Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:881/21.4 BESNT
Secção:JUIZ PRESIDENTE
Data do Acordão:05/24/2022
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:CONFLITO
INCOMPETÊNCIA TERRITORIAL
TRÂNSITO EM JULGADO
Sumário:
Votação:DECISÃO SUMÁRIA
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: DECISÃO

I. Relatório

A Senhora Juíza da Secção Tributária do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja veio, ao abrigo do disposto no artigo 36.º, n.º 1, alínea t) do ETAF, requerer a este Tribunal Central Administrativo Sul a resolução do conflito negativo de competência, em razão do território, suscitado entre si e a Senhora Juíza do juízo de execução fiscal e de recursos contraordenacionais do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, uma vez que ambas se atribuem mutuamente competência, negando a própria, para conhecer da petição de oposição à execução fiscal nº…………… e apensos que a sociedade “L….. – ……….., S.A.”, fez chegar à Secção de Processo Executivo de Beja do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. e dirigiu ao Juiz do juízo de execução fiscal e de recursos contraordenacionais do TAF de Sintra



II. Fundamentação

II.1. De facto

Com relevo para a decisão emergem dos autos as seguintes ocorrências processuais:

1. Pelo Juiz do juízo de execução fiscal e de recursos contraordenacionais, ao qual os presentes autos foram atribuídos, foi proferida decisão em 12.11.202, a julgar oficiosamente verificada a excepção dilatória da incompetência territorial do tribunal para conhecer da causa e ordenada a remessa dos autos, após trânsito, para o tribunal considerado competente em razão do território: o TAF de Beja (Secção Tributária).

2. A decisão foi notificada às partes em 15.12.2021 e os autos foram remetidos electronicamente ao TAF de Beja, após trânsito, como havia sido ordenado.

3. No TAF de Beja a Senhora Juíza da Secção Tributária a quem os autos foram distribuídos, após notificar a exequente, IGFSS, I.P., para os termos do disposto no artigo 210º do CPPT e apresentar contestação, veio a proferir decisão com data de 21.03.2022, a declinar essa competência e a determinar a remessa da acção de oposição à execução fiscal para o Tribunal Tributário de Lisboa.

4. Na mesma decisão, foi solicitada a resolução do conflito de competência.

5. As partes foram notificadas dessa decisão em 22.03.2022 e, após trânsito, os presentes autos foram remetidos electronicamente ao Tribunal Central Administrativo Sul.



II.2. De Direito

Dispõe o artigo 105.º, n.º 2, do CPC - o qual está inserido na Secção II (do Capítulo V, do Título IV, do Livro I), relativa à incompetência relativa, a qual abrange a infracção das regras de competência fundadas nomeadamente na divisão judicial do território (cfr. art. 102º) - que “[a] decisão transitada em julgado resolve definitivamente a questão da competência, mesmo que esta tenha sido oficiosamente suscitada.”

Ora, no caso, encontra-se assente que a decisão proferida no juízo de execução fiscal e de recursos contraordenacionais do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, em 12.11.2021, tinha transitado quando o processo foi remetido ao TAF de Beja (secção tributária) pelo a solução do “aparente” conflito passa fundamentalmente pela análise das consequências jurídicas da norma constante do artigo 105.º, n.º 2, do CPC, supra transcrita.

De igual modo, deverá atender-se ao estatuído no artigo 625.º do CPC que dispõe do seguinte modo:

1- Havendo duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, cumprir-se-á a que passou em julgado em primeiro lugar.

2- É aplicável o mesmo princípio à contradição existente entre duas decisões que, dentro do processo, versem sobre a mesma questão concreta da relação processual.

Ou seja, o conflito verificado em sede de competência relativa deve ser resolvido de acordo com o princípio geral da prevalência do primeiro julgado, como decorre do artigo 105.º, n.º 2, conjugado com o artigo 625.º do CPC (neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STA de 23.11.2005, rec. n.º 1025/2005, de 30.11.2005, rec. n.º 895/2005 e n.º 974/2005, de 26.04.2012, rec. n.º 360/12, de 15.05.2012, rec. n.º 459/12, de 24.05.2012, rec. n.º 498/12, de 12.06.2012, rec. n.º 552/12, de 10.07.2012, rec. n.º 682/12 e de 29.05.2013, rec. n.º 786/13 e os Acórdãos do STJ de 02.07.1992, BMJ 419, p. 626, de 02.02.2000, P. 99S246, de 29.01.04, P.03B3747, de 17.02.2005, P. 253/05 e de 16.11.2005, Conflito nº2339/05).

No caso da competência territorial, se o tribunal onde for proposta a acção se considerar territorialmente incompetente, remete o processo para o tribunal competente, sendo a remessa vinculativa para este, como decorre do referido art. 105.º, n.ºs 2 e 3, do CPC. Donde, o segundo tribunal não é livre de apreciar a sua própria competência. De resto, o n.º 4 do art. 105.º do CPC apenas prevê que da decisão que aprecie a competência cabe reclamação; o que seguramente não é o caso.

Assim, o conflito – que verdadeiramente o não é - deve ser resolvido no sentido de que a decisão sobre competência territorial que primeiro transitou em julgado deve ser acatada pelo tribunal que aí foi declarado territorialmente competente, independentemente do mérito dessa decisão (como parece, aliás, ter sucedido num primeiro momento em foi ordenada a notificação do IGFSS, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 210º do CPPT).

Nos termos do n.º 2 daquele artigo 105.º do CPC, a decisão transitada quanto à competência territorial, resolvendo definitivamente a questão, deve ser acatada pelo tribunal ao qual aquela decisão atribuiu essa competência, não podendo este último, por isso, declarar-se incompetente em razão do território.

Como explica Miguel Teixeira de Sousa, em comentário a este artigo, “a procedência da excepção dilatória de incompetência relativa determina a remessa do processo para o tribunal competente (…). No tribunal remetido, não é possível voltar a discutir a competência relativa (n.º 2), ainda que com fundamento diverso do anteriormente apreciado e mesmo que a incompetência relativa tenha sido decretada no despacho saneador (art. 104.º, n.º 3). Em suma: o disposto no art. 595.º, n.º 3, é afastado pelo disposto no n.º 2. (c) Se, ainda assim, o tribunal remetido proferir uma decisão incompatível com a anterior, é esta que prevalece (art. 625.º, n.º 2). // (a) A decisão proferida sobre a competência relativa (só) pode ser impugnada através de reclamação para o presidente da Relação com competência na circunscrição territorial do tribunal de 1.ª instância” (in CPC ONLINE, art. 59.º a 114.º, Versão de 2021.04).

A situação aqui em presença, de resto, é igual àquelas por nós já decididas em 10.11.2021, 17.01.2022, 6.05.2022 (2) e 9.05.2022, nos processos, respectivamente, 590/21.4BESNT, 290/21.4BEALM, 2022/19.9BELRS e 217/21.4BELRS e 2268/19.0BELRS.

Face ao exposto, e sem necessidade de outros considerandos, terá que prevalecer a primeira decisão, por ser essa a decisão que transitou em primeiro lugar e resolveu definitivamente a questão.


III. Decisão

Termos em que, decidindo, declara-se o TAF de Beja (secção tributária) territorialmente competente para conhecer da presente acção, declarando-se, em consequência, inválida a decisão desse tribunal que recusou essa competência.

Sem tributação.

Notifique.




O Juiz Presidente do TCA Sul

Pedro Marchão Marques