Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:132/21.1BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:08/24/2021
Relator:ANA CRISTINA CARVALHO
Descritores:PROVA TESTEMUNHAL
AUTORIDADE DO CASO JULGADO
PRESCRIÇÃO
LITIGANTE DE MÁ-FÉ
Sumário:1ª - No processo judicial tributário compete ao juiz examinar se é legalmente permitida a produção da prova testemunhal oferecida pelas partes em face das normas que disciplinam a admissibilidade desse meio de prova, e, no caso afirmativo, aferir da relevância da factualidade alegada perante as várias soluções plausíveis para as questões de direito colocadas, só podendo dispensar essa prova no caso de concluir que ela é manifestamente impertinente, inútil ou desnecessária;

- A excepção dilatória do caso julgado, pressupõe a repetição de uma causa já decidida por sentença transitada em julgado, enquanto a autoridade do caso julgado implica o acatamento de decisão proferida em acção anterior cujo objecto se inscreva, como pressuposto necessário, no objecto de acção posterior, obstando a que a relação jurídica ali definida possa ser contemplada, de novo, de forma diversa.

3ª - Se num determinado processo judicial se analisa a questão da prescrição da obrigação pecuniária e se o mesmo transita em julgado, tal questão consolida-se na ordem jurídica relativamente aos factos nela tratados e suscitando novamente a mesma questão encontra-se o executado limitado à invocação de que já decorreu o prazo que, segundo essa decisão, ainda faltava para se completar o fixado prazo de prescrição.

4ª – Interposta nova reclamação do acto que indeferiu o pedido de prescrição da dívida exequenda, quando a Reclamante já tinha conhecimento do segundo Acórdão proferido pelo STA e de posterior Acórdão proferido pelo TCAS sobre a prescrição da dívida exequenda cobrada coercivamente no mesmo processo executivo, existindo apenas um mero lapso de tempo decorrido de seis meses após o referido trânsito em julgado, e se inexistem questões jurídicas díspares das anteriormente decididas, nem novos factos com relevo para o cômputo do prazo prescricional, conclui-se que a recorrente reincidiu na sua conduta deduzindo pretensão, cuja falta de fundamento não devia ignorar, actuação que se configura como litigante de má-fé.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul


I - RELATÓRIO


S....., Lda., inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra que julgou improcedente reclamação por aquela deduzida contra o acto de indeferimento proferido pela Chefe do Serviço de Finanças de Sintra – 2, datado de 06 de outubro de 2020, que indeferiu o pedido de reconhecimento da prescrição no âmbito do processo de execução fiscal n.º ....., dela veio interpor o presente recurso formulando, para o efeito, as seguintes conclusões:

«1.ª – A douta sentença recorrida enferma de julgamento de facto, por um deficiente juízo valorativo da dispensa de prova testemunhal ou da sua irrelevância para a decisão da causa, dado que mostrava-se indispensável para a apreciação da responsabilidade do mandatário a produção de prova através da inquirição das testemunhas arroladas pela Recorrente no requerimento de 16.03.2021, pelo que o Tribunal recorrido violou o disposto nos artigos 13.º, 113.º e 114.º do CPPT e 99.º da LGT.

2.ª – A decisão recorrida integra erro de julgamento de direito porque por imperativo constitucional (princípio da legalidade e tipicidade, e reserva de lei da AR), é inaplicável, à prescrição dos créditos tributários, o regime do artigo 327.º n.º 1 do CC, segundo o qual o prazo de prescrição só se inicia quando transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo - consequência do entendimento segundo o qual a interrupção da prescrição tem um "efeito duradouro", protelando o início da prescrição para o fim do processo no qual se discute a legalidade da liquidação, como se tratasse de uma causa de suspensão da prescrição, e não de interrupção.

3.ª – A sentença recorrida enferma de julgamento de direito, por errada interpretação e aplicação da lei, e por violação de lei por considerar verificada a autoridade caso julgado considerando que a divida em cobrança coerciva não se encontra prescrita, tendo violado o disposto nos artigos 8.º e 30.º da LGT, bem como dos artigos 20.º, n.º 1, 103.º, n.º 2, 266.º, n.º 2 e 268.º, n.º 4 da CRP,

4.ª – A sentença recorrida enferma de erros de julgamento, pelo que o pedido de condenação da Recorrente como litigante de má fé e consequente condenação em multa deveria ter sido julgado integralmente procedente, porquanto violou claramente e frontalmente os artigos 542.º do CPC e artigos 2º e 266º da CRP.

NESTES TERMOS,

Deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências.

SÓ ASSIM SE DECIDINDO SERÁ CUMPRIDO O DIREITO E FEITA JUSTIÇA!»


*


A Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

*




Foi dada vista ao Ministério Público, e neste Tribunal Central Administrativo, o Procurador–Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, acolhendo os argumentos invocados no parecer do Ministério Público prolatado em primeira instância, entendendo que “perante a ocorrência dos factos suspensivos e interruptivos do prazo de prescrição, a dívida tributária não se encontrar prescrita.”

*


Com dispensa dos vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, vem o processo submetido à conferência para apreciação e decisão.

*


II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente no âmbito das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Importa assim, decidir se o tribunal a quo incorreu:

i) em erro de julgamento de facto ao dispensar a prova testemunhal indicada pela recorrente e de direito por violação do disposto nos artigos 13.º, 113.º e 114.º do CPPT e 99.º da LGT;

ii) em erro de julgamento de direito por ser inaplicável à prescrição dos créditos tributários o régie previsto no artigo 327.º, n.º 1 do CCivil quanto ao efeito duradouro da interrupção do prazo;

iii) em erro de julgamento de direito por errada interpretação e aplicação da autoridade do caso julgado;

iv) em erro de julgamento de direito quanto à condenação da recorrente como litigante de má fé.

III - FUNDAMENTAÇÃO

III – 1. De facto


É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida:

«A) Correu neste Tribunal o processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 456/17.2BESNT, instaurado pela Reclamante, “S....., Lda.”, em que foi impugnado o despacho do órgão de execução fiscal, de 08-02-2017, que não reconheceu a prescrição da dívida em cobrança no processo de execução fiscal n.º ..... - provado por consulta, na plataforma SITAF, ao processo n.º 456/17.2BESNT;
B) No processo n.º 456/17.2BESNT, foi proferida sentença, no dia 31 de maio de 2017, na qual se pode ler o seguinte:
«[…]
III.2. DE DIREITO
A questão decidenda consiste em saber se se encontra prescrita a dívida exequenda a ser exigida em sede do processo de execução fiscal n.º ....., instaurado para cobrança do montante correspondente à liquidação de IRC, referente ao exercício de 1998, no valor de €1.010.987,63, e acrescido.
Cumpre decidir.
Em causa nos presentes autos encontra-se uma dívida de IRC respeitante ao período de 1998, pelo que à data dos factos, encontrava-se em vigor o artigo 48.º da Lei Geral Tributária (LGT), sob a epígrafe “Prescrição”, com a seguinte redacção:
“1 - As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu.
2 - As causas de suspensão ou interrupção da prescrição aproveitam igualmente ao devedor principal e aos responsáveis solidários ou subsidiários.
3 - A interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efectuada após o 5.º ano posterior ao da liquidação.”
Considerando que o IRC é um imposto de obrigação periódica, o termo inicial do prazo de prescrição de 8 anos contava-se, à luz da redacção do n.º 1 do artigo 48.º da LGT, a partir do termo no ano em que se verificou o facto tributário.
Consequentemente, o prazo de prescrição aqui em análise, relativo ao IRC de 1998, iniciou-se em 01.01.1999, pelo que o decurso do prazo de prescrição terminaria a 31.12.2006, caso não existissem causas interruptivas ou suspensivas relevantes.
Importa assim aferir da existência de tais causas de suspensão e de interrupção, nos termos do disposto no artigo 49.º da LGT, a aplicar ao caso em apreço, sendo que a redacção à data do facto tributário em análise, dada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro era a seguinte:
“1 - A reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição.
2 - A paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que tiver decorrido após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
3 - O prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento ou prestação legalmente autorizada, ou de reclamação, impugnação ou recurso.”
Face à redacção introduzida pela Lei n.º 100/99, de 26 de Julho, passou o n.º 1 do artigo 49.º, passou a consagrar mais um facto interruptivo: a citação.
Assim, e olhando para os factos interruptivos, verificamos que pela Reclamante foi apresentada reclamação – em 13.02.2003, foi interposta impugnação judicial – em 10.09.2003, e ainda foi citada em sede de processo de execução fiscal – em 23.06.2003 [cf. als. C), D) e G) dos factos assentes].
A interrupção da prescrição inutiliza todo o tempo anteriormente decorrido ao facto interruptivo (cf. o n.º 1 do artigo 326.º do Código Civil), recomeçando a contagem do prazo de prescrição de 8 anos.
Assim temos três factos que interromperam a contagem do prazo de prescrição. Uma vez que só com a introdução da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, é que se introduziu a norma do n.º 3 que prevê que a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verifica em primeiro lugar.
Devendo ainda ser tida em consideração a suspensão do prazo de prescrição, previsto no n.º 3 do artigo 49.º da LGT, uma vez que dos factos assentes resulta que pela Reclamante foi apresentado contencioso de legalidade da liquidação – reclamação e impugnação, o que, associado à prestação de garantia idónea, permitiu a suspensão do referido processo de execução fiscal.
Tal como se escreveu, entre outros, nos Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 05.05.2010, em sede do processo n.º 0140/10 e de 07.12.2010, em sede do processo n.º 0490/10: “A impugnação judicial interrompe a prescrição, mas a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo, faz cessar tal efeito, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação (n.ºs 1 e 2 do artigo 49.º da LGT). Porém, se a execução se encontrar suspensa em virtude de prestação de garantia ou de penhora de bens que garantam a totalidade da dívida e do acrescido, ao abrigo do artº 169º do CPPT, a paragem do processo não releva para efeitos de prescrição, uma vez que, em face do disposto no nº 3 do artº 49º da LGT, a prescrição se suspende também com a paragem da execução”.
Atentos os factos dados como provados, o processo de execução fiscal ficou suspenso por determinação do Chefe do Serviço de Finanças de Sintra 2, em 09.09.2003 [cf. al. F) dos factos assentes], mediante a apresentação de garantia bancária, associada à apresentação de reclamação graciosa seguida de impugnação judicial, até trânsito da decisão proferida em sede do processo de impugnação judicial, ocorrido em 04.04.2016 [cf. al. K) dos factos assentes].
Ao contrário do que defende a Reclamante, o facto de ter sido reconhecida a caducidade da garantia bancária prestada para suspender o PEF n.º ....., não significa que o prazo de prescrição não se mantenha suspenso.
Neste sentido veja-se o acórdão muito bem citado pelo Digno Magistrado do Ministério Público, no seu parecer, proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo de 12.10.2016, em sede do processo n.º 0935/16, cujo sumário aqui transcrevemos:
“I - O art. 183.º-A, aditado ao CPPT pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, passou a permitir aos interessados obter a declaração de caducidade da garantia prestada pelo contribuinte ou constituída pela Administração Tributária, sem perder o efeito suspensivo da execução, se a reclamação graciosa em que fosse discutida a legalidade da liquidação não fosse decidida no prazo de um ano ou a impugnação judicial em que fosse discutida essa legalidade não estivesse decidida, em 1.ª instância, no prazo de dois anos (ulteriormente alterado para três anos pela Lei n.º 30-B/2002, de 30 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2003), a contar da sua apresentação, prazos que eram acrescidos de seis meses caso houvesse lugar à produção de prova pericial.
II - Caducada a garantia o processo de execução fiscal continuava suspenso, mesmo sem garantia, até ao momento em que estaria se a garantia se mantivesse, ou seja, até à decisão do pleito. (negrito nosso)
III - Da norma contida no nº 3 do art. 49º da LGT, conjugada com a norma legal que define o regime da suspensão da execução fiscal (art. 169º do CPPT), resulta que o efeito suspensivo da execução fiscal não é consequência directa e imediata da instauração da reclamação, impugnação ou recurso, nem é consequência directa e imediata da prestação de garantia; o que determina o efeito suspensivo da execução – e, por consequência, o efeito suspensivo da prescrição – é a instauração de reclamação, impugnação ou recurso, quando acompanhada ou seguida da constituição ou prestação de garantia idónea, da autorização da sua dispensa, ou da penhora de bens que garantam o pagamento integral da quantia exequenda e do acrescido.”
Assim,
Considerando o facto interruptivo ocorrido em 10.09.2003 – impugnação judicial, e a suspensão do prazo de prescrição entre 09.09.2003 e 04.04.2016, verificamos que o prazo de 8 anos iniciou-se em 05.04.2016, pelo que nesta data a dívida em cobrança coerciva no PEF n.º ....., instaurado para cobrança do montante correspondente à liquidação de IRC, referente ao exercício de 1998, não se encontra prescrita.

Termos em que deve a presente reclamação ser julgada improcedente e mantido o acto reclamado no ordenamento jurídico.
[….]
IV – DECISÃO
Com os fundamentos expostos, julga-se totalmente improcedente a presente reclamação do acto do órgão de execução fiscal, absolvendo-se a Fazenda Pública do pedido.
[…]»
- provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação do ato do órgão de execução fiscal n.º 456/17.2BESNT, documento n.º 005754559;
C) A Reclamante interpôs recurso da sentença referida na alínea anterior para o Supremo Tribunal Administrativo - provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação do ato do órgão de execução fiscal n.º 456/17.2BESNT, documento n.º 005762270;
D) No dia 15 de agosto de 2017, foi proferida decisão sumária pelo Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito do processo n.º 945/17, na qual se pode ler:
«[…]
Efectivamente o assim decidido pelo TAF de Sintra respeita a doutrina seguida por este STA (o acórdão invocado pela recorrente no artigo 55º da petição da reclamação respeita a regra legal diferente da aplicável ao caso concreto) no tocante à suspensão do prazo de prescrição, quando se verifica a pendência de impugnação do acto de liquidação de imposto, seja por via administrativa, seja por via contenciosa, cumulada com a prestação de garantia e suspensão do processo de execução fiscal.
Refere o Sr. Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, se considerarmos que a jurisprudência do STA, tem de forma reiterada e pacífica adotado o entendimento sufragado na doutrina...no sentido de que: “a interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para a prescrição de todo o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único efeito próprio da interrupção, presente em todas as situações (artigo 326, n° 1 do CC). Porém, em certos casos, designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (artigo 327°, n° 1 do CC). Resultam, assim, destes artigos 326º e 327º dois conceitos de interrupção da prescrição ou interrupções de dois tipos: um que se traduz exclusivamente num efeito instantâneo sobre o prazo de prescrição (inutilização para a prescrição todo o tempo decorrido), outro que se consubstancia no mesmo efeito instantâneo acrescido de um efeito suspensivo (é eliminado o período decorrido e a prescrição não corre enquanto o processo durar, efeito duradouro este que é próprio dos factos suspensivos da prescrição)”.
Daí que no caso concreto, encontrando-se pendente a ação executiva, em face dos efeitos duradouros produzidos pela citação da Recorrente, teremos que concluir que à luz de tal entendimento, o prazo de prescrição nem sequer se reiniciou.
Lido atentamente o corpo das alegações do recurso que nos vem dirigido, nomeadamente os artigos 3 a 6, não se vê que seja posta em causa de modo eficiente e suficiente a argumentação fundamentadora apresentada pela sentença recorrida, que além do mais se apoia declaradamente na doutrina deste STA que, em casos análogos (quanto à matéria de facto), aplicou de modo uniforme as mesmas regras de direito, tendo concluído pela não prescrição das dívidas exequendas.
Assim, e porque não há agora qualquer razão que implique a inversão de tal doutrina do STA, também agora, relembrando-a e aplicando-a, mais não nos resta do que negar provimento ao recurso nesta parte.
[…]»
- provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 456/17.2BESNT, de fls. 9 a 17 do documento n.º 005803417;
E) A Reclamante apresentou reclamação para a conferência da decisão sumária identificada na alínea anterior - provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação do ato do órgão de execução fiscal n.º 456/17.2BESNT, de fls. 22 a 31 do documento n.º 005803417;
F) No dia 20 de setembro de 2017, foi então proferido acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito do processo n.º 945/17, no qual se pode ler:
«[…]
As invocadas ilegalidades constitucionais vêm primeiramente arguidas no artigo 58º da petição inicial nos seguintes termos:
O princípio da legalidade, consagrado no artigo 103º, n.º 2 da CRP, o direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável, consagrado no artigo 20º, n.º 4 da CRP, os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança e legítimas expectativas dos administrados, ínsitos no primado do Estado de Direito Democrático, consagrado no artigo 2.º da CRP, o princípio da irretroactividade fiscal, consagrado no artigo 103.º n.º 3 da CRP, bem como a garantia fundamental do direito de defesa e protecção jurisdicional efectiva, constitucionalmente assinalados nos artigos 20.º n.º 1 e 268.º n.º 4 da CRP e os princípios constitucionais da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público, consignados no artigo 266.º n.º 2 da CRP sempre imporiam decisão diversa à ora reclamada.
Na sentença recorrida identificou-se no relatório esta alegação sem posteriormente se ter desenvolvido uma argumentação própria destinada a afastar a mesma. Dessa decisão foi interposto recurso em que se concluiu:
1 - Nos termos do disposto nos artigos 608º/2 do CPC, 123.º e 124.º do CPPT, o juiz deve - sob pena de nulidade (artigo 615º/l/d) do CPC e artigo 125.º/1 do CPPT) - pronunciar-se sobre todas as questões que lhe sejam postas pelas partes e que não estejam prejudicadas pela solução dada a outras, bem como sobre questões cujo conhecimento oficioso a lei impõe - V. Supra nºs 1 a 2;
2 - A sentença recorrida enferma de nulidade por omissão de pronúncia sobre a questão da violação de princípios constitucionais pela decisão reclamada suscitada no art. 58.º e na conclusão I) da reclamação, sendo certo que foi frontalmente violado o disposto nos artigos 608º/2 do CPC e 124.º do CPPT (arts. 615º/l/d) do CPC e 125.º/1 do CPPT) - V. Supra n.ºs 7 a 2;
3 - A decisão recorrida integra erro de julgamento de direito, por errada interpretação e aplicação da lei, e por violação de lei, mais precisamente da disposição do art.º 49°, n.ºs 2e 3 da Lei Geral Tributária, na redacção aplicável in casu (2002), uma vez que o processo de impugnação judicial ficou parado, por causa não imputável à Reclamante por mais de um ano, pelo que cessou o efeito interruptivo decorrente da dedução do processo de impugnação, sendo certo que no caso em apreço não é aplicável qualquer suspensão do prazo de prescrição em virtude de prestação de garantia, pois por decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra foi declarado a caducidade da garantia bancária prestada- V. Supra n.ºs 4 a 5;
4- 0 princípio da legalidade, consagrado no artigo 103º, n.º 2 da CRP, o direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável, consagrado no artigo 20º, n.º 4 da CRP, os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança e legítimas expectativas dos administrados, ínsitos no primado do Estado de Direito Democrático, consagrado no artigo 2.º da CRP, o princípio da irretroactividade fiscal, consagrado no artigo 103° n.° 3 da CRP, bem como a garantia fundamental do direito de defesa e protecção jurisdicional efectiva, constitucionalmente assinalados nos artigos 20º n.º 1 e 268º n.º 4 da CRP e os princípios constitucionais da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público, consignados no artigo 266º n.º 2 da CRP sempre imporiam decisão diversa à ora recorrida - V. Supra nº 5;
5- A douta sentença recorrida enferma de julgamento de direito, por errada interpretação e aplicação da lei, e por violação de lei ao considerar que a divida em cobrança coerciva não se encontra prescrita, tendo violado o disposto nos artigos 48º e 49º, n.ºs 2e 3 da Lei Geral Tributária, na redacção aplicável in casu (2002) - V. Supra n.º 6.
Deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências.
Sobre a questão da nulidade por omissão de pronúncia decidiu-se na decisão reclamada:
Quanto à nulidade suscitada pela recorrente, conclusões 1 e 2.
Alega a recorrente que ocorre a nulidade da sentença recorrida, nos termos do disposto no artigo 125º, n.º 1 do CPPT, porque no Tribunal recorrido não foi emitida pronúncia, como se impunha por força do disposto no artigo 124º do CPPT, sobre a invocada violação de parâmetros constitucionais invocada no artigo 58º da petição da reclamação.
Alega a recorrente na sua petição inicial, no segmento com interesse para o conhecimento desta questão:
“54º - No caso em apreço não é assim aplicável qualquer suspensão do prazo de prescrição em virtude de prestação de garantia.
55º - Neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 31.01.2007, decidiu expressamente que “o prazo prescricional não se suspende em consequência da suspensão do processo de execução devido a prestação de garantia”.
(vd. Proc.01086/06, in vww.dgsi.pt).
56º - Tal é o único entendimento aceitável num Estado de Direito, pois entendimento contrário levaria ao absurdo de nenhuma dívida tributária prescrever caso o contribuinte tivesse prestado garantia, ainda que passassem décadas sobre a mesma!
57º - O artigo 55º da Lei Geral Tributária estatui que a administração tributária exerce as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários.
58º - O princípio da legalidade, consagrado no artigo 103º, n.º 2 da CRP, o direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável, consagrado no artigo 20º, n.º 4 da CRP, os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança e legítimas expectativas dos administrados, ínsitos no primado do Estado de Direito Democrático, consagrado no artigo 2.º da CRP, o princípio da irretroactividade fiscal, consagrado no artigo 103.º n.º 3 da CRP, bem como a garantia fundamental do direito de defesa e protecção jurisdicional efectiva, constitucionalmente assinalados nos artigos 20.º n.º 1 e 268.º n.º 4 da CRP e os princípios constitucionais da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público, consignados no artigo 266º n.º 2 da CRP sempre imporiam decisão diversa à ora reclamada.”.
Resulta da leitura, ainda que superficial, desta argumentação esgrimida pela recorrente, não se tratam de verdadeiras questões -vícios ou ilegalidades- que a recorrente colocou à apreciação do Tribunal, tratam-se, antes de argumentos que coadjuvam a questão principal que passa por saber se a dívida exequenda está ou não prescrita.
Na verdade, a argumentação genérica apresentada não permite que se identifique em concreto qual a norma ou interpretação da mesma (feita pelo órgão reclamado) que ofenda os parâmetros constitucionais a que se faz referência.
Como refere o Sr. Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal, ...é patente que a Reclamante não suscitou qualquer questão de inconstitucionalidade sobre a qual o tribunal “a quo” tivesse que emitir pronúncia. Com efeito, a Reclamante limitou-se a invocar, de forma assaz genérica, diversos princípios consagrados na Constituição da República, à luz dos quais, no seu entender, o órgão de execução fiscal devia ter adotado outro entendimento sobre a verificação da prescrição da dívida exequenda. Todavia, a Reclamante não concretizou, ainda que minimamente, em que termos a interpretação que o órgão de execução fiscal fez das normas legais aplicadas viola tais princípios, de modo a que das suas palavras se identificasse vício de inconstitucionalidade cuja apreciação se impusesse e cuja omissão agora censura.
Não tendo autonomizado qualquer vício de inconstitucionalidade, não pode assacar à sentença recorrida omissão de pronúncia, pois recai sobre os sujeitos processuais o dever de identificarem de forma clara as questões que pretendem que sejam apreciadas pelo tribunal - art. 608º do CPC - e só nessa medida se pode censurar o tribunal pela omissão na sua apreciação.
Ora, não é esse o caso dos autos, em que da petição inicial apresentada pela Reclamante não ressalta, ainda que de forma incipiente, a identificação de qualquer vício de inconstitucionalidade assacado à decisão do órgão de execução fiscal. E tanto é assim que nem agora nas suas alegações de recurso essa concretização é feita. E como nos parece óbvio, a mera enunciação de princípios legais ou constitucionais não configura questão jurídica que importe dirimir.
Ou seja, não se podendo configurar tal alegação como uma verdadeira questão, antes apenas podendo ser vista como mais um argumento próprio da questão principal, é evidente que não tinha o tribunal a quo o dever de se pronunciar sobre a mesma, apenas lhe incumbia decidir nos termos da lei a questão que lhe havia sido colocada, a da prescrição ou não da dívida exequenda.
Aliás, o modo como a recorrente invoca a violação de tais parâmetros constitucionais neste recurso revela que não assume tal violação de per se, antes a vendo como um argumento adicional à questão por si suscitada.
Improcede, assim, esta questão.
Portanto, o que cumpre saber é se na decisão sumária, e também na sentença recorrida, se imporia uma pronúncia expressa e autónoma sobre qualquer uma das “questões” de constitucionalidade suscitadas, face à argumentação expendida a propósito da questão de mérito -prescrição ou não da dívida exequenda.
Nos processos de natureza impugnatória, como o dos autos, a causa de pedir reconduz-se aos concretos fundamentos de facto e de direito em que se baseia a pretensão anulatória do acto impugnado, cfr. ac. Deste Supremo Tribunal, rec. n. º 0419/11, de 07.12.2011.
Ou seja, a causa de pedir consubstancia-se na arguição conjugada de factos e de regras de direito que se entende terem sido violadas pelo acto impugnado, devendo o autor adiantar uma argumentação concretizadora e explicativa da razão pela qual entende que as normas ou princípios jurídicos foram ofendidos, em obediência ao princípio do dispositivo.
É certo que também se impõe ao julgador o conhecimento de questões ex officio tanto formais como materiais, isto é, tratam-se de questões que devem ser conhecidas independentemente de as partes as trazerem à discussão aos autos.
Contudo, todas as questões só podem ser conhecidas nos autos por referência ao caso concreto, à concreta situação de facto em discussão, por referência ao acto concreto cuja anulação se pretende.
No caso concreto a recorrente não densificou, na petição inicial, nem no recurso que veio dirigido a este Supremo Tribunal, as alegadas violações dos preceitos constitucionais que, aliás, condensou num único artigo sem qualquer explicação adicional; nem o tribunal conseguiria, se o pretendesse fazer ex officio, conhecer de tais ilegalidades uma vez que as mesmas não resultam imediatamente
apreensíveis face aos argumentos factuais esgrimidos pela recorrente. Na verdade, não incumbe ao tribunal fazer uma ponderação exaustiva de eventuais ilegalidades que se possam colocar em cada caso concreto e por referência a cada acto impugnado, apenas lhe cumpre conhecer daquelas que sejam evidentes, razão pela qual não ocorre omissão de pronúncia nas questões de conhecimento oficioso quando não sejam arguidas pelas partes.
Portanto, e como já se deixou dito na decisão sumária, a falta de concretização das alegadas violações dos preceitos constitucionais invocados impede que o tribunal emita também uma apreciação individualizada sobre as mesmas, não se podendo, por isso, configurar como verdadeiras questões que mereçam um tratamento singular e individualizado, antes tendo a sua apreciação que se reconduzir à procedência ou improcedência da questão principal, a da prescrição ou não da dívida exequenda, tudo em consonância com o disposto no artigo 608°, n.º 2 do CPC.
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da secção do contencioso tributário do Supremo tribunal Administrativo em indeferir a reclamação apresentada pela recorrente
- provado por consulta do processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 456/17.2BESNT na plataforma SITAF, fls. 45 a 53 do documento n.º 005803417;
G) O processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 456/17.2BESNT transitou em julgado em 09-10-2017 - provado por consulta do processo de reclamação do ato do órgão de execução fiscal n.º 456/17.2BESNT na plataforma SITAF;
H) Correu neste Tribunal o processo de reclamação de ato do órgão de execução fiscal n.º 350/18.0BESNT, instaurado pela Reclamante, em que foram impugnadas as penhoras de imóveis no âmbito do processo de execução fiscal n.º ..... - provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 350/18.0BESNT;
I) No âmbito do processo referido na alínea antecedente, foi proferida sentença, no dia 17 de maio de 2018, na qual se pode ler o seguinte:
«[…]
.2. De direito
Vem através da presente reclamação, a sociedade S....., Lda., reagir contra as penhoras efectuados no PEF n. ....., que corre termos no Serviço de Finanças de Sintra 2, o que faz invocando:
- A prescrição da dívida exequenda;
- A inconstitucionalidade da norma vertida no artigo 49.º da LGT;
- A violação do dever de colaboração, por parte do OEF, por não ter averiguado o valor de mercado dos imóveis penhorados.
Relativamente à prescrição da dívida, há que ponderar, como invoca a própria reclamante, a prolação de decisão no processo que correu termos neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, sob o n.º 456/17.2BESNT, onde a reclamante invocou a prescrição da dívida exequenda, e onde se decidiu, que o início da contagem do prazo de prescrição de oito anos, se conta, no caso concreto, a partir de 05/04/2016. Assim e remetendo para o que ali se escreveu, assim como para o que se escreveu na decisão sumária do STA, e no acórdão daquele Tribunal superior, que vertemos já para a probatório, nada mais há a acrescentar, quanto ao início da cotagem do prazo.
Vem a reclamante invocar a inconstitucionalidade do artigo 49.º da LGT, quando “interpretado no sentido de que o prazo de prescrição se interrompe sucessivamente no tempo, por virtude de sucessivos factos interruptivos, e que o prazo de prescrição só se inicia a partir do fim do último facto dos processos interruptivos, impondo-se a continuação da execução ad eternum”.
Desde já se diga que não é a sucessão de factos interruptivos que determina, no caso, a não prescrição da dívida, mas a prestação de garantia, pela aqui reclamante, o que teve efeito suspensivo da execução.
Ademais, como invoca a FP, a questão da conformidade das normas vertidas no artigo 49.º da LGT com a CRP, foi já objecto de diversas decisões, do STA, nomeadamente no acórdão do pleno, proferido no recurso n.º660/14, de 21/01/2015, e no acórdão de 12/10/2016, no processo 0935/16, e acrescentamos, de decisões do TC, nomeadamente no Acórdão 441/2012.
De qualquer forma, cumpre referir que a reclamante aponta à norma, no sentido a que já nos referimos, a sua desconformidade com a CRP, invocando o desrespeito por diversos princípios, sem nunca concretizar em que medida tais princípios são, em concreto, feridos pela norma em questão. Assim a questão da inconstitucionalidade da norma vertida no artigo 49.º da LGT não é questão a que cumpra dar mais ampla resposta.
Sem necessidade de maiores considerações, há assim apenas que verificar que desde o dia 05/04/2016, data em que se inicia a contagem do prazo de prescrição, até à presente data, manifestamente não decorreram oito anos, pelo que tem de improceder a presente reclamação, na parte que assaca ilegalidade derivada à penhora, em face da prescrição da dívida.
[…]

***
De todo o exposto, improcede totalmente a presente reclamação, e, em consequência, vai a reclamante condenada no pagamento das custas do processo (artigo 527.º do CPC).
[…]»
- provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação de ato do órgão de execução fiscal n.º 350/18.0BESNT, documento n.º 005898828;
J) A Reclamante interpôs recurso da decisão a que se refere a alínea anterior para o Supremo Tribunal Administrativo - provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 350/18.0BESNT, documento n.º 005905718;
K) No dia 16 de agosto de 2018, o Supremo Tribunal Administrativo proferiu decisão sumária - provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 350/18.0BESNT, documento n.º 005973160;
L) No dia 17 de outubro de 2018, foi proferido acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito do processo n.º 768/18, no qual se pode ler:
«[…]
“S....., Lda.”, inconformada, reclama par a conferência da decisão sumária proferida pelo relator, datada de 16.08.2018, que recaiu sobre o recurso que havia interposto da sentença proferida pelo TAF de Sintra, que julgou improcedente o pedido que havia formulado nos presentes autos de Reclamação de Acto do Órgão de Execução Fiscal, no sentido de ser reconhecida a prescrição dos créditos fiscais exequendos.
Alega, em síntese:
A decisão sumária de que reclama não se pronunciou sobre a questão da violação do direito da reclamante a um processo equitativo, conforme disposto no artigo 6º, parágrafo primeiro, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que é fundamental e necessária à justa decisão da lide, não estando nem tendo sido declarada prejudicada pela solução dada a outras questões;
A reclamante fica, indefinidamente, refém de uma dívida fiscal com várias dezenas de anos e sujeita ao agravamento financeiro decorrente da morosidade na resolução do litigio, designadamente ao nível do empolamento dos juros de mora, o que consubstancia um protelamento “ad eternum” deste processo judicial, em contravenção com as mais elementares regras de celeridade processual e do direito a um processo equitativo, conforme disposto no artigo 6º, parágrafo primeiro, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no n.° 4 do artigo 20º da CRP;
Na decisão reclamada consta por mera remissão para decisões judiciais anteriores a respectiva pronúncia sobre se a manutenção do acto reclamado no ordenamento jurídico, ao abrigo do disposto no artigo 49.º da LGT, é violadora de normas e princípios constitucionais, o que não constitui resposta fundamentada perante o recurso interposto.
Vejamos então.
A reclamante pretende que na decisão recorrida o Tribunal não se pronunciou fundamentadamente sobre as questões anteriormente enunciadas.
As questões colocadas pela reclamante prendem-se, no essencial, com o facto do regime legal da prescrição das dívidas tributárias e da interpretação que do mesmo se fez na sentença recorrida, no entender da recorrente, além de violarem o direito a um processo equitativo, alarga indefinidamente o prazo de prescrição, porque faz depender a sua verificação da prestação de garantia e de um efeito suspensivo com fim incerto, o que será em si mesmo contrário aos fins de segurança jurídica e de proteção da confiança que fundamentam o próprio instituto da prescrição, pelo que este alargamento indefinido do prazo de prescrição afigura-se contrário ao direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável e em processo equitativo, o que constitui uma violação do artigo 20.°, n.º 4 da CRP, pelo que, o artigo 49.º da LGT (na redação anterior à da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro), interpretado no sentido de que o prazo de prescrição interrompe-se sucessivamente no tempo, por virtude dos sucessivos factos interruptivos, e que o prazo de prescrição só se inicia a partir do fim do último dos processos interruptivos, impondo assim a continuação da execução fiscal “ad eternum”, encontra-se ferido de inconstitucionalidade por violação dos princípios da legalidade, do direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável, da segurança jurídica, da protecção da confiança e legítimas expectativas dos administrados, da irretroactividade fiscal, do direito de defesa e protecção jurisdicional efectiva, da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público, todos consagrados na CRP.
Na verdade, na decisão reclamada ambas as questões foram abordadas, ainda que necessariamente de forma sumária e por referência a anteriores decisões jurisprudenciais, cfr. artigo 656° do CPC, como bem indica a reclamante, contudo a mesma não se conforma com a solução dada a ambas as questões.
A morosidade do processo de execução fiscal a que a reclamante alude “... inobservância do prazo de duração do processo de execução fiscal...”, não tem uma correlação directa com o regime próprio da prescrição das dívidas tributárias, cfr. artigo 49º da LGT na redacção com interesse, antes se encontra intimamente relacionado com o cumprimento atempado dos prazos processuais legalmente estabelecidos, ou seja, o facto de a lei ordinária estabelecer a interrupção e suspensão do decurso do prazo de prescrição quando se verifiquem determinadas ocorrências na pendência do processo de execução fiscal, v.g. prestação de garantia, dedução de impugnação judicial, etc.
Assim, mesmo que este Supremo Tribunal, secção tributária, pudesse conhecer da questão da morosidade do processo, ou dos processos, que não pode, nunca poderia concluir que isso se repercutiria sobre as regras próprias da suspensão e interrupção da prescrição.
Por outro lado, também o facto de se considerar que a interrupção da prescrição, tal como delineada naquele artigo 49º da LGT, poderia prolongar a pendência da execução fiscal “ad eternum”, não conflitua com os parâmetros constitucionais invocados pela reclamante.
Como tem referido o Tribunal Constitucional, também no acórdão a que se fez referência na decisão sumária, “... sendo o instituto da prescrição especificamente determinado por princípios e valores objetivos de segurança e certeza jurídicas, certo é que o âmbito de proteção dos direitos de acesso ao direito e aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva não compreende um direito à prescrição das dívidas fiscais, enquanto alegado direito dos contribuintes, pelo que não ocorre a violação daqueles direitos...”, cfr. acórdão do TC, fl.° 122/2015, datado de 12.02.2015.
É manifesto que a interpretação feita do artigo 49º da LGT não se assume como desrespeitadora dos parâmetros constitucionais invocados ou até dos princípios consagrados na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, porque não conduz ao desrespeito de legítimas expectativas do contribuinte ou sequer afecta de forma desrazoável e insuportável a certeza e segurança jurídicas exigíveis no Estado de Direito democrático, arredando de qualquer hipótese a possibilidade de ocorrência da prescrição de qualquer dívida tributária.
Improcede, assim, a reclamação que nos vinha dirigida.
Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em indeferir a reclamação apresentada.
[…]»
- provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 350/18.0BESNT, documento n.º 005973160;
M) O processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 350/18.0BESNT transitou em julgado em 05-11-2018 - provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 350/18.0BESNT;
N) Correu neste Tribunal o processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 351/18.8BESNT, instaurado pela Reclamante, em que foi impugnada a decisão do órgão de execução fiscal que considerou que inexistia dever legal de decisão sobre requerimento apresentado pela Reclamante em 18-01-2018, em que esta pediu, a final, a extinção do processo de execução fiscal n.º ....., por inutilidade superveniente da lide, alegando que a dívida exequenda tinha prescrito - provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 351/18.8BESNT;
O) No processo n.º 351/18.8BESNT, foi proferida sentença, no dia 12 de junho de 2018, na qual se determinou a improcedência da reclamação identificada na alínea anterior - provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação do ato do órgão de execução fiscal n.º 351/18.8BESNT, documento n.º 005914067;
P) Na sequência da interposição pela Reclamante de recurso da sentença identificada na alínea anterior, o Supremo Tribunal Administrativo prolatou acórdão, em 22-08-2018, no processo n.º 771/18, no sentido de conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida, ordenando que os autos regressassem à primeira instância, a fim de aí, depois de ser fixada a factualidade pertinente, ser proferida nova decisão, dele constando, designadamente, o seguinte:
“(…) Finalmente, e como também bem salientou o Procurador-Geral Adjunto no parecer referido em 1.1, não pode olvidar-se que da decisão do anterior pedido de extinção da execução fiscal por prescrição foi deduzida reclamação judicial e que a sentença aí proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra foi objecto de recurso para este Supremo Tribunal, já decidido por acórdão que transitou em julgado. O que significa que na apreciação da questão da prescrição não poderá de deixar de se ter em conta o teor dessas decisões judiciais e o eventual alcance do respectivo caso julgado”.
- provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 351/18.8BESNT, documento n.º 005977887;
Q) Foi então proferida nova sentença, no dia 5 de dezembro de 2018, no processo n.º 351/18.8BESNT, julgando procedente a reclamação e anulando a decisão reclamada, ordenando a sua substituição por outra que apreciasse o pedido da Reclamante - provado por consulta, na plataforma SITAF, do processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 351/18.8BESNT;
R) Correu também neste Tribunal o processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 461/19.4BESNT, instaurado pela Reclamante, “S....., Lda.”, em que foi impugnado o despacho do órgão de execução fiscal, de 07-03-2019, que não reconheceu a prescrição da dívida em cobrança no processo de execução fiscal n.º ..... - provado por consulta, na plataforma SITAF, ao processo n.º 461/19.4BESNT;
S) No âmbito do processo referido em R), a Fazenda Pública suscitou a litigância de má fé da Reclamante e esta suscitou a litigância de má fé da Fazenda Pública - provado por consulta, na plataforma SITAF, ao processo n.º 461/19.4BESNT;
T) No âmbito do processo referido em R), em 12 de setembro de 2019, foi proferida sentença que julgou improcedente a reclamação de atos do órgão da execução fiscal bem como os pedidos incidentais de condenação em litigância de má-fé - provado por consulta, na plataforma SITAF, ao processo n.º 461/19.4BESNT;
U) Na sentença referida na alínea antecedente, pode ler-se o seguinte:
[…]
Atendendo à improcedência da referida exceção, passamos agora à análise das questões relativas à ilegalidade da decisão reclamada, impondo-se, por isso, começar por apreciar e decidir se, à data em que foi proferida, o processo de execução fiscal n.º ..... deveria ter sido extinto, por inutilidade superveniente da lide, em virtude de a dívida exequenda ter prescrito.
A este respeito, há que ponderar, como suscitou a própria Reclamante, a decisão do processo que correu termos neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, sob o n.º 456/17.2BESNT, onde invocou a prescrição da dívida exequenda e onde se decidiu que o início da contagem do prazo de prescrição de oito anos ocorreu, no caso concreto, a partir de 5 de abril de 2016. Naquela, foram igualmente considerados três factos interruptivos do prazo prescricional, um dos quais a citação da Reclamante em sede de processo de execução.
Remetendo para o que ali se escreveu, assim como para o que se escreveu na decisão sumária do Supremo Tribunal Administrativo do dia 15 de agosto de 2017, e no acórdão daquele Tribunal superior de 20 de setembro de 2017, transcritos no probatório, nada mais há a acrescentar, quanto ao início da contagem do prazo ou quanto às causas de interrupção do prazo prescricional, em especial sobre a citação da Reclamante.
A respeito das alegadas violações dos art.os 8.º e 30.º da LGT, bem como do n.º 1 do art.º 20.º, do n.º 2 do art.º 103.º, do n.º 2 do art.º 266.º e do n.º 4 do art.º 268.º da CRP, e remetendo para aquilo que foi explicado no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 20 de setembro de 2017, proferido no processo n.º 945/17 (transcrito no probatório), a falta de densificação, na petição inicial, sobre essas violações impede que o Tribunal emita uma apreciação individualizada sobre as mesmas. Em consequência, não se conhecerá das mesmas.
Em suma, verifica-se que desde o dia 5 de abril de 2016, data em que iniciou a contagem do prazo de prescrição, até à data em que a decisão reclamada foi proferida [isto é, no dia 7 de março de 2019 - cfr. alínea u) dos factos provados], não tinham decorrido três anos. Em consequência, não é ilegal a decisão reclamada porque, à data em que foi proferida, a dívida exequenda ainda não tinha prescrito, nos termos e para os efeitos do n.º 1 do art.º 48.º da LGT, improcedendo, por isso, esta ilegalidade suscitada pela Reclamante.
Cumpre agora analisar a questão relativa à ilegalidade da decisão reclamada decorrente da inconstitucionalidade do art.º 49.° da LGT, na redação anterior à da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, por alegada violação dos princípios da legalidade, do direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável, da segurança jurídica, da proteção da confiança e legítimas expectativas dos administrados, da irretroatividade fiscal, do direito de defesa e proteção jurisdicional efetiva, da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público.
A este respeito, a Reclamante, nos seus artigos 57.º e 58.º da petição inicial, alega o seguinte:
«57º
O princípio da legalidade, consagrado no artigo 103.º, n.º 2 da CRP, o direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável, consagrado no artigo 20.º, n.º 4 da CRP, os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança e legitimas expectativas dos administrados, ínsitos no primado do Estado de Direito Democrático, consagrado no artigo 2.º da CRP, o princípio da irretroactividade fiscal, consagrado no artigo 103.° n.° 3 da CRP, bem como a garantia fundamental do direito de defesa e protecção jurisdicional efectiva, constitucionalmente assinalados nos artigos 20.° n.° 1 e 268.° n.° 4 da CRP e os princípios constitucionais da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público, consignados no artigo 266.° n.° 2 da CRP sempre impediriam uma imprescritibilidade da referida dívida tributária ora reclamada.
58º
Aplicando os princípios acima referidos ao caso ora em apreço, verifica-se que o artigo 49.° da LGT (na redação anterior à da Lei n.° 53-A/2006, de 29 de Dezembro), interpretado no sentido de que o prazo de prescrição interrompe-se sucessivamente no tempo, por virtude dos sucessivos factos interruptivos, e que o prazo de prescrição só se inicia a partir do fim do último dos processos interruptivos, impondo assim a continuação da execução fiscal “ad eternum” , encontra-se ferido de inconstitucionalidade por violação dos princípios da legalidade, do direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável, da segurança jurídica, da protecção da confiança e legítimas expectativas dos administrados, da irretroactividade fiscal, do direito de defesa e protecção jurisdicional efectiva, da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público, todos consagrados na CRP.»
Mais uma vez, subscrevendo e repetindo o entendimento pugnado no acórdão de 20 de setembro de 2017, proferido no processo n.º 945/17, e transcrito no probatório, cumpre salientar que, nos processos de natureza impugnatória, como o dos autos, a causa de pedir reconduz-se aos concretos fundamentos de facto e de direito em que se baseia a pretensão anulatória do ato impugnado. Ou seja, a causa de pedir consiste na arguição conjugada de factos e de regras de direito que se entende terem sido violadas pelo ato impugnado, devendo o autor adiantar uma argumentação concretizadora e explicativa da razão pela qual considera que as normas ou princípios jurídicos foram ofendidos, em obediência ao princípio do dispositivo.
É certo que também se impõe ao julgador o conhecimento de questões ex officio, tanto formais como materiais. No entanto, todas as questões só podem ser conhecidas nos autos por referência ao caso concreto, à concreta situação de facto em discussão, por referência ao ato concreto cuja anulação se pretende.
Ora, no caso dos autos, a Reclamante não densificou, na petição inicial, as alegadas violações dos preceitos constitucionais que condensou em dois artigos sem qualquer explicação adicional. Nem o Tribunal conseguiria, se o pretendesse fazer ex officio, conhecer de tais ilegalidades uma vez que as mesmas não resultam imediatamente apreensíveis face aos argumentos factuais esgrimidos pela Reclamante.
Não incumbe ao Tribunal fazer uma ponderação exaustiva de eventuais ilegalidades que se possam colocar em cada caso concreto e por referência a cada ato impugnado, apenas lhe cumpre conhecer daquelas que sejam evidentes.
Portanto, a falta de concretização das alegadas violações dos preceitos constitucionais invocados impede que, também a este respeito, o Tribunal emita uma apreciação individualizada sobre as mesmas, não se podendo, por isso, configurar como verdadeiras questões que mereçam um tratamento singular e individualizado.
Ainda assim, às mesmas foi dado tratamento singular e individualizado, por forma a mais uma vez repetir que a questão da conformidade, com a CRP, do art.º 49.º da LGT, na redação anterior à da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, já foi objeto de diversas decisões do Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão do Pleno da Seção de Contencioso Tributário, de 21 de janeiro de 2015, proferido no processo n.º 0660/14, e no acórdão de 12 de outubro de 2016, no processo 0935/16, e dos acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 441/2012, proferido no processo n.º 890/2011, e n.º 122/15, proferido no processo n.º 179/13, para os quais se remete.
Importa agora apreciar e decidir a ilegalidade da decisão reclamada decorrente de a atuação da AT não observar o prazo de duração do processo de execução fiscal, atento o decurso do prazo de prescrição da dívida, por ofender o direito da Reclamante a um processo equitativo, conforme disposto no art.º 6.º, parágrafo primeiro, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
Como resulta do acima exposto, o prazo de prescrição de oito anos iniciou a sua contagem, no caso concreto, a 5 de abril de 2016 e, em consequência, ainda não decorreu, à data em que a decisão reclamada foi proferida, o prazo de 8 anos de prescrição da dívida em cobrança no processo de execução fiscal n.º ......
Assim sendo, não se verifica a premissa em que a Reclamante sustenta a conclusão de que a AT não observou o prazo de duração daquele processo, o que, de acordo com a sua própria tese, impede uma alegada ofensa do direito da Reclamante a um processo equitativo.
Não obstante, chamamos à colação o entendimento pugnado pelo Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 17 de outubro de 2018, proferido no processo n.º 768/18, e transcrito no probatório, no qual se defendeu que a morosidade do processo de execução fiscal, a que a Reclamante faz referência, não tem uma correlação direta com o regime próprio da prescrição das dívidas tributárias, antes está relacionada com o cumprimento atempado dos prazos processuais legalmente estabelecidos. Ou seja, está relacionada com o facto de a lei ordinária estabelecer a interrupção e a suspensão do decurso do prazo de prescrição quando se verifiquem determinadas ocorrências na pendência do processo de execução fiscal.
Adicionalmente, além de esta ser uma questão cujo conhecimento está vedado em sede dos presentes autos, se se pudesse conhecer da mesma, sempre imporia concluir que a morosidade do processo não se repercute sobre as regras próprias da suspensão e interrupção da prescrição.
Face ao acima exposto, improcede esta ilegalidade suscitada pela Reclamante.
A Reclamante também defende que a decisão reclamada é ilegal porque remete para informação e despacho de 8 de fevereiro de 2017 da Exma. Chefe do serviço de finanças de Sintra 2, quando os fundamentos de facto e de direito invocados no requerimento de 19 de janeiro de 2018 não são idênticos aos que constam do pedido que deu origem àquela informação e despacho.
Alega que, para cálculo do prazo de prescrição, não foi considerado todo o período de tempo decorrido desde a data de apresentação da anterior reclamação de ato do órgão de execução fiscal, que correu termos neste Tribunal, sob o processo n.º 456/17.2BESNT, até trânsito em julgado da decisão proferida em última instância ou, se se entender que a referida reclamação tem efeito suspensivo, não considerou o período de tempo decorrido desde a data do trânsito em julgado da decisão em última instância até à data da apresentação do pedido formulado em 19 de janeiro de 2018. Além de que invocou a violação de normas e princípios da CRP, bem como do art.º 6.º, parágrafo primeiro, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
Vejamos.
No dia 18 de janeiro de 2018, a Reclamante apresentou requerimento dirigido ao serviço de finanças de Sintra 2, pedindo, a final, a extinção do processo de execução fiscal n.º ....., por inutilidade superveniente da lide, em virtude de a dívida exequenda ter prescrito [cfr. alínea l) dos factos provados].
De entre os diversos argumentos apresentados, defende que o princípio da legalidade, o direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável, os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança e legítimas expectativas dos administrados, o princípio da irretroatividade fiscal, bem como a garantia fundamental do direito de defesa e proteção jurisdicional efetiva e os princípios constitucionais da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público, sempre impediriam uma imprescritibilidade da referida dívida tributária [artigo 45.º do requerimento transcrito na alínea l) dos factos provados].
Também alega que o art.º 49.º da LGT, na redação anterior à da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, interpretado no sentido de que o prazo de prescrição se interrompe sucessivamente no tempo, por virtude dos sucessivos factos interruptivos, e que o prazo da prescrição só se inicia a partir do fim do último dos processos interruptivos, impondo assim a continuação da execução fiscal «ad etemum», encontra-se ferido de inconstitucionalidade por violação dos princípios da legalidade, do direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável, da segurança jurídica, da proteção da confiança e legítimas, expectativas dos administrados, da irretroatividade fiscal, do direito de defesa e proteção jurisdicional efetiva, da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público, todos consagrados na CRP [artigo 46.º do requerimento transcrito na alínea l) dos factos provados].
Por último, defende que a atuação da AT, consubstanciada na inobservância do prazo de duração do processo execução fiscal, por efeito do decurso do prazo de prescrição da respetiva dívida, ofende o direito a um processo equitativo, conforme disposto no art.º 6.º, parágrafo primeiro, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem [artigo 49.º do requerimento transcrito na alínea l) dos factos provados].
A decisão reclamada de 7 de março de 2019, ao concordar com a informação elaborada, no mesmo dia, pelo serviço de finanças de Sintra 2, conclui no sentido de que o processo de execução fiscal devia seguir o seu curso pela dívida não estar prescrita [cfr. alíneas r) e u) dos factos provados].
E fá-lo, por remissão para a informação e despacho da Chefe do serviço de finanças de Sintra 2, de 8 de fevereiro de 2017, onde se concluiu que a dívida não se encontrava prescrita, bem como por considerar que o tempo decorrido entre 8 de fevereiro de 2017 e 7 de março de 2019 era insuficiente para que o prazo de prescrição se tivesse completado [cfr. alínea r) dos factos provados]. Da leitura da referida informação também resulta que a mesma teve em consideração o conteúdo da decisão sumária do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de agosto de 2017, proferida no processo n.º 945/17 [cfr. alínea r) dos factos provados].
Assim sendo, verifica-se, por um lado, que foi cumprido o dever previsto no n.º 1 do art.º 56.º da LGT, uma vez que a AT se pronunciou sobre o pedido que lhe foi formulado no requerimento de 18 de janeiro de 2018, tendo concluído pela não extinção do processo de execução fiscal n.º ....., porque a dívida exequenda não prescreveu. A circunstância de não se ter pronunciado sobre todos os argumentos apresentados pela Reclamante não constitui uma violação do referido dever E, por outro lado, a decisão está fundamentada, considerando que, no domínio do direito fiscal, a fundamentação deve consistir numa sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão, mas também pode consistir numa mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas (n.º 1 do art.º 77.º da LGT).
Neste sentido, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 22 de agosto de 2018, proferido no processo n.º 771/18, a que se faz referência na alínea p) dos factos provados, refere, no sumário, que o órgão de execução fiscal não está impedido de na decisão se limitar a remeter para os termos da anterior, se for caso disso, designadamente em face dos fundamentos da anterior decisão e respeitando o caso julgado formado pela sentença e acórdão proferidos em sede de reclamação judicial. O que foi feito.
Improcede, sem necessidade de mais considerações, a ilegalidade suscitada pela Reclamante.
[…]
- provado por consulta, na plataforma SITAF, ao processo n.º 461/19.4BESNT;
V) Da sentença de 12 de setembro de 2019, referida na alínea antecedente, a Reclamante interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul - provado por consulta, na plataforma SITAF, ao processo n.º 461/19.4BESNT;
W) Também o Representante da Fazenda Pública interpôs recurso da referida sentença, tendo por objeto o indeferimento do pedido de condenação da Reclamante como litigante de má-fé - provado por consulta, na plataforma SITAF, ao processo n.º 461/19.4BESNT;
X) Em 14 de janeiro de 2020, o Tribunal Central Administrativo Sul proferiu acórdão, onde consta, designadamente, o seguinte:
“[…]
Comecemos pela errónea interpretação do artigo 49.º, nºs 2 e 3 da LGT, convocando, para o efeito, a fundamentação em que se estribou o Tribunal a quo nesta matéria.
O Tribunal a quo analisa a questão remetendo para o já decidido no âmbito do processo nº 456/17, que correu termos no TAF de Sintra “[o]nde invocou a prescrição da dívida exequenda e onde se decidiu que o início da contagem do prazo de prescrição de oito anos ocorreu, no caso concreto, a partir de 5 de abril de 2016. Naquela, foram igualmente considerados três factos interruptivos do prazo prescricional, um dos quais a citação da Reclamante em sede de processo de execução.
Remetendo para o que ali se escreveu, assim como para o que se escreveu na decisão sumária do Supremo Tribunal Administrativo do dia 15 de agosto de 2017, e no acórdão daquele Tribunal superior de 20 de setembro de 2017, transcritos no probatório, nada mais há a acrescentar, quanto ao início da contagem do prazo ou quanto às causas de interrupção do prazo prescricional, em especial sobre a citação da Reclamante.”
E de facto, nenhuma censura pode ser apontada ao Tribunal a quo quando remete para o já decidido com trânsito em julgado, visto que tal ponderação decorre de vinculação jurídica.
Conforme é jurisprudência reiterada a questão da prescrição da dívida exequenda apenas pode ser discutida de novo relativamente ao período de tempo que decorreu após a prolação de sentença proferida no processo de reclamação, e sempre com respeito pelo prazo de prescrição que nela foi julgado como aplicável, sob pena de violação da autoridade do caso julgado.
Com efeito, é preciso ter presente a distinção entre a exceção dilatória do caso julgado, a qual pressupõe a repetição de uma causa já decidida por sentença transitada em julgado, e a autoridade do caso julgado a qual implica o acatamento de decisão proferida em ação anterior cujo objeto se inscreva, como pressuposto necessário, no objeto de ação posterior, obstando a que a relação jurídica ali definida possa ser contemplada, de novo, de forma diversa.
Neste particular, importa ter presente que a doutrina tem vindo a evidenciar, que enquanto a função positiva é exercida através da autoridade do caso julgado, já a função negativa é exercida através da exceção dilatória do caso julgado prevista nos artigos 577.º, alínea i), 580.º e 581.º, do CPC).
Conforme doutrinado no Aresto deste Tribunal, proferido no processo nº 161/09 de 05 de junho de 2019: “O caso julgado material pode refletir uma dupla função, negativa ou positiva. [V. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil, Vol. III, p. 93. Distinguindo as situações consoante a relação entre o objeto da decisão transitada e o do processo posterior e, nesse seguinte, discernindo entre situações com relação de identidade, situações com relações de prejudicialidade e situações com relações de concurso, v. Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo Processo Civil, 2.ª Ed., Lex. Lisboa, 1997, pp. 574 a 577.] Assim, a função negativa do caso julgado material está inerente à exceção de caso julgado, consubstanciando-se no impedimento de a mesma causa ser apreciada pelo Tribunal numa nova ação. Já a função positiva respeita à chamada autoridade do caso julgado, através da qual se obsta a que a situação jurídica material definida por sentença ou acórdão transitados em julgado possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença ou acórdão [Cfr. os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 13.11.2018 (Processo: 4263/16.1T8VCT.G1.S1), 27.02.2018 (Processo: 2472/05.8 TBSTR.E1)].Ou seja, a autoridade do caso julgado impõe à segunda decisão de mérito o decidido na primeira como sendo seu pressuposto indiscutível, subjacente a uma relação de prejudicialidade entre o objeto de ambas as decisões [V. os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 26.02.2019 (Processo: 4043/10.8TBVLG.P1.S1), de 13.11.2018 (Processo: 4263/16.1T8VCT.G1.S1), e Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 28.02.2019 (Processo: 2143/05.5BELSB)].”
Aplicando estes conceitos jurídicos ao caso concreto da prescrição da dívida exequenda, temos, então, que se num determinado processo judicial se analisa a questão da prescrição da obrigação pecuniária e se o mesmo transita em julgado, tal questão consolida-se na ordem jurídica relativamente aos factos nela tratados, “[r]azão por que, para suscitar novamente a mesma questão, o executado se encontra limitado à invocação de que já decorreu o prazo que, segundo essa decisão, ainda faltava para se completar o fixado prazo de prescrição.
É o que resulta do disposto no artigo 621º do CPC (a que correspondia o artigo 673º do anterior CPC), segundo o qual a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga e, por isso, se a parte decaiu por não ter decorrido um prazo, a sentença não obsta a que o pedido se renove quando o prazo se preencha. Razão por que está, em princípio, vedado ao juiz voltar a pronunciar-se em termos distintos do que ficou já definido sobre a prescrição desta obrigação tributária.”
Feitos estes considerandos jurídicos, e resultando perentório da factualidade assente que a questão da prescrição da dívida exequenda foi dirimida, com trânsito em julgado, dimana inequívoco que a mesma se consolidou na ordem jurídica quanto ao prazo prescricional, em concreto, a aplicar, ao seu cômputo e inerentes causas de interrupção e prescrição ocorridas até aquela data, pelo que nenhuma ilegalidade pode ser apontada à decisão recorrida, quando remete para o que foi decidido no processo nº 456/17 e confirmado mediante decisão sumária e posterior Aresto do STA, proferidos no processo nº 945/17.
Ora, tendo o STA decidido, neste particular, que:
“Atentos os factos dados como provados, o processo de execução fiscal ficou suspenso por determinação do Chefe do Serviço de Finanças de Sintra 2, em 09.09.2003 [cf al. F) dos factos assentes], mediante a apresentação de garantia bancária, associada à apresentação de reclamação graciosa seguida de impugnação judicial, até trânsito da decisão proferida em sede do processo de impugnação judicial, ocorrido em 04.04,2016 [cf. al. K) dos factos assentes].
Ao contrário do que defende a Reclamante, o facto de ter sido reconhecida a caducidade da garantia bancária prestada para suspender o PEF n.º ....., não significa que o prazo de prescrição não se mantenha suspenso.
Considerando o facto interruptivo ocorrido em 10.09.2003 — impugnação judicial, e a suspensão do prazo de prescrição entre 09.09.2003 e 04.04.2016, verificamos que o prazo de 8 anos iniciou-se em 05.04.2016, pelo que nesta data a dívida em cobrança coerciva no PEF n.° ....., instaurado para cobrança do montante correspondente à liquidação de IRC, referente ao exercício de 1998, não se encontra prescrita.
Efectivamente o assim decidido pelo TAF de Sintra respeita a doutrina seguida por este STA (o acórdão invocado pela recorrente no artigo 55° da petição da reclamação respeita a regra legal diferente da aplicável ao caso concreto) no tocante à suspensão do prazo de prescrição, quando se verifica a pendência de impugnação do acto de liquidação de imposto, seja por via administrativa, seja por via contenciosa, cumulada com a prestação de garantia e suspensão do processo de execução fiscal.” nada há a acrescentar neste e para este efeito.
De relevar, outrossim, que não se verifica qualquer erro de julgamento de direito não se vislumbrando, na senda do já decidido anteriormente pelo STA, que tal entendimento permita um alargamento indefinido do prazo de prescrição, e bem assim que traduza qualquer inconstitucionalidade do citado normativo, na redação anterior à da Lei n.º53-A/2006, de 29 de dezembro, por alegada violação dos princípios da legalidade, do direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável, da segurança jurídica, da proteção da confiança e legítimas expectativas dos administrados, da irretroatividade fiscal, do direito de defesa e proteção jurisdicional efetiva, da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público.
Neste particular, a decisão recorrida, aderindo ao entendimento constante no citado Aresto do STA, evidenciou que não haveria lugar a qualquer pronúncia expressa e autónoma sobre qualquer das “questões” de constitucionalidade suscitadas, uma vez que, “[n]o caso dos autos, a Reclamante não densificou, na petição inicial, as alegadas violações dos preceitos constitucionais que condensou em dois artigos sem qualquer explicação adicional. Nem o Tribunal conseguiria, se o pretendesse fazer ex officio, conhecer de tais ilegalidades uma vez que as mesmas não resultam imediatamente apreensíveis face aos argumentos factuais esgrimidos pela Reclamante.
Não incumbe ao Tribunal fazer uma ponderação exaustiva de eventuais ilegalidades que se possam colocar em cada caso concreto e por referência a cada ato impugnado, apenas lhe cumpre conhecer daquelas que sejam evidentes.”
E, de facto, nenhuma censura merece tal entendimento, visto que, tal como na situação tratada no processo nº 456/17, a Recorrente não substanciou, como era seu ónus, as arguidas inconstitucionalidades limitando-se a, genericamente, enunciar os princípios legais ou constitucionais.
Conforme evidenciado no citado Aresto proferido no processo nº 945/17, “a causa de pedir consubstancia-se na arguição conjugada de factos e de regras de direito que se entende terem sido violadas pelo acto impugnado, devendo o autor adiantar uma argumentação concretizadora e explicativa da razão pela qual entende que as normas ou princípios jurídicos foram ofendidos, em obediência ao princípio do dispositivo”.
De todo o modo, e conforme evidenciado pela decisão recorrida, sempre se dirá que a questão da conformidade, com a CRP, do artigo 49.º da LGT, na redação anterior à da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, foi por diversas vezes objeto de decisão pelo STA, deles se destacando, designadamente, o acórdão do Pleno da Seção de Contencioso Tributário, de 21 de janeiro de 2015, proferido no processo n.º0660/14, e no acórdão de 12 de outubro de 2016, no processo 0935/16, e bem assim pelo Tribunal Constitucional, mormente, no processo n.º 441/2012, proferido no processo n.º 890/2011, e n.º 122/15, proferido no processo n.º 179/13, entendimento que este Tribunal acolhe na íntegra.
Destarte, improcede o aludido erro de julgamento de direito tendo a decisão recorrida decidido a questão com total acerto.
Resta apreciar se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quanto ao efeito duradouro da prescrição da dívida exequenda previsto no artigo 327.º, n.º 1 do Código Civil.
Vejamos, então.
A decisão recorrida convoca a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra remetendo, outrossim, para a decisão sumária de 15 de agosto de 2017 e para o Acórdão de 20 de setembro de 2017 explicitando, com clareza, que foram considerados três factos interruptivos do prazo prescricional um dos quais a citação da Reclamante em sede de processo executivo pelo que concluiu que nada há a acrescentar quanto ao cômputo inicial do prazo de prescrição e respetivas causas de interrupção e suspensão, sublinhando, em especial, a citação.
Sustentando, em concreto, que “[a] respeito das alegadas violações dos art.ºs 8.º e 30.º da LGT, bem como do nº1 do artº 20.º, do nº2 do artº 103.º, do nº2 do artº 266.º e do nº4 do artº 268.º da CRP, e remetendo para aquilo que foi explicado no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 20 de setembro de 2017, proferido no processo nº 945/17 (transcrito no probatório), a falta de densificação, na petição inicial, sobre essas violações impede que o Tribunal emita uma apreciação individualizada sobre as mesmas.”
Ora, mais uma vez nenhuma ilegalidade pode ser apontada ao juízo de entendimento do Tribunal a quo, sendo que, face ao já supra evidenciado, tendo a aludida questão sido analisada pelo STA e transitada em julgado nada mais há acrescentar nesse e para esse efeito, limitando-nos a remeter para tal Aresto e extratando-se na parte que para os autos releva que
“[a] jurisprudência do STA, tem de forma reiterada e pacífica adotado o entendimento sufragado na doutrina...no sentido de que: "a interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para a prescrição de todo o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único efeito próprio da interrupção, presente em todas as situações (artigo 326, n° 1 do CC). Porém, em certos casos, designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (artigo 327°, n° 1 do CC). Resultam, assim, destes artigos 326° e 327° dois conceitos de interrupção da prescrição ou interrupções de dois tipos: um que se traduz exclusivamente num efeito instantâneo sobre o prazo de prescrição (inutilização para a prescrição todo o tempo decorrido), outro que se consubstancia no mesmo efeito instantâneo acrescido de um efeito suspensivo (é eliminado o período decorrido e a prescrição não corre enquanto o processo durar, efeito duradouro este que é próprio dos factos suspensivos da prescrição)".
De relevar, in fine, que tal juízo de razão tem total acolhimento na Jurisprudência dos TCA,s e bem assim do STA, resultando consolidado o entendimento que a interrupção da prescrição, resultante da citação do executado, inutiliza, para a prescrição, todo o tempo decorrido anteriormente, nos termos do artigo 326º 1 do C. Civil, e o novo prazo da prescrição não começa a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo, nos termos do nº 1 do artigo 327º do mesmo diploma legal, não consubstanciando tal interpretação qualquer violação de princípios constitucionais basilares.
Face a todo exposto, improcedem, na íntegra, todos os erros de julgamento de direito assacados à decisão recorrida, confirmando-se, nessa medida, o acerto do decidido pelo Tribunal a quo “[a] propósito da ilegalidade da decisão reclamada decorrente da prescrição da dívida exequenda no processo de execução fiscal n.º ....., (…) ocorrendo o início de contagem do prazo prescricional “[n]o dia 5 de abril de 2016, pelo que, até à presente data, ainda não se verificou o prazo de prescrição de 8 anos previsto no n.º 1 do art.º 48.º da LGT.”
Aqui chegados, atentemos, ora, na condenação enquanto litigante de má-fé.
A Recorrente DRFP sindica o erro de julgamento de direito quanto à questão da litigância de má-fé relevando, neste particular, a errada interpretação dos artigos 278.º, nº7 do CPPT, 104.º, nº2 da LGT e 542.º do CPC.
A Recorrente DRFP sustenta que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito visto que o comportamento da Reclamante/Recorrida visava impedir a normal tramitação da execução, pela penhora e venda de bens, e que o prejuízo irreparável alegado, além de não se encontrar fundamentado, não se mostra razoável considerando a mais recente decisão judicial que considerou que a dívida do PEF .....não se encontrava prescrita, atentando ao início da sua contagem, em 05 de abril de 2016.
Razão pela qual, conclui que tendo ficado demonstrado que o pedido de subida imediata da reclamação não tem fundamento razoável, não bastando estar em causa a prescrição da dívida exequenda para se admitir a subida imediata da reclamação deverá a Reclamante/Recorrida ser considerada, e devidamente sancionada, como litigante de má-fé, em conformidade com o que dispõe o n.º 7 do art.º 278º do CPPT.
Sem prescindir, aduz, outrossim, que atento o consignado no artigo 542.º do CPC ter-se-á de configurar como litigância de má-fé a atuação processual da Recorrida quando, passado pouco mais de 4 meses do trânsito em julgado do (2º) acórdão do STA [no proc. 350/18.0BESNT] que declarou que a dívida do PEF ..... não se encontrava prescrita, veio a Reclamante/Recorrida [em 21.03.2019] deduzir nova pretensão de declaração de prescrição da [mesma] dívida.
Mais concretizando que o requerimento que deu origem à presente reclamação foi apresentado junto do órgão da execução fiscal em 19 de janeiro de 2018, como resulta do ponto l) dos factos dados como provados na sentença, sendo que, como resulta do ponto Z aditada pela Fazenda Pública aos factos provados, o processo de reclamação do art.º 276º CPPT n.º 350/18.0BESNT, onde foi [mais uma vez] conhecida e decidida a questão da prescrição da dívida no PEF ....., transitou em julgado em 05.11.2018.
Logo, quando a Reclamante/Recorrida dirige nova reclamação ao tribunal [em 21.03.2019] já era conhecedora desta [outra] decisão judicial que não reconhecia a prescrição no PEF ......
Ademais, sempre importará relevar que o teor do acórdão do STA de 22 de agosto de 2018, proferido no âmbito do processo 771/18 esclarece, de forma clara, que na apreciação da questão da prescrição “não poderá deixar de se ter em conta o teor dessas decisões judiciais e o eventual alcance do respectivo caso julgado”.
Conclui, assim, que o comportamento da Reclamante torna-se manifestamente reprovável quando pretende, conscientemente, que o tribunal se pronuncie, novamente, com os mesmos factos, com os mesmos fundamentos e com recurso a um meio processual já utilizado, sobre uma questão que já havia sido, recentemente, decidida definitivamente, e onde não lhe foi reconhecida razão.
Dissente a Recorrida defendendo para o efeito que a sua conduta processual em nada se pode pautar como litigante de má-fé, visto que a litigância de má-fé não resulta apenas de uma violação do dever de cooperação, mas também do dever de verdade a que as partes estão vinculadas no processo, sendo que a Reclamante não deduziu quaisquer tipos de pretensões infundamentadas, nem tão-pouco alterou ou omitiu factos relevantes para a causa. Ademais, os factos em causa nas decisões reclamadas são distintos devido ao decurso do tempo e a Reclamante invocou argumentos de direito diferentes em ambas as ações judiciais.
Vejamos, então.
(…)
Quanto ao âmbito e extensão da condenação como litigante de má-fé veja-se, neste particular, o doutrinado por Jorge Lopes de Sousa, “[d]everá considerar-se como justificando a condenação por litigância de má fé prevista no n.º 6 do art. 278.º do CPPT, não só a invocação de prejuízo irreparável sem fundamento razoável, como a falta de alegação de quaisquer factos que sirvam de suporte ao pedido de subida imediata da reclamação.”.
Com efeito, a falta de fundamento razoável a que se refere o citado preceito legal dirige-se ao pedido em que sejam invocados pelo Reclamante os factos dos quais resulte o prejuízo irreparável e não propriamente ao fundamento do mérito da reclamação.
É entendimento jurisprudencial que “[a] norma em causa refere-se, de modo muito claro, não ao fundamento da pretensão impugnatória que constitui objecto da reclamação mas antes ao pedido referido no nº 3 do artigo 278º, ou seja, ao pedido de subida imediata da reclamação com o consequente efeito suspensivo fundado na invocação de prejuízo irreparável.”
Ora, no caso vertente o Tribunal a quo analisou a questão da litigância de má-fé ao abrigo do regime geral, sem fazer qualquer alusão ao artigo 278.º, nº 7, do CPPT visto que propugnou, e bem, que estavam verificados os pressupostos para a sua subida imediata.
Neste particular, entendeu o Tribunal a quo, estribando-se em entendimento jurisprudencial uniforme, que a reclamação onde seja invoca a prescrição da dívida exequenda é precisamente um dos casos em que a subida diferida da reclamação lhe retira qualquer efeito útil, não sendo suscetível de alterar esse entendimento o facto de a prescrição ter sido apreciada em anteriores decisões judiciais, no sentido da sua improcedência.
Razão pela qual, entende-se que não padece de qualquer erro de julgamento de direito a decisão recorrida que entendeu que a reclamação de atos do órgão da execução fiscal que versa sobre a prescrição tem subida imediata não relevando, face às considerações supra expendidas, para este efeito de aferição e densificação do conceito de “fundamento razoável” constante no citado normativo a existências de outros processos onde se analise a prescrição das dívidas objeto de cobrança coerciva no aludido processo. E por assim ser, contrariamente ao sustentado pela Recorrente DRFP, não se verificam os pressupostos para a condenação como litigante como má-fé ao abrigo do artigo 278.º, nº7 do CPPT.
Destarte, estando em causa o comportamento processual da Reclamante no que respeita ao mérito da reclamação, a existir condenação como litigante como má fé, o fundamento legal da condenação não pode ser o da norma do n° 7 do artigo 278° do CPPT, mas quando muito do artigo 542.º do CPC.
Aqui chegados, apreciemos, então, se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito ao entender que a situação fática não é passível de enquadramento no citado artigo 542.º do CPC, aplicável ex vi artigo 104.º, nº2 da LGT, e nessa medida se inexiste fundamento legal para a condenação da Recorrida como litigante de má-fé.
Apelemos, desde já, ao regime jurídico que releva neste âmbito.
De harmonia com o disposto no artigo 542.º, do CPC ex vi artigo 104.º, nº2 da LGT:
“2 - Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.”
Do tipo legal supra citado infere-se que a litigância de má-fé, quanto à configuração, apresenta especificidades relativamente à conduta sancionada, à culpa e às consequências.
Relativamente à conduta sancionada, da letra do citado normativo legal, podemos enunciar três tipos de atuação substancial e um de conduta processual. No tocante à atuação substancial podem ser configuradas enquanto tais:
Ø O deduzir pretensão ou oposição cuja falta de fundamento se não deva ignorar (542.º, nº2, alínea a) do CPC);
Ø O alterar a verdade dos factos ou o omitir factos relevantes para a decisão da causa (542.º, nº2, alínea b) do CPC);
Ø A omissão grave do dever de cooperação (542.º, nº2, alínea c) do CPC);
No concernente à conduta processual, o aludido preceito legal, concretamente, o seu nº2, alínea d), descreve um uso manifestamente reprovável do processo ou dos meios processuais, com os seguintes fins:
Ø Obter um objetivo ilegal;
Ø Obstar à descoberta da verdade material;
Ø Diferir, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
Conforme doutrina António Menezes Cordeiro “[a] lei processual castiga a litigância de má fé, independentemente do resultado. Apenas releva o próprio comportamento, mesmo que, pelo prisma do prevaricador, ele não tenha conduzido a nada. O dano não é pressuposto da litigância de má fé.”
Quanto à culpa são hoje penalizadas, como litigância de má fé determinadas condutas especialmente tipificadas, desde que cometidas com dolo ou negligência grave.
Há “dolo quer o agente tenha actuado com intenção de enganar, quer a sua actuação não tenha sido intencionalmente enganadora, mas apenas conscientemente indutora de engano, quer ele tenha, intencionalmente ou apenas conscientemente, por acção ou por omissão, mantido o erro em que o declarante se encontrava.”
Por seu turno, a negligência grave verifica-se naquelas situações resultantes da falta de precauções exigidas pela mais elementar prudência ou das desaconselhadas pela previsão mais elementar que devem ser observadas nos usos correntes da vida.
António Abrantes Geraldes e outros doutrinam quanto à litigância instrumental que a mesma “[r]esultará da violação grave do dever de cooperação ou da utilização dos meios processuais para os fins ilegítimos que constam do art. 542.º, nº2, al. d), como sucede com a sistemática interposição de recursos com vista ao protelamento do trânsito em julgado (STJ 26-9-2013, 305/10 e STJ 12-1-2017, 59970/12).”
Vistos os conceitos que relevam para o caso dos autos, cumpre fazer a devida transposição ao acervo fático dos autos, aquilatando, desta feita, se face à factualidade assente se pode inferir que a Recorrida atuou com má-fé.
Vejamos, então.
Da factualidade assente resulta que na sequência da prolação do despacho de 08 de fevereiro de 2017 por parte do Serviço de Finanças de Sintra 2, que indeferiu o pedido de reconhecimento de prescrição da dívida exequenda no âmbito do processo de execução fiscal nº ....., a sociedade “S....., Lda.” interpôs reclamação a qual correu termos junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, mantendo o ato impugnado.
Por seu turno, a aludida sentença foi objeto de recurso jurisdicional tendo o STA proferido decisão sumária datada de 15 de agosto de 2017 e ulteriormente, face à apresentação de reclamação para a conferência, prolatado Acórdão datado de 20 de setembro de 2017 (processo nº 945/17), os quais confirmaram a decisão de primeira instância, negando o reconhecimento da prescrição da dívida exequenda.
Face ao trânsito em julgado da decisão, conforme dimana inequívoco do probatório e já expendido anteriormente, consolidou-se na ordem jurídica o prazo prescricional, o dies a quo, e as causas de interrupção e suspensão do prazo de prescrição ocorridas até esse momento e demais questões de direito nela sindicadas.
Mais dimana da factualidade assente que, na sequência da realização de penhoras de bens imóveis, a sociedade “S....., Lda.”, apresentou reclamação de atos do órgão da execução fiscal a qual correu termos junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra com o número de processo 350/18, onde invoca, designadamente, a ilegalidade dessas penhoras atenta a prescrição da dívida exequenda, a qual foi julgada improcedente remetendo, nesse particular, para o decidido pelo STA no âmbito do processo nº 945/17.
Por não se conformar com a aludida sentença a sociedade “S....., Lda.” interpôs recurso jurisdicional para o STA tendo sido proferida decisão sumária datada de 16 de agosto de 2018 e ulterior Acórdão datado de 17 de outubro de 2018, com trânsito em julgado em 05 de novembro de 2018, que confirmaram, na íntegra, a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra.
Face ao exposto, e no sentido propugnado pela DRFP quando a sociedade ““S....., Lda.” interpõe reclamação, do ato que indeferiu o pedido de prescrição da dívida exequenda datado de 07 de março de 2019, já tinha conhecimento do segundo Aresto proferido sobre a prescrição da dívida cobrada coercivamente no mesmo processo executivo, existindo apenas um mero lapso de tempo decorrido de quatro meses após o referido trânsito em julgado.
Ora, da aludida factualidade infere-se que a sociedade “S....., Lda.” atuou com negligência grave, pois qualquer pessoa, entenda-se homem médio, colocada na sua posição teria equacionado e discernido que se a 17 de outubro de 2018 não estava prescrito o prazo prescricional de oito anos, cujo cômputo inicial ocorreu em 05 de abril de 2016, então, a 07 de março de 2019 tal prazo não estaria, necessária e inequivocamente, prescrito.
Com efeito, a negligência grave é entendida como “imprudência grosseira, sem aquele mínimo de diligência que lhe teria permitido facilmente dar-se conta da desrazão do seu comportamento, que é manifesta aos olhos de qualquer um.”
Note-se que inexistem questões jurídicas díspares das convocadas e analisadas nos processos que correram termos com os números 456/17 e 350/18, como resulta, aliás sintomático, da análise que fizemos dos erros de julgamento de direito, sendo que, conforme já evidenciado anteriormente, fundamentos e argumentos não se confundem com questões. Acresce, outrossim, que inexistem factos novos, entenda-se em termos de factos com relevo em termos de interrupção/suspensão da prescrição da dívida exequenda, bastando para o efeito uma leitura atenta do probatório.
Neste particular, importa chamar à colação o Acórdão deste Tribunal proferido no âmbito do processo nº 7237/13, datado de 27 de fevereiro de 2014, que em situação similar à dos autos considerou que configura litigância de má fé o comportamento da reclamante quando passado menos de um ano do trânsito em julgado de um Acórdão que declarou que a dívida não estava prescrita e que só ainda havia decorrido cerca de três anos dos dez do prazo da prescrição veio deduzir nova pretensão de declaração de prescrição da dívida.
Convoque-se, neste âmbito, a fundamentação jurídica do citado Aresto extratando-se na parte que, ora, releva o seguinte: “[a] ora recorrente havia sido convencida no citado acórdão do TCASUL sobre a questão da prescrição das dívidas em causa, e ao vir com a nova pretensão de que se declarasse a prescrição das dívidas que havia sido apreciada há tão pouco tempo não devia ignorar que esta última pretensão não tinha fundamento quando a formulou. Trata-se de previsão contida no art. 542 n°s 1 e 2 al. a) do CPC, pois que a reclamante, ora recorrente, deduziu pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar dado que havia, pouco tempo antes, sido convencida da questão da prescrição e que não se verificava, por isso, a prescrição quando a veio deduzir, por último, em 7.5.2013.”
De relevar, in fine, que o Tribunal não descura que o despacho de indeferimento foi prolatado na sequência e em execução do Acórdão do STA prolatado no processo nº 771/18, mas a verdade é que também nesse Acórdão é feita expressa menção que “[n]ão pode olvidar-se que da decisão do anterior pedido de extinção da execução fiscal por prescrição foi deduzida reclamação judicial e que a sentença aí proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra foi objecto de recurso para este Supremo Tribunal, já decidido por acórdão que transitou em julgado. O que significa que na apreciação da questão da prescrição não poderá deixar de se ter em conta o teor dessas decisões judiciais e o eventual alcance do respectivo caso julgado.”
Face a todo o exposto, entende-se que a atuação da sociedade “S....., Lda.” configura atuação como litigante de má fé, pelo que deverá ser condenada em multa a fixar entre 2 UC e 100 UC nos termos conjugados do n° 1 do artigo 542.º do CPC e n° 3 do artigo 27.º do RCP, afigurando-se adequada ao comportamento da Recorrente a multa de 10 Unidades de Conta.
[…]
- provado por consulta, na plataforma SITAF, ao processo n.º 461/19.4BESNT;
Y) O processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 461/19.4BESNT transitou em julgado em 04-02-2020 - provado por consulta, na plataforma SITAF, ao processo n.º 461/19.4BESNT;
Z) Em 13-07-2020, a Reclamante apresentou requerimento dirigido ao Chefe do Serviço de Finanças de Sintra 2, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, pedindo, a final, a extinção do processo de execução fiscal n.º ....., por inutilidade superveniente da lide, em virtude de a dívida exequenda ter prescrito, onde pode ler-se, designadamente, o seguinte:
“[…]
46.º
No caso ora em apreço, verifica-se que a dívida em causa refere-se a IRC de 1998.
[…]
48.º
O processo de impugnação judicial esteve parado entre 03.02.2005 e 29.09.2008 e entre 09.02.2010 e 19.11.2015.
49.º
É assim manifesto que a dívida exequenda já se encontra prescrita na presente data.
50.º
Se assim não se entender, hipótese que se coloca sem conceder, sempre será de considerar que o artigo 49.º, n.º 3 da Lei Geral Tributária, na redação aplicável in casu, nos termos supra expostos (anterior à Lei n.º 53-A/2016, de 29 de Dezembro), apenas admitia como causa de suspensão do prazo de prescrição nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou “por motivo de paragem do processo de execução em virtude de prestações legalmente autorizadas”.
51.º
No caso em apreço não é assim aplicável qualquer suspensão do prazo de prescrição em virtude de prestação de garantia.
[…]
55.º
O princípio da legalidade, consagrado no artigo 103.º, n.º 2 da CRP, o direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável, consagrado no artigo 20.º, n.º 4 da CRP, os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança e legítimas expectativas dos administrados, ínsitos no primado do Estado de Direito Democrático, consagrado no artigo 2.º da CRP, o princípio da irretroactividade fiscal, consagrado no artigo 103.º, n.º 3 da CRP, bem como a garantia fundamental do direito de defesa e protecção jurisdicional efectiva, constitucionalmente assinalados nos artigos 20.º n.º 1 e 268.º n.º 4 da CRP e os princípios constitucionais da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público, consignados no artigo 266.º n.º 2 da CRP sempre impediriam uma imprescritibilidade da referida dívida tributária ora reclamada.
56.º
Aplicando os princípios acima referidos ao caso ora em apreço, verifica-se que o artigo 49.º da LGT (na redação anterior à da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro), interpretado no sentido de que o prazo de prescrição interrompe-se sucessivamente no tempo, por virtude dos sucessivos factos interruptivos, e que o prazo de prescrição só se inicia a partir do fim do último dos processos interruptivos, impondo assim a continuação da execução fiscal “ad eternum”, encontra-se ferido de inconstitucionalidade por violação dos princípios da legalidade, do direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável, da segurança jurídica, da protecção da confiança e legítimas expectativas dos administrados, da irretroactividade fiscal, do direito de defesa e protecção jurisdicional efectiva, da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse pública, todos consagrados na CRP.
57.º
Ademais, no caso em apreço também não é aplicável qualquer efeito de interrupção do prazo de prescrição em virtude da citação da Requerente da instauração da execução fiscal.
[…]
88.º
Nesta medida, a actuação da Administração Tributária consubstanciada na inobservância do prazo de duração do processo de execução fiscal, por efeito do decurso do prazo de prescrição da respectiva dívida, ofende o direito da Requerente a um processo equitativo, conforme disposto no artigo 6.º, parágrafo primeiro, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
[…]
Nestes termos deve a presente execução ser extinta, por inutilidade superveniente da lide, em virtude da dívida exequenda ter prescrito, com as legais consequências”.
– cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial;
AA) Em 06-10-2020, por técnico do Serviço de Finanças de Sintra 2, foi elaborada informação sob o assunto “Novo pedido de prescrição”, onde consta o seguinte:
Na sequência do pedido de reconhecimento da prescrição apresentado peio executado, S....., LDA, NIF ....., cumpre-me informar o seguinte:
O pedido tem o mesmo objeto e fundamentos de pedidos anteriores, em que a executada não obteve provimento, relativamente à ocorrência de prescrição para o PEF ....., em três momentos anteriores, tendo mesmo já sido condenado por litigância de má-fé, conforme se descreve seguidamente.
Da factualidade subjacente o processo de execução fiscal (PEF) n° ....., importa referir que:
a) O processo foi instaurado em 2003-02-03, por divida de IRC do ano de 1998.
b) Em 2003-02-13 foi apresentada reclamação graciosa da liquidação.
c) Foi efetuada citação pessoal em 2003-06-27.
d) Em 2003-09-09 a executada prestou garantia bancaria para suspensão do processo de execução fiscal.
e) Em 2008-09-29, o executado requereu ao tribunal a declaração de caducidade da garantia, tendo o tribunal decidido a seu favor em 2008-12-11.
f) Em 2003-09-10, a executada apresentou Impugnação Judicial, que obteve pelo tribunal o n°73/03.4.2 e no SICJUT o n° ......
g) A impugnação teve 1ª decisão em 2009-10-20, tendo sido considerada parcialmente procedente.
h) A executada interpôs recurso em 2010-01-13, tendo sido proferido Acórdão de improcedência, com trânsito em julgado em 2016-04-04.
i) Na sequência da sentença parcialmente procedente, a mesma foi concretizada, tendo produzido efeitos em 2018-01-22, tendo sido à liquidação de IRC de 1998, anulado o montante de € 74.659,77.
j) Em 24-01-2017, o executado apresentou requerimento no órgão de execução fiscal, no qual suscitava a prescrição do PEF ......
k) Através do despacho proferido em 2017-02-08, o Chefe do SF de Sintra 2 indeferiu a pretensão da executada, ao considerar que não tinha ocorrido prescrição ao PEF em causa,
l) Na sequência do indeferimento do SF de Sintra 2, o devedor, em 24-03-2017, intentou reclamação da decisão do Órgão de execução fiscal, nos termos do artigo 276° e SS do CPPT, a cujo processo foi atribuído pelo tribunal o nº 456/17.2BESNT e pelo SICJUT o n° ......
m) Deste processo judicial, o tribunal decidiu em 1ª Instância pela improcedência, através da sentença datada de 2017-05-31.
n) Não se conformando com a decisão, o executado interpôs recurso, em 2017-07-12, ao qual foi dado pelo tribunal o n° 945/17-30, tendo ficado pelo SICJUT com o n° ......
o) O Recurso foi decidido em 2017-08-15, tendo o Acórdão confirmado a improcedência, declarada na sentença da 1ª Instância, defraudando a espectativa do executado no que concerne à prescrição do PEF ......
p) O Serviço de Finanças de Sintra 2, notificou o executado, através de ofícios datados de 2018-02-09, da ocorrência de penhoras de imóveis.
q) Na sequência da notificação de penhora de imóveis de 2018-02-19, o executado apresenta nova reclamação, na qual volta a solicitar a apreciação da prescrição.
r) Esta reclamação, instaurada em 2018-03-07, obteve do Tribunal o n° 350/18.0BESNT e SICJUT n° ....., e foi julgada improcedente por sentença de 2018-05-16.
s) Não se conformando com a decisão da 1ª Instância, o executado intentou recurso, em 2018-06-01, que correu termos o n° 768/18-30 e SICJUT n° ....., cujo Acórdão, de 2018-08-21, confirmou a decisão de 1ª Instância, declarando improcedente a prescrição do processo executivo.
t) Em 2019-02-20, o executado remete ao SF de Sintra 2 requerimento, no qual solicita a devolução do montante de €1.291,62, referente a penhoras de contas bancárias, que foram convertidas em penhor em 2019-03-01.
u) Na sequência da conversão automática do montante dos saldos bancários penhorados, o executado intentou nova Reclamação do OEF, nos termos do artigo 276° e seguintes do CPPT, instaurado em 2019-03-22, que correu termos no tribunal sob o n° 461/19.4 BESNT e SICJUT ....., na qual, renovou a apreciação da prescrição para o PEF ......
v) Este processo obteve sentença em 1ª Instância, datada de 2019-09-12, na qual o douto tribunal declarou improcedente a prescrição.
w) Mais uma vez, o devedor não se conformando com a decisão da 1ª Instância, volta a recorrer, depois de duas decisões anteriores que lhe foram desfavoráveis. O recurso intentado em 2019-10-04 foi registado pelo tribunal com o n° 461/19.4BESNT, tendo obtido do SICJUT o n° ....., cuja decisão, através do Acórdão de 2020-01-14, confirmou a sentença da 1ª Instância.
Acerca da decisão deste recurso, cabe referir que o executado foi condenado por Litigância de má-fé, conforme passamos a citar para compreensão cabal do seu alcance:
“Face a todo o exposto, entende-se que a atuação da sociedade S....., Lda, configura atuação como litigante de má fé, pelo que deverá ser condenada em multa a fixar entre 2UC e 100UC, nos termos conjugados no nº 1 do artigo 542º CPC e nº 3 do artigo 27º da RCP, afigurando-se adequada ao comportamento da Recorrente a multa de 10 Unidades de Conta.”
Depois deste percurso administrativo e judicial e após três decisões totalmente desfavoráveis, relativamente à prescrição do processo executivo fiscal n.º ....., e ainda após condenação por litigância de má-fé, com os contornos anteriormente explanados, o executado volta a apresentar junto do Serviço de Finanças de Sintra 2, novo requerimento, alegando que a divida se encontra prescrita, repetindo alegações de anteriores pedidos que já foram objeto de apreciação tanto pela AT como pelos tribunais de primeira instância e de recurso, e acrescentando agora que a Autoridade Tributária deve “considerar para apreciação do presente pedido todo o período de tempo decorrido desde a data de apresentação do anterior requerimento apresentado em 18.01.2018 até ao trânsito em julgado da decisão proferida em última instância referente a este pedido”.
Ora, no presente caso, tendo em consideração que o prazo de prescrição de 8 anos previsto no art. 48 ° da Lei Geral Tributária, se manteve-se suspenso desde a data de apresentação da garantia (para efeitos de suspensão da execução por motivo de dedução de impugnação judicial - Proc. n°73/03.4.2) em 2003-09-09 até ao trânsito em julgado do acórdão do TCA Sul, ocorrido em 2016-04-04, que a contagem do prazo de oito anos de prescrição da dívida exequenda, nos termos do art.º 48°, n.º 1 da Lei Geral Tributária, se interrompeu com a citação pessoal do executado que ocorreu em 2003-06-27, interrupção esta que não só inutilizou para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente — “efeito instantâneo (art.º 326°, n.° 1 do Código Civil), como também determina que o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto estiver pendente o processo no qual se verificou aquele efeito interruptivo - efeito duradouro (art.º 327°, n.° 1 do C.C.), sendo que não existe decisão que tenha posto termo ao processo, contando-se os 8 anos apenas a partir de então, afigura-se não restarem dúvidas quanto à não ocorrência da prescrição, conforme jurisprudência uniforme e consolidada do STA, entre outros, os Acórdãos de 2018/09/05, rec. N.° 0644/18 e de 2018/06/20, rec. n.° 0537/18.
cfr. fls. 84 a 91 dos autos do sitaf;
BB) Em 06-10-2020, pela Chefe do Serviço de Finanças de Sintra 2, foi proferido despacho de concordância com a informação identificada na alínea antecedente, tendo sido indeferido o requerimento referido em Z) – cfr. fls. 84 a 91 dos autos do sitaf. »
*
Consta ainda da mesma sentença que «Inexistem factos não provados com relevância para a decisão da causa.» e que «A convicção do Tribunal quanto aos factos provados decorre da análise crítica dos elementos documentais juntos aos autos, bem como da consulta na plataforma SITAF, à tramitação eletrónica de processos que correram termos neste Tribunal, conforme indicado em cada uma das alíneas do probatório.»
*

III – 2. De direito

Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, e de que ainda seja possível conhecer, como referimos antes, é pelas conclusões com que o recorrente extrai das suas alegações, que se determina o objecto do recurso e o âmbito de intervenção deste tribunal.

Nas conclusões deve o recorrente indicar, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida, conforme resulta do disposto no artigo 639.°, n.° 1, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho.

A recorrente imputa à sentença a verificação de erro de julgamento, «por um deficiente juízo valorativo da dispensa de prova testemunhal ou da sua irrelevância para a decisão da causa, dado que mostrava-se indispensável para a apreciação da responsabilidade do mandatário a produção de prova através da inquirição das testemunhas arroladas pela Recorrente no requerimento de 16.03.2021, pelo que o Tribunal recorrido violou o disposto nos artigos 13.º, 113.º e 114.º do CPPT e 99.º da LGT.»

Assim, a primeira questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se, em face dos factos alegados pela recorrente, no articulado em que requereu a produção de prova testemunhal, era lícito ao juiz a quo dispensar a prova testemunhal indicada.

Antes de mais, para melhor percebermos o alcance do recurso jurisdicional que nos vem dirigido importa ter presente o contexto em que a decisão proferida.

Na contestação a Fazenda Pública alegou que, na sua perspectiva, «como resulta aliás da [longa] factualidade exposta nesta Resposta, a Reclamante tem, por via de requerimentos e reclamações dirigidos, quer ao OEF, e depois ao tribunal, protelado a acção da AT, impedindo a concretização das diligências com vista à cobrança das dívidas exequendas em causa nos presentes autos de execução e quiçá alcançar a prescrição das dívidas exequendas (…) Inclusive, após ter sido condenada como litigante de má-fé nos autos de reclamação n.º 461/19.4BESNT». Mais adianta «ser evidente que a Reclamante violou, de forma dolosa, os seu dever de boa fé processual, mediante a adopção de comportamento que se insere no âmbito da previsão do n.º 2 do artigo 542.º (…) reincidindo na sua conduta».

Tal alegação foi alicerçada na identificação dos processos de reclamação do acto do órgão da execução fiscal instaurados pela reclamante em que, relativamente ao mesmo processo de execução fiscal e quanto à mesma dívida, foi sendo suscitada a questão da prescrição da dívida exequenda. Aludia a Fazenda Púbica aos processos n.ºs 456/17, 350/18, 1294/18 e, em concreto, ao processo n.º 461/19.4BESNT em cuja decisão foi qualificada «a sua atuação com negligência grave, pois “qualquer pessoa, entenda-se homem médio, colocada na sua posição teria equacionado e discernido que se a 17 de outubro de 2018 não estava prescrito o prazo prescricional de oito anos, cujo cômputo inicial ocorreu em 05 de abril de 2016, então, a 07 de março de 2019 tal prazo não estaria, necessária e inequivocamente, prescrito.”, usou de igual procedimento, questionando [mais uma vez] a prescrição da dívida no processo de execução fiscal n.º ....., por não se conformar, mais uma vez, com a solução jurídica do douto tribunal.»

Com base na mesma factualidade, a Fazenda Pública invocou que devia ser assacada responsabilidade pessoal e directa ao mandatário da ora recorrente, pela prática dos actos descritos que revelaram má fé, peticionando a extração de certidão e sua remessa à Ordem dos Advogados, para os referidos efeitos.

No exercício do contraditório foi alegado, no que se refere em concreto quanto à responsabilidade do mandatário, o seguinte:


« 55.º

O Mandatário da Reclamante praticou todos os actos a que as circunstâncias do caso concreto impunham não lhe sendo, para além disso, imputável qualquer conduta que permita responsabilização disciplinar ou pessoal.

56.º

Com efeito, de todo o exposto supra resulta que o Mandatário adoptou, no caso concreto, todos o actos e condutas a que segundo a legis artis estava obrigado para defesa dos direitos da Reclamante, o que culminou na apresentação da reclamação com invocação de mais questões jurídicas e que a Fazenda Pública reconhece expressamente na sua resposta.

57.º

Sendo que a conduta adoptada pelo Mandatário em face das circunstâncias concretas existentes e, não merece qualquer censura, sendo certo que Fazenda Pública apenas pretende atemorizar quem, legitimamente e no estrito cumprimentos dos deveres estatutários e processuais aplicáveis, sempre defenderá os interesses legítimos dos seus constituintes nos termos do artigo 208.º da CRP.

58.º

Aliás, o Mandatário é um profissional competente, zeloso e cumpridor das suas obrigações e deveres deontológicos.

59.º

E sempre como tal foi reputado quer por clientes, colegas, magistrados e demais operadores judiciários.

60.º

Não podendo, pois, face a todo o exposto ser-lhe imputada qualquer responsabilidade e não deixará de mobilizar os meios legais ao dispor para junto da tutela suscitar a eventual responsabilização dos intervenientes da Fazenda Pública.

61.º

Em face do exposto, conclui-se que não tem qualquer fundamento o alegado pela Fazenda Pública quanto à actuação do Mandatário da Reclamante, tal como se demonstrará pelos meios de prova legalmente admissíveis se assim for necessário para os efeitos pretendidos, o que ora se requer.»

Assim, a prova testemunhal foi oferecida no âmbito do referido articulado de resposta à questão da responsabilidade nos termos do artigo 545.º do CPC.

Vejamos agora qual a fundamentação do despacho que procedeu à dispensa da prova testemunhal indicada pela recorrente.

No despacho em causa, a questão foi delimitada da seguinte forma: «a matéria contida nos referidos artigos depende da apreciação da conduta processual adotada pela parte e respetivo mandatário nos presentes autos».

Resulta ainda do referido despacho o seguinte: «[m]ais se refira que a eventual responsabilização do mandatário, por atos ou fatos por ele praticados ou produzidos, que configurem uma atuação processualmente reprovável, não pode ser efetivada nos autos pelo juiz, mas antes pela respetiva ordem profissional, estatuindo o artigo 545.º do CPC que “Quando se reconheça que o mandatário da parte teve responsabilidade pessoal e direta nos atos pelos quais se revelou a má-fé na causa, dar-se-á conhecimento do facto à respetiva associação pública profissional, para que esta possa aplicar sanções e condenar o mandatário na quota-parte das custas, multa e indemnização que lhe parecer justa”» concluindo o tribunal a quo que «dispõem os autos dos elementos essenciais à apreciação da questão em causa» indeferindo assim, o requerimento de prova testemunhal nos termos do artigo 13.º, n.º 1 do CPPT, a contrario.

Vejamos.

Vigora no processo judicial tributário o princípio do inquisitório, conforme resulta do disposto no artigo 99.º, n.º 1 da LGT, nos termos do qual «o tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados ou de que oficiosamente pode conhecer.» Como corolário de tal princípio, no âmbito da incumbência que impende sobre o juiz na direcção e julgamento dos processos, o juiz foi dotado do poder/dever de realizar ou ordenar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade no enquadramento supra descrito, conforme resulta do artigo 13.º, n.º 1 do CPPT.

Com efeito, impõe-se ao tribunal decidir conforme os factos e as provas que lhe são apresentados de acordo com as regras processuais, pelo que, ao juiz apenas lhe é lícito dispensar a fase de instrução dos autos «se a questão for apenas de direito ou, sendo também de facto, o processo fornecer os elementos necessários» conforme estatui o artigo 113.º do CPPT.

Do que se deixou dito, resulta a conclusão de que o direito à prova no procedimento e no processo tributário não constitui um direito absoluto. Não basta que a parte requeira a produção de prova testemunhal para que ocorra uma situação de deficit instrutório, pois, claramente o legislador não instituiu como regra absoluta que deve haver sempre lugar a produção de prova. O que resulta dos citados preceitos legais é que o legislador conferiu ao juiz o poder de ponderar e decidir da necessidade da sua produção. Em primeiro lugar, de acordo com as normas que disciplinam a admissibilidade desse meio de prova e, sendo admissível, incumbe-lhe ponderar ainda as circunstâncias do caso concreto, aferindo da relevância da factualidade alegada perante as várias soluções plausíveis para as questões de direito colocadas, só podendo dispensar essa prova no caso de concluir que ela é manifestamente impertinente, inútil ou desnecessária.

A questão da decisão sobre a produção de prova tem sido decidida pela jurisprudência de forma reiterada e uniforme, citando-se a título exemplificativo o Acórdão de 14.09.2016, proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 0946/17: «o processo judicial tributário é, pelo menos desde a Lei Geral Tributária, um processo de partes, pautado pelo princípio da legalidade, do contraditório e da igualdade de partes, devendo o tribunal decidir conforme os factos e as provas que lhe são apresentados dentro das regras processuais. E, por isso, o juiz só pode dispensar a fase de instrução dos autos «se a questão for apenas de direito ou, sendo também de facto, o processo fornecer os elementos necessários» (artigo 113.º do CPPT), devendo, caso contrário, ordenar as diligências de prova necessárias, nomeadamente a testemunhal, em conformidade com o disposto nos artigos 114.º, 115, n.º 1 e 119.º do CPPT.

Assim, embora o tribunal tenha, em princípio, de admitir todos os meios de prova que as partes ofereçam – posto que em processo tributário de impugnação são, em regra, admitidos todos os meios gerais de prova (artigo 115.º do CPPT) – pode recusar a sua produção caso exista norma legal que limite ou proíba determinado meio de prova ou julgue que as provas oferecidas são manifestamente impertinentes, inúteis ou desnecessárias.

O direito à prova no procedimento e no processo tributário existe e é objecto de uma tutela muito forte, mas não constitui um direito absoluto, pois que o legislador ordinário estabeleceu limites e indicou critérios precisos de restrição do uso de meios de prova em relação a factos determinados, como acontece com o artigo 392.º do Código Civil, onde se estabelece que “A prova por testemunhas é admitida em todos os casos em que não seja directa ou indirectamente afastada”, e com o disposto nos artigos 393.º, 394.º e 395.º desse Código, que prevêem as situações em que é inadmissível a prova testemunhal.

Em suma, compete ao juiz examinar, em cada processo judicial, se é legalmente permitida a produção dos meios de prova oferecidos pelas partes, e, no caso afirmativo, aferir da necessidade da sua produção em face das questões colocadas, sabido que instrução tem por objecto os factos controvertidos e relevantes para o exame e decisão da causa tendo em conta as várias soluções plausíveis da questão de direito.»

No caso dos autos, importava saber se se verificavam os pressupostos para reconhecer que o mandatário da parte teve responsabilidade pessoal e directa nos actos pelos quais se revelou a má-fé na causa. Sublinha-se que previamente, a questão que ao tribunal a quo foi colocada consistiu em saber se a actuação processual em causa, reiterando a pretensão de ver declarada a prescrição da dívida nos processos que correram termos com os n.ºs 456/17.2BESNT, 350/18.0BESNT e 461/19.4BESNT, depois do Supremo Tribunal Administrativo ter confirmado o entendimento sufragado no primeiro processo, no sentido de que a dívida não se encontrava prescrita, foi de molde a protelar ou impedir a concretização das diligências com vista à cobrança das dívidas exequendas em causa nos autos de execução, tendo como propósito o decurso do prazo necessário à consumação da prescrição da dívida exequenda, conforme alegou a Fazenda Pública.

A decisão de tal questão passa inelutavelmente, tal como decidiu o tribunal a quo, pela apreciação da conduta processual da recorrente consubstanciada nos factos alegados, nos pedidos formulados constantes dos articulados apresentados nos diversos processos judiciais que correram termos relativos ao mesmo processo executivo e respectivas decisões judiciais, ou seja, passa pela apreciação da prova documental que consta dos autos.

A dispensa da prova foi motivada, precisamente, por os autos conterem todos os elementos de prova essenciais à apreciação da questão sub judice.

Alega a recorrente que a prova testemunhal que foi objecto de dispensa se destinava a provar que o mandatário praticou todos os actos a que as circunstâncias do caso concreto impunham, não lhe sendo imputável qualquer conduta que permita responsabilização disciplinar ou pessoal, tendo praticado todos os actos e condutas a que, segundo a legis artis estava obrigado para defesa dos direitos da Reclamante que culminou com a apresentação da reclamação com invocação de mais questões jurídicas, não lhe podendo ser censurável tal conduta. Saber se a conduta invocada foi conforme a legis artis passa pela apreciação da prova documental constante dos autos (em concreto de todos os articulados apresentados pela recorrente) e pela interpretação das normas aplicáveis.

Importa ainda referir que a alegação de que o mandatário é um profissional competente, zeloso e cumpridor das suas obrigações e deveres deontológicos ou saber se assim é reputado por clientes, colegas, magistrados e demais operadores judiciários constituem questões irrelevantes para a apreciação e decisão sub judice que consiste em saber se, em concreto, os actos processuais praticados nos diversos incidentes do processo de execução fiscal n.º ..... podem constituir conduta processual sujeita à censura que lhe foi imputada.

Assim sendo, o despacho em que o tribunal a quo decidiu dispensar a prova testemunhal por disporem os autos dos elementos essenciais à apreciação da questão não merece a censura que lhe vem imputada, sendo de confirmar.


*

Na segunda conclusão de recurso alega a recorrente que a decisão recorrida padece de erro de julgamento de direito pois considera que, por imperativo constitucional (princípio da legalidade, tipicidade e reserva de lei da Assembleia da República), é inaplicável à prescrição dos créditos tributários, o regime do artigo 327.º n.º 1 do CC, segundo o qual o prazo de prescrição só se inicia quando transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo - consequência do entendimento segundo o qual a interrupção da prescrição tem um "efeito duradouro", protelando o início da prescrição para o fim do processo no qual se discute a legalidade da liquidação, como se se tratasse de uma causa de suspensão da prescrição e não de interrupção.

A recorrente defende tal alegação com base no facto de, em matéria de prescrição, estar vedada a importação do direito civil sem que haja remissão expressa, ou se verifique qualquer lacuna a preencher.

Resulta ainda das alegações de recurso que a recorrente sustenta tal conclusão na discordância com o decidido pelo tribunal recorrido quanto à sua vinculação ao que foi anteriormente apreciado e decidido nos diversos processos que correram termos, com trânsito em julgado, melhor identificados no probatório, relativamente à questão da interrupção/suspensão da prescrição da dívida exequenda.

A questão tem assim, uma conexão inelutável com a terceira conclusão de recurso na qual a recorrente advoga que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de direito, por errada interpretação e aplicação da lei e por violação de lei, ao considerar verificada a autoridade do caso julgado e em consequência, que a dívida em cobrança coerciva não se encontra prescrita, violando o disposto nos artigos 8.º e 30.º da LGT, bem como dos artigos 20.º, n.º 1, 103.º, n.º 2, 266.º, n.º 2 e 268.º, n.º 4 da CRP.

Comecemos pela apreciação da questão da autoridade do caso julgado.

Para a apreciação e decisão de tal questão importa examinar a fundamentação da decisão recorrida.

«Atento o probatório, constata-se que a prescrição da dívida exequenda referente ao processo de execução fiscal n.º ..... foi já suscitada pela Reclamante nos processos de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.ºs 456/17.2BESNT, 350/18.0BESNT e 461/19.4BESNT, tendo sempre sito negado, nas várias decisões proferidas, o reconhecimento da prescrição da dívida exequenda.

No processo n.º 456/17.2BESNT, decidiu o tribunal que o início da contagem do prazo de prescrição de oito anos ocorreu, no caso concreto, a partir de 5 de abril de 2016, tendo sido considerados três factos interruptivos do prazo prescricional, um dos quais a citação da Reclamante em sede de processo de execução.

A Reclamante interpôs recurso da referida sentença para o Supremo Tribunal Administrativo, tendo sido proferida decisão sumária que negou provimento ao recurso.

Da referida decisão sumária, foi apresentada reclamação para a conferência, tendo sido proferido acórdão que indeferiu a reclamação apresentada pela Reclamante, negando o reconhecimento da prescrição da dívida exequenda.

A sentença proferida no âmbito do referido processo transitou em julgado em 09-10-2017.

No âmbito do processo de reclamação de atos do órgão de execução fiscal n.º 350/18.0BESNT, foi proferida sentença, confirmada pelo Supremo Tribunal Administrativo e transitada em julgado em 05-11-2018, onde pode ler-se, designadamente, o seguinte:

“Sem necessidade de maiores considerações, há assim apenas que verificar que desde o dia 05/04/2016, data em que se inicia a contagem do prazo de prescrição, até à presente data, manifestamente não decorreram oito anos, pelo que tem de improceder a presente reclamação, na parte que assaca ilegalidade derivada à penhora, em face da prescrição da dívida”.

Também no âmbito do processo n.º 461/19.4BESNT, o tribunal analisou a questão da prescrição da dívida referente ao processo de execução fiscal n.º ....., remetendo para o já decidido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra no âmbito do processo nº 456/17, para a decisão sumária de 15 de agosto de 2017 e para o Acórdão de 20 de setembro de 2017, referindo que “nada mais há a acrescentar, quanto ao início da contagem do prazo ou quanto às causas de interrupção do prazo prescricional, em especial sobre a citação da Reclamante”.

E o Tribunal Central Administrativo Sul, no acórdão de 14 de janeiro de 2020, confirmou a sentença proferida no âmbito do processo n.º 461/19.4BESNT, podendo ler-se em tal acórdão, transcrito no probatório, que «nenhuma ilegalidade pode ser apontada ao juízo de entendimento do Tribunal a quo, sendo que, face ao já supra evidenciado, tendo a aludida questão sido analisada pelo STA e transitada em julgado nada mais há acrescentar nesse e para esse efeito, limitando-nos a remeter para tal Aresto e extratando-se na parte que para os autos releva que

“[a] jurisprudência do STA, tem de forma reiterada e pacífica adotado o entendimento sufragado na doutrina...no sentido de que: "a interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para a prescrição de todo o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único efeito próprio da interrupção, presente em todas as situações (artigo 326, n° 1 do CC). Porém, em certos casos, designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (artigo 327°, n° 1 do CC). Resultam, assim, destes artigos 326° e 327° dois conceitos de interrupção da prescrição ou interrupções de dois tipos: um que se traduz exclusivamente num efeito instantâneo sobre o prazo de prescrição (inutilização para a prescrição todo o tempo decorrido), outro que se consubstancia no mesmo efeito instantâneo acrescido de um efeito suspensivo (é eliminado o período decorrido e a prescrição não corre enquanto o processo durar, efeito duradouro este que é próprio dos factos suspensivos da prescrição)".

De relevar, in fine, que tal juízo de razão tem total acolhimento na Jurisprudência dos TCA,s e bem assim do STA, resultando consolidado o entendimento que a interrupção da prescrição, resultante da citação do executado, inutiliza, para a prescrição, todo o tempo decorrido anteriormente, nos termos do artigo 326º 1 do C. Civil, e o novo prazo da prescrição não começa a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo, nos termos do nº 1 do artigo 327º do mesmo diploma legal, não consubstanciando tal interpretação qualquer violação de princípios constitucionais basilares».

Refira-se que a questão da prescrição da dívida exequenda apenas pode ser discutida de novo relativamente ao período de tempo que decorreu após a sentença proferida no processo anterior, e sempre com respeito pelo prazo de prescrição que nela foi julgado como aplicável, sob pena de violação da autoridade do caso julgado.

A autoridade do caso julgado importa a aceitação de uma decisão proferida em ação anterior, que se insere, quanto ao seu objeto, no objeto da segunda, visando obstar a que a relação ou situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença.

Enquanto a exceção de caso julgado implica a identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir, conforme decorre do disposto no artigo 581.º, n.º. 1 e 4, do CPC e tem o efeito negativo de impedir o conhecimento do mérito de uma segunda ação, impondo a absolvição da instância, a autoridade do caso julgado não implica a identidade objetiva e tem o efeito positivo de impor a primeira decisão como pressuposto indiscutível da segunda decisão de mérito – cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de 26.02.2019, proc. 4043/10.8TBVLG.P1.S1 e Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC Anotado, Vol. 2º, 3ª ed., pp. 599 e ss.

In casu, por força da autoridade do caso julgado, impõe-se aceitar as várias decisões proferidas anteriormente, na medida em que o núcleo fulcral das questões de direito e de facto nelas apreciadas e decididas são exatamente as mesmas que a Reclamante aqui pretende ver apreciadas e discutidas.

Tal como referido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, no acórdão de 14 de janeiro de 2020, transcrito na alínea X) do probatório, “resultando perentório da factualidade assente que a questão da prescrição da dívida exequenda foi dirimida, com trânsito em julgado, dimana inequívoco que a mesma se consolidou na ordem jurídica quanto ao prazo prescricional, em concreto, a aplicar, ao seu cômputo e inerentes causas de interrupção e prescrição ocorridas até aquela data (…)”.

Ora, no caso dos autos, o início de contagem do prazo prescricional ocorreu no dia 5 de abril de 2016, conforme resulta das decisões judiciais anteriores, já transitadas em julgado, transcritas no probatório, pelo que, até à presente data, ainda não se verificou o prazo de prescrição de 8 anos previsto no n.º 1 do art.º 48.º da LGT.

Improcede, pois, a invocada prescrição da dívida exequenda. (…)»

A recorrente insurge-se contra o assim decidido, podendo ler-se no corpo das alegações de recurso, citando doutrina e jurisprudência distinguindo os conceitos de caso julgado e autoridade do caso julgado, que «a força e autoridade do caso julgado não pode limitar-se aos estreitos contornos definidos nos artigos 580.º e ss. do CPC para a excepção do caso julgado, antes se estendendo a situações em que, apesar da ausência formal da identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir, o fundamento daquela figura jurídica está presente.

E na perspectiva do respeito pela autoridade do caso julgado, isto é, da aferição do âmbito e limites da decisão, ou seja, dos “termos em que se julga”, tem-se entendido que a determinação dos limites do caso julgado e sua eficácia passam pela interpretação do conteúdo da sentença, nomeadamente quanto aos seus fundamentos que se apresentem como antecedentes lógicos necessários à parte dispositiva do julgado por considerar que, contrariamente ao decidido na sentença, no que diz respeito à identidade de causas de pedir, a mesma não se verifica, pois, a causa de pedir nos processos judiciais precedentes, já transitados em julgado, foram factos distintos consubstanciados em decisões proferidas pelo Órgão de Execução Fiscal, as quais foram proferidas em momentos temporais distintos e com base em questões de direito também diferentes.»

Mais sustenta que nunca os Tribunais nas decisões precedentes apreciaram expressamente a questão dos efeitos do decurso do tempo, para a prescrição da divida tributária, desde a entrada do pedido objecto da decisão reclamada – 13.07.2020 - até à data da respectiva decisão – 15.10.2020, não se formando caso julgado material (aludindo-se, certamente por lapso, a matéria), pelo que a douta sentença errou ao considerar verificada a autoridade do caso julgado.

Desde já se adianta que a recorrente confunde conceitos e parte de um pressuposto errado quando sustenta que não se verifica a identidade de causas de pedir, quando defende que a causa de pedir nos processos judiciais precedentes, já transitados em julgado, foram factos distintos consubstanciados em decisões proferidas pelo Órgão de Execução Fiscal.

As diversas decisões proferidas pelo órgão de execução, que incidiram sobre as diversas pretensões apresentadas pela recorrente peticionando a declaração da prescrição da dívida constituem o objecto de cada acção e não a causa de pedir ou facto jurídico.

A constatação de que estamos perante decisões do órgão da execução distintas, proferidas em momentos distintos não obsta só por si, a que o núcleo central da causa seja o mesmo. Com efeito, a questão que tem vindo a ser submetida pela recorrente, apreciada e decidida pelo órgão da execução e pelos tribunais é a mesma: a prescrição da obrigação tributária, isto é, da dívida exequenda que constitui objecto de cobrança coerciva no processo de execução fiscal n.º ......

O argumento de que estão em causa decisões proferias pelo órgão de execução fiscal em momentos distintos, levado ao extremo permitiria à recorrente deduzir um pedido de declaração de prescrição da dívida a cada dia que passe sem que existisse vinculação com as decisões anteriores. As questões que tenham sido decididas de mérito relativamente à relação material controvertida, com trânsito em julgado, impõem-se com força de caso julgado impedindo a propositura de nova acção com base nelas. Em qualquer caso, relativamente às questões relativas ao período decorrido após a última decisão, a decisão sobre as questões suscitadas tem como critério delimitador a autoridade do caso julgado que abrange toda a definição anterior da situação jurídica, ou seja, implica o acatamento de decisão proferida em acção anterior cujo objecto se inscreva, como pressuposto necessário, no objecto de acção posterior.

Como se deixou dito no Acórdão datado de 14/01/2020 proferido por este Tribunal no processo 461/19.4BESNT (parcialmente transcrito no ponto X) do probatório), sobre a mesma questão « […] Comecemos pela errónea interpretação do artigo 49.º, nºs 2 e 3 da LGT, convocando, para o efeito, a fundamentação em que se estribou o Tribunal a quo nesta matéria.

O Tribunal a quo analisa a questão remetendo para o já decidido no âmbito do processo nº 456/17, que correu termos no TAF de Sintra “[o]nde invocou a prescrição da dívida exequenda e onde se decidiu que o início da contagem do prazo de prescrição de oito anos ocorreu, no caso concreto, a partir de 5 de abril de 2016. Naquela, foram igualmente considerados três factos interruptivos do prazo prescricional, um dos quais a citação da Reclamante em sede de processo de execução.

Remetendo para o que ali se escreveu, assim como para o que se escreveu na decisão sumária do Supremo Tribunal Administrativo do dia 15 de agosto de 2017, e no acórdão daquele Tribunal superior de 20 de setembro de 2017, transcritos no probatório, nada mais há a acrescentar, quanto ao início da contagem do prazo ou quanto às causas de interrupção do prazo prescricional, em especial sobre a citação da Reclamante.”

E de facto, nenhuma censura pode ser apontada ao Tribunal a quo quando remete para o já decidido com trânsito em julgado, visto que tal ponderação decorre de vinculação jurídica.

Conforme é jurisprudência reiterada a questão da prescrição da dívida exequenda apenas pode ser discutida de novo relativamente ao período de tempo que decorreu após a prolação de sentença proferida no processo de reclamação, e sempre com respeito pelo prazo de prescrição que nela foi julgado como aplicável, sob pena de violação da autoridade do caso julgado.

Com efeito, é preciso ter presente a distinção entre a exceção dilatória do caso julgado, a qual pressupõe a repetição de uma causa já decidida por sentença transitada em julgado, e a autoridade do caso julgado a qual implica o acatamento de decisão proferida em ação anterior cujo objeto se inscreva, como pressuposto necessário, no objeto de ação posterior, obstando a que a relação jurídica ali definida possa ser contemplada, de novo, de forma diversa.

Neste particular, importa ter presente que a doutrina tem vindo a evidenciar, que enquanto a função positiva é exercida através da autoridade do caso julgado, já a função negativa é exercida através da exceção dilatória do caso julgado prevista nos artigos 577.º, alínea i), 580.º e 581.º, do CPC).

Conforme doutrinado no Aresto deste Tribunal, proferido no processo nº 161/09 de 05 de junho de 2019: “O caso julgado material pode refletir uma dupla função, negativa ou positiva. [V. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil, Vol. III, p. 93. Distinguindo as situações consoante a relação entre o objeto da decisão transitada e o do processo posterior e, nesse seguinte, discernindo entre situações com relação de identidade, situações com relações de prejudicialidade e situações com relações de concurso, v. Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo Processo Civil, 2.ª Ed., Lex. Lisboa, 1997, pp. 574 a 577.] Assim, a função negativa do caso julgado material está inerente à exceção de caso julgado, consubstanciando-se no impedimento de a mesma causa ser apreciada pelo Tribunal numa nova ação. Já a função positiva respeita à chamada autoridade do caso julgado, através da qual se obsta a que a situação jurídica material definida por sentença ou acórdão transitados em julgado possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença ou acórdão [Cfr. os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 13.11.2018 (Processo: 4263/16.1T8VCT.G1.S1), 27.02.2018 (Processo: 2472/05.8 TBSTR.E1)]. Ou seja, a autoridade do caso julgado impõe à segunda decisão de mérito o decidido na primeira como sendo seu pressuposto indiscutível, subjacente a uma relação de prejudicialidade entre o objeto de ambas as decisões [V. os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 26.02.2019 (Processo: 4043/10.8TBVLG.P1.S1), de 13.11.2018 (Processo: 4263/16.1T8VCT.G1.S1), e Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 28.02.2019 (Processo: 2143/05.5BELSB)].”

Aplicando estes conceitos jurídicos ao caso concreto da prescrição da dívida exequenda, temos, então, que se num determinado processo judicial se analisa a questão da prescrição da obrigação pecuniária e se o mesmo transita em julgado, tal questão consolida-se na ordem jurídica relativamente aos factos nela tratados, “[r]azão por que, para suscitar novamente a mesma questão, o executado se encontra limitado à invocação de que já decorreu o prazo que, segundo essa decisão, ainda faltava para se completar o fixado prazo de prescrição.

É o que resulta do disposto no artigo 621º do CPC (a que correspondia o artigo 673º do anterior CPC), segundo o qual a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga e, por isso, se a parte decaiu por não ter decorrido um prazo, a sentença não obsta a que o pedido se renove quando o prazo se preencha. Razão por que está, em princípio, vedado ao juiz voltar a pronunciar-se em termos distintos do que ficou já definido sobre a prescrição desta obrigação tributária.”

Feitos estes considerandos jurídicos, e resultando perentório da factualidade assente que a questão da prescrição da dívida exequenda foi dirimida, com trânsito em julgado, dimana inequívoco que a mesma se consolidou na ordem jurídica quanto ao prazo prescricional, em concreto, a aplicar, ao seu cômputo e inerentes causas de interrupção e prescrição ocorridas até aquela data, pelo que nenhuma ilegalidade pode ser apontada à decisão recorrida, quando remete para o que foi decidido no processo nº 456/17 e confirmado mediante decisão sumária e posterior Aresto do STA, proferidos no processo nº 945/17.

Ora, tendo o STA decidido, neste particular, que:

“Atentos os factos dados como provados, o processo de execução fiscal ficou suspenso por determinação do Chefe do Serviço de Finanças de Sintra 2, em 09.09.2003 [cf al. F) dos factos assentes], mediante a apresentação de garantia bancária, associada à apresentação de reclamação graciosa seguida de impugnação judicial, até trânsito da decisão proferida em sede do processo de impugnação judicial, ocorrido em 04.04.2016 [cf. al. K) dos factos assentes].

Ao contrário do que defende a Reclamante, o facto de ter sido reconhecida a caducidade da garantia bancária prestada para suspender o PEF n.º ....., não significa que o prazo de prescrição não se mantenha suspenso.

Considerando o facto interruptivo ocorrido em 10.09.2003 — impugnação judicial, e a suspensão do prazo de prescrição entre 09.09.2003 e 04.04.2016, verificamos que o prazo de 8 anos iniciou-se em 05.04.2016, pelo que nesta data a dívida em cobrança coerciva no PEF n.° ....., instaurado para cobrança do montante correspondente à liquidação de IRC, referente ao exercício de 1998, não se encontra prescrita.

Efectivamente o assim decidido pelo TAF de Sintra respeita a doutrina seguida por este STA (o acórdão invocado pela recorrente no artigo 55° da petição da reclamação respeita a regra legal diferente da aplicável ao caso concreto) no tocante à suspensão do prazo de prescrição, quando se verifica a pendência de impugnação do acto de liquidação de imposto, seja por via administrativa, seja por via contenciosa, cumulada com a prestação de garantia e suspensão do processo de execução fiscal.” nada há a acrescentar neste e para este efeito. (…)»

Ora, não restam dúvidas quanto à existência de identidade dos pedidos formulado em todas as acções, consubstanciado na declaração de prescrição da divida exequenda. Importa averiguar se, relativamente ao presente caso, foram invocadas distintas causas de pedir (entendida, recorde-se, como os factos constitutivos da situação jurídica que, neste processo, pretende fazer valer), como sustenta a recorrente.

Afirma a recorrente que apenas está em causa a apreciação dos factos relativos ao período temporal decorrido após a entrada do pedido objecto da decisão reclamada, que «nunca os Tribunais nas decisões precedentes apreciaram expressamente a questão dos efeitos do decurso do tempo, para a prescrição da divida tributária, desde a entrada do pedido objecto da decisão reclamada – 13.07.2020 - até à data da respectiva decisão – 15.10.2020, não se formando caso julgado matéria, pelo que a douta sentença errou ao considerar verificada a autoridade caso julgado.»

Para além de a afirmação de que apenas está em causa a apreciação dos factos relativos ao período temporal decorrido após a entrada do pedido objecto da decisão reclamada, não corresponder à verdade, como já antes se deixou dito, a recorrente confunde o conceito de caso julgado enquanto excepção e autoridade do caso julgado, não obstante a recorrente ter transcrito doutrina explicitando a sua delimitação.

A afirmação não tem correspondência com o teor do requerimento e petição inicial, na medida em que a recorrente volta a suscitar a questão da inaplicabilidade da suspensão do prazo de prescrição em virtude da prestação de garantia, facto que não se circunscreve no período que delimitou em 2020, remontando antes a 2003. Assim sendo, ou a recorrente reduziu o âmbito do recurso circunscrevendo-o apenas às questões relativas ao referido período, ou impõe-se considerar que o decidido nas anteriores decisões sobre a questão se impõe nestes autos, como vinculação, a coberto da autoridade do caso julgado. Em qualquer das hipóteses a questão

Senão vejamos. Invocava a recorrente que na petição inicial que o artigo 49.º da LGT, interpretado no sentido propugnado na decisão reclamada, levaria ao aumento do prazo de prescrição em violação do princípio da legalidade consagrado no artigo 103.º, n.º 2 da CRP, o direito a uma decisão em prazo razoável consagrado no artigo 20.º, n.º 4 da CRP, os princípios da segurança jurídica e da protecção a confiança e legitimas expectativas dos administrados, ínsitos no primado do Estado de Direito consagrado no artigo 2.º da CRP, o princípio da irretroactividade (cf. artigo 103.º, n.º 3 da CRP), garantia fundamental do direito de defesa e protecção jurisdicional efectiva e os princípios da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público, consagrados no artigo 266.º n.º 2 da CRP.

Sobre a questão, a sentença recorrida pronuncia-se remetendo para o decidido em Acórdão do STA proferido no processo n.º 768/18 e 461/19 (cf. alínea L) do probatório).

No recurso que nos vem dirigido, vem a recorrente invocar que assim não sucede, reiterando toda a argumentação relativa à interpretação do artigo 49.º da LGT invocando o Acórdão que não tem aplicação ao caso, como já havia sido afirmado na decisão sumária e Acórdão proferidos no processo n.º 350/18.0BESNT (cf. pontos K) e L). Reportamo-nos em concreto à invocação pela recorrida do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 31/01/2007, proferido no processo n.º 1086/06, que perfilhou a solução defendida pela recorrida, contudo com fundamento em que a garantia bancária para suspender a execução fora apresentada em 26/8/98, sendo-lhe aplicável o regime do Código do Processo Tributário, enquanto que no caso dos autos, a garantia foi prestada em 9/9/2003, já no âmbito da vigência da Lei Geral Tributária. Sobre a questão da diferença de regimes em caso idêntico e envolvendo a apreciação do Acórdão proferido no processo 1086/06, enquanto Acórdão fundamento de oposição de julgados, decidiu o Pleno da Secção do CT do STA no Acórdão de 14/09/2011 no processo 0319/1 que não se verificava oposição de Acórdãos descrevendo as diferenças verificadas nas decisões do seguinte modo: «importa referir que, apesar de ser certo que o nº 3 do art. 34º do CPT prevê que a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e a instauração da execução interrompem a prescrição, cessando, porém, esse efeito se o processo estiver parado por facto não imputável ao contribuinte durante mais de um ano (regra que também foi transposta para o nº 2 do art. 39º da LGT), também é certo que o nº 3 do art. 49º da LGT (na redacção introduzida pela Lei nº 100/99, de 26/7) veio determinar que o prazo de prescrição se suspende por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou de reclamação, impugnação ou recurso [ou seja, enquanto que o CPT não previa expressamente causas de suspensão do prazo de prescrição (embora elas pudessem derivar de lei especial, como sucedia com o disposto no nº 5 do art. 5º do DL n° 124/96, de 10/8 – a chamada «Lei Mateus»), a LGT veio, porém, introduzir (no nº 3 do seu art. 49º) uma norma de carácter geral sobre suspensão da prescrição, estabelecendo que o prazo de prescrição legal se suspende por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento ou prestação legalmente autorizada, ou de reclamação, impugnação ou recurso].» Concluindo o citado aresto «(…) Em suma, não se verifica entre os arestos, nem identidade substancial das situações fácticas em confronto (…) nem identidade dos regimes jurídicos aplicáveis.»

Ora, a questão da inaplicabilidade da interrupção do prazo de prescrição em virtude da citação a 23/06/2003 ou da sua suspensão em virtude da prestação de garantia em 9/9/2003, não constituem factos que tenham ocorrido posteriormente a 13/7/2020 (data do último pedido de reconhecimento da prescrição conhecido nos autos) como afirma a recorrente, sublinhando-se que as mesmas foram suscitadas antes pela recorrente e objecto de decisão no processos 456/17 e 461/19 (conforme resulta dos pontos D) a X)). Donde se conclui que, relativamente a tais questões, tal como se decidiu no já citado Acórdão deste Tribunal no processo n.º 461/19 quando afirma que «resultando perentório da factualidade assente que a questão da prescrição da dívida exequenda foi dirimida, com trânsito em julgado, dimana inequívoco que a mesma se consolidou na ordem jurídica quanto ao prazo prescricional, em concreto, a aplicar, ao seu cômputo e inerentes causas de interrupção e prescrição ocorridas até aquela data». Assim sendo, ao decidir no sentido de que estava vinculado pela apreciação efectuada sobre a questão nas diversas decisões anteriores, o tribunal a quo cumpriu com a vinculação a que estava sujeito, não merecendo a censura que lhe vem dirigida, resultando improcedente a alegação de recurso apreciada.


*

Alega a recorrente que, nunca os Tribunais nas decisões precedentes apreciaram expressamente a questão dos efeitos do decurso do tempo, para a prescrição da divida tributária, desde a entrada do pedido objecto da decisão reclamada – 13/07/2020 - até à data da respectiva decisão – 15/10/2020, não se formando caso julgado material, pelo que a douta sentença errou ao considerar verificada a autoridade do caso julgado. Mais alega que, «contrariamente ao exposto na sentença, a situação de facto alterou-se relativamente ao pedido anteriormente decidido pois é manifesto que o decurso do tempo releva para efeitos de cálculo do prazo de prescrição, contado desde a data da decisão do pedido anterior até à data da apresentação do novo pedido.»

Não explicita a recorrente quais os factos «diferentes», novos, que ocorreram desde 14/01/2020 com relevo para a verificação da prescrição e qual a consequência que deles deveria ser extraída. Apenas refere que a Autoridade Tributária teria de considerar todo o tempo decorrido para efeitos de cálculo do prazo de prescrição, desde a data da apresentação do requerimento formulado em 18/01/2018 até ao pedido formulado em 13/07/2020.

Ora, não se tratando de uma verdadeira questão, nada mais haverá a dizer, a não ser que, sendo o prazo de prescrição de 8 anos, até à presente data não transcorreram 8 anos. Sendo essa a conclusão a que chegou a decisão reclamada e a decisão recorrida. Já assim não seria se o prazo estivesse decorrido, ou se ocorresse um facto constitutivo, modificativo ou extintivo da obrigação tributária controvertido, ou se tivesse transcorrido todo o prazo necessário para que se operasse a prescrição da obrigação, uma vez que seria necessário declarar com rigor e certeza qual a data em que tal facto teria ocorrido. Ora na ausência do decurso do aludido prazo estamos perante um facto que decorrerá no futuro. O mero decurso de parte do prazo não tem relevância autónoma, enquanto questão a dirimir, já que a conclusão a extrair é a de que não se verifica a prescrição.

Ainda assim resulta da sentença recorrida a seguinte fundamentação:

«Quanto à invocada inconstitucionalidade do art.º 49.° da LGT, na redação anterior à da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, por alegada violação dos princípios da legalidade, do direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável, da segurança jurídica, da proteção da confiança e legítimas expectativas dos administrados, da irretroatividade fiscal, do direito de defesa e proteção jurisdicional efetiva, da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público, foi igualmente tal argumento aduzido pela Reclamante anteriormente, remetendo-se para o entendimento pugnado no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 20 de setembro de 2017, proferido no processo n.º 945/17, e transcrito no probatório, onde se pode ler que:

“Resulta da leitura, ainda que superficial, desta argumentação esgrimida pela recorrente, não se tratam de verdadeiras questões -vícios ou ilegalidades- que a recorrente colocou à apreciação do Tribunal, tratam-se, antes de argumentos que coadjuvam a questão principal que passa por saber se a dívida exequenda está ou não prescrita.

Na verdade, a argumentação genérica apresentada não permite que se identifique em concreto qual a norma ou interpretação da mesma (feita pelo órgão reclamado) que ofenda os parâmetros constitucionais a que se faz referência.

Como refere o Sr. Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal, ...é patente que a Reclamante não suscitou qualquer questão de inconstitucionalidade sobre a qual o tribunal “a quo” tivesse que emitir pronúncia. Com efeito, a Reclamante limitou-se a invocar, de forma assaz genérica, diversos princípios consagrados na Constituição da República, à luz dos quais, no seu entender, o órgão de execução fiscal devia ter adotado outro entendimento sobre a verificação da prescrição da dívida exequenda”.

(…)

Ou seja, não se podendo configurar tal alegação como uma verdadeira questão, antes apenas podendo ser vista como mais um argumento próprio da questão principal, é evidente que não tinha o tribunal a quo o dever de se pronunciar sobre a mesma, apenas lhe incumbia decidir nos termos da lei a questão que lhe havia sido colocada, a da prescrição ou não da dívida exequenda.

Aliás, o modo como a recorrente invoca a violação de tais parâmetros constitucionais neste recurso revela que não assume tal violação de per se, antes a vendo como um argumento adicional à questão por si suscitada”.

E pode ler-se, a este propósito, na sentença deste Tribunal Administrativo e Fiscal, proferida em 12 de setembro de 2019, no âmbito do processo n.º 461/19.4BESNT, também referida no probatório, que ainda assim, a tais questões “foi dado tratamento singular e individualizado, por forma a mais uma vez repetir que a questão da conformidade, com a CRP, do art.º 49.º da LGT, na redação anterior à da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, já foi objeto de diversas decisões do Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão do Pleno da Seção de Contencioso Tributário, de 21 de janeiro de 2015, proferido no processo n.º 0660/14, e no acórdão de 12 de outubro de 2016, no processo 0935/16, e dos acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 441/2012, proferido no processo n.º 890/2011, e n.º 122/15, proferido no processo n.º 179/13, para os quais se remete”.

(…)

chamamos à colação o entendimento pugnado pelo Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 17 de outubro de 2018, proferido no processo n.º 768/18, e transcrito no probatório, no qual se defendeu que a morosidade do processo de execução fiscal, a que a Reclamante faz referência, não tem uma correlação direta com o regime próprio da prescrição das dívidas tributárias, antes está relacionada com o cumprimento atempado dos prazos processuais legalmente estabelecidos. Ou seja, está relacionada com o facto de a lei ordinária estabelecer a interrupção e a suspensão do decurso do prazo de prescrição quando se verifiquem determinadas ocorrências na pendência do processo de execução fiscal.

Adicionalmente, além de esta ser uma questão cujo conhecimento está vedado em sede dos presentes autos, se se pudesse conhecer da mesma, sempre imporia concluir que a morosidade do processo não se repercute sobre as regras próprias da suspensão e interrupção da prescrição.

Face ao acima exposto, improcede esta ilegalidade suscitada pela Reclamante”.

Em suma, constata-se que todas as questões jurídicas suscitadas pela Reclamante no âmbito da presente reclamação de atos do órgão da execução fiscal, foram já convocadas e analisadas nos processos que correram termos com os números 456/17, 350/18 e 461/19, inexistindo factos novos com relevo em termos de interrupção/suspensão da prescrição da dívida exequenda.

Atenta a factualidade assente, não se vislumbra que do requerimento de 13-07-2020, apresentado pelo Reclamante junto do serviço de finanças, resultem questões ou factos novos.

Encontra-se, portanto, este tribunal vinculado ao que foi anteriormente apreciado, nas diversas decisões, já transitadas em julgado, transcritas no probatório, e para as quais se remete.

Nos termos e com os fundamentos supra expostos, a presente reclamação terá de»

Se é verdade que os factos ocorridos em momento posterior ao da última decisão devem ser apreciados quando tenham relevo para a contagem do prazo de prescrição, no caso dos autos não ocorreram factos novos. Por tal razão, o acto reclamado alude apenas à não verificação do decurso do prazo de prescrição (cf. alínea Z) do probatório no qual se reproduz parcialmente a sua pretensão) entendimento que foi reiterado na sentença recorrida e que aqui se confirma.


*

Por fim, importa apreciar a questão constante da 4ª conclusão, referente ao erro de julgamento de direito, por violação dos artigos 542.º do CPC e artigos 2º e 266º da CRP, quanto ao pedido de condenação da recorrente como litigante de má fé e consequente condenação em multa que a recorrente considera, certamente por lapso, que devia ter sido julgado integralmente procedente.

Vejamos.

A condenação contra a qual se insurge a recorrente foi peticionada pela Fazenda Pública alegando que, na sua perspectiva, é evidente que a Reclamante violou, de forma dolosa, o seu dever de boa fé processual, mediante a adopção de comportamento que se insere no âmbito de previsão do n.º 2 do artigo 542.º do CPC.

Consubstancia tal pretensão na alegação de que «a Reclamante tem, por via de requerimentos e reclamações dirigidos, quer ao OEF, e depois ao tribunal, protelado a acção da AT, impedindo a concretização das diligências com vista à cobrança das dívidas exequendas em causa nos presentes autos de execução e quiçá alcançar a prescrição das dívidas exequendas (…) pretendendo (…) obstar ao normal prosseguimento do processo de execução fiscal, nomeadamente para actos de penhora e venda de bens da executada

Mais alega que após ter sido condenada como litigante de má fé nos autos de reclamação n.º 461/19.4BESNT decisão em que se declarou que «qualquer pessoa, entenda-se homem médio, colocada na sua posição teria equacionado e discernido que se a 17 de outubro de 2018 não estava prescrito o prazo prescricional de oito anos, cujo cômputo inicial ocorreu em 05 abril de 2016, então, a 07 de março de 2019 tal prazo não estaria, necessária e inequivocamente, prescrito.”» a ora recorrente «usou de igual procedimento, questionando [mais uma vez] a prescrição da dívida no processo de execução fiscal n.º ....., por não se conformar, mais uma vez, com a solução jurídica do douto tribunal. (…) inexistem questões jurídicas díspares das convocadas e analisadas nos processos que correram termos com os números 456/17 e 350/18, como resulta, aliás sintomático, da análise que fizemos dos erros de julgamento de direito, sendo que, conforme já evidenciado anteriormente, fundamentos e argumentos não se confundem com questões. Acresce, outrossim, que inexistem factos novos, entenda-se em termos de factos com relevo em termos de interrupção/suspensão da prescrição da dívida exequenda, bastando para o efeito uma leitura atenta do probatório.

52. Sendo certo que quando a sociedade "S....., Lda" interpõe reclamação, do ato que indeferiu o pedido de prescrição da dívida exequenda datado de 07 de março de 2019, já tinha conhecimento do segundo Aresto proferido sobre a prescrição da dívida cobrada coercivamente no mesmo processo executivo, existindo apenas um mero lapso de tempo decorrido de quatro meses após o referido trânsito em julgado.

53. Observação(ões) que têm absoluta pertinência e aplicação para os presentes autos.» actuação que considera ter sido levada a cabo de forma dolosa com negligência grave, que se insere na precisão do artigo 542.º, n.º 2 do CPC.

Mais sustenta que, «quando a sociedade "A....., Lda" interpõe reclamação, do ato que indeferiu o pedido de prescrição da dívida exequenda datado de 07 de março de 2019, já tinha conhecimento do segundo Aresto proferido sobre a prescrição da dívida cobrada coercivamente no mesmo processo executivo, existindo apenas um mero lapso de tempo decorrido de quatro meses após o referido trânsito em julgado.

Mais alega, que «a Reclamante reincidindo na sua conduta, quando apresenta reclamação questionando o ato que indeferiu o pedido de reconhecimento da prescrição da dívida exequenda, apresentado em 13.07.2020 [e sem que apresente questões ou factos jurídicos distintos do anteriormente apresentados] já tinha conhecimento do terceiro Aresto [proferido nos autos de reclamação 461/19.4BESNT] pronunciando-se sobre a prescrição da dívida no mesmo processo executivo, e onde, e mais uma vez, se determinou que o prazo de prescrição teve o seu início em 05.04.2016 (…)Logo, aquele pedido, surgiu decorrido apenas cerca de cinco meses após o trânsito em julgado daquela decisão,

56. Período de tempo que, considerando o conteúdo das decisões judiciais e mais concretamente o início da contagem do prazo de prescrição, em nada afectou o seu cômputo» alegando que o período, entretanto decorrido «produzirá efeitos para a verificação da prescrição (…) sem concretizar como. (…) Assim, a apresentação da presente reclamação (do art.º 276º do CPPT) configura litigância de má-fé, comportamento censurável e condenável, nos termos do n.º 2 do art.º 104º da LGT e art.º 542º e segs do CPC.»

Após a identificação dos processos e respectivas pretensões que na sua óptica concretizam o comportamento dolos, conclui que «nestes quase cinco anos, não se terem podido realizar as necessárias diligências de penhora (como de créditos, de contas bancárias, etc), o que aconteceu é que daquelas penhoras que se conseguiram concretizar, como a penhora de imóveis ou de contas bancárias, ou não puderam prosseguir para a venda, ou o OEF teve de devolver os valores [entretanto] penhorados, como os dos saldos bancários, perante o efeito suspensivo da(s) reclamação(ões) apresentadas (…) A tais prejuízos terá necessariamente que se juntar todos aqueles que AT teve de incorrer com os presentes autos, designadamente com a remessa do processo ao tribunal (nomeadamente no que se refere a custos com papel, recursos humanos, etc.)»

Em abono da sua tese cita o Acórdão proferido por este Tribunal no processo n.º 461/19.4BESNT.

A ora recorrente exerceu o contraditório invocando que não deduziu quaisquer pretensões infundadas, não omitiu factos relevantes para a causa nem teve qualquer tipo de comportamento que possa preencher os pressupostos descritos no n.º 2 do artigo 542.º do CPC.

Em sede de recurso, a recorrente reiterou tal entendimento, acrescentando que tem apenas discutido juridicamente a questão do decurso do tempo para efeitos de prescrição baseando-se na interpretação, ainda que reiterada, qua faz do regime jurídico aplicável ao instituto da prescrição, em especial sobre as causas interruptivas e suspensivas que considera processualmente admissível.

Dirige a sua discordância em relação à decisão recorrida sustentando que não está demonstrado de forma manifesta e inequívoca, qualquer dolo ou negligência grave daa recorrente nos pedidos que formulou, nem que tenha feito uso destes autos um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal.

Vejamos o que se nos oferece dizer sobre a questão.

Tribunal a quo, após efectuar o enquadramento jurídico da questão, apreciou-a nos seguintes termos:

«tal como supra referido, todas as questões jurídicas suscitadas pela Reclamante, no âmbito da presente reclamação de atos do órgão da execução fiscal, foram já convocadas e analisadas nos processos que correram termos com os números 456/17, 350/18 e 461/19, inexistindo factos novos com relevo em termos de interrupção/suspensão da prescrição da dívida exequenda.

Tal como decorre da factualidade assente, a Reclamante, não obstante o trânsito em julgado das decisões judiciais que declararam que não estava prescrita a dívida exequenda em causa e, não obstante estar já consolidado na ordem jurídica o prazo prescricional, o dies a quo, e as causas de interrupção e suspensão do prazo de prescrição ocorridas e demais questões de direito nelas sindicadas, vem novamente deduzir pretensão de declaração de prescrição da dívida.

Acresce que, atento o teor do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 14 de janeiro de 2020, transcrito no probatório, constata-se que a Reclamante foi já condenada como litigante de má fé em multa de 10 Unidades de Conta, podendo ler-se em tal aresto o seguinte:

“[…]

Da factualidade assente resulta que na sequência da prolação do despacho de 08 de fevereiro de 2017 por parte do Serviço de Finanças de Sintra 2, que indeferiu o pedido de reconhecimento de prescrição da dívida exequenda no âmbito do processo de execução fiscal nº ....., a sociedade “S....., Lda” interpôs reclamação a qual correu termos junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, mantendo o ato impugnado.

Por seu turno, a aludida sentença foi objeto de recurso jurisdicional tendo o STA proferido decisão sumária datada de 15 de agosto de 2017 e ulteriormente, face à apresentação de reclamação para a conferência, prolatado Acórdão datado de 20 de setembro de 2017 (processo nº 945/17), os quais confirmaram a decisão de primeira instância, negando o reconhecimento da prescrição da dívida exequenda.

Face ao trânsito em julgado da decisão, conforme dimana inequívoco do probatório e já expendido anteriormente, consolidou-se na ordem jurídica o prazo prescricional, o dies a quo, e as causas de interrupção e suspensão do prazo de prescrição ocorridas até esse momento e demais questões de direito nela sindicadas.

Mais dimana da factualidade assente que, na sequência da realização de penhoras de bens imóveis, a sociedade “S....., Lda”, apresentou reclamação de atos do órgão da execução fiscal a qual correu termos junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra com o número de processo 350/18, onde invoca, designadamente, a ilegalidade dessas penhoras atenta a prescrição da dívida exequenda, a qual foi julgada improcedente remetendo, nesse particular, para o decidido pelo STA no âmbito do processo nº 945/17.

Por não se conformar com a aludida sentença a sociedade “S....., Lda” interpôs recurso jurisdicional para o STA tendo sido proferida decisão sumária datada de 16 de agosto de 2018 e ulterior Acórdão datado de 17 de outubro de 2018, com trânsito em julgado em 05 de novembro de 2018, que confirmaram, na íntegra, a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra.

Face ao exposto, e no sentido propugnado pela DRFP quando a sociedade “S....., Lda” interpõe reclamação, do ato que indeferiu o pedido de prescrição da dívida exequenda datado de 07 de março de 2019, já tinha conhecimento do segundo Aresto proferido sobre a prescrição da dívida cobrada coercivamente no mesmo processo executivo, existindo apenas um mero lapso de tempo decorrido de quatro meses após o referido trânsito em julgado.

Ora, da aludida factualidade infere-se que a sociedade “S....., Lda” atuou com negligência grave, pois qualquer pessoa, entenda-se homem médio, colocada na sua posição teria equacionado e discernido que se a 17 de outubro de 2018 não estava prescrito o prazo prescricional de oito anos, cujo cômputo inicial ocorreu em 05 de abril de 2016, então, a 07 de março de 2019 tal prazo não estaria, necessária e inequivocamente, prescrito.

Com efeito, a negligência grave é entendida como “imprudência grosseira, sem aquele mínimo de diligência que lhe teria permitido facilmente dar-se conta da desrazão do seu comportamento, que é manifesta aos olhos de qualquer um.”

Note-se que inexistem questões jurídicas díspares das convocadas e analisadas nos processos que correram termos com os números 456/17 e 350/18, como resulta, aliás sintomático, da análise que fizemos dos erros de julgamento de direito, sendo que, conforme já evidenciado anteriormente, fundamentos e argumentos não se confundem com questões. Acresce, outrossim, que inexistem factos novos, entenda-se em termos de factos com relevo em termos de interrupção/suspensão da prescrição da dívida exequenda, bastando para o efeito uma leitura atenta do probatório.

Neste particular, importa chamar à colação o Acórdão deste Tribunal proferido no âmbito do processo nº 7237/13, datado de 27 de fevereiro de 2014, que em situação similar à dos autos considerou que configura litigância de má fé o comportamento da reclamante quando passado menos de um ano do trânsito em julgado de um Acórdão que declarou que a dívida não estava prescrita e que só ainda havia decorrido cerca de três anos dos dez do prazo da prescrição veio deduzir nova pretensão de declaração de prescrição da dívida.

Convoque-se, neste âmbito, a fundamentação jurídica do citado Aresto extratando-se na parte que, ora, releva o seguinte: “*a+ ora recorrente havia sido convencida no citado acórdão do TCASUL sobre a questão da prescrição das dívidas em causa, e ao vir com a nova pretensão de que se declarasse a prescrição das dívidas que havia sido apreciada há tão pouco tempo não devia ignorar que esta última pretensão não tinha fundamento quando a formulou. Trata-se de previsão contida no art. 542 n°s 1 e 2 al. a) do CPC, pois que a reclamante, ora recorrente, deduziu pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar dado que havia, pouco tempo antes, sido convencida da questão da prescrição e que não se verificava, por isso, a prescrição quando a veio deduzir, por último, em 7.5.2013.”

De relevar, in fine, que o Tribunal não descura que o despacho de indeferimento foi prolatado na sequência e em execução do Acórdão do STA prolatado no processo nº 771/18, mas a verdade é que também nesse Acórdão é feita expressa menção que “*não pode olvidar-se que da decisão do anterior pedido de extinção da execução fiscal por prescrição foi deduzida reclamação judicial e que a sentença aí proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra foi objecto de recurso para este Supremo Tribunal, já decidido por acórdão que transitou em julgado. O que significa que na apreciação da questão da prescrição não poderá deixar de se ter em conta o teor dessas decisões judiciais e o eventual alcance do respectivo caso julgado.”

Face a todo o exposto, entende-se que a atuação da sociedade “S....., Lda” configura atuação como litigante de má fé, pelo que deverá ser condenada em multa a fixar entre 2 UC e 100 UC nos termos conjugados do n° 1 do artigo 542.º do CPC e n° 3 do artigo 27.º do RCP, afigurando-se adequada ao comportamento da Recorrente a multa de 10 Unidades de Conta.

[…]”

Ora, apesar da recente condenação da Reclamante como litigante de má fé numa multa de 10 Unidades de Conta, aquela não se inibiu de invocar novamente a prescrição da dívida exequenda perante o órgão da execução fiscal e de deduzir nova reclamação de ato do órgão da execução fiscal.

Atente-se que o processo de reclamação de atos do órgão da execução fiscal n.º 461/19.4BESNT transitou em julgado em 04-02-2020 e em 13-07-2020 a Reclamante apresentou novamente requerimento dirigido ao serviço de finanças, pedindo o reconhecimento da prescrição da dívida sub iudice, tendo, perante o indeferimento do referido requerimento, deduzido a presente reclamação.

Transpondo a fundamentação do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul supra citado, para o presente caso, é forçoso concluir que a Reclamante atuou com negligência grave, pois que, qualquer pessoa, entenda-se homem médio, colocada na sua posição teria equacionado e discernido que se a 14 de janeiro de 2020 (data em que foi proferido o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul no âmbito do processo n.º 461/19.4BESNT) o prazo prescricional de oito anos, cujo cômputo inicial ocorreu em 05 de abril de 2016, não se tinha ainda completado, então, a 13 de julho de 2020, tal prazo não tinha, necessária e inequivocamente, decorrido.

E refira-se que a Reclamante, quando deduziu reclamação questionando o ato que indeferiu o pedido de reconhecimento da prescrição da dívida exequenda, apresentado em 13-07-2020, tinha já conhecimento do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido nos autos de reclamação 461/19.4BESNT, pronunciando-se sobre a prescrição da dívida no mesmo processo executivo, e onde, e mais uma vez, se reiterou que o prazo de prescrição teve o seu início em 05-04-2016.

Atento o curto lapso de tempo decorrido entre o trânsito em julgado do referido acórdão e a dedução de nova pretensão de declaração da prescrição da dívida (cerca de cinco meses) e considerando a anterior condenação da Reclamante como litigante de má fé, conclui-se que a Reclamante, reincidiu na sua conduta, deduzindo pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar [alínea a) do n.º 2 do artigo 542.º do CPC].

Face a todo o exposto, entende-se que a atuação da Reclamante configura atuação como litigante de má fé, pelo que deverá ser condenada em multa a fixar entre 2 UC e 100 UC nos termos conjugados do n.º 2 do artigo 104.º da LGT, n° 1 do artigo 542.º do CPC e n° 3 do artigo 27.º do RCP.

Considerando que a Reclamante foi já condenada na multa de 10 Unidades de Conta e ainda assim, não se coibiu de deduzir nova pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar, afigura-se adequada ao comportamento da Reclamante a multa de 30 Unidades de Conta.»

Do que se deixou transcrito resulta claramente qual a fundamentação da condenação.

Além da apreciação crítica efectuada com base nos factos constates dos autos, o tribunal a quo socorreu-se da fundamentação constante do Acórdão proferido por este Tribunal no processo n.º 461/19, que fez sua, com inteira justificação, na medida em que ali estavam em causa os mesmos factos com relevo para os presentes autos. Sendo os mesmos factos que integram o comportamento da processual da recorrente, para efeitos da sua subsunção à norma constante do artigo 542.º do CPC, que prevê os pressupostos que configuram a actuação processualmente reprovável, a decisão recorrida, que assim considerou, não merece a censura que lhe vem dirigida.

Na verdade, a apreciação feita pelo tribunal recorrido teve em conta o teor de todos os requerimentos dirigidos pela recorrente nos processos n.º 456/17, 350/18 e 461/19 concluindo que não obstante o trânsito em julgado das decisões que declararam que a dívida não estava prescrita, com consolidação do prazo prescricional, do dies a quo, causas de interrupção e suspensão do prazo e demais questões de direito nelas sindicadas a recorrente veio reiterar a pretensão de declaração de prescrição da dívida, conforme melhor se detalhou na apreciação efectuada no Acórdão proferido no processo n.º 461/19.

Para além da referida factualidade, a decisão recorrida teve em conta que apesar da recorrente ter sido condenada pelo aludido Acórdão, condenação transitada em julgado em 04/02/2020, a recorrente deduziu nova pretensão em 13/07/2020 pedindo novamente o reconhecimento da prescrição, tendo, perante o indeferimento do pedido, deduziu a presente reclamação, concluindo o Tribunal a quo que se impunha considerar que a «Reclamante atuou com negligência grave, pois que, qualquer pessoa, entenda-se homem médio, colocada na sua posição teria equacionado e discernido que se a 14 de janeiro de 2020 (data em que foi proferido o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul no âmbito do processo n.º 461/19.4BESNT) o prazo prescricional de oito anos, cujo cômputo inicial ocorreu em 05 de abril de 2016, não se tinha ainda completado, então, a 13 de julho de 2020, tal prazo não tinha, necessária e inequivocamente, decorrido.» Ponderou ainda o Tribunal recorrido o facto essencial, consubstanciado na circunstância da recorrente ter deduzido a reclamação em causa nos presentes autos, quando já tinha conhecimento do aludido Acórdão que se pronunciou sobre os elementos que configuram a questão da prescrição. Tendo formulado nova pretensão no curto lapso de tempo que em nada alterava aquela configuração e considerando a condenação da recorrente a que se procedeu no referido Acórdão, como litigante de má fé, forçoso é concluir, como concluiu o Tribunal a quo, que a reclamante reincidiu na sua conduta deduzindo pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar, comportamento que integra o pressuposto constante da alínea a) do n.º 2 do artigo 542.º do CPC, pelo que improcede, também a conclusão de recurso apreciada.


*

IV - Conclusões:

1ª - No processo judicial tributário compete ao juiz examinar se é legalmente permitida a produção da prova testemunhal oferecida pelas partes em face das normas que disciplinam a admissibilidade desse meio de prova, e, no caso afirmativo, aferir da relevância da factualidade alegada perante as várias soluções plausíveis para as questões de direito colocadas, só podendo dispensar essa prova no caso de concluir que ela é manifestamente impertinente, inútil ou desnecessária;

- A excepção dilatória do caso julgado, pressupõe a repetição de uma causa já decidida por sentença transitada em julgado, enquanto a autoridade do caso julgado implica o acatamento de decisão proferida em acção anterior cujo objecto se inscreva, como pressuposto necessário, no objecto de acção posterior, obstando a que a relação jurídica ali definida possa ser contemplada, de novo, de forma diversa.

3ª - Se num determinado processo judicial se analisa a questão da prescrição da obrigação pecuniária e se o mesmo transita em julgado, tal questão consolida-se na ordem jurídica relativamente aos factos nela tratados e suscitando novamente a mesma questão encontra-se o executado limitado à invocação de que já decorreu o prazo que, segundo essa decisão, ainda faltava para se completar o fixado prazo de prescrição.

4ª – Interposta nova reclamação do acto que indeferiu o pedido de prescrição da dívida exequenda, quando a Reclamante já tinha conhecimento do segundo Acórdão proferido pelo STA e de posterior Acórdão proferido pelo TCAS sobre a prescrição da dívida exequenda cobrada coercivamente no mesmo processo executivo, existindo apenas um mero lapso de tempo decorrido de seis meses após o referido trânsito em julgado, e se inexistem questões jurídicas díspares das anteriormente decididas, nem novos factos com relevo para o cômputo do prazo prescricional, conclui-se que a recorrente reincidiu na sua conduta deduzindo pretensão, cuja falta de fundamento não devia ignorar, actuação que se configura como litigante de má-fé.


*

V - DECISÃO


Termos em que, acordam os juízes da formação de julgamento em turno, do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso jurisdicional, confirmando a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 24 de Agosto de 2021.


Ana Cristina Carvalho


A relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, têm voto de conformidade com o presente acórdão as Senhoras Juízas Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, Dora Lucas Neto e Paula Loureiro

(Ana Cristina Carvalho)