Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1207/17.7BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:11/07/2024
Relator:MARIA DA LUZ CARDOSO
Descritores:AÇÃO PARA RECONHECIMENTO DE UM DIREITO
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
Sumário:I - A ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido em matéria tributária será o meio processual próprio quando se prove tratar-se do mais adequado, e apenas para assegurar uma tutela plena, eficaz e efetiva do direito ou interesse legalmente protegido.
II - Verifica-se o erro na forma do processo quando inexiste correspondência entre a finalidade concretamente visada pelo autor e a finalidade para a qual a lei criou o meio processual utilizado.
III - A reclamação prevista no artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) tem por objeto atos materialmente administrativos praticados no âmbito do processo de execução fiscal pela administração tributária que tenham potencialidade lesiva.
IV - A ser assim, verifica-se o erro na forma do processo quando o pedido a apreciar através da reclamação prevista no artigo 276º do CPPT, - de reconhecimento de um direito de arrendamento violado no procedimento de venda judicial no decurso do processo de execução fiscal e de restituição à Autora da posse a título de arrendamento até ao fim do contrato - seja formulado na ação de reconhecimento de um direito, expressamente prevista no artigo 145º do CPPT, como meio processual que visa assegurar a efetiva tutela do direito ou interesse legalmente protegido em matéria tributária, mas, nos termos do n.º3 dessa norma legal, só quando os restantes meios contenciosos não assegurem essa tutela.
V - Em face do disposto nos artigos 97º, n. º3 da Lei Geral Tributária (LGT) e 98º, n. º4, do CPPT, deverá ordenar-se a correção da forma de processo quando o meio usado não for o adequado segundo a lei e se não existirem obstáculos ao prosseguimento da petição na forma processual adequada, designadamente em termos de tempestividade.
IV - Não tendo o Tribunal a quo deixado de apreciar questões submetidas à sua apreciação, deixando, quanto a elas, de exercer o seu poder/dever de pronúncia, a sentença ora recorrida, não enferma da arguida nulidade, por omissão de pronúncia.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Tibutária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I - RELATÓRIO:


I........., LDA. (doravante Recorrente), inconformada com a sentença proferida em 2024-02-19 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, na Ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, instaurada contra a Autoridade Tributária, F........., M......... e S.......... (doravante Recorridos), na qual se julgou procedente a exceção de erro na forma de processo, absolvendo-se os Réus da instância, dela veio apresentar recurso.

A Recorrente encerra as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

CONCLUSÕES

“I. Discute-se na presente lide, a forma de processo adotada em vista ao reconhecimento de um direito de arrendamento violado pela Autoridade Tributária e Aduaneira na sequência de uma venda judicial no âmbito do Processo de Execução Fiscal nº 1503200201208110.

II. O Tribunal a quo julgou a ação improcedente por considerar a existência de uma exceção dilatória, de conhecimento oficioso, de erro na forma de processo.

III. Para tal invocou o erro quanto aos destinatários da ação, bem como a inadequação do meio processual utilizado face ao pedido realizado pela Recorrente.

IV. A ora aqui Recorrente possuía, à data da venda judicial, um direito de arrendamento, que não foi acautelado, nem reconhecido no âmbito da venda judicial.

V. Posteriormente, a requerimento dos terceiros adquirentes, 2ª e 3ª Recorridos, a Autoridade Tributária e Aduaneira procedeu à notificação da locatária, aqui Recorrente, para a entrega do bem imóvel.

VI. Reitera-se, uma vez mais, que o seu direito de arrendamento não foi reconhecido no processo de venda judicial, nem posteriormente.

VII. Motivo pelo qual, não restou outra solução que não intentar a presente ação de reconhecimento de um direito nos termos do artigo 145º do CPPT.

VIII. O Tribunal a quo pronunciou-se quanto à inexistência de relação jurídica tributária, o que não corresponde à verdade.

IX. A relação jurídica tributária não deve ser vista de acordo uma definição rigorosa estabelecida entre o sujeito ativo, entidade de direito público, e o sujeito passivo, o contribuinte, do qual recai a obrigação de pagamento de imposto, sendo possível, muitas das vezes, no âmbito de uma relação jurídica tributária os seus efeitos estenderem-se a terceiros e, em virtude de tal extensão surgir a violação direitos na esfera jurídica desses mesmos terceiros.

X. Motivo pelo qual, a relação jurídica tributária deve ser tida como o “vínculo intersubjetivo emergente de um facto tributário enformado por normas jurídico tributárias

- cfr. Joaquim Freitas da Rocha in Teoria da Relação Jurídica Tributária.

XI. Ora, dúvidas não restam que da notificação pela Autoridade Tributária Aduaneira à ora Recorrente, da aplicação de normas tributárias emerge um vínculo intersubjetivo entre a Autoridade Tributária e Aduaneira, entidade de direito público, e a Recorrente.

XII. Podendo, deste modo, concluir-se que figura, no presente caso, uma relação jurídica tributária.

XIII. A pretensão da ora Recorrente consiste no reconhecimento de um direito de arrendamento violado no procedimento de venda judicial no decurso do processo de execução fiscal suprarreferido.

XIV. A ação para o reconhecimento de um direito, enquanto ação de simples apreciação consiste no “único meio processual adequado à apreciação das pretensões que se esgotem no reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária. – cfr. Acórdão do STA, proferido no processo nº 0204/17.7BECTB 01467/17, em 03- 06-2020, publicado em www.dgsi.pt.

XV. Do confronto entre o pedido da ora Recorrente na sua petição inicial e a forma de processo empregue, outra conclusão não poderá ser extraída que não a adequação do meio processual adotado face à pretensão da Autora, aqui Recorrente para garantir a tutela jurisdicional do seu direito violado.

XVI. O que permite concluir que não andou bem o Tribunal a quo ao subsumir a presente situação a um erro sobre a forma do processo.

XVII. Além do mais, nos termos dos artigos 193º e 196º do CPC o erro sobre a forma do processo implicará a anulação total do processo e a absolvição da Recorrida da instância quando não possa ser corrigido para a forma de processo adequada.

XVIII. Face ao que até aqui foi dito, entende-se que a presente ação de reconhecimento de um direito é o meio de tutela jurisdicional efetiva adequado à tutela do direito de arrendamento que a ora Recorrente se arroga, motivo pelo qual, devem os presentes autos ser aproveitados relativamente à 1º Recorrida.

XIX. Mais acresce que ainda que não tenha apresentado contestação, a Autoridade Tributária e Aduaneira foi devidamente demandada.

XX. E, ainda que se considerasse o erro sobre a forma de processo, quanto à 2ª e 3ª Rés, a verdade é que não decorre nenhuma factualidade ou direito invocado relativamente à atuação da Autoridade Tributária e Aduaneira.

XXI. Abstendo-se o Tribunal a quo de se pronunciar sobre a existência ou não de relação jurídica tributária entre a Recorrente e a aqui 1ª Recorrida.

XXII. Tal omissão gera uma nulidade da sentença por omissão de pronúncia sobre questões com relevância para a decisão de mérito.

XXIII. Pelo que a sentença recorrida não é justa nem imparcial.

XXIV. Mais devem V.Exas. Exmos. Senhores Drs. Juízes Desembargadores do tribunal Central Administrativo julgar este meio processual como o meio processual adequado e baixarem os autos para que seja apreciada a questão de mérito.

80. Reitera-se como na petição inicial, e bem assim que o meio processual adequado é a presente ação de reconhecimento do direito, atendendo a que as reclamações dos atos fiscais de entrega do imóvel foram consideradas improcedentes, não porque o Tribunal tenha conhecido do direito ao arrendamento, mas porque a entrega efetiva do imóvel ao seu proprietário, por compra em execução, não caduca aquele direito ao arrendamento.

XXV. Atendendo à doutrina e jurisprudência sobre este tema, a Autora entende que a sua pretensão é legítima e pretende com a presente ação que lhes seja reconhecido o direito ao arrendamento sobre o imóvel / prédio urbano, que é uma moradia constituída por R/chão e 1º andar, sito na Rua das F.........., ….9, B.........., descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Cascais sob a ficha nº ..........89e inscrito na matriz predial sob o artigo matricial urbano com o nº ….9, conforme certidão do teor da descrição do imóvel emitida pela 2ª Conservatória do Registo Predial de Cascais.

NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE POR PROVADO E REVOGADA A SENTENÇA, POR NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNICA E ERRO SOBRE O JULGAMENTO QUANTO AO ERRO SOBRE A FORMA DE PROCESSO, FAZENDO V. EXAS., EXMOS SENHORES MMOS. JUÍZES DESEMBARGADORES DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL, A COSTUMADA JUSTIÇA!”.

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Devidamente notificados, os Recorridos não apresentaram resposta às alegações.
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A Digna Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos legais, nos termos do artigo 657º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 281º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), vem o processo à Conferência para julgamento.
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Questões a decidir no recurso.


Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas as questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer (cf. artigos 608º, n.º 2, 635º, n.ºs 4 e 5 do CPC, ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281º do CPPT).

Nesta conformidade, cabe a este Tribunal apreciar e decidir se a decisão recorrida padece do apontado erro de julgamento ao concluir pela existência de erro na forma de processo, errando na aplicação e interpretação que fez do artigo 145º do CPPT e de omissão de pronúncia.


II - FUNDAMENTAÇÃO:

Consta da decisão que julgou procedente a exceção de erro na forma de processo, sem possibilidade de convolação e em consequência absolveu os Réus da instância, que:

Do erro na forma de processo.

Os RR. S.........., F......... e P..........alegam que a A. pretende que os RR. lhe reconheçam um direito ao arrendamento de um imóvel. Face ao pedido formulado a Ação para o reconhecimento de direitos ou interesses legítimos em matéria tributária não é a forma processualmente adequada, pois esta forma de processo destina-se às relações jurídicas, em matéria tributária, que se estabelecem entre a Administração Tributária e o Contribuinte, o que não é o caso.

Por seu lado, a Autora alega que a Autoridade Tributária violou o seu direito ao arrendamento, no âmbito de um processo de execução fiscal, pois vendeu o imóvel sem onerar o adquirente com seu direito ao arrendamento. Apesar de existirem outros meios contenciosos, o uso da presente ação deve ser admitida quando com ela seja possível obter uma tutela do direito em causa de forma mais efetiva, nomeadamente, um efeito jurídico que não possa ser obtido por outros meios ou uma mais duradoura satisfação dos direitos e interesses em causa.

Cumpre apreciar e decidir.

Importa começar por referir que a cada direito corresponde um, e apenas um, meio processual adequado para o seu reconhecimento em juízo (“a acção adequada”), a não ser que a lei determine o contrário (cfr. art. 2.º, n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi do art. 2.º, alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)), verificando-se o erro na forma de processo quando o A. faz uso de uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 10.07.2014, Proc. 07422/14, disponível em www.dgsi.pt).
O erro na forma de processo consiste na escolha de uma forma de processo que não é adequada ao tipo de pedido formulado, constituindo exceção dilatória, de conhecimento oficioso, nos termos do disposto nos artigos 193.º e 196.º do CPC ex vi do artigo 2.º, al. e) do CPPT.

Estabelece o artigo 97.º, n.º 2 da LGT que “A todo o direito de impugnar corresponde o meio processual mais adequado de o fazer valer em juízo.”
Pois, “Como é sabido, a ocorrência do erro na forma de processo deve aferir-se pelo pedido formulado na acção, pois é pela pretensão que o impugnante pretende fazer valer que se determina a propriedade ou impropriedade do meio processual empregue para o efeito (cfr. entre outros, acórdãos do STA de 28/05/2014, proc. n.º 01086/13, de 05/11/2014, proc. n.º 01015/14, de 29/10/2014, processo 01022/14 e de 17/0172018, proc. n.º 088/14, todos disponíveis em www.dgsi.pt/)” (cfr. Ac. TCAS de 16- 12-2020, Proc. 914/07.7BEALM, disponível em www.dgsi.pt).
Assim, o erro na forma de processo afere-se pelo pedido, isto é, pondo em confronto o pedido ou pedidos formulados com o fim que a lei estabelece para a forma de processo concretamente escolhida pelo Autor (cfr. Acórdão do TCAN, de 07.11.2019, Proc. 00855/14.1BEAVR, disponível em www.dgsi.pt).
Por seu turno, o pedido é o efeito jurídico que se pretende obter com a ação, ou seja, a finalidade que o Autor pretende alcançar (cfr. Acórdão de 20.03.2015, 00231/09.8BEPRT, disponível em www.dgsi.pt).

A Autora formulou os seguintes pedidos:

“ser a administração aduaneira e tributária condenada a reconhecer à sociedade I........., Lda., ora Autora, o direito ao arrendamento e consequentemente a restituir à Autora a posse, a título de arrendamento, do imóvel acima melhor identificado, até ao terminus do contrato. Consequentemente serem os proprietários, ora 22º RR [2.º RR], primeiros adquirentes, em compra por execução, condenados a reconhecer à sociedade I........., Lda., ora Autora, o direito ao arrendamento e consequentemente a restituir à sociedade imobiliária, ora Autora, a posse a título de arrendamento, do imóvel, acima melhor identificado, até ao terminus do contrato. Bem assim, ser o actual proprietário, ora 3.º R., da família dos 2.º RR, condenado a reconhecer também à sociedade imobiliária, ora Autora, o direito ao arrendamento e consequentemente a restituir à sociedade, ora Autora, a posse a título de arrendamento do imóvel acima melhor identificado até ao terminus do contrato. E ainda todos os RR. serem condenados no pagamento das custas, custas de parte e de Tribunal, a que houver lugar.”

Face aos pedidos formulados, vejamos se a Ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legitimo em matéria tributária é a forma de processo mais adequada à pretensão da Autora.
Sobre o recurso à Ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legitimo em matéria tributária, o Tribunal Central Administrativo Sul, em acórdão muito recente, disse o seguinte:

“A acção para reconhecimento de um direito assume, conforme é reconhecido pela jurisprudência e pela doutrina dominante, um carácter complementar dos demais meios processuais, e não um meio alternativo ou subsidiário. Como meio complementar que é, esta acção só pode ser utilizada quando for o meio mais adequado para assegurar uma tutela plena, eficaz e efectiva dos seus direitos, estando, pois, condicionada à inexistência de outro meio contencioso que permita assegurar a obtenção dos efeitos jurídicos pretendidos.” (Cfr. Acórdão de 21-01-2024, Proc. 1203/22.2 BELRA, disponível em www.dgsi.pt).

A Ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legitimo em matéria tributária é uma das várias formas de processo do processo judicial tributário, conforme estabelecido no artigo 97.º, n.º 1 do CPPT.
Nos termos do artigo 96.º, n.º 1 do CPPT, “O processo judicial tributário tem por função a tutela plena, efectiva e em tempo útil dos direitos e interesses legalmente protegidos em matéria tributária.”
Daqui pode-se retirar desde já uma conclusão, que é a seguinte, para que a Ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legitimo em matéria tributária seja, em abstrato, uma forma de processo adequada temos de estar perante uma relação jurídica tributária.
Com efeito, cumpre aferir quem são os sujeitos da relação jurídica tributária.
Estabelece o artigo 18.º da Lei Geral Tributária, cujo título é “Sujeitos” o seguinte:
“1 - O sujeito activo da relação tributária é a entidade de direito público titular do direito de exigir o cumprimento das obrigações tributárias, quer directamente quer através de representante.
2 – (…).
3 - O sujeito passivo é a pessoa singular ou colectiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável.
(…).”

Da disposição legal acabada de indicar, extrai-se que o sujeito ativo da relação jurídica tributária é a entidade pública, no caso dos autos, a Autoridade Tributária e o sujeito passivo é a pessoa, entidade ou património que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte direto, substituto ou responsável.
Do que precede, resulta que para haver uma relação jurídica tributária, necessariamente, tem de haver uma ligação entre uma entidade de direito público e um ou mais particulares. Dito de outro modo, numa relação que se estabeleça apenas entre particulares, não se pode falar em relação jurídica tributária
Nos presentes autos, a Autora, entre o mais, pede a condenação dos “primeiros adquirentes, em compra por execução, condenados a reconhecer à sociedade I........., Lda., ora Autora, o direito ao arrendamento e consequentemente a restituir à sociedade imobiliária, ora Autora, a posse a título de arrendamento, do imóvel, acima melhor identificado, até ao terminus do contrato.
Bem assim, ser o actual proprietário, ora 3.º R., da família dos 2.º RR, condenado a reconhecer também à sociedade imobiliária, ora Autora, o direito ao arrendamento e consequentemente a restituir à sociedade, ora Autora, a posse a título de arrendamento do imóvel acima melhor identificado até ao terminus do contrato.”
Ou seja, a Autora recorrendo a um processo judicial tributário pede que o tribunal condene particulares a reconhecerem-lhe um direito que alega ter.
Ora, entre a Autora e os particulares que demandou (2.º e 3 RR) não existe qualquer relação jurídica tributária.
Em consequência, no entendimento do Tribunal, isto é quanto basta para se poder concluir que, face aos pedidos formulados pela Autora contra os 2.º e 3.º RR, nenhuma das formas de processo judicial tributário é adequada, pois, conforme acima se referiu, entre particulares não se estabelecem relações jurídicas tributárias.

Contudo, com o que se acaba de referir não se está a dizer que particulares não podem ser demandados por outros particulares nos Tribunais Administrativos e Fiscais, o que se afirma é que entre particulares não se estabelecem relações jurídico-tributárias e, em consequência, nenhuma das formas de processo tributário é adequada a fazer valer uma qualquer pretensão entre particulares.
Face ao exposto, o Tribunal conclui que Ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legitimo em matéria tributária não é a forma de processo adequada para a Autora pedir a condenação dos “primeiros adquirentes, em compra por execução, condenados a reconhecer à sociedade I........., Lda., ora Autora, o direito ao arrendamento e consequentemente a restituir à sociedade imobiliária, ora Autora, a posse a título de arrendamento, do imóvel, acima melhor identificado, até ao terminus do contrato.
Bem assim, ser o actual proprietário, ora 3.º R., da família dos 2.º RR, condenado a reconhecer também à sociedade imobiliária, ora Autora, o direito ao arrendamento e consequentemente a restituir à sociedade, ora Autora, a posse a título de arrendamento do imóvel acima melhor identificado até ao terminus do contrato.”

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Havendo erro na forma de processo, cumpre aferir se o processo pode ser convolado na forma adequada.

Dispõe o artigo 97.º n.º 3 da LGT que “[o]rdenar-se-à a correcção do processo quando o meio usado não for o adequado segundo a lei”, em consonância com o disposto no artigo 98.º n.º 4 do CPPT que estipula que “[e]m caso de erro na forma do processo este será convolado na forma do processo adequada, nos termos da lei”.
Por apelo princípio da proibição da prática de atos inúteis, a jurisprudência tem vindo a entender, uniformemente, que a convolação só deverá ser admitida quando não seja manifesta a improcedência ou intempestividade do meio processual para que se convola.
Face ao que acima se disse quanto à (im)possibilidade de utilização do processo judicial tributário para pedir a condenação de particulares, o Tribunal conclui que não é possível determinar a convolação do processo.
Além do mais, ainda se dirá que Autora, em 2011, apresentou uma reclamação das decisões do órgão da execução fiscal, prevista no artigo 276.º do CPPT, na qual pediu a revogação do ato do órgão de execução fiscal que ordenou a venda do imóvel. O Processo correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, sob o número 737/11.9BESNT, tendo a reclamação sido julgada improcedente, decisão que foi confirmada pelo Acórdão de 19.03.2013, do Tribunal Central Administrativo Sul (artigo 22.º da PI). Como refere a Autora, o fundamento que levou ao insucesso daquela reclamação foi a Autora não ter provado que tinha legitimidade processual naquele processo.
Ou seja, se a Autora não provou os pressupostos da legitimidade naquele processo e com isso o Tribunal não apreciou a questão de fundo, não pode agora lançar mão da presente Ação. Com efeito, as Ações para obter o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido em matéria tributária apenas podem ser propostas quando este meio processual for o mais adequado para assegurar uma tutela plena, eficaz e efetiva do direito ou interesse legalmente protegido e não para contornar o insucesso de uma ação anterior.
Termos em que terá se ser julgada procedente a exceção de erro na forma de processo.”
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IV- O DIREITO:

Vem o presente recurso interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que, concluindo que o meio processo utilizado - ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária - é impróprio para os pedidos que a Autora formula a final e que não é possível a convolação no meio processual adequado, absolveu os Réus da instância.

Com o assim decidido não se conforma a Recorrente, por entender que a sua pretensão é legítima.

A Recorrente pretende com a presente ação que lhes seja reconhecido o direito ao arrendamento sobre o imóvel / prédio urbano, que é uma moradia constituída por R/chão e 1º andar, sito na Rua das F.........., ….9, B.........., descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Cascais sob a ficha nº ..........89e inscrito na matriz predial sob o artigo matricial urbano com o nº ……9.

Alega que a sua pretensão consiste no reconhecimento de um direito de arrendamento violado no procedimento de venda judicial no decurso de processo de execução fiscal.

E que, contrariamente ao decidido não tinha outros meios de tutela e a ação para reconhecimento de um direito era o único que dispunha e lhe conferia maior tutela.

Entende que, da notificação pela Autoridade Tributária Aduaneira à ora Recorrente, da aplicação de normas tributárias emerge um vínculo intersubjetivo entre a essa entidade de direito público e a Recorrente. Podendo, deste modo, concluir-se que figura, no presente caso, uma relação jurídica tributária.

Salienta a Recorrente, que, nos termos dos artigos 193º e 196º do CPC, o erro sobre a forma do processo implicará a anulação total do processo e a absolvição da Recorrida da instância quando não possa ser corrigido para a forma de processo adequada.

E, que ainda que se considerasse o erro sobre a forma de processo, quanto à 2ª e 3ª Rés, não decorre nenhuma factualidade ou direito invocado pelo tribunal a quo relativamente à atuação da Autoridade Tributária e Aduaneira.

Assim, considera a Recorrente que, abstendo-se o Tribunal a quo de se pronunciar sobre a existência ou não de relação jurídica tributária entre a Recorrente e a aqui 1ª Recorrida, tal omissão gera uma nulidade da sentença por omissão de pronúncia sobre questões com relevância para a decisão de mérito.

As questões sobre as quais este tribunal é chamado a pronunciar-se são, assim, a de saber se a ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria




tributária a que alude o artigo 145º do CPPT é meio processual adequado à tutela dos direitos ou interesses da Recorrente e se a decisão recorrida padece de omissão de pronúncia por o tribunal a quo nada ter dito acerca da existência ou não de relação jurídica tributária entre a Recorrente e a 1ª Recorrida (Autoridade Tributária e Aduaneira).

Cremos, contudo, que não assiste razão à Recorrente na sua argumentação.

Vejamos.

Resulta do artigo 101º da Lei Geral Tributária (LGT) e, mais impressivamente do artigo 97º do CPPT, que todas as ações tributárias são especiais ou foram especializadas para responderem a diferentes tipos de pretensões jurídicas.

Elegendo a ação para o reconhecimento do direito como forma processual residual e como repositório final do direito à tutela judicial efetiva quando nenhum dos modelos de ação típicos sejam adequados ao enquadramento da pretensão formulada.

A ação para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária constitui um meio complementar dos restantes meios previstos no contencioso tributário, apenas podendo ser proposta quando for o meio mais adequado para assegurar uma tutela plena, eficaz e efetiva do direito ou interesse respetivo, face à globalidade de meios ali existentes.

Tal é o que decorre, aliás, do disposto no n.º 3 do artigo 145º do CPPT ao estatuir que “As acções apenas podem ser propostas sempre que esse meio processual for o mais adequado para assegurar uma tutela plena, eficaz e efectiva do direito ou interesse legalmente protegido.” Dessa forma se vê adoptada o que tem vindo a ser designado por teoria do alcance médio - cfr., a este propósito Jorge Lopes de Sousa, in CPPT, anotado e comentado, Vol. II, 6.ª edição, Áreas Editora, a fls.491 e segs. e Vieira de Andrade, in “A Justiça Administrativa”, Lições, 3ª edição, a fls. 140.

A este respeito afirmou-se na fundamentação da decisão recorrida que:

«(…)

A Ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legitimo em matéria tributária é uma das várias formas de processo do processo judicial tributário, conforme estabelecido no artigo 97.º, n.º 1 do CPPT.

Nos termos do artigo 96.º, n.º 1 do CPPT, “O processo judicial tributário tem por função a tutela plena, efectiva e em tempo útil dos direitos e interesses legalmente protegidos em matéria tributária.”

Daqui pode-se retirar desde já uma conclusão, que é a seguinte, para que a Ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legitimo em matéria tributária seja, em abstrato, uma forma de processo adequada temos de estar perante uma relação jurídica tributária.

Com efeito, cumpre aferir quem são os sujeitos da relação jurídica tributária.

Estabelece o artigo 18.º da Lei Geral Tributária, cujo título é “Sujeitos” o seguinte:

«1 - O sujeito activo da relação tributária é a entidade de direito público titular do direito de exigir o cumprimento das obrigações tributárias, quer directamente quer através de representante.
2 – (…).
3 - O sujeito passivo é a pessoa singular ou colectiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável.
(…).”

Da disposição legal acabada de indicar, extrai-se que o sujeito ativo da relação jurídica tributária é a entidade pública, no caso dos autos, a Autoridade Tributária e o sujeito passivo é a pessoa, entidade ou património que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte direto, substituto ou responsável.

Do que precede, resulta que para haver uma relação jurídica tributária, necessariamente, tem de haver uma ligação entre uma entidade de direito público e um ou mais particulares. Dito de outro modo, numa relação que se estabeleça apenas entre particulares, não se pode falar em relação jurídica tributária.

Nos presentes autos, a Autora, entre o mais, pede a condenação dos “primeiros adquirentes, em compra por execução, condenados a reconhecer à sociedade I........., Lda., ora Autora, o direito ao arrendamento e consequentemente a restituir à sociedade imobiliária, ora Autora, a posse a título de arrendamento, do imóvel, acima melhor identificado, até ao terminus do contrato.

Bem assim, ser o actual proprietário, ora 3.º R., da família dos 2.º RR, condenado a reconhecer também à sociedade imobiliária, ora Autora, o direito ao arrendamento e consequentemente a restituir à sociedade, ora Autora, a posse a título de arrendamento do imóvel acima melhor identificado até ao terminus do contrato.”

Ou seja, a Autora recorrendo a um processo judicial tributário pede que o tribunal condene particulares a reconhecerem-lhe um direito que alega ter.

Ora, entre a Autora e os particulares que demandou (2.º e 3 RR) não existe qualquer relação jurídica tributária.

Em consequência, no entendimento do Tribunal, isto é quanto basta para se poder concluir que, face aos pedidos formulados pela Autora contra os 2.º e 3.º RR, nenhuma das formas de processo judicial tributário é adequada, pois, conforme acima se referiu, entre particulares não se estabelecem relações jurídicas tributárias.

Contudo, com o que se acaba de referir não se está a dizer que particulares não podem ser demandados por outros particulares nos Tribunais Administrativos e Fiscais, o que se afirma é que entre particulares não se estabelecem relações jurídico-tributárias e, em consequência, nenhuma das formas de processo tributário é adequada a fazer valer uma qualquer pretensão entre particulares.

Face ao exposto, o Tribunal conclui que Ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legitimo em matéria tributária não é a forma de processo adequada para a Autora pedir a condenação dos “primeiros adquirentes, em compra por execução, condenados a reconhecer à sociedade I........., Lda., ora Autora, o direito ao arrendamento e consequentemente a restituir à sociedade imobiliária, ora Autora, a posse a título de arrendamento, do imóvel, acima melhor identificado, até ao terminus do contrato.

Bem assim, ser o actual proprietário, ora 3.º R., da família dos 2.º RR, condenado a reconhecer também à sociedade imobiliária, ora Autora, o direito ao arrendamento e consequentemente a restituir à sociedade, ora Autora, a posse a título de arrendamento do imóvel acima melhor identificado até ao terminus do contrato.»

Relativamente a este segmento da decisão objeto de recurso, nenhum reparo há a fazer, pois como bem refere o tribunal a quo entre particulares não se estabelecem relações jurídico-tributárias e, em consequência, nenhuma das formas de processo tributário é adequada a fazer valer uma qualquer pretensão entre particulares.

As relações jurídicas tributárias são as “estabelecidas entre a administração tributária, agindo como tal, e as pessoas singulares e colectivas e outras entidades legalmente equiparadas a estas” (cfr. artigo 1º, n.º2 da LGT).

Está em discussão uma relação jurídica privada que não cabe na esfera de competência dos tribunais tributários.

O que aliás a própria Recorrente acaba por admitir, quando nas suas alegações afirma: “E, ainda que se considerasse o erro sobre a forma de processo, quanto à 2ª e 3ª Rés, a verdade é que não decorre nenhuma factualidade ou direito invocado relativamente à atuação da Autoridade Tributária e Aduaneira.”.

Pelo que, quanto a esta parte sempre se teria de verificar o apontado erro na forma de processo.

Mais alega a Recorrente, que o tribunal a quo não se pronunciou sobre a existência ou não de relação jurídica tributária entre a Recorrente e a aqui 1ª Recorrida, o que consubstancia omissão de pronuncia.

Vejamos o que se diz na decisão sob escrutínio quanto a esta questão:

«Além do mais, ainda se dirá que Autora, em 2011, apresentou uma reclamação das decisões do órgão da execução fiscal, prevista no artigo 276.º do CPPT, na qual pediu a revogação do ato do órgão de execução fiscal que ordenou a venda do imóvel. O Processo

correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, sob o número 737/11.9BESNT, tendo a reclamação sido julgada improcedente, decisão que foi confirmada pelo Acórdão de 19.03.2013, do Tribunal Central Administrativo Sul (artigo 22.º da PI). Como refere a Autora, o fundamento que levou ao insucesso daquela reclamação foi a Autora não ter provado que tinha legitimidade processual naquele processo.

Ou seja, se a Autora não provou os pressupostos da legitimidade naquele processo e com isso o Tribunal não apreciou a questão de fundo, não pode agora lançar mão da presente Ação. Com efeito, as Ações para obter o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido em matéria tributária apenas podem ser propostas quando este meio processual for o mais adequado para assegurar uma tutela plena, eficaz e efetiva do direito ou interesse legalmente protegido e não para contornar o insucesso de uma ação anterior

Ora, é imposto ao juiz, pelo artigo 608º nº 2 do CPC, aplicável ex vi artigo 2º, alínea e), do CPPT, o dever de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e de não poder ocupar-se senão dessas questões, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, determinando a violação dessa obrigação a nulidade da sentença por omissão ou por excesso de pronúncia.

Assim, incumbe ao julgador a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais exceções invocadas), ficando apenas excetuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras.

Pois bem, a Recorrente alega, que o tribunal a quo não se pronunciou sobre a existência ou não de relação jurídica tributária entre a Recorrente e a aqui 1ª Recorrida.

No entanto, resulta do teor da sentença que:

“Além do mais, ainda se dirá que Autora, em 2011, apresentou uma reclamação das decisões do órgão da execução fiscal, prevista no artigo 276.º do CPPT, na qual pediu a revogação do ato do órgão de execução fiscal que ordenou a venda do imóvel. O Processo correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, sob o número 737/11.9BESNT, tendo a reclamação sido julgada improcedente, decisão que foi confirmada pelo Acórdão de 19.03.2013, do Tribunal Central Administrativo Sul (artigo 22.º da PI). Como refere a Autora, o fundamento que levou ao insucesso daquela reclamação foi a Autora não ter provado que tinha legitimidade processual naquele processo.

Ou seja, se a Autora não provou os pressupostos da legitimidade naquele processo e com isso o Tribunal não apreciou a questão de fundo, não pode agora lançar mão da presente Ação. Com efeito, as Ações para obter o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido em matéria tributária apenas podem ser propostas quando este meio processual for o mais adequado para assegurar uma tutela plena, eficaz e efetiva do direito ou interesse legalmente protegido e não para contornar o insucesso de uma ação anterior.»



Daqui resulta, que, apesar de forma não expressa, o tribunal a quo se pronunciou sobre a relação entre a Recorrente e a Autoridade Tributária, não podendo por isso falar-se em omissão de pronúncia. Pois ao considerar, ser a reclamação de atos do órgão de execução fiscal, prevista no artigo 276º do CPPT, a forma processual adequada para apreciação da pretensão da Recorrente, está implicitamente a pronunciar-se sobre a existência da relação jurídica tributária entre a Recorrente e a aqui 1ª Recorrida. Sendo que a mesma não foi posta em causa pelo tribunal a quo, mas tão só a possibilidade de convolação da presente ação na forma processual adequada.

Assim sendo, tendo presente que incumbe ao julgador a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais exceções invocadas), ficando apenas excetuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras, o presente recurso está condenado ao insucesso, na medida em que, não se pode dizer que existe qualquer situação de nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

Não há dúvida que, a ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária é o único meio processual adequado à apreciação das pretensões que se esgotem no reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária. É este, por assim dizer, o seu âmbito nuclear.

No fundo, é uma ação declarativa de simples apreciação positiva de direitos ou interesses legítimos em matéria tributária. Reagindo contra uma situação de incerteza acerca dos seus direitos ou interesses no quadro de uma relação jurídica tributária, o autor recorre a esta ação para obter do tribunal a declaração de que tem o direito ou de que deve ser assegurada a realização desse interesse.

Assim, a ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido em matéria tributária é o meio processual mais adequado quando a mesma pretensão possa ser formulada em mais do que um meio processual e este ofereça maior tutela.

Ora, no caso em apreciação a presente ação não é o único meio processual adequado ao conhecimento da sua pretensão porque o Autor pode obter o mesmo desiderato recorrendo a outros meios processuais e com maior tutela.

Tanto mais, que, as ações de simples apreciação não têm nenhuma força executiva. Não modificam a situação jurídica do autor nem condenam o órgão decisor a modificá-la.

A ação adequada para fazer valer o direito em causa é a reclamação de atos do órgão de execução fiscal, prevista no artigo 276º, do CPPT, da qual aliás a ora Recorrente lançou mão, como resulta do teor da decisão.

Não esqueçamos, que, a ação de reconhecimento de direitos ou interesses legítimos em matéria tributária vertida no artigo 145º do CPPT, constitui um meio processual complementar e não alternativo aos demais meios processuais, sendo apenas admissível,


reafirmamos, quando a lei não faculte meio adequado para a tutela Jurisdicional dos direitos do contribuinte.

Ora, nos autos, como salienta o Mº Juiz a quo o contribuinte reagiu tempestivamente, desde logo, através de reclamação do acto do órgão de execução fiscal.

Não pode, pois, dizer-se que, no caso concreto, a acção proposta seja o meio mais adequado para assegurar ao contribuinte a “tutela plena, eficaz e efectiva” do direito pretendido fazer valer através da presente ação, uma vez que o meio processual referido e do qual fez utilização permitia perfeitamente concretizar tais objetivos.

Havendo erro na forma de processo, cumpre aferir se o processo pode ser convolado na forma adequada.

Dispõe o artigo 97º n.º 3 da LGT que “[o]rdenar-se-à a correcção do processo quando o meio usado não for o adequado segundo a lei”, em consonância com o disposto no artigo 98º n.º 4 do CPPT que estipula que “[e]m caso de erro na forma do processo este será convolado na forma do processo adequada, nos termos da lei”.

Por apelo ao princípio da proibição da prática de atos inúteis, a jurisprudência tem vindo a entender, uniformemente, que a convolação só deverá ser admitida quando não seja manifesta a improcedência ou intempestividade do meio processual para que se convola.

Face ao exposto, sendo a reclamação prevista no artigo 276º do CPPT a forma de processo adequada para ver apreciada a pretensão da Recorrente e tendo esta feito utilização desse meio processual, não se coloca a questão da convolação na espécie processual correta, pois a mesma redundaria em improcedência. Não restando, assim, outra solução ao tribunal, senão considerar estar perante uma situação de erro na forma de processo.

Pelo que, os argumentos aduzidos no recurso não são suscetíveis de abalar os fundamentos da decisão objeto de apreciação.

Assim, bem andou o Tribunal a quo ao concluir pelo erro na forma de processo (e bem assim pela impossibilidade de convolação).

***



V-DECISÃO:


Face ao exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.



Custas pela Recorrente (artigo 527º do CPC).

Registe e notifique.


Lisboa, 7 de novembro de 2024.

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[Maria da Luz Cardoso]
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[Rui A. S. Ferreira]
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[Tânia Meireles da Cunha]