Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2245/18.8BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:04/29/2021
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:INTIMAÇÃO PARA UM COMPORTAMENTO
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
PRETENSÃO DO REQUERENTE
Sumário:O enunciado requisito da Intimação do dever de prestação jurídica violado, consubstanciou-se na preterição do dever de decisão, plasmado no art.º 56.º da Lei Geral Tributária, mas a legalidade ficou reintegrada logo que o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP proferiu a decisão omitida, independentemente do seu conteúdo, alcance e sentido decisório.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO
J....., com os sinais nos autos, veio, em conformidade com os artigos 280º a 282.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, interpor recurso da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, de 31 de outubro de 2020, a qual, no âmbito da intimação para comportamento contra Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP para responder ao pedido de reconhecimento da prescrição das dívidas em apreço deduzida por J....., declarou a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide. Mais, aquela sentença, fixou à o valor da instância em €30.000,01 e condenou o A. nas custas.

O Recorrente termina as alegações de recurso formulando as conclusões seguintes:
A) A douta sentença que aqui se recorre, considerou erradamente que: “A pretensão do Requerente foi satisfeita na pendência da ação (Cfr. facto provado nº 1), encontrando-se assim os autos sem objecto, pelo que, importa declarar extinta a presente lide, nos termos do artigo 277º alínea e) do código de Processo Civil, ex vi, do artigo 2º e) do Código de Processo e Procedimento Tributário.”Acrescentando, ainda a douta sentença, “Na verdade, em que ao contrário do defendido pelo Autor não e este o meio processual para impugnar o despacho que indeferiu o requerimento de declaração da prescrição das dívidas em apreço.”
B) Em 15 de novembro de 2018, o Recorrente remeteu ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., um pedido de reconhecimento da prescrição das cotizações que lhe estavam a ser peticionadas correspondentes aos períodos de 2010 a outubro de 2012. Mais, solicitando que fosse remetida ao Recorrente a notificação do deferimento da arguição da prescrição efetuada.
C) Em 27 de junho de 2019, na pendência dos presentes autos, foi rececionada uma missiva do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, proferindo indeferimento relativamente ao pedido de reconhecimento de prescrição das dívidas de cotizações de fevereiro de 2010 a dezembro de 2012.
D) Da missiva rececionada consta a seguinte informação, “O indeferimento da prescrição relativamente a todos os períodos constantes dos processos de execução nº ..... e apensos e nº ..... e apensos (....., ....., ..... e .....) e com os fundamentos explanados, porquanto ocorreram factos/atos suscetíveis de interromperem o cômputo do prazo prescricional do revertido J....., enquanto responsável subsidiário da executada originária R....., LDA – NIPC ....., pelo que se mantém a exigibilidade da dívida exequenda.”
E) Ora, processo ....., o mesmo refere-se unicamente a cotizações dos períodos de março de 2009 a janeiro de 2010. O processo ....., apenso ao processo supra mencionado, diz respeito a contribuições. Os processos ....., ..... e ....., os mesmos encontram-se na mesma situação do processo supra referido, isto é, respeita unicamente a contribuições. E os processos ....., ....., encontram-se extintos quanto ao aqui Recorrente, logo, deixam de ter relevância quanto ao peticionado.
F) Ora, não basta à entidade intimada, responder de forma genérica, mencionar processos de execução fiscal que em nada tem a ver com a pretensão do Autor, nem com os períodos de dívida cuja prescrição pretende ver reconhecida.
G) Ao contrário do entendimento preconizado na douta sentença, o Recorrente, não pretende impugnar o despacho que indeferiu o Requerimento de declaração da prescrição. Mas, salvo o devido respeito, não pode, a administração pública responder “qualquer coisa”, mesmo que, em nada se adeque ao solicitado, e considerar-se a pretensão satisfeita.
H) Pelo facto da entidade requerida ter efetuado uma comunicação ao Recorrente que em nada responde ao requerido, pois que os períodos mencionados, na missiva, nem sequer são os mesmos, não pode ser considerado que está a responder ao peticionado. E, concomitantemente, não pode o Tribunal a quo considerar que a pretensão foi satisfeita.
I) Assim, andou mal o Tribunal a quo, pelo que a sentença proferida não pode produzir efeitos jurídicos, pelo que a mesma, deve ser substituída por outra, que intime o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., a responder ao pedido efetuado pelo Recorrente.

Nestes termos e nos mais de Direito sempre com o mui douto suprimento de V/ Exas. deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e consequentemente ser a sentença proferida substituída por outra que intime a recorrida a responder ao pedido formulado pelo Recorrente.
****
A AT, notificada, não apresentou contra-alegações.
****
Notificado, o Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
****
Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que a recorrente remate a sua alegação (art. 639º do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do referido tribunal.
De outro modo, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.
Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que no caso concreto, a questão fundamental a decidir é saber se a sentença recorrida errou no seu julgamento quando declarou extinta a presente instância, por a pretensão da requerente ter sido satisfeita na pendência da acção.
****

II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1. De facto

A sentença recorrida deu por provado o seguinte facto:
“1. Em data posterior à instauração dos presentes autos, o Autor foi notificado do indeferimento do pedido de reconhecimento da prescrição das dívidas em apreço. (provado por prova documental cfr. fls 133 e segs dos presentes autos.)”
****
No que respeita a factos não provados, refere a sentença o seguinte:
“Não se detecta a alegação de factos essenciais relevantes para a decisão da causa que devam ser considerados como não provados.”
****

A convicção do Tribunal assentou “nos documentos juntos aos autos e não impugnados, referidos nos «factos provados» e na posição das partes.”
****
Dá-se como provado a seguinte factualidade, ao abrigo do artigo 662.º do CPC, com relevo para a decisão do recurso:

2. Em 15/11/2018, o requerente dirigiu requerimento ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP, onde a final, requeria o seguinte:
(i) O reconhecimento da prescrição das cotizações peticionadas de abril de 2010 a outubro de 2012;
(ii) E a notificação do deferimento da arguição de prescrição aqui efetuada.

3. Na notificação referida em 1. consta o seguinte “Na sequência da análise de prescrição, foi proferido despacho de indeferimento da prescrição, para os tributos de 2010/02 a 2012/12, (…)”.
*****

II.2. De Direito
Em sede de aplicação de direito, declarou-se extinta a presente instância, por inutilidade superveniente da lide, por a pretensão da requerente ter sido satisfeita na pendência da acção.

Inconformado, o requerente veio interpor recurso da decisão alegando [conclusões de recurso H) e I)] que Pelo facto da entidade requerida ter efetuado uma comunicação ao Recorrente que em nada responde ao requerido, pois que os períodos mencionados, na missiva, nem sequer são os mesmos, não pode ser considerado que está a responder ao peticionado. E, concomitantemente, não pode o Tribunal a quo considerar que a pretensão foi satisfeita. Assim, andou mal o Tribunal a quo, pelo que a sentença proferida não pode produzir efeitos jurídicos, pelo que a mesma, deve ser substituída por outra, que intime o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., a responder ao pedido efetuado pelo Recorrente.

Vejamos.
Sob a epígrafe «Intimação para um comportamento» estatui o artigo 147.º do CPPT que «Em caso de omissão, por parte da administração tributária, do dever de qualquer prestação jurídica susceptível de lesar direito ou interesse legítimo em matéria tributária, poderá o interessado requerer a sua intimação para o cumprimento desse dever junto do tribunal tributário competente».
Temos então que os requisitos legais para uso deste meio processual são os seguintes:
(i) a omissão de um dever jurídico por parte da administração tributária susceptível de lesar direito ou interesse legítimo em matéria tributária, e
(ii) que essa intimação seja o meio mais adequado para assegurar a tutela plena desse direito ou interesse, pressupondo aquela omissão a prévia definição da existência desse dever.

Em sede de recurso, vem o recorrente mostrar o seu desagrado com a resposta obtida (alega que de “forma genérica”) da entidade requerida, sendo que a decisão foi de indeferimento da prescrição, ao contrário do que tinha requerido.
E mais considera que a sentença recorrida deve ser substituída por outra que intime a recorrida a responder ao pedido formulado pelo recorrente.
Ora, o recorrente encontrava-se legitimidado a lançar mão deste meio processual da Intimação para um Comportamento visando obter uma decisão sobre o pedido de reconhecimento da prescrição das cotizações peticionadas de abril de 2010 a outubro de 2012.
Mas tão-só.

Não lhe assiste o direito a obter do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP uma decisão favorável à pretensão deduzida, nem o tribunal pode, através deste meio processual, sindicar o mérito da decisão proferida sobre o pedido.
Para isso, o meio processual próprio será outro meio processual que comporte uma fase declarativa, definidora da situação jurídica do Recorrente.
É que o enunciado requisito da Intimação do dever de prestação jurídica violado, consubstanciou-se na preterição do dever de decisão, plasmado no art.º 56.º da Lei Geral Tributária, mas a legalidade ficou reintegrada logo que o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP proferiu a decisão omitida, independentemente do seu conteúdo, alcance e sentido decisório.
A inutilidade superveniente da lide (art.º 277º, al. e), do Código de Processo Civil), verifica-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a solução do litígio deixe de ter todo o interesse e utilidade, conduzindo, por isso, à extinção da instância.
Tendo sido proferida uma decisão expressa sobre o pedido dirigido ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP e visando a qual se intentara a presente meio processual, ficou sem objecto a presente Intimação.
O que implica a inutilidade superveniente da lide e consequente extinção da instância, nos termos do disposto nos artigos 277.º, al. e) do Código de Processo Civil e 2º.al. e) do Código de Procedimento e Processo Tributário.
Pelo que improcede o presente recurso, mantendo-se a sentença recorrida.

****
III – DECISÃO

Termos em que, acordam os Juízes da 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.

Custas pelo recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 29 de Abril de 2021

[O Relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Desembargadoras Maria Cardoso e Catarina Almeida e Sousa]