Pareceres/Diversos

Tribunal Central Administrativo Sul - Contencioso Administrativo
Contencioso:ADMINISTRATIVO
Data:07/03/2014
Processo:11286/14
Nº Processo/TAF:00000/00/0
Sub-Secção:2.º JUÍZO - 1.ª SECÇÃO
Magistrado:Maria Antónia Soares
Descritores:PLANO DE PORMENOR DO ALTO DE ALGÉS;
MORADIA SITUADA EM ZONA PROTEGIDA;
ADOPÇÃO DO CRITÉRIO DO MODELO DE GESTÃO URBANÍSTICA;
FALTA DE ACORDO DOS PROPRIETÁRIOS;
PREJUÍZOS INDEMNIZÁVEIS.
Texto Integral:Procº nº 11286/14
2º Juízo-1ª Secção

Acção Administrativa Comum

Parecer do MP

Vem o presente recurso jurisdicional interposto pela autora, da sentença que considerou improcedente a acção por si proposta contra o Município de Oeiras, com vista ao ressarcimento dos alegados prejuízos decorrentes da impossibilidade de venda de um prédio de que é proprietária, sito em Linda-a-Velha, por falta de adequação do Plano de Pormenor do Alto de Algés (PPAA) - publicado no DR, II série, de 26-2-1999, que entrou em vigor no mesmo dia - ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial ( RJIGT), aprovado pelo DL nº 380/99, de 22-9, conforme determina o artº 154º nº1 deste. E com isto acarretando a manutenção da vigência do PPAA, nos termos do qual, no núcleo 14, unidade de execução 93, está prevista a construção de um único prédio, que garantiria, por associação entre eles, dos actuais proprietários das moradias existentes no local, a capacidade de construção a cada um, aí se propondo a demolição de todas as moradias existentes, entre as quais a da ora recorrente (artº 27º nº3 do Regulamento do PPAA).

1.Considera, a ora recorrente, que a sentença errou ao considerar não provado o quesito 8º da base instrutória, nos termos do qual “os compradores, ao terem conhecimento de que a moradia seria demolida nos termos do Plano, desistiram do negócio”.

Quanto a nós, não terá razão a recorrente, dado que, o facto da desistência dos compradores ser devida a ordem de demolição da moradia, não está minimamente provada ( cfr depoimentos de Joaquina Mateus Santos Balas e Amilcar Fernandes Morgado).

Na verdade, só uma concreta ordem de demolição poderia alicerçar um motivo objectivo de desistência da compra do imóvel e que, eventualmente fosse imputável ao demandado.

Ora, na altura em que foi posta à venda a citada moradia, não tinha sido ordenada qualquer demolição, a qual, aliás, poderia ser evitada, conforme decorre dos nºs 3 e 4 do artº 27 do Regulamento do PPAA.

2.Quanto à alegada ilicitude da conduta da entidade demandada, insiste a recorrente que a mesma se verifica, por ter sido violado o nº4 do artº 27º do Regulamento do PPAA, uma vez que era à entidade demandada que competia promover a aplicação dos critérios do modelo de gestão urbanística aí referidos, o que não fez, assim violando o dever de execução do citado Plano de Pormenor, com o que causou prejuízos à recorrente.

Estipula o citado normativo, o seguinte:

“Na impossibilidade de concretização da associação dos proprietários abrangidos por um núcleo de propriedades, a Câmara Municipal promoverá a aplicação dos critérios do modelo de gestão urbanística a cada uma das propriedades, contribuindo, assim, para a realização dos acordos necessários à concretização das soluções previstas no PPAA”.

E, nos termos do artº 27º nº3, do Regulamento do PPAA, no núcleo 14, unidade de execução 93, onde se insere o prédio da recorrente, está prevista a construção de um único prédio, que garantiria por associação entre eles, a capacidade de construção a cada um dos actuais proprietários das moradias existentes no local, aí se propondo a demolição de todas as moradias, entre as quais a da ora recorrente.

Assim e antes do mais, importa extrair dos citados normativos que, não tendo existido acordo entre os citados proprietários, também não se verifica a demolição a que o nº3 do artº 27º se refere.

E ainda que a CMO tivesse promovido a execução do nº4 do artº 27º, usando o critério de adopção do modelo de gestão urbanística, também não é seguro que houvesse o acordo entre os proprietários, necessário à sua implantação.

Portanto, os danos invocados pela recorrente, nomeadamente os pretensamente decorrentes da não venda do prédio, não podem ser atribuídos à mera possibilidade dessa demolição. Poderão, quanto muito, ser atribuíveis à falta de acordo entre os moradores, à qual é totalmente alheio o Município aqui demandado.

3.Quanto à não execução do estabelecido no nº4 do artº 27º, por não ter sido usado o critério de adopção do modelo de gestão urbanística, não se vê como daí resulta qualquer ilicitude de conduta omissiva, mormente porque estamos claramente perante uma norma genérica e abstrata, da qual não é possível atribuir quaisquer efeitos directos na esfera jurídica da recorrente, susceptíveis de lhe causar os danos que enumera, até porque deixou a sua propriedade tal como se encontrava, não aumentando nem diminuindo o seu valor.

4.Por outro lado, a degradação do prédio em causa apenas à recorrente é imputável, uma vez que ficou provado que no mesmo poderiam ter sido feitas obras de conservação e restauro, que dessem à moradia condições de habitabilidade, conforme foi autorizado recorrido ( cfr facto nº 7).

5.Sobre o direito a construir, este não é um direito de propriedade, nem está consignado na CRP, pelo que não é um direito absoluto, sem condicionalismos, que possa ser adquirido pela aplicação directa da lei, genérica e abstracta.

Assim, também a discussão sobre se prevalece o interesse privado ou o interesse público, na execução dos planos urbanísticos nos parece despicienda, neste caso.

De qualquer maneira dir-se-á que os planos urbanísticos têm, essencialmente, um valor de gestão de interesses comunitários, com total preterição dos interesses privados quando com aqueles incompatíveis. Isto sem prejuízo de eventual compensação pelos prejuízos sofridos, quando se verifiquem os necessários pressupostos, o que, pelo que se deixa exposto, entendo não ser o caso aqui em apreciação.

Ao contrário do que a recorrente refere ex novo nas suas alegações, o DL nº 380/99 , de 22-9, é aplicável ao caso vertente pois o nº1 do artº 154º visa precisamente a adequação a este diploma dos planos já vigentes à data da sua entrada em vigor. Contudo, quer este DL, quer a Lei nº 48/98, de 11-8, a que a recorrente faz alusão ex novo como aplicável ao caso vertente, contêm normas de natureza meramente programática, enquanto definidoras de princípios a prosseguir, que não foram nem tinham que ser aplicáveis directamente ao caso vertente atendendo à vigência do PPAA.

Nestes termos, não se verifica qualquer actuação ilícita por parte do recorrido, motivo pelo qual fica prejudicada a apreciação dos restantes pressupostos da responsabilidade civil, uma vez que estes são de verificação cumulativa.

Termos em que, me pronuncio pela manutenção da sentença recorrida, com a consequente improcedência do presente recurso jurisdicional.


A Procuradora-Geral Adjunta

Maria Antónia Soares