Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1639/10.1 BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:11/17/2022
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores: PRESTAÇÕES DE DESEMPREGO
DOCENTE UNIVERSITÁRIO
ENSINO PARTICULAR
Sumário:I – O contrato estabelecido entre as partes era um contrato de prestação de serviços, não se tratando de um contrato de trabalho subordinado, nos termos do art. 78º, nº 3, do DL nº 220/2006, razão pela qual não tinha a A. que apresentar junto da Segurança Social declaração do empregador comprovativa da situação de desemprego.
II - Nos termos do art. 639º, do CPC, as conclusões devem indicar as normas jurídicas violadas pela sentença recorrida ou as normas que a sentença deveria ter aplicado, sob pena de não se poder conhecer do recurso.
III - No que concerne à junção de documento em sede de Recurso, nos termos da conjugação dos arts. 425º e 651º, nº 1, do CPC, a apresentação de documentos apenas é admissível quando a sua junção antes do encerramento da discussão em 1ª instancia não tivesse sido possível ou quando a junção com as alegações de recurso se tenha revelado necessária em razão do decidido em 1ª instancia.
IV – É pacifico que a contratação de docentes do ensino superior particular e cooperativo tanto pode fazer-se recorrendo ao modelo do contrato de trabalho, como ao modelo do contrato de prestação de serviços.
Quer o n.º 2 do art.º 40 do Dec. Lei n.º 271/89 de 19 de Agosto, diploma que aprovou o Estatuto do Ensino Superior Particular ou Cooperativo, quer os n.ºs 1 e 2 do art.º 24 do DL n.º 16/94 de 22 de Janeiro, diploma que aprovou um novo Estatuto do Ensino Superior Particular ou Cooperativo, decorre que não existe uma configuração jurídico-material exclusiva para as relações de trabalho que tenham por objeto a prestação de docência (e/ou da investigação) em estabelecimentos de ensino superior.
A contratação de docentes do ensino superior particular ou cooperativo opera-se num contexto de liberdade contratual (art. 405º do CC) podendo a instituição universitária e o docente recorrer, tanto ao contrato de trabalho, como ao contrato de prestação de serviços, optando, num caso ou no outro, pelo modelo de contratação que melhor se ajuste aos interesses em presença.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
I......, devidamente identificada nos autos, intentou ação administrativa especial de impugnação de ato administrativo e de condenação contra o Instituto da Segurança Social, I.P. e o ISPA – Instituto Superior de Psicologia Aplicada, CRL, tendo peticionado, a final, que seja declarada a ilicitude do ato que indeferiu o reinício do pagamento à Autora das prestações de desemprego, com fundamento na violação dos artigos 53.º e 78.º n.º 3 do Decreto-lei n.º 220/2006, bem como se condene o Instituto da Segurança Social, I.P. a proceder àquele pagamento com efeitos retroagidos à data em que deviam ter sido reiniciados.
O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra proferiu sentença em 14 de março de 2016, através da qual decidiu julgar a ação procedente, anulando a decisão impugnada, condenando o Instituto da Segurança Social, I.P. a proceder àquele pagamento com efeitos retroagidos à data em que deveriam ter sido reiniciados, mais tendo absolvido o ISPA – Instituto Superior de Psicologia Aplicada, CRL dos pedidos formulados pela Autora.
Inconformado com a sentença, veio o Instituto da Segurança Social, I.P interpor recurso jurisdicional da referida decisão, proferida em primeira instância no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra.
Formula o aqui Recorrente/Instituto da Segurança Social, I.P. nas suas alegações de recurso, apresentadas em 18 de abril de 2016, as seguintes conclusões:
“1- A Autora, enquanto trabalhadora ao abrigo de um Contrato de Prestação de Serviços, impunha-se que estivesse inscrita como trabalhadora independente (TI) e não como trabalhador por contra de outrem (TCO).
2 - No momento em que viesse a cessar funções como TI, cessava de imediato a sua atividade como trabalhadora independente junto da Autoridade Tributária e da Segurança Social.
3- Impunha-se apresentar, junto do Centro de Emprego de Emprego, a declaração de cessação de atividade emitida pela Autoridade Tributária, aquando do pedido de cessação de atividade como TI, com vista a requerer e retomar o subsídio de desemprego que havia interrompido em Outubro de 2009, conforme informação disponível no “Guia prático de subsídio de desemprego”, publicado na página da segurança social, no seu n° 2, acessível a todos os cidadãos, via internet.
4- A Autora, por razões que o ISS.IP, desconhece não procedeu em conformidade.
5 - A informação comunicada através do registo de carreira contributiva e acesso a subsídios, pela Entidade Empregadora no que respeita à trabalhadora é de “trabalhador por conta de outrem” (TCO),
6 - ou seja o ISPA entregou contribuições/cotizações pela trabalhadora.
7 - Em consequência a Autora ficou, enquadrada como trabalhadora por conta de outrem, e caso se tivesse tratado de um erro, o ISPA, poderia ter comunicado o lapso, contudo, nunca a Entidade Empregadora solicitou a respetiva retificação.
8 - Impõe-se assim concluir que, a Trabalhadora e Entidade Empregadora aceitaram a qualificação TCO, pelo que se impunha que no momento em que a A. cessou funções tivesse solicitado a declaração comprovando a situação de desemprego junto do ISPA, para efeitos de desemprego, pelo que o ato se consolidou.
9 - Apesar de ser referido na sentença que o ISPA contestou, a verdade é que o Requerente ISS.IP, não foi notificado da contestação apresentada pelo Réu ISPA, não tendo oportunidade de exercer o contraditório nesta parte, o que consubstancia uma nulidade.
10 - Em suma a qualificação material da A. era da mesma tivesse em tempo dado a conhecer junto do ISS.IP que laborava como trabalhadora independente,
11 - Contudo a Autora não se inscreveu como trabalhadora independente, não entregou contribuições e cotizações como trabalhadora independente, logo o ISS.IP, qualificou-a e enquadrou-a conforme informação prestada pela entidade patronal, gerando uma qualificação diferente daquela que a Autora, alega e pretende, e que era da sua responsabilidade.
12 - Aquando da segunda cessação do “contrato” laboral com o ISPA, após Dezembro de 2009, em momento algum a A. juntou declaração emitida pela Autoridade Tributária que comprovasse o fim da sua atividade como Trabalhadora Independente, conforme a mesma alega, pelo que o subsídio de desemprego foi indeferido.
13 - De acordo com a informação declarada pelo Réu ISPA ao ISS.IP, a A. tinha necessariamente que ser qualificada como trabalhadora por conta de outrem, e no momento da cessação do vínculo laboral o ISS.IP, cumpriu com o imposto pelo Guia prático de subsídio de desemprego e apresentar a declaração de desemprego.
14 - Por outro lado, a Autora, não apresentou a declaração da Autoridade Tributária, informando da cessação da atividade como trabalhador independente, bem como nunca se inscreveu como trabalhador independente, nem cumpriu durante esse período com as suas obrigações, decorrentes da qualidade de trabalhador independente, junto da Segurança Social.
15 - Em sede de audiência prévia a Autora, foi instada para juntar os documentos necessários, a beneficiária nada fez, conforme fls. 1 a 12 juntas pelo recorrente em 22-02-11.
16 - Limitou-se a requerer desemprego, não cumprindo com os requisitos para aceder ao referido subsídio, e apesar de ser notificado para o fazer nada fez.
17- O ISS.IP., agiu em conformidade com o disposto na lei em vigor, pelo que o ato de indeferimento que recaiu sobre a pretensão da Autora é um ato valido e executório.
Nestes termos, em face da motivação e das conclusões atrás enunciadas, deve ser dado provimento ao presente recurso, e em consequência, ser revogada a sentença de que se recorre, e o Recorrente ISS.IP,, absolvido do pedido com as legais consequências, assim se fazendo por VOSSAS EXCELÊNCIAS, serena, sã e objetiva JUSTIÇA”
O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por Despacho de 31 de maio de 2016.
A aqui Recorrida, I......, veio apresentar contra-alegações de Recurso em 17 de maio de 2016, aí concluindo:
“1. A questão a decidir nos autos é em suma a seguinte:
a) A A. tinha um contrato de trabalho celebrado com o ISPA, e a que as partes puseram termo com efeitos reportados a 31 de Julho de 2009, tendo a cessação por fundamento a necessidade de adequar o quadro de docentes ao decréscimo de alunos e turmas que estava a ocorrer;
b) Por causa dessa cessação do contrato de trabalho a A. inscreveu – se no Centro de Emprego e requereu ao ora Recorrente que lhe fossem pagas as prestações de desemprego a que tinha direito nos termos do DL 220/2006, prestações essas que foram deferidas pelo ora Recorrente;
c) Em Outubro seguinte o ISPA, contactou a A. para que esta, numa modalidade diferente de contratação e de prestação de trabalho e de remuneração voltasse a desempenhar a sua actividade no ISPA, tendo as partes celebrado em 9 desse mês e ano um contrato de prestação de serviços, ao abrigo do qual a A. passou a desempenhar funções docentes a tempo parcial e de modo irregular, dependendo das horas prestadas;
d) A A. requereu então a suspensão das prestações de desemprego;
e) Tendo este último contrato de prestação de serviços durado só alguns meses, uma vez cessado o mesmo a A. requereu ao R. que voltasse a pagar à A. As prestações de desemprego, sendo dada por finda a suspensão que requerera, pois o contrato que motivara aquela suspensão havia terminado, requerimento que fez nos termos do art. 53º, do Dec-Lei 220/2006;
f) O ora Recorrente, por oficio datado de 15 de Junho de 2010, recusara a retoma do pagamento das prestações invocando que, consultados os registos, a A. fora trabalhadora por conta de outrem, designadamente do ISPA, e não apresentara documento comprovativo da situação de desemprego, para que pudesse ser atribuído novo subsidio;
g) Tratando-se da cessação de um contrato de prestação de serviços, a cessação do mesmo não conferia à A. o direito o direito ao pagamento de prestações de desemprego, mas somente ao levantamento da suspensão do pagamento das mesmas – art. 78º, nº 3, do Dec-Lei 220/2006;
h) E, obviamente, o ISPA recusou – se a emitir uma declaração de que “despedira” a A., pois tal não tinha acontecido;
i) E é esse acto de indeferimento por parte do ora Recorrente que vem impugnado nos presentes autos;
2. Proferida sentença a mesma veio a considerar que o contrato de prestação de serviços celebrado entre o ISPA e a A. era um verdadeiro contrato de prestação de serviços e que, não se tratando de um contrato de trabalho subordinado, nos termos do art. 78º, nº 3, do Dec-Lei 220/2006, razão porque não tinha a A. Que apresentar a declaração do empregador comprovativa da situação de desemprego, tendo anulado o acto de indeferimento praticado pelo R. com fundamento em violação dos arts. 53º e 78º, nº 3, do Dec-Lei 220/2006, condenando o R. a efectuar o pagamento das prestações de desemprego com efeitos retroagidos à data em que deveriam ter sido reiniciados, como peticionado;
3. Interpõe agora o R. o presente recurso jurisdicional invocando que:
a) A A., após ter assinado, em 10 de Outubro de 2009, o contrato de prestação de serviços com o ISPA não se inscreveu na Segurança Social como Trabalhadora Independente e documento emitido pela Autoridade Tributária comprovando a cessação de tal actividade independente, após a cessação do contrato de prestação de serviços;
b) E, na ausência de tais elementos o R. havia consultado os registos de contribuições existentes no R. este constatou que, no período em que perdurou aquele contrato de prestação de serviços, as contribuições entradas eram as que eram devidas no âmbito de um contrato de trabalho subordinado;
c) Essas duas situações fizeram com que o R. presumisse que, a partir de Outubro de 2009, a A. estivesse a trabalhar para o ISPA, no âmbito de uma relação de trabalho subordinado;
d) Tanto mais quando é certo que o R. havia solicitado à A. uma cópia do contrato de prestação de serviços, cópia essa que a A. nunca entregara;
d) Fora pois por omissão imputável à A. que o R. não a tivesse qualificado, a partir de 10 de Outubro de 2009, como Trabalhadora Independente e tivesse negado o reinicio do pagamento à A. das prestações de desemprego;
4. O principal problema deste processo radica na definição da natureza do vinculo contratual que os liga ao Estabelecimento de Ensino Superior Particular, matéria que o legislador persiste em não definir, conduzindo a interpretações dispares, mas que maioritariamente têm sido decididas pela Jurisprudência no sentido de que a contratação de docentes do Ensino Superior Particular e Cooperativo tanto pode fazer-se recorrendo ao modelo do contrato de trabalho, como ao modelo do contrato de prestação de serviços – Ver por todos o Acórdão do STJ, de 13 de Outubro de 2004;
5. E, precisamente por causa desta indefinição e colocando – se a questão do regime contributivo em sede de Segurança Social, é que foi estabelecido o acordo entre a Associação Portuguesa do Ensino Particular, o ACT e a Inspecção da Segurança Social e que consta do Doc. 7, que impõe aos estabelecimentos de Ensino Superior Particular um regime de excepção nos pagamentos a fazer à Segurança Social, e consta também do Despacho que consta do Doc. 2, oferecido pelo R. em requerimento entrado nos autos no dia 23 de Fevereiro de 2012 e que remete para a aplicação aos docentes do Ensino Superior Particular através de contratos de prestação de serviços o regime constante do art. 2º do Dec-Lei 109/93 que é o regime geral da Segurança Social, com regras especiais quanto ao montante e responsabilidade pelo pagamento das contribuições;
6. Fica pois esclarecido que na situação da A. esta, após a celebração do contrato de prestação de serviços com o ISPA, em 10 de Outubro de 2009, tinha que continuar a contribuir para a Segurança Social, embora não existisse já um vinculo contratual de subordinação;
7. Cai pois pela base a tese da R. de que tinha sido a A. que tinha induzido o R. em erro por o ISPA ter continuado a remeter para a Segurança Social as contribuições após a celebração do contrato de prestação de serviços, pois o ISPA não podia deixar de o fazer;
8. Acresce que, nunca o R. comunicou sequer à A. que se a mesma se tivesse inscrito na Segurança Social, como Trabalhadora independente iria ter acesso a nova atribuição de prestações de desemprego, mas antes o que lhe comunicou foi que, como tinham estado a entrar contribuições referentes à existência de um contrato de trabalho subordinado, tinha que trazer uma declaração do empregador em como fora despedida, dando lugar a nova concessão de subsídios de desemprego, e não ao reinicio das prestações suspensas e é esse acto que vem impugnado nos autos;
9. A douta sentença recorrida deve pois ser mantida, por ter feito correcta aplicação do direito aplicável aos factos.
Termos em que, Deverá:
a) Decidir – se em sede de despacho de admissão de recurso se o mesmo pode se admitido ou se deve antes ser objecto de reclamação para a conferencia;
b) Ser o R. ora Recorrente notificado para indicar nas conclusões quais as normas jurídicas violadas ou as que foram impropriamente aplicadas;
c) Determinar-se o desentranhamento do documento oferecido com as alegações do recurso interposto, por o mesmo não reunir os pressupostos da sua admissibilidade;
d) Ser negado provimento ao presente recurso, mantendo – se a sentença recorrida, como é de direito e é de inteira JUSTIÇA”
O Ministério Público junto deste Tribunal notificado em 14 de junho de 2016, veio a emitir Parecer em 23 de junho de 2016, no qual se pronuncia no sentido de ser negado provimento, mantendo-se o decidido em toda a sua extensão”.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente/ISS IP, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita, designadamente, uma nulidade decorrente da circunstância de não ter sido notificada da Contestação apresentada pelo corréu ISPA, mais se impondo verificar a natureza do vinculo funcional da Autora, de modo a concluir se preenchia os pressupostos tendentes a retomar o recebimento do Subsidio de Desemprego.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada:
“1) A Autora [A], I......, Professora, reside na Rua , ….. Esqº, Linda-a-Velha, Oeiras.
2) Desde 01/10/1987 e até 31/07/2009, a Autora foi docente do R, ISPA-Instituto Superior de Psicologia Aplicada, CRL [ISPA], no âmbito de um contrato de trabalho subordinado vigente entre estas partes –doc 1, fls 11, da PI, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
3) Em 05/07/2009, em razão de redução da atividade do R, ISPA, a A e este celebraram o «acordo de revogação de contrato de trabalho», de fls 12, doc 2 da PI, e doc 3, fls 13, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, com produção de efeitos no dia 31/07/2009.
4) Em 31/07/2009, a Autora requereu ao R, Instituto da Segurança Social, IP [ISS-IP], a atribuição do subsídio de desemprego, tendo as prestações sido deferidas a partir do dia 17/08/2009 e processadas até dia 12/10/2009, no montante diário de €41,92 e tendo a duração de 180 dias –doc 4, fls 14, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
5) Em 09/10/2009, a A celebrou com aquele R, ISPA, o acordo designado «contrato de prestação de serviços», de fls 15, doc 5, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, nos termos do qual a A retomou as suas funções docentes a tempo parcial durante o ano letivo de 2009/2010.
6) Em 13/10/2009, tendo retomado funções, a A requereu ao R, ISS-IP, a suspensão da atribuição das prestações de desemprego [nos termos do artigo 52-1-a), do DL 220/2006, tendo aquela suspensão ocorrido a partir desse dia 13/10/2009 –acordo das partes, não tendo as partes junto documento comprovativo.
7) Em data não concretizada pelas partes, o designado «contrato de prestação de serviços» acima referido, cessou antes do termo que dele constava, tendo a Autora terminado também exercício da atividade que vinha a prestar ao Réu, ISPA –acordo das partes, não tendo as partes junto documento comprovativo.
8) Em 11/02/2010 a A requereu de ao R, ISS-IP, o reinício do subsídio de desemprego, pelo requerimento de fls 124 e 135, cujo teor se dá por integralmente reproduzido [artigo 53 do DL 220/2006].
9) Em data não concretizada pelas partes, na sequência deste requerimento, o R, ISS-IP, solicitou à Autora, a entrega da declaração comprovativa da situação desemprego e da inscrição no Centro de Emprego [com base no artigo 78-3, do DL 220/2006, de 03/11] -acordo das partes, não tendo as partes junto documento comprovativo.
10) Em 12/05/2010, o R, ISS-IP, dirigiu à A o ofício 085494, de fls 134, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, segundo o qual «Assunto: Prestações de desemprego- NISS.... (…) Em resposta à exposição apresentada por V. Ex ª no dia 06/05/2010, sobre o assunto em epígrafe, cumpre informar:
Nos termos do n° 3 do artº 78° do Decreto-Lei n° 220/06 de 3 de Novembro, para análise e decisão do reinicio das prestações de desemprego que foram suspensas no dia 13/10/09 é exigida a inscrição no Centro de Emprego e, no caso de exercício de atividade profissional por conta de outrem, a apresentação da declaração do empregador comprovativa da situação de desemprego.
Face ao exposto, enquanto não for entregue a referida declaração não poderá ter direito ao reinicio. (…)».
11) Em 15/06/2010, o R, ISS-IP, dirigiu à A o ofício 099081, de fls 133 e fls 18, doc 6 da PI, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, segundo o qual consta «Assunto: Prestações de desemprego- NISS.... (…) Vimos pelo presente informar V.Exª que não pode ser dado o reinicio das prestações de desemprego solicitado, porque consultadas os registos dos sistemas da Segurança Social foi trabalhadora por conta de outrem no ISPA e não apresentou a declaração da situação de desemprego, para que pudesse ser atribuído o novo subsídio.
Face ao exposto, enquanto não for entregue a referida declaração, não poderá ter direito ao reinicio.(…)».
12) A Direção dos Regimes da Segurança Social do Ministério do Trabalho e da Solidariedade emitiu uma «ORIENTAÇÃO TÉCNICA» transmitida pela Circular no 6 de 25/03/1998, de fls 131, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
13) A APESP-Associação Portuguesa de do Ensino Superior Particular, emitiu o entendimento, junto a fls 49, doc 7 da PI, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, acerca do regime contratual do pessoal docente das instituições de ensino superior privado e do regime contributivo para a segurança social a aplicar, para valer a partir de 01/01/1998.
14) A presente ação deu entrada em juízo em 25/10/2010 -fls 2 e 3.”

IV – Do Direito
No que aqui releva, discorreu-se no discurso fundamentador da decisão recorrida, o seguinte:
“(…) 2.2.O artigo 22º, do DL 220/2006, de 03/11, sob a epígrafe «prazos de garantia», estabelece que «1- O prazo de garantia para atribuição do subsídio de desemprego é de 450 dias de trabalho por conta de outrem, com o correspondente registo de remunerações, num período de 24 meses imediatamente anterior à data do desemprego. 2- O prazo de garantia para atribuição do subsídio social de desemprego é de 180 dias de trabalho por conta de outrem, com o correspondente registo de remunerações, num período de 12 meses imediatamente anterior à data do desemprego»
A verificação dos prazos de garantia é feita nos termos do artigo 23º, do DL 220/200, que determina os períodos de registo de remunerações com ou sem relevantes.
Nos termos do artigo 52º-1, do DL 220/2006, intitulado «situação laboral ou profissional», «1 - Determinam a suspensão do pagamento das prestações de desemprego as seguintes situações inerentes à situação laboral ou profissional do beneficiário: a) Exercício de atividade profissional por conta de outrem ou por conta própria, por período consecutivo inferior a três anos; b) Frequência de curso de formação profissional com atribuição de compensação remuneratória; c) Registo de remunerações relativo a férias não gozadas na vigência do contrato de trabalho».
Dispõe o artigo 53º-1, do DL 220/2006, sob a epígrafe «reinício das prestações», que
«1- O reinício do pagamento das prestações de desemprego depende da verificação da capacidade e disponibilidade para o trabalho, concretizada na inscrição para emprego no centro de emprego.».
O artigo 78º, do DL 220/2006, de 03/11, estabelece, sob a epígrafe «dispensa de requerimento», que:
«1- A atribuição do subsídio social de desemprego resultante de o beneficiário ter esgotado o período de concessão do subsídio de desemprego bem como a atribuição do subsídio de desemprego parcial não dependem de requerimento mas exigem a apresentação dos meios de prova específicos das condições que justificam a sua atribuição, no prazo de 90 dias consecutivos a contar, respetivamente, da cessação do subsídio de desemprego ou do início do trabalho a tempo parcial.
2- Nas situações previstas no nº 4 do artigo 24º, o prazo para apresentação dos meios de prova das condições de atribuição do subsídio social de desemprego conta-se a partir da data do termo do contrato de trabalho a tempo parcial.
3- O reinício do pagamento das prestações de desemprego que se encontrava suspenso não depende de requerimento mas exige a inscrição para emprego no centro de emprego e, no caso de exercício de atividade profissional por conta de outrem, a apresentação da declaração do empregador comprovativa da situação de desemprego.».
Alega o R que, tendo a A requerido, em Fevereiro/2010, de novo, o subsídio de desemprego, nos termos do artigo 78º-3, do DL 220/2006, foi-lhe solicitada a entrega de documentos de prova, -para poder ser reiniciado o pagamento do subsídio de desemprego suspenso-, mediante a inscrição para emprego no centro de emprego e a declaração da entidade empregadora confirmando a situação de desemprego, exigidos pelos citados artigo 78º-3 e 53º; pois, não cumprindo, a A se coloca na situação do artigo 22º [prazos de garantia].
Contra-alega a A que a declaração do empregador comprovativa da situação de desemprego só é necessária no caso de ter havido exercício de atividade profissional por conta de outrem; porém a autora não se encontrava a trabalhar por conta de outrem, pois se encontrava a trabalhar ao abrigo de um contrato de prestação de serviços.
O artigo 78º-3, do DL 220/2006, como acabamos de ver, exige que o interessado faça prova, -para efeitos do reinício do pagamento que se encontrava suspenso-, da inscrição, para emprego, no centro de emprego e, [cumulativamente, como indica a partícula «e»], no caso de trabalho por conta de outrem, a apresentação da declaração do empregador comprovativa da situação de desemprego.
O DL 220/2006, de 03/11, estabeleceu o quadro legal da reparação da eventualidade de desemprego dos trabalhadores por conta de outrem, no âmbito do subsistema previdencial [artigo 1º]. Como dá nota na declaração de motivos preambular, o legislador procurou, tendo por base a experiência, delimitar conceitos, tais como o desemprego conveniente, que reconheceu ser bastante vago, impreciso e pouco operativo. Como ali expos, as alterações assentam, entre o mais, em que o regime então atual se tem mostrado pouco eficaz na prevenção de situações de fraude no acesso e na atribuição indevida desta prestação, sendo necessário proceder a alguns ajustamentos e aperfeiçoar conceitos de modo que os mesmos possam ser mais operativos, promovendo-se, por isso, uma maior articulação entre os serviços de emprego e os da segurança social, reforçando e agilizando os canais de comunicação e a partilha de informação entre os mesmos.
Destaca ainda o facto de as medidas de combate à fraude, para além da promoção da poupança de recursos na segurança social, penalizarem os comportamentos que distorcem a concorrência entre empresas. «Assim, são definidas com rigor as condições em que, mesmo nos casos de cessação do contrato por acordo entre a entidade empregadora e o trabalhador, se mantém o acesso ao subsídio de desemprego, pois o sistema de proteção social não deve continuar a suportar os custos decorrentes de todas as situações de acordo entre trabalhadores e empresas, sem prejuízo, contudo, da consideração de situações específicas de verdadeira reestruturação das empresas, com vista a garantir a sua viabilidade económica, e, assim, dos postos de trabalho em causa».
Parece, então, que, dadas estas preocupações, o legislador pretendeu definir com rigor as condições de acesso ao subsídio de desemprego, e que, por isso, estabeleceu que «a caracterização da relação laboral decorre da situação de o trabalhador ter estado vinculado por contrato de trabalho, ainda que sujeito a legislação especial» [artigos 19º, 18º e 22º],
Importa, assim, caracterizar o contrato celebrado entre a A e o ISPA, em 09/10/2009, designado «contrato de prestação de serviços».
2.3.O contrato de 09/10/2009
Importa distinguir o contrato de trabalho do contrato de prestação de serviços. Na verdade, o contrato de prestação de serviços é um contrato dito afim do contrato de trabalho mas com ele não se confunde.
O contrato de trabalho é o contrato «pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direção desta» [artigo 1152, do CC]; e está sujeito a legislação especial [artigo 1153, do CC].
Ou, na formulação do artigo 11º, da Lei 7/2009, de 12/02 [e atual Lei 23/2012, de 25/06], «contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas».
O contrato de prestação de serviço «é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição» [artigo 1154º, CC]. Enquanto que no contrato individual de trabalho «uma pessoa» singular se obriga, no contrato de prestação de serviços obriga-se «uma das partes»; no contrato de trabalho a pessoa singular presta a própria atividade [intelectual ou manual], no contrato de prestação de serviços «uma das partes» presta o resultado do seu trabalho [intelectual ou manual]; no contrato de trabalho o prestador [trabalhador] encontra-se sob a autoridade e direção [e organização] da outra parte, no contrato de prestação de serviços não existe esta subordinação à autoridade da outra parte. Por isso, a parte beneficiária da prestação do serviço nunca pode, por exemplo, «despedir» a outra parte, pois não há uma relação de dependência, de subordinação e de poder de intromissão na própria [gestão da] prestação da atividade. Na prestação de serviços, a parte prestadora é autónoma, desse ponto de vista, comprometendo-se, porém, obviamente, a prestar a sua atividade, como um «produto», nos termos contratados, mas não nos termos do contrato de trabalho; e não está sujeita ao regime do contrato de trabalho. O contrato de trabalho é sempre remunerado e envolve regalias específicas, mas no contrato de prestação de serviços pode ser ou não remunerado e não tem as regalias específicas do trabalhador por conta de outrem mediante um contrato individual de trabalho.
Assim, embora o contrato de prestação de serviços [trabalho autónomo] constitua uma das figuras afins do contrato de trabalho [trabalho subordinado] e não seja óbvia a distinção entre um e outro, como ensina ANTÓNIO MONTEIRO FERNANDES, a prestação de serviços não se confunde com o contrato de trabalho.
Vejamos agora os termos do contrato celebrado.
Como resulta das cláusulas do contrato, as partes contratantes assentaram no considerando de que continuam a aguardar pela aprovação do diploma próprio do regime de contratação do pessoal docente previsto no artigo 53º, da Lei 62/2007, de 10/09 e na especificidade do quadro do exercício da atividade docente nos estabelecimentos de ensino superior particular e cooperativo, de acordo com a qual, apesar do vínculo contratual com a entidade titular, compete aos órgãos próprios, com autonomia pedagógica e científica, determinar, dirigir, avaliar e fiscalizar a prestação de serviços docentes.
Nesse sentido, a A obrigou-se a exercer a docência no estabelecimento do ISPA, conforme a sua qualificação académica; seguindo as determinações e instruções emanadas dos diferentes órgãos académicos do ISPA em tudo o que disser respeito à prestação de serviços docentes e à organização e funcionamento do estabelecimento de ensino; sendo responsável pela regência (ou lecionação) da(s) disciplinas(s), de acordo com os planos de estudo aprovados. A A obrigou-se ainda a assegurar o regular funcionamento das aulas, exames, atendimento aos alunos e reuniões pedagógicas que lhe forem atribuídos, de acordo com o horário que lhe for distribuído e com as necessidades e exigências da prestação do serviço docente; bem como a elaborar os ‘pontos’ escritos, coordenar a vigilância na prestação das provas e integrar os júris de avaliação.
Convencionaram ainda que o desempenho funcional da A não integra as obrigações próprias dos docente vinculados por contrato de trabalho, designadamente as de fazer parte dos órgãos colegiais do estabelecimento de ensino, e outras tarefas de extensão universitária e investigação científica, bem como a atribuição à A de uma determinada carga horária num ano letivo, de nenhum modo o constitui no direito de lhe ver atribuída no ano letivo subsequente idêntica quantidade de horas de lecionação.
Em contrapartida, o ISPA acordou pagar mensalmente à A os honorários dos serviços prestados em cada mês, conforme tabela de retribuição do valor/hora de aula [37,20€] e horas de atendimento e de vigilância de exames [50% do valor da hora/aula].
O contrato assim celebrado, manifestamente, não representa qualquer contrato individual de trabalho encapotado com as vestes do contrato de prestação de serviço. Trata-se, efetivamente de um contrato de prestação de serviço, só que de um serviço tal que, pelas suas características específicas, implica, de um lado, o necessário reconhecimento da autonomia técnico-científica do professor, prestador do serviço, - como resultado da sua atividade -, e de outro lado a necessária conformação a programas, horários, conteúdos e normas de ensino cuja delimitação e determinação compete à outra parte beneficiária da prestação definir, conformar e determinar.
Ora, o conteúdo e especificidades, acabados de referir, nada têm a ver com um contrato individual de trabalho, isto é, com uma relação de subordinação pela Autora à autoridade e direção do estabelecimento [dos órgãos do] de ensino superior em questão.
Não é, pois, verdade que o alegado pelo R, no ponto 6º da contestação, quando refere que, «embora se intitule como um contrato de prestação de serviços, a verdade é que as condições dispostas do Art° 1º ao 11º, têm implícitas os deveres de subordinação jurídica e económica do trabalhador à entidade empregadora, portanto um verdadeiro contrato de trabalho, com uma carga horária a definir e um custo subjacente».
As partes são livres de, dentro dos limites legais, estabelecer os contratos e tipo de contratos que entenderem [artigos 397º e 398º, do CC]. É evidente que o legislador quis obstaculizar a fraude na obtenção de subsídios, mas daí não se segue que as partes não possam celebrar um contrato de prestação de serviço docente, em vez de um contrato individual de trabalho, pelo qual o trabalhador preste tal serviço docente. O serviço pode até ser o mesmo, mas já não será o mesmo o seu regime obrigacional e legal.
No caso do contrato de trabalho o empregador pode intrometer-se na própria prestação do serviço docente, mas sendo prestação de serviço só pode acordar os termos da prestação, colhendo o resultado da prestação dessa atividade docente, mas não pode intrometer-se na própria atividade.
A circunstância de, no caso específico do exercício da docência, em face da autonomia técnica e científica do professor, a entidade patronal acabar por apenas poder interferir em termos semelhantes aos referente ao docente que se encontre em regime de prestação de serviços, - e de substancialmente, a prestação se aproximar -, tal não invalida que os dois tipos de contrato não possam ser diferenciáveis e diversos, como efetivamente são.
Deste modo, entendemos que o contrato em questão pode e deve ser caracterizado como contrato de prestação de serviço docente, não constituindo um contrato individual de trabalho subordinado entre a A e o ISPA [que, se o fosse, adiante-se seria a termo certo].
Regressando agora ao citado artigo 78º-3, do DL 220/2006, uma vez que não estamos perante «caso de exercício de atividade profissional por conta de outrem», não era exigível «a apresentação da declaração do empregador comprovativa da situação de desemprego».
Não é, pelo exposto, necessário discutir, por inócua, a questão de saber se o regime jurídico do contrato de docência é o do DL 67/2000 de 26/04 e do DL 220/2006 de 03/11, com as necessárias adaptações, ou se o artigo 53º [que se refere ao «regime do pessoal docente e de investigação»] da Lei 62/2007, de 10/09, já foi regulamentado.
O ato padece de violação de lei cujo sancionamento é a anulabilidade [artigo 135, CPA].
Em face de tudo o exposto, deve ser julgada procedente a presente ação, anulando-se o ato impugnado, que indeferiu o reinicio do pagamento das prestações de desemprego [com fundamento na violação dos artigos 53º e 78º-3, do DL 220/2006], e condenando-se o R, ISS-IP, a proceder àquele pagamento com efeitos retroagidos à data em que deveriam ter sido reiniciados, como peticionado. Deve ainda absolver-se o R, ISPA, dos pedidos.”

Vem pelo ISS IP recursivamente suscitada a nulidade da Sentença, decorrente da circunstância de não ter sido notificado da contestação apresentada pelo Corréu ISPA.

Foi pelo tribunal de 1ª instância sustentada a Sentença Recorrida, por Despacho de 31/05/2016, no qual, e no que aqui releva, se afirmou:
“Alega o R que «apesar de ser referido na sentença que o ISPA contestou, a verdade é que o Requerente ISS-IP, não foi notificado da contestação apresentada pelo Réu ISPA, não tendo oportunidade de exercer o contraditório nesta parte, o que consubstancia uma nulidade».
Entendemos que não se trata de qualquer nulidade processual substancial, a declarar, que implicasse, por arrastamento da nulidade do processado subsequente, a nulidade da própria sentença. Na verdade, foi assegurado o contraditório e, se o ISS-IP não invocou antes a alegada omissão de que fala é porque não quis. Mas vejamos melhor.
Embora o recorrente não venha arguir expressamente a nulidade da própria sentença, nos termos do artigo 615-1 e 617, ambos do CPC [artigo 95-2, CPTA], e embora a nulidade processual não esteja ali vertida, certo é que, o mesmo vem indiretamente alegar uma nulidade processual por alegada violação do principio do contraditório. E, a ser como alega, poderia implicar a nulidade dos atos do processado posterior não aproveitável, incluindo, portanto, a própria sentença. Por isso, acautelando, nos termos do disposto no artigo 617º, do CPC, diremos que a mesma, salvo melhor opinião, não ocorre.
A alegada omissão de contraditório, quando seja devido, e mais ainda se influi de forma desfavorável à parte, constitui nulidade processual que determinaria a nulidade dos atos processuais posteriores, não aproveitáveis, incluindo a própria sentença. Isto se for devido e se não puder funcionar o princípio do máximo aproveitamento dos atos consagrado no artigo 195º, do CPC.
Se fosse como o R pretende fazer crer, e crê-se que não é, haveria lugar à anulação dos atos subsequentes à omissão, haveria que garantir o exercício deste e voltar-se-ia a proferir sentença, tendo em conta tal contraditório. Mas o R reservou-se para a fase de alegações de recurso, para vir arguir tal alegada nulidade, quando, teve todas as possibilidades de, até de acordo com o princípio da lealdade e da boa-fé, plasmado nos artigos 8º, do CPTA, [e 7º e 8º do CPC], não só ter exercido o contraditório como também de suscitar essa alegada falta.
Com efeito, foram citados os demandados o ISS-IP, ora recorrente, e o ISPA, como competia. E ambos contestaram, o ISS-IP a fls 72/83 e o ISPA a fls 79. E não suscitaram exceções.
A Secção notificou as contestações À Autora e ao MP, cfr fls 92/ss.
Foi proferido, e notificado ao ISS-IP, o despacho de fls 117, que dá conta da contestação do contrainteressado ISPA, pelo que o ISS-IP disso tomou conhecimento.
Também o despacho saneador de fls 201 foi notificado ao R ora recorrente, ali se falando também do contrainteressado ISPA.
Notificados para alegações, o R, ora recorrente, veio alegar a fls 209.
Nunca o ora recorrente ISS-IP suscitou qualquer falta de notificação do contrainteressado, a não ser agora em alegações de recurso, uma vez que a sentença lhe foi desfavorável.
Informou a Secção [UO], a fls 294, que cumpriu o ato oficioso da secretaria, conforme o artigo 84, do CPTA, notificando a autora da apresentação das contestações do R e do CI, não se mostrando oficiosa a notificação do corréu, ao Réu ora recorrente.
Ora, dando cumprimento ao artigo 81º, do CPTA, a Secção notificou a PI ao R, ora recorrente e ao contra Interessado, ISPA. E as contestações foram notificadas pela Secção à Autora.
E do PA instrutor junto pelo R, foi a A notificada, cfr despacho de fls 117 e fls 129/ss e 192, nos termos do artigo 84, CPTA.
O princípio do contraditório visa assegurar o debate entre autores [parte ativa] e demandados [parte passiva], e não entre vários autores e/ou entre demandados, uns em relação aos outros. Em nome, no fundo, do princípio da defesa, e do pedido, os quais não se colocam entre partes plurais, ativas ou passivas, da relação processual, entre si , mas apenas entre a parte autora e a parte demandada. No caso, não tinha que ser assegurada qualquer contraditoriedade entre o demandado Réu e o contrainteressado, mas apenas entre estes e
a Autora. Contraditoriedade, que, de resto, nem foi alegada nem se vislumbra.
Vistos os artigos 186º/ss, e 195º a 202º, todos do CPC, ex vi 1ºº e 35º, do CPTA, não ocorre qualquer nulidade processual, determinante de anulação do processado posterior, incluindo a sentença. Não existiu violação do princípio do contraditório e, mesmo que tivesse de ser notificada a contestação do CI ao R, também a sua alegada omissão não influiu na decisão da causa [artigo 195º-1, fine, do CPC]. Tal alegada omissão não se encontra expressamente fulminada com nulidade, nos termos do artigo 195-1, do CPC, que determina a taxatividade
das nulidades.
Por tudo o exposto, não declaro a nulidade da sentença, por arrastamento da alegada nulidade processual, que também não declaro, decorrente da alegada violação do contraditório. Mantenho, assim, o decidido na sentença, nos seus precisos termos, salvo o sempre devido respeito a decisão do tribunal superior.

Apreciando a nulidade suscitada, refira-se que se acompanha, no essencial, a precedente sustentação proferida em 1ª Instância.
Efetivamente tendo o ISPA tido uma intervenção processual meramente instrumental e incidental, a ausência de notificação da sua Contestação ao corréu ISS IP, não teve quaisquer consequências relativamente ao sentido da decisão final, nos termos o nº 1 do Artº 195º do CPC, o qual estatui que a omissão de formalidade só produz nulidade quando a irregularidade cometida possa influir na decisão da causa.

De resto, tendo o ISPA, a final, sido absolvido dos pedidos, a sua Contestação, que assentava exatamente na sua ilegitimidade passiva, enquanto suposto contrainteressado, não teve qualquer influência no sentido decisório relativamente à condenação do ISS IP.

Assim, não se reconhece a verificação da suscitada nulidade, à luz do referido nº 1 do Artº 195º do CPC.
* * *
As questões a decidir nos autos predem-se, no essencial, e atenta a matéria dada como provada, com o seguinte:
a) A A. tinha um contrato de trabalho celebrado com o ISPA, sendo que as partes puseram termo ao mesmo com efeitos reportados a 31 de Julho de 2009, tendo a cessação por fundamento a necessidade de adequar o quadro de docentes ao decréscimo de alunos e turmas que estava a ocorrer;
b) Decorrente dessa cessação do contrato de trabalho a A. Inscreveu-se no Centro de Emprego e requereu ao ISS que lhe fossem pagas as prestações de desemprego nos termos do DL nº 220/2006, prestações essas que foram deferidas;
c) Em Outubro seguinte o ISPA, contactou a A. para que voltasse a desempenhar a sua atividade no ISPA, tendo as partes celebrado em 9 desse mês e ano um contrato de prestação de serviços, ao abrigo do qual a A. passou a desempenhar funções docentes a tempo parcial e de modo irregular, dependendo das horas prestadas;
d) A A. requereu então, como lhe competia, a suspensão das prestações de desemprego;
e) Tendo o último contrato, de prestação de serviços, vigorado apenas por alguns meses, uma vez cessado o mesmo a A. requereu ao ISS IP que fosse retomado o pagamento das prestações de desemprego;
f) O ISS IP, por oficio de 15 de Junho de 2010, recusou a retoma do pagamento das prestações invocando que, consultados os registos, a A. fora trabalhadora por conta de outrem, designadamente do ISPA, não tendo apresentado documento comprovativo da situação de desemprego, para que pudesse ser atribuído novo subsidio;
g) Mais, tratando-se da cessação de um contrato de prestação de serviços, a cessação do mesmo não conferia à A. o direito ao pagamento de prestações de desemprego;
h) O ISPA instado a emitir uma declaração de despedimento da A., não o fez.

A Sentença proferida em 1ª instância veio a considerar que o contrato firmado entre as partes em outubro de 2009, era um verdadeiro contrato de prestação de serviços, não se tratando de um contrato de trabalho subordinado, nos termos do art. 78º, nº 3, do DL nº 220/2006, razão pela qual não tinha a A. que apresentar a declaração do empregador comprovativa da situação de desemprego, tendo anulado o ato de indeferimento praticado pelo R. exatamente com fundamento na violação dos Artº 53º e 78º, nº 3, do DL nº 220/2006, condenando o R. a efetuar o pagamento das prestações de desemprego com efeitos retroagidos à data em que deveriam ter sido reiniciados, como peticionado.

Interpôs o ISS IP o Recurso ora em análise, assentando nos seguintes pressupostos/fundamentos:
a) A A., após ter assinado, em 10 de Outubro de 2009, o contrato de prestação de serviços com o ISPA não se inscreveu na Segurança Social como Trabalhadora Independente e documento emitido pela Autoridade Tributária comprovando a cessação de tal atividade independente, após a cessação do contrato de prestação de serviços;
b) Na ausência de tais elementos o R. havia consultado os registos de contribuições existentes no R. tendo constatado que, no período em que perdurou aquele contrato de prestação de serviços, as contribuições entradas eram as que eram devidas no âmbito de um contrato de trabalho subordinado;
c) Ambas as situações fizeram com que o ISS IP presumisse que, a partir de Outubro de 2009, a A. estivesse a trabalhar para o ISPA, no âmbito de uma relação de trabalho subordinado.

Vejamos:
A Autora, aqui Recorrida, suscitou nas suas Contra-alegações a circunstância do ISS IP não ter recursivamente indicado as normas jurídicas violadas pela sentença recorrida e o facto de ter juntado com o Recurso um novo documento.

Da falta de indicação pelo Recorrente das normas jurídicas violadas pela sentença recorrida
Efetivamente, nos termos do art. 639º, do CPC, as conclusões devem indicar as normas jurídicas violadas pela sentença recorrida ou as normas que a sentença deveria ter aplicado, sob pena de não se poder conhecer do recurso.

É efetivamente incontornável que o Recorrente ISS IP incumpriu recursivamente o referido ónus, o que determinaria a insusceptibilidade de uma plena e rigorosa apreciação do invocado, o que não invalida que se faça a apreciação infra.

Da junção de documentos em sede de recurso
Já no que concerne à junção de documento em sede de Recurso, nos termos da conjugação dos arts. 425º e 651º, nº 1, do CPC, a apresentação de documentos apenas é admissível quando a sua junção antes do encerramento da discussão em 1ª instancia não tivesse sido possível ou quando a junção com as alegações de recurso se tenha revelado necessária em razão do decidido em 1ª instancia.

Não é essa a situação do documento junto pelo Recorrente com as alegações de recurso, o qual, se fosse o caso, já poderia ter sido apresentado precedentemente, razão pela qual a sua apresentação se mostra inadmissível, sendo que, em qualquer caso, não se vislumbra nem reconhece que o seu teor pudesse determinar a inflexão do sentido da decisão proferida ou a proferir.

Das questões suscitadas pelo R. em sede de recurso
O que predominantemente se mostra controvertido e está em causa na presente Ação, resulta de alguma indefinição reinante normativamente quanto aos vínculos contratuais estabelecidos relativamente aos docentes dos Estabelecimento de Ensino Superior Particular onde prestam serviço.

Em face do que precede, a própria jurisprudência tem ensaiado algumas soluções.

Veja-se o Acórdão do STJ, de 13 de Outubro de 2004, onde se afirma que “Tem sido orientação praticamente uniforme da jurisprudência ultimamente emitida por este Supremo Tribunal a de que a contratação de docentes do ensino superior particular e cooperativo tanto pode fazer-se recorrendo ao modelo do contrato de trabalho, como ao modelo do contrato de prestação de serviços.
Quer o n.º 2 do art.º 40 do Dec. Lei n.º 271/89 de 19 de Agosto, diploma que aprovou o Estatuto do Ensino Superior Particular ou Cooperativo, quer os n.ºs 1 e 2 do art.º 24 do DL n.º 16/94 de 22 de Janeiro, diploma que aprovou um novo Estatuto do Ensino Superior Particular ou Cooperativo, decorre que não existe uma configuração jurídico-material exclusiva para as relações de trabalho que tenham por objeto a prestação de docência (e/ou da investigação) em estabelecimentos de ensino superior.
A contratação de docentes do ensino superior particular ou cooperativo opera-se num contexto de liberdade contratual (art. 405º do CC) podendo a instituição universitária e o docente recorrer, tanto ao contrato de trabalho (através de um convénio em que se verifique o condicionalismo de subordinação característico do contrato individual de trabalho) como ao contrato de prestação de serviços, optando, num caso ou no outro, pelo modelo de contratação que melhor se ajuste aos seus interesses.”

Esta situação de inércia legislativa e indefinição, que se tem mantido, no essencial, imutável ao longo dos anos, leva a que no atual Regulamento Jurídico das Instituições de Ensino Superior, aprovado pela Lei 62/2007, se continuasse a prever no art.º 53º que o regime do pessoal docente e de investigação das instituições privadas é aprovado por Decreto-Lei, sem que tal tenha ainda sido concretizado.

É, aliás, essa crónica indefinição que levou a que o regime contributivo em sede de Segurança Social, tenha sido objeto de uma orientação por parte da Associação Portuguesa do Ensino Particular, depois de reunir com a Inspeção-geral de Trabalho e a Inspeção-geral de Segurança Social, “com o propósito de definir um entendimento acerca do regime contratual do pessoal docente das Instituições de ensino superior privado e do regime contributivo para a segurança social a aplicar” (Doc. 7 PI).

Essa orientação permitiu criar um regime de exceção nos pagamentos a fazer à Segurança Social, e que consta igualmente da “Circular de Orientação Técnica nº 6” do Ministério do Trabalho e da Solidariedade – Direção-geral dos Regimes de Segurança Social (Cfr. Doc 2, junto aos Autos pelo ISS IP em 23 de Fevereiro de 2011) e que remete para a aplicação aos docentes do Ensino Superior Particular através de contratos de prestação de serviços, do regime constante do art. 2º do DL nº 109/93 que é o regime geral da Segurança Social, com regras especiais quanto ao montante e responsabilidade pelo pagamento das contribuições.

Perante a panóplia de regimes vigentes, e em funções das “orientações Técnicas” que foram sendo proferidas, acompanha-se a exaustiva interpretação adotada em 1ª Instância, no sentido de que, na situação da A., após a celebração do novo contrato com o ISPA, em 10 de Outubro de 2009, nada obstava a que, na duvida e à cautela, continuasse a contribuir para a Segurança Social, embora não existisse já um vinculo contratual de subordinação.

Acresce que o ISS IP apenas comunicou à A. que, como tinham estado a entrar contribuições referentes à existência de um contrato de trabalho subordinado, tinha que trazer uma declaração do empregador em como fora despedida, dando lugar a nova concessão de subsídios de desemprego, e não ao reinicio das prestações suspensas, sendo esse o ato aqui objeto de impugnação.

Assim sendo, entende-se que a Autora, aqui Recorrida não poderá ser penalizada pela indefinição legal vigente quanto aos regimes contratuais dos docentes do Ensino Superior Privado, e do correspondente regime de segurança social aplicável, considerando-se que a interpretação adotada em 1ª instância, que aqui se ratifica, é a que melhor se adequa aos factos ao direito e à justiça.

* * *

Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao Recurso, confirmando-se a Sentença Recorrida.

Custas pelo Recorrente

Lisboa, 17 de novembro de 2022
Frederico de Frias Macedo Branco

Alda Nunes

Lina Costa