Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:85/10.1BECTB
Secção:CT
Data do Acordão:07/08/2021
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:AVALIAÇÃO COM RECURSO AO 89ºA DA LGT
CASO DECIDIDO
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO
NOTIFICAÇÃO PESSOAL
Sumário:I – Na situação e apreço, a Recorrente confunde dois aspectos que não são confundíveis: uma coisa, é a contestação da avaliação da matéria coletável pelo método constante do artigo 89º-A da LGT, a qual está sujeita a regras próprias, que não podem deixar de ser observadas, sob pena da matéria, assim fixada, se tornar definitiva; outra coisa, bem diferente, é a liquidação final ser ela mesma susceptível de contestação por ilegalidades não correspondentes à discordância com a avaliação efectuada com recurso ao artigo 89º -A da LGT.

II - O regime da caducidade do direito à liquidação de impostos não é matéria de conhecimento oficioso, nem invocável a todo o tempo.

III - No caso dos autos, estamos face a liquidação de IRS, imposto periódico, pelo que o prazo de caducidade do direito à liquidação se conta a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário (cfr. artigo 45, nº.4, da LGT). Tratando-se de liquidação relativa ao ano fiscal de 2005, o prazo inicia-se em 31/12/05, tendo o seu termo final em 31/12/2009.

IV - A escolha da notificação pessoal pela entidade competente da administração tributária, para transmitir ao destinatário o conteúdo do acto tributário, constitui manifestação do exercício de um poder discricionário que deve ponderar a eficácia no cumprimento do objectivo visado.

V - As notificações pessoais de actos tributários, a realizar de acordo com as regras das citações pessoais, poderão ser efectuadas de acordo com qualquer das modalidades de citação pessoal previstas no CPC.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul


I – RELATÓRIO


L... e M..., m.i nos autos, deduziram impugnação judicial do acto de liquidação adicional de IRS de 2005 com o n.º 20095005..., de 24/12/2009, no montante de 97.256,57euros.

Invocaram, para tanto, dois fundamentos, a saber e por esta ordem: caducidade do direito à liquidação (violação do artigo 45º da LGT) e a ilegalidade da fixação dos rendimentos por métodos indirectos, ao abrigo do artigo 89º-A da LGT.

O Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Castelo Branco considerou, dando razão à questão suscitada pela Fazenda Pública, que dúvidas “não restam que não podem já os impugnantes lançar mão de impugnação judicial para discutir a verificação dos pressupostos para a avaliação da matéria colectável, ao abrigo do artigo 89.º-A, da LGT”, com a justificação - em resumo útil e de acordo com jurisprudência que invoca – “de que decisão de avaliação constitui acto destacável do procedimento administrativo, pelo que se forma caso decidido ou caso resolvido na falta de recurso judicial dessa decisão, a qual, assim, se consolida na ordem jurídica, não podendo ser posta em causa na impugnação judicial da liquidação respectiva”.

No mais, julgou improcedente a invocada violação da caducidade do direito à liquidação.

Inconformados, os Impugnantes, interpuseram recurso jurisdicional da sentença, tendo apresentado alegações e formulado as seguintes conclusões:



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*


Foram apresentadas contra-alegações, com as seguintes conclusões.

a) O recorrente foi notificado da avaliação indireta da matéria tributável, nos termos do seguintes: 1. Nos termos do artigo 77º da LGT – Lei Geral Tributária e do artigo 62º do RCPIT – Regime Complementar de Inspeção Tributária, do relatório de avaliação indireta do rendimento tributável em sede de IRS, do exercício de 2005, nos termos do artº 89º-A da LGT, junto em anexo.

2. E, nos termos dos artºs 66º do CIRS (…) e 36º do CPPT (…), da fixação do rendimento tributável de IRS, do exercício de 2005, por avaliação indireta, ao abrigo do disposto no artº 89º-A da LGT, conforme apuramento descrito no quadro seguinte:


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3. A decisão referida no ponto anterior tem por base os factos, motivos e fundamentos e, bem assim, os critérios que originam os valores acima referidos, expressamente desenvolvidos no relatório da decisão da aplicação de métodos indiretos, que faz parte da presente notificação.

4. De harmonia com o disposto nos artºs 89º-A, nº 7 da LGT e 146º-B do CPPT, da mesma decisão cabe recurso para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco de 1ª instância, a apresentar no prazo de dez dias a contar da data em que foi notificado da decisão, com efeito suspensivo da liquidação de imposto. (sublinhado nosso) – documento nº 3 junto com a pi, sendo por isso, do perfeito conhecimento do ora recorrente.

b) O recorrente não cumpriu o disposto no artº 146º-B do CPPT, ou seja, não interpôs o recurso para o TAF de Castelo Branco.

c) O procedimento de revisão da matéria tributável, ao contrário do que faz presumir o recorrente, não teve por objeto a fixação do rendimento coletável, com recurso ao disposto no artº 89º-A da LGT, mas sim no que concerne ao facto da contabilidade do contribuinte não se mostrar credível e idónea, mas no que respeita ao exercício de 1997.

d) O ato tributário que está em causa na presente impugnação refere-se ao ano de 2005. O recorrente procura, de forma pueril, lançar a confusão na presente questão decidenda, quando se trata de dois atos perfeitamente distintos e autónomos.

e) Os recorrentes fizeram suprimentos à sociedade “C... & Filhos Lda”, no montante de 429.464,32, utilizados na aquisição do terreno mencionado na Ata nº 11 de 25.05.2005, registados na conta 25 da contabilidade.

f) Pela aplicação da tabela do artº 89º-A da LGT estimou-se um rendimento padrão de € 214.732,16 (50% x 429.464,32); nesse ano, o agregado familiar declarou o rendimento líquido de € 34.696,38, conforme nota de liquidação de IRS nº 5133988669 de 02.08.2006, evidenciando rendimentos de montante inferior a 50% do referido rendimento padrão (50% de 214.732,16 – 107.366,08 €).

g) Mostrando-se reunidos os requisitos legais para, de acordo com a tabela a que se refere o artº 89º-A da LGT se proceder à fixação do rendimento tributável no montante de € 214.732,16 a considerar como rendimento da categoria G, de acordo com a alínea d) do nº 1 do artº 9º do CIRS.

h) Dispõe o artº 38º nºs 5 e 6 do CPPT que: As notificações serão pessoais nos casos previstos na lei ou quando a entidade que a elas proceder o entender necessário. 6 - Às notificações pessoais aplicam-se as regras sobre a citação pessoal.

i) Não existe nenhuma referência legal que dite a obrigatoriedade do envio de carta registada para as notificações que sejam o culminar de um procedimento onde se cumpriu o direito de audição. O que se prevê é essa possibilidade, uma vez que o direito de defesa do contribuinte e o pleno conhecimento dos factos que deram origem às correções e consequente liquidação adicional já foram devidamente assegurados, pelo exercício do direito do artº 60º da LGT (direito de participação).

j) - No entanto, se o órgão competente para a notificação entender utilizar como forma de notificação, atenta a dificuldade em efetuar a mesma e o eventual decurso do prazo de caducidade, por contacto pessoal com o notificando, nada obsta na lei a que o faça. Tal faculdade cabe no seu poder discricionário, sempre nos limites da legalidade. Vide neste sentido o Ac. do STA de 27.09.2005, proc. 0423/05. Na mesma esteira vão o comentário do Conselheiro Lopes de Sousa ao preceito do artº 38º do CPPT, in Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado, 6ª Edição, Vislis, 2011.

k) A notificação pessoal, que se efetua como a citação pessoal, que aqui se refere, é a que é efectuada através de contacto pessoal com o notificando ou aquela que é efetuada em pessoa diversa do notificando, encarregada de lhe transmitir o conteúdo do ato, que nos casos expressamente previstos na lei, é equiparada à citação pessoal, presumindo-se, salvo prova em contrário, que o citando dela teve oportuno conhecimento [art. 233, nºs 2, alínea c), e 4, do CPC].

l) Trata-se de um conceito diferente do utilizado no processo civil para as citações, pois nele se considera citação pessoal não só a que é efectuada através de contacto com o citando (ou com pessoa encarregada de lhe transmitir a citação, que é equiparada à citação pessoal, nos casos expressamente previstos na lei. Não se compreende a razão de facto ou de direito que impeça que o artº 240º e 241º do CPC (atuais 232º e 233º do CPC).

m) Quanto à notificação com hora certa, esta só pode ter lugar quando se confirme a residência do notificando no local e aí não se encontre. Circunstância que os funcionários encarregados da diligência de notificação procuraram confirmar, uma vez que se deslocaram ao local, contactaram com o TOC, para averiguar do paradeiro dos ora impugnantes, foi efetuado um contacto telefónico com o filho dos mesmos, que se encontrava no estrangeiro, que se mostrou evasivo quanto ao paradeiro dos pais, ou seja, envidaram-se todos os esforços para corroborar a residência dos impugnantes e para os contactar pessoalmente, de modo a entregar-lhes a notificação ou a encontrar um terceiro que validamente lhes pudesse comunicar o conteúdo do ato a notificar (neste caso, o filho) não se tendo alcançado tal desiderato.

n) Foram cumpridos todos os trâmites legais para efetivar validamente a notificação, nunca tendo sido referido aos funcionários, que os impugnantes se encontrassem ausentes, no gozo de um período de férias. Procedeu-se, nesse caso, à afixação, na residência dos impugnantes, da comunicação a designar o dia 31.12.2009, pelas 10h00, para contacto pessoal, conforme Doc. nº 4 junto pelos impugnantes. Esta afixação foi levada a efeito em 30.12.2009, pelas 17h30. Residência em que é expressamente reconhecida como sendo a própria, nos presentes autos, pois, de contrário, não se compreenderia a alegação de uma eventual prática de um crime de introdução em local vedado ao público, p.p. pelo artº 191º do C. Penal.

o) Cumpre ainda observar, conforme certidão do registo comercial da Guarda, a fls. 251 a 254, a sede da empresa C... & Filhos Lda é, precisamente, na Rua V..., pelo que, não nos parece que a sede social de uma empresa, seja um local vedado ao público. Considerando a confusão entre a sede social e o domicilio dos impugnantes, deixa-se aqui a nota que a sociedade, sendo uma entidade abstrata, tem que se manter sempre em funcionamento, representada por alguém, designadamente, com o intuito de receber notificações (das finanças e outras), não se podendo ausentar, convenientemente, em férias, nos últimos dias do ano.

p) Na hora e data designadas, no mesmo local, i.e., Rua V..., procedeu-se à verificação da hora certa, não se logrando encontrar os notificandos, pelo que, nos termos do artº 240º, nº 3 do CPC, se considerou validamente efetuada a notificação e se comunicou aos interessados que poderiam aceder aos elementos em causa, designadamente, à demonstração da liquidação de IRS, do ano de 2005, nº 2009- 1919205, no valor global de € 93.875,25, na sequência das correções propostas na ação de inspeção com o nº OI 200900561.

q) Foi ainda tentada a notificação numa morada no Rabaçal, concelho da Meda – Rua ...º (junto ao Parque Infantil) por se tratar da segunda residência dos notificandos. Diligências levadas a cabo nas datas supra referidas, com idêntica taxa de sucesso, ou seja, designou-se hora certa, fez-se a verificação da mesma e não se obtendo o contacto pessoal com os ora impugnantes, considerou-se feita a notificação.

r) Assim foi cumprido o prazo de quatro anos previsto no artº 45º da LGT, uma vez que o ato tributário foi validamente notificado no dia 31.12.2009.

Pelo que, com o mais que Vossas Excelências se dignarão suprir, não deve ser dado provimento ao recurso e, em consequência, deve ser mantida a decisão recorrida, devendo, ainda, manter-se a liquidação de IRS impugnada, com as legais consequências, só se assim se fazendo

JUSTIÇA!


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Neste TCA, a Exma. Magistrada do Ministério Público pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à Secção de Contencioso Tributário para julgamento do recurso.

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II - FUNDAMENTAÇÃO

De facto

É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida, fixada em dois momentos distintos na sentença mas que, aqui, se agrupam:

“Com interesse para a decisão da excepção, mostram-se provados os seguintes factos:

a) A liquidação de IRS relativa ao exercício de 2005 resulta do despacho do Director de Finanças da Guarda, onde, além do mais, se lê (fls. 26 e ss. dos autos, dá-se por integralmente reproduzido):

“a. De acordo com o disposto no n.º1 do artigo 89-A, da LGT, há lugar a avaliação indirecta da matéria colectável quando falte a declaração de rendimentos ou os rendimentos declarados, num determinado ano, para efeitos de IRS, mostrem uma desproporção superior a 50%, para menos, e relação ao rendimento padrão apurado nos termos da tabela a que se refere o n.º4 do citado artigo.

b. No ano de 2005, o sujeito passivo L..., NIF ..., titular de rendimentos da categoria A, F e H, efectuou suprimentos à sociedade C... e& Filhos, Lda.‖ com o NIPC 5..., da qual é sócio, no montante global de 429.464,32 €m valor que pela aplicação da tabela identificada, permite estimar um rendimento padrão de 214.732,16 €(50%+426.464,32€).

c. Nesse ano o agregado familiar declarou o rendimento líquido de 34.696,38€ m conforme nota de liquidação de IRS n. º5133988669 de 02/08/2006, evidenciado rendimento de montante inferior a 50% do referido rendimento padrão (50%*214.732,16=107.366,08).

d. Pelo que, se encontram reunidas as condições legais para, de acordo com a tabela a que se refere o n.º4 do referido 89.º -A da LGT, se proceder à fixação do rendimento tributável no montante de 214.732,16€, assim quantificado.


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e. Este rendimento tributável será considerado como rendimento da categoria G, de acordo com a alínea d) do n.º1 do artigo 9.º do Código de IRS – Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares.

f. Nos termos do n.º3 do artigo 89.º - A da LGT, para obstar ao procedimento de fixação devem os sujeitos passivos fazer prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, mediante apresentação, de cópia de extractos bancários que evidenciem a origem e a mobilização dos recurso financeiros utilizados para os suprimentos realizados, acompanhada da declaração escrita onde manifeste expressamente autorização à Administração Tributária, nos termos da alínea b) do n.º3 do artigo 63.º - B da LGT, para aceder as contas bancárias.

g. Nos termos do n.º6 do artigo 60 da LGT e do artigo 45.º do CPPT – Código de Procedimento e de Processo Tributário, os elementos referidos no ponto anterior, deveriam ser apresentados, por escrito, no prazo de 10 dias da notificação do projecto de decisão de aplicação de métodos indirectos, efectuada através do ofício n.º32889 de 30/09/2009.

2. Direito de audição exercido pelos sujeitos passivos

Tendo os sujeitos passivos sido notificados, através do oficio n. 32889 remetido por carta registada com aviso de recepção em 30/09/2009, e nos termos do art. 60.° da LGT e art 60.° do RCPIT, para exercer o direito de audição sobre o projecto de decisão de aplicação de métodos indirectos vieram os mesmos e exercer esse direito por escrito em 9/10/2009, e como tal fora do prazo legal, dado que o mesmo terminou em 16/10/2009, através de uma petição, que não continha os documentos ai mencionados, pelo que foram os sujeitos passivos novamente notificados através do oficio n. 32991 de 20/10/2009, para completar a sua petição com a junção dos elementos em falta.

Apreciação

Referem os sujeitos passivos no ponto 1 da petição que ―estiveram emigrados em França entre os anos de 1965 e 1983, de tempo ao longo do qual sempre desenvolveram actividade profissional remunerada‖.

Juntando, para demonstrar este argumento, cópia de alguns dos recibos de vencimentos obtidos, pelo que não se coloca em causa este argumento, o qual não é objecto de apreciação no presente processo.

Até porque em seguida, os sujeitos passivos indicam, no ponto 2 da petição, que após o seu regresso a Portugal com as economias significativas que amealharam (…) constituíram uma pequena empresa de construção em nome individual, através da qual adquiriram alguns prédios rústicos para posterior venda em propriedade horizontal; pelo que partir dessa data são os rendimentos daqui obtidas que importa analisar.

Mais referem os sujeitos passivos nos pontos 3 da sua petição, que na década de 90 essa empresa foi objecto de ―fixação de rendimentos desproporcionados por parte da Administração Fiscal, facto para o qual os signatários não puderam contestar devido ―insuficiência de organização, e que ― tal fixação não prova a realização de valores, e que ―não parece legítimo que um mesmo incidente tenha duas leituras distintas.

Argumento este que é de todo inaceitável, desde logo, porque ao contrário do que afirmam os sujeitos passivos tais correcções foram efectuadas no âmbito da Ordem de Serviço n.º5827 de 12/04/1999, com referência ao exercido de 1997e tendo as mesmas siclo objecto de acordo na reunião de peritos levada a cabo nos termos do art 91. da LGT. conforme acta nº19 de 2/11/2000. pelo que não só foram contestadas, como as correcções finais foram efectuadas com o acordo do sujeito passivo em análise, conforme cópia da referida acta, que se junta em anexo. Para além disso, as correcções efectuadas dizem respeito a venda de imóveis, e nesse exercício de 1997 o valor patrimonial tributário dos imóveis inscritos em nome dos sujeitos passivos aumentou 425.783,89€m sendo que esses imóveis se encontram actualmente arrendados constituindo a principal fonte dos rendimentos declarados em sede de IRS pelos sujeitos passivos.

Nos pontos 5 a 8 os sujeitos passivos alegam que após o mês de Dezembro de 1999, ― actividade desenvolvida de construção de edifícios se passou a desenvolver através da sociedade C... & FILHOS. LDA, com o NIPC 5..., os rendimentos globais brutos tiveram um significativo decréscimo, após o ano de 2000‖ atingindo cerca de 40.000,00 € por ano, com excepção do ano de 2005 que ascenderam a 50.000,00 €, sendo estes, conforme alega no ponto 6 que ―os rendimentos brutos declarados entre os anos de 2000 e 2004 (...) concorreram para apuramento do rendimento padrão nos termos do n. °l do art.° 89. °da LGT.

Mais uma vez não concordamos com este argumento, desde logo porque o n. 1 do art.° 89. da LGT não tem aplicação no caso em apreço, e também não existe qualquer previsão legal de que para apuramento do rendimento padrão se deve ter em conta os rendimentos dos anos de 2000 a 2004. Conforme alegado pelo sujeito passivo, uma vez que o n.° 1 do art.º 89-A da LGT refere-se à desproporção entre o rendimento declarado em determinado ano e o rendimentos padrão, e para apuramento deste atende-se apenas ao suprimentos efectuados no ano em causa, conforme resulta da alínea b) do n.º2 do art.º 89-A, da LGT e o n.º4 do mesmo artigo.

Como tal, caberia ao sujeito passivo comprovar que no ano em causa correspondem a realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte da manifestação de fortuna evidenciada.

Prova esta que não foi efectuada pelos sujeitos passivos, que alegam nos pontos 9 e 10 da sua petição que (...) pese embote a confiança de que o sistema bancário usufrui não ousam colocar em causa, ainda assim, e na sua condição individual sempre consideraram oportuno, depositar/guardar as suas economias em cofre pessoal; Tal situação porque não é ilegal deve por si só consubstanciar elemento de prova no termos do art.° 89 da LGT.

Relativamente a este argumento, temos a referir que os sujeitos passivos estavam obrigados a cumprir com o disposto no n. 2 do art. 63.°-C da LGT, o qual prevê que todos os movimentos relativos a suprimentos outras formas de empréstimo e adiantamentos de sócios devem ser efectuados através de conta bancária afecta exclusivamente à actividade empresarial desenvolvida, o que efectivamente aconteceu, conforme demonstram os elementos de prova dos suprimentos efectuados, bem assim como do aumento de capital subscrito e realizado no ano de 2006.

Verifica-se assim que, apesar do facto de os sujeitos passivos alegarem guardar as suas economias em cofre pessoal, na manifestação de fortuna evidenciada foram utilizados cheques bancários como meio de realização dos suprimentos, e, mesmo tendo em conta os rendimentos declarados pelas sujeitos passivos em sede de IRS e já corrigidos pela Administração Fiscal com referência ao exercido de 1997, pelo facto de não apresentarem cópia de extractos bancários que evidenciem a origem e a mobilização dos recursos financeiros utilizados para os suprimentos realizados acompanhados de declaração escrita onde manifestem expressamente autorização à Administração Tributária, nos termos da alínea b) do n.º3 do artigo 63.º - B da LGT, para aceder às contas bancárias, não permite verificar se esses rendimentos declarados em sede de IRS foram entretanto consumidos ou aplicados de outra forma‖.

3. Conclusão

Em face do que acima foi disposto, e não tendo os sujeitos passivos colocado em causa a realização dos suprimentos que deram origem á tributação por avaliação indirecta nos termos do art. 89.-A da LGT, e conforme melhor explanado no ponto 1, encontram-se reunidas as condições legais para, de acordo com a tabela a que se refere o n.º4 do referido 89.° — A da LGT, se proceder á fixação do rendimento tributável no montante de 214.732,16 € no exercido do 2005.Este rendimento tributável será considerado como rendimento da categoria G, de acordo com a alínea d) do n.°1 do artigo 9,º do Código de IRS - Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares.

Nos termos do n.° 3 do artigo 89.- A da LGT, foram os sujeitos passivos notificados para fazer prova de que correspondiam à realidade os rendimentos declarados e de que era outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, nomeadamente mediante apresentação, de cópia de extractos bancários que evidenciem a origem e a mobilização dos recursos financeiros utilizados para os suprimentos realizados, acompanhados da declaração escrita onde manifestassem expressamente autorização à Administração Tributária, nos termos da alínea b) do n.º 3 do artigo 63.° — B da LGT, para aceder às contas bancárias.

Não tendo feito prova da origem dos rendimentos, conforme explanado no ponto 2, e não tendo apresentado extractos bancários ou declaração a autorizar o acesso às suas contas bancárias, contrariando assim o disposto no n.°1 e 3 do art.° 74° da LGT, é de manter a proposta de fixação do rendimento tributável no montante de 214.732.16 € (no exercício de 2005, rendimento esse, considerado como rendimento da categoria G, de acordo com a alínea d) do n. 1 do artigo 9.º do Código de IRS - Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares.

Por fim, admitindo que os rendimentos declarados em sede de IRS pelos sujeitos passivas nos anos anteriores a 2005, possam justificar parcialmente a origem dos meios monetários utilizados para a realização dos suprimentos, os mesmos são insuficientes para justificar a totalidade do montante que permitiu a manifestação de fortuna evidenciada para evitar a aplicação do método Indirecto de avaliação da matéria colectável, senda por esse motivo considerado como rendimento tributável em sede de IRS, o rendimento padrão conforme disposto no n.º 4 do art° 89°-A da LGT.

A este propósito veja-se o conteúdo do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no processo n.°761/08 a 28/01/2009 e do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, proferido no processo n.° 00352/08.4BEVIS, em 19/02/2009‖.

b) O despacho a que se refere a alínea anterior foi notificado por ofício n.º33389, de 24/11/2009 (cfr. documento n.º3, junto pelos impugnante, de fls. 24 e ss. dos autos);

c) Naquele despacho lê-se, além do mais (cfr. documento n.º3, junto pelos impugnante, de fls. 24 e ss. dos autos);


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(…)

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Cumpre prosseguir para conhecimento da caducidade da liquidação.

III. Fundamentação

.1De facto

d) A 24/12/2009 foi emitida a liquidação de IRS n.º20095005..., relativa aos aqui impugnantes, do exercício de 2005, onde se apurou um rendimento global de 261.255,48euros, e um valor a pagar de 97.256,57 euros (cfr. documento n.º1 junto com a PI, de fls. 17 dos autos);

e) A 29/12/2009 foi emitida nota de cobrança, demonstração de compensação, com o n.º200900019…, resultando num valor a pagar de 93.876,35euros (cfr. documentos n.º1-B, de fls. 19 dos autos);

f) A 30/12/2009, pelas 17h30min, foi lavrada certidão relativa à afixação de aviso tendente à indicação de hora certa para diligência posterior, no sentido de vir a notificar os impugnantes da demonstração detalhada da liquidação de IRS de 2005, no montante global de 93.876,35euros, na sequência das correcções propostas na acção de inspecção com o n.ºOI200900561 (cfr. documento n.º4 junto com a PI, de fls. 34 a 42 dos autos);

g) A certidão a que se refere a alínea anterior foi assinada por duas testemunhas, identificadas (cfr. documento n.º4 junto com a PI, de fls. 34 a 42 dos autos);

h) A 31/12/2009, pelas 10h00min, foi lavrada certidão relativa à afixação de nota de notificação, por retorno ao local onde, se havia agendado hora certa de hora certa para a notificação dos impugnantes, da demonstração detalhada da liquidação de IRS de 2005, no montante global de 93.876,35euros, na sequência das correcções propostas na acção de inspecção com o n.ºOI200900561 (cfr. documento n.º3 junto com a PI, de fls. 38 a 42 dos autos);

i) A certidão a que se refere a alínea anterior foi assinada por duas testemunhas, identificadas (cfr. documento n.º3 junto com a PI, de fls. 38 a 42 dos autos);

j) A 31/12/2009 foi emitido o ofício n.º24148 com a advertência de notificação, por afixação de nota de notificação por funcionário (cfr. documento n.º6, junto com a PI, de fls. 61 dos autos);

k) Desde 1991 a 1999, inclusive, os impugnantes resgataram unidades de participação, no fundo C..., de que eram titulares (cfr. documentos n.º15 a 72, de fls. 82 a 139 dos autos);

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Factos não provados:

1. A carta remetida tendente à notificação dos impugnantes, com a advertência de notificação foi recebia a 08/01/2010 (o documento junto n.º7, de fls.71 é relativo ao objecto postal identificado por RM567…PT, não sendo possível apurar a sua correspondência com o objecto postal daquele ofício n.º24148).

Os factos provados assentam na análise crítica dos documentos juntos aos autos e não impugnados, conforme se indica em cada alínea do probatório”.


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De direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Vejamos, então.

Nas primeiras duas conclusões da alegação de recurso, sustenta o Recorrente que:


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A liquidação correspondente ao documento 1, junta a fls. 17 dos autos, mostra-se referida na alínea d) dos factos provados e, efectivamente, da mesma consta a possibilidade de reclamar ou impugnar nos termos e nos prazos estabelecidos nos artigos 140º do CIRS e 70º e 102º do CPPT. Consta e – acrescentamos nós – não podia deixar de constar, uma vez que o acto tributário de liquidação adicional, como acto final do procedimento de liquidação, é graciosamente reclamável e/ou susceptível de impugnação judicial.

Tanto assim é que, como se vê, os impugnantes lançaram mão da impugnação judicial, no âmbito da qual foi proferida a sentença objecto do presente recurso.

Ora, na realidade, como resulta da contestação apresentada, a Fazenda Pública, após longas considerações, acabou por defender que “a impugnação judicial não é o meio processual adequado para se fazer a prova a que alude o arº 89-A nº 3 da LGT, porquanto, a lei prescreve no nº8 do mesmo preceito o recurso do artº 146º-B do CPPT.”

Sabido que o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, a sentença dando uma diversa conformação jurídica à questão, tomou a seguinte decisão, a este propósito:

“Defende a FP ser inimpugnável o acto de liquidação de IRS, de 2005, por não ter sido impugnado judicialmente o despacho que determinou a avaliação indirecta do rendimento tributável, dos aqui impugnantes em sede de IRS, nos termos do artigo 89.º-A da LGT.

Notificados para se pronunciarem, os impugnantes vieram opor-se a tal conclusão, defendendo não atender a FP ao pedido de revisão oficiosa, ao abrigo do artigo 91.º e ss. da LGT.

Ora, ainda que a AT tivesse admitido pedido de revisão, ao abrigo do artigo 91.º da LGT, o certo é que existe previsão legal de regime especial de impugnação, prevista para os actos que assentem na verificação da existência de manifestações de fortuna, como se depreende do estabelecido no artigo 89.º-A, n.º 7 e n.º8 da LGT, e que prevê, a impugnação da decisão que fixe rendimentos através de manifestações de fortuna, para o Tribunal Tributário, sendo que esta impugnação tem efeitos suspensivos da liquidação.

Assim sendo, era sobre os impugnantes que impendia o dever de impugnar judicialmente o acto de fixação de rendimentos, com fundamento em manifestações de fortuna, mais sendo relevante referir que no ofício tendente à sua notificação do despacho aqui em causa, a AT comunicou a forma de proceder à respectiva impugnação.

E quanto à matéria que aqui nos ocupa, releva lançar mão da jurisprudência dos nossos tribunais superiores, nomeadamente aos acórdãos n.º0348/08 de 24/09/2008 (o que foi no essencial reafirmado, recentemente, no acórdão n.º0225/15, do STA, proferido a 08/07/2015), onde se lê, do respectivo sumário:

―I – Da decisão de avaliação da matéria colectável por método indirecto, atinente a ―manifestações de fortuna‖, cabe recurso para o tribunal tributário, no prazo de 10 dias – nos termos das disposições combinadas do n.º 7 do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária, e do n.º 2 do artigo 146.º-B do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

II – A decisão de avaliação constitui acto destacável do procedimento administrativo, pelo que se forma caso decidido ou caso resolvido na falta de recurso judicial dessa decisão, a qual, assim, se consolida na ordem jurídica, não podendo ser posta em causa na impugnação judicial da liquidação respectiva.‖

Dúvidas, assim, não restam que não podem já os impugnantes lançar mão de impugnação judicial para discutir a verificação dos pressupostos para a avaliação da matéria colectável, ao abrigo do artigo 89.º-A, da LGT. Ainda assim, importa analisar as alegações dos impugnante para verificar que estes invocam, para além do erro nos pressupostos de facto que levaram à tributação por manifestação de fortuna, a caducidade da liquidação, sendo que a impugnação com este fundamento, não ficou precludida pela falta de recurso nos termos já descritos, visto que é questão que só se pode colocar em momento posterior. Assim, impõe-se conhecer do pedido relativo ao fundamento da caducidade, e não conhecer do pedido relativo ao erro sobre os pressupostos de facto, absolvendo a FP da instância, quanto a esta parte.

Cumpre prosseguir para conhecimento da caducidade da liquidação”.

Ora, o decidido está correcto e tem completo apoio na lei, em concreto no nº 7 do artigo 89º -A da LGT, nos termos do qual “Da decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto constante deste artigo cabe recurso para o tribunal tributário, com efeito suspensivo, a tramitar como processo urgente, não sendo aplicável o procedimento constante dos artigos 91.º e seguintes” e, bem assim, no artigo 146º-B do CPPT.

A Recorrente confunde, salvo o devido respeito, dois aspectos que não são confundíveis: uma coisa, é a contestação da avaliação da matéria coletável pelo método constante do artigo 89º-A da LGT, a qual está sujeita a regras próprias, que não podem deixar de ser observadas, sob pena da matéria, assim fixada, se tornar definitiva; outra coisa, bem diferente, é a liquidação final ser ela mesma susceptível de contestação por ilegalidades não correspondentes à discordância com a avaliação efectuada com recurso ao artigo 89º A da LGT.

Foi esta distinção que o Tribunal fez (e bem) e que não pode deixar de se reiterar, pois, como se faz notar, a decisão de avaliação neste caso constitui um acto destacável do procedimento administrativo, pelo que se forma caso decidido ou caso resolvido na falta de recurso judicial dessa decisão, a qual, assim, se consolida na ordem jurídica, não podendo ser posta em causa na impugnação judicial da liquidação respectiva.

Portanto, no caso, evidentemente não se pode falar – nem tal faz o menor sentido – de venire contra factum proprium, já que não se vislumbra aqui o exercício de uma posição em contradição com o comportamento assumido por uma mesma parte anteriormente.

Daí, portanto, que o Tribunal a quo tenha aceite – e bem – conhecer o pedido relativo ao fundamento da caducidade do direito à liquidação.

Improcedem, portanto, as duas primeiras conclusões da alegação do recurso.

Avançamos para as seguintes conclusões, nas quais os Recorrentes se insurgem contra a solução alcançada relativamente ao fundamento correspondente à caducidade do direito à liquidação.

Vejamos o que se nos oferece dizer a este propósito.

Comecemos por deixar claro o percurso alinhado na sentença. Aí se escreveu:

“Invocam os impugnantes, ter caducado a liquidação, uma vez, defendem, não foram validamente notificados da mesma dentro do prazo de quatro anos, previsto no n.º1 do artigo 45.º da LGT, que se inicia, nos termos do n.º4 do mesmo artigo, no início do ano seguinte ao que respeitam os rendimentos periódicos, aqui em questão.

Assim se defendem que o prazo de caducidade se iniciou a 01/01/2006, terminando a 31/12/2009, pelo que, sendo apenas notificados a 08/01/2010, se havia já esgotado o prazo de caducidade.

E defendem os impugnantes ter caducado a liquidação, em face de ser inaplicável o disposto no artigo 240.º, n.º4 do CPC, sendo este o procedimento de notificação levado a cabo pela AT, por não ser aplicável ao procedimento administrativo, previsto no CPPT. Mas, adiante-se, não têm razão, porque o artigo 38.º, n.º6 do CPPT remete expressamente para aquele normativo.

Ademais importa acrescentar que o n.º5 do mesmo artigo 38.º prevê a possibilidade de efectuar as notificações pessoais, sempre que a entidade que a elas proceder o entender necessário, o que bem se compreende, visto que a notificação pessoal, não comprime os direitos do notificando, sendo, na verdade, a forma que mais garantias oferece, para se proceder à notificação.

Assim, e nos termos do disposto no artigo 240.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, na redacção em vigor em 2004 (aplicável ex vi artigos 149.º, n.º 5, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e 38.º, n.º 6, do Código de Procedimento e de Processo Tributário) na notificação com hora certa em que não seja encontrada a pessoa a notificar e não seja possível obter a colaboração de terceiros, a notificação é feita mediante afixação da nota de notificação no local mais adequado.

Invocam os impugnantes, que os funcionários da AT ter-se-ão, de forma ilícita, introduzido em local vedado, visto que os impugnantes afirmam ter procedido ao fecho do portão, mas da nota de citação não resulta que a mesma tenha sido afixada em local fechado, e nem os impugnantes o alegam em concreto, nada dizendo sobre o local onde encontraram o aviso, pelo que irreleva o aventado pelos impugnantes. Em resultado do todo o exposto improcede a invocada caducidade da liquidação”.

Contra o assim decidido, defendem os Reclamantes que respeitando a liquidação de IRS a 2005 e não tendo a mesma sido notificada aos impugnantes até ao termo de 2009, verifica-se a caducidade do direito à liquidação. Mais dizem, de resto, que este é fundamento invocável a todo o tempo e do conhecimento oficioso.

Vejamos, por partes, começando por este último aspecto para esclarecer, sem delongas nem hesitações, que, como a jurisprudência afirma reiteradamente, o regime da caducidade do direito à liquidação de impostos, não é, matéria de conhecimento oficioso, nem invocável a todo o tempo (neste sentido, entre muito outros, vejam-se os acórdãos TCA SUL, de 31/01/19, processo nº 2724/05.7BELSB e do TCA Norte, de 12/01/17, processo nº 00674/15.8BEVIS).

Com isto dito, avancemos para a caducidade do direito à liquidação.

“No que diz respeito ao direito tributário, o regime da caducidade do direito à liquidação de impostos, matéria que não é de conhecimento oficioso, encontra actualmente consagração genérica no artº.45, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo dec.lei 398/98, de 17/12, norma que vem consagrar um prazo de caducidade de quatro anos (cfr.anterior artº.33, nº.1, do C.P.Tributário, o qual consagrava o prazo de cinco anos). Face à redacção do aludido artº.45, da L. G. Tributária, é claro que, quer o exercício do direito à liquidação, quer a notificação do seu conteúdo ao contribuinte, e não apenas aquele primeiro acto, têm que ocorrer dentro do mencionado prazo de quatro anos contados do facto tributário, sob pena de operar a caducidade de tal direito. O prazo de caducidade em análise justifica-se por razões objectivas de segurança jurídica, tendo o propósito último de gerar a definição da situação do obrigado tributário num prazo razoável, cujo decurso conduz à preclusão do direito do Estado de promover a liquidação dos impostos que lhe sejam eventualmente devidos (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/10/2012, proc.5792/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/11/2013, proc.7031/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/10/2014, proc.7773/14; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e Anotada e comentada, Editora Encontro da Escrita, 4ª. Edição, 2012, pág.359 e seg.; J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª.edição, Coimbra Editora, 2007, pág.259 e seg.; Joaquim Casimiro Gonçalves, A caducidade face ao direito tributário, in Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Vislis, 1999, pág.225 e seg.).

A Constituição da República Portuguesa, após a revisão introduzida pela Lei Constitucional nº.1/82, de 30/9, prevê no seu artº.268, nº.3, que os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados na forma prevista na lei (lei ordinária), assim impondo à Administração um dever de dar conhecimento aos interessados, mediante uma comunicação oficial e formal, do teor dos actos praticados, comunicação essa que deve incluir também a própria fundamentação do acto que do mesmo faz parte integrante (cfr.J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4ª. Edição revista, II volume, Coimbra Editora, 2010, pág.824 e seg.).

A natureza receptícia do acto tributário, enquanto acto administrativo, deve hoje ter-se como perspectiva devidamente sedimentada pela doutrina e jurisprudência, configurando-se a notificação como requisito de perfeição do acto tributário de liquidação (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12; Alberto Pinheiro Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, Almedina, 1972, pág.239 a 242; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.94 e seg.; Soares Martínez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.309 a 311).

No entanto, a notificação não é um elemento intrínseco do acto tributário e, portanto, não é um requisito da sua validade, mas simples condição da sua eficácia, aliás, suprível por outras formas de conhecimento (cfr.artº.67, nº.1, do C.P.A., então em vigor; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/10/2012, proc.5673/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12)” – cfr. acórdão do TCA Sul já citado de 31/01/19.

No caso dos autos, estamos face a liquidação de IRS, tributo que é, unanimemente, considerado como um imposto periódico, pelo que o prazo de caducidade do direito à liquidação se conta a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário (cfr. artigo 45, nº.4, da LGT). Tendo em conta que se trata da liquidação relativa ao ano fiscal de 2005, o prazo inicia-se em 31/12/05, tendo o seu termo final em 31/12/2009.

Há, então, que apreciar o caso concreto, como a sentença fez e perceber se o sentido adoptado se pode, ou não, manter [face ao analisado na sentença, mal se percebe o teor da asserção contida na conclusão E) das conclusões].

Ora, a primeira questão que suscita a firme discordância dos Reclamantes é o recurso da ATA, para feitos de notificação, ao 240º do CPC, uma vez que, tratando-se de liquidação adicional de IRS, que alterou a situação tributária dos contribuintes, a sua comunicação deveria passar pela carta registada com A/R (36º, 38º e 39 º do CPPT).

Lê-se na conclusão F) o seguinte:

Vejamos.

No caso, a dívida corresponde a uma liquidação de IRS de 2005, relativamente à qual os serviços tributários optaram por emitir mandado de notificação e proceder à notificação pessoal, nos termos do n.º 5 do artigo 38º do CPPT.

À data que aqui releva, o artigo 38º do CPPT preceituava, sob a epígrafe “avisos e notificações por via postal ou telecomunicações endereçadas”:

1 - As notificações são efectuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de recepção, sempre que tenham por objecto actos ou decisões susceptíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes ou a convocação para estes assistirem ou participarem em actos ou diligências.

2 - Para efeitos do disposto no número anterior a comunicação dos serviços postais para levantamento de carta registada remetida pela administração fiscal deve sempre conter de forma clara a identificação do remetente.

3 - As notificações não abrangidas pelo n.º 1, bem como as relativas às liquidações de tributos que resultem de declarações dos contribuintes ou de correcções à matéria tributável que tenha sido objecto de notificação para efeitos do direito de audição, são efectuadas por carta registada.

4 - As notificações relativas a liquidações de impostos periódicos feitas nos prazos previstos na lei são efectuadas por simples via postal.

5 - As notificações serão pessoais nos casos previstos na lei ou quando a entidade que a elas proceder o entender necessário.

6 - Às notificações pessoais aplicam-se as regras sobre a citação pessoal.

7 - O funcionário que emitir qualquer aviso ou notificação indicará o seu nome e mencionará a identificação do procedimento ou processo e o resumo dos seus objectivos.

8 - As notificações referidas nos n.os 3 e 4 do presente artigo podem ser efectuadas, nos termos do número anterior, por telefax quando a administração tributária tenha conhecimento do número de telefax do notificando e possa posteriormente confirmar o conteúdo da mensagem e o momento em que foi enviada.

9 - As notificações referidas no presente artigo podem, ainda, ser efectuadas por transmissão electrónica de dados, nos termos a definir por portaria do Ministro das Finanças.

10 - As notificações efectuadas nos termos do número anterior equivalem, consoante os casos, à remessa por via postal registada ou por via postal registada com aviso de recepção, de acordo com o disposto no n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2 de Agosto.

No caso, o SF de Meda/ Direcção de Serviços da Guarda, determinou a notificação pessoal da notificação da liquidação de IRS, o que, não apenas é legalmente admissível, nos termos expostos no preceito anteriormente transcrito, como desejável em casos como aquele aqui nos ocupa, em que se aproxima o final do prazo de caducidade e que, por todos os meios possíveis, a ATA deve evitar o decurso de tal prazo sem fazer o que lhe compete.

Conforme se pode ler no sumário do acórdão do STA, de 21/09/11, proferido no processo n.º 0305/11, que aqui transcrevemos:

“I - A liquidação adicional de IRS deve ser notificada ao sujeito passivo, por carta registada com aviso de recepção (art. 38° nº 1 do CPPT e arts. 65° nº 4, 66º e 149° nº 2 do CIRS), mas a entidade que dirige o procedimento pode ordenar que se proceda a notificação pessoal quando o entender necessário (nº 5 do art. 38° do CPPT).

II - A escolha da notificação pessoal pela entidade competente da administração tributária, para transmitir ao destinatário o conteúdo do acto tributário, constitui manifestação do exercício de um poder discricionário que deve ponderar a eficácia no cumprimento do objectivo visado e não há falta de notificação quando tal escolha é feita sem a indicação da necessidade específica ou concreta que se pretende atingir.

III - As notificações pessoais de actos tributários, a realizar de acordo com as regras das citações pessoais, poderão ser efectuadas de acordo com qualquer das modalidades de citação pessoal previstas no CPC, designadamente a citação através de contacto pessoal do funcionário com o citando e a citação com hora certa ou através de afixação com posterior advertência (arts. 239°, 240° e 241° do CPC).

IV - O envio subsequente de carta registada, no prazo de 2 dias úteis, é uma diligência complementar e cautelar posterior à notificação, comunicando ao notificado a data e o modo por que o acto se considera realizado, bem como o prazo para oferecimento da defesa e as comunicações aplicáveis à falta desta, bem como o destino dado ao duplicado (art. 241° do CPC).

(…)”

À notificação pessoal aplicam-se as regras sobre a citação pessoal, como resulta do n.º 6 do referido artigo 38.º do CPPT.

Uma vez que num primeiro momento, no dia 30/12/09, não foi possível o contacto directo do funcionário da Direcção de Finanças encarregue da notificação junto dos notificandos, no seu local de residência, Rua V..., Guarda, foi deixada nota com indicação de que voltariam para proceder à notificação em falta, determinando dia e hora certa – para o dia seguinte – 31 de Dezembro, pelas 10horas [cf. alínea f) dos factos factos assentes].

No dia seguinte, 31/12/09, deslocando-se de novo à mesma morada de residência, e não encontrando novamente os notificandos, nem pessoa em condições de lhes transmitir a notificação, os funcionários da AT procederam à afixação da nota de notificação [cf. alínea h) dos factos assentes].

Em qualquer dos casos, a certidão mostra-se assinada por duas testemunhas (cf alíneas g) e i dos factos assentes).

Nesse mesmo dia, foi remetida por carta registada para o domicílio dos Oponentes com a comunicação a que alude o artigo 241º do CPC [cf. j) dos factos assentes].

A notificação assim efectuada considera-se pessoal, nos termos do artigo 240.º, n.º 6, do CPC, em vigor à data dos factos. E cumpridas estas exigências legais, vertidas no regime constante dos artigos 232.º, n.º 1, 240.º e 241.º, todos do CPC, em vigor à data dos factos, aplicáveis ex vi do artigo 2.º, al. e) e 38.º, n.º 6, ambos do CPPT, os Impugnantes consideram-se notificados na data da afixação (cf. artigo 240.º, n.º 3 e 241.º ambos do CPC), ou seja, no dia 31 de Dezembro de 2009.

Importa assim concluir que a 31/12/09 foi realizada a notificação pessoal dos contribuintes, ora Recorrentes, quanto à liquidação de IRS referente ao exercício de 2005, pelo que a mesma foi efectuada dentro do prazo de caducidade consagrado no artigo 45.º, n.º 1 da LGT.

Veja-se no mesmo sentido, entre muitos outros arestos, e sobre a possibilidade de notificação pessoal com recurso às regras do CPC, o acórdão de 28/01/21, processo nº 101/08.7 BEFUN ou o nº 704/09.2 BESNT, de 03/12/20.

Por conseguinte, face ao tudo o que vem dito, e na ausência de alteração ao quadro factual fixado e confirmando o quadro legal aplicado, impõe-se confirmar a sentença recorrida e negar provimento ao recurso.


*

III – DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso.

Registe e notifique.

Custas pelos Recorrentes.

Lisboa, 08/07/21

[A Relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Senhoras Desembargadoras Hélia Gameiro e Ana Cristina Carvalho]

Catarina Almeida e Sousa