Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03514/09
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:05/24/2011
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:IRC. NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA.
CONHECIMENTO EM SUBSTITUIÇÃO.
DECISÃO SURPRESA.
DUPLA TRIBUTAÇÃO.
REINVESTIMENTO DE MAIS VALIAS.
Sumário:I) - Havendo a obrigação de conhecer do vício de dupla tributação relativamente a uma correcção técnica, vício suscitado pela recorrente nas suas alegações e já invocado na petição de inicial e não se vislumbrando na sentença recorrida qualquer referência directa ou implícita a tal questão, padece a mesma de omissão de pronúncia, encontrando-se ferida da nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 668º do CPC, procedendo, em consequência, a 1ª conclusão da alegação da recorrente.
II) - E haverá que conhecer em substituição do mérito do recurso contencioso interposto pelo recorrente, pois o processo reúne todos os elementos para decidir (cfr. artigo 715º n.º 1 do CPC).
III) - De harmonia com a regra da substituição da Relação ao tribunal recorrido (artº 715º, nº 2 do CPC, na sua actual redacção) os poderes de cognição deste Tribunal Central Administrativo Sul incluem todas as questões que ao tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução que deu ao litígio.
IV) -É também pacífico que a obrigação de substituição do TCAS ao tribunal recorrido, imposta pelo nº 2 do artº 715º do CPC, existe mesmo que o recorrido – como aconteceu «in casu»- não tenha lançado mão do disposto no artº 684º-A, nº 1 do mesmo Código devendo, como as partes não se pronunciaram sobre o objecto desta decisão, o relator deste processo, antes de proferir aquela decisão, a fim de evitar decisões surpresa, mandar notificar cada uma das partes para, em dez dias, se pronunciarem sobre as questões objecto dessa decisão, nos termos do nº 3 do artº 715º.
V) -O artigo 3°, n° 3, do Código de Processo Civil é plenamente aplicável em processo judicial administrativo e tem como finalidade declarada evitar, proibindo-as, as denominadas decisões - surpresa.
Assim, caso não seja dada possibilidade à Recorrente de se pronunciar sobre um facto decisivo para a decisão recorrida, o Acórdão em causa incorreria em nulidade, por violação do principio do contraditório e do artigo 3°, do Código de Processo Civil.
VI) -O artigo 3º nº. 3 do C. Processo Civil estipula que o Juiz deve observar e fazer cumprir ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.
VII) -O princípio do contraditório, que é um dos princípios fundamentais do nosso direito processual civil, assegura não só a igualdade das partes, como, no que aqui interessa, é um instrumento destinado a evitar as decisões -surpresa.
VIII) -Tendo o recurso sido decidido com base nos factos alegados e provados, factos esses de que a recorrente teve conhecimento e contra os quais poderia esgrimir os argumentos que entendesse convenientes, na altura própria, a decisão tomada no acórdão em nada afecta quer a pretensão deduzida, quer a defesa.
IX) -Acrescente-se que a audição das partes será dispensada nos termos do artigo 3º nº. 3 em casos de manifesta desnecessidade e naqueles em que, objectivamente, as partes não possam alegar de boa fé, desconhecimento das questões de direito ou de facto a decidir pelo Juiz e das respectivas consequências.
X)- A dupla tributação configura uma situação em que o mesmo facto tributário se integra na hipótese de incidência de duas normas tributárias diferentes, o que implica, de um lado, a identidade do facto tributário e, do outro, a pluralidade de normas tributárias.
XI)- Fundamental para que haja dupla tributação é que ambas as normas colidam i. é, se apliquem ao caso concreto, originando assim duas pretensões tributárias; e, para que haja uma efectiva dupla tributação ou “in praxi” é mister que ocorra um concurso real de normas em que o mesmo facto recai na previsão de duas normas tributárias pertencentes a ordenamentos distintos, inexistindo mecanismos que paralisem a eficácia de qualquer delas.
XII)- Mas também existe a chamada dupla tributação virtual ou “in thesi” decorrente do concurso aparente o qual existe quando o mesmo facto recai na esfera de incidência de duas normas sem que haja a aplicação concreta de ambas, ou havendo a aplicação apenas de uma. Isto por força de determinadas regras em vigor à data dos factos insertas em nos ordenamentos legislativos contendo normas de conflitos proibindo a dupla tributação como factor de insegurança jurídica, ou em tratados contra a dupla tributação que regem as relações entre os Estados contratantes, em que a dupla tributação existiria caso ambos os ordenamentos fossem aplicados isoladamente.
XIII) - Independentemente da recorrente ter ou não manifestado a intenção de reinvestimento do saldo das mais valias obtidas, a verdade é que não foi posto em causa pela Administração tributária que a recorrente, de facto, procedeu ao reinvestimento da mais valia apurada no exercício em causa de 1999 no subsequente exercício de 2000, portanto dentro do lapso de tempo referido no artigo 44° do CIRC.
XIV) - O que releva em direito fiscal, são as realidades económicas, as situações reais que expressam a percepção do rendimento ou a capacidade contributiva, e não as meras roupagens com que, por vezes, se apresentam, exteriormente, pelo que a mais valia apurada em 1999 foi, de facto, reinvestida no exercício de 2000, não obstante não ter sido formulada a intenção expressa de reinvestimento, não pode ser tributada, atento o estatuído no artigo 44.° do CIRC, na redacção, então, vigente.
XV)- Entendimento contrário, como o que foi perfilhado pela AT e pela sentença sob recurso, traduziria uma situação de dupla tributação, porquanto, no pressuposto da isenção de tributação da mais valia, a impugnante, em conformidade com o disposto no artigo 44.°/6 do CIRC e 7.°/7 da Lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro, procedeu à correcção do montante das reintegrações e amortizações aceites como custo, deduzindo o valor da mais valia alegadamente não tributada o que concerne aos exercícios dos anos de 2000 e 2001.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACORDA-SE, EM CONFERÊNCIA, NESTE TRIBUNAL:


1. A COMPANHIA PORTUGUESA RÁDIO A..., S.A., veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do TT de Lisboa que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação adicional de IRC do exercício de 1999, relativamente à correcção técnica das mais valias, alegadamente, não reinvestidas, no montante global de €1.800.346,94, incluindo juros compensatórios.
São estas as conclusões das alegações do recurso e que definem respectivo objecto:
A) O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, de 17 de Abril de 2009, que julgou "a presente impugnação improcedente, com a consequente manutenção da liquidação adicional sindicada na ordem jurídica", sendo que a instância em causa tem origem na impugnação judicial apresentada pela ora Recorrente do acto de liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios, referente ao exercício de 1999, com o n.°8310002870 no montante global de € 1.800.346,94.
B) Em tal impugnação, a ora Recorrente demonstrou a sua discordância relativamente às várias correcções efectuadas pela Administração Tributária, embora no âmbito do presente recurso apenas pretende discutir apenas a legalidade da correcção efectuada relativa às mais-valias, no montante de € 4.325.774,27, resultantes da não aceitação do reinvestimento dos valores de realização obtidos na alienação de bens do activo imobilizado corpóreo.
C) Entende, pois, a Recorrente que a sentença recorrida assenta em erro de julgamento, concretamente no que respeita à análise da matéria de facto e de direito que lhe subjaz.
D) De acordo com a argumentação exposta pela Administração Tributária:
"Ao exercício de 1999, o contribuinte procedeu à alienação de bens do seu activo imobilizado corpóreo, tendo apurado com esta operação uma mais-valia fiscal, no montante de (anexos 27).
Nos termos do artigo 44° do CIRC, no verso do mapa de Mais ou Menos Valias, o contribuinte mencionou a intenção de não reinvestir o valor de realização dos bens alienados, neste exercício.
No entanto, não acresceu ao lucro tributável, no Q 07 da declaração Mod. 22, o valor da mais-valia fiscal obtida nas operações acima citadas, considerado proveito nos termos do artigo 20°, alínea f) do CRIC, em conjugação com o artigo 42° do mesmo diploma, pelo que se consideram infringidos os mesmos artigos" (fls. 4 da sentença recorrida).
E) Ainda com relevância para o presente recurso, importa considerar a factualidade inscrita nas alíneas G) e H), dada como provada pela decisão recorrida:
Em 15-7-2002, a impugnante dirigiu à Direcção de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária (DSP/7) um requerimento, através do qual solicitou que aqueles Serviços considerassem que ao preencher a Declaração Anual do exercício de 2000 mencionou, por lapso, no Quadro 10, campo A 328, o valor de 867.239.878$00 como valor reinvestido, quando devia ter mencionado o valor de 2.451.833.294$00, que foi o que efectivamente reinvestiu em 2000 (cfr. doc. de fls. 47, que se dá por integralmente reproduzido);
H) A impugnante entregou, em 31-5-2000, a declaração Modelo 22 de IRC, referente ao exercício de 1999, exercício no qual apurou a matéria colectável de € 36.006.163,29 e imposto a pagar no montante de € 6.688.830,05, e efectuou investimentos em imobilizado corpóreo, os quais não foram considerados para efeitos de reinvestimento dos valores de realização obtidos nesse ano ou em anos anteriores (cfr. declarações Modelo 22 e Anual, a fls. 85 a 87 e 9 a 95 do PAT apenso, que se dão por integralmente reproduzidos)" (fls. 5 da sentença recorrida.
F) Em suma, na decisão recorrida resume-se a questão ora em análise da seguinte forma: “saber se se deve aceitar a aplicação do regime do reinvestimento dos valores de realização obtidos na alienação de bens do activo imobilizado corpóreo, previsto no artigo 44° do Código do IRC, não obstante não ter sido declarado no mapa de mais e menos valias a intenção de reinvestimento" (fls. 6 da sentença recorrida).
G) Atenta a argumentação aduzida na decisão recorrida, que conclui pela manutenção da correcção em análise, a ora Recorrente, usando expressão avançada pela própria decisão recorrida, entende que, face à matéria de facto e de direito pressupostas, é de facto necessário "melhor juízo" para elucidação da questão controvertida, pois só desta forma se logrará alcançar a solução justa e legal para a mesma, no sentido da necessidade de se considerar ilegal a correcção em causa.
H) É a seguinte a tese defendida na argumentação da decisão recorrida: a factualidade em causa não legitima a consideração da existência de um lapso de preenchimento da declaração referente à manifestação da intenção de reinvestir o valor da realização, mas, ao invés uma expressa intenção de não reinvestir tal valor.
l) Sendo que os argumentos que suportam tal tese poderão resumir-se ao seguinte:
i) O requerimento dirigido pela Recorrente aos SPIT com vista à correcção do montante do reinvestimento mencionado a declaração anual do ano de 2000 apenas foi elaborado em 15-7-2002 (mais de um ano após o termo do prazo legal de entrega da referida declaração - 30-6-2001 -, mais de dois anos após a entrega da declaração de rendimentos onde foi praticado o alegado lapso de preenchimento (31-5-2000), e em momento posterior 10 da conclusão da acção inspectiva e da própria emissão e notificação da liquidação adicional de IRC de 1999);
ii) A Recorrente não apresentou uma declaração de substituição Mod. 22 relativa ao ano de 1999 no prazo legal previsto, nem mesmo um requerimento solicitando a correcção do Mapa de mais e menos valias em data mais próxima à do cometimento do alegado lapso;
iii) Apurou-se que nas declarações de rendimentos e anual relativas ao exercício de 1999 foi efectuado investimento em imobilizado corpóreo, não tendo a impugnante considerado esse investimento para efeitos de concretização do reinvestimento dos valores de realização obtidos nesse ano, ou em anos anteriores ainda por concretizar.
iv) Considerar o contrário frustraria o regime legal previsto para o reinvestimento dos valores de realização, concretamente no que respeita à obrigação de manifesta", na declaração de rendimentos do exercício da realização, a intenção de efectuar o reinvestimento.
J) Atento o exposto, deverá considerar-se que, não só a decisão recorrida não versa sobre a principal problemática em causa, alegada tempestivamente pela impugnante ora Recorrente e que se traduz na questão substancial que deveria ter sido assumida como a principal questão a decidir em sede de impugnação, como ainda, ao invés, erige como principal preocupação e critério jurídico definidor da solução da questão controvertida o critério temporal de reparação do lapso incorrido pela ora Recorrente. Não o faz, todavia, correctamente.
K) De tal forma que, colocar o assento tónico naquela questão puramente cronológica constitui erro de julgamento materializado em patente erro na interpretação do direito constituído e positivado pelo legislador. Assim, há antes de mais que perceber que:
- em 31/5/2000 a Recorrente entregou a declaração de rendimentos relativa ao exercício de 1999, onde foi efectivamente praticado lapso no preenchimento;
- em 15/7/2002 a Recorrente remeteu aos SPIT requerimento com vista à correcção do montante de reinvestimento que havia mencionado na declaração anual de 2000;
- este requerimento foi efectuado após conclusão da acção inspectiva e da própria emissão e notificação da liquidação adicional de IRC de 1999.
L) De acordo com o disposto no artigo 78.° da Lei Geral Tributária, já em vigor na data dos factos relevantes, nos casos de erro na autoliquidação (n.° 2 do referido artigo) como sucede n) caso concreto, a Administração Tributária pode, por sua própria iniciativa, a todo o tempo, na medida em que o tributo não estava ainda pago mas garantido, proceder à revisão dos actos tributários dos contribuintes. Pelo que, poderia e deveria a Administração Tributária, face à patente injustiça que está em causa nos presentes autos e assente na desconsideração de lapso incorrido pela Recorrente, que efectivamente veio a reinvestir o produto resultante da realização ocorrida em 1999, ter procedido por sua própria iniciativa à correcção do referido lapso.
M) Devendo relevar-se que, "este dever de rever os actos injustos é um corolário do dever de actuação segundo o princípio da justiça, constitucionalmente consagrado (art. 266°, nº2 da CRP), pelo que não é constitucionalmente admissível o estabelecimento, pela lei ordinária, de casos de dispensa de observância de tal directriz de actuação" (cfr., Diogo Leite de Campos/Benjamim Silva Rodrigues/Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária Comentada e Anotada, 3.a Edição, Vislis Editores, página 407). Esta é a única interpretação possível atento o sentido geral da LGT de reforço dos direitos e garantias dos contribuintes, o que está em causa de forma particularmente premente nos presentes autos na medida em que é inequívoca a demonstração por parte da Recorrente do reinvestimento efectuado.
N) Atento o regime da revisão pressuposto no artigo 78.° da LGT, já em vigor na data dos factos relevantes, e de acordo com a própria cronologia daqueles factos relevada pela decisão recorrida, resulta inequívoco que, para além do facto de a Administração Tributária, mesmo após liquidação adicional, ter na sua posse todos os elementos relevantes para proceder à correcção da injustiça materializada na não aceitação do reinvestimento que foi efectivamente realizado, não deixou a Recorrente, em 2002, de suscitar a questão através de requerimento e da correcção dos valores declarados referentes ao exercício de 2000. O que não pode deixar de ser considerado quando, no ponto 65.° da impugnação judicial apresentada, a Recorrente refere que o "mero lapso de preenchimento foi imediatamente corrigido". Acrescente-se que, apesar da decisão recorrida ser totalmente omissa quanto a este ponto, a Recorrente mantém tudo o que expôs em sede de impugnação quanto à necessidade de, in casu, considerar-se o princípio da prevalência da substância sobre a forma.
O) Neste sentido, e ainda que relativamente a um outro tributo, determinou o Supremo Tribunal Administrativo (STA) que "I - Nos termos do n.° 2 do artigo 60° da Lei Geral Tributária, a audição é dispensada "no caso de a liquidação se efectuar com base na declaração do contribuinte ou a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição lhe for favorável”. // -Tendo o contribuinte feito constar na sua declaração de rendimentos, relativa ao ano de 1998, a venda de um prédio e a intenção de reinvestir o respectivo preço, a liquidação adicional, efectuada com base na falta de declaração, nos dois anos seguintes, desse reinvestimento, não precisa de ser precedida da audição do contribuinte nos termos dos n.os 1, alínea a), e 2 do artigo 60.° da Lei Geral Tributária. III - É suficiente, no caso dos autos, afirmar-se que o acto de liquidação adicional teve por fundamento "a falta de reinvestimento do valor de realização no montante de 49.879,79 € constante do anexo G da declaração de rendimentos do referido ano de mil novecentos e noventa e oito", já que o recorrente, depois de indicar a sua intenção de reinvestir o ganho proveniente da transmissão onerosa de imóvel destinado a habitação, não podia ignorar que teria que demonstrar a realização desse reinvestimento para se aproveitar da situação de não tributação prevista no n.°5 do artigo 10° do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, na redacção dada pela Lei n.°10-B/96, de 23 de Março".
P) Deste entendimento é possível extrair a conclusão segundo a qual, nos casos em que o contribuinte faz constar, na sua declaração de rendimentos, a intenção de reinvestir um determinada realização, não pode posteriormente ignorar que terá efectivamente que demonstrar e comprovar a efectiva realização desse reinvestimento para que possa beneficiar da situação de não tributação. Pelo que, na situação inversa, sempre se deverá atender ao facto de, comprovando e demonstrando o contribuinte a efectiva realização de um reinvestimento para que possa beneficiar da situação de não tributação, tal deve ser fiscalmente relevado, ainda que, por mero lapso, essa mesma intenção não tenha sido formalizada na declaração.
Q) O que traduz a necessidade de desconsiderar o lapso incorrido na declaração referente ao exercício de 1999 e relevar a substância dos montantes efectivamente reinvestidos referentes à realização obtida com a alienação em causa, comprovando também de forma inequívoca a injustiça da presente correcção e, concomitantemente, da liquidação adicional em causa.
R) Num outro prisma, deverá atender-se ao facto de, em sede de impugnação judicial, mais concretamente nos pontos 75.° e 76.°, a impugnante ora Recorrente ter referido um outro fundamento que consubstancia a ilegalidade da presente correcção e, em consequência, da liquidação adicional impugnada. Referindo-se que: "75. O que se afigura relevante e, em primeira linha o efectivo reinvestimento, e em segunda linha, a necessidade e o dever da Administração Fiscal evitar situações de dupla tributação. 76. Ora, a não aceitação desse reinvestimento, com as consequências da mesma no apuramento do lucro tributável, encontrando-se preenchidos os requisitos legais para a sua aceitação, não pode proceder até porque redundaria numa dupla tributação, uma vez que a Impugnante tem vinco, nos exercícios já decorridos de 2000 e 2001, a corrigir as amortizações dos bens resultantes do reinvestimento em causa, procedendo à sua tributação (...), nos termos do n°6 do artigo 44° do CIRC (aplicável à data dos factos), e n° 7 do art. 7° da Lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro".
S) Ora, quanto a este importante fundamento invocado pela impugnante nada resulta na sentença recorrida, o que configura omissão ilegal de pronúncia, devendo ainda relevar-se que, como forma de comprovar o alegado, a impugnante havia inclusive procedido à junção dos documentos 10 e 11.
T) De acordo com o estatuído no n.° 1 do artigo 125.° do CPPT, constitui causa de nulidade da sentença a "falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciai". E, a questão suscitada relativa à dupla tributação é, inquestionavelmente, um importante fundamento que contribui para a conclusão da ilegalidade da correcção em causa e, claro está, da ilegalidade da liquidação adicional que a acolhe. Sendo que tal questão foi, como se expôs, expressamente suscitada e alegada pela impugnante.
U) A decisão recorrida, ao não pronunciar-se sobre tal questão, é ilegal, conforme determinado no referido artigo 125.° do CPPT e no artigo 668.° e n.°2 do artigo 660.° do Código de Processo Civil. Este é também o entendimento do STA:"/ - A sentença é nula, por omissão de pronúncia, quando deixe de apreciar questões de que devesse conhecer -artigos 668°, n.° 1 do CPC e 125°, n.° 1 do CPPT. II - Essa nulidade ocorre quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questão que devesse conhecer, o que está conexionado com os seus deveres de cognição, previstos no artigo 660.° n. 2 do CPC, de acordo com o qual o juiz tem o deve de conhecer todas as questões que as partes lhe tenham submetido à apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras" (Acórdão de 18-02-2009, da 2.a Secção do STA). E ainda:"/ - A sentença é nula, por omissão de pronúncia, nos termos do disposto nos art°s 668°, n° 1, al. d) do CPC e 125° do CPPT, quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, face ao preceituado no art° 660° n°2 do CPC (Acórdão de 03-12-2008, da 2.a Secção do STA).
V) Relativamente à situação de dupla tributação que a manutenção da sentença recorrida consubstancia, sempre se dirá que, conforme evidenciado nos mapas de amortizações juntos com a petição inicial e juntos com as presentes alegações, o bem registado sob o código 530, designado por "Cabo Submarino Açores Continente - PC971", adquirido em 2000, tem vindo a ser objecto de correcções derivadas da não tributação da mais-valia apurada em 1999 e que, afinal, veio a ser tributada.
W) Ou seja, partindo do pressuposto que havia feito o reinvestimento da mais-valia obtida em 1999, através do reinvestimento na compra do bem acima identificado, adquirido em 2000, a ora Recorrente procedeu, em conformidade com o disposto no artigo 44°, n.° 6 do CIRC 3ntão em vigor e também do disposto no n.°7 do art. 7.° da Lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro, à correcção do montante das reintegrações e amortizações aceites como custo, deduzido o valor da mais-valia "alegadamente" não tributada.
X) Ao fazê-lo, por imposição legal, a Impugnante diminuiu necessariamente o valor dos custos fiscais que poderia ter deduzido em cada um dos referidos exercícios (desde 2000 a 2007), aumentando a sua matéria tributável na referida proporção e sendo tributada nesses exactos termos.
Y) Ora, a não aceitação do reinvestimento, com a consequente tributação da mais-valia, apesar de se encontrarem preenchidos os requisitos legais para a sua aceitação, acarreta uma situação de dupla tributação na medida em que, por duas vezes é tributado o mesmo rendimento.
Z) Num primeiro momento, em 1999, é tributada a mais-valia. Num segundo momento, entre 2000 e 2008, é tributado o valor de amortização não aceite fiscalmente, decorrente do pressuposto de que a mais-valia não foi tributada.
AA) Assim sendo, deverá a sentença recorrida ser revogada, e substituída por sentença que analise a impugnação judicial apresentada pela ora recorrente, com as devidas consequências legais.
TERMOS EM QUE, ATENTO O EXPOSTO, E EM ESPECIAL A VIOLAÇÃO DAS NORMAS INVOCADAS, DEVERÁ O PRESENTE RECURSO SER J JLGADO PROCEDENTE POR PROVADO E EM CONSEQUÊNCIA DEVERÁ A SENTENÇA RECORRIDA SER REVOGADA, E SUBSTITUÍDA POR SENTENÇA QUE ANALISE A IMPUGNAÇÃO JUDICIAL APRESENTADA PELA ORA RECORRENTE, COM AS DEVIDAS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.
O recorrido não contra -alegou.
A Impugnante interpôs ainda a fls. 93 e segs. recurso do despacho que considerou desnecessário proceder à inquirição das testemunhas arroladas na p.i., formulando, para tanto as seguintes conclusões:
i) Por despacho de 11/10/2007, do Meritíssimo Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, foi considerado desnecessário proceder à inquirição das testemunhas arroladas pela Recorrente, no âmbito do processo de Impugnação n.°138/2002.
ii) A referida Impugnação Judicial foi apresentada contra o acto de liquidação de IRC n.°8310002870 do exercício de 1999, no montante total de € 1.800.346,94.
iii) A Administração Tributária considerou que (i) os custos relativos a prémios atribuídos não são indispensáveis à manutenção dos proveitos, nos termos do disposto no artigo 23° do CIRC; (ii) o valor de realização de um bem do activo imobilizado não foi reinvestido; e (iii) as despesas relativas a combustíveis não estão devidamente documentadas, e como tal não constituem encargos dedutíveis, nos termos do estabelecido no artigo 41.°, nº 1, alínea h) do CIRC.
iv) Para prova da pretensão efectiva da ora Recorrente, foi arrolada, na p.i., a necessária prova testemunhal.
v) O Exmo. Senhor Juiz do Tribunal a quo considerou desnecessário proceder à inquirição das testemunhas arroladas, por considerar que a matéria assente é suficiente para a decisão de mérito.
vi) Pelo que, não sendo possível provar, unicamente com os documentos juntos à p.i , os factos alegados pela ora Recorrente,
vii) deverá, o Tribunal a quo, proceder à inquirição das testemunhas arroladas.
TERMOS EM QUE, COM O DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELERIAS, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, REVOGANDO-SE O DOUTO DESPACHO, DE 11/10/2007, DO EXMO. SENHOR JUIZ DO TRIBUNAL A QUO E, EM CONSEQUÊNCIA, SER ORDENADA A INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS ARROLADAS NA P.I.
Este recurso também não foi contra -alegado.
O EPGA pronunciou-se no sentido de que o recurso da sentença merece provimento.
Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos.
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2. - Na sentença recorrida deram-se como provados os seguintes factos:
A) Na sequência da Ordem de Serviço n°114/2001, a impugnante foi objecto de uma acção inspectiva de âmbito geral, relativa aos exercícios de 1997, 1998 e 1999, efectuada pela Direcção de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária (DSPIT) da Direcção de Finanças de Lisboa, em cumprimento da Ordem de Serviço n°114/2001, incidindo sobre os elementos contabilísticos, registos auxiliares e demonstrações financeiras, e que decorreu de 17-9-2001 a 8-2-2002, tendo a final, sido elaborado o Relatório de Inspecção Tributária, com as correcções à matéria tributável efectuadas (cfr. relatório c anexos, a fls. 137 a 308 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);
B) No que concretamente respeita ao exercício de 1999, único em causa nos presentes autos, e conforme melhor consta do respectivo relatório da inspecção, a Administração Fiscal efectuou as seguintes correcções à matéria colectável para efeitos de IRC, perfazendo o montante de €4.346.796,09:
1- Despesas não documentadas, no montante de 3.714.500800 (€18.527,84), tendo sido apurado o montante de €5.928,91 referente a IRC cm falta (Tributação Autónoma), por se ter considerado que «Na conta POC 622129 - Combustíveis, foram registados valores no montante de Esc. 3.714.500$00 que por não se encontrarem documentados, não são aceites como custo fiscal, nos termos da alínea h) do n°1 do artigo 41° do CIRC, e estão sujeitos a tributação autónoma, à taxa de 32%, prevista no artigo 4° do Decreto-Lei n°292/90, de 9-6.
Os registos contabilísticos destes valores tinham como suporte documental os documentos bancários de aquisição de cheques autos os quais não servem de justificativo à despesas de aquisição de combustíveis. O valor apurado corista do anexo 25.»
2 - Donativos, no montante de 500.000$00 (€2.493,98), por se ter considerado que «Na conta POC 691 - Custos Extraordinários, foram contabilizados custos do montante de 500.000$00, referente a prémios escolares, que não se enquadram no âmbito do Decreto-Lei n°74/99, de 16-3», remetendo-se para o Anexo 26 ao relatório de inspecção, do qual consta que os referidos prémios, no montante individual de 100.000$00, foram pagos a B..., C..., D...e E..., e, ainda, a F..., cfr. doc. 6 anexo à p.i., a fls. 42 dos autos, que se dá por integramente reproduzido;
3 - Mais-Valias, no montante de 867.239.878$00 (€4.325.774,27), por se ter considerado que «No exercício de 1999, o contribuinte procedeu à alienação de bens do seu activo imobilizado corpóreo, tendo apurado com esta operação uma mais-valia fiscal, no montante de 867.239.878$00 (Anexos 27).
Nos termos do artigo 44° do CIRC, no verso do mapa de Mais ou Menos Valias, o contribuinte mencionou a intenção de não reinvestir o valor de realização dos bens alienados, neste exercício.
No entanto, não acresceu ao lucro tributável, no Q 07 da declaração Mod. 22, o valor da mais-valia fiscal obtida nas operações acima citadas, considerado proveito nos termos do artigo 20°, alínea f) do CIRC, em conjugação com o artigo 42° do mesmo diploma, pelo que se consideram infringidos os mesmos artigos.»
C) A impugnante foi notificada para o exercício do direito de audição prévia sobre o Projecto de Relatório de Inspecção Tributária, nos termos do artigo 60°, n°1, alínea e) da LGT e 60° do RCPIT, através do ofício n°493, de 14-2-2002, recebido em 18-2-2002 (cfr. oficio, a fls. 64 do PAT apenso, que se dá por integralmente reproduzido);
D) A impugnante exerceu o direito de audição prévia através de requerimento apresentado em 28-2-2002, pronunciando-se sobre as correcções e respectiva fundamentação propostas no Projecto de Relatório de Inspecção Tributária, tendo junto elementos novos ao processo, os quais foram analisados, tendo, a final, sido mantidas as correcções propostas, aqui sindicadas (cfr. requerimento e docs. anexos, a fls. 65 a 88 do PAT apenso, e relatório da inspecção, a Fls. 137 a 157 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);
E) Em 13-3-2002, o Director da DSPIT proferiu despacho de concordância com as conclusões do relatório de inspecção e ordenou, além do mais, que o mesmo fosse notificado à impugnante, o que veio a suceder cm 15-3-2002 (cfr. despacho e ofício, a fls. 137 dos autos e 88 do PAT apenso, respectivamente, que se dão por integralmente reproduzidos);
F) Em consequência das correcções supra identificadas, foi emitida a liquidação adicional de IRC n°8310002870, de 22-3-2002, relativa ao exercício de 1999, no montante de €1.800.346,94, incluindo o valor de €5.928,91, referente a tributação autónoma (despesas confidenciais), com prazo para pagamento voluntário até 8-5-2002, da qual foi efectuado, em 7-5-2002, um pagamento por conta parcial, no montante de €9.159,78, (cfr. documento de cobrança, guia, e informação oficial, a fls. 30 e 35 dos autos, e 32 e 33 do PAT apenso, que se dão por integralmente reproduzidas);
G) Em 15-7-2002, a impugnante dirigiu à Direcção de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária (DSPIT) um requerimento, através do qual solicitou que aqueles serviços considerassem que ao preencher a Declaração Anual do exercício de 2000 mencionou, por lapso, no Quadro 10, campo A 328, o valor de 867.239.878$00 como valor reinvestido, quando devia ter mencionado o valor de 2.451.883.294$00, que foi o que efectivamente reinvestiu em 2000 (cfr. doc. de fls. 47 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);
H) A impugnante entregou, em 31-5-2000, a declaração Modelo 22 de IRC, referente ao exercício de 1999, exercício no qual apurou a matéria colectável de €36.006.163,29 e imposto a pagar no montante de €6.688.830,05, e efectuou investimentos em imobilizado corpóreo, os quais não foram considerados para efeitos de reinvestimento dos valores de realização obtidos nesse ano ou em anos anteriores (cfr. declarações Modelo 22 e Anual, a fls. 55 a 87 e 91 a 95 do PAT apenso, que se dão por integralmente reproduzidas);
I) Nos termos dos respectivos regulamentos, o prémio escolar A... destinasse aos alunos que frequentam as Escolas Superiores Portuguesas com Licenciatura em Engenharia Electrotécnica e Telecomunicações ou, no caso da Madeira e Açores, Escolas que ministrem Cursos Tecnológicos nas áreas de Electrónica/Electrotécnica, Sistemas Digitais ou Informática, e constitui um incentivo à formação técnica nas áreas das novas tecnologias associadas aos Sistemas de Informação e às Telecomunicações (cfr. regulamentos a fls. 36 a 39 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);
J) A impugnante encontra-se enquadrada, em sede de IRC, no regime geral de tributação, e a sua actividade consiste na prestação de serviços de telecomunicações – tráfego, cedência de meios e aluguer de equipamentos (cfr. relatório da inspecção, a fls. 141 e 142 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido).
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Ao abrigo do artº 712º do CPC, adita-se ao probatório a seguinte factualidade e altera-se a matéria dada como não provada:
K) No pressuposto da isenção de tributação da mais valia, a impugnante, em conformidade com o disposto no artigo 44.°/6 do CIRC e 7.°/7 da Lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro, procedeu à correcção do montante das reintegrações e amortizações aceites como custo, deduzindo o valor da mais valia alegadamente não tributada nos anos referentes aos exercícios de 2000 e 2001(documentos 10 e 11 juntos com a PI).
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FACTOS NÃO PROVADOS

Com relevância para a decisão da causa, nada mais se provou, designadamente quanto à apresentação da competente declaração de substituição, e, quanto aos cheques auto em causa, quais os efectivos beneficiários dos mesmos, nem que foram utilizados na aquisição de combustível, porquanto não foi identificado um único beneficiário, nem apresentado nenhum elemento documental que comprove os gastos em combustível.

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MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame crítico das informações e dos documentos, não impugnados, constantes dos autos e do PAT apenso, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.
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3. -A questão decidenda traduz-se em saber se a sentença enferma de nulidade por omissão de pronúncia sobre a questão de que a não aceitação do reinvestimento, verificados os seus pressupostos substanciais, redundaria numa dupla tributação, uma vez que a recorrente tem vindo no exercícios de 2000 e 2001 a corrigir as amortizações dos bens resultantes do reinvestimento em causa, nos termos do estatuído no artigo 44.°/6 do CIRC e 7º/7 da Lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro.
A nulidade da sentença geralmente designada por omissão de pronúncia, segundo o disposto no artº125º do CPPT, que está em consonância com o artº668º, nº 1, al. d)-1ª parte do CPC, existe quando o juiz não toma conhecimento de questão de que podia e devia conhecer e está em correlação com a proibição estabelecida na 2ª parte do artigo 660º do mesmo Código que prescreve não poder o juiz ocupar-se senão de questões suscitadas pelas partes, de sorte que a expressão «questões» não abrange os argumentos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, por ser o juiz livre na qualificação jurídica dos factos (artº664º do CPC), mas reporta-se apenas às pretensões formuladas ou aos elementos inerentes ao pedido e à causa de pedir (cfr. ainda Rodrigues Bastos, Notas..., pág. 228 e A, Varela in RLJ, 122º-112).
Verifica-se, na parte que ora importa, que a sentença considerou que o acto impugnado não estava ferido de ilegalidade por julgando improcedente a impugnação judicial deduzida da liquidação adicional de IRC de 1999, no que concerne à correcção técnica relativa às mais valias, alegadamente, não reinvestidas, com fundamento em que não podem ser considerados eventuais reinvestimentos efectuados nos exercícios subsequentes, sob pena de se frustrar o regime legal previsto para a o reinvestimento dos valores de realização, concretamente no que respeita à obrigação de manifestar, na declaração de rendimentos do exercício Ia realização, intenção de efectuar o reinvestimento.
Ora, como em sede de recurso, a impugnante apenas questiona essa parte da sentença, sustentando que a mesma é nula por não se ter pronunciado, também, sobre a questão suscitada na p.i. de que a não aceitação do reinvestimento, verificados os seus pressupostos substanciais, redundaria numa dupla tributação, uma vez que a recorrente tem vindo no exercícios de 2000 e 2001 a corrigir as amortizações dos bens resultantes do reinvestimento em causa, nos termos do estatuído no artigo 44.°/6 do CIRC e 7º/7 da Lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro.
E, na verdade, sobre a questão da dupla tributação levantada pela recorrente e com na qual, também, pretendia a anulação da correcção em causa o tribunal recorrido não se pronunciou, como se reconhece no próprio despacho de sustentação de exarado a fls. 235 ao abrigo do nº 4 do artº 668º do CPC, quando afirma que “no caso concreto (…) a sentença proferida se pronunciou, além do mais, sobre a legalidade da correcção em causa, constituindo a questão relativa à dupla tributação – de resto, como a própria impugnante reconhece – apenas mais um fundamento que contribuiria para a pronúncia no sentido da ilegalidade da mesma (?), pelo existe omissão de pronúncia, com consequente nulidade da sentença.
É que a nulidade prevista na primeira parte dos artigos 125º do CPPT e da al. d) do nº 1 do 668º DO CPC, como se disse, está directamente relacionada com o comando fixado no nº 2 do artº 660º, segundo o qual «o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras».
Tal norma suscita, de há muito, o problema de saber qual o sentido exacto da expressão «questões» ali usado, o qual é normalmente resolvido a partir do ensinamento do Ilustre Mestre, Prof. J. A Reis no seu CPC Anotado, 5º-54, ao expender que»...assim como a acção se identifica pelos seus elementos essenciais (sujeitos, pedido e causa de pedir) (...) também as questões suscitadas pelas partes só podem ser devidamente individualizadas quando se souber não só quem põe a questão (sujeitos), qual o objecto dela (pedido), mas também qual o fundamento ou razão do pedido apresentado.
Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, «questões» e, por outro, «razões» ou «argumentos» para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das «questões») integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das «razões» ou «argumentos» invocados para concluir sobre as questões. Cf. nesse sentido, entre muitos, os Acs. do STJ de 17.1.2001, AD, 478º-1376 e de 19.3.2002, Ver. Nº 537/02-2ª: Sumários, 3/2002).).
Também Paulo Cunha in Proc. Civ. De Declaração, II, 356 e ss defende que, contra o que, à primeira vista, poderia sustentar-se, as omissões de decisão não constituem vícios de conteúdo ou substanciais da sentença, mas, antes vícios formais: «...se o juiz julga mal, quer na parte principal quer na parte complementar do conteúdo, temos então um vício substancial, um vício que se situa na própria substância da decisão proferida. Mas se o juiz, em vez de julgar, se abstém de proferir decisão a respeito de determinado ponto, já o vício incide apenas na actividade da elaboração da sentença e é portanto um vício formal».
Assim, os vícios determinantes de nulidade da sentença correspondem a casos de irregularidades que afectam formalmente a sentença, como é o caso de uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender resolver questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões que deveria conhecer (omissão de pronúncia)- al. d) do nº 1 do artº 668º do CPC e 125º do CPPT. Esses são vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afectada.
E a nulidade da sentença (ou acórdão) consistente em ter o julgador deixado de apreciar questões de que devesse só pode ser arguida perante o tribunal que o proferiu se não for admissível recurso ordinário.
Como a recorrente e o EPGA advertem, contra o entendimento do Mº Juiz expresso em sede de sustentação, deveria a sentença ter conhecido ainda da questão da dupla tributação que foi outro fundamento invocado na p.i. no sentido da ilegalidade da correcção.
Ora, não tendo a sentença recorrida procedido ao exame dessa matéria, incorre em nulidade de omissão de pronúncia, prevista na al. 668º nº 1 al. d), 1ª parte – cfr. artº 125º do CPPT-.
O Prof. Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, Apêndice, pág. 409, ainda que não destaque a circunstância de somente uma das partes ter legitimidade para recorrer da decisão do TT 1ª Instância – como acontecia in casu – esclarece que a lei não previne «...a hipótese se procedência ou improcedência do pedido quando dos vários fundamentos ou excepções invocados (...) só alguns e não todos os fundamentos ou excepções tenham sido julgados procedentes ou apreciados (...). Põe-se então a questão de saber se ao tribunal ad quem (...) cabe conhecer oficiosamente da procedência ou improcedência desses fundamentos ou excepções ou se só poderá fazê-lo a instância da parte interessada (...) através da respectiva alegação e as consequentes conclusões.
(...) Na falta de qualquer disposição da nossa lei sobre a matéria, temos certo que ao tribunal ad quem cumpre conhecer oficiosamente (quer o recorrido intervenha ou não no recurso) dos fundamentos ou excepções que foram negadas ao recorrido, ou que, por supérfluas, não chegaram a ser apreciadas pelo tribunal ad quem. Não obsta a esse conhecimento oficioso o requisito imposto pela lei da apresentação de conclusões, que só é exigido e tem razão de ser em efectivo vencimento e não em vencimento formal».
Ora, como a nulidade de omissão de pronúncia se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do dever prescrito no nº 2 do artº 660º do CPC, e que é o de resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão estiver prejudicada pela solução dada a outras, visto que a sentença acabou apenas por conhecer do fundamento da impugnação visando a questionada correcção técnica julgando este improcedente, e não conheceu da outra causa de pedir cujo conhecimento não ficara lógica e implicitamente prejudicado pela procedência do primeiro, a sentença incorreu num desvio do ritualismo processual prescrito na lei, com relevância na discussão da causa, pelo que é nulo e devia essa nulidade ser arguida – como foi – e julgada no presente recurso pois a sentença admite recurso ordinário- cfr. nº 3 do artº 668º do CPC.
Acresce que não é de exigir uma fórmula sacramental para arguir nulidades; o que é necessário é que o interessado exprima a vontade de reagir contra certa e determinada infracção processual que se cometeu e para o efeito de ser aplicada a sanção que a lei julgue adequada, sendo certo que o Tribunal não está sujeito às alegações da partes no tocante à interpretação das normas legais.
E, pela Reforma de 1995, introduzida ao CPC pelo DL nº 329-A/95, foram aditados ao artº 715º dois números consagrando um regime inovador que no relatório daquele diploma é assim justificado:
Consagrou-se «expressamente a vigência da regra da substituição da Relação ao tribunal recorrido, ampliando e clarificando o regime que a doutrina tem vindo a inferir da lacónica previsão do artº 715º do CPC, por se afigurar que os inconvenientes resultantes da possível supressão de um grau de jurisdição são largamente compensados pelos ganhos em termos de celeridade na apreciação das questões controvertidas pelo tribunal «ad quem». Neste sentido, estatui-se que os poderes de cognição da Relação incluem todas as questões que ao tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução que deu ao litígio – cumprindo à Relação, assegurado que seja o contraditório e prevenindo o risco de serem decisões – surpresa, resolvê-las, sempre que disponha dos elementos necessários».
Assim, de harmonia com a regra da substituição da Relação ao tribunal recorrido (artº 715º, nº 2 do CPC, na sua actual redacção) os poderes de cognição deste Tribunal Central Administrativo Sul incluem todas as questões que ao tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução que deu ao litígio.
Por outro lado, é manifesto que o cumprimento do contraditório plasmado no nº 3 do artº 715º do CPC apenas se impõe no caso de procedência do recurso.
É também pacífico que a obrigação de substituição do TCAS ao tribunal recorrido, imposta pelo nº 2 do artº 715º do CPC, existe mesmo que o recorrido – como aconteceu «in casu»- não tenha lançado mão do disposto no artº 684º-A, nº 1 do mesmo Código.
Mas será necessário ouvir as partes para se pronunciarem sobre o objecto desta decisão, devendo o relator deste processo, antes de proferir aquela decisão em substituição, a fim de evitar decisões surpresa, mandar notificar cada uma das partes para, em dez dias, se pronunciarem sobre as questões objecto dessa decisão, nos termos do nº 3 do artº 715º?
Há, na verdade, que conhecer da sobrante questão da ilegalidade do acto recorrido com fundamento em dupla tributação, pois, em face da procedência do recurso haverá que apreciar, em substituição, o mérito das questões que o tribunal recorrido deixou de conhecer pois nada obsta à sua apreciação e o processo reúne todos os elementos para decidir, havendo as partes tomado posição sobre as mesmas (cfr. art.715º, n.°s 2 e 3 do CPC).
Na verdade, só quando as partes não hajam tomado posição é que se justifica que sejam ouvidas sobre as questões de que não se conheceu por se julgar prejudicado esse conhecimento em virtude da procedência por outro fundamento.
É que, tendo-se já pronunciado sobre os fundamentos porque consideram ilegal/legal o acto que agora, em face da procedência, tem de ser solucionada, a decisão que for proferida com preterição da audição da recorrente e da recorrida, não atenta contra o princípio do contraditório e do fair trial, inexistindo “decisão surpresa”.
Ora, se decidir sobre a legalidade/ilegalidade do acto impugnado fundado nos elementos que se encontram nos autos, o presente acórdão não o fará, sem que às partes não fosse dada oportunidade de sobre ela se pronunciar.
Todavia, o artigo 3°, n° 3, do Código de Processo Civil é plenamente aplicável no recurso contencioso e tem como finalidade declarada evitar, proibindo-as, as denominadas decisões - surpresa, sendo que a decisão no acórdão recorrido da questão da legalidade do acto impugnado não constitui, propriamente, uma decisão - surpresa.
O artigo 3º nº. 3 do C. Processo Civil estipula que o Juiz deve observar e fazer cumprir ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.
O princípio do contraditório, que é um dos princípios fundamentais do nosso direito processual civil, assegura não só a igualdade das partes, como, no que aqui interessa, é um instrumento destinado a evitar as decisões -surpresas.
Mas, pergunta-se, onde está a decisão - surpresa?
É que:
1º. - A recorrente, assacou ao acto impugnado, entre outros, o vício de dupla tributação.
2º - A entidade recorrida, respondeu a esse fundamento, reafirmando a legalidade do acto impugnado na sua contestação remetendo para o parecer e informação constante do PI; porte para s conclusões de recurso;
3º. - Ora não há nenhuma argumentação nova surgida na 2ª instância.
A decisão que vier a ser tomada no acórdão sobre tal questão, em nada afecta quer a pretensão deduzida, quer a defesa.
Diga-se, como nota final, que a audição das partes será dispensada nos termos do artigo 3º nº. 3 em casos de manifesta desnecessidade e naqueles em que, objectivamente, as partes não possam alegar de boa fé, desconhecimento das questões de direito ou de facto a decidir pelo Juiz e das respectivas consequências - "Temas da Reforma do Processo Civil" - Almedina, 1997, Desembargador Abrantes Geraldes, pág. 70.
Donde que se passa a conhecer de imediato e sem mais formalidades, do Vício de violação de lei sobre a correcção incidente sobre as mais valias.
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Como se disse acima, a sentença recorrida, sufragando a posição da AT, julgou improcedente a impugnação judicial deduzida da liquidação adicional de IRC de 1999, no que tange à correcção técnica relativa às mais valias, alegadamente, não reinvestidas, para o que fundamentou que não podem ser considerados eventuais reinvestimentos efectuados nos exercícios subsequentes, sob pena de se frustrar o regime legal previsto para a o reinvestimento dos valores de realização, concretamente no que respeita à obrigação de manifestar, na declaração de rendimentos do exercício da realização, intenção de efectuar o reinvestimento.
Adversamente, a recorrente sustenta que a questão de que a não aceitação do reinvestimento, verificados os seus pressupostos substanciais, redundaria numa dupla tributação, uma vez que a recorrente tem vindo nos exercícios de 2000 e 2001 a corrigir as amortizações dos bens resultantes do reinvestimento em causa, nos termos do estatuído no artigo 44.°/6 do CIRC e 7º/7 da Lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro.
O EPGA, revendo a posição que assumira na 1ª instância em sede de parecer pré -sentencial, reconhece agora que se verifica tal vício em termos que merecem a nossa concordância.
Assim, compulsando os elementos constante dos autos, mormente a declaração modelo 22 de IRC de 1999, vê-se, a partir desta, que a recorrente efectuou investimentos em imobilizado corpóreo, os quais não foram considerados para efeitos de reinvestimento dos valores de realização obtidos nesse ano ou em anos anteriores.
Sucede que em 15.07.2002, (vd. als. G) e H) do probatório) a impugnante dirigiu à Direcção de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária (DSPIT) um requerimento, através do qual solicitou que aqueles serviços considerassem que ao preencher a Declaração Anual do exercício de 2000 mencionou, por lapso, no Quadro 10, campo A 328, o valor de 867.239.878$00 como valor reinvestido, quando devia ter mencionado o valor de 2.451.883.294$00, que foi o que efectivamente reinvestiu em 2000 e que a impugnante entregou, em 31-5-2000, a declaração Modelo 22 de IRC, referente ao exercício de 1999, exercício no qual apurou a matéria colectável de €36.006.163,29 e imposto a pagar no montante de €6.688.830,05, e efectuou investimentos em imobilizado corpóreo, os quais não foram considerados para efeitos de reinvestimento dos valores de realização obtidos nesse ano ou em anos anteriores.
Ora., apesar de a recorrente ter dirigido à DSPIT um requerimento através do qual solicitou que aqueles serviços considerassem que ao preencher a Declaração anual do exercício de 2000 mencionou, por lapso, no Quadro 10, Campo A 328, o valor de 867.239.878$00 como valor de reinvestimento, quando deveria ter mencionado o valor de 2.451.833.294$00, que foi o que efectivamente reinvestiu em 2000 e que no verso do mapa de Mais e Menos Valias do exercício de 1999, a recorrente mencionou a intenção de não reinvestir o valor de realização dos bens alienados, o que teria acontecido por lapso, segundo esclarecimento daquela, a AT não extraiu nenhumas consequências, tendo mantido a sua posição nos termos supra explicitados.
A dupla tributação é um conceito com que no Direito Tributário se designam os casos de concurso de normas. Há concurso de normas em Direito Fiscal quando o mesmo facto se integra na previsão de duas normas tributárias distintas, dando origem à constituição de mais do que uma obrigação de imposto- cfr. Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, 220.
São requisitos do conceito de dupla tributação a identidade do facto e a pluralidade de normas.
Por um critério de exclusão, não haverá identidade do facto quando não estamos perante o mesmo facto ou quando normas distintas incidem sobre factos diversos, aí não há dupla tributação.
Mas aqui há uma razão de ordem a apontar: - o que vem a ser a identidade do facto ou, melhor dizendo, quais são os critérios operáveis para individualizar juridicamente um facto no mundo naturalístico?
A este propósito costuma referir-se a chamada “regra das quatro identidades” a qual é imanente ao conceito de facto tributário normalmente acolhido nas normas tributárias, como sendo um facto estruturalmente complexo, constituído por diversos elementos, a saber: - um elemento material, um elemento subjectivo, um elemento espacial e um elemento temporal.
É na verificação conjunta destes quatro elementos que a propósito do fenómeno da dupla tributação se formulou a “regra das quatro identidades” que se pode enunciar assim: - para que se possa falar em identidade do facto é necessário que se verifique a identidade do objecto, a identidade do sujeito, a identidade do período tributário e a identidade do imposto.
No caso concreto, em que está em causa o IRC que é um imposto sobre o rendimento, sobreleva o critério da identidade do objecto, ou seja, a capacidade contributiva que, no caso das empresas, se refere ao lucro nas suas componentes positivas (proveitos) e negativas (custos)
É manifesto que «in casu» ocorre a identidade do facto já que a dupla tributação, que «configura uma situação em que o mesmo facto tributário se integra na hipótese de incidência de duas normas tributárias diferentes, o que implica, de um lado, a identidade do facto tributário e, do outro, a pluralidade de normas tributárias» (JOSÉ CASALTA NABAIS, DIREITO FISCAL, 2ª edição, pág. 230/231).
Ou seja, para haver dupla tributação é também necessária a pluralidade de normas.
Porém, para que haja dupla tributação, o que importa é que ambas as normas colidam i. é, se apliquem ao caso concreto, originando assim duas pretensões tributárias; e, para que haja uma efectiva dupla tributação ou “in praxi” é mister que ocorra um concurso real de normas em que o mesmo facto recai na previsão de duas normas tributárias pertencentes a ordenamentos distintos, inexistindo mecanismos que paralisem a eficácia de qualquer delas.
Mas também existe a chamada dupla tributação virtual ou “in thesi” decorrente do concurso aparente o qual existe quando o mesmo facto recai na esfera de incidência de duas normas sem que haja a aplicação concreta de ambas, ou havendo a aplicação apenas de uma. Isto por força de determinadas regras em vigor à data dos factos insertas em nos ordenamentos legislativos contendo normas de conflitos proibindo a dupla tributação como factor de insegurança jurídica, ou em tratados contra a dupla tributação que regem as relações entre os Estados contratantes, em que a dupla tributação existiria caso ambos os ordenamentos fossem aplicados isoladamente.
Diga-se ainda que a efectiva dupla tributação ou “in praxi” resultando de um concurso de pretensões, acarreta uma sobrecarga tributária pois gera um encargo fiscal mais elevado do que aquele que decorreria da aplicação exclusiva da mais elevada das pretensões em concurso.
Descendo ao caso dos autos, mais uma vez se apreende a argúcia do EPGA ao demonstrar que «in casu» se verifica dupla tributação à luz dos conceitos acabados de desenvolver já que, do ponto de vista jurídico, a operação não é a mesma.
Ora, tendo sempre presentes as considerações teórico – doutrinais que ficaram expostas, ocorre dupla tributação que não é legal, pois, independentemente da recorrente ter ou não manifestado a intenção de reinvestimento do saldo das mais valias obtidas, a verdade é que não foi posto em causa pela Administração tributária que a recorrente, de facto, procedeu ao reinvestimento da mais valia apurada no exercício em causa de 1999 no subsequente exercício de 2000, portanto dentro do lapso de tempo referido no artigo 44° do CIRC.
E, como bem refere o EPGA arrimando-se à doutrina do Acórdão do STA, de 2006.02.02, proferido no recurso n.°0746/05, disponível no sítio da internet www.dgsi.pt.,o que releva em direito fiscal, são as realidades económicas, as situações reais que expressam a percepção do rendimento ou a capacidade contributiva, e não as meras roupagens com que, por vezes, se apresentam, exteriormente.
Por esse prisma, visto que a mais valia apurada em 1999 foi, de facto, reinvestida no exercício de 2000, não obstante não ter sido formulada a intenção expressa de reinvestimento, não pode ser tributada, atento o estatuído no artigo 44.° do CIRC, na redacção, então, vigente.
Entendimento contrário, como o que foi perfilhado pela AT e pela sentença sob recurso, traduziria uma situação de dupla tributação, porquanto, no pressuposto da isenção de tributação da mais valia, a impugnante, em conformidade com o disposto no artigo 44.°/6 do CIRC e 7.°/7 da Lei 30-G/2000, de 29 de Dezembro, procedeu à correcção do montante das reintegrações e amortizações aceites como custo, deduzindo o valor da mais valia alegadamente não tributada o que concerne aos exercícios dos anos de 2000 e 2001 (documentos 10 e 11 juntos com a PI).
Procede, pois, o recurso na parte recorrida e referente à correcção técnica sub judice.
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Face ao acabado de fundamentar e decidir, uma vez que não se mostrava necessária a realização da prova requerida por não ter relevância para a decisão sobre a legalidade da correcção incidente sobre o reinvestimento das mais valias, tem de julgar-se improcedente o recurso interposto do despacho interlocutório que considerou desnecessário proceder à inquirição das testemunhas arroladas pela Recorrente, até porque o recurso da sentença foi circunscrito pela recorrente à ilegalidade da dita correcção.
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3. Face ao exposto acordam os Juízes deste TCAS em conceder provimento ao recurso, anular a sentença na parte recorrida e, em substituição, julgar a impugnação procedente e anular a liquidação no que se refere à correcção referente à não aceitação do reinvestimento em relação ao exercício de 1999.
Condena-se a recorrente em custas, por ela devidas apenas em 1ª instância e em função do seu vencimento, com taxa de justiça de 5 Ucs, no que tange ao recurso da sentença e em 1uc pelo recurso do despacho interlocutório.
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Lisboa, 24/05/2011
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Joaquim Condesso)