Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:02/05/2015
Processo:11892/15
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2.º JUÍZO - 1.ª SECÇÃO
Magistrado:Fernanda Carneiro
Descritores:PEDIDO DE ASILO EXTEMPORÂNEO.
Texto Integral: Processo n.º 11892/15
2.º Juízo-1.ª Secção (Contencioso Administrativo)
Impugnação de decisão do SEF (indeferimento de pedido de asilo)


EXCELENTÍSSIMOS SENHORES
JUÍZES DESEMBARGADORES
DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

O Ministério Público junto deste Tribunal, nos termos dos art.ºs 146.º e 147.º e seguintes do CPTA, vem apresentar o seu PARECER nos seguintes termos:

O presente recurso jurisdicional foi interposto pelo requerente M… da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que considerou extemporânea a apresentação da petição inicial por estar caducado o seu direito de impugnação judicial da decisão do Director Nacional Adjunto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras de 5.6.2014 que indeferiu o seu pedido de asilo e a concessão de autorização de residência por razões humanitárias, nos ter mos do artº 24º, nº4 da Lei nº 2772008 de 30/06.

O recorrente nas conclusões das suas alegações de recurso, imputa à sentença recorrida nulidade por omissão de pronúncia sobre os factos que articulou e falta de fundamentação.

São as conclusões que definem o objecto do recurso artigos 637º, nº2 e 639 do CPC.

No artigo 615º do CPC, está prevista a nulidade da sentença quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar.

Esta nulidade está directamente relacionada com o dever que é imposto ao juiz pelo artigo 608º, nº 2 do CPC, em que se estabelece que o juiz tem de resolver todas as questões suscitadas pelas partes, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

É entendimento pacífico e reiterado da nossa jurisprudência de que só se verifica esta nulidade quando existe a violação dos deveres de pronúncia do tribunal sobre questões que deva apreciar; não devendo confundir-se, no entanto, questão a decidir com considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes.

Resulta das conclusões das alegações de recurso que o Recorrente invoca que alegou factos e juntou documentos com vista à demonstração da tempestividade da apresentação da petição inicial e que o Meritíssimo Juiz a quo não se pronunciou na sua decisão quanto ao alegado e oferecido documentalmente.

Com o devido respeito, entendemos que lhe não assiste razão.

Ora, da analise da sentença, ora recorrida, verifica-se que a mesma se pronunciou sobre o pedido de nomeação de patrono, sobre a escusa de patrocínio e sobre a inerente interrupção do prazo de 30 dias para intentar a acção.

O tribunal “ a quo” pronunciou-se sobre as questões invocadas pelo ora recorrente e indicou as razões de facto e de direito que levaram à conclusão da caducidade do direito de acção.

Assim, não estamos perante qualquer omissão de pronúncia sobre factualidade alegada pelo ora recorrente.

Se a sentença, ora em crise, deu relevância a certos factos sobre os demais ou se deu preponderância a certas datas sobre as demais, não há omissão de pronúncia mas erro de julgamento que não foi invocado.

Conforme é doutrina e jurisprudência pacíficas, a nulidade da sentença por falta de fundamentação, só ocorre quando existe absoluta falta de fundamentação.

Como resulta do douto Ac. do STA, de 09-01-2013, proc. nº 01076/12 :
“ A lei só fulmina com a nulidade a sentença que “não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão” - art. 668.º/1/b) do CPC – e, no caso, esse vício não ocorre.
Com efeito, essa cominação só pode incidir sobre uma decisão a que faltem os fundamentos que a justificam já que, como ensinou o Prof. J. A. dos Reis, ”Uma decisão sem fundamentos equivale a uma conclusão sem premissas; é uma peça sem base. …. As partes precisam de ser elucidadas a respeito dos motivos da decisão. Sobretudo a parte vencida tem o direito de saber por que razão lhe foi desfavorável a sentença; e tem mesmo necessidade de o saber, quando a sentença admita recurso, para poder impugnar fundamento ou fundamentos perante o Tribunal superior. Este carece também de conhecer as razões determinantes da decisão, para as poder apreciar no julgamento do recurso.””- CPC Anotado, vol. V, pg. 139.
O que significa que, por um lado, a nulidade da sentença por falta de fundamentação está intimamente à ligada necessidade de esclarecimento das partes e, por outro, que esse vício pressupõe que a sentença não indique as razões jurídicas que estiveram na base da decisão (Vd. A. Varela, J. M. Bezerra e S. Nora, “Manual de Processo Civil”, 2ª. ed., pg. 687.). E, porque assim, esta nulidade só ocorre quando a sentença seja totalmente omissa no tocante à fundamentação, não bastando que seja insuficiente, obscura ou mesmo errada visto que, nestes casos, esse erro, insuficiência ou obscuridade se traduzir num erro de julgamento que determina a sua revogação ou alteração e não num vício que importe a sua nulidade.
“Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de facto e de direito.” - Vd. Prof. J. A. Reis, na citada obra a fls. 140 (Neste sentido podem ver-se A. Varela e outros “Manual de Processo Civil”, pg. 669, e, entre muitos outros, os Acórdãos do STJ de 5/1/84, BMJ, 333/398, e do STA de 21/3/00 (rec. 41.027), de 25/10/00 (rec. 27.760), de 14/11/00 (46.046), de 27/6/01 (rec. 37.410), de 2/5/02 (rec. 44.888) e de 27/5/98 (rec. 37.068, publicado nos CJA n.º 20, pg. 18).).”

Também no douto Ac. do TCAS, de 19-01-2012, proc. nº 06234/10, se escreve :
“ - Para que se verifique falta de fundamentação da sentença não basta que os elementos de facto e ou as razões ou justificações de direito invocadas como suporte da decisão ou de segmento desta, sejam deficientes, escassas ou incompletas, pouco plausíveis ou convincentes, incoerentes, ilógicas ou erradas, ou mesmo obtidas por remissão; desde que sejam suficientes para se compreender a opção jurídica que a decisão encerra, não há falta de fundamentação mas apenas e eventualmente erro de julgamento, porque só a absoluta impossibilidade de perceber o raciocínio ou caminho que conduziram à decisão é que configura uma ausência absoluta de falta de fundamentação ou motivação…”

Ora, a decisão recorrida indicou as razões de facto e de direito pelas quais decidiu num certo sentido e não noutro, sendo claramente perceptível o raciocínio ou caminho que conduziu à decisão pelo que inexiste nulidade por falta de fundamentação.

Se existe discordância por parte do Réu quanto à subsunção legal da matéria probatória, tal não se enquadra no vicio de falta de fundamentação mas sim em eventual erro de julgamento, vício que não foi imputado à decisão recorrida nas conclusões das alegações e recurso.

Pelo exposto, emito parecer no sentido da improcedência do recurso
A Procuradora Geral-Adjunta

( Fernanda Carneiro)