Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:698/22.9BELRA
Secção:CA
Data do Acordão:11/17/2022
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR
PENA DISCIPLINAR DE DEMISSÃO
DIREITO À NÃO INCRIMINAÇÃO
Sumário:I – Mesmo que se admitisse que a inicial inquirição do arguido se mostrava irregular pela ausência do seu mandatário, tendo havido segunda inquirição já com a sua presença, sempre se mostraria sanada qualquer eventual irregularidade precedente, tanto mais que o arguido na primeira inquirição declarou “não pretender pronunciar-se sobre a matéria,” pelo que se não verificou qualquer auto incriminação.
II - O direito à não autoincriminação, que se integra no princípio nemo tenetur se ipsum accusare, beneficia de proteção constitucional, mas não configura um direito absoluto, podendo ser objeto de restrições, conforme decorre do artigo 18.º, n.º 2, da CRP, mesmo no âmbito do processo criminal.”
II – Os prazos de tramitação dos Processo Disciplinares são meramente instrumentais e ordenadores, não constituindo o seu incumprimento qualquer irregularidade suscetível de determinar a anulação do correspondente processo.
III - Detetando o instrutor de Processo Disciplinar qualquer irregularidade na Acusação sempre poderá proceder à sua devida reformulação, estando apenas obrigado a facultar o contraditório ao arguido relativamente à nova acusação.
IV - Fazendo depender o artigo 120.º do CPTA o deferimento das providências cautelares da existência cumulativa dos dois requisitos positivos enunciados no n.º 1, o “periculum in mora” e o “fumus boni iuris”, e ainda, segundo o n.º 2, da inexistência de danos superiores decorrentes da adoção da providência relativamente àqueles que possam resultar da sua não adoção, no âmbito do juízo de ponderação “dos interesses públicos e privados em presença”, sendo a necessidade de preenchimento dos referidos pressupostos, como se disse, de natureza cumulativa, tendo sido entendido inverificar-se o preenchimento do fumus boni iuris, está, por natureza, e desde logo, comprometida a procedência da presente Providência Cautelar.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
P...., Agente da Polícia de Segurança Pública, no âmbito de Providência Cautelar apresentada contra o Ministério da Administração Interna tendente “à suspensão de eficácia de ato administrativo, tendo em vista a suspensão da decisão daquela Entidade, datada de 23.06.2022, pela qual lhe foi aplicada a pena disciplinar de demissão no âmbito de processo disciplinar contra si instaurado, com o n.º 2020LSB00114DIS”, inconformado com a Sentença proferida no TAF de Leiria em 12 de setembro de 2022, através da qual foi julgada “totalmente improcedente o presente processo cautelar”, veio em 26 de setembro de 2022 interpor recurso jurisdicional da referida decisão, no qual concluiu:
“a. A douta sentença recorrida, salvo melhor opinião, enferma de erro nos pressupostos de facto e de direito.
b. Cometeu erro de direito na apreciação, valoração e concretização do fumus boni iuri.
c. Andou mal o Tribunal a quo, quando, desvaloriza o facto do Recorrente, ter sido sujeito a um primeiro interrogatório, em data que, por requerimento, o seu mandatário referiu estar impossibilitado de o acompanhar – invocando justo impedimento - enquadrando-o apenas numa ótica de mera “irregularidade sanável”, insignificante para a instrução do processo, uma vez que, “resulta do processo instrutor, bem como da acusação e do relatório final, este interrogatório não foi tido em conta nem apreciado pelo instrutor do processo para efeitos de determinação da pena (...).”
d. Ora, a questão de direito, não é saber se o Recorrente, apresentando-se a interrogatório (ao qual não teria escolha, sob pena de incorrer em procedimento disciplinar), sem a garantia do seu direito constitucional, a estar acompanhado pelo seu mandatário, mesmo não prestando declarações, teria ou não um efeito jurídico, nulo nesse ato ou em todo o processado, mas sim, perceber qual a razão e fundamentação que levou o Senhor Instrutor a indeferir a garantia deste direito constitucional ao Recorrente, e é aqui, que salvo melhor entendimento, deveria residir a avaliação e fundamentação do Tribunal a quo.
e. Os direitos dos cidadãos, seja em que condição for, e em especial na condição de arguido não ficam suspensos só porque se aproxima ou encontra-se a terminar um qualquer prazo administrativo, contraordenacional ou judicial, mesmo que tenha como resultado a prescrição ou arquivamento de um procedimento disciplinar.
f. Esta situação não se encontra prevista em nenhum normativo legal, caso contrário o instituto da prescrição e da caducidade, não existiriam, porque a exceção através de prorrogação de prazo de inquérito ou instrução, com base numa alegada complexidade processual inexistente, seria sempre colmatada e acutelada por este instrumento – despacho de prorrogação do prazo de instrução.
g. A fase de instrução do processo disciplinar, previsto no artigo 82.º e seguintes do Estatuto Disciplinar da PSP é da responsabilidade e direção do Senhor Instrutor Disciplinar e não do arguido, logo a “fundamentação” de indeferimento para a alteração do interrogatório proferido por despacho a 22 de setembro de 2020, não existe e salvo melhor entendimento, é ilegal e inconstitucional.
h. Logo, o despacho de prorrogação do prazo de instrução apenas foi proferido, porque o processo disciplinar movido contra o Recorrente, estava na iminência da prescrição, ou da sua nulidade, caso não houvesse uma possibilidade de convocar uma segunda vez para interrogatório, assegurando a garantia constitucional do Recorrente se encontrar acompanhado pelo seu mandatário.
i. Foi apenas por esta razão, evidente e ilegal, que se proferiu um despacho de prorrogação do prazo de instrução, por fundamentar, invocando uma alegada complexidade que não existiu, face aos factos em causa e ao reconhecimento parcial por parte do ora Recorrente, como arguido no processo.
j. Na Sentença recorrida, o tribunal a quo, considerou que “conforme consta já do relatório final do procedimento disciplinar, vem a jurisprudência dos nossos tribunais superiores emitindo pronuncia acerca desta matéria em sentido desfavorável ao que vem preconizado pelo Requerente, afirmando que nada obsta que, em processo disciplinar, o instrutor reformule a acusação, “com vista à completa articulação dos factos e circunstâncias que envolvem responsabilidade disciplinar do arguido”, o que é feito nos termos do n.º 2 do artigo 123.º do CPP, norma que é nesse âmbito aplicável por força do artigo 7.º do EDPSP, e que confere ao instrutor a possibilidade de anular a acusação originalmente deduzida”.
k. O Recorrente, não se conforma com esta avaliação e interpretação, uma vez que, a entidade detentora do poder disciplinar, não é o Instrutor Disciplinar!
l. Alias, nunca poderia ser, nunca foi e a pratica na tramitação processual de processos disciplinar na Polícia de Segurança Pública, tem demonstrado, à exceção do presente caso, que apenas aqueles, detentores do poder disciplinar, podem punir, arquivar e anular qualquer procedimento disciplinar, sob proposta do Instrutor Disciplinar, que apenas é titular do processo, não do poder disciplinar.
m. E não é necessário, ao contrário do que fez o Tribunal a quo, aplicar por força do artigo 7.º do ED/PSP, qualquer norma subsidiária no caso com recurso ao CPP, uma vez que a resposta se encontra de forma clara e sem grande esforço interpretativo na Lei n.º 3737/2019, de 30 de maio que aprovou o Estatuto Disciplinar da PSP.
n. Ora, salvo melhor entendimento, o ED/PSP, distingue bem e de forma clara, as competências legais de um Instrutor Disciplinar e as competências legais do Decisor Disciplinar. Não são as mesmas, nem tão pouco complementares.
o. Se ao Instrutor Disciplinar cabe, a partir da sua nomeação pelo detentor do poder disciplinar, instruir o processo, proceder a todas as diligências convenientes para o apuramento dos factos em censura disciplinar, realizar todas as diligências de prova, por sua iniciativa ou por requerimento do arguido, propor a suspensão do processo disciplinar e elaborar o relatório final com conclusões e enquadramento de punição, já o Decisor Disciplinar, como superior hierárquico, identificado nos anexos i e ii do ED/PSP, compete-lhe instaurar procedimento disciplinar, julgar infrações, aplicar penas ou concessão de recompensa, arquivar processos ou inquéritos, nomear o Instrutor Disciplinar, titular do processo disciplinar, decidir sob proposta do Instrutor Disciplinar a suspensão do processo disciplinar e a sua decisão final.
p. Ora em momento algum o Instrutor Disciplinar é um decisor disciplinar, ou é portador do poder disciplinar, porque toda e qualquer decisão no âmbito de um processo disciplinar é tomada pelo titular desse direito, a quem a lei identificou que se encontra nos anexos i e ii do ED/PSP, e mais ninguém.
q. Aliás, esta distinção, pode no limite ser comparada, com aquela que opera na lei laboral – Código do Trabalho – onde o instrutor nomeado pela entidade patronal, pratica atos de instrução processual e disciplinar, mas não decisões de punição ou de arquivamento, esse poder disciplinar, cabe à entidade patronal.
r. Por isso, jamais, o Recorrente poderá aceitar este extravasar de competências legais por parte do Instrutor Disciplinar, ao anular uma acusação disciplinar, notificada ao Recorrente, cuja Defesa Escrita foi apresentada em prazo.
s. E muito menos poderá aceitar a “fundamentação” dada para a anulação ilegal da acusação disciplinar formulada em 18 de janeiro de 2022.
t. Com o devido respeito por entendimento contrário, o despacho proferido pelo Senhor Instrutor Disciplinar de 9 de março de 2021, está ferido de qualquer legalidade e legitimidade, colocando em causa princípios basilares do direito, como o princípio da boa-fé processual, o princípio da legalidade, e da confiança e segurança jurídica.
u. O princípio da boa-fé assume-se como um dos princípios gerais que servem de fundamento ao ordenamento jurídico.
v. Tal princípio apresenta-se como um dos limites da atividade discricionária da Administração.
w. Um dos corolários do princípio da boa-fé consiste no princípio da proteção da confiança legitima, incorporando a boa-fé o valor ético da confiança.
x. A exigência da proteção da confiança é também uma decorrência do princípio da segurança jurídica, imanente ao princípio do Estado de Direito.
y. O Tribunal a quo, compara, por alegada aplicação de norma subsidiária, que o Recorrente já demonstrou e fundamentou não ser de aplicar, as atribuições legais de um Instrutor Disciplinar e por analogia forçada as atribuições do Ministério Público, pelo menos no que concerne à titularidade do inquérito e competência legal para proferir acusação.
z. Por analogia e mera comparação não cabe, ao Ministério Público, após proferir despacho de acusação, notificá-lo ao arguido e demais partes civis e processuais, proceder à correção dos lapsos de que padeça a acusação e à integração de lacunas que a dita peça processual revele, uma vez que essa competência legal cabe ao Juiz de Instrução Criminal.
aa. As conclusões tiradas, sem o mínimo de fundamentação, que levaram o Tribunal a quo, a proferir decisão de improcedência, por alegado não preenchimento do requisito fumus boni iuris, decorrem apenas de uma adesão não justificada por parte do Tribunal a quo, às conclusões tiradas pelo Instrutor Disciplinar, que obtiveram mal e ilegalmente a chancela do detentor do poder disciplinar para a aplicação de uma pena de demissão, Sua Exa. o Ministro da Administração Interna.
bb. Pelo que, considera o Recorrente que, com a provável obtenção de provimento em Ação Principal, aos factos em crise e a sua correta submissão e enquadramento legal, se encontra preenchido o requisito fumus boni iuris, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 120.º do CPTA.
cc. Considerando o ora Recorrente, conforme demonstrou em petição inicial e conforme demonstra no presente recurso, os requisitos cumulativos para o decretamento da urgente suspensão do Despacho de Sua Exa. o Ministro da administração interna, de 23 de junho de 2022, que aplicou uma pena de Demissão
Nestes termos e nos melhores de direito, sempre com o Mui Douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser admitido e julgado procedente, por provado, e, em consequência, deverá ser revogada a Douta Sentença, ora recorrida.”

O aqui Recorrido/MAI veio a apresentar contra-alegações de Recurso em 7 de outubro de 2022, tendo concluído:
“I. O Recorrente, nas suas alegações de recurso, não demonstra, nem fundamenta nenhum vício que possa ser imputado à Douta Sentença, não logrando por em causa os seus fundamentos, encontrando-se a mesma devidamente fundamentada de facto e de direito;
II. A douta sentença foi minuciosa na recolha da matéria de facto constante do processo disciplinar, tendo procedido a uma rigorosa ponderação da matéria de facto, revelando conhecer com profundidade o direito aplicável;
III. Compulsados os autos, analisando-se da legalidade que estes comportam, é inequívoco que o ato administrativo punitivo ora sob escrutínio respeita a lei e o direito;
IV. No procedimento disciplinar foi produzida prova que consubstanciou a Acusação, o Relatório Final e a Decisão;
V. Estão provados, sem margem para dúvidas, os factos descritos na acusação, tendo o ora Recorrente, com a sua conduta, cometido uma infração disciplinar, prevista no artigo 3° do EDPSP, por violação dos Deveres de Obediência, previsto no artigo 14.°, n.°s 1 e 2, alínea a), de Assiduidade, previsto no artigo 17.°, n.°s 1 e 2, alínea a), de Pontualidade, previsto no artigo 18.° e de Aprumo, previsto no artigo 19.°, n.°s 1 e 2, alínea f), todos do EDPSP, com referência ao artigo 42.°, do Decreto-Lei n.° 243/2015, de 19 de outubro, que aprovou o Estatuto Profissional do Pessoal com Funções Policiais da Polícia de Segurança Pública, e que fundamentam a proposta de aplicação da pena disciplinar de DEMISSÃO, conforme prova recolhida nos autos, devidamente analisada no Relatório Final, que aqui se dá por integralmente reproduzido;
VI. Carece, em nosso entender, de razão, o argumento do ora Recorrente de que teria decorrido o prazo previsto para a instrução disciplinar, argumento, aliás, aduzido em sede de defesa disciplinar e que foi objeto de apreciação pelo Sr. Instrutor, conforme melhor se alcança do relatório final, de fls. 266 a 275 do processo, para o qual se remete;
VII. Na verdade, tendo o processo disciplinar sido autuado em 22 de maio de 2020, e tendo em consideração a regra da contagem dos prazos prevista no artigo 2.° da Lei n.° 37/2019, de 29 de maio, a instrução do processo decorreu dentro do prazo previsto no artigo 82.° do ED/PSP, considerando-se que, no âmbito do mesmo, o prazo de conclusão foi objeto de prorrogação, de acordo com o n.° 2 daquela disposição legal;
VIII. Também não merece acolhimento a argumentação da ilegalidade da anulação da primeira acusação e apresentação de nova acusação, não só pelas razões aduzidas no despacho de 08.04.2021 (fls. 247), mas também pelas aduzidas no relatório final (fls. 266 a 275);
IX. A questão da admissão de nova acusação em processo disciplinar tem sido admitida a nível jurisprudencial, desde que seja respeitado o direito de defesa do arguido, o que aconteceu no caso presente, encontrando- se esta questão há muito consolidada jurisprudencialmente. A título exemplificativo, cf. Acórdãos do STA n.° 029876, de 21.02.1995, n.° 031496, de 28.03.1996 e n.° 029875, de 11.12.1996;
X. Como resulta do processo, o arguido, ora Recorrente, foi sempre notificado, quer da primeira acusação, através do seu mandatário, pois o próprio não compareceu na Esquadra a que pertence para ser notificado (fls. 152 a 154 e 170 a 174), quer do despacho que determinou a anulação da primeira acusação (fls. 178, 179 e 202), quer da nova acusação (fls. 184 e 256);
XI. Mais resulta do processo disciplinar que o ora Recorrente exerceu o seu direito de defesa em relação à primeira acusação (fls. 163 a 169 do PA), apresentou reclamação do ato de anulação (fls. 184, 185, 199 e 200) e apresentou a sua defesa em relação à posterior acusação no processo disciplinar (fls. 203 a 246);
XII. Quer-se com isto dizer que resulta provado que não se verifica a violação do princípio do acusatório, tendo sido garantidos ao Requerente todos os direitos de defesa;
XIII. Reitera-se que no processo foi efetuada uma análise crítica de todos os elementos probatórios constantes dos autos, permitindo-se considerar provados os factos constantes da acusação mediante um raciocínio lógico, conforme às regras da experiência comum e do bom senso, desprovido de qualquer forma de arbitrariedade;
XIV. Os factos praticados pelo ora Recorrente enquadram-se na violação dos deveres de obediência, assiduidade, pontualidade e aprumo e fundamentam a aplicação da pena disciplinar de demissão, conforme prova recolhida nos autos e analisada em sede de relatório final. Os factos provados constituem infração disciplinar muito grave e são violadores dos deveres decorrentes da função policial, sendo o comportamento do arguido, na qualidade de agente de autoridade, indigno, para além de lesivo e ofensivo da imagem da PSP, quebrando irremediavelmente a relação de confiança entre a arguida e a Corporação e cuja gravidade é inviabilizadora da manutenção da relação laborai;
XV. Tais factos enquadram-se no disposto no artigo 23.° do ED/PSP e correspondem, necessariamente, a uma pena de natureza expulsiva, tanto mais que o ora Recorrente se ausentou, de forma ilegítima, do serviço por um período superior a 5 dias seguidos ou 10 interpolados;
XVI. Nestes termos, estabelece o artigo 23.°, n.° 2, alínea r), do EDPSP que “São suscetíveis de inviabilizar a manutenção da relação funcional, nomeadamente os seguintes comportamentos: Dar cinco faltas seguidas ou dez interpoladas, sem justificação”, sendo aplicável a pena disciplinar de demissão ou aposentação compulsiva;
XVII. Por outro lado, ficou demonstrada a inviabilização da manutenção da relação funcional uma vez que os factos praticados pelo Recorrente, para além de decorrentes da função policial, como se disse, são lesivos e ofensivos da imagem e do bom nome da Instituição;
XVIII. Na presente situação, como muito bem refere o Instrutor “(...) a violação do dever de assiduidade poderá não justificar por si só a aposentação compulsiva ou demissão, mas apenas quando tal violação for levada a cabo de forma manifestamente grave contudo, entende o Instrutor que “(...) é exatamente isso que aqui se verifica, pois o arguido, movido por questões respeitáveis com toda a certeza, sem dar qualquer explicação ou justificação aos seus superiores, decidiu não cumprir o que lhe foi determinado ou justificar as suas faltas acrescentando que “Um período tão alargado de faltas injustificadas e consecutivas é só por si uma violação grave do dever de assiduidade";
XIX, A nosso ver, e secundando a posição do Instrutor, a qual se encontra exemplarmente fundamentada, a conduta do arguido, ora Requerente, é efetivamente grave, pois, citando uma vez mais o Relatório Final “A desconsideração do arguido pela sua obrigação de comparecer nos serviços clínicos, conforme lhe foi determinado, aqui refletida gravemente num período de tempo alargado e durante o qual a instituição desconhecia, por vontade do próprio, as circunstâncias das suas faltas, colocam-no numa posição inconciliável com as regras comportamentais exigíveis a qualquer elemento que quer continuar a pertencer a esta polícia”]
XX. Nesta conformidade, a pena de demissão prevista nos artigos 23.°, n.°s 1 e 2, alínea r), 30.°, n.° 1, alínea f) e 36°, todos do Estatuto Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (EDPSP), aprovado pela Lei n.° 37/2019, de 30 de maio, revela-se adequada à gravidade das infrações disciplinares, cometidas com elevado grau de culpa, pondo em causa o prestígio e o bom nome da instituição, inviabilizando a manutenção da relação funcional;
XXI. Deste modo se conclui pela não existência da “aparência do bom direito’’, não se verificando o preenchimento do critério do “fumus bonus iuris”, já que ficou inequivocamente provado, tanto através da prova recolhida nos autos que os factos descritos na acusação foram praticados com elevado grau de culpa, revelando um comportamento doloso, donde resultaram prejuízos elevados para o serviço;
XXII. O requisito periculum in mora não se mostra evidenciado, uma vez que não se vislumbra a existência de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Recorrente visa assegurar no processo principal, uma vez que na mera hipótese académica de vir a ser dado provimento à ação principal, o que em caso algum se concede, os eventuais prejuízos são facilmente contabilizáveis, podendo o Recorrente ver repostos todos montantes remuneratórios de que se tenha visto privado;
XXIII. No que respeita à diminuição de rendimentos do agregado familiar do ora Recorrente, para além de se traduzir numa inevitabilidade, convirá assinalar que, ainda assim, tal como o Recorrente expressamente admite, a sua companheira aufere um rendimento decorrente do seu trabalho, acrescendo ainda que o próprio Recorrente não está impedido de exercer outra atividade profissional, compatível com a sua situação clínica, de forma a contribuir para a economia familiar e garantir a sua subsistência;
XXIV. Tendo em conta o n.° 2 do artigo 120.° do CPTA, que impõe uma ponderação “(...) dos interesses públicos e privados (...)” verifica-se que aqueles primeiros interesses ficariam gravemente lesados pelo eventual deferimento da providência cautelar;
XXV. O grau de censurabilidade dos factos imputados ao ora Recorrente assume, em geral importância elevada, não só pelo sucessivo desrespeito de normas relativas à justificação de faltas, mas também pela ausência continua ao serviço demonstrando um claro e grave incumprimento de deveres funcionais, sendo as infrações praticadas pelo arguido claramente inviabilizadoras da manutenção da relação funcional e não permitem que este possa ter qualquer vínculo à PSP;
XXVI. Acrescenta-se ainda, na esteira da melhor jurisprudência, que “...quando as condutas infracionárias atingem uma gravidade tal que das mesmas resulta não ter sido o funcionário capaz de se adaptar ao serviço e de interiorizar, responsavelmente, as suas funções a lei prevê a pena de demissão ou aposentação compulsiva (pena expulsiva) com o afastamento do funcionário que desse modo se revelou inadaptado às funções e, por isso, não merecedor da confiança eu os cidadãos e a Administração nele depositaram, a Administração que assim se vê livre de quem se revelou, pela sua conduta, não merecer pertencer-lhe...’*',
XXVII. Com a sua atuação o arguido, ora Recorrente, colocou em causa o prestígio da corporação (PSP) e do Estado Português, resultando prejuízos elevados para o serviço, mostrando-se indigno do cargo que desempenha, levando a uma perda da confiança necessária ao exercício de funções policiais que lhe estão atribuídas;
XXVIII. Destacamos ainda que a pena disciplinar de Demissão foi sufragada pela unanimidade dos membros do Conselho de Deontologia e Disciplina (CDD), em reunião realizada em 29 de novembro de 2021, na medida em que os efeitos da conduta do ora Recorrente se repercutem na própria Corporação;
XXIX. O decretamento da providência cautelar implicaria que a suspensão da execução da punição aplicada ao agente redundaria em grave prejuízo para o interesse público, traduzido em nefastos efeitos ao nível da disciplina e do espírito de corpo, princípios nobres e basilares de uma Força de Segurança, caracterizada pela exigência e máximo rigor na conduta dos seus elementos, como é o caso da PSP;
XXX. A suspensão de eficácia do despacho punitivo proferido pelo Senhor Ministro, no uso das suas competências exclusivas, em 23 de junho de 2022, em consequência do decretamento da presente providência cautelar, resultaria grave prejuízo ao interesse público, pelo dano que causaria à disciplina e ao espírito de corpo, enquanto alicerces éticos fundamentais de uma Força de Segurança como é a PSP;
XXXI. Face ao exposto, consideramos que não se encontram reunidos os requisitos legais estabelecidos nos n.°s 1 e 2 do art.° 120.° do CPTA, para que a presente Providência Cautelar possa ser procedente;
XXXII. Desde logo face à inexistência de invalidades no procedimento disciplinar e porque o despacho proferido pelo Senhor Ministro da Administração Interna, não padece de qualquer vício, encontrando-se plenamente fundamentado, tendo, do ponto de vista da qualificação jurídica a pena disciplinar decidida aplicar ao visado, ter por fonte os fundamentos constantes quer no Relatório Final, quer no Parecer do Conselho de Deontologia e Disciplina da Polícia de Segurança Pública, constante da Ata da reunião de 29 de novembro de 2021, quer no despacho do Senhor Diretor Nacional da PSP de 17 de dezembro de 2021, no Parecer n.° 102- PM/2022, da Direção de Serviços de Assessoria Jurídica, Contencioso e Política Legislativa e na Informação n.° 00113/FRM, de 23 de junho de 2022, do Gabinete de Sua Excelência o Ministro da Administração Interna que sustenta o despacho que determinou a aplicação da pena disciplinar de demissão;
XXXIII. Nesta conformidade, entende o Ministério que a douta sentença recorrida revelou profundo conhecimento dos factos constantes do processo disciplinar e procedeu a uma cuidada aplicação do direito, devendo por isso ser mantida na ordem jurídica pelo Tribunal Central.
Termos em que, nos melhores de direito e com o mui douto suprimento de vossas excelências, deve ser julgado improcedente este recurso, por não se verificarem os vícios assinalados pelo recorrente, e, em consequência, deverá ser mantida a, aliás, douta sentença ora recorrida, o que se pede por ser de justiça.”
O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por Despacho de 10 de outubro de 2022.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 13 de outubro de 2022, veio a emitir Parecer no mesmo dia, no qual se pronuncia no sentido de dever “manter-se o julgado, por a decisão sob recurso não padecer de quaisquer vícios, nomeadamente os que lhe vêm imputados”.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita, designadamente, que a decisão proferida, enferma de erro nos pressupostos de direito, mais se considerando que terá sido cometido erro de direito na apreciação, valoração e concretização do fumus boni iuris.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade provada:
“1. Em 20.11.1996 o Requerente foi incorporado na função pública e alistado na Polícia de Segurança Pública (PSP) (cf. nota de fls. 13 verso do processo instrutor);
2. Em 09.11.2005 o Requerente foi punido com uma pena de repreensão escrita (cf. nota de fls. 14 verso do processo instrutor);
3. Do registo biográfico do Requerente constam, com relevo, as seguintes menções a ocorrências extraordinárias (cf. nota de fls. 32 e seguintes do processo instrutor):
“(…)
2001 - No NDD/COMETLIS, está a ser organizado o Processo de Sanidade n.º 2001LSB00264SAN. OSCML: 139, de 22-08.
2004- Por despacho de 15Mar04, foi considerado como tendo ocorrido em serviço, o acidente de que foi vítima em 22Mai01. Esteve com baixa por motivo do acidente 212 dias. Proc. n.º 2001LSB00264SAN. OSCML: 63, de 31-03.
2007 - No NDD/COMETLIS, está a ser organizado o Processo de Sanidade n.º 2007LSB00321SAN. OSCML:121, de 27-06.
2008 - Por despacho de 21Jan08, foi considerado como tendo ocorrido em serviço, o acidente de que foi vítima em 25Mai07. Esteve com baixa por motivo do acidente 4 dias. - Proc. n.º 2007LSB00321SAN. OSCML: 39, de 26-02.
2009 - No NDD/COMETLIS, está a ser organizado o Processo de Sanidade n.º 2009LSB00293SAN. OSCML: 136, de 17-07.
2010 - Por despacho de 29Abr10, foi considerado como tendo ocorrido em serviço, o acidente de que foi vítima em 14Jun09. Não mudou de situação. - Proc. N.º 2009LSB00293SAN. OSCML: 107, de 07-06.
2010 - No NDD/COMETLIS, está a ser organizado o Processo de Sanidade n.º 2010LSB00301SAN. OSCML: 139, de 22-07.
2010 - Faltou à Junta de Saúde do COMETLIS, reunida em 220ut10. OSCML: 211, de 03-11.
2011 - A Junta de Saúde do COMETLIS, reunida em07Jan11, concedeu-lhe 60 dias de serviços moderados internos, com início em 10Jan2011. OSCML: 17, de
2011 - A Junta de Saúde reunida em 18Mar11 atribuiu 60 dias de serviços moderados internos com inicio em 10Mar2011.
(…)
2011 - A Junta de Saúde do COMETLIS, reunida em 13Mai11, concedeu-lhe 60 dias de serviços moderados, internos, com início em 10Mai11. OSCML: 105, de 01-06.
2011 - Por despacho de 04Ago11, do Comandante em Substituição do COMETLIS, o Processo de Sanidade n.º 2010LSB00301SAN, foi considerado Acidente de Trabalho. Of.º n.º 10223/SAL7/2011, de 05Ago11. OSCML: 154, de 12-08.
2011 - A Junta Superior de Saúde, reunida em 180ut11, concedeu 1095 dias de serviços moderados internos, com início em 09Jul11. Findos os quais volta àquela Junta. OSCML: 204, de 25-10.
2012 - No NDD/COMETLIS, está a ser organizado o Processo de Sanidade com o seguinte número: N.º 2012LSB00219SAN. OSCML: 99, de 22-05.
2012 - A Junta de Saúde do Cometlis, reunida em 15Jun2012, decidiu que Retoma verba da Junta Superior de 18Out2011 - SMI. OSCML: 129, de 05-07.
2013 - No NDD/COMETLIS, está a ser organizado o Processo de Sanidade com o n.º 2013LSB00259SAN. OSCML; 113, de 14-06.
2013- Por despacho de 20set13, foi considerado como tendo ocorrido em serviço, o acidente de que foi vítima em 20nov2012. Esteve com baixa por motivo do acidente 3 dias. Proc. n.º 2013LSB00259SAN. OSCML: 218, de 11-11
(…)
2015 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 20fev2015, atribuiu 30 dias de Licença de Tratamento com início em 05fev2015 - Existe Nexo Causal com A/T em 20nov2012. OSCML: 50, de 12/03.
2015 - A Junta Superior de Saúde, reunida em 14abr2015, emitiu a seguinte decisão: Serviços moderados internos por 730 dias com inicio em 08jul2014, findos os quais volta a esta junta, OSCML:83, de 29-04.
2015 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 08mai2015, atribuiu 30 dias de Licença de Tratamento com início em 06mai2015 - A/T em 20nov2012. OSCML: 103, de 28/05.
2015 - A Junta de Saúde do COMETLIS, reunida em 05 de Junho de 2015, concedeu 30 dias LT, com inicio em 05jun2015 - A/T em 20NOV2012 OSCML: 126, de 01-07.
2015 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 03jul2015, atribuiu 30 dias de Licença de Tratamento com início em 05jul2015 - A/T em 20nov2012. OSCML: 136, de 15-07.
2015 - FALTOU à Junta de Saúde do COMETLIS, reunida em 14 de agosto de 2015. OSCML: 169, de 31-08.
2015 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 28ago2015, atribuiu 60 dias de Licença de Tratamento com início em 04ago2015 - Tem Nexo Causal c/ A/T em 20nov2012 - Reabertura. OSCML: 176, de 09-09.
2015 - Por despacho de 11set2015 do Comandante do COMETLIS deferiu o requerimento apresentado e ordenou a reabertura do Proc.º 2013LSB00259SAN, já considerado como acidente de trabalho. OSCML: 192, de 01-10.
2015 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 02out2015, atribuiu 45 dias de Licença de Tratamento com início em 03out2015 - A/T em 20nov2012 Reabertura - Despacho 03/CG/91 4.4.2. OSCML: 209, de 26-10.
2015 / A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 13nov2015, considerou-o - CURADO c/ IPP de 7% de A/T em 13ABR2012. OSCML: 23 6, de 02-12.
2015 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 27nov2015, atribuiu 45 dias de Licença de Tratamento com início em 17nov2015 - A/T em 20nov2012 Reabertura. OSCML: 247, de 18-12.
2016 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 08Jan2016, atribuiu 30 dias de licença para tratamento com início em 01Jan2016. A/T em 20nov2012 Reabertura. OSCML: 22, de 02-02.
2016 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 05Fevl6, atribuiu 60 dias de licença para tratamento com início em 31Jan2016. A/T em 20nov2012 Reabertura. OSCML:43, de 03-03.
2016 - A Junta de Saúde do COMETLIS, reunida em 01abr2016, concedeu 60 dias Licença tratamento, com inicio em 31mar2016 - A/T em 20nov2012 Reabertura. OSCML:76, de 20-04.
2016 - A Junta Superior de Saúde reunida em 24mai2016, emitiu a seguinte decisão: «Apreciação médica. Solicita-se RMN do ombro direito». OSCML: 114, de 17-06.
2016 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 17jun2016, atribuiu 60 dias de Licença para Tratamento com início em 30mai2016 de A/T em 20nov2012 - Reabertura. OSCML: 132, de 13-07.
2016 - A Junta Superior de Saúde, reunida em 23ago2016, emitiu a seguinte decisão: «Apreciação de nexo causal. A junta médica, face â documentação clínica do processo e ao mecanismo da lesão, aceita por unanimidade o nexo de causalidade. Aceita as rubricas orçamentais 3090 e 3170 e exclui as restantes. GDH 315; Nível de severidade 1». OSCML: 175, de 13-09.
2016 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 12ago2016, atribuiu 60 dias de Licença para Tratamento com início em 29Jull6. A/T em 20nov2012 Reabertura - (ITA) - Aguarda autorização para Cirurgia. OSCML:188, de 30-09.
2017 - A Junta de Saúde do COMETLIS, reunida em 07out2016, concedeu-lhe 15 dias LT com inicio a 27set2016 - A/T em 20NOV2012 - Reabertura - (ITA) - Aguarda autorização para Cirurgia. OSCML:47, de 07-03.
2017 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 210ut2016 - Atribuiu 60 dias de licença para tratamento com início em 120ut2016. A/T em 20NOV2012 Reabertura - (ITA) - Aguarda Autorização para Cirurgia.OSCML:52, de 15-03
2017 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 16Dez2016 - Atribuiu 20 dias de licença para tratamento com início em 11Dez2016. A/T em 20NOV2012 Reabertura - (ITA) - Aguarda Autorização para Cirurgia. OSCML: 82, de 28-04.
2017 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 06jan2017, atribuiu 30 dias de Licença de Tratamento com início em 31Dec2016. A/T em 20nov2012 Reabertura - (ITA). OSCML: 98, de 24-05.
2017 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 03fev2017, atribuiu 60 dias de Licença de Tratamento com início em 30jan2017 - A/T em 20nov2012 - (ITA) Aguarda autorização administrativa de cirurgia. OSCML: 112, de 14-06.
2017 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 07Abrl7, atribuiu 60 dias de Licença para tratamento com inicio em 31Mar17. A/T em 20nov2012 Reabertura - (ITA) - Aguarda autorização administrativa de cirurgia - Seja presente â JSS/Avaliação. OSCML: 135, de 18-07.
2017 - A Junta Superior de Saúde, reunida em 03out2017, emitiu, a seguinte decisão: «Incapacidade temporária parcial por 120 dias com início em 04out2017, findos os quais volta a esta Junta. Incapacidade temporária absoluta de 127 dias desde 30mai2017. Aguarda cirurgia pelo SNS (Acidente em 20nov2012). OSCML: 220, de 17-11.
2018 – A Junta Superior de Saúde, reunida em 21nov2017, emitiu a seguinte decisão: «Serviços moderados internos por 365 dias com início em 22nov2017, findos os quais volta a esta Junta. Regularizo em serviços moderados internos o período de 07jul2016 a 21nov2017». OSCML: 12, de 17-01,
2018 – A Junta Superior de Saúde, reunida em 06fev2018, emitiu a seguinte decisão: «Incapacidade temporária parcial por 90 dias com inicio em 01fev2018, findos os quais volta a esta Junta. Aguarda cirurgia pelo SNS. (Acidente em 20nov2012)». OSCML: 49, de 12-03.
2018 - A Junta de Saúde do COMETLIS reunida em 04mai2018, atribuiu 32 dias de Licença para Tratamento com início em 03abr2018. A/T em 20nov2012 (ITA) - Reabertura - Verificação de Patologia - Seja presente Urgente à JSS, p/lncumprimento da verba. OSCML: 115, de 19-06.
2018 – A Junta Superior de Saúde, reunida em 29mai2018, emitiu a seguinte
decisão: «Incapacidade temporária absoluta de 180 dias com inicio em 05mai2018, findos os quais volta a esta junta. Aguarda cirurgia pelo SNS». OSCML: 120, de 26-06.
2018 - Por despacho de 16out2018, não foi considerado como acidente de trabalho, o acidente ocorrido em 13abr2012 (Proc. 2012LSB00219SAN). OSCML: 210, de 02-11.
2018 - A Junta Superior de Saúde, reunida em 30out2018, emitiu a seguinte decisão: «Curado sem desvalorização. Sem sequelas do acidente de 02jun2010. Curado sem desvalorização.» OSCML: 235, de 07-12.
2018 - A JSS, reunida em 13nov2018, emitiu a seguinte decisão: Incapacidade temporária parcial por 40 dias com inicio em 14nov2018, findos os quais volta a esta Junta. Aguarda cirurgia ao nível do privado, segundo refere, durante o mês de dezembro de 2018. Não tem incapacidade total podendo fazer trabalho administrativo. Incapacidade temporária absoluta de 13 dias desde 01nov2018. Acidente em 20nov2012. OSCML: 247, de 27-12.
2019 – A Junta de Saúde do COMETLIS, reunida em 08jan2019, emitiu ao elemento policial – P….., ….8, da 2.ª Divisão, «Lesão a estabilizada com IPP de 8,00%, Cap. I 3.2.7.3. b) . Serviços compatíveis com a situação clinica. Evitar esforços com o membro superior direito.
Concedida incapacidade temporária parcial de 14 dias desde 14nov2018. Concedida incapacidade temporária absoluta de 40 dias desde 29nov2018. Acidente em 20nov2012». OSCML: 28, de 08-02.
(…)
2019 - Pela Junta de Saúde do COMETLIS reunida 06set2019, atribuiu: 60 dias de LT/ITA, em 18jul2019. A/T em 20NOV2012 - (ITA) - Reabertura - Verificação de Patologia - Seja presente â JSS / Avaliação de Nexo Causal. OSCML: 191, de 07/10.
2020 - A Junta de Saúde do COMETLIS, reunida em 15MAR2020, com início 20Mar2020, FALTOU OSCML:84, de 30/04.
(…)”.
4. Em 17.02.2020 o Serviço de Saúde do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP solicitou a notificação do Requerente para estar presente na junta médica do Comando no dia 06.03.2020 (cf. correio de fls. 3 do processo instrutor);
5. Em 18.02.2020 o Comando Metropolitano de Lisboa da PSP recebeu e-mail com o assunto Não entregue e com a mensagem ―Falha na entrega a estes destinatários ou grupos: P.... (p…….). A caixa de correio do destinatário está cheia e não pode aceitar mais mensagens neste momento. (…)‖ (cf. correio de fls. 6 do processo instrutor);
6. Em 04.03.2020 o Comando Metropolitano de Lisboa da PSP informou o Serviço de Saúde do Comando da impossibilidade de contactar o Requerente no sentido de lhe comunicar o referido em 4., inclusivamente através de chamadas para o seu contacto pessoal (correio de fls. 4 e 5 do processo instrutor);
7. Em 05.03.2020 foi publicada a Ordem de Serviço n.º 45 da PSP de Lisboa, relativa à Junta de Saúde do Serviço de Saúde do Comando Metropolitano, daí constando como elemento a convocar à Junta de Saúde do dia 06.03.2020 o Requerente (cf. ordem de fls. 12 do processo instrutor);
8. Em 12.03.2020 o Serviço de Saúde do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP solicitou informação sobre a falta do Requerente à junta médica do Comando reunida em 06.03.2020, mais solicitando a sua notificação para estar presente em junta médica de 20.03.2020 (cf. correio de fls. 2 do processo instrutor);
9. Em 16.03.2020 a PSP instaurou contra o Requerente o processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS, sendo o resumo da ocorrência ―Em 06set2019, o arguido foi presente à Junta Médica do COMETLIS e a partir dessa data, por manifesto incumprimento do determinado, nomeadamente, não se ter apresentado no Posto Clínico a que pertence de 10 em 10 dias, não comparência, nos dias 06 e 20mar2020, às Juntas Médicas desta Polícia agendadas, mantendo-se incontactável e inviabilizando dessa forma as notificações respetivas, colocou-se em ausência ilegítima‖ (cf. auto de fls. 1 do processo instrutor);
10. Em 25.05.2020 o instrutor do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS emitiu mandado de notificação do Requerente, para efeitos de o informar que ―lhe está a ser organizado o Processo Disciplinar sob o NUP 2020 LSB00114DIS, que teve início em 22mai2020, devendo considerar-se arguido a partir desta data‖, e ainda de que ―poderá constituir advogado, fazer-se assistir por ele em qualquer fase do processo, requerendo diligências e ser ouvido‖ (cf. mandado de fls. 22 do processo instrutor);
11. Em 25.05.2020 o instrutor do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS solicitou ao Comandante da 2.ª Divisão Policial do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP informações sobre a “conduta moral e profissional” do Requerente, bem como sobre “a sua situação em relação ao serviço no dia 06 DE MARÇO DE 2020” (cf. ofício de fls. 10 do processo instrutor);
12. Em 19.06.2020 o Núcleo de Saúde do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP elaborou informação na qual pode ler-se, com relevo, o seguinte (cf. informação de fls. 35 e seguintes do processo instrutor):
“(…) 1. O Agente Principal M/ 1… P...., do efetivo da 2.ª Divisão do Cometlis, começou a ser seguido, pela Junta Médica do Cometlis a 05FEV2015, no regime de (ITA) Incapacidade Temporária Absoluta (Acidente de Trabalho)
2. A situação referida, acontece, após 15 dias de baixa e por força da reabertura do Acidente de Trabalho ocorrido a 20NOV2012.
3. No âmbito deste processo, o mesmo foi acompanhado, tanto pela Junta Médica do Cometlis, bem como a Junta Superior de Saúde, na qual já era seguido, por outras patologias.
4. Sempre que lhe foi atribuída, (ITP) Incapacidade Temporária Parcial/Serviços Moderados, a mesma nunca foi cumprida, na íntegra, tendo sempre metido outro tipo de licenças e faltas, seguidas de parte de doente, nunca se apresentando ao serviço.
5. A 08JAN2019, foi presente á Junta Superior de Saúde, a qual encerrou o processo clínico, com a verba «Lesão estabilizada c/ IPP 8% - Serviços compatíveis com a situação, devendo evitar esforços com Membro Superior Direito.»
6. A duração deste processo, iniciou a 05FEV2015, e culminou a 08JAN2019, cerca de 41 meses.
7. Dado a verba atribuída, dever ter-se-ia, apresentado ao serviço, apenas com a limitação, referente ao Membro Superior Direito.
8. Nesse mesmo dia apresentou novo Certificado de Incapacidade Temporária (20 dias), o qual nunca chegou a este Núcleo, que apenas soube e teve conhecimento, após consulta do GIV&RH.
9. A 30ABR2019, após o gozo de outras licenças e faltas, voltou a apresentar Certificados de Incapacidade Temporária, por Acidente em Serviço.
10. Face à situação foi solicitada a sua presença na Junta Médica de 06SET2019, para análise e continuação da situação reportada/indicada.
11. A Junta Médica a 06SET2019, verificou tratar-se do mesmo Acidente de Trabalho, concluído a 08JAN2019, pelo que foi enviado à Junta Superior de Saúde, para avaliação do Nexo de Causalidade, entre a baixa e o Acidente.
12. Nesse mesmo dia, 06SET2019, conforme Circular 1238/DEPSAD de 05MAI01, foi notificado para comparecer no Posto Clínico a que pertence de 10 em 10 dias, após 15SET2019, o que até à presente data não aconteceu.
13. A 14NOV2019, com o Ofº. Nº. 9451/DSAD/2019, de 08/11/2019, foi devolvido o processo a este Núcleo, pelo, DSAD, com a indicação que não era justificável a presença do elemento em questão, á JSS, para Nexo Causal, em virtude do processo do ponto de vista clínico já se encontrar encerrado com IPP de 8%, desde 08JAN2019,
14. Face ao descrito no ponto anterior, e por despacho da Exmª. Srª. Comandante em Substituição, Superintendente V.... a 02DEZ2019, foi enviado ofício ao NDD, para notificação do elemento no âmbito do processo de sanidade, e a este Núcleo para proceder em conformidade.
15. Nessa sequência e dado que a continuação da baixa, teria que ser no âmbito de Doença Natural e não por Acidente em Serviço, foi solicitada a convocação através de mail datado de 17/02/20, para ser presente á Junta Médica de 06MAR2020.
16 A 04MAR2020, a 2ª. Divisão informa não ser possível contactar o elemento e a 3ª. Divisão (área da residência), também informa das diligências efetuadas no sentido da notificação.
17. A 06MAR200 o mesmo não compareceu na Junta Médica.
18. Dada a não comparência, a 12MAR2020, foi solicitada à Divisão Policial, informação/justificação, da falta e ainda convocação de nova data para ser presente 20MAR2020 à Junta Médica.
19. A 20MAR2020 voltou a não comparecer na Junta Médica.
20. Novamente a 24MAR2020, foi solicitada nova informação/justificação á Divisão, da não comparência.
“(…) - Em resumo verifica-se que sempre houve intenção do Agente Principal P.... de não se apresentar ao serviço, dado que não o fez quando lhe era atribuída Incapacidade Temporária Parcial (ITP), vulgo Serviços Moderados, nem quando o processo clinico foi encerrado.
- Da análise do processo não consta que o Agente Principal P.... tenha solicitado, junto deste Cometlis, qualquer apresentação à Junta Médica da CGA, IP.
- As competências das Juntas Médicas da Policia de Segurança Pública encontram-se esgotadas, em virtude do tempo de ausência ao serviço por motivo acidente de trabalho do Agente Principal P.... ultrapassar 18 meses previstos no Art.º 25 da LGTFP. No entanto e neste caso em concreto (Acidente de Trabalho), o Decreto-Lei 503/99 no seu Art.º 20, prevê 36 meses.
- No que respeita às faltas de comparência, do autor à Junta Médica do Cometlis, a 2.ª Divisão Policial, bem como a 3.ª, por solicitação deste Núcleo efetuaram, diversas diligências para o notificar na sua residência, bem como designadamente, por via eletrónica, nunca tendo o autor comparecido às Juntas Médicas, por sua culpa exclusiva, tendo em consideração o clausulado do n.º 5 do artigo 1° do Decreto-Lei n.º 299/2009, de 14 de Outubro, que estabelece, «O pessoal policial é obrigado a comunicar e a manter permanentemente atualizado o loca! da sua residência habitual e as formas de contacto». (…)”
13. Em 26.06.2020 o Comandante em exercício da 34.ª Esquadra do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP emitiu, no âmbito do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS, a seguinte informação (cf. informação de fls. 25 e seguintes do processo instrutor):
“(…) Foram efetuadas as diligências possíveis para tentar o contacto com o Agente Principal P…., quer através de várias tentativas de chamada para o número de telemóvel conhecido desse (966466396), o qual dá sinal de chamada, mas nunca é atendido, quer através de envio de email via Institucional, obtendo-se resposta automática de que a Caixa de correio do elemento se encontra cheia.
Informo ainda que, apesar de existir informação no passado de que o Agente Principal P..., se encontraria em mudanças da sua residência conhecida na zona de Lisboa, foi solicitado à 41ª Esquadra - Bairro da Cruz Vermelha, diligências junto da morada Ru…n°…., 1750-428 Lisboa. Diligências efetuadas, e contactados alguns dos moradores, foi possível apurar que o elemento já não é visto no local há bastante tempo, encontrando-se o apartamento em obras, e ao que indica estará para venda através da Empresa «R….. ».
Em conclusão e pelo atrás descrito, não foi possível proceder à Notificação do Agente Principal P.....
Em resposta ao pedido de informação da conduta moral e profissional do Agente P...., começar por informar que, desde que assumi as funções de Adjunto ao Comandante da 34ª Esquadra, que o elemento policial, à exceção de escassos dias, esteve sempre na situação de Baixa Médica, pelo que nesse contexto, me é difícil pronunciar relativo à conduta moral e profissional desse, pois o contacto pessoal e presencial foi praticamente inexistente.
Ainda assim, dos dados que possuo, nomeadamente relativo às tentativas de contacto com esse, o mesmo nunca mostrou disponibilidade para atender as várias tentativas de contacto telefónico por parte da Esquadra, nem fez por manter a caixa de correio institucional limpa, por forma a poder ser contactado por essa via. Em suma e neste campo, o Agente Principal P.... nunca mostrou disponibilidade para o serviço. (…)”
14. Em 26.06.2020 o Comando Metropolitano de Lisboa da PSP informou o Núcleo de Deontologia e Disciplina da impossibilidade de entrar em contacto com o Requerente “quer telefonicamente, quer eletronicamente” (cf. correio de fls. 21 do processo instrutor);
15. Em 09.07.2020 o Chefe do Núcleo de Deontologia e Disciplina da PSP determinou que o Requerente fosse considerado em ausência ilegítima desde 07.09.2019, informando o seguinte (cf. informação de fls. 59 do processo instrutor):
“(…) Para os devidos efeitos, informo V. Exª. que o Agente Principal M/145298, P...., do efetivo da 2ª. Divisão, deste Comando, entre 05fev2015 e 08jan2019, esteve incapacitado para o serviço (reabertura de processo de acidente de trabalho de 2012) e foi seguido pela Junta Médica do COMETLIS e pela Junta Superior de Saúde, desta Polícia.
Findo o referido período, deveria ter-se apresentado ao serviço, o que não aconteceu e manteve-se ausente, por baixa médica, outras licenças e faltas, acabando por ser presente à Junta Médica deste Comando em 06set2019.
Após a data referida no parágrafo anterior - 06set2019, entre outras exigências legais que não cumpriu, verificou-se o manifesto incumprimento por parte do referido elemento policial do que lhe foi determinado, nomeadamente, não se ter apresentado no Posto Clínico a que pertence de 10 em 10 dias, não comparência nas Juntas Médicas subsequentes, mantendo-se incontactável e furtando-se às notificações respetivas. (…)”
16. Em 09.07.2020 foi apensado ao processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS o processo disciplinar n.º 2020LSB00218DIS, instaurado pela seguinte ocorrência (cf. despachos e proposta de fls. 31 e seguintes do processo instrutor):
“(…) Entre 05fev2015 e 08jan2019, associado à reabertura de um processo de acidente de trabalho, o arguido esteve incapacitado para o serviço e foi seguido pela Junta Médica do COMETLIS e pela Junta Superior de Saúde, desta Polícia e, findo esse período, deveria ter-se apresentado ao. serviço, embora com limitações, mas manteve-se ausente, por baixa médica, outras licenças e faltas, acabando por ser presente à referida Junta Médica em 06set2019 e a partir dessa data, por manifesto incumprimento do determinado, nomeadamente, não se ter apresentado no Posto Clínico a que pertence de 10 em 10 dias, não comparência às Juntas Médicas desta Polícia, por se manter completamente incontactável, furtando-se dessa forma às notificações respetivas, colocou-se em ausência ilegítima. (…)”
17. Em 16.07.2020 foi publicada a ordem de serviço n.º 136 da PSP de Lisboa, no âmbito da qual se fez constar que o Requerente se encontra na situação de ausência ilegítima ao serviço desde 07.09.2019 (cf. ordem de fls. 64 do processo instrutor);
18. Em 21.08.2020 o Comandante da 34.ª Esquadra do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP emitiu certidão negativa de notificação do Requerente no âmbito do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS, “em virtude do visado não ter comparecido neste Departamento Policial para o efeito‖, mais daí fazendo constar que ―após várias insistências e não se ter conseguido contactar com o requisitado, quer presencialmente, quer por via telefónica, no dia 20-08-2020, pelas 09h30, foi possível entrar em contacto telefónico com o visado, sendo esse colocado ao corrente da existência da presente notificação, tendo o mesmo se comprometido em comparecer neste Departamento Policial, afim de ser notificado, o que acabou por não acontecer, nem tendo sido dada qualquer justificação para o efeito” (cf. certidão de fls. 68 do processo instrutor);
19. Em 11.09.2020 o Comandante Metropolitano de Lisboa aplicou ao Requerente, no âmbito do processo disciplinar n.º 2018LSB00027DIS, a pena de cinco dias de suspensão (cf. notificação de fls. 148 do processo instrutor);
20. Em 16.09.2020 o instrutor do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS emitiu mandado de notificação do Requerente do seguinte (cf. mandado de fls. 72 do processo instrutor):
“(…) Por despacho do Exmo. Senhor Comandante Metropolitano, de 16mar2020, foi-lhe mandado organizar o Processo Disciplinar sob o NUP 2020LSB00114DIS, que teve início em 22mai2020.
Por despacho do Exmo. Senhor Comandante Metropolitano, de 29jun2020, foi-lhe mandado organizar o Processo Disciplinar sob o NUP 2020LSB00218DIS, que teve início em 08ju 12020.
Por despacho da mesma Entidade, de 08jul2020, exarado na sequência de uma Informação/Proposta que elaborei na qualidade de Instrutor dos dois processos referenciados, procedeu-se à sua APENSAÇÃO do que resultou que o último dos processos acima referidos perdeu a sua autonomia e que passou a subsistir um só processo - NUP 2020LSB00114DIS, no qual o notificado se deve considerar arguido a partir desta data e no seu âmbito serão analisados todos os factos.
Mais se notifica que, na qualidade de arguido, poderá constituir advogado, fazer-se assistir por ele em qualquer fase do processo, requerendo diligências e ser ouvido, nos termos dos artigos 73.º, n.º 1, e 83.º, n.ºs 2 e 4, do EDPSP.
Notifica-se ainda, na qualidade de arguido, para no dia 02 de SETEMBRO de 2020 às 10H30, comparecer no Núcleo de Deontologia e Disciplina do COMETLIS (Sala 15), sito na Avenida de Moscavide nº 88, Piso 2, 1886-502, Moscavide, a fim de ser interrogado no âmbito do referido processo disciplinar, podendo fazer-se acompanhar de advogado nomeado ou a nomear no ato.
Notifica-se também, que a falta de comparência não justificada do arguido, nos termos da lei, faz incorrer o seu autor em responsabilidade disciplinar (art.º 66.º, n.º 3 do EDPSP). Em caso de impossibilidade de comparecer no dia e hora indicados, tal deve ser comunicada com cinco (5) dias de antecedência, se for previsível, ou, no próprio dia e hora designados para a prática do ato, se for imprevisível. Da comunicação deve constar, sob pena de não justificação da falta, a indicação do respetivo motivo, local onde o faltoso pode ser encontrado e da duração previsível do impedimento (art.º 117.º n.º 2 do CPP). (…)”
21. Em 18.09.2020 o Requerente dirigiu ao Comando Metropolitano de Lisboa da PSP, através do seu mandatário, requerimento de alteração da data do interrogatório agendado para 23.09.2020 no âmbito do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS, ”fruto do impedimento do seu mandatário, por encontrar-se em diligências profissionais fora da área metropolitana de Lisboa‖, propondo como datas alternativas os dias 09.10.2020 e 13.10.2020” (cf. requerimento de fls. 73 e seguintes do processo instrutor);
22. Em 22.09.2020 o instrutor do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS indeferiu o requerido em 21., “por motivos essencialmente processuais, colocando em causa os prazos estabelecidos na instrução do processo” (cf. despacho de fls. 73 do processo instrutor);
23. Em 23.09.2020 o Requerente foi ouvido em interrogatório no âmbito do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS, tendo-lhe sido tomadas declarações no sentido de que “Relativamente aos factos e como a matéria se reveste de alguma complexidade, não pretende prestar declarações, porque não lhe foi dada a possibilidade de estar acompanhado pelo seu mandatário (…)” (cf. auto de fls. 78 do processo instrutor);
24. Em 24.09.2020 o instrutor do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS solicitou ao Comandante Metropolitano de Lisboa da PSP a prorrogação do prazo de instrução do referido processo, com os seguintes fundamentos (cf. informação de fls. 83 do processo instrutor):
“(…) 1. Por despacho de V. Excelência, de 16mar2020, foi determinada a instauração do presente processo disciplinar (2020LSB00114DIS), no qual é arguido o Agente Principal M/145298, P...., do efetivo da 2.ª Divisão deste Comando;
2. Por Despacho subsequente, de 29jun2020, V. Ex.ª determinou a instauração de mais um processo Disciplinar, ao referido elemento policial, com a referência 2020LSB00218DIS;
3. E, em 08jul2020, na sequência de uma Proposta do Instrutor ora signatário, anuiu à Apensação deste último processo referido ao primeiro que foi instaurado, passando a vigorar um só processo;
4. Autonomamente, o prazo para a instrução do processo apenso, iniciada posteriormente, apenas terminaria em 11nov2020, contudo o processo Disciplinar em vigor, foi iniciado em 22mai2020 e o Estatuto Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (EDPSP), aprovado pela Lei nº 37/2019, de 30 de maio, no seu artº. 82º., nº. 1, limita a 90 dias o prazo para concluir a instrução, contados nos termos do artigo 297:º n.º 1 do Código Civil, que termina no próximo dia 28set2020;
5. Em resultado da apensação, verifica-se por um lado o avolumar dos factos imputados ao arguido, que se revestem de maior complexidade, carecem de ser esclarecidos e que passaram assim a ser analisados num único processo e, por outro lado, ficou também prejudicado o prazo para a Instrução;
6. Ademais, deparamos com dificuldades em notificar o arguido e apesar das várias tentativas que foram realizadas do antecedente, apenas recentemente (16set2020) foi possível notificá-lo (constituição de arguido) e efetivar o respetivo interrogatório, que se realizou ontem 23set2020;
7. No momento das suas declarações a que alude o número anterior, para a qual foi devidamente notificado, o arguido não esclareceu nenhum facto, resumindo o seu ato ao silêncio do apuramento dos factos, pela circunstância de não estar acompanhado pelo seu advogado.
8. Prevê ainda o EDPSP, no n° 2 do referido artigo, que o prazo de conclusão pode ser prorrogado uma única vez, por igual período de 90 dias, por Despacho da Entidade competente, sob proposta fundamentada do Instrutor em casos de excecional complexidade;
9. Nos termos do disposto no mesmo Estatuto, o procedimento disciplinar visa assegurar a boa administração da justiça disciplinar no seio da PSP, garantindo a responsabilização dos infratores, se for o caso, ou a sua absolvição, quando injustamente acusados;
10. Em resultado do conjunto de fatores atrás expostos, para além das já efetuadas, impõem-se diligências adicionais nos autos disciplinares e que se preveem de alguma morosidade, sendo que o prazo de instrução está em vias de se esgotar, conforme atrás referido;
11. Pelo que proponho a V. Ex.a, que considere a especial complexidade da matéria subjacente ao processo e que ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 82- do ED/PSP, prorrogue o prazo para conclusão da instrução, por mais 90 dias; (…)”
25. Em 29.09.2020 o Comandante Metropolitano de Lisboa da PSP determinou, com base na informação referida em 24., a prorrogação do prazo de instrução do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS, por 90 dias (cf. despacho de fls. 83 do processo instrutor);
26. Em 01.11.2020 o instrutor do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS emitiu mandado de notificação ao Requerente do despacho referido em 25., bem como para comparecer no dia 10.11.2020 no Núcleo de Deontologia e Disciplina do Comando para efeitos de interrogatório (cf. mandado de fls. 85 do processo instrutor);
27. Em 04.11.2020 foi comunicado ao Comandante Metropolitano de Lisboa, pela 34.ª Esquadra, que o último dia em que o Requerente ali desempenhou funções foi o dia 17.07.2019 (cf. correio de fls. 147 do processo instrutor);
28. Em 10.11.2020 o Requerente foi ouvido em interrogatório no âmbito do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS, tendo-lhe sido tomadas as seguintes declarações (cf. auto de fls. 122 e seguintes do processo instrutor):
“(…) Relativamente aos factos e questionado o arguido do porquê de ter faltado à Junta Médica do COMETLIS, marcada para o dia 06mar2020, respondeu que não sabia que havia Junta, nem foi notificado para o efeito.
Questionado há quanto tempo reside na R.. n°……., 1750-428 Lisboa, respondeu que desde 2006.
Questionado se a sua habitação esteve ou está à venda, respondeu afirmativamente.
Questionado se presentemente continua a residir na referida morada, respondeu afirmativamente, deslocando-se apenas aos fins-de-semana para uma outra habitação que possui em Leiria.
Questionado há quanto tempo tem o número n°. ……96, de telemóvel, respondeu que desde sempre, desde os anos 90, tendo mantido sempre o mesmo número.
Questionado o motivo de manter a sua caixa de correio eletrónico institucional repleta, o que toma inviável o envio de mensagens, respondeu que desde há uns anos a esta parte, julga que 2015, deixou de ter acesso à referida caixa de correio.
No dia 06set2019, foi devidamente notificado para comparecer de 10 em 10 dias, no Posto Clínico desta Polícia a que pertence, o que nunca cumpriu e instado a pronunciar-se sobre essa falta de comparência, respondeu que preferiu ficar sossegado em casa, uma vez que lesão que tem no ombro desaconselham qualquer mobilidade, encontrando-se a aguardar cirurgia, que já esteve agendada por várias vezes no British Hospital e Hospital da Cuf, contudo, como o Termo de Responsabilidade que foi emitido pela PSP não cobria todos os atos médicos necessários e por conselho médico, entendeu não avançar com a cirurgia nos referidos Hospitais, por não ter meios económicos que lhe permitam cobrir as despesas remanescentes, tendo feito uma tentativa para ser operado através do Serviço Nacional de Saúde, sem resultados.
Em complemento e perante o impasse criado, tem feito vários-contactos telefónicos com os serviços clínicos desta Polícia, sediados nas instalações da 5ª. Divisão Policial de Lisboa e onde funciona a Junta Superior de Saúde, na perspetiva da questão do pagamento de todos os atos médicos ser desbloqueada e até ao momento não obteve qualquer resposta.
Questionado sobre se entretanto se registaram outros desenvolvimentos relativamente à sua situação se saúde, respondeu que, datada de 14ago2020, foi-lhe remetida uma convocatória para a Junta Médica da Caixa Geral de Aposentações, agendada para o dia 01set2020, à qual compareceu, sendo-lhe atribuído IPP, cuja percentagem não se recorda.
Para documentar os autos e sem prejuízo de outra documentação que posteriormente fará chegar aos autos, neste ato, faz a entrega de uma cópia da convocatória que lhe foi enviada pela CGA para a referida Junta Médica.
Relativamente à entrega da documentação a que acabou de se referir, foi fixado neste ato um prazo de 10 dias úteis, para o efeito.
Relativamente ao teor da Certidão de fls. 68, dos autos, do qual lhe foi dado conhecimento neste ato, respondeu que não se lembra de ter sido contactado pelo Subcomissário R.... ou de ter assumido o compromisso de passar pela Esquadra para ser notificado, mas admite que tal possa ser verdade, mas o certo é que tem passado pela Esquadra com alguma frequência. (…)”
29. Em 11.01.2021 o instrutor do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS encerrou a fase de instrução do referido processo (cf. despacho de fls. 150 do processo instrutor);
30. Em 18.01.2021 o instrutor do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS deduziu acusação contra o Requerente no âmbito do referido processo, podendo aí ler-se, com relevo, o seguinte (cf. acusação de fls. 151 e seguintes do processo instrutor):
“(…)
Artigo 1º
Em 06SET2020 foi notificado na junta médica do COMETLIS para comparecer no posto Clínico desta Polícia, de 10 em 10 dias até ser presente à Junta Superior de Saúde da PSP. Esta determinação nunca a cumpriu, ignorando-a, sem nunca comparecer no posto clínico determinado.
Artigo 2
O correio eletrónico institucional é uma ferramenta encaixada na celeridade e fulcral na dinâmica da informação, notificações e determinações, sendo obrigatório a sua gestão e consulta ordinária de forma a não ficar com a caixa de correio cheia e desta forma inutilizável. O arguido, pelo menos, desde de 18 de fevereiro de 2020, mantêm a sua caixa de correio eletrónico cheia, inutilizável, razão pela não recebe mensagens e consequentemente todas as notificações remetidas por esta via.
Artigo 3
Em 21 de Agosto de 2020, o Subcomissário R.... elaborou uma certidão a esclarecer que no dia 21 de agosto de 2020, entrou em contacto telefónico com o arguido, informando-o de que tinha de passar pela Esquadra, devido a uma notificação endereçada ao próprio, o qual se comprometeu a realizar aquele ato processual, no dia seguinte, o que não concretizou. Este Mandado de Notificação correspondia à notificação do arguido para prestar declarações no dia 2 de setembro de 2020, na sala 15 deste Núcleo de Deontologia e Disciplina.
Artigo 4
As faltas praticadas pelo arguido, conforme plasmado no artigo 1º da acusação e seguintes, configuram infrações disciplinares, nos termos do disposto do artigo 3º, do EDPSP, por violação dos Deveres de: Obediência, previsto no artigo 14, nº 1 e nº 2 al. a); Pontualidade previsto no artigo 18 e o dever de Aprumo, previsto no artigo 19°, n.º 1 e n° 2 al. f); todos do EDPSP e em conformidade com as normas em vigor, no momento da prática dos factos, nomeadamente a determinação exarada pelo Ex° Comandante Metropolitano de Lisboa, difundida na OS n° 92 de 13/05/15 deste COMETLIS, o Despacho N°16/GDN/2008, de 17 de março de 2020 e pelo DESPACHO 20/GDN/2020 de 26 de março 2020, ambos de Sua Exa o Diretor Nacional da Polícia de Segurança Pública.
Artigo 5º
O arguido não beneficia de nenhuma das circunstâncias dirimentes da responsabilidade disciplinar previstas no art.º 38.° do EDPSP.
O arguido beneficia das circunstâncias atenuantes previstas nas alíneas b) e h) do artigo 39. ° do EDPSP.
E tem como circunstâncias agravantes da responsabilidade disciplinar as previstas nas alíneas d), f) e i) do nº 1 do artigo 40° do EDPSP.
Artigo 6º
Desta forma, às infrações realizadas pelo arguido, porque cometidas com dolo são nos termos dos artigos 20° e 22°, ambos do EDPSP, qualificadas como GRAVES.
Às faltas assim qualificadas corresponde a pena disciplinar de SUSPENSÃO SIMPLES, nos termos da alínea b) do n° 1, do artigo 30°, conjugado os artigos 34°, 41°, 42°, e 45°, nº 1 e 3, todos do EDPSP. (…)”
31. Em 07.02.2021 o Requerente apresentou defesa escrita no âmbito do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS, tendo aí peticionado o arquivamento do processo disciplinar ou, ao invés, a suspensão da execução da pena a aplicar pelo período máximo de um ano (cf. defesa de fls. 162 e seguintes do processo instrutor);
32. Em 09.03.2021 o instrutor do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS emitiu despacho de anulação da acusação referida em 30., com o seguinte teor (cf. despacho de fls. 177 do processo instrutor): “(…) Introdução
Terminado a instrução foi deduzida a acusação com o respetivo enquadramento, a qual foi remetida ao arguido e ao seu mandatário, no entanto, o arguido e à semelhança do antecedente, não foi notificado, tendo-o sido, unicamente, o seu Mandatário.
Entretanto o Ilustre advogado, constituído nos autos, montou a sua defesa na qual não requereu diligências complementares de prova, concluindo nas suas alegações que «...deve a presente Defesa ser julgada totalmente procedente, por provada, e, em consequência, arquivar-se os presentes autos de processo disciplinar no estado em que se encontram, não sendo o Defendente alvo de qualquer sanção disciplinar, ou, ao ser aplicada uma pena disciplinar que a mesma seja suspensa na sua execução pelo período máximo de 1 (um) ano.»
Análise da prova e fundamentação
O instrutor ao analisar, minuciosamente, toda a prova carreada para os autos, em sede de instrução e defesa, concluiu existirem lapsos na apreciação inicial da prova e consequentemente na incidência dos factos que formularam o objeto da acusação.
Efetivamente, analisada toda a prova, verificamos que o arguido, não compareceu, nem justificou as diversas faltas de serviço, desde 06set2019, por ter ignorado as diversas notificações/comunicações/determinações para os atos médicos e processuais a que foi sujeito em diversas formas, nomeadamente, por telefone, por email e por mandado de notificação.
Em face do exposto, é minha convicção que os factos praticados, pelo arguido, assumem maior gravidade do que, inicialmente, na fase de instrução e da subsequente acusação, tinha sido equacionada.
Desta forma decido:
1. Anular a Acusação já deduzida ao arguido, tomando a mesma sem qualquer efeito;
2. Deduzir uma nova acusação, com novo enquadramento de facto e de direito que se apresentar adequado e proporcional à totalidade das faltas consideradas provadas e ainda sujeitas a responsabilidade disciplinar.
3. Notifique-se o arguido e Mandatário deste meu despacho. (…)”
33. Em 15.03.2021 o instrutor do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS deduziu acusação contra o Requerente no âmbito do referido processo, com o seguinte teor (cf. acusação de fls. 180 e seguintes do processo instrutor):
“(…) Artigo 1.º
Em 06SET2019, o arguido foi notificado na junta médica do COMETLIS para comparecer no posto Clínico desta Polícia, de 10 em 10 dias até ser presente à Junta Superior de Saúde da PSP. Esta determinação, o arguido nunca a cumpriu, ignorando-a, e nunca compareceu no posto clínico conforme lhe foi determinado, nem justificou essas faltas.
Artigo 2. °
O arguido, pelo menos, desde de 18 de fevereiro de 2020, mantêm a sua caixa de correio eletrónico cheia, inutilizável, razão pela qual não recebe mensagens e consequentemente todas as notificações remetidas por esta via.
Artigo 3. °
O arguido manteve-se incontactável, não se deixando notificar em diversas diligências, por vários meios, nomeadamente para as Juntas Médicas de Saúde do Cometlis, agendadas para os dias 06 e 20 de março de 2020.
Artigo 4. °
Em 21 de Agosto de 2020, o Subcomissário R.... elaborou uma certidão a esclarecer que, após várias insistências infrutíferas para contactar o arguido, no dia anterior (20ago2020), pelas 09h30, entrou em contacto telefónico com o mesmo, informando-o de que tinha de passar pela Esquadra, devido a uma notificação endereçada ao próprio, o qual se comprometeu a comparecer para realizar aquele ato processual, o que não concretizou, nem justificou a não comparência.
Artigo 5. °
Em conformidade com o teor dos artigos antecedentes, constata-se que, após o dia 06 de setembro de 2019, o arguido encontra-se ausente do serviço, sem justificação.
Artigo 6.º
As faltas praticadas pelo arguido, conforme plasmado no artigo 1.º da acusação e seguintes, configuram infrações disciplinares, nos termos do disposto do artigo 3.°, por violação dos Deveres de: Obediência, previsto no artigo 14.°, n.°s 1 e 2, al. a); Assiduidade, previsto no artigo 17.°, n.°s 1 e 2, al. a); Pontualidade, previsto no artigo 18.° e o de Aprumo, previsto no artigo 19.°, n.°s 1 e 2 al. f), todos do EDPSP; com referência ao artigo 42.°, do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de Outubro, que aprovou o Estatuto Profissional do Pessoal com funções policiais da Polícia de Segurança Pública.
Artigo 7. °
O arguido não beneficia de nenhuma das circunstâncias dirimentes da responsabilidade disciplinar previstas no art.° 38. ° do EDPSP.
O arguido beneficia das circunstâncias atenuantes previstas nas alíneas b) e h) do artigo 39.° do EDPSP.
E tem como circunstâncias agravantes da responsabilidade disciplinar as previstas nas alíneas d), f) e i) do n.º 1 do artigo 40.°, do EDPSP.
Artigo 8. °
A conduta do arguido é inviabilizadora da manutenção da relação funcional, já que demonstra um total desinteresse no serviço policial, por faltar ao serviço sem apresentar qualquer justificação para as faltas, o que revela um comportamento que põe gravemente em causa o bom nome e o prestígio da Instituição, quebrando, dessa forma, a confiança que deve existir entre a Corporação e os seus agentes.
Assim, as infrações realizadas pelo arguido, porque cometidas com dolo são nos termos dos artigos 20.° e 23.°, ambos do EDPSP, qualificadas como MUITO GRAVES.
As infrações assim indiciadas são puníveis com a pena disciplinar de aposentação compulsiva ou de demissão, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 23.°, n.°s 1 e 2 al. r); 30.° n.º 1, ais. e) e f); 35.° e 36.°, todos do EDPSP, por, no caso, se tomar inviável a manutenção do exercício da relação funcional. (…)”
34. Em 05.04.2021 o Requerente apresentou defesa escrita no âmbito do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS (cf. defesa de fls. 203 e seguintes do processo instrutor);
35. Em 08.04.2021 o instrutor do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS emitiu despacho com o seguinte teor (cf. despacho de fls. 247 e 248 do processo instrutor):
“(…) 1 - DO PEDIDO
Através de requerimento dirigido ao instrutor e na sequência do Despacho que anulou a acusação disciplinar, de 18 de janeiro de 2021, vem o arguido, por intermédio de douto Mandatário, requerer que: «...seja indicado com a devida fundamentação, qual o normativo legal habilitante, uma vez que tal despacho é completamente omisso nessa matéria, criando uma situação de incompreensão, injustiça e convicção que tal despacho foi proferido de forma arbitrária.»
2 - A APRECIAÇÃO
Com base no exposto, importa referir que o Processo Disciplinar em curso por via do qual se efetua a administração da justiça do Estado, destina-se, pois, à aplicação do Direito.
A aplicação do Direito, depende da existência ou verificação dos factos aos quais a ordem jurídica alia a produção desse efeito.
E, a produção da prova é fundamental, isto é, é a demonstração da verdade ou realidade dos factos juridicamente relevantes.
A prova constitui, pois o pilar estruturante de qualquer processo.
Nada obsta, no processo disciplinar, reapreciada a prova contidos em acusação já formulada, a que o instrutor proceda à reformulação da acusação, com vista à completa articulação dos factos e circunstâncias que envolvem responsabilidade disciplinar do arguido. A necessidade dessa reformulação derivou da verificação de irregularidades que imponham a reformulação da acusação.
Os objetivos da realização do Direito, da justiça material, ficaria gravemente prejudicada se não fosse corrigida a análise correta da prova, na fase em que o processo está sob o Dominus da direção do Instrutor e na sua livre apreciação da prova, (artigos 7º e 71° do EDPSP). (…)”
36. Em 20.09.2021 o instrutor do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS determinou o encerramento da fase de defesa do referido processo (cf. despacho de fls. 265 do processo instrutor);
37. Em 24.09.2021 o instrutor do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS emitiu relatório final no âmbito do referido processo, podendo aí ler-se, com relevo, o seguinte (cf. relatório de fls. 266 e seguintes do processo instrutor):
“(…) 1. INTRODUÇÃO
1.1. Este processo disciplinar, no qual é Arguido o Agente Principal P...., …..98, do efetivo da 2ª Divisão Policial/34ª. Esquadra, do Comando Metropolitano de Lisboa da Polícia de Segurança Pública, foi mandado instaurar por Despacho, de 16mar2020, do Exmo. Sr. Comandante Metropolitano, fls. 2.
1.2. Na origem do processo está o facto de o arguido não ter comparecido à Junta de Saúde do COMETLIS, agendada para o dia 06mar2020, pelas 14h00.
1.3. A este processo, mediante proposta e por Despacho de 08jul2020 do Exm°. Sr. Comandante Metropolitano, foi apenso o processo Disciplinar NUP 2020LSB00218DIS, que tinha sido mandado instaurar por Despacho de 29jun2020, da mesma Entidade e que, por força da apensação, perdeu a sua autonomia, fls. 31 a 35.
1.4. Dos documentos que deram origem ao segundo processo Disciplinar retira-se que, em 06set2019, o arguido foi presente à Junta Médica do COMETLIS e a partir dessa data, por manifesto incumprimento do determinado, nomeadamente, não se ter apresentado no Posto Clínico a que pertence de 10 em 10 dias, não comparência nas Juntas Médicas subsequentes que lhe foram agendadas, mantendo-se incontactável e furtando-se às notificações respetivas, colocando-se assim em ausência ilegítima.
2. INSTRUÇÃO
2.1. Integração de documentos:
(…) 2.2. Inquirições/interrogatórios:
(…) 3. ACUSAÇÃO
3.1. Acusação deduzida ao arguido em 18jan2021:
3.1.1. Por se mostrar suficientemente indiciada a existência de infração disciplinar imputável ao arguido, foi-lhe deduzida acusação nos termos dos n°s. 4 e 5, do artigo 86°, do Estatuto Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (EDPSP), aprovado em anexo à Lei 37/2019, de 30 de maio, conforme fls. 151 e 151v, dos autos, a qual se dá aqui por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais;
3.1.2. Nesta primeira acusação, as infrações imputadas ao arguido foram enquadradas na pena disciplinar de Suspensão Simples, fls. 151 v;
3.1.3. O Mandatário/Advogado do arguido foi notificado da Acusação, conforme consta a fls. 153 e 154, dos autos;
3.1.4. Dentro do prazo legal, o Mandatário do arguido, remeteu aos autos a Defesa Escrita respetiva, conforme consta a fls. 163 a 169;
3.1.5. Não foram requeridas diligências complementares de prova nessa missiva de Defesa e solicita-se o arquivamento dos autos ou, ao ser aplicada pena disciplinar que a mesma seja suspensa na sua execução pelo período máximo de um ano;
3.1.6. Quanto ao Arguido, à semelhança das atitudes que já assumira do antecedente perante outras notificações e pese embora o compromisso que assumiu, neste caso concreto, perante os superiores hierárquicos, acabou por não se deslocar à Esquadra a que pertence para o efeito, acabando por não ser notificado formalmente da Acusação, conforme consta a fls. 171 e 176, dos autos.
3.2. Anulação da acusação de 18jan202I:
3.2.1. O Instrutor e no contexto a que aludem os números antecedentes, na posse da prova carreada para os autos em sede de instrução e defesa, por ter concluído que existiram lapsos na apreciação inicial da prova e consequentemente na incidência dos factos que formularam o objeto da referida Acusação, elaborou Despacho de Anulação da Acusação, conforme consta a fls. 177, dos autos;
3.2.2. Este Despacho foi notificado ao arguido e ao seu mandatário, fls. 178, 179 e 202;
3.2.3. O mandatário do arguido, reagiu à anulação da Acusação de forma que classificamos no mínimo de imprópria e grosseira, ao referir «...estamos perante um facto que fere todo o processo por falta de profissionalismo e idoneidade para o exercício da função de instrutor disciplinar» e foi-lhe respondido em conformidade, conforme se extrai dos Emails a fls. 184 e 197;
3.2.4. Entretanto, o Advogado do arguido, apresentou requerimento formal, no qual reafirma o pedido de esclarecimentos sobre a fundamentação da anulação da acusação, que foi objeto de resposta através de Despacho, fls. 200 e 247.
3.3. Acusação deduzida ao arguido em 15mar2021:
3.3.1. No enquadramento a que aludem os números antecedentes, suficientemente indiciada a existência de infração disciplinar imputável ao arguido, foi-lhe deduzida nova acusação nos termos dos n°s. 4 e 5, do artigo 86°, do Estatuto Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (EDPSP), aprovado em anexo à Lei 37/2019, de 30 de maio, conforme fls. 182 e 182v, dos autos, a qual se dá aqui por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais;
3.3.2. Nesta acusação subsequente, as infrações imputadas ao arguido foram enquadradas na pena disciplinar de Aposentação Compulsiva ou de Demissão, fls. 182v;
3.3.3. O Mandatário/Advogado e, desta feita, também o próprio arguido, foram notificado da Acusação, conforme consta a fls. 184 e 256, dos autos.
4. DA DEFESA
4.1. Dentro do prazo que concedido para o efeito, através do seu representante legal, o arguido, remeteu aos autos a Defesa Escrita à nova Acusação, conforme consta a fls. 204 a 226;
4.2. Anexo à defesa e como prova documental, foram remetidos a cópia da defesa anterior, Informação sobre a morada do arguido e vários Relatórios e Declarações Médicas, que integram fls. 227 a 246.
4.3. Na Defesa apresentada não foi requerida a audição de prova testemunhal.
5. INCIDENTES DA DEFESA
A defesa deu entrada dentro dos prazos legais, pelo que se impõe a sua apreciação.
Em resumo, os fundamentos da defesa assentam essencialmente em três grandes linhas argumentativas, designadamente:
5.1. Incumprimento do disposto no artigo 82°., n°s. 1 e 4, do EDPSP, por ter sido ultrapassado o prazo máximo da fase de instrução;
5.2. Declaração de nulidade, por ilegalidade, do despacho de anulação da acusação disciplinar, proferido pelo instrutor em 09mar2021, por falta de legitimidade e cobertura legal e processual, e da subsequente acusação de 15mar2021;
5.3. Declarada a procedência total da defesa, por provada, sendo muitos os fundamentos alegados e, consequentemente, revogar-se o segundo despacho de acusação;
5.4. Nestas linhas de orientação, a defesa, vem em todas elas advogar o arquivamento dos autos, sem que o arguido seja alvo de qualquer sanção disciplinar.
Vejamos então,
5.5. O douto mandatário e como conclusão da primeira parte da defesa, delimitada do artigo 1.º ao 16.°, refere «... no dia 29 de setembro de 2020, o prazo de conclusão da fase de instrução já estava ultrapassado, escusando referir que ao contrário do entendimento do Senhor Instrutor Disciplinar, os prazos administrativos, contam-se nos termos do disposto do artigo 87° do código do Procedimento Administrativo e não nos termos do artigo 297º., n°1 do Código Civil». Requer assim o arquivamento dos autos, na fase em que se encontra, por incumprimento do disposto no artigo 82.°, n.°1 e n.° 4, do ED/PSP.
Apreciando,
5.6. Relativamente a esta questão suscitada pela defesa, permitimo-nos concordar que a contagem dos prazos faz-se exatamente nos termos do plasmado do artigo 87° do CPA.
5.7. No caso em concreto o Instrutor autuou o Despacho do Exm°. Sr. Comandante Metropolitano no dia 22mai2020 e, como resulta da norma, para a contagem não se inclui o dia em que ocorre o evento, suspendendo-se os prazos aos sábados e domingos e feriados, pelo que e iniciada essa contagem em 25mai2020, o primeiro dia útil subsequente, o prazo para a sua conclusão terminava a 29set2020, inclusive.
5.8. Na referida data de 29set2020, o Exm°. Sr. Comandante Metropolitano, nos termos do n°. 2 do artigo 82.° do EDPSP, por proposta do Instrutor de 24set2020, exarou Despacho de prorrogação do prazo de instrução, por mais 90 dias.
5.9. Verifica-se assim que, ao contrário do entendimento da Defesa, o prazo para a conclusão da instrução não foi ultrapassado.
5.10. Acresce ainda aqui referir, que os factos aqui apreciados de maior gravidade disciplinar, foram inicialmente objeto do processo Disciplinar NUP 2020LSB00218DIS, cuja instrução se iniciou em 08jul2020 e cujo prazo terminaria apenas em 12nov2020, mas que entretanto perdeu autonomia por apensação ao presente processo.
Prosseguindo,
5.11. Quando à suposta ilegalidade do Despacho de anulação da primeira Acusação, proferido pelo Instrutor em 09mar2021, argumentação que se estende dos artigos 17°. ao 40°. da Defesa, discordamos dessa interpretação que é defendida pela Defesa que requer a sua nulidade.
5.12. Este assunto já foi abordado pelo Instrutor em resposta a requerimento do mandatário do arguido, conforme resulta do Despacho proferido pelo Instrutor em 08abr2021, que aqui se considera como integralmente reproduzido e do qual importa transcrever a sua parte final «Os objetivos da realização do Direito, da justiça material, ficaria gravemente prejudicada se não fosse corrigida a análise correta da prova, na fase em que o processo está sob o Dominus da direção do Instrutor e na sua livre apreciação da prova (artigos 7o e 71° do EDPSP)», fls. 200 e 247.
5.13. Efetivamente é no direito sancionatório e na legislação processual penal, de aplicação subsidiária por força do artigo 7º, do EDPSP, na doutrina e na jurisprudência associada, que encontramos o respetivo suporte legal.
Veja-se, na parte que interessa, os seguintes Acórdãos
5.14. ACRL de 11-01-2018 — Correção de nulidades ou irregularidades em fase de inquérito - Proc. 819/16.0JFLSB-K.L1 9ª. Secção.
(...) No caso o Ministério Público deduziu acusação contra o recorrente e outros arguidos, e, depois de ele ter sido notificado dela mas antes de os autos serem enviados ao Tribunal, declarou-a nula e não escrita quanto a ele.
Pode o Ministério Público declarar nula a acusação (...)?
A vinculação do Ministério Público aos objetivos de descoberta da verdade e na realização do direito, ou da realização da justiça material, ficaria gravemente prejudicada se se negar a quem caba a direção da Instrução (artigo 263° do CPP), a faculdade de corrigir eventuais nulidades ou irregularidades cometidas na fase em que o processo está sob a sua direção e ainda não transitou para a esfera judicial através da entrada do processo na secretaria do Tribunal. Enquanto o processo não entrar na secretaria do Tribunal, o Ministério Público, que tem a direção do inquérito, tem competência para conhecer das nulidades e irregularidades nos termos dos artigos 118 a 123 do CP.
O conhecimento da nulidade detetada pelo Ministério Público, como no caso aconteceu, não importa violação do direito de defesa do arguido.
(...) Não é legítima nem protegida por lei ou pela Constituição qualquer espectativa do arguido de se aproveitar da nulidade cometida na fase da Instrução ou na acusação ao ponto de impedir a sua declaração e correção nos termos dos artigos 118°a 123 do CPP.»
5.15. Acórdão do STA de 17-01-1995, Apêndice de 18-07-1997 - 1.ª Secção
«(...) pode ordenar-se oficiosamente a reparação de qualquer irregularidade, no momento em que da mesma se tomar conhecimento, quando ela puder afetar o valor do ato praticado», preceito este que, conforme obtempera o Exmo. Conselheiro Maia Gonçalves, in Código de Processo Penal Anotado, 2ª ed., rev. e act., 1988, p. 335, permite que ‗qualquer irregularidade da acusação possa ser retificada oficiosamente‘.
5.16. O Instrutor julga a prova segundo as regras de experiência comum e a livre convicção que sobre ela forma (art.° 127.° do Código de Processo Penal).
5.17. Quando está em causa a questão da apreciação da prova não pode deixar de dar-se a devida relevância à perceção que cabe ao Instrutor e, para tal, a sua convicção tem de ser formada na ponderação de toda a prova produzida.
5.18. Assim, ao confirmar o erro inicial na apreciação da prova, ao Instrutor não restava outro caminho que não fosse reparar esse lapso, o que aconteceu e que, conforme se pode concluir das alegações supra, foi legítimo, legal e mais, não prejudicou os direitos de defesa do arguido.
Aqui Chegados
Passamos a apreciar a terceira parte da defesa, a argumentação que se estende pelos artigos 41°. e seguintes:
5.19. Os artigos 41°. ao 44°., referem-se ao comportamento do arguido em geral, que não importa aqui contraditar e que se aceita.
5.20. Dos artigos 45°. ao 49°., a defesa debruça-se sobre os factos descritos na acusação, entendidos como parcialmente ocorridos e reproduz os artigos respetivos.
5.21. A partir do artigo 50°., no capítulo «C. Fundamentos da defesa», a defesa começa por referir que o Defendente declara conformar-se parcialmente com os factos que lhe são imputados pela acusação, por os mesmos corresponderem parcialmente à verdade, discordando com a interpretação e alcance que o Instrutor quer dar aos mesmos, estando afastados do verdadeiro contexto em que se deram para.
5.22. Seguidamente, a defesa, para justificar a falta de cumprimento, por parte do arguido, da determinação/notificação que lhe foi feita para comparecer de 10 em 10 dias no Posto Clínico desta Polícia até ser presente à Junta Superior de Saúde da PSP, argumenta com limitações física decorrente de uma lesão no ombro, por acidente em serviço, encontrando-se a cirurgia respetiva por resolver, imputando à PSP as responsabilidades pela demora e pelo prolongar da situação.
Vejamos então,
5.23. Encontra-se provado, mediante prova testemunhal e documental, que o arguido após ter sido notificado em 06SET2019, na Junta Médica do COMETLIS para comparecer no posto Clínico desta Polícia, de 10 em 10 dias até ser presente à Junta Superior de Saúde da PSP, que, esta determinação, o arguido, nunca a cumpriu, ignorando-a e, nunca compareceu no posto clínico, nem justificou essas faltas, fls. 35 a 37 e 52/52v.
5.24. O arguido entre 05fev2015 e 08jan2019 esteve incapacitado para o serviço, devido a um acidente de trabalho, o qual foi sendo seguido pela Junta Médica do COMETLIS e pela Junta Superior de Saúde desta Polícia, a qual encerrou o processo clínico com a atribuição de IPP 8% e, findo esse período, deveria ter-se apresentado ao serviço, embora com limitações, mas manteve-se ausente, por baixa médica, outras licenças e faltas, acabando por ser presente a nova Junta Médica do COMETLIS, em 06SET2019.
5.25. A partir da data de 06set2019, o arguido, nunca justificou a razão pela qual não cumpriu com o determinado pela Junta Médica «...para comparecer no posto Clínico desta Polícia, de 10 em 10 dias, até ser presente à Junta Superior de Saúde da PSP» e não se deixou notificar para as Juntas Médicas seguintes, que lhe foram agendadas.
5.26. Assim, as faltas subsequentes dadas pelo arguido, são consideradas faltas injustificadas, consumando-se desta forma a violação do disposto na al. r), do n° 2, do artigo 23°, do EDPSP.
5.27. Ainda relativamente a esta questão, no seu interrogatório, em 10nov2020, à questão que lhe foi formulada para se pronunciar sobre a sua falta de comparência, o arguido respondeu «...que preferiu ficar sossegado em casa...».
5.28. Em tempo vinculativo ao exigido por lei e como já foi escalpelizado, o arguido, não justifica a sua ausência nas datas determinadas, no entanto, em 17nov2020, após o seu interrogatório neste âmbito, mais precisamente e praticamente mais de um ano civil após a sua notificação para «...para comparecer no posto Clínico desta Polícia, de 10 em 10 dias até ser presente à Junta Superior de Saúde da PSP.», apresentou uma Declaração Médica, elaborada pela Drª M...., a qual refere que «...Para os devidos efeitos se declara que desde julho de 2019 que o Sr° P........tem tido agravamento… que aguarda cirurgia e está limitado nas suas deslocações uma vez que o seu quadro álgico não lhe permite a condução ....», fls. 137 e 138.
5.29. Sem prejuízo do arguido estar limitado nas suas deslocações, como apresenta a aludida Declaração Médica, durante os trâmites deste processo, verifica-se que existiram sempre dificuldades em o notificar, como e entre outras é prova em vários tempos:
• Em 18 de fevereiro de 2020, a caixa de correio eletrónica do arguido estava cheia e não podia aceitar mensagens, fls. 6;
• Em 06mar2020, o Subcomissário V....., Comandante da 41ª. Esquadra - Musgueira, informa que «... Foram efetuadas deslocações à residência do visado em datas e horas diferentes mas não foi possível contactar o mesmo....», e através do contacto telefónico as «...tentativas efetuadas resultado infrutíferas.», fls 44;
• Em 04 de março de 2020, a 2ª Divisão Policial de Lisboa, informa: «...até ao presente momento não foi possível contactar de forma alguma o Agente Principal ….98 P...., no sentido de o notificar para a comparência em Junta Médica, nesse Cometlis», fls. 4;
• Em 24 de junho de 2020, a caixa de correio eletrónica do arguido estava cheia e não podia aceitar mensagens, fls. 28;
• Em 25jun2020, através de Email, o Adjunto da 41ª Esquadra, refere que «Efetuadas diligências na Rua …, n°…., 1750-428, Lisboa, foi possível apurar junto dos vizinhos que o Agente Principal P....já há bastante tempo que não é visto no local, desconhecendo o seu paradeiro ou contactos, tendo acrescentado que o apartamento esteve alugado durante um tempo.
Atualmente a casa encontra-se em obras, tendo um cartaz publicitário em que indica que a mesma está à venda na empresa R…. — S…., Lda, tlm. 9… ...», fls. 29;
• Em 03jul2020 é integrado neste processo um ofício emanado da 2ª. Divisão Policial de Lisboa, a referir que «...não foi possível dar cumprimento ao solicitado.... para notificar o Agente Principal …..98 P...., quer telefonicamente, quer eletronicamente....», fls.22;
• Em 26jun2020, o Adjunto da 34ª Esquadra, o Chefe de Polícia N..... com a M/..., informa que «Foram efetuadas as diligências para tentar contacto com o Agente Principal P........o qual dá sinal de chamada, mas nunca é atendido, quer através de envio de email via Institucional, obtendo-se resposta automática que a caixa de correio do elemento se encontra cheia...», «...foi possível apurar que o elemento já não é visto no local há bastante tempo....», na sua residência Rua..., n°…., 1750-428 Lisboa, referindo ainda que «...o mesmo nunca mostrou disponibilidade para atender as várias tentativas de contacto telefónico por parte desta Esquadra, nem fez para manter a caixa de correio institucional limpa...», fls. 25 e 25v.
• Em 21ago2020, o Subcomissário F ….., elabora uma Certidão onde refere após várias insistências e não se ter conseguido contactar com o arguido quer presencialmente, quer por via telefónica, no dia 20/08/20, pelas 09H30, foi possível entrar em contacto telefónico com o visado, tendo o mesmo se comprometido em comparecer neste Departamento Policial, a fim de ser notificado, o que acabou por não acontecer, nem ter sido dada qualquer justificação para o efeito», fls. 68;
• Em 05mar2020, a Divisão Policial de Leiria, informa que o arguido não reside naquela localidade, nem atende o telefone, fls. 112;
• Em 02mar2020, a 2ª. Divisão Policial de Lisboa, informa que não foi possível dar cumprimento à notificação (da acusação) do arguido, fls. 170 a 172.
5.30. Neste enquadramento, não pode ser acolhida a argumentação da defesa, que procura refutar a dificuldade óbvia que o arguido criou à efetivação das variadas notificações que lhe foram dirigidas, quer dos atos médicos/Juntas, quer neste âmbito processual disciplinar.
5.31. Ainda nesta parte, a defesa, persiste na impossibilidade do arguido retomar a sua atividade laboral, enquanto não for sujeito à intervenção cirúrgica, conforme atesta a diversa documentação médica que apresentou, remetendo para a falta de resposta dos serviços desta Polícia a responsabilidade pelo prolongar da sua situação.
5.32. Dos artigos 97° a 182°, em resumo, a defesa debruça-se sobre uma alegada interpretação errada e aplicação do direito aos factos e vem alegar que não estão reunidos os pressupostos legais que possam levar à pena de aposentação compulsiva ou demissão do arguido, classificada de manifestamente ilegal, imerecida, injusta e desproporcional, porque não se provou a inviabilização da relação funcional, sendo pacífica a doutrina e a jurisprudência dos tribunais superiores relativamente ao facto de, a violação do dever de assiduidade só ser justificativo da quebra da relação funcional, quando seja de tal forma grave que inviabilize a manutenção dessa relação o que, no entendimento da defesa, não é o caso - pela falta de demostração de que houve um comportamento culposo por parte do arguido, mas tão só uma consequência de um acidente em serviço, com manifesta impossibilidade de retomar ao serviço.
Examinemos,
5.32. Começamos a nossa apreciação a estes argumentos da defesa, dando conta da nossa concordância relativamente ao facto de a violação do dever de assiduidade não justificar, só por si, a aposentação compulsiva ou demissão, mas apenas quando tal violação for levada a cabo de forma manifestamente grave.
5.33. Ora, no nosso entendimento, é exatamente isso que aqui se verifica, como seguidamente explicaremos, sendo certo que a acusação deduzida ao arguido, expressa bem tal gravidade.
5.34. O arguido, movido por questões, respeitáveis com toda a certeza, sem dar qualquer explicação ou justificação aos seus superiores, decidiu não cumpriu o que lhe foi determinado ou justificar as suas faltas.
5. 35. Um período tão alargado de faltas injustificadas e consecutivas é só por si uma violação grave do dever de assiduidade.
5.37. Bem sabia o arguido que tinha sido notificado em 06set2019, «...para comparecer no posto Clínico desta Polícia, de 10 em 10 dias até ser presente à Junta Superior de Saúde da PSP», não justificando in tempore frigus a razão pela qual não cumpriu com o determinado, conforme está provado.
5.38. Embora o arguido alegue questões que motivaram a sua ausência, as quais podemos considerar relevantes, estas não podem ser entendidas como capazes de justificar o grosseiro desrespeito da sua parte para com a instituição em geral e os seus superiores.
5.39. Para com a instituição e os seus superiores, porque o arguido nem sequer se dignou a dar conhecimento da sua ausência ou dos motivos que a fundamentaram.
Ou seja,
5.40. O arguido, simplesmente não teve consideração pela organização que o acolheu e pelos seus membros, olhando apenas e exclusivamente, para os seus interesses.
5.41. E não deu conhecimento, não porque tal não estivesse na sua esfera de possibilidade, mas sim porque não teve qualquer vontade de o fazer, num manifesto desapego pelas consequências que os seus atos pudessem acarretar.
5.42. Na generalidade, os argumentos que o arguido apresentou para justificar a sua conduta não se apresentam legalmente justificativos para o isentar do cumprimento desses mesmos deveres, ou atenuar a gravidade e as consequências do seu comportamento.
5.43. A desconsideração do arguido pela sua obrigação de comparecer nos serviços clínicos, conforme lhe foi determinado, aqui refletida gravemente num período de tempo alargado e durante o qual a instituição desconhecia, por vontade do próprio, as circunstâncias das suas faltas, colocam-no numa posição inconciliável com as regras comportamentais exigíveis a qualquer elemento que quer continuar a pertencer a esta polícia.
5.44. O comportamento do arguido, pela gravidade, não permite que a instituição possa continuar a confiar no mesmo.
Portanto,
5.45. Para além do facto do arguido não ter justificado in tempore frigus a determinação, em notificação pessoal, «...para comparecer no posto Clínico desta Polícia, de 10 em 10 dias até ser presente à Junta Superior de Saúde da PSP.», o que implica que as faltas ao serviço a partir dessa altura não estão justificadas por qualquer meio e o coloca automaticamente na condição de lhe ser aplicada a pena de aposentação compulsiva ou demissão, nos termos da als. e) e f) do n° 1, do artigo 30°, do RDPSP, há a acrescentar que violou este dever de assiduidade num contexto de elevada censura pelo facto de, voluntariamente, ter ignorado completamente as suas obrigações para com a instituição, nomeadamente por não ter remetido aos serviços os motivos de tal ação/comportamento.
5.46. O arguido teve apenas em conta os respetivos interesses, com toda a certeza importantes para o próprio, mas que não justificam as faltas cometidas e muito menos o manifesto desdém institucional.
5.47. Esta falta de consideração institucional faz com que a própria instituição não possa voltar a confiar no arguido e como tal, que não seja possível manter com aquele a relação funcional, uma vez que o dever de assiduidade foi violado numa das suas formas mais graves, que consistiu em faltar injustificadamente ao determinado, como está provado.
5.48. Evidenciou o arguido um comportamento manifestamente contrário à lei e aos regulamentos, num contexto altamente censurável, nomeadamente pelo desprezo institucional revelado, o que faz cessar a confiança que deve existir entre a Corporação e os seus agentes, estando desta forma inviabilizada a manutenção da relação funcional.
5.49. Além do mais a instituição não pode facilitar na aplicação das sanções previstas na lei, sob pena de deixar passar uma imagem de facilitismo capaz de colocar em causa as necessidades de prevenção geral que as penas disciplinares reclamam e por conseguinte, a própria disciplina no seio da PSP.
5.50. Não se manifesta necessário outros comentários aos argumentos da defesa, que entendemos não conseguem abalar as conclusões que são apresentadas neste relatório.
Desta forma,
5.50. Em discordância com os argumentos da defesa e em conformidade com a apreciação supra, chegamos à conclusão que a pena disciplinar a aplicar ao arguido pela violação dos deveres por si levados a cabo, num contexto de consciência e vontade, o enquadram na pena disciplinar de aposentação compulsiva ou demissão.
6. DA PROVA
(…) 6.5. Factos considerados provados:
a) Em 06SET2019, o arguido foi notificado na junta médica do COMETLIS para comparecer no posto Clínico desta Polícia, de 10 em 10 dias até ser presente à Junta Superior de Saúde da PSP. Esta determinação, o arguido, nunca a cumpriu, ignorando-a, e nunca compareceu no posto clínico conforme lhe foi determinado, nem justificou essas faltas.
b) O arguido, pelo menos, desde de 18 de fevereiro de 2020, mantêm a sua caixa de correio eletrónico cheia, inutilizável, razão pela qual não recebe mensagens e consequentemente todas as notificações remetidas por esta via.
c) O arguido manteve-se incontactável, não se deixando notificar em diversas diligências, por vários meios, nomeadamente para as Juntas Médicas de Saúde do Cometlis, agendadas para os dias 06 e 20 de março de 2020.
d) Em 21 de Agosto de 2020, o Subcomissário R.... elaborou uma certidão a esclarecer que, após várias insistências infrutíferas para contactar o arguido, no dia anterior (20ago2020), pelas 09h30, entrou em contacto telefónico com o mesmo, informando-o de que tinha de passar pela Esquadra, devido a uma notificação endereçada ao próprio, o qual se comprometeu a comparecer para realizar aquele ato processual, o que não concretizou, nem justificou a não comparência.
e) Em conformidade com o teor dos artigos/alíneas antecedentes, constata-se que, após o dia 06 de setembro de 2019, o arguido encontra-se ausente do serviço, sem justificação.
7. APRECIAÇÃO JURÍCO DISCIPLINAR DOS FACTOS PROVADOS
a) As faltas praticadas pelo arguido, conforme plasmado no artigo 1,° da acusação e seguintes, configuram infrações disciplinares, nos termos do disposto do artigo 3.°, por violação dos Deveres de: Obediência, previsto no artigo 14.°, n.°s 1 e 2, al. a); Assiduidade, previsto no artigo 17.°, n.°s 1 e 2, al. a); Pontualidade, previsto no artigo 18.° e o de Aprumo, previsto no artigo 19.°, n.°s 1 e 2 al. f), todos do EDPSP; com referência ao artigo 42.°, do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de Outubro, que aprovou o Estatuto Profissional do Pessoal com funções policiais da Polícia de Segurança Pública.
b) O arguido não beneficia de nenhuma das circunstâncias dirimentes da responsabilidade disciplinar previstas no art.° 38.° do EDPSP.
c) O arguido beneficia das circunstâncias atenuantes previstas nas alíneas b) e h) do artigo 39.° do EDPSP.
d) E tem como circunstâncias agravantes da responsabilidade disciplinar as previstas nas alíneas d), f) e i) do n.º 1 do artigo 40.°, do EDPSP.
8. REGISTO DISCIPLINAR/COMPORTAMENTAL
a) O arguido foi alistado na PSP em 20novl996, tendo entrado nessa data para a EPP.
b) Habilitações literárias - 9 anos de escolaridade.
c) Tem uma punição averbada - Repreensão Escrita.
d) Não tem averbado louvores ou recompensas
e) Tem atribuídas três condecorações/Medalhas.
9. INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR
Ainda no decurso deste processo, chegou aos autos uma informação remetida por email pela 2ª. Divisão Policial de Lisboa deste COMETLIS (34ª. Esquadra), da qual consta que o arguido - Agente Principal ……98, P...., apresentou-se ao serviço em 07set2021 conforme fls. 259 a 264.
10. DA PENA
Na proposta de aplicação da pena vai ser tido em conta o disposto no artigo 41°., do EDPSP, aprovado em anexo à Lei n°. 37/2019, de 30 de maio. A prova produzida foi apreciada nos termos do artigo 127°., do Código do Processo Penal, aplicável por força do artigo 7o. Do EDPSP.
10. PROPOSTA DA PENA
Atendendo que:
a) As infrações realizadas, pelo arguido, porque cometidas com dolo são, nos termos dos artigos 20°. e 23°., ambos do EDPSP, qualificadas como Muito Graves.
b) Apresentou argumentos que não podem ser considerados legalmente justificáveis para o seu comportamento.
c) Cometeu as faltas num contexto de desconsideração institucional.
d) O seu comportamento demostra total desinteresse no serviço policial, revelador de que não dispensa à instituição a importância a que está obrigado.
e) Esta conduta, por parte do arguido, afigura-se inviabilizadora da manutenção da relação funcional, já que demonstra que para o próprio e em termos profissionais, a PSP não é assaz importante, o que atesta a falta de um verdadeiro interesse em continuar a ser agente policial, quer por faltar ao serviço, sem apresentar justificativo, quer por não cumprir as determinações que lhe foram dadas na forma legal, evidenciando um comportamento contrário às normas, o que faz cessar a quebra de confiança que deve existir entre a Corporação e os seus Agentes.
f) Paralelamente, o número de dias de ausência sem justificação, ilegítima, que o arguido concretizou, por ser superior a cinco dias seguidos, coloca-o automaticamente na circunstância prevista na al. r) do n°. 2 e artigo 23°., do EDPSP, aprovado pela Lei n°. 37/2019, de 30 de maio, aplicando-se a tal infração a pena disciplinar de aposentação compulsiva ou demissão, por refletir uma violação muito grave do dever de assiduidade.
Neste sentido proponho a V. Exa que,
Por entender que se fará justiça, bem como ao mesmo tempo se acautelarão as necessidades de prevenção geral e especial que o caso reclama, às faltas praticadas pelo arguido seja aplicada a Pena Disciplinar de APOSENTAÇÃO COMPULSIVA ou de DEMISSÃO, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 23°., n°s. 1 e 2, al. r); 30°., n°. 1, als. e) e f), 35°., 36°., 41°. e 46°., todos do Estatuto Disciplinar da PSP, aprovado em anexo pela Lei n°. 37/2019, de 30 de maio.
(…)”
38. Em 29.11.2021 reuniu o Conselho de Deontologia e Disciplina da PSP, aí tendo sido deliberado, por unanimidade, dar parecer no sentido de ser aplicada ao Requerente a pena de demissão, no âmbito do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS (cf. ata de fls. 278 e seguintes do processo instrutor);
39. Em 23.06.2022 o Ministro da Administração Interna decidiu aplicar ao Requerente, no âmbito do processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS, a pena de demissão (cf. despacho de fls. 285 do processo instrutor);
40. Do agregado familiar do Requerente fazem parte a sua companheira, M....., e o filho menor de ambos, M..... (acordo e conjugação dos documentos 8, 9 e 16 juntos com o requerimento inicial);
41. O filho do Requerente possui um grau de incapacidade de 80% (cf. atestado junto como doc. n.º 8 do requerimento inicial);
42. O filho do Requerente frequenta sessões de musicoterapia com o valor mensal de €67,00 (cf. faturas juntas como documentos 12, 13 e 14 do requerimento inicial);
43. Durante o ano de 2019 o Requerente auferiu rendimentos de trabalho dependente no valor total de €25.257,48, sendo estes os seus únicos rendimentos declarados (cf. declaração junta como doc. n.º 15 do requerimento inicial);
44. Durante o ano de 2019 a companheira do Requerente auferiu rendimentos de trabalho dependente no valor total de €12.200,80, sendo estes os seus únicos rendimentos declarados (cf. declaração junta como doc. n.º 16 do requerimento inicial);
45. Durante o ano de 2020 o Requerente auferiu rendimentos de trabalho dependente no valor total de €16.361,69, e rendimentos de trabalho dependente de anos anteriores no valor de €1.310,33, sendo estes os seus únicos rendimentos declarados (cf. declaração junta como doc. n.º 17 do requerimento inicial);
46. Durante o ano de 2020 a companheira do Requerente auferiu rendimentos de trabalho dependente no valor total de €9.503,04, sendo estes os seus únicos rendimentos declarados (cf. declaração junta como doc. n.º 18 do requerimento inicial);
47. Durante o ano de 2021 o Requerente auferiu rendimentos de trabalho dependente no valor total de €8.563,54, e rendimentos de trabalho dependente de anos anteriores no valor de €245,60, tendo ainda recebido mais-valias e outros incrementos patrimoniais no montante total de €21.279,22 (cf. declaração junta como doc. n.º 19 do requerimento inicial);
48. Durante o ano de 2021 a companheira do Requerente auferiu rendimentos de trabalho dependente no valor total de €12.110,88, sendo estes os seus únicos rendimentos declarados (cf. declaração junta como doc. n.º 20 do requerimento inicial);
49. A companheira do Requerente paga uma prestação de crédito à habitação no valor mensal de €162,48 (acordo e comprovativo junto como doc. n.º 21 do requerimento inicial);
50. A companheira do Requerente paga uma prestação de seguro multirriscos referente ao crédito à habitação no valor mensal de €11,25 (acordo e comprovativo junto como doc. n.º 22 do requerimento inicial);
51. A companheira do Requerente paga uma prestação de seguro de vida referente ao crédito à habitação no valor mensal de €13,54 (acordo e comprovativo junto como doc. n.º 23 do requerimento inicial);
52. O Requerente paga uma prestação de crédito automóvel no valor mensal de €271,43 (acordo e comprovativo junto como doc. n.º 24 do requerimento inicial);
53. O Requerente paga anualmente o valor de €66,08 a título de seguro automóvel (cf. fatura junta como doc. nº 25 do requerimento inicial);
54. O Requerente paga uma prestação de crédito ao consumo no valor mensal de €32,47 (acordo e comprovativo junto como doc. n.º 26 do requerimento inicial);
55. A companheira do Requerente paga uma prestação relativa ao condomínio sito na morada R. Quinta de S. ..., n.º….., 3.º Frente, 2410 Leiria, no valor mensal de €26,72 (cf. aviso junto como doc. n.º 27 do requerimento inicial);
56. Durante o mês de abril de 2022 foram gastos, na R. Quinta de S. ..., n.º …., 3.º Frente, 2410 Leiria, €88,92 referentes a eletricidade (cf. fatura junta como doc. n.º 28 do requerimento inicial);
57. Durante o mês de junho de 2022 foram gastos, na R. Quinta de S. ..., n.º…., , 3.º Frente, 2410 Leiria, €72,66 referentes a eletricidade (cf. fatura junta como doc. n.º 29 do requerimento inicial);
58. Durante o mês de maio de 2022 foram gastos, na R. Quinta de S. ..., n.º …., 3.º Frente, 2410 Leiria, €69,44 referentes a eletricidade (cf. fatura junta como doc. n.º 30 do requerimento inicial);
59. Durante o mês de abril de 2022 foram gastos, na R. Quinta de S. ..., n.º ….., 3.º Frente, 2410 Leiria, €65,79 referentes a telecomunicações (cf. fatura junta como doc. n.º 31 do requerimento inicial);
60. Durante o mês de maio de 2022 foram gastos, na R. Quinta de S. ..., n.º ……, 3.º Frente, 2410 Leiria, €67,45 referentes a telecomunicações (cf. fatura junta como doc. n.º 32 do requerimento inicial);
61. Durante o mês de março de 2022 foram gastos, na R. Quinta de S. ..., n.º …., 3.º Frente, 2410 Leiria, €65,52 referentes a telecomunicações (cf. fatura junta como doc. n.º 33 do requerimento inicial);
62. Em 15.05.2022 a Ordem dos Engenheiros Técnicos disponibilizou ao Requerente, para pagamento, o valor de €79,80, referente a quotas do período compreendido entre janeiro e junho de 2022 (acordo e correio junto como doc. n.º 34 do requerimento inicial).

IV – Do Direito
Foi requerido no presente Processo a suspensão de eficácia do despacho do Ministro da Administração Interna que determinou a demissão do aqui Recorrente.

Decidiu o Tribunal a quo que “(…) Face ao exposto, julgo totalmente improcedente o presente processo cautelar e, em consequência, absolvo a Entidade Requerida do pedido.”

Refira-se desde já que a decisão proferida em 1ª instância, será para manter.

Efetivamente, no que ao “direito” diz respeito, e no que aqui releva, discorreu-se no discurso fundamentador da Sentença Recorrida:
“(…) Vejamos então se, no caso concreto, e atenta a factualidade dada como provada, se encontram preenchidos os requisitos necessários à concessão da providência cautelar requerida.
- Do fumus boni iuris
Como vimos já, refere a este propósito o Requerente que a decisão de reposição de quantias (No original) cuja eficácia aqui pretende ver suspensa padece de diversos vícios de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, que de seguida melhor serão analisados.
Efetivamente, cumpre antes de mais precisar que o n.º 1 do artigo 120.º do CPTA exige que, verdadeiramente, exista uma probabilidade de procedência da pretensão formulada no processo principal, o que significa que estamos aqui perante um fumus boni iuris na sua formulação positiva, tendo de se verificar “uma aparência de que o requerente ostenta, de facto, o direito que considera lesado pela atuação administrativa” (…)
Não significa isto que, em sede de processo cautelar, o juiz antecipe a decisão do mérito da causa principal, tratando-se “de mera verosimilhança o juízo de probabilidade da existência do direito invocado, não sendo de exigir a prova da existência (…) nos termos em que deverá ser produzida no âmbito da ação, bastando que se indicie uma probabilidade séria, suficientemente forte” (v. acórdão do TCAS de 30.09.2004, Proc. n.º 00290/04, disponível em www.dgsi.pt).
Ora, os vícios de violação de lei que são assacados pelo Requerente ao ato que determinou que lhe fosse aplicada a pena de demissão reconduzem-se, em primeira mão, a ilegalidades que aponta ao modo como foi conduzido o próprio procedimento disciplinar, bem como ao ato de acusação, e ao despacho que anulou a primeira acusação, vícios que serão apreciados em primeiro lugar.
Alega num primeiro momento o Requerente que foi privado de ser acompanhado pelo seu mandatário, constituído no âmbito do procedimento, tendo requerido a alteração da primeira data designada para o seu interrogatório para que o mandatário pudesse estar presente, o que foi indeferido.
Ora, nos termos do Estatuto Disciplinar da PSP (EDPSP), aprovado pela Lei n.º 37/2019, de 30 de maio, o arguido em processo disciplinar pode constituir advogado em qualquer fase do processo, exercendo este os direitos que a lei reconhece ao arguido – cf. artigo 73.º deste diploma legal.
Pode ainda ler-se no artigo 7.º deste Estatuto que lhe serão subsidiariamente aplicáveis os princípios gerais e normas do direito sancionatório, bem como da legislação processual penal. E, como é sabido, no âmbito do processo penal, o arguido tem o direito legalmente garantido de ser assistido pelo seu defensor em todos os atos processuais em que participe, conforme resulta da al. f) do n.º 1 do artigo 61.º do Código de Processo Penal (CPP) – o que inclui, naturalmente, o seu interrogatório.
Revertendo ao caso concreto temos que, efetivamente, existiu uma primeira notificação do Requerente para comparecer em interrogatório, tendo este solicitado o seu adiamento propondo datas alternativas, alegando a indisponibilidade de se fazer acompanhar pelo seu mandatário. Este requerimento, conforme afirma, foi-lhe indeferido, com fundamento na necessidade de pugnar pela celeridade do andamento do processo e de cumprimento dos prazos processuais. Com efeito, o Requerente compareceu em interrogatório, desacompanhado do seu mandatário, tendo declarado não pretender pronunciar-se sobre a matéria.
Sucede apenas que resulta do processo instrutor, bem como da acusação e do relatório final, que este interrogatório não foi tido em conta nem apreciado pelo instrutor do processo para efeitos de determinação da sua pena, tendo ao invés sido apreciadas, para este efeito, as suas declarações tomadas em interrogatório que a Entidade Requerida posteriormente levou a cabo, e para o qual foram notificados o Requerente e o seu mandatário.
Significa isto que, sem prejuízo de efetivamente o Requerente não ter sido acompanhado do seu mandatário naquele primeiro interrogatório, foi-lhe dada a possibilidade de prestar novas declarações, desta feita devidamente acompanhado pelo seu defensor, tendo sido estas as declarações valoradas na decisão final do processo disciplinar, pelo que nenhuma ilegalidade foi cometida quanto a esta matéria.
Alega ainda o Requerente que foi ilegalmente prorrogado o prazo de instrução, por terem sido ultrapassados os prazos a que faz referência o artigo 82.º do EDPSP
(…)
De facto, e como resulta do probatório, foi solicitado pelo instrutor do processo em 24.09.2020 a prorrogação do prazo da instrução, pelo período de 90 dias, sendo aí afirmado que a instrução terminaria em 28.09.2020, face ao prazo definido no n.º 1 do artigo 82.º do EDPSP, acima transcrito.
Inexiste, no caso dos autos, um despacho que formalmente declare a abertura da instrução do procedimento, mas afigura-se-nos que a primeira diligência instrutória do procedimento foi levada a cabo através de ofício dirigido ao Comandante da 2.ª Divisão Policial do Comando solicitando informações sobre a conduta do Requerente, o que sucedeu em 25.05.2020, data em que pode dar-se como iniciado o período de instrução.
Ora, contabilizando-se o prazo de noventa dias a que faz referência o n.º 1 do artigo 82.º do EDPSP nos termos do artigo 2.º da Lei n.º 37/2019, que remete por seu turno para o Código do Procedimento Administrativo nesta matéria, e portanto para a al. c) do seu artigo 87.º, o que implica a sua suspensão aos sábados, domingos, e feriados, temos que o nonagésimo dia do prazo de instrução do processo disciplinar foi o dia 29.09.2020, dia em que, justamente, o Comandante Superintendente deferiu o pedido de prorrogação deste prazo feito pelo instrutor do processo, por mais 90 dias.
Afigura-se-nos, assim, que nenhuma ilegalidade foi cometida neste ponto.
Ainda a propósito do decurso do procedimento, insurge-se o Requerente contra o despacho de anulação da acusação, por entender que o instrutor do procedimento não tem legitimidade para anular a acusação que o próprio formulou, e que o fez sem norma habilitante para tal.
Verificamos, efetivamente, que existiu uma primeira acusação deduzida contra o Requerente, no âmbito da qual era proposta a pena de suspensão, tendo esta acusação sido anulada por, alegadamente, o instrutor ter considerado ser necessária uma reavaliação da prova produzida, que permitia antever uma maior gravidade nos factos praticados pelo Requerente. Após esta anulação, foi deduzida nova acusação, desta feita com a proposta da aplicação de uma pena de demissão ou de aposentação compulsiva. Afirma o Requerente que esta anulação da acusação, e subsequente prolação de novo despacho acusatório, coloca em causa princípios básicos do direito, como sejam os princípios da boa fé, legalidade, confiança e segurança jurídica.
Porém, conforme consta já do relatório final do procedimento disciplinar, vem a jurisprudência dos nossos tribunais superiores emitindo pronúncia acerca desta matéria em sentido desfavorável ao que vem preconizado pelo Requerente, afirmando que nada obsta que, em processo disciplinar, o instrutor reformule a acusação, “com vista à completa articulação dos factos e circunstâncias que envolvem responsabilidade disciplinar do arguido”, o que é feito nos termos do n.º 2 do artigo 123.º do CPP, norma que é neste âmbito aplicável por força do artigo 7.º do EDPSP, e que confere ao instrutor a possibilidade de anular a acusação originariamente deduzida (…).
Chega mesmo a afirmar-se, no acórdão daquele Supremo Tribunal de 17.01.1995 (Proc. n.º 0347/13), em situação em tudo idêntica à dos autos e ao abrigo do EDPSP, que pode ordenar-se oficiosamente a reparação de qualquer irregularidade, incluindo as da acusação. “Pode assim a entidade detentora do poder disciplinar, se se aperceber que a peça acusatória se encontra deduzida em termos vagos e genéricos – o que pode vir a acarretar nulidade insuprível geradora de vício de forma, com a consequente repetição do processado a partir da data dessa dedução e inclusive, ordenar a reformação, retificação ou repetição da elaboração da nota de culpa”. Essencial é que, feita esta reformulação, seja dada ao arguido nova oportunidade de defesa, o que in casu sucedeu, tendo o Requerente apresentado defesa escrita após ambas as acusações, sendo certo ainda que a sua defesa apresentada após a segunda acusação foi devidamente tida em conta no relatório final.
Percorridas as ilegalidades assacadas pelo Requerente ao procedimento administrativo e ao ato de acusação, vejamos agora os vícios de violação de lei que o Requerente também imputa ao despacho cuja eficácia pretende suspender.
Começando pelos alegados vícios de violação de lei com base em erro nos pressupostos de facto, rapidamente verificamos que o Requerente não nega a ocorrência dos factos em que se baseiam a aplicação da pena ou a acusação, referindo ao invés que, designadamente, o não comparecimento de dez em dez dias no posto clínico da PSP ocorreu, e também que se encontra de facto afastado do serviço. O Requerente procura assim, apenas, justificar as suas condutas com o seu quadro clínico, que lhe impede deslocações frequentes, e com o facto de se encontrar a aguardar uma cirurgia que ainda não ocorreu. Justifica a ausência e o não comparecimento junto do posto com as suas dificuldades de locomoção.
Só que destas circunstâncias a Entidade Requerida não duvida em momento em algum, não pondo em causa a complexidade do quadro clínico do Requerente, preocupando-se apenas com o facto de, durante quase um ano, o Requerente não comparecer junto do posto médico da PSP sem qualquer justificação para o efeito, tendo sido necessário um processo disciplinar para que o Requerente sentisse a necessidade de justificar o incumprimento dessa determinação. Verificamos, ademais, que em sede de prestação de declarações, o Requerente afirmou que atentas as suas dificuldades de locomoção preferiu ficar em casa sossegado a deslocar-se, o que a Entidade Requerida tomou por desinteresse e falta de cooperação com o serviço, em conclusão que o Tribunal não pode censurar.
Já no que diz respeito à impossibilidade de notificação do Requerente através do correio eletrónico, refere-se nos artigos 73.º e 74.º do requerimento inicial que a mesma se deve ao facto de não ter acesso à caixa de correio eletrónico profissional, que entende ser-lhe alheia, uma vez que solicitou apoio informático por diversas vezes. Mais uma vez não foi o que afirmou em sede de declarações, em que declarou não ter acesso à caixa de correio eletrónico desde 2015. Não comprova, ademais, nem tenta fazê-lo, que solicitou o apoio informático a que se refere. Depois, afirma que nunca impossibilitou a Requerida de o notificar através de carta, o que também não corresponde à realidade, encontrando-se documentada e vertida no probatório a deslocação dos serviços da Entidade a pelo menos três residências conhecidas do Requerente, incluindo a da Rua Fernando Gusmão a que se refere no artigo 87.º do requerimento inicial, para efeitos de proceder a notificações diversas, diligências que nunca surtiram efeito. E não pode o Tribunal, uma vez mais, censurar o entendimento da Requerida de acordo com o qual também a falta de comunicação da residência habitual implica falta de cooperação com o serviço.
Refere ainda o Requerente que sempre apresentou todos os atestados médicos e justificações necessários à sua ausência do serviço, não compreendendo o motivo de ser tido como ausente sem justificação desde 06.09.2019. Uma vez mais se verifica que o único elemento que poderia permitir concluir pela legitimidade da sua ausência é uma declaração médica que apresentou já só em sede de processo disciplinar, em que se declara o agravamento do seu quadro clínico e o desaconselhamento da condução. Assim se verifica, novamente, que só após a instauração do processo disciplinar o Requerente sentiu a necessidade de justificar a sua ausência ao serviço e também a falta de comparência junto do posto médico da PSP, sendo legítima a conclusão da Entidade Requerida de que as faltas em que assim incorreu têm de ser tidas como injustificadas.
Por fim, no que concerne ao que alega nos artigos 103.º e seguintes do seu requerimento inicial, a propósito de ser obrigação do superior hierárquico a atribuição de trabalho compatível ou a sujeição a uma junta médica, afigura-se-nos que tal não se assume como uma qualquer ilegalidade da decisão de aplicação da pena de demissão, não podendo conduzir à suspensão da sua eficácia, uma vez que está em causa apenas, neste processo disciplinar, a não apresentação do Requerente no posto médico da PSP e no serviço, bem como a impossibilidade de proceder à sua notificação.
Temos ainda que é entendimento do Requerente que a decisão padece de um vício de violação de lei, desta feita por erro nos pressupostos de direito, na medida em que a aplicação de uma pena de demissão se apresenta como violadora do princípio da proporcionalidade, o que refere nos artigos 110.º e seguintes do seu requerimento inicial.
Sucede apenas que o Requerente refere, genericamente, que a aplicação da pena de demissão é violadora deste princípio, e de outros, não os densificando nem alegando, em concreto, o motivo pelo qual entende que a aplicação da pena de demissão, no caso concreto, é desproporcional – além das alegações que atrás reproduziu e que já foram, acima, devidamente analisadas.
De facto, esta matéria foi analisada pelo instrutor do processo disciplinar e foi feita constar do relatório final do procedimento, tendo sido justificado pela Entidade Requerida o motivo pelo qual foi aplicada a pena de demissão e pelo que foi entendido que a conduta do Requerente inviabilizou a manutenção da relação funcional.
O Requerente, contudo, não rebate quaisquer dos argumentos aí reproduzidos pela Requerida, limitando-se aqui a afirmar que a pena aplicada é desproporcional, sem explicitar as razões pelas quais, no caso concreto, assim entende, desrespeitando o ónus de alegação que lhe é imposto pelo artigo 5.º do CPC e que, respeitado, permitiria ao Tribunal adequadamente apreciar esta alegada violação do princípio da proporcionalidade.
Resulta do que vem sendo exposto, portanto, que é improvável que a pretensão do Requerente obtenha provimento em sede principal, atenta a inverosimilhança da procedência dos vícios de violação de lei que invoca, pelo que resta concluir que não se encontra verificado, no caso concreto, o fumus boni iuris que é exigido pelo n.º 1 do artigo 120.º do CPTA.
Sendo cumulativos os requisitos de concessão da providência, conforme resulta expressamente dos normativos acima descritos, verifica-se a necessária impossibilidade de conceder provimento à pretensão cautelar do Requerente com a não verificação de apenas um deles, pelo que fica prejudicado o conhecimento do requisito do periculum in mora e da ponderação de interesses, nos termos do n.º 2 do artigo 608.º do CPC, havendo que julgar totalmente improcedente a presente ação, com a consequente absolvição da Entidade Requerida do pedido, o que a final se determinará.

Vejamos:
O presente recurso vem interposto da sentença proferida em 12.09.2022 no TAF de Leiria que julgou improcedente o presente processo cautelar e, em consequência, absolveu a Entidade Requerida do pedido formulado pelo Requerente, ora Recorrente, de suspensão de eficácia de ato administrativo, que visava a suspensão da decisão da Entidade Requerida de 23.06.2022, pela qual lhe foi aplicada pena disciplinar de demissão no âmbito de processo disciplinar n.º 2020LSB00114DIS, por ter sido entendido improvável que a pretensão do Requerente pudesse vir a obter provimento em sede principal, atenta a inverosimilhança da procedência dos vícios de violação de lei que invoca, concluindo que não se encontra verificado, no caso concreto, o fumus boni iuris que é exigido pelo n.º 1 do artigo 120.º do CPTA.

Entende o Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro nos pressupostos de facto e de direito, por considerar que a fundamentação de indeferimento para a alteração do interrogatório proferido por despacho a 22 de setembro de 2020, não existe e é ilegal e inconstitucional.

Mais entende o Recorrente que o despacho proferido pelo Instrutor Disciplinar de 9 de março de 2021, carece de legitimidade, colocando em causa princípios basilares do direito, como o princípio da boa-fé processual, o princípio da legalidade, e da confiança e segurança jurídica.

Por considerar que se inverificavam os vícios suscitados, pronunciou-se o tribunal a quo no sentido da improcedência da presente Providência, em decorrência do não preenchimento do fumus boni iuris, por considerar não provável obtenção de provimento na Ação Principal, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 120.º do CPTA.

Em contraponto ao decidido pelo tribunal de 1ª Instância entende o Recorrente que o Tribunal a quo desvalorizou o facto do Recorrente, ter sido sujeito a um primeiro interrogatório, em data que o seu mandatário havia referido estar impossibilitado de o acompanhar, invocando justo impedimento, mais alegando que a fundamentação de indeferimento para a alteração do interrogatório, se mostrou ilegal e inconstitucional, tal como o despacho de prorrogação do prazo de instrução.

Referiu-se a este respeito na Sentença Recorrida que “Este requerimento, conforme afirma, foi-lhe indeferido, com fundamento na necessidade de pugnar pela celeridade do andamento do processo e de cumprimento dos prazos processuais. Com efeito, o Requerente compareceu em interrogatório, desacompanhado do seu mandatário, tendo declarado não pretender pronunciar-se sobre a matéria.
Sucede apenas que resulta do processo instrutor, bem como da acusação e do relatório final, que este interrogatório não foi tido em conta nem apreciado pelo instrutor do processo para efeitos de determinação da sua pena, tendo ao invés sido apreciadas, para este efeito, as suas declarações tomadas em interrogatório que a Entidade Requerida posteriormente levou a cabo, e para o qual foram notificados o Requerente e o seu mandatário.
Significa isto que, sem prejuízo de efetivamente o Requerente não ter sido acompanhado do seu mandatário naquele primeiro interrogatório, foi-lhe dada a possibilidade de prestar novas declarações, desta feita devidamente acompanhado pelo seu defensor, tendo sido estas as declarações valoradas na decisão final do processo disciplinar, pelo que nenhuma ilegalidade foi cometida quanto a esta matéria”.

Mesmo que se admitisse que a inicial inquirição do arguido se mostrava irregular pela ausência do seu mandatário, tendo havido segunda inquirição já com a sua presença, sempre se mostraria sanada qualquer eventual irregularidade precedente, tanto mais que o arguido na primeira inquirição declarou “não pretender pronunciar-se sobre a matéria,” pelo que se não verificou qualquer auto incriminação.

Em qualquer caso, como sumariado no Acórdão nº 60/22.3BCLSB, de 21.04.2022, sempre se dirá que “O direito à não autoincriminação, que se integra no princípio nemo tenetur se ipsum accusare, beneficia de proteção constitucional, mas não configura um direito absoluto, podendo ser objeto de restrições, conforme decorre do artigo 18.º, n.º 2, da CRP, mesmo no âmbito do processo criminal.”

Mais refere o Recorrente que o despacho de prorrogação do prazo de instrução apenas foi proferido porque o processo disciplinar que lhe foi instaurado estava na iminência de prescrever, pelo que foi ilegal.

Como referido em 1ª instância e aqui se ratifica, “(…) contabilizando-se o prazo de noventa dias a que faz referência o n.º 1 do artigo 82.º do EDPSP nos termos do artigo 2.º da Lei n.º 37/2019, que remete por seu turno para o Código do Procedimento Administrativo nesta matéria, e portanto para a al. c) do seu artigo 87.º, o que implica a sua suspensão aos sábados, domingos, e feriados, temos que o nonagésimo dia do prazo de instrução do processo disciplinar foi o dia 29.09.2020, dia em que, justamente, o Comandante Superintendente deferiu o pedido de prorrogação deste prazo feito pelo instrutor do processo, por mais 90 dias.
Afigura-se-nos, assim, que nenhuma ilegalidade foi cometida neste ponto”.

Mesmo que assim não fosse, é pacifico na doutrina e na Jurisprudência que o referido prazo é meramente instrumental e ordenador, não constituindo o seu incumprimento qualquer irregularidade suscetível de determinar a anulação do correspondente processo.

Referencia-se a este propósito, entre muitos outros, o ac. STA n.º 01086/11, de 25.06.2013, ac. n.º 135/06, de 13.02.2007, ac. n.º 0663/06, de 01.02.2007, ac. n.º 2017/02, de 20.03.2003, ac. n.º 39946, de 16-06-1998 e ac. n.º 30355, de 17-12-1997.

Insurge-se ainda o Recorrente contra o despacho de anulação da acusação, por entender que entidade detentora do poder disciplinar, não é o Instrutor Disciplinar, sustentando que está ferido de ilegalidade e ilegitimidade, colocando em causa princípios basilares do direito, como o princípio da boa-fé processual, o princípio da legalidade, e da confiança e segurança jurídica.

Detetando o instrutor de Processo Disciplinar qualquer irregularidade na Acusação sempre poderá proceder à sua devida reformulação, estando apenas obrigado a facultar o contraditório ao arguido relativamente à nova acusação.

Nulidade verificar-se-ia caso a acusação fosse reformulada e não fosse facultado novo prazo ao arguido para apresentar a sua defesa.

Como se discorreu no Acórdão do STA de 12.01.2012, Proc. n.º 0863/11, “Necessário é que essa reformulação da acusação seja devidamente notificada ao arguido, e que a este seja dada nova oportunidade de defesa em relação à acusação reformulada». (Citam-se, no mesmo sentido, o acórdão da Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo de 24-9-1996, processo n.º 38304, publicado em Apêndice ao Diário da República de 15-3-99, página 6197, e o acórdão do Pleno de 9-7-1992, processo n.º 27365, publicado em Apêndice ao Diário da República de 30-11-94, página 654, e BMJ n.º 419, página 517.
Na mesma linha decidiu este Supremo Tribunal Administrativo nos seguintes acórdãos: de 17-1-1995, processo n.º 34713, publicado em Apêndice ao Diário da República de 18-7-97, página 449; de 20-12-1990, processo n.º 27974, publicado em Apêndice ao Diário da República de 22-3-95, página 7618; de 10-7-1997, processo n.º 37218, publicado em Apêndice ao Diário da República de 12-8-2001, página 5751. )
Trata-se de jurisprudência pacífica pelo que não de veem razões para a alterar.
De resto, a reformulação da nova acusação implica a revogação, por substituição, da primeira, pelo que subsiste no processo apenas uma única acusação.”

O único pressuposto a atender aquando da reformulação da acusação é a necessidade de se proceder a nova notificação da mesma, o que in casu sucedeu, tendo o Recorrente apresentado defesa escrita após ambas as acusações, improcedente, assim, também a arguição deste vício.

Do mesmo modo, mal se compreende o recurso à analogia feita pelo Recorrente, relativamente às atribuições do Ministério Público quanto ao inquérito criminal, quando afirma que também não lhe cabe, ao proferir despacho de acusação, notificá-lo ao arguido e demais partes, procedendo à correção dos lapsos de que padeça a acusação e à integração de lacunas, uma vez que essa competência caberá ao Juiz de Instrução Criminal.

Independentemente da possibilidade, ou não, do Ministério Público poder proceder à declaração de nulidade de acusação formulada, a referida analogia não procede nem tem cabimento, por se tratarem de questões de natureza diversa, não comparáveis.

Finalmente, fazendo depender o artigo 120.º do CPTA o deferimento das providências cautelares da existência cumulativa dos dois requisitos positivos enunciados no n.º 1, o “periculum in mora” e o “fumus boni iuris”, e ainda, segundo o n.º 2, da inexistência de danos superiores decorrentes da adoção da providência relativamente àqueles que possam resultar da sua não adoção, no âmbito do juízo de ponderação “dos interesses públicos e privados em presença”, sendo a necessidade de preenchimento dos referidos pressupostos, de natureza cumulativa, tendo sido entendido inverificar-se o preenchimento do fumus boni iuris, está, por natureza, e desde logo, comprometida a procedência da presente Providência Cautelar.

Sendo o preenchimento dos referidos requisitos cumulativos, a não verificação de um dos requisitos positivos determina necessariamente o indeferimento da providência.

Na realidade, o Requerente, como lhe competia, não logrou sequer demonstrar o preenchimento do “fumus boni iuris”, em face do que não merece censura a decisão proferida em 1ª instância.

Efetivamente, como afirmado em 1ª Instância, “Resulta do que vem sendo exposto, portanto, que é improvável que a pretensão do Requerente obtenha provimento em sede principal, atenta a inverosimilhança da procedência dos vícios de violação de lei que invoca, pelo que resta concluir que não se encontra verificado, no caso concreto, o fumus boni iuris que é exigido pelo n.º 1 do artigo 120.º do CPTA”.

Aqui chegados, atento tudo quanto supra se expendeu supra, não se vislumbram razões para censurar a decisão recorrida.
* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, negar provimento ao Recurso, confirmando a Sentença Recorrida.

Custas pelo Recorrente

Lisboa, 17 de novembro de 2022
Frederico de Frias Macedo Branco

Alda Nunes

Lina Costa