido 4 sábados e não 3 no período, quando os proveitos dos sábados são, de um modo geral, cerca de 50% de um dia de semana, pelo que, no período de 18/01/2007 a 10/02/2007, a quebra dos proveitos é superior (15,15%) ao do período antes do fecho da porta (5,27%), havendo, naquele período mais um sábado, o qual tem um peso compreendido entre 2 a 3% da quebra registada.
(resposta ao facto 41.º) relatório pericial de fls. 318-337 maxime fls. 328-329 dos autos.
45. O ano de 2003 face a 2002 teve uma quebra global de 2,79%, mas com oscilações significativas, positivas e negativas, mensalmente - (resposta ao facto 42.º) - relatório pericial de fls. 318-337 maxime fls. 330 dos autos;
46. O ano de 2004 em relação a 2003 teve globalmente uma evolução positiva de 1,50%. Até Agosto de 2004 os proveitos registaram uma variação positiva de 6,77%, em que apenas o mês de Fevereiro de 2004 teve uma evolução negativa (0,58%) e de Setembro a Dezembro de 2004 registou-se um decréscimo global de 7,15%, com principal incidência no mês de Outubro que registou uma variação de - 13,65% - (resposta ao facto 42.º) - relatório pericial de fls. 318-337 maxime 328-331 dos autos;
47. O ano de 2005 regista uma quebra global de 9,39%, decorrente da variação negativa registada, com oscilações, de Janeiro a Novembro. O mês de Dezembro teve uma ligeira variação positiva (0,55%) - (resposta ao facto 42.º) - relatório pericial de fls. 318-337 maxime fls. 330 dos autos;
48. O ano de 2006 em relação a 2005 teve uma quebra global de 2,60%, com variações negativas e positivas ao longo do ano - (resposta ao facto 42.º) - relatório pericial de fls. 318-337 maxime fls. 330 dos autos;
49. O ano de 2007 face a 2006 teve uma quebra global de 6,85%, registando apenas evolução positiva nos meses de Outubro e Novembro - (resposta ao facto 42.º) - relatório pericial de fls. 318-337 maxime 328-331 dos autos;
50. A preços correntes, anualmente, regista-se uma diminuição dos proveitos, com excepção de 2004, que registou um aumento de 1,50% (resposta ao facto 43.º) - relatório pericial - fls. 331-332 dos autos.
51. A preços correntes, mensalmente, verifica-se uma tendência de quebra a partir de Setembro de 2004 - (resposta ao facto 43.º) - relatório pericial de fls. 318-337 maxime fls. 331-332 dos autos.
52. A preços constantes, anual e mensalmente, verifica-se uma tendência mais evidente de quebra dos proveitos. A quebra de 2005 foi de 11,43%, em 2006 de 5,53% e em 2007 de 9,30% e, mensalmente, em nenhum dos meses a evolução é positiva em 2005 e 2006, e em 2007 apenas os meses de Outubro e Novembro registaram aumentos (0,14% em Outubro e 0,13% em Novembro) - (resposta ao facto 43.º) - relatório pericial de fls. 318-337 maxime fls. 331-332 dos autos;
53. O valor mensal efectuado em Dezembro de 2006 foi devido a uma venda de encomendas de bolo-rei no valor de € 13.600, acrescido de IVA, no total de € 15.232,00 (resposta ao facto 44.º) - relatório pericial de fls. 318-337 maxime fls. 332-333 e 336-337 dos autos.
54. A variação das receitas globais é a seguinte:


(resposta ao facto 45.º) - relatório pericial de fls. 318-337 maxime fls. 333-334 dos autos.
55. O acesso à "Pastelaria S......." ao trânsito pedonal nunca foi vedado - cfr. fls. 597-611.
56. Os painéis de rede colocados nalguns locais da vedação permitiam a visão periférica e havia setas indicativas, designadamente do acesso à "Pastelaria S......."- cfr. fls. 22-24 e 597-611 dos autos.
57. O caminho pedonal de acesso à "Pastelaria S......." tinha, pelo menos, 2 metros de largura - cfr. fls. 597-611 dos autos.
58. A localização do estaleiro e os desvios de trânsito foram aprovados pela Câmara Municipal de Lisboa.
59. A porta de entrada pela Avenida da República foi encerrada com o acordo da Autora.
60. A obra foi realizada no subsolo sob laje de cobertura, provocando menos ruído e menor tempo de ocupação da via pública.
61. Nos 1.º semestre de 2004, 1.º e 2.º semestres de 2005, 1.º e 2.º semestres de 2006 e no 1.º semestre de 2007, foram efectuadas medições dos níveis de ruído, de vibrações e de qualidade do ar nos pontos identificados nos instrumentos de fls. 612-617 dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
62. Em Fevereiro de 2001 foi elaborado o “Estudo Sócio-Económico incluindo Benefícios Sociais e Ambientais”, relativo à Extensão da Linha Vermelha: Alameda - Campolide - Campo de Ourique, que aqui se dá por integralmente reproduzido - cfr. fls. 99-146 dos autos.
63. Por despacho de 31 de Março de 2003 do Secretário de Estado do Ambiente foi emitido parecer favorável ao troço do traçado compreendido entre o início da Estação S. Sebastião II e o ponto em que se cruza com a R. Alves Redol condicionado ao cumprimento das medidas de minimização e aos planos de monitorização, nos termos da Declaração de Impacte Ambiental (DIA) de fls. 151 que aqui se dá por integralmente reproduzida - cfr. fls. 151-162 dos autos.
64. O Réu elaborou um “Plano de Gestão Ambiental do Estaleiro da Estação Saldanha II”, nos termos do instrumento de fls. 163-186 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
65. Por despacho de 29 de Março de 2005 do Chefe da Divisão de Controlo Ambiental da Câmara Municipal de Lisboa foi deferido o pedido do Rude concessão de licença especial de ruído referente à execução da empreitada para prolongamento da Linha Vermelha entre a Alameda e S. Sebastião que deve obedecer às condições impostas nos termos do instrumento de fls. 147-148 dos autos - cfr. fls. 147-150 dos autos.
66. Por despacho de 11 de Março de 2004 do Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações foi determinado que a execução das obras do prolongamento da Linha Vermelha, Alameda/São Sebastião, designadamente das frentes de obra do Estaleiro do Poço de Ventilação I e do estaleiro da estação de Saldanha II, fiquem dispensadas da exigência do cumprimento dos limites previstos no n.º 3 do artigo 4.º e no n.º 3 do artigo 8.º do Regime Legal sobre a Poluição Sonora, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 292/2000, de 14 de Novembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 259/2002, de 23 de Novembro, no período entre as 18 e as 7 horas, nos dias úteis e sábados, entre Março de 2005 e Agosto de 2006 no Estaleiro do poço de ventilação I, entre Março de 2005 e Dezembro de 2006 e aos domingos entre Março e Agosto de 2005 no estaleiro da estação de Saldanha II - cfr. fls. 657-658 dos autos.
67. Por despacho de 11 de Março de 2005 do Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações publicado na II Série, do DR n.º 64, de 1 de Abril de 2005, foi determinado que a execução das obras do prolongamento da Linha Vermelha, Alameda-São Sebastião, designadamente das frentes de obra do estaleiro do poço de ventilação I e do estaleiro da estação de Saldanha I, fiquem dispensadas da exigência do cumprimento dos limites previstos no n.º 3 do artigo 4.° e no n.º 3 do artigo 8.° do regime legal sobre a poluição sonora, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 292/2000, de 14 de Novembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 259/2002, de 23 de Novembro, no período entre as 18 e as 7 horas, nos dias úteis e sábados, entre Março de 2005 e Agosto de 2006 no estaleiro do poço de ventilação I, entre Março de 2005 e Dezembro de 2006 e aos domingos entre Março e Agosto de 2005 no Estaleiro da Estação de Saldanha II - cfr. fls. 659 dos autos.
68. Por despacho de 17 de Março de 2006 da Secretário de Estado dos Transportes foi determinado que a execução das obras do prolongamento da Linha Vermelha, Alameda-São Sebastião, designadamente das obras relacionadas com o Estaleiro da Estação de S. Sebastião II, fique dispensada da exigência do cumprimento dos limites previstos no n.º 3 do artigo 4.° e no n.º 3 do artigo 8.° do regime legal sobre a poluição sonora, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 292/2000, de 14 de Novembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 259/2002, de 23 de Novembro, no período entre as 18:00 e as 7:00, nos dias úteis (2.ª a 6.ª feira) e sábados, domingos e feriados pelo tempo da duração da correspondente licença especial de ruído - cfr. fls. 661-662 dos autos.
69. Por despacho de 30 de Outubro de 2006 da Secretária de Estado dos Transportes foi determinado que a execução das obras do prolongamento da Linha Vermelha, Alameda-São Sebastião, designadamente das obras relacionadas com o Estaleiro do Posto de ventilação I e do Estaleiro da Estação de Saldanha II, fique dispensada da exigência do cumprimento dos limites previstos no n.º 3 do artigo 4.º e no n.º 3 do artigo 8.º do regime legal sobre a poluição sonora, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 292/2000, de 14 de Novembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 259/2002, de 23 de Novembro, no período entre as 18 e as 7 horas, nos dias úteis (2.ª a 6.ª feira) e sábados e domingos da 0:00h às 24:00h, para o Estaleiro do Posto de Ventilação I, pelo tempo da duração da correspondente licença especial de ruído - cfr. fls. 664-665 dos autos.
70. O Réu foi citado para os termos da presente acção em 30 de Outubro de 2008 - cfr. fls. 85 dos autos.

Não se provaram outros factos com interesse para a decisão, nomeadamente:
- Quanto ao trânsito pedonal, o acesso à "Pastelaria S......." ficou vedado a quem se deslocasse em automóveis privados ou em transportes colectivos;
- O referido em 19 a 22 da FF) torna o percurso inseguro e monótono;
- O caminho é estreito, permitindo, com dificuldade, o cruzamento de pessoas.
- Apenas no período de 17/01/2007 a 26/02/2007 houve maiores alterações à circulação do trânsito pedonal;
- Antes do início das obras não era possível estacionar em frente à "Pastelaria S.......", a qual se situa numa zona em que sempre houve poucos lugares de estacionamento disponíveis;
- A quebra de vendas da "Pastelaria S......." só foi minorada nas épocas de Natal e de fim do ano, graças à venda do bolo-rei;
- A tradição da época festiva e a qualidade do produto fabricado, esta muito superior à oferecida pela concorrência, levaram a clientela a suportar as incomodidades das obras;
- A diminuição de clientela e a consequente retracção de vendas no período considerado de Setembro de 2004 a final de 2007 é causada pela conjuntura recessiva;
- Os estabelecimentos situados nas cercanias do átrio Sul da estação do Saldanha (que se manteve sempre aberto) e aqueles que se localizam nas cercanias do átrio Norte mas longe do estaleiro das obras, não sofreram qualquer prejuízo decorrente das obras e vão beneficiar delas tanto como a Autora;
- A Autora normalmente só tem uma porta em funcionamento;
- A abertura do prolongamento da Linha Vermelha, entre as Estações da Alameda e S. Sebastião, vai beneficiar o estabelecimento da A., uma vez que passará à sua porta, diariamente, um número acrescido de pessoas;
- Os acessos ao estabelecimento da A. sempre estiveram completamente desimpedidos.

Motivação: A convicção que permitiu dar como provados os factos acima descritos assentou no acordo das partes, na análise crítica do teor dos documentos constantes dos autos, conjugados nos pontos indicados infra com a prova testemunhal produzida, bem como, com o relatório pericial constante a fls. 318-337 dos autos, concretamente:
- Factos 2 a 11 no acordo das partes;
- Factos 12-41, 55 e 56, os depoimentos conjugados da testemunha J……, Director-Geral da Associação dos Hotéis e Restaurantes desde há 2 anos, tendo anteriormente desempenhado as funções de Secretário-Geral da mesma Associação, durante cerca de 20 anos, que referiu conhecer o estabelecimento da Autora em virtude de o frequentar diariamente, antes do início das obras; durante as obras passou a ser cliente da Pastelaria V….. onde via clientes da S......., tendo ficado cliente da V….. Explicou os percursos que fazia antes das obras e os que passou a ter de fazer durante as obras, assim como, as condições em que funcionava a Pastelaria S....... antes das obras e durante as obras, nomeadamente no que respeita às condições acústicas, bem como, às poeiras que existiam no estabelecimento. Descreveu as condições gerais do exercício da actividade de restauração no período de 2004/2008, em Lisboa, como um período estabilidade, referindo que se iniciou o processo de queda em 2009 e sendo o “choque” mais evidente em 2012. Mencionou as influências sobre os estabelecimentos já existentes da abertura de novos estabelecimentos de novas formas de alimentação, tipo “fast food”, designadamente, na Pastelaria S....... que no início da década “estava viçosa na sua recente remodelação”. Salientou que em Lisboa a partir de 2004 aumentou o consumo e ligeiramente os preços nos estabelecimentos de restauração, a boa localização da S....... que se localiza na zona nobre da Capital. Referiu conhecer os fluxos de clientela da Pastelaria S....... mas não a contabilidade, afirmando que a diminuição de clientela da S....... de Setembro de 2004 a final de 2007 se deveu às obras do Metro, que revelou ter conhecimento directo dos factos, tendo prestado um depoimento esclarecedor e objectivo, aparentemente isento e imparcial. Depoimento que não é abalado pelo teor de fls. 240 e 592-596 que para além de se tratar de excertos informativos ou de “noticias” não respeitam à concreta realidade de Lisboa e especialmente à zona onde se localiza a “Pastelaria S.......” e concretamente a esta, sendo que a “crise” não afecta igualmente todos os estabelecimentos seja de restauração ou outros, pois existem factores em concreto que têm de ser considerados com seja, a localização, clientela e qualidade de produtos e serviços oferecidos; da testemunha:
- C….., que tem um estabelecimento no local, há 46 anos, denominado “Charcutaria D…..”, é cliente diário da Pastelaria S........ Referiu que logo que a obra começou em Setembro de 2004 começaram a colocar blocos de betão para fazer a separação das faixas de rodagem da Av.ª da República, cerca de um ano depois colocaram uma grua no meio da Av.ª Duque D`Ávila junto ao n.º 1….., explicitou as dimensões dos tapumes e a composição dos mesmos, nomeadamente, a alteração que sofreram para permitir visibilidade, as condicionantes que o trânsito sofreu, a existência de vários trajectos pedonais, a impossibilidade de em finais de 2006 início de 2007 de aceder à Pastelaria S....... pelo “passeio original”, bem como, as máquinas utilizadas nas obras, referindo-se ao som incomodativo das mesmas e à necessidade de elevar o tom de voz para poder falar, bem como, ao pó e “limagem”que existia no local, aos inconvenientes e receios das pessoas se deslocarem causados pelos percursos alternativos e pela execução dos trabalhos, tendo revelado possuir conhecimento directo dos factos prestando um depoimento esclarecedor, aparentemente isento e imparcial, ainda que tenha manifestado desagrado com os inconvenientes da situação que também viveu, não se nos afigurando que esta circunstância tivesse abalado a credibilidade do depoimento; da testemunha:
- S……., pasteleiro da Pastelaria S....... desde há volta de 30 anos que esclareceu qual a actividade exercida da Autora, os serviços que presta, modo como funciona, como está equipada e é gerida a Pastelaria S........ Referindo que diminuiu o fabrico, facto que permite ver a redução da clientela. Explicou também as condições em que trabalhava antes das obras e como passou a trabalhar durante as obras referindo-se ao aumento do ruído e trepidação causados pelas máquinas das obras, assim como, os percursos que tinha de fazer para aceder ao local de trabalho, e os cuidados que tiveram de ter com a exposição ou colocação dos bolos na Pastelaria após a confecção, nomeadamente, tapando-os para evitar as poeiras, tendo prestado um depoimento esclarecedor objectivo, aparentemente sincero e isento; da testemunha:
- T……, empregado de balcão da Autora desde há cerca de 30 anos, que explicou os cuidados que normalmente têm com o acondicionamento dos bolos e os cuidados ou medidas que tiveram de adoptar durante as obras, para isolar o som, referindo-se, ainda ao aumento de ruído que se sentia no estabelecimento durante as obras e à diminuição dos clientes. Explicando que antes das obras estavam todo o dia a trabalhar e durante as obras havia alturas em que paravam, clientes que deixaram de aparecer uns porque pensavam que estava fechado, outros porque não queriam andar por dentro dos taipais, por medo, tendo prestado um depoimento esclarecedor e aparentemente isento; e da testemunha:
- M….., empregada de balcão da A desde há 15 anos, que referiu o tipo de clientela da Pastelaria S....... e os serviços que prestam. Explicou que com a eliminação de autocarros, com as alterações do sentido do trânsito, a instalação do estaleiro e as escavações e demais trabalhos diminuiu a clientela. Referiu que se tornava desagradável o local, pois havia poeiras, tinham de falar mais alto, sentia-se o chão a tremer, tiveram de vedar fendas. Durante as obras havia manhãs em que estavam parados, os clientes deixavam de ir, sendo que a maior parte dos clientes habituais voltou depois das obras, tendo prestado um depoimento esclarecedor e aparentemente isento;
- E quanto aos factos 16 a 18, 24, 41, 56 a 58 os referidos depoimentos, conjugados também com os depoimentos da testemunha F….., engenheiro civil, que no período de 2004 a 2006 foi o responsável pela extensão da “Linha Vermelha Alameda II a S. Sebastião II”, posteriormente foi coordenador de todas as obras de expansão da rede, e nessa qualidade deslocava-se ao local pelo menos uma vez por semana. Durante as obras foi cliente da Pastelaria S......., que referiu que a obra obrigou a escavações entre a Avenida da República e a Defensores de Chaves, designadamente, no cruzamento da Av. da República com a Av.ª Duque D`Ávila e que o trânsito foi cortado em diversas alturas com pedidos e autorizações da Câmara Municipal de Lisboa (CML), bem como, os percursos terrestres e as respectivas alterações eram autorizadas pela CML. Descreveu o tipo de veículos que transitavam na zona para a execução das obras, assim como, a necessidade de realização de avaliação de impacto ambiental, tendo referido que sempre foi possível aceder à “Pastelaria S.......” e que os acessos eram iluminados com electricidade do dono de obra, tendo prestado um depoimento aparentemente isento e imparcial; da testemunha:
- J….., engenheiro de minas e de geo-recursos, funcionário da R. desde 2005, acompanhou as obras da Estação do Saldanha e a partir de 2007 passou a ser o representante do dono de obra. Deslocava-se com uma periodicidade bi-semanal ao local da obra. Tendo referido que até 2006 não havia obras junto à Pastelaria S......., apenas os desvios de trânsito junto à Pastelaria S........ Em Março de 2006 passaram o “estaleiro administrativo” para a Av.ª Duque D`Ávila. Descreveu as fases de execução das obras no local, assim como, as respectivas condicionantes de acesso, esclarecendo que de Março de 2006 a Agosto de 2008 não havia acesso de trânsito rodoviário entre a Av.ª Duque D`Ávila e a Av.ª da República, que até Fevereiro de 2006 não havia constrangimentos de acesso a peões e que de Outubro de 2004 até Agosto de 2008 não se podia atravessar a AV.ª da República, tinha de se ir pela Praça do Saldanha ou pelo lado Norte até à João Crisóstomo. Mencionou os veículos utilizados na execução da obra. Referiu genericamente os efeitos dos trabalhos executados, nomeadamente, quanto à qualidade do ar relacionada com as poeiras da obra. Descreveu os trabalhos que eram realizados no “estaleiro administrativo”, nomeadamente corte de varões de acesso e que a grua nele instalada transportava materiais de uma zona da Av.ª da República para a outra, tendo prestado um depoimento esclarecedor quanto aos aspectos técnicos da execução obra, embora quanto aos efeitos negativos da obra se tenha caracterizado pela desvalorização dos mesmos com o fundamento genérico de terem sido observados os procedimentos legais; da testemunha:
- N……, engenheiro civil, funcionário do Réu há 30 anos, esteve encarregue das funções de coordenação de fiscalização da obra estando em permanência na mesma, ia ao estaleiro “social e administrativo”, descreveu a função deste, referiu as máquinas utilizadas na execução da obra, assim como, a forma como iam sendo executados os trabalhos, o tempo de duração de alguns trabalhos, como, a descarga de betão, referindo-se aos ruídos e poeiras que faziam durante a execução dos trabalhos, que não valorizou como causadores de incómodos, explicou o método utilizado para a realização das escavações, revelando ter conhecimento directo dos factos; e da testemunha:
- J….., engenheiro civil, funcionário da F…… desde há 20 anos, acompanhou a execução da obra na qualidade de chefe de fiscalização, encontrando-se no local da obra permanentemente, referiu que todos os desvios de trânsito tinham de ser aprovados pela CML e que tinham sempre placards para sinalizar os desvios. Explicou que utilizaram mandíbula e fio adiamantado para efectuar a demolição e que a escavação foi muito cuidada em virtude de a abóbada da estação antiga não poder ser demolida, tendo sido efectuada com máquinas pequenas e que saía pouca quantidade de terra e que se trata de terras com muita argila, cujo índice de humidade é grande, referindo, ainda que o método utilizado foi o mais apropriado por ter o menor impacto possível e que recorreram a um método mais caro e mais moroso, tendo prestado um depoimento esclarecedor quanto aos aspectos técnicos da execução da obra;
- Quanto aos factos 42 a 55 o relatório pericial, como enunciado em cada um dos pontos da fundamentação de facto;
- Quanto aos factos 55 a 60 os depoimentos conjugados das testemunhas F….., J….., e N……, pelas razões anteriormente enunciadas;
- No que respeita aos registos de monitorização ambiental relativos ao 1.º semestre de 2004, 1.º e 2.º semestres de 2005, 1.º e 2.º semestres de 2006 e no 1.º semestre de 2007, referentes a medições dos níveis de ruído, de vibrações e de qualidade do ar nos pontos identificados nos instrumentos de fls. 612-617 dos autos, além de não terem sido efectuadas junto à Pastelaria S......., não se pode concluir quais as concretas datas e períodos temporais de laboração ou não, que trabalhos estavam a ser executados no momento em que foram realizadas, assim como, a situação em que se encontravam as máquinas, não permitem infirmar os depoimentos supra enunciados, que relataram as incomodidades sentidas a nível de poeiras, de ruído e de vibrações na Pastelaria S....... e imediações. E tal também não pode ocorrer pelo facto de no ponto de recolha n.º 6 do doc. 6A relativo ao 1.º Semestre de 2004, existirem valores de 73 dB (A) antes do início das obras, ou seja, níveis de ruído acima do limite legal para o período diurno.”

DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional.

1. Erro de julgamento de facto quanto à matéria provada e não provada, por erro de apreciação e por estar infundamentada.

Segundo o Recorrente, atenta a prova produzida, testemunhal e documental, a sentença recorrida incorre em erro de apreciação da matéria de facto dada como provada, por estar infundamentada, assim como ao ter sido erradamente considerada certa factualidade como não provada.

Antes de analisar criticamente a matéria de facto posta em crise pelo Recorrente impõe-se proceder ao enquadramento de direito dos termos em que o julgamento de facto pode ser impugnado em sede de recurso e das suas exigências, assim como em que condições está este Tribunal ad quem habilitado a reexaminar a matéria de julgado julgada em primeira instância.

Como anteriormente decidido, entre outros, no Processo 03522/08, de 19/01/2012, deste TCAS, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 640.º do CPC, incumbe ao recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto “obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição”:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”.

Segundo o n.º 2 do citado artigo 640.º do CPC, no caso previsto na alínea b) do número anterior:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.”.

Nas citadas disposições impõe-se um ónus especial de alegação quando se pretenda impugnar a matéria de facto, que impende sobre o aqui Recorrente e que o mesmo satisfez, como decorre do teor das alegações produzidas em juízo.

Na sua alegação o Recorrente identifica o concreto ponto da matéria de facto impugnada, assim como os meios de prova em que o Tribunal se fundou e ainda, em alguns casos, os meios de prova que considera que devem determinar resposta diferente, com indicação precisa do tempo da respectiva gravação da matéria de facto quando produzida na audiência final.

Respeitado o ónus a cargo do Recorrente, vejamos os limites aplicáveis a este Tribunal de recurso.

A este Tribunal de recurso assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo Tribunal a quo, desde que ocorram os pressupostos previstos nos artigos 662.º do CPC e 149.º do CPTA, incumbindo-lhe reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.

Não obstante a amplitude conferida a um segundo grau de jurisdição, na caracterização da amplitude dos poderes de cognição do Tribunal ad quem sobre a matéria de facto, não se está perante um segundo ou novo julgamento de facto, porquanto, tal possibilidade de conhecimento está confinada aos pontos de facto que o Recorrente considere incorrectamente julgados e desde que cumpra os pressupostos fixados no artigo 640.º, nºs. 1 e 2 do CPC, além de que o controlo de facto, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade (vide Abrantes Geraldes, inTemas da Reforma do Processo Civil”, vol. II, págs. 250 e segs.).

O Tribunal ad quem aprecia apenas os aspectos sob controvérsia e não vai à procura duma nova convicção, pois o que visa determinar é se a motivação apresentada pelo Tribunal a quo encontra suporte razoável naquilo que resulta do depoimento testemunhal, registado a escrito ou através de gravação, em conjugação com os demais elementos probatórios existentes ou produzidos nos autos.

A garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não pode postergar o princípio da livre apreciação da prova por parte do julgador, previsto no n.º 5 do artigo 607.º do CPC, intervindo na formação da convicção não apenas elementos racionalmente demonstráveis, mas também factores não materializados.

A valoração de um depoimento não é absolutamente percetível através da gravação e/ou da respetiva transcrição, pois existem inúmeros aspectos comportamentais dos depoentes que não são passíveis de ser registados numa simples gravação e que, como tal, foram apreendidos ou percecionados pelo juiz.

O Tribunal a quo está, por isso, numa posição privilegiada em termos de recolha dos elementos e sua posterior ponderação, nomeadamente, com a articulação de toda a prova produzida, de que decorre a convicção expressa na decisão proferida sobre a matéria de facto, pelo que, a convicção formada a partir da globalidade dos meios de prova é de difícil destruição, sobretudo ao pretender-se pô-la em crise através de indicações parcelares ou referências genéricas.

A convicção do tribunal forma-se de um modo dialético, pois além dos dados objetivos fornecidos pelos documentos e outras provas produzidas nos autos, importa atender também à análise conjugada das declarações e depoimentos produzidos, em função das razões de ciência, da imparcialidade, das certezas, das lacunas, das contradições, das hesitações, das inflexões de voz, da serenidade, dos olhares para alguns dos presentes, da linguagem silenciosa do comportamento, da coerência de raciocínio e de atitude, da seriedade e do sentido de responsabilidade evidenciados, das coincidências e inverosimilhanças que transpareçam no decurso da audiência de julgamento, entre depoimentos e demais elementos probatórios (neste sentido, Acórdão do TCA Norte, de 11/11/2011, Proc. nº 3097/10.4BEPRT).

Nos sistemas da livre apreciação da prova, detendo o julgador a liberdade de formar a sua convicção, não é de associar o arbítrio no julgamento da matéria de facto, pois o Tribunal não está isento de indicar os fundamentos onde aquela assentou, de modo a que, com recurso às regras da ciência, da lógica e da experiência, possa ser controlada a razoabilidade do processo de formação da convicção sobre a prova e não prova dos factos, deste modo se sindicando o processo racional da decisão.

Por isso, a nossa lei processual prevê um processo racional e objetivado, que faz impender sobre o julgador um ónus de objetivação da sua convicção, através da exigência da fundamentação da matéria de facto (da factualidade provada e da não provada), mediante uma análise critica e comparativa das provas e a especificação dos fundamentos que foram decisivos para a convicção, segundo o disposto no n.º 4 do artigo 607.º do CPC).

A exigência legal de enunciação ou explicitação da convicção sobre a prova constitui uma garantia da transparência, da imparcialidade e da inerente assunção da responsabilidade por parte do julgador.

Se, à luz desta caracterização a decisão, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, então ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.

No sentido ora expendido, vide o Acórdão do STA, datado de 17/03/2010, Proc. 367/09, segundo o qual: “A garantia de duplo grau de jurisdição em matéria de facto (art. 712º CPC) deve harmonizar-se com o princípio da livre apreciação da prova (art. 655º/1 CPC). Assim, tendo em conta que o tribunal superior é chamado a pronunciar-se privado da oralidade e da imediação que foram determinantes da decisão em 1ª instância e que a gravação/transcrição da prova, por sua natureza, não pode transmitir todo o conjunto de factores de persuasão que foram directamente percepcionados por quem primeiro julgou, deve aquele tribunal, sob pena de aniquilar a capacidade de livre apreciação do tribunal a quo, ser particularmente cuidadoso no uso dos seus poderes de reapreciação da decisão de facto e reservar a modificação para os casos em que a mesma se apresente como arbitrária, por não estar racionalmente fundada, ou em que for seguro, segundo as regras da ciência, da lógica e/ou da experiência comum que a decisão não é razoável.”.

No mesmo sentido, cfr. ainda o Acórdão do STA, de 14/10/2010, Proc. 751/07, nos termos do qual: “o tribunal de recurso, em princípio, só deve alterar a matéria de facto em que assenta a decisão recorrida se, após ter sido reapreciada, for evidente que ela, em termos de razoabilidade, foi mal julgada na instância recorrida”.

Em face do exposto, tendo presente a fundamentação constante da sentença recorrida, vejamos os concretos fundamentos de impugnação da matéria de facto invocados pelo Recorrente.

1.1. Nulidade do depoimento da testemunha J……

Segundo o Recorrente a sentença recorrida incorre em erro de julgamento de facto ao valorar o depoimento da testemunha J……, pois tendo respondido aos costumes que era Secretário-Geral da ARESP e que nenhuma relação tinha com a Autora, Pastelaria S......., Lda., conhecendo o estabelecimento como cliente e como diretor do associado, Pastelaria S......., não tendo nenhuma relação de dependência ou trabalhado, verifica-se que analisada a documentação junta com a petição inicial, os documentos 26, 27 e 28 revelam que esta testemunha participa na pastelaria S........

Sustenta que não se sabendo a que factos a testemunha foi arrolada, porque não foi perguntado e também não foi indicado pelo mandatário da Autora, atenta a motivação da matéria de facto dada como provada, consta que o depoimento dessa testemunha serviu para a prova dos factos 12 a 41, 55 e 56.

Alega o Recorrente que essa testemunha tinha ou teve manifesto interesse na decisão a proferir nos presentes autos, tendo prestado um depoimento tendencioso e deturpado da realidade dos factos, depondo de forma parcial, não merecendo credibilidade o seu depoimento.

Por isso, pede que o seu depoimento seja nulo e desvalorizado em sede de motivação e fundamentação dos factos sobre os quais depôs, designadamente, aqueles para os quais foi o único depoente e que se identificam como sendo os factos provados sob n.ºs 11, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 28, 30, 31, 32, 34 e 36, os quais se devem dar como não provados nos autos.

Vejamos.

Quanto aos factos referidos pelo Recorrente, revelados pelos documentos 26 a 28 juntos com a petição inicial, extrai-se em primeiro lugar que a Autora juntou essa documentação aos autos, pelo que, em consequência, não é seguramente seu intuito pretende omitir tal tipo de informação.

Em segundo lugar existe uma errónea interpretação do teor do documento junto pela Autora sob n.º 27, porquanto do mesmo não é possível retirar o que ora se mostra alegado pelo Recorrente, quanto o de a testemunha J.......deter uma participação social na Pastelaria S......., ora Autora.

Tal documento não se apresenta completo, não se encontrando comprovado quem o assinou, por apenas ser junta a sua primeira página.

Porém, mediante confronto entre os documentos juntos sob n.ºs 26, 27 e 28 é possível compreender que os documentos sob n.ºs 26 e 28 estão assinados pela testemunha, na qualidade de Secretário-Geral da ARESP, mas que o documento sob n.º 27 que não está completo, nem assinado, não pode ser imputado à mesma pessoa, isto é, ao referido Secretário-Geral da ARESP.

Do teor do documento sob n.º 27 extrai-se o seguinte: “Na sequência da correspondência, subscrita pelo nosso Secretário-Geral, registada (…)

No caso vertente, das pastelarias S....... e V…., fazemos questão de salientar que, não obstante de serem ambas participadas pelo signatário, não devem as mesmas receber tratamento preferencial (…)”.

Considerando o exato teor do citado documento n.º 27 e mediante o seu confronto com os documentos n.ºs 26 e 28, será de entender que aquele não foi subscrito pelo Secretário-Geral da ARESP, pelo que não será ele a proferir a afirmação de que é detentor de participação social na Pastelaria S........

Do que resulta que o Recorrente, muito depois de os documentos serem apresentados aos autos, pois foram juntos com a petição inicial, pretende pôr em causa a prova documental e/ou testemunhal produzida, sob a invocação de um alegado erro de julgamento de facto da sentença recorrida.

Não se comprova da citada prova documental de que efetivamente a testemunha J….. detenha participação social na ora Autora, mas, sem prejuízo, impõe-se dizer que mesmo que assim não fosse, não seria de proceder a censura dirigida contra a sentença, a respeito da admissibilidade do depoimento e da sua credibilidade.

Não se podendo imputar à testemunha qualquer omissão no interrogatório inicial quanto à matéria da sua identificação e aos costumes, realizado na audiência final, mesmo que assim não fosse e se comprovasse o alegado pelo Recorrente, de a testemunha deter participação social na Autora, seria de recusar que tal se traduzisse inelutavelmente numa nulidade do depoimento por falta de credibilidade da testemunha, ou seja, que o depoimento prestado não pudesse ser considerado.

A circunstância de a testemunha ter uma participação na sociedade Autora, o que ora não se comprova, só por si não acarreta nenhum impedimento para depor, não estando impedida de depor, por não acarretar à face da lei uma causa objetiva de falta de imparcialidade ou de credibilidade.

A credibilidade do depoimento afere-se pelo modo como a testemunha depõe, pela sua clareza, coerência, à vontade, segurança e convicção, características que são imediatamente apreensíveis no decurso do depoimento, quer pelo Tribunal, quer pelos mandatários das partes que se encontram presentes e perante quem a prova é produzida.

Nem ao Tribunal, nem a qualquer dos mandatários, designadamente, o do Réu, se suscitou qualquer motivo para duvidar da credibilidade do depoimento prestado pela testemunha em causa durante a audiência.

Acaso durante o julgamento tivesse ocorrido qualquer circunstância que fizesse ameaçar a credibilidade do depoimento ou da testemunha em si mesma, caberia ao mandatário do Réu suscitar a acareação ou contradita da testemunha.

O Tribunal a quo valorou o depoimento da testemunha nos exatos termos que constam da motivação da matéria de facto, não existindo motivos para o contrariar, por a circunstância relatada pelo Recorrente não se encontrar demonstrada e, mesmo que assim não fosse, não conduziria, sem mais, à descredibilização da testemunha e do seu depoimento e, consequentemente, à nulidade invocada.

De resto, o Recorrente nada mais alega em desabono da testemunha, que determine a procedência do requerido.

Nestes termos, será de julgar improcedente, por não provado, o erro de julgamento de facto, no tocante à valoração do depoimento prestado pela testemunha em causa, por não se encontrar provada a sua participação na Autora.

1.2. Erro quanto ao facto provado n.º 11, devendo ser dado como não provado

Alega o Recorrente o erro em relação à prova do facto que se dá como provado sob n.º 11, pois não se pode dar por provado, por acordo entre as partes, que a Autora tem uma clientela fiel e conservadora.

Invoca que essa factualidade foi impugnada, por isso, constando da base instrutória.

Nenhuma prova foi produzida sobre essa matéria, devendo ser dado como não provado.

Vejamos.

Compulsando a motivação da matéria de facto constante da sentença, resulta que o facto n.º 11, “A Autora tem uma clientela fiel e conservadora”, foi efetivamente dado como provado por acordo das partes, o que o Recorrente contesta, invocando a impugnação desse facto.

Tal facto foi invocado pela Autora no artigo 43.º da petição inicial.

Analisando a contestação apresentada pelo Réu, ora Recorrente, verifica-se que consta do artigo 60.º, o que ora se reproduz: “Aceita-se a afirmação da A., nos arts. 42.º e 43º da petição inicial, de que não teve menos vendas do que nos anos anteriores nas épocas de Natal e Ano Novo, impugna-se tudo o resto, com exceção do facto de a A. dispor de uma clientela habitual.”.

Perante a posição assumida pelo Réu em relação ao facto alegado pela Autora é, por isso, de entender que o Réu aceitou o facto de a Autora ter uma clientela habitual, o que corresponde ao facto alegado pela Autora na petição inicial, de que a não diminuição das vendas no período do Natal e do ano Novo se deveu ao facto de que “A Autora tem uma clientela fiel e conservadora”.

Nestes termos, falece razão ao ora Recorrente quanto ao erro de julgamento de facto que dirige contra a sentença recorrida em relação ao facto dado como provado no n.º 11, tendo existido uma correta interpretação da posição assumida pelo Réu na contestação apresentada em juízo.

1.3. Erro quanto ao facto provado n.º 15, devendo ser dado como não provado

No que respeita ao facto dado como provado no n.º 15 alega o Recorrente que não resulta provado que o objeto da atividade da Autora se materializa na prestação de serviços, “Com especial destaque, no que à venda de retalho concerne, para o bolo-rei, cuja qualidade de fabrico o torna um dos mais procurados por quem vive ou trabalha em Lisboa”.

Alega que para além do depoimento de J…., que não pode ser valorado, nenhuma outra testemunha depôs sobre essa matéria e, mesmo que o tivessem feito, sempre seriam depoimentos tendenciosos e pouco isentos, por se tratarem todos de trabalhadores do estabelecimento da Autora.

Invocando a falta de prova do facto alegado, considera que ele deve passar a não provado.

Sem razão, porquanto nos termos antecedentes, não se pode concluir pela falta de isenção ou de credibilidade do depoimento da testemunha J…….

Além disso, carece totalmente de fundamento a alegação genérica e inconcretizada do Recorrente quanto à falta de isenção de todas as demais testemunhas, por serem trabalhadoras do Réu.

Essa é uma alegação que o Réu podia ter feito aquando o interrogatório das testemunhas e, sendo caso disso, mediante a impugnação das testemunhas ou até se o entendesse mediante a sua contradita, não constituindo fundamento que abale o julgamento de facto constante da sentença.

Nestes termos, se impõe concluir pela improcedência, por não provado, do invocado erro de julgamento.

1.4. Erro quanto aos factos provados n.ºs 16 e 17, devendo o primeiro ser alterado na sua redação e o segundo ser dado como não provado

Sustenta o Recorrente que os factos dados como provados nos n.ºs 16 e 17 inferem um grau de imprecisão enorme quanto ao local onde efetivamente na obra ocorreram grandes escavações na referida Avenida Duque d`Ávila, pois esta tem extensão assinalável, começando na Avenida Marquês Sá da Bandeira e terminando na Avenida Manuel da Maia ou vice-versa, sendo do conhecimento generalizado que a obra não implicou a realização de grandes escavações e se confinou apenas a um quarteirão daquela Avenida.

Pugna que o teor do facto sob n.º 16 seja alterado, de forma a prever: “A obra obrigou a grandes escavações na Avenida Duque D`Ávila, no quarteirão compreendido entre a Avenida Defensores de Chaves e a Avenida 5 de Outubro – cfr. fls. 25-34 e 603-604 os autos”, e que o facto n.º 17 seja dado como não provado.

Vejamos.

Os factos que resultam provados nos n.ºs 16 e 17 da matéria de facto assente são os seguintes:
16. A obra obrigou a grandes escavações na Avenida Duque D'Ávila - cfr. fls. 25-34 e 603-604 dos autos.
17. Designadamente, no cruzamento desta avenida com a Avenida da República - cfr. fls. 25-34 e 603-604 dos autos.”.
Pretende o Recorrente abalar o julgamento de facto com o depoimento da testemunha Jo…., que transcreve parcialmente, olvidando que a sentença recorrida alicerça a fundamentação da demonstração desses factos em prova documental, nos termos dos documentos que identifica, correspondendo a plantas da obra que tem assinalados os locais das intervenções da obra.
Não só a prova testemunhal referida pelo Recorrente não abala a força probatória dos documentos que servem à demonstração dos factos em causa, como do depoimento da citada testemunha não é possível concluir pelos invocados erros da sentença, por aquilo que nela se dá como provado resultar igualmente das declarações prestadas em audiência e não existir qualquer erro ou contradição.

Nestes termos, falece razão ao Recorrente quanto aos invocados erros de julgamento da sentença recorrida.

1.5. Erro quanto ao facto provado n.º 18, devendo ser dada outra redação

No respeitante ao facto assente sob n.º 18 sustenta o Recorrente que ele enferma de enorme imprecisão.

Alega que até ao final de 2006 o trânsito na Avenida Duque d`Ávila, no troço junto ao estabelecimento da Autora, sempre se circulou normalmente e mesmo depois de 2006 ainda era possível circular em ¾ do troço ou quarteirão na Avenida onde se situa o estabelecimento da Autora, nunca tendo estado cortado em ambos os sentidos da Avenida Duque D`Ávila, ao longo de toda a sua extensão desde o cruzamento com a Avenida Defensores de Chaves, passando pelo cruzamento com a Avenida da República, até ao cruzamento com a Avenida 5 de Outubro.

Por o facto n.º 18 não corresponder com exatidão à realidade verificada e provada nos autos, alega o Recorrente que deve ser alterado, segundo a redação que propõe.

Vejamos.
A factualidade que se deu como provada na sentença recorrida sob o facto n.º 18 assume o seguinte teor: “O trânsito automóvel, foi cortado em ambos os sentidos da Avenida Duque D'Ávila, desde o cruzamento desta com a Avenida Defensores de Chaves, passando pelo cruzamento com a Avenida da República, até ao cruzamento com a Avenida 5 de Outubro - cfr fls. 25-34 e 603-604 dos autos.”.
Como resulta da motivação constante do próprio facto, esse facto foi dado por provado por prova documental, estando em causa plantas dos trabalhos e da obra, embora esses documentos tenham sido exibidos a várias testemunhas no decurso da audiência final.
O Recorrente pretende abalar o facto dado como assente, pedindo que se adote outra redação, que considera ser mais precisa e rigorosa, com base no depoimento da testemunha que identifica na alegação de recurso.
Porém, do depoimento da citada testemunha não é possível concluir no sentido em que o Recorrente alega no presente recurso, pois o que a testemunha refere é que a zona da Duque D`Ávila em frente à pastelaria S....... foi cortada ao trânsito automóvel, indo até à Avenida da República, embora permitisse o acesso até um determinado ponto.
Tal restrição de trânsito iniciou-se em março de 2006 até agosto de 2008 e durante esse período não havia acesso do trânsito rodoviário entre Avenida Duque D`Ávila no troço com a Avenida 5 de Outubro e a Avenida da República.
Tudo isto resulta do depoimento prestado pela testemunha que o Recorrente invoca como servindo de fundamento para abalar o teor do facto que se dá como provado no n.º 18 dos factos assentes, mas totalmente sem razão.
O Tribunal a quo baseou-se quando à prova do facto, quer nos documentos constantes dos autos, quer dos depoimentos prestados, não se retirando do depoimento da testemunha ora analisado coisa diferente do que se deu como provado.
Nestes termos, será de julgar improcedente, por não provado o erro de julgamento.

1.6. Erro quanto aos factos provados n.ºs 19, 20, 21 e 23, devendo ser dados como não provados ou ser especificado o período temporal

No que se refere à impugnação dos factos sob n.ºs 19, 20 e 21 do probatório assente, sustenta o Recorrente que são utilizadas expressões vagas e pouco precisas, quando o que se queria provar é que a colocação de vedações e tapumes aumentou em muitas dezenas de metros os percursos curtos.

Invoca que as testemunhas arroladas se limitaram a expressar a sua impressão subjetiva sem qualquer tipo de precisão ou de elementos objetivos e concretos, o que originou que o Tribunal desse como assente a matéria de facto que não tem elementos quantificados.

Invoca ainda que a testemunha J…… esclareceu que praticamente durante o período das obras foi possível contornar todo o passeio de fronte da montra do estabelecimento da Autora.

De imediato se impõe dizer que a factualidade dada como provada nos factos 19, 20 e 21 tem como meio de prova a prova documental, que consiste o documento junto com a petição inicial sob n.º 35, que corresponde a um desenho dos caminhos e trajetos pedonais para aceder à pastelaria S......., que comprovam o labirinto que então existia para se chegar a esse estabelecimento comercial, de resto, expressamente dado como provado no próprio teor do facto n.º 20.

A factualidade encontra-se comprovada documentalmente e as testemunhas que se pronunciaram sobre esses factos apresentaram a sua versão, que não se apresenta em oposição com a prova constante do documento n.º 35.

Acresce que esse documento permite contrariar a versão dos factos apresentada na alegação do Recorrente, de que foi possível contornar todo o passeio de fronte da montra do estabelecimento da Autora durante praticamente todo o tempo, por segundo o documento, não haver sequer acesso à montra do estabelecimento.

Mesmo a delimitação temporal que o Recorrente pretende introduzir não é por ele feita, pois a alegação de que o acesso ao estabelecimento sofreu uma alteração temporária e breve no percurso pedonal não se apresenta com suficiente grau de concretização.

De resto, a factualidade que se dá como provada e cujo teor consta do probatório da sentença recorrida é a que resulta alegada pelas partes nos seus articulados, tendo sido vertida para a seleção dos Factos Assentes e da Base Instrutória, tal como consta do despacho-saneador.

Não cabe ao Tribunal recorrido, nem sequer em sede de recurso jurisdicional, no Tribunal ad quem, conformar a alegação de facto que foi feita pelas partes nos articulados e com base da qual recaíram os meios de prova.

É na fase dos articulados que cabia ao Réu, ora Recorrente, contrapor, contrariar ou concretizar a versão dos factos apresentada pela Autora ou como agora alegado, conferir-lhe precisão.

A impugnação de facto que é feita no presente recurso pelo Recorrente mais do que atacar a prova dos factos levados aos factos assentes, põe em crise a concreta redação adotada, olvidando que o exato teor de cada facto resulta daquela que é a alegação das partes nos articulados e da sua confirmação pela prova produzida.

Por isso, no tocante aos factos 19, 20 e 21 o Recorrente conclui por essa matéria passe a figurar como não provada ou, no limite, passar a especificar-se o período temporal em concreto durante o qual essa factualidade ocorreu.

Porém, não só essa factualidade resulta demonstrada em juízo, nenhum erro de julgamento devendo ser assacado à sentença recorrida, como a concretização do período temporal que o Recorrente pretende que seja aditado não se mostra por ele concretizado ou especificado.

Nestes termos, não pode proceder o alegado em relação aos factos dados como assentes nos n.ºs 19, 20 e 21.

Em consequência, também não procede o alegado no tocante ao facto sob n.º 23, em que o Recorrente se limita a invocar que, na sequência do que se conclui para os factos provados sob n.ºs 19, 20 e 21, também não pode ser provado que o referido naqueles factos “torna o percurso confuso”, sendo o facto n.º 23 uma consequência dos anteriores.

Em suma, julgam-se improcedentes as conclusões do recurso acerca da impugnação dos factos dados por assentes sob n.ºs 19, 20, 21 e 23.

1.7. Erro quanto ao facto provado n.º 22, devendo ser dado como não provado

Pretende também o Recorrente que se dê como não provado o facto que consta sob n.º 22, mas mais uma vez sem razão, porquanto relendo a factualidade assente nela não se diz que os tapumes que diminuem ou eliminam a visão periférica dos transeuntes e que mudavam em função das necessidades da realização da obra fossem todos fechados.

Refere-se a tapumes elevados, o que se encontra devidamente demonstrado pelos depoimentos prestados e refere-se à diminuição da visibilidade, o que igualmente resulta demonstrado pelos excertos dos depoimentos testemunhais referidos pelo Recorrente.

Por isso, nenhum erro de julgamento deve ser assacado à sentença recorrida, que exija a sua reparação, mantendo-se o facto tal como foi dado por provado.

1.8. Erro quanto ao facto provado n.º 25, devendo ser dado como não provado

No que concerne ao facto provado sob n.º 25, sustenta o Recorrente simplesmente que ele não resultou provado, pelo que não podia ter sido dado como provado.

Porém, tal alegação, sem mais, não permite a sindicância pretendida pelo Recorrente, considerando o princípio da livre convicção da prova que assiste ao julgador perante quem a prova é produzida, segundo o princípio da imediação e nos termos e com os fundamentos supra expostos sobre a reapreciação do julgamento de facto pelo Tribunal de recurso.

Pelo que, improcede o alegado pelo Recorrente, por não provado em relação ao facto sob n.º 25.

1.9. Erro quanto aos factos provados n.º 24 a 28 e 31, devendo ser indicado o período temporal e o aditamento de um facto, sob 31-A

Em relação aos factos provados sob n.ºs 24 a 28 e 31 alega o Recorrente que os mesmos estão feridos de imprecisão temporal, devendo todos esses factos ser descritos por referência ao período a partir de 2007.

Mais alega especificamente quanto aos factos sob n.ºs 24 a 28 que o tribunal deveria ter salvaguardado a indicação expressa do período temporal, porque a Autora invocou nos seus articulados que estes factos se verificaram durante todo o período de 2004 a 2008 e isso não pode ser dado como provado.

Por isso, pugna pela alteração da matéria de facto sob os n.ºs 24 a 28 e 31 e que seja aditado um novo facto, sob n.º 31-A, com o seguinte teor: “Os factos referidos em 24 a 28 e 31apenas ocorreram após o início do ano de 2007.”.

Vejamos.

Compulsado cada um desses factos denota-se que não é referido qualquer período temporal em que tais ocorrências se sucederam.

Os factos provados são aqueles e apenas aqueles que resultam da sentença recorrida, inferindo-se o que deles consta, pelo que, não sendo dado como provado qualquer período temporal, não se pode concluir como o Recorrente, de que o Tribunal está a dar como provado que tais ocorrências ocorreram entre 2004 a 2008.

Nestes termos, julga-se não provado o erro de julgamento invocado.

1.10. Erro quanto ao facto provado n.º 30, devendo ser dado como não provado

No que concerne ao facto provado sob n.º 30, sustenta o Recorrente que o Tribunal não fez uma correta valoração da prova produzida e que esse facto não resultou provado, por nenhuma prova ter sido produzida.

Contudo, tal como antecedentemente se fez referência, tal alegação, sem mais, não permite a sindicância pretendida pelo Recorrente, considerando o princípio da livre convicção da prova que assiste ao julgador perante quem a prova é produzida, segundo o princípio da imediação e nos termos e com os fundamentos supra expostos sobre a reapreciação do julgamento de facto pelo Tribunal de recurso.

Improcede, assim o alegado pelo Recorrente, por não provado em relação ao facto sob n.º 30.

1.11. Erro quanto aos factos provados n.ºs 31 e 32, devendo ser dados como não provados

Segundo a alegação do Recorrente o Tribunal recorrido não fez uma correta valoração da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, não podendo tais factos ser dados como provados.

Totalmente sem razão.

Em primeiro lugar procede o Recorrente a uma alegação como se a matéria factual dada por provada resultasse da alegação, da iniciativa ou do impulso do Tribunal, o que é absolutamente de refutar, por resultar da alegação das partes e da prova produzida.

A matéria dada por provada em relação ao encerramento do átrio Norte da Estação de Metro do Saldanha visa enquadrar o contexto em que as acessibilidades no local e suas imediações ocorriam, sendo despropositado que o Recorrente se pretenda referir a qualquer juízo de crítica ou de controlo da gestão do seu património e da exploração da sua atividade.

Por outro lado, não tem qualquer sustento a alegação feita pelo Recorrente sobre a falta de prova da diminuição da clientela da Autora, quando essa matéria resulta da motivação do julgamento de facto, assente no depoimento de várias testemunhas.

Do depoimento de J……, consta “conhecer os fluxos de clientela da pastelaria S....... mas não a contabilidade, afirmando a diminuição da clientela da S....... de Setembro de 2004 a final de 2007 se deveu às obras do Metro”; a testemunha S….. também depôs sobre a perda da clientela e a diminuição do fabrico; a testemunha T….. referiu-se à diminuição de clientes e que os clientes deixaram de aparecer, uns porque pensavam que estava fechado, outros porque não queriam andar por dentro dos taipais, e a testemunha M….. referiu-se igualmente à diminuição de clientela e que durante as obras haviam manhãs em que estavam parados e os clientes deixavam de ir, embora a maior parte dos clientes habituais tenha voltado depois das obras.

Por isso, carece totalmente de fundamento a invocação do erro de julgamento imputado à sentença recorrida ou sequer a alegação de recurso de que a quebra de receitas não pode ser confundida com a redução de clientela, vistos as receitas advirem da clientela.

Não obstante, os factos impugnados referem-se à diminuição da clientela, o que se mostra inteiramente demonstrado pela prova testemunhal produzida, nos termos referidos.

E também carece de fundamento pretender dar como não provado o facto de a clientela da pastelaria S....... ter migrado para outros estabelecimentos, pois além desse facto ter sido referido pelas testemunhas, com relevo para a testemunha J….., que referiu expressamente ter passado a frequentar a pastelaria V…., onde via clientes da S......., essa é também uma consequência normal do mercado, considerando que a necessidade do consumidor não terá desaparecido no período em causa.

Neste sentido, improcede totalmente o erro de julgamento em relação à prova dos factos assentes sob n.ºs 31 e 32, os quais por resultarem provados se mantém nos exatos termos julgados na sentença recorrida.

1.12. Erro quanto aos factos não provados, devendo ser dado como provado o facto n.º 71 no que consta como seu quarto ponto

No que respeita aos factos dados por não provados, alega o Recorrente que não se pode conformar com a matéria de facto dada por não provada, incorrendo o Tribunal em manifesto erro de apreciação.

Na presente impugnação está em causa o facto que se deu como não provado no quarto ponto da matéria de facto não provada, referente a “Apenas no período de 17/01/2007 a 26/02/2007 houve maiores alterações à circulação do trânsito pedonal”.

Sustenta que durante a quase totalidade do período de duração das obras, os acessos ao estabelecimento da Autora se mantiveram exatamente os mesmos, podendo os clientes contornar toda a esquina, o que apenas não aconteceu no período compreendido entre 17/01/2007 e 26/02/2007, durante cerca de 40 dias, em que os acessos existentes não puderam ser utilizados e obrigarem a desvios de circulação de peões.

Sem razão.

A extensa matéria de facto dada por provada na sentença recorrida e a sua respetiva motivação é bem elucidativa quanto às alterações ocorridas à circulação do trânsito pedonal e às limitações de acesso à pastelaria S......., que sofriam alterações em função da execução dos trabalhos da obra e decorrentes das próprias barreiras e taipais colocados.

Por isso, a alegação de que os acessos ao estabelecimento se mantiveram praticamente os mesmos está em direta e flagrante contradição com os factos provados, assim como a delimitação temporal pretendida, já que esse período não corresponde a condicionamentos ou limitações de acesso, mas a uma total impossibilidade dos acessos existentes.

Neste sentido, será de julgar não provado o alegado erro de julgamento resultante da factualidade dada como não provada.

1.13. Erro quanto aos factos não provados, devendo ser dado como provado o facto n.º 72, correspondente ao que consta sob o ponto 5

Pugna o Recorrente pelo erro de julgamento no tocante ao facto não provado que consta sob o seu ponto 5, de que “Antes do início das obras não era possível estacionar em frente à “Pastelaria S.......”, a qual se situa numa zona em que sempre houve poucos lugares de estacionamento disponíveis”.

Segundo a alegação do Recorrente já antes das obras não era possível estacionar em frente ao estacionamento, pelo que tal facto deveria ter sido julgado como provado.

Porém, como resulta da prova produzida, resultante do depoimento da testemunha J….., resulta que era possível estacionar se conseguisse arranjar lugar.

Assim, não resulta provado que não fosse possível estacionar á frente da pastelaria S......., como pretende o Recorrente, pelo que, não pode proceder o alegado erro de julgamento quanto ao facto não provado.

1.14. Erro quanto aos factos não provados, devendo ser dado como provado o facto n.º 73

Prossegue o Recorrente com a impugnação do facto que se dá como não provado sob o ponto 8, que se refere “A diminuição de clientela e a consequente retracção de vendas no período considerado de Setembro de 2004 a final de 2007 é causada pela conjuntura recessiva”, invocando que durante esse período o país atravessou uma crise, conforme provado pelos documentos juntos que retratam as dificuldades sentidas pelo setor.

Vejamos.

A factualidade que o Recorrente pretende que se dê por provada não tem a ver apenas com a situação do país ou sequer com o sector da restauração no período em causa.

O Recorrente sustenta o erro de julgamento de facto da sentença recorrida porque alega ter sido provado, documentalmente e por prova testemunhal, que a diminuição da clientela e a consequente retração de vendas da pastelaria S....... foi causada pela conjuntura recessiva.

Tal facto apresenta-se em manifesta e flagrante contradição com a demais factualidade demonstrada nos autos e constante da selecção dos factos provados.

A prova dos factos não tem que ver com um qualquer desejo, vontade, ideia ou sequer convicção que se tenha sobre certa realidade da vida, mas antes decorre do que se consegue demonstrar pelos meios de prova disponíveis e segundo as regras legais do valor probatório de cada meio de prova.

Em face de toda a prova produzida sobre a realização das obras, a sua intensidade e impacto, a sua duração no tempo e os impactos e a afetação do estabelecimento comercial da Autora, vir alegar que a diminuição da clientela e a retracção de vendas é causada pela conjuntura recessiva do país, consiste num exercício muito pouco credível e ainda menos sustentado em toda a prova produzida nos autos.

A realidade de facto com relevo para o mérito da causa não se apresenta isolada, nem é valorada isoladamente, antes merecendo uma análise global aturada e desenvolvida do Tribunal, de forma a compreender todos os reais circunstancialismos dos termos do litígio e das posições das partes assumidas nos articulados e da dialética contraditória ocorrida na audiência final.

O erro de julgamento de facto dirigido contra a sentença recorrida esbarra com o peso de toda a demais prova produzida, assumindo-se como manifestamente infundado.

Em consequência, julgam-se não provadas as conclusões do recurso, mantendo-se a factualidade em causa como não provada.

1.15. Erro quanto aos factos não provados, devendo ser dado como provado o facto n.º 74, constante sob o seu ponto 10

Discorda o Recorrente que se dê como não provado o que consta sob o ponto 10 dos factos não provados, de que “A Autora normalmente só tem uma porta em funcionamento”.

Para o Recorrente ficou inequivocamente demonstrado que o estabelecimento da Autora normalmente só tem uma porta e funcionamento, pelo que o Tribunal deveria ter dado este facto como provado.

Porém, mais uma vez sem razão, porquanto da prova produzida é possível concluir que existem duas portas, uma para a Avenida da República e outra para a Avenida Duque D´Ávila, estando esta apta a funcionar e que foi a única que esteve aberta por causa das obras, embora a porta principal seja a da Avenida da República.

Precisamente porque existem duas portas é que não assiste razão ao Recorrente ao pugnar pelo erro de julgamento da sentença ao dar como não provado que a Autora normalmente só tem uma porta em funcionamento.

De resto, do facto provado sob n.º 1 verifica-se a indicação das duas Avenidas e dos seus respectivos números de polícia, como correspondendo ao estabelecimento da Autora e, do mesmo modo, no facto provado sob n.º 2.

Assim se compreende também o facto que se dá como provado sob n.º 9, relativo ao encerramento da porta da Avenida da República e o que se dá como provado no facto sob n.º 10, de utilização da porta da Avenida Duque D`Ávila.

Nestes termos, carece de fundamento o invocado erro de julgamento quanto à não prova do facto alegado.

1.16. Erro quanto aos factos não provados, devendo ser dado como provado o facto n.º 75

Por último, invoca o Recorrente o erro de julgamento em relação ao último dos factos não provados, sob n.º 12, de que “Os acessos ao estabelecimento da A. sempre estiveram completamente desimpedidos”, por entender que, pelo menos, deveria ter sido dado como parcialmente provado, pois apenas assim não aconteceu no período entre 17/01/2007 e 26/02/2007.

Porém, foi outro o entendimento do Tribunal a quo, que é de manter, por ser de considerar diversos tipos de limitações a esses acessos e em face de toda a demais prova dada por provada, que comprovam inequivocamente as dificuldades de acesso ao estabelecimento comercial da Autora.

Neste sentido, julga-se não provado o invocado erro de julgamento de facto, por não provado.


*

Em face do exposto, será de julgar totalmente improcedente a impugnação do julgamento da matéria de facto, seja no tocante aos factos dados como provados, seja aos factos julgados na sentença recorrida como não provados, mantendo-se a integralidade do julgamento de facto realizado na sentença recorrida, sendo com base na matéria de facto apurada que recairá o julgamento de direito.

2. Erro de julgamento de direito, quanto ao pressuposto do dano e do nexo de causalidade e quanto ao quantum indemnizatório, no respeitante à consideração dos lucros cessantes e dos juros vencidos

Dirige o Recorrente o erro de julgamento de direito contra a sentença recorrida no tocante aos pressupostos do dano e do nexo de causalidade, assim como em relação ao concreto quantum da indemnização fixado, no que respeita a ter-se incluído os lucros cessantes e os juros que já haviam sido considerados no montante peticionado pela Autora.

De imediato merece ser destacado que a total improcedência da impugnação do julgamento de facto constante da sentença recorrida se assume como relevante para a análise e apreciação dos alegados erros de julgamento de direito, pois este assenta necessariamente na matéria de facto que resulta demonstrada nos autos.

Concorda o Recorrente com o enquadramento de direito constante da sentença sobre a prática pelo órgão ou agente da Administração de ato que formal e substancialmente se confina nos limites do poder de que legalmente dispõe, ou sejam um ato lícito de um órgão do Estado ou de outra pessoa colectiva pública, assim como que essa atuação ocorra por razões de interesse público.


*

A discordância radica, de entre o mais, que se verifique o pressuposto do dano resultante do ato ou da atuação desenvolvida pelo Réu, alegando que não se encontra comprovada a verificação de um dano por atuação que lhe seja imputável.

A Recorrente apenas reconhece o facto de, em consequência da realização das obras, no período entre 17/01/2007 e 26/02/2007, a Autora ter encerrado a porta da pastelaria na Avenida da República e ter passado a utilizar uma porta de recurso, mais estreita, na Avenida Duque D`Ávila, pois sustenta que, quanto ao demais, os factos não se passaram como descritos, nos termos em que procedeu à impugnação da matéria de facto.

Ora, é manifesta a improcedência do alegado pela Autora, ao pretender através da invocação do erro de julgamento de direito pôr em crise a factualidade que se encontra provada nos autos e que serve de fundamento à aplicação dos normativos de direito.

Os factos são aqueles que constam como provados nos autos, pelo que, quaisquer outros que não constem da fundamentação de facto não podem ser considerados ou valorados pelo Tribunal.

Neste sentido, tudo quanto se mostre alegado pelo Recorrente em sede de erro de julgamento de direito que tenha por base uma diferença de valoração ou consideração dos factos assentes, não pode ser considerado por este Tribunal de recurso.

Tal é o que se verifica em relação ao pressuposto da responsabilidade civil do dano, aqui configurado no âmbito da responsabilidade civil por factos lícitos como prejuízos especiais e anormais, já que estes, enquanto requisito normativo da obrigação de indemnizar encontram-se inequivocamente demonstrados nos autos.

Segundo a fundamentação de direito vertida na sentença recorrida e que ora se acolhe in totum, na parte ora relevante:

Provou-se que a obra obrigou a grandes escavações na Avenida Duque D'Ávila, designadamente, no cruzamento desta avenida com a Avenida da República.

As escavações da obra implicaram alterações ao trânsito de veículos automóveis, públicos e privados e ao trânsito pedonal na Avenida Duque D'Ávila. Bem como, alterações das paragens dos transportes colectivos. E ao encerramento do átrio Norte da estação de Metro do Saldanha. O trânsito automóvel, foi cortado em ambos os sentidos da Avenida Duque D'Ávila, desde o cruzamento desta com a Avenida Defensores de Chaves, passando pelo cruzamento com a Avenida da República, até ao cruzamento com a Avenida 5 de Outubro.

Em consequência das obras, entre 17/01/2007 e 26/02/2007, a Autora encerrou a porta da "Pastelaria S......." no n.º 11-C de polícia da Avenida da República e organizou o acesso ao seu estabelecimento por uma porta de recurso, mais estreita, sita no n.º 111 de polícia da Avenida Duque D'Ávila.

Provou-se que a colocação de vedações e tapumes aumentou em muitos metros os percursos para alcançar o estabelecimento da Autora, pois houve necessidade de criar percursos alternativos que foram sendo alterados consoante as fases de execução das obras.

Provou-se, também, que o espaço por onde circulavam os peões estava ladeado por tapumes elevados, que diminuíam ou eliminavam a visão periférica dos transeuntes e que mudavam em função das necessidades da realização da obra.

O percurso era confuso.

O Réu instalou e fez circular e manobrar no estaleiro da obra, a poucos metros do estabelecimento da Autora camiões pesados, com betoneiras incorporadas ou destinados ao transporte de materiais de construção ou à retirada de terras e entulhos, gruas, guindastes, tractores, retro escavadoras e outros equipamentos destinados à realização da obra que se propôs executar.

Estes factos tornaram as imediações do estabelecimento da Autora num local onde o ruído era por vezes desagradável.

As vibrações produzidas pela circulação e manobras de veículos pesados, das gruas e dos guindastes fizeram vibrar o estabelecimento da Autora. Criando nas pessoas, uma sensação de insegurança e de incomodidade impeditiva de qualquer conversa com uma intensidade de som normal.

A Autora protegeu a porta do n.º 11-C da Avenida da República contra possível rebentamento dos vidros, provocado pelas vibrações ou por estilhaços.

Ora, o objecto social da Autora materializa-se através da prestação de serviços de restauração, pequenos-almoços, almoços e lanches no "self-service", bem como, através da prestação de serviços de cafetaria e de produtos de pastelaria que a própria Autora fabrica, cafés e outras bebidas, nas referidas instalações de "self-service" ou ao balcão. E, ainda, através da venda dos mencionados produtos de cafetaria e pastelaria por ela fabricados, para consumo fora do estabelecimento. Com especial destaque, no que à venda a retalho concerne, para o bolo-rei, cuja qualidade de fabrico o torna um dos mais procurados por quem vive ou trabalha em Lisboa.

A "Pastelaria S......." é um local que as pessoas procuram para conviver e/ou para, num ambiente calmo e aprazível, consumir os serviços oferecidos e para proceder a encomendas ou adquirir, para consumo no exterior, produtos de cafetaria e de pastelaria.

A clientela da "Pastelaria S......." é constituída por pessoas da classe média, de meia-idade e idosos.

O corte do trânsito, do estacionamento automóvel e dos transportes colectivos, o encerramento do átrio Norte da Estação de Metro do Saldanha, as dificuldades colocadas ao acesso pedonal, a incomodidade e insegurança emergentes das vibrações e dos ruídos incomodativos e desagradáveis e as dificuldades de acesso afastaram a clientela do estabelecimento da Autora.

Levando-a a procurar os serviços de estabelecimentos congéneres, nas imediações, designadamente, a Pastelaria V….., provocando diminuição de vendas no período de Setembro de 2004 a final de 2007.

Assim, no exercício da referida actividade de interesse público e como consequência desta actividade o Réu lesou bens da Autora, causando-lhe danos.


*

Contudo, não basta que tenha causados danos à Autora, pois como vimos só são indemnizáveis os encargos ou danos especiais e anormais, ou seja, não são indemnizáveis os danos ou de pequena gravidade que devam ser entendidos como um encargo normal exigível como contrapartida dos benefícios que derivam do funcionamento dos serviços públicos.

Como refere Carlos Cadilha in obra citada pág. 302 a especialidade e anormalidade são requisitos do prejuízo indemnizável, enquanto pressuposto da responsabilidade civil e não propriamente um critério do cálculo da indemnização.

Este entendimento é válido quer no âmbito do anterior regime aplicável ao caso dos autos, quer do actualmente em vigor.

Assim, caracterizando-se o dano ou prejuízo como especial e anormal há lugar à indemnização pelo sacrifício desde que se verifiquem os demais requisitos materiais do dever ressarcitório: a imposição de um encargo ou a causação de um dano a um particular, no quadro de uma intervenção de uma autoridade pública, por razões de interesse público.

No caso da Autora podemos qualificar os danos sofridos pela mesma como danos especiais, pois os danos causados não foram generalizados, incidiram de forma desigual sobre a Autora, ou seja, a linha de Metro em tese causará benefícios a todos os utentes, bem como, aos moradores e demais comerciantes da zona, e em geral aos habitantes de Lisboa, contudo, a Autora teve de suportar a instalação do estaleiro junto ao seu estabelecimento, escavações, movimentação de máquinas para execução das obras, implantação e movimentação de diversos materiais através de grua e camiões junto ao seu estabelecimento.

Igualmente, as poeiras resultantes da execução dos trabalhos, ruídos e vibrações obrigaram-na a especiais cuidados, nomeadamente na exposição dos produtos, assim como, provocaram o afastamento dos clientes, cujos efeitos a Autora sentiu no período de Setembro de 2004 até final de 2007 e que se traduziram em diminuição de vendas e receitas.

O que nos permite concluir que se mostra quebrado o princípio da igualdade na repartição dos encargos públicos, tendo, assim, a Autora sofrido prejuízos especiais.

Bem como, anormais, pois ultrapassaram os custos próprios da vida em sociedade, concretamente, em termos de duração e de gravidade.

Ora, no caso dos autos, atentos os factos provados não se pode concluir que estamos perante danos generalizados e de pequena gravidade insusceptíveis de ser indemnizáveis.

Ao invés deve concluir-se que estamos perante prejuízos anormais, pois, revestem-se de um certo peso ou gravidade, em termos de ultrapassar os limites daquilo que, no caso, a Autora tem de suportar enquanto membro da comunidade, extravasando os encargos sociais normais, exigíveis em contrapartida da existência e funcionamento dos serviços públicos, no caso, o Metro e prejuízos especiais, pois, não foram impostos à generalidade das pessoas, empresas ou comerciantes da zona, incidindo desigualmente sobre a Autora que além de suportar as obras com as escavações à porta do estabelecimento, teve ainda, localizado à frente do estabelecimento o estaleiro, com uma grua de grandes dimensões como se provou e se referiu.

Ainda que não se tenha provado que os estabelecimentos situados nas cercanias do átrio Sul da estação do Saldanha (que se manteve sempre aberto) e aqueles que se localizam nas cercanias do átrio Norte mas longe do estaleiro das obras, não sofreram qualquer prejuízo decorrente das obras e vão beneficiar delas tanto como a Autora, provou-se, o que basta para se dar como verificado este pressuposto da responsabilidade civil por acto lícito, ou seja, que a Autora sofreu prejuízos anormais e especiais que não foram sofridos pela generalidade das pessoas beneficiárias do serviço a prestar pelo Réu após a conclusão das obras, o que permite configurar a existência de violação do princípio da igualdade na repartição dos encargos públicos que justifique a intervenção restauradora da indemnização.

Nos presentes autos não se trata de prejuízos resultantes do arranjo, pavimentação de uma concreta rua ou artéria que onere especialmente todos os moradores ou comerciantes da mesma, sendo que, os moradores ou comerciantes de uma outra artéria suportarão os inerentes custos de reparação dessa outra artéria, sendo assim os encargos repartidos de forma proporcional ou sucessiva pela colectividade mais próxima e em tese beneficiária directa da mesma, sejam moradores ou comerciantes da rua ou artéria.

Estamos perante um prolongamento de uma linha de Metro, que beneficiará um número indistinto de utilizadores, sendo os trabalhos realizados no interesse da generalidade dos cidadãos e que causou especiais e anormais à Autora para a respectiva realização, não só pela gravidade, mas também pela duração dos mesmos, pois ainda que os trabalhos não lhe tenham causado o mesmo incómodo ou prejuízo ao longo de todo o período, o certo é que os mesmos decorreram de Setembro de 2004 até 27/10/2008, estendendo-se, assim, por cerca de quatro anos, pelo que, o ónus imposto à Autora ultrapassou os normais distúrbios que uma tal situação acarretou ao comum dos utentes daquela artéria.

Provou-se que:

- A Autora no ano de 2003 face a 2002 teve uma quebra global de 2,79%, mas com oscilações significativas, positivas e negativas, mensalmente;

- O ano de 2004 em relação a 2003 teve globalmente uma evolução positiva de 1,50%. Até Agosto de 2004 os proveitos registaram uma variação positiva de 6,77%, em que apenas o mês de Fevereiro de 2004 teve uma evolução negativa (0,58%) e de Setembro a Dezembro de 2004 registou-se um decréscimo global de 7,15%, com principal incidência no mês de Outubro que registou uma variação de - 13,65%;

- O ano de 2005 regista uma quebra global de 9,39%, decorrente da variação negativa registada, com oscilações, de Janeiro a Novembro. O mês de Dezembro teve uma ligeira variação positiva (0,55%);

- O ano de 2006 em relação a 2005 teve uma quebra global de 2,60%, com variações negativas e positivas ao longo do ano;

- O ano de 2007 face a 2006 teve uma quebra global de 6,85%, registando apenas evolução positiva nos meses de Outubro e Novembro;

- A preços correntes, anualmente, regista-se uma diminuição dos proveitos, com excepção de 2004, que registou um aumento de 1,50%;

- A preços correntes, mensalmente, verifica-se uma tendência de quebra a partir de Setembro de 2004;

- A preços constantes, anual e mensalmente, verifica-se uma tendência mais evidente de quebra dos proveitos. A quebra de 2005 foi de 11,43%, em 2006 de 5,53% e em 2007 de 9,30% e, mensalmente, em nenhum dos meses a evolução é positiva em 2005 e 2006, e em 2007 apenas os meses de Outubro e Novembro registaram aumentos (0,14% em Outubro e 0,13% em Novembro);

Sucede que como se provou no ano de 2004 os proveitos da Autora aumentaram de Março a Agosto, tendo sofrido uma quebra a partir de Setembro, data de inicio das obras, tendo começado a diminuir, situação que se manteve no período de execução das obras, com pequenas excepções, como resulta do quadro constante do ponto 54 da FF, que aqui se dá por integralmente reproduzido.

O que representa um sacrifício pesado para a Autora, uma limitação considerável da sua posição jurídica no aspecto aqui em causa.

Tais danos ultrapassam, assim, o ónus natural decorrente da vida em sociedade, e, sendo especiais, gozam de gravidade, importância e peso que justificam a sua ressarcibilidade, nos termos do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 48 051.”.

O julgamento antecedente, amplamente fundamentado do ponto de vista factual, encontra pleno acolhimento no direito aplicável ao instituto da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas no tocante à verificação do pressuposto do dano, aqui caracterizado no âmbito da responsabilidade por factos lícitos, como prejuízos especiais e anormais.

De resto, em rigor, o Recorrente não logra atacar a sentença recorrida no tocante ao julgamento de direito em relação ao pressuposto do dano, configurado como prejuízos especiais e anormais, por fazer depender toda a sua alegação de uma nova versão dos factos que, segundo o seu entendimento, devem ser considerados provados em juízo.

Mesmo na parte em que o Recorrente se refere aos prejuízos especiais e anormais e alega que os danos causados à Autora são de natureza generalizada e afetam todos os que na área de influência da obra não puderam laborar dentro da total normalidade, traduzindo um encargo normal exigível a todos quantos beneficiam do serviço público do metropolitano, tal não pode deixar de considerar-se totalmente refutado com base na factualidade demonstrada nos autos, que contraria inequivocamente toda esta alegação do Recorrente.

É, pois, manifesta a falta de razão do Recorrente quanto ao alegado no presente recurso relativamente à não prova do pressuposto da verificação do dano resultante da atuação imputável ao Réu, por os factos em que alicerça a sua alegação não resultarem, enquanto tais, provados e não provados em juízo.


*

Do mesmo modo no tocante ao pressuposto do nexo de causalidade, por não ser de acolher a alegação do Recorrente de que no caso falta a atuação lesiva imputável ao Réu e o dano decorrente dessa atuação.

A alegação do Recorrente no presente recurso no tocante à falta de verificação dos requisitos da responsabilidade civil não só não se mostra concretizada no plano dos factos, como não se mostra substanciada do ponto de vista do direito, por nenhumas razões de facto e de direito serem invocadas pelo Recorrente para contrariar o julgamento da sentença recorrida e demonstrar o seu erro de julgamento de direito.

Por isso, nenhuma censura procede em relação ao decidido na sentença recorrida, acolhendo-se o aí decidido a respeito do pressuposto do nexo de causalidade, na parte considerada ora relevante em função do fundamento do recurso:

O problema do nexo de causalidade entre o facto e o dano traduz-se na averiguação, do ponto de vista jurídico, de quando é que um prejuízo se pode qualificar como consequência de um dado facto.

A teoria mais correcta para resolver o problema do nexo causal entre o facto e o dano é a teoria da causalidade adequada, acolhida pela doutrina e com assento na lei (artigo 563º do Código Civil); encontrando consagração na referência a "provavelmente".

«O nexo de causalidade é um “pressuposto da responsabilidade civil que consiste na interacção causa/efeito, de ligação positiva entre a lesão e o dano, através da previsibilidade deste em face daquele, a ponto de poder afirmar-se que o lesado não teria sofrido tal dano se não fosse a lesão (art. 563º do C.Civil)” – Ac. STA de 07.06.2006 – Rec. 1.177/05.

De acordo com a jurisprudência uniforme deste STA, o art. 563.º do CCivil (“A obrigação de indemnizar só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”) consagra a teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa, proposta por Ennecerus-Lehman, segundo a qual a condição deixará de ser causa do dano sempre que ela seja de todo indiferente para a produção do mesmo, e só se tenha tornado condição dele em virtude de outras circunstâncias, sendo pois inadequada à sua produção (cfr. Ac. de 16.05.2006 – Rec. 874/05, com vasta citação de jurisprudência).

À luz desta teoria, não serão ressarcíveis todos e quaisquer danos que sobrevenham ao facto, mas tão só os que ele tenha realmente ocasionado, ou seja, aqueles cuja ocorrência com ele esteja numa relação de adequação causal.

Por outras palavras, dir-se-á que o juízo de adequação causal tem que assentar numa relação intrínseca entre o facto e o dano, de modo que este decorra como consequência normal e típica daquele, ou seja, que corresponda a uma decorrência adequada do mesmo.».

Este entendimento é igualmente válido para a averiguação do nexo de causalidade no âmbito da responsabilidade por facto lícito.

Provou-se que o corte do trânsito, do estacionamento automóvel e dos transportes colectivos, o encerramento do átrio Norte da Estação de Metro do Saldanha, as dificuldades colocadas ao acesso pedonal, a incomodidade e insegurança emergentes das vibrações e dos ruídos incomodativos e desagradáveis e as dificuldades de acesso afastaram a clientela do estabelecimento da Autora, levando-a a procurar os serviços de estabelecimentos congéneres, nas imediações, designadamente, a Pastelaria Versalhes, provocando diminuição de vendas no período de Setembro de 2004 a final de 2007.

E que os clientes fugiram das obras do Metro que causavam barulho, vibrações nos edifícios, impossibilidade do acesso por transportes públicos ou privados e das dificuldades do acesso pedonal e não da "Pastelaria S.......", dos produtos que fabrica, dos serviços que presta ou da equipa que ali trabalha.

Em consequência das obras, muitos clientes deixaram de consumir no estabelecimento da Autora as suas refeições (pequeno-almoço, almoço, lanche e jantar), ou de ali se deslocar para tomar a "bica" e comer um rissol ou um croquete ou para ali encomendar (para consumo fora do estabelecimento), bolos de aniversário e outros produtos de pastelaria e de cafetaria.

A diminuição da clientela é em abstracto, idónea, em condições normais, para produzir os enunciados danos sofridos pela Autora e em concreto constituiu condição dos danos acima referidos.

Estando, assim, preenchido o necessário requisito da existência de nexo de causalidade entre as obras e os prejuízos sofridos pela Autora.”.

Pelo que, nenhuma razão assiste ao Recorrente no respeitante ao erro de julgamento relativo ao pressuposto do nexo de causalidade.


*

Por último, no tocante ao quantum indemnizatório fixado na sentença, alega o Recorrente que, admitindo a obrigação de indemnizar, não pode concordar que a quebra de receitas tenha equivalência com os lucros cessantes, alegando que estes não se mostram reclamados ou sequer identificados nos autos, lavrando o Tribunal em manifesto erro.

Insurge-se ainda o Recorrente quanto à condenação em juros, porquanto a quantia peticionada pela Autora refere-se a € 136.372,53 de capital em dívida e € 14.610,17 de juros moratórios, o que perfaz o valor de € 150.982,70, peticionado pela Autora.

Daí que segundo o Recorrente só possa ser um lapso da sentença condenar o Réu no valor peticionado, acrescido de juros desde 30/10/2008.

Vejamos.

No que respeita ao quantum da indemnização, resulta da fundamentação de direito da sentença recorrida que se acolhe a doutrina do Acórdão do TCAS n.º 06958/10, de 11/04/2013, a respeito de saber se a indemnização por atos administrativos legais ou actos materiais lícitos do Estado e demais pessoas colectivas públicas, no domínio do D.L. n.º 48.051, abrange, ou não, os lucros cessantes.

Esse acórdão pugna pelo entendimento de que na vigência do D.L. n.º 48.051 a questão não era pacífica, mas que constituía entendimento maioritário os que entendiam que a indemnização por facto lícito devia abranger os lucros cessantes.

Por relevante e esclarecedor, transcreve-se o extrato do citado Acórdão do TCAS, acolhido no discurso fundamentador da sentença recorrida sobre esta questão de direito:

Com efeito, na vigência deste diploma, que veio a ser revogado pela Lei 67/2007, de 31-12, a resposta não reuniu consenso na doutrina e jurisprudência.

Cremos, no entanto, que, pelo menos tendencialmente, eram mais os que consideravam (expressa ou implicitamente) que, uma vez preenchidos os requisitos da especialidade e anormalidade dos danos imediatamente causados pelo acto lícito da administração, os danos deviam ser integralmente reparados segundo os critérios gerais dos artigos 562º e segs do Código Civil (cfr. exemplificativamente, na doutrina, António Dias Garcia, ob. cit., pág. 209, e, na jurisprudência, os Acórdãos do TCAS, 15-04-2010, proc. 2065/06, de 1-03-2012, proc. 7528/11, 4-10-2012, proc. 5204/09, (em que também fomos relator), todos consultáveis em www.dgsi.pt).

Pelo contrário, outros sempre entenderam ou passaram a entender (pouco antes ou com a entrada em vigor da citada Lei 67/2007) que, no domínio do DL 48 051, a indemnização por facto lícito de gestão pública devia ser reduzida à mera compensação dos sacrifícios sofridos, dela ficando excluídos os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão (lucros cessantes).

Não há dúvida que, com a entrada em vigor da Lei 67/2007 (na doutrina já a partir dos trabalhos preparatórios da reforma), o art. 16º deste novo diploma (arrumado no final do diploma e num capítulo autónomo) ao mandar atender, para cálculo da indemnização, designadamente, ao “grau de afectação do conteúdo substancial do direito ou interesse violado ou sacrificado”, sustenta, objectivamente, o entendimento de que a indemnização por prejuízos decorrentes de facto lícito não abrange os lucros cessantes.

(…)

Porém, não entraremos em consideração com o novo regime jurídico, que seguramente apela a considerações que não podem ser tidas em conta na vigência do diploma aplicável ao caso.

No domínio do Decreto-Lei n.º 48051, de 21 de Novembro de 1967, a responsabilidade por actos administrativos e actos materiais lícitos está configurada como uma das modalidades da responsabilidade civil extracontratual da Administração Pública, em que os danos especiais e anormais imediatamente decorrentes de acto administrativo legal ou acto material lícito de gestão pública, segundo os critérios gerais dos artigos 562.º e segs do Código Civil, são susceptíveis de integral reparação tal como acontece com os danos decorrentes de factos ilícitos e culposos, por ser naquelas disposições que estão contemplados os critérios de determinação do quantum indemnizatório do regime geral da responsabilidade civil extracontratual, sem distinção entre a origem do dano ou da natureza do facto. (…)”.

Entendimento este aplicável ao caso sub iudice e que seguiremos.”.

No sentido e em reforço da posição assumida na sentença recorrida, de sob a vigência do D.L. n.º 48.051 a obrigação de indemnizar por facto lícito abranger os lucros cessantes, vide o Acórdão do STA, n.º 01314/13, de 18/06/2015, nos termos do qual:

I – No domínio do DL nº. 48051, a obrigação de indemnização pela prática de acto lícito regula-se pelos artºs. 562 e sgts. do C. Civil, abrangendo a cobertura de todos os danos, desde que especiais e anormais, onde de incluem, assim, tanto os danos emergentes como os lucros cessantes.”.

À luz da citada jurisprudência do STA, cuja fundamentação ora se acolhe:

O art.º 9.º, do DL n.º48051, de 21/11/67, consagrava o dever do Estado e das demais pessoas colectivas públicas indemnizarem os particulares a quem, no interesse geral, mediante actos administrativos legais ou actos materiais lícitos, impusessem encargos ou tivessem causado prejuízos especiais e anormais.

Embora o preenchimento dos requisitos da especialidade e anormalidade dos danos constituísse um pressuposto da responsabilidade civil pela prática de facto lícito, sendo apurado que os prejuízos verificados reuniam essas características teriam eles de ser integralmente reparados, à semelhança do que sucede na responsabilidade civil pela prática de facto ilícito e culposo.

Efectivamente, não distinguindo o referido diploma legal entre as diversas modalidades de responsabilidade civil, a obrigação de indemnização rege-se, em relação a todas elas pelos arts. 562.º e seguintes.

Assim, ao contrário do que alega o R., na responsabilidade civil pela prática de facto lícito, o ressarcimento dos prejuízos, desde que especiais e anormais, não está sujeito a qualquer limitação ou regras especiais, devendo o lesante reconstituir a situação que existiria se não fosse a lesão, aí incluindo tanto os danos emergentes como os lucros cessantes (cf. art.º564.º, n.º1). Com efeito, se a responsabilidade por factos lícitos tem o seu fundamento no princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos e se nela se desvaloriza a ocorrência de danos generalizados e de pequena gravidade, não há justificação para que, além deste, haja outro factor limitativo da indemnização de danos, os quais são inequivocamente graves e incidem desigualmente sobre certos cidadãos por só abrangerem um indivíduo ou um grupo restrito de indivíduos.”.

Neste sentido, em face de todo o exposto, não procede a alegação do Recorrente de que os lucros cessantes não se integram na obrigação de indemnizar.


*

No que releva a apurar se o Tribunal recorrido incorreu no lapso de considerar por duas vezes o montante dos juros de mora, importa considerar o quantum da indemnização peticionado pela Autora e o que foi fixado na sentença recorrida.

Na petição inicial a Autora peticionou a quantia de € 150.982,70, acrescida de juros de mora a contar de 28/10/2008 até efetivo pagamento, os quais incidem sobre o capital de € 136.372,53.

Da alegação da Autora resulta que à importância de € 136.372,53 acrescem juros de mora vencidos desde 14/11/2007 a 31/12/2007, no valor de € 2.098,27

E ainda os juros de mora no valor de € 7.532,25, sobre o montante de € 136.372,53, desde 14/11/2007 até 31/12/2007; e ainda a quantia de € 4.979,65 de juros moratórios calculados sobre o capital em dívida, vencidos entre 01/07/2008 e 27/10/2008.

Assim, peticiona a Autora a quantia de € 136.372,53, acrescida de € 14.610,17 de juros de mora, no total de € 150.982,70, acrescidos dos juros que se vencerem desde o dia 28/10/2008.

Por sua vez resulta da sentença recorrida que foi considerado que nos autos a Autora reclamou danos patrimoniais no valor € 136.372,53, acrescidos de juros moratórios que se vencerem desde 28/10/2008.

Pedindo, assim, que o Réu seja condenado a pagar à Autora a quantia de € 150.982,70, acrescida de juros moratórios comerciais que se vencerem desde 28.10.2008, até efetivo reembolso, calculados à taxa anual de 11,2% (ou outra que, entretanto, venha a ser fixada pelo Governo), sobre o capital de € 136.372,53.

Tal significa que não assiste razão ao Recorrente, não incorrendo a sentença recorrida no lapso de condenar por duas vezes ao pagamento de juros, pois os juros moratórios no valor de € 14.610,17 são os juros vencidos, que não incluem os juros vincendos a contar de 28/10/2008, tal como decidido na sentença recorrida.


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Do mesmo modo, mantendo-se integralmente, quer quanto aos factos, quer quanto ao direito, o decidido na sentença recorrida, sendo o Réu condenado no pedido, recai sobre ele o encargo pelo pagamento das custas processuais.

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Termos em que, em face de todo o exposto, improcedem na totalidade as conclusões do recurso em relação ao erro de julgamento de direito dirigido contra a sentença recorrida, por não provadas.

***

Pelo exposto, será de julgar totalmente improcedente o recurso e manter a sentença recorrida.

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Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. A impugnação do julgamento de facto ocorre perante os pressupostos e exigências previstas no artigo 640.º do CPC, incumbindo ao recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto “obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição” o que dispõem as alíneas a), b) e c) do seu n.º 1 e dar cumprimento às demais prescrições do preceito.

II. Ao Tribunal de recurso assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo Tribunal a quo, desde que ocorram os pressupostos previstos nos artigos 662.º do CPC e 149.º do CPTA, incumbindo-lhe reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada e apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.

III. Não obstante a amplitude conferida a um segundo grau de jurisdição, não se está perante um segundo ou novo julgamento de facto, porquanto, tal possibilidade de conhecimento está confinada aos pontos de facto considerados incorretamente julgados e desde que cumpridos os pressupostos fixados no artigo 640.º, nºs. 1 e 2 do CPC, além de que o controlo de facto, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos não pode aniquilar a livre apreciação da prova do julgador, construída dialeticamente na base da imediação e da oralidade.

IV. A garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não pode postergar o princípio da livre apreciação da prova por parte do julgador, previsto no n.º 5 do artigo 607.º do CPC, intervindo na formação da convicção não apenas elementos racionalmente demonstráveis, mas também fatores não materializados.

V. A valoração de um depoimento não é absolutamente percetível através da gravação e/ou da respetiva transcrição, pois existem inúmeros aspetos comportamentais dos depoentes que não são passíveis de ser registados numa simples gravação e que, como tal, foram apreendidos ou percecionados pelo juiz.

VI. O Tribunal a quo está numa posição privilegiada em termos de recolha dos elementos e sua posterior ponderação, nomeadamente, com a articulação de toda a prova produzida, de que decorre a convicção expressa na decisão proferida sobre a matéria de facto, pelo que, a convicção formada a partir da globalidade dos meios de prova é de difícil destruição, sobretudo ao pretender-se pô-la em crise através de indicações parcelares ou referências genéricas.

VII. Os factos são aqueles que constam como provados nos autos, pelo que, quaisquer outros não podem ser considerados ou valorados pelo Tribunal.

VIII. Na vigência do D.L. n.º 48.051 a obrigação de indemnizar por facto lícito, por encargos ou prejuízos especiais e anormais, abrange os lucros cessantes.


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Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em julgar totalmente improcedente o recurso, por não provados os erros de julgamento de facto e de direito e em manter a sentença recorrida, que julgou procedente o pedido de condenação do Réu ao pagamento de uma indemnização fundada em responsabilidade civil por facto lícito.

Custas pelo Recorrente.

Registe e Notifique.


(Ana Celeste Carvalho - Relatora)


(Pedro Marchão Marques)


(Paula de Ferreirinha Loureiro)