Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01825/15.8BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/22/2024
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paulo Moura
Descritores:TAXA MUNICIPAL;
DIREITO DE AUDIÇÃO PRÉVIA;
Sumário:
Quando o contribuinte não tenha sido notificado para apresentar a declaração fiscal em falta, o direto de audição prévia não pode ser dispensado, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 60.º da Lei Geral Tributária, mesmo que a liquidação possa ser efetuada oficiosamente, com base em valores objetivos previstos na lei.
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


«[SCom01...], Lda.», interpõe recurso da sentença que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de taxas pela instalação e funcionamento de postos de combustíveis, emitida pelo Município de ............ e referente ao ano de 2015, no montante global de dez mil euros.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
A. O presente recurso vem interposto da sentença que julgou improcedente a impugnação apresentada contra as liquidações, efetuadas pelo Município de ............, da «taxa devida pela instalação e funcionamento de posto de abastecimento de combustível» referentes a 2015 e, por essa via, a anulação das próprias liquidações, no montante global de € 10.000.
B. O Tribunal a quo laborou em erro de julgamento, violando o disposto nos artigos 114.º, 115.º, n.º 1, 118.º e 119.º do CPPT, ao dispensar a produção da prova testemunhal oferecida pela Recorrente na p.i. de impugnação, a qual contém factos, passíveis de serem provados por testemunhas, com relevo para o apuramento da factualidade que constitui o fundamento dos vícios alegados.
C. Independentemente do enquadramento jurídico relativo às competências do Município — ou ausência delas, como é o caso — para o licenciamento do posto de abastecimento em causa, só o depoimento de testemunhas com conhecimento directo dos factos poderiam esclarecer o Tribunal acerca da existência, frequência e propósito da actuação do Município no que respeita a esse licenciamento e, bem assim, à fiscalização preventiva do impacto ambiental eventualmente produzido pela sua atividade.
D. Tivesse o Tribunal acedido em ouvir as testemunhas arroladas e depressa teria chegado à conclusão que, em concreto, nenhum acto foi praticado, nenhum serviço foi prestado, nenhum contacto foi efectuado junto do posto de abastecimento em causa relacionado com o licenciamento e/ou a fiscalização da sua actividade.
E. A Recorrente entende que, ao contrário do que julga o Tribunal a quo, os indeferimentos das reclamações por esta submetidas não se encontram adequadamente fundamentados, desde logo na medida em que deveria o Tribunal a quo ter reconhecido que o Município se demitiu de dar resposta às objecções às liquidações plasmadas nas reclamações apresentadas, insistindo em generalidades sem qualquer substrato material e falhando em demonstrar de que modo, afinal, os postos de combustíveis objecto de taxação geram o impacto ambiental negativo alegado.
F. Desta forma, os indeferimentos notificados à Recorrente não logram explicar porque agiu o Município desta maneira e não de outra, pelo que devem ser anulados, com todas as consequências legais, sendo a sentença que assim o não entendeu revogada e substituída por decisão que considere este vício verificado.
G. A Recorrente considera que julgou erroneamente, mais uma vez, o Tribunal quo ao concluir que também as liquidações em crise se encontram suficientemente fundamentadas.
H. Diferentemente, a Recorrente entende que de uma leitura atenta do conteúdo dos actos de liquidação em crise resulta que dos mesmos não é possível extrair os fundamentos de direito e de facto, ou o método de cálculo, eventualmente ponderados pelo Município de ............ para a determinação dos respectivos montantes.
I. Entre o mais, as notas de liquidação não evidenciam qual o modo de determinação do quantum a pagar, vejamos: i) não fazem referência ao método de cálculo que levou ao apuramento do montante em causa; nem ii) qual o critério seguido para apurar o custo ou os factores de agravamento e benefício ponderados. A
J. Em suma, carecendo os indeferimentos e as liquidações sob análise de fundamentação factual e de direito suficiente, estes devem ser anulados por violação do disposto nos artigos 268.º, n.º 3, da CRP, 77.º da LGT, 36.º do CPPT, sendo a sentença que assim não o entendeu revogada e substituída por decisão que considere este vício verificado.
K. O Município de ............ decidiu, para o cálculo do tributo dos Autos, aplicar a taxa prevista nos artigos 55.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público de ............ e 25.º, n.º 3, da Tabela de Taxas constante do anexo II ao Regulamento de Taxas e Outras Receitas do Município de ............ sem qualquer especificação factual, pelo que a participação da Recorrente na decisão de liquidação, mediante o esclarecimento de vários aspectos poderia ser determinante, impedindo a emissão de actos de liquidação ilegais.
L. Neste contexto, à Recorrente deveria ter sido concedida a possibilidade de se pronunciar previamente à emissão das liquidações em crise, ao abrigo do disposto no artigo 60.º, n.º 1 da LGT.
M. Sendo que, ao contrário do que julgou o Tribunal a quo, no caso dos Autos não se mostra aplicável a dispensa à realização de audição prévia vertente da alínea b) do n.º 2 do artigo 60.º da LGT, na medida em que a Recorrente nunca foi notificada para a apresentação de uma qualquer declaração, a qual, em sanidade de espírito, não se encontra em falta, pelo que não está preenchido um dos pressupostos essenciais para a aplicação daquela dispensa.
N. Por outro lado, na situação em apreço também não se poderia aplicar o princípio do aproveitamento do acto, uma vez que os elementos em que as liquidações dos Autos se basearam não foram apresentados pela Recorrente, mas sim em elementos oficiosos pelo Município e, caso à Recorrente tivesse sido dada a oportunidade de se pronunciar em momento anterior às liquidações, esta poderia ter imediatamente esclarecido o Município sobre a sua incompetência in casu para as mesmas, assim como poderia ter, eventualmente, aferido da bondade dos dados considerados naquelas.
O. Tudo visto, e como se comprovou ao longo do presente processo, as liquidações da taxa em crise mostram-se absolutamente ilegais por violação do artigo 60.º da LGT, devendo, em conformidade, a sentença que erroneamente assim o não entendeu ser revogada e os actos de liquidação em crise anulados.
P. Ao contrário do que assume o Tribunal a quo, o tributo em crise não se relaciona com o licenciamento da actividade de exploração de posto de abastecimento de combustíveis, o que é afirmado na contestação do Município de ............; a actividade de exploração de posto de abastecimento de combustíveis em apreço foi licenciada pela DRE Norte, sendo que aquela licença vigora até 2028.
Q. De todo o modo, a competência não só para o licenciamento, mas também para a fiscalização da actividade de exploração do posto de abastecimento de combustíveis duplo dos Autos, localizado em estrada nacional, não é do Município, mas sim da DRE Norte — cfr. artigo 6.º, n.º 3, alínea a) e artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 267/2002, de 26 de novembro.
R. Se a fiscalização da actividade do posto de abastecimento em causa, também quanto ao impacto ambiental eventualmente causado, é da competência da DRE Norte, o Município não se encontra legitimado a liquidar e cobrar um tributo em função de suposta actividade relacionada com a fiscalização preventiva de posto de abastecimento e referente aos riscos para a saúde pública e riscos ambientais associados à existência e funcionamento daquele posto de combustíveis.
S. Tudo visto, mal andou o Tribunal a quo ao não declarar a nulidade das liquidações em crise por incompetência por falta de atribuições, incorrendo em violação do artigo 133.º, n.º 2, al. b) do CPA que assim o determina, dado que os órgãos do Município de ............, não tendo competência nem para o licenciamento, nem para a fiscalização do posto de abastecimento em causa, por falta de atribuições, não podiam ter liquidado a taxa dos Autos.
T. Sem embargo, a Recorrente não tem dúvidas de que a taxa impugnada é um tributo que não visa compensar o Município de ............ pela realização de uma qualquer prestação pública, não assentando em qualquer dos pressupostos previstos no artigo 3.º do RGTAL e no artigo 4.º da LGT, não podendo, como tal, ser qualificado como uma taxa. A
U. Diferentemente do que entendeu — mas mal! — o Tribunal a quo, tributo em causa não assenta na remoção de um obstáculo jurídico à instalação e exploração do posto de abastecimento, uma vez que o mesmo já se encontra instalado e a sua actividade devidamente licenciada, o que é reconhecido pelo Município de ............; sendo que o mesmo não assenta ainda na utilização de qualquer bem do domínio público municipal, pois o posto de abastecimento está totalmente implantado em propriedade privada.
V. Ademais, o tributo em causa não assenta em qualquer prestação concreta de um serviço público local, uma vez que o Município de ............ não tem, tão-pouco, competência para a fiscalização da actividade — mormente no que respeita ao seu impacto ambiental — do posto de abastecimento em causa, nem demonstrou ou procurou demonstrar que tenha efectuado quaisquer prestações efectivas e concretas à Recorrente neste domínio.
W. O tributo dos Autos parece fundar-se apenas na existência de impacto ambiental negativo e de potenciais efeitos nefastos para a saúde dos munícipes, o que impede, de novo, a sua qualificação como taxa, uma vez que, se as taxas podem ter finalidades extrafiscais, estas não podem basear-se só e exactamente na prossecução daquelas finalidades, por tal representar uma violação do princípio da equivalência que opera como pressuposto e limite daquele tipo de tributos.
X. Daí que, não sendo o tributo previsto nos artigos 55.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público de ............ e 25.º, n.º 3, da Tabela de Taxas constante do anexo II ao Regulamento de Taxas e Outras Receitas do Município de ............ anexa justificado por qualquer contrapartida específica, carecendo de carácter bilateral, este assume a natureza de verdadeiro imposto.
Y. A esta luz, padece a sentença dos Autos de erro de julgamento por não ter considerado que a taxa liquidada é um imposto, na medida em que não assenta em qualquer dos pressupostos legalmente previstos no RTGAL para o efeito.
Z. Em suma, os actos impugnados devem ser anulados por violação de lei ordinária e constitucional, dado que as normas contidas no artigo 55.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público de ............ e no artigo 25.º, n.º 3, da Tabela de Taxas constante do anexo II ao Regulamento de Taxas e Outras Receitas do Município de ............ nas quais aqueles se basearam são orgânica e materialmente inconstitucionais, por violação dos artigos 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, alínea i) da CRP, violação que inquina a sentença recorrida por assim não ter entendido, devendo ser, pois, revogada.
AA. Não obstante o Regulamento invocado nas liquidações em crise incluir a suposta demonstração económico-financeira de cada tipo de taxa, esta não se mostra, como se demonstrou, de acordo com o princípio da equivalência. A
BB. Apesar de parecer conhecer este princípio e as suas implicações na determinação do valor das taxas e na discriminação dos custos relevados, o Município de ............ limita-se a referir que o montante da taxa em crise visa compensar supostos custos — sem nunca especificar quais – aplicando depois factores de agravamento e benefício, sem qualquer efectiva fundamentação.
CC. Ao longo do processo de impugnação o Município não logrou — nem tentou, em rigor — evidenciar a que concretos custos se quer referir, razão pela qual, é forçoso concluir que o valor da taxa em crise não tem qualquer fundamentação nos custos incorridos pelo Município de ............ com referência ao posto de abastecimento da Recorrente, em violação do disposto no artigo 4.º do RTGAL.
DD. Do exposto resulta ainda que o artigo 55.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público de ............ (conjugado com o artigo 25.º, n.º 3, da Tabela de Taxas constante do anexo II ao Regulamento de Taxas e Outras Receitas do Município de ............) interpretado no sentido de que implica a incidência de uma taxa ao arrepio do princípio constitucional da igualdade, na vertente do princípio da equivalência, tal como plasmado no artigo 13.º da Constituição, deve ser tido por inconstitucional.
EE. Nestas situações o valor das taxas deixa de ter qualquer ligação com os custos incorridos pelo Município, verifica-se, não só a clara violação do aludido princípio da equivalência, mas também a violação do princípio da proporcionalidade.
FF. Nessa medida, resulta também que o artigo 55.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público de ............ (conjugado com o artigo 25.º, n.º 3, da Tabela de Taxas constante do anexo II ao Regulamento de Taxas e Outras Receitas do Município de ............) interpretado no sentido de que implica a incidência de uma taxa ao arrepio do princípio constitucional da proporcionalidade, princípio a que estão sujeitos todos os actos do poder público e que se encontra nomeadamente plasmado no artigo 266.º, n.º 2, da Constituição, deve ser tido por inconstitucional.

Termos em que, deve ser:

i. concedido provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando-se a decisão emitida pelo Tribunal a quo, a qual deve ser substituída por decisão que dê por verificados de violação de Lei ordinária e/ou constitucional alegados, declarando-se a nulidade ou, pelo menos, anulando-se os actos impugnados, com as devidas consequências legais, ou;
ii. revogada a sentença recorrida por vício de preterição ilegal de produção de prova testemunhal.

Só nestes termos será respeitado o DIREITO e feita JUSTIÇA!

O Município apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma:
1 - A douta sentença recorrida, que julgou improcedente as impugnações considerando que o artigo 55º, nº 1, alínea b) e n°2 do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público de ............ e o artigo 25° nº3 da Tabela de taxas, constante do Anexo II ao Regulamento de Taxas e Outras Receitas do Município são organicamente constitucionais, e estar legitimada a cobrança das taxas em causa - de impacto ambiental negativo - pelo município no sentido de que o tributo é bilateral, resultando da remoção do obstáculo jurídico à actividade do particular de produção de impacto ambiental negativo causado in casu pelos postos de abastecimento de combustíveis, e que o tributo é proporcional e não viola o principio da equivalência jurídica, por isso, é uma taxa, não havendo deficiente fundamentação económico-financeira do valor das taxas impugnadas nem haver violação do direito de fundamentação porquanto os atos encontra-se devidamente fundamentados, quer de facto quer de direito, assim como não se verifica violação do direito de audiência prévia por as taxas terem sido oficiosamente liquidadas em base em valores objetivos previstos nos referidos Regulamentos, isto é, sem qualquer margem de discricionariedade por parte do Município e, como tal não se impõe a audiência prévia dos interessados nos termos do n°2 do artigo 60º da LGT, também entendeu não ocorrer falta de fundamentação das decisões de indeferimento das reclamações por as mesmas estarem suficientemente fundamentadas, percebendo-se perfeitamente as razões que conduziram o órgão administrativo à prática daqueles atos, não merece qualquer reparo, encontra-se devidamente fundamentada e fez correta interpretação da lei aos factos, não violando quaisquer normativos legais, pelo que deve ser mantida.
2 - O indeferimento da realização da diligência de inquirição de testemunha ocorreu por despacho de 03 de novembro de 2016, onde o Tribunal fundamentou a sua decisão com o facto de considerar não se detetar na petição inicial alegação de matéria de facto suscetível de prova testemunhal.
3 - A recorrente foi notificada desse despacho e aceitou-o, não tendo interposto recurso, pelo que essa decisão se firmou na ordem jurídica, e, por isso, não pode ser objecto do presente recurso.
4 - Por outro lado o objecto do presente recurso restringe-se à sentença e como nela nada é referido a esse respeito, esta questão não pode ser conhecida, devendo ser rejeitada.
5 - Acresce que, com a prova testemunhal a impugnante pretenderia provar que nenhum acto foi praticado, nenhum serviço foi prestado, nenhum contacto foi efectuado junto do posto de abastecimento em causa relacionado com o licenciamento e/ou a fiscalização da sua actividade, contudo, como tal facto não foi alegado pela recorrente na sua p.i. não podia ser sujeito a prova e, além disso o objecto da taxa não está relacionado com o licenciamento da actividade, como veremos, pelo que também de nada serviria.
6 - A douta sentença de modo bem fundamentado e claro, corroborando o entendimento doutrinal e jurisprudencial sobre esta matéria, decidiu, e bem, que tanto a liquidação como o indeferimento da reclamação se encontram suficientemente fundamentadas.
7 - Na verdade, a impugnante bem entendeu os fundamentos do ato de liquidação, onde consta expressamente o método de cálculo e o critério seguido para apurar o custo, além de que tais valores e critérios, por aplicação do artigo 55º do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público de ............ estão previstos no artigo 25° n°3 da Tabela de Taxas do Regulamento de Taxas e Outras Receitas do Município, para onde a liquidação também remete.
8 - Assim como a impugnante bem percebeu as razões de fato e de direito que levaram ao indeferimento da reclamação, como se descortina pela leitura da petição inicial.
9 - Deste modo, e corroborando o que é dito na sentença sob recurso: "Revertendo ao caso sub judice, ficou provado que das notificações para pagamento das taxas anuais devidas pela instalação e funcionamento dos postos de abastecimento de combustíveis em apreço resulta que esses tributos são devidos pela Impugnante pelo facto de a exploração dos seus postos de abastecimento de combustíveis consistirem numa atividade suscetível de causar impacto ambiental negativo, constando também das referidas notificações o suporte legal para o apuramento das mencionadas taxas (...)
(…)
Ora, compulsadas as propostas que suportaram as deliberações da Câmara Municipal de ............ de indeferimento das reclamações apresentadas pela Impugnante, constata-se que as mesmas estão suficientemente fundamentadas, percebendo-se perfeitamente as razões que conduziram o órgão administrativo à prática daqueles atos.”, deve o alegado vício de falta de fundamentação improceder.
10 - Como bem decidiu a sentença sob recurso, tendo o valor da taxa sido calculado de acordo com o estabelecido na lei e sem qualquer margem de discricionariedade e não comportando a liquidação da taxa qualquer definição do direito do particular, o dever de notificação para o exercício de audição prévia encontra-se incluído na excepção prevista na alínea b) do n°2 do artigo 60º da Lei Geral Tributária.
11 - Na verdade, como se alegou e demonstrou, a liquidação da taxa em apreço resulta de valores objetivos previstos no Regulamento Municipal de Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público e na Tabela Anexa ao Regulamento de Taxas e Outras Receitas Municipais.
12 - Acresce ainda referir que a recorrente não põe em causa qualquer elemento objectivo da taxa, o seu valor, ou qualquer erro na liquidação, a discordância da recorrente é na própria aplicação e/ou legalidade da taxa e tal discordância não seria evitada na audiência prévia como, aliás, não foi na reclamação.
13 - Limitando-se o acto de liquidação a aplicar a taxa prevista no artigo 25° da Tabela anexa ao Regulamento de Taxas, ou seja, sem margem de discricionariedade, estamos manifestamente perante uma situação de absoluta impossibilidade de a decisão do procedimento ser influenciada pela audição da impugnante.
14 - Assim, a audiência prévia, ao contrário do alegado, em nada seria determinante para a liquidação da taxa que resulta de valores objectivos e vinculados definidos na lei e estando o dever de notificação para o exercício de audição prévia incluído na excepção prevista na alínea b) do n°2 do artigo 60º da Lei Geral Tributária, a douta sentença não merece qualquer reparo, pelo que as conclusões L), M), N), O) e P) das Alegações de recurso também devem improceder.
15 - Ao atentarmos no teor da douta sentença verifica-se que o Tribunal entendeu bem qual o objecto da taxa impugnada - a actividade/funcionamento do posto de abastecimento e não o seu licenciamento - e decidiu em conformidade com esse objecto.
16 - A recorrente funda o seu raciocínio da incompetência do Município para liquidar a taxa em pressuposto errado, isto é, no pressuposto de que o licenciamento é que remove o obstáculo jurídico à actividade e que é a entidade responsável pelo licenciamento que garante que não exista consequências ambientais ou de segurança negativas e, como o Município não é a entidade competente para o licenciamento nem fiscalização também não seria competente para a liquidação da taxa.
17 - Contudo a taxa liquidada e em apreciação nada tem a ver com o licenciamento da actividade nem com o cumprimento dos requisitos legais a que a mesma está sujeita, aquela taxa incide sobre os impactos negativos que o funcionamento da actividade, em cumprimento de todos os requisitos legais, inevitavelmente causa no ambiente.
18 - Situação esta bem fundamentada no Acórdão n° 316/2014 do Tribunal Constitucional e no Acórdão do STA de 15/11/2017, proferido no processo n° 0173/15 que contemplam situação em tudo similar à presente.
19 - Na verdade, como refere aquele Acórdão: " a licença de exploração de postos de combustíveis, enquanto ato administrativo de execução continuada (ou de eficácia duradoura), também não esgota os seus efeitos num só momento, através de um ato ou facto isolado. Bem pelo contrário, constitui uma relação jurídica duradoura no quadro da qual o licenciado adquire o direito de exercer uma actividade que, mesmo cumprindo os deveres específicos impostos pela legislação e regulamentação técnica aplicável, interfere permanentemente com a conformação de bens públicos, como o ambiente (ar, águas e solos), o urbanismo, o ordenamento do território, a gestão do tráfego."
20 - E "a atividade de abastecimento de combustíveis, independentemente de estar instalada em propriedade particular, pela natureza do efeito útil pretendido, contende necessariamente com o espaço público, cuja gestão e disciplina compete à entidade municipal tutelar."(Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no Processo n.° 5256/11 de 10/07/2012).
21 - Incumbe aos municípios, ao lado do Estado e a nível local, a realização da politica de ambiente, o artigo 254° n° 2 da Constituição da República Portuguesa consagra que os Municípios dispõem de receitas tributárias próprias nos termos da lei, o artigo 15° do D.L. 73/2013, de 03/09, estipula que os municípios dispõem de poderes tributários, nos termos a definir em diploma próprio, que actualmente é a Lei n° 53-E/2006, de 29 de Dezembro, e o n°2 do artigo 6° do RGTAL determina que as taxas municipais podem também incidir sobre a realização de actividades dos particulares geradoras de impacto ambiental negativo.
22 - A taxa em apreço encontra-se prevista no Regulamento Municipal de Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público de ............, é uma taxa municipal anual e é devida pelo facto da atividade exercida ser geradora de impacto ambiental negativo, pelo que, de acordo com o mencionado Regulamento Municipal e com o disposto nos artigos 6°, 7° e 8° da Lei 53-E/2006, de 29 de dezembro bem como no artigo 15° da Lei das Finanças Locais e nos artigos 238° n° 4 e 241° da Constituição da República Portuguesa o sujeito ativo da presente relação jurídica - tributária geradora da obrigação de pagamento da taxa em questão é a autarquia local.
23 - E o artigo 8° do mesmo diploma legal estipula que as taxas das autarquias locais são criadas por regulamento aprovado pelo órgão deliberativo respectivo, o que aconteceu com a presente taxa através do Regulamento Municipal suprarreferido.
24 - Sendo, por isso, o Município de ............, como autarquia local que é, o sujeito activo da relação jurídica - tributária geradora da obrigação de pagamento da presente taxa e a entidade competente para a criar.
25 - Na apreciação da questão sobre a natureza da taxa e verificação dos pressupostos do artigo 3º do RGTAL a douta sentença também não merece qualquer reparo.
26 - Como consta da Nota Justificativa da proposta de alteração do Regulamento de Taxas e Compensações Urbanísticas, que originariamente criou a taxa, submetida a Apreciação Pública, a previsão da taxa em questão surge na sequência do disposto no n°2 do artigo 6º do RGTAL que dispõe que as taxas municipais podem incidir sobre a realização de actividades dos particulares geradoras de impacto ambiental negativo.
27 - Aliado à circunstância de existirem certos domínios das actividades económicas que foram identificados e considerados no Regulamento, e com os fundamentos constantes da nota justificativa, como o maior exemplo de actividades geradoras de impacto ambiental negativo, onde consta a existência de postos de abastecimento de combustíveis junto aos eixos rodoviários e vias estruturantes mas também a instalação de infraestruturas de radiocomunicações, a ocupação do solo com parques de estacionamento a descoberto e os stands de exposição para venda de veículos automóveis ou outros objectos ao ar livre.
28 - E, na verdade, é do senso comum que estas actividades elencadas, e concretamente a instalação de postos de abastecimento, pela agressão que constituem à paisagem urbana ou rural, pela pressão que exercem não só nas rodovias como no tecido urbano envolvente e até pelo desequilíbrio urbano e paisagístico que provocam, são actividades que causam impacto ambiental negativo, isto é, produzem alterações desfavoráveis em termos ambientais numa determinada área, in casu na área do Município de .............
29 - O funcionamento dos postos de abastecimento de combustíveis que, normalmente, acontece junto de elementos vulneráveis como zonas residenciais, vias de comunicação, locais frequentados pelo público, constitui, por isso, uma actividade prejudicial ao ambiente urbano, degradando o ordenamento do território e o urbanismo e a paisagem urbana bem como a qualidade de vida dos cidadãos e colocando problemas a nível de gestão de tráfego, bens ambientais que incumbe ao Município preservar e manter dentro de determinados parâmetros.
30 - O concelho de ............, por ser um concelho com uma grande extensão, constituído por vários eixos rodoviários principais e estruturantes e desde sempre ser um concelho de travessia para o ............. e Norte do País, tem instalados muitos postos de abastecimento, o que, em termos urbanísticos e de gestão de tráfego, causa um forte impacto negativo pelas condicionantes urbanísticas e de aproveitamento de solos que a sua instalação determina no espaço público municipal.
31 - Acresce que o funcionamento dos postos de abastecimento provoca ainda impactos negativos ambientais presentes e futuros principalmente ao nível da poluição atmosférica com a emissão de gases e libertação de vapores e outros poluentes mas também com a emissão de ruídos (face à afluência de veículos e também pelo movimento de descargas dos veículos cisterna de combustível) que incumbe à autarquia inspeccionar, fiscalizar e prevenir, sendo nesses postos de abastecimento armazenada e manipulada uma substância perigosa que, por ser altamente inflamável, apresenta problemas de prevenção de segurança civil.
32 - É, assim, evidente o impacto de um posto de abastecimento nos bens ambientais que compete ao município preservar, decorrente não só das suas atribuições e competências gerais como da Lei de Bases do Ambiente.
33 - Como melhor consta do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no Processo n.º 5256/11 de 10/07/2012, a atividade de abastecimento de combustíveis, independentemente de estar instalada em propriedade particular, pela natureza do efeito útil pretendido, contende necessariamente com o espaço público, cuja gestão e disciplina compete à entidade municipal tutelar.
34 - Assim, de acordo com esta jurisprudência mais recente a taxa em causa assenta na remoção de um obstáculo jurídico, e encontra-se legitimada pela "tutela de reais interesses públicos, cuja preservação é condição indispensável da "qualidade ambiental das povoações e da vida urbana" nos termos constitucionalmente exigidos".
35 - O funcionamento desta actividade representa um risco para os bens jurídicos ambientais que, em prejuízo da qualidade ambiental da vida urbana e segurança no concelho, o Município tem de suportar passivamente, acrescido do facto de que, com fundamento no principio da responsabilização, o beneficiário da actividade, e que com ela tem lucro económico, tem o dever de contribuir, através da taxa em apreço, para ressarcir a comunidade dos danos ambientais reais ou potenciais, aos bens afectados.
36 - A utilidade económica que a recorrente / Impugnante retira da sua actividade é sustentada por correspondente dispêndio de recursos naturais, que exige e requer a execução de serviços pelo Município com vista à redução dos fatores de risco ambiental.
37 - Verifica-se, por isso, a existência de fundamento legal para a aplicação da taxa constante do artigo 55º do Regulamento Municipal de Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público, que se reveste de uma taxa de desincentivo, pretendendo-se com o valor fixado penalizar este tipo de ocupação dado o seu nível de prejudicialidade.
38 - Também o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 05.02.2013, proferido no processo 06245/12, disponível em www.dgsi.pt e o Acórdão nº 581/2012, proferido pelo Tribunal Constitucional em 05 de Dezembro de 2012, vão no mesmo sentido, além do Acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional n° 316/2014, de 01 de Abril de 2014, e do Acórdão do STA de 15/11/2017, que fundamentaram a sentença sob recurso.
39 - Também, como salienta a douta sentença, o Tribunal Constitucional já se pronunciou sobre a constitucionalidade dos normativos em apreciação, o artigo 55º do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público de ............ e o artigo 25° n°3 da Tabela de Taxas do Regulamento de Taxas e Outras Receitas do Município, no seu Acórdão n° 623/2019, de 23 de Outubro de 2019, tendo decidido por não julgar inconstitucional tais normas, pelo que as mesmas são constitucionais.
40 - Ora, tendo sido com os fundamentos desta jurisprudência que a douta decisão sob recurso entendeu estar legitimada a cobrança das taxas pelo Município no sentido de que o tributo é bilateral resultando da remoção do obstáculo jurídico à actividade do particular de produção de impacto ambiental negativo, nada lhe há apontar, não se verificando qualquer inconstitucionalidade, devendo, por via disso, também serem julgadas improcedentes todas as conclusões de recurso.
41 - O regulamento e a liquidação têm fundamentação económico-financeira suficiente, não se afigurando razoável exigir que as autarquias para poderem cobrar uma taxa tenham de fazer prova de todas e cada uma das acções realizadas em cumprimento deste dever, como, aliás, é referido no mencionado Acórdão do Tribunal Constitucional nº 316/2014.
42 - A recorrente não concretiza em que medida se verifica a violação dos princípios da equivalência e da proporcionalidade.
43 - De qualquer modo, sempre se diga que existe fundamento legal para a aplicação da taxa em apreço que se trata de uma taxa de desincentivo, uma vez que com o valor fixado pretende-se desencorajar a exploração deste tipo de actividade.
44 - Deste modo, bem decidiu a douta sentença ao julgar a impugnação improcedente, e, não ocorrendo a violação dos normativos invocados ou de qualquer outro, deve a douta sentença manter-se por válida e legal.

Termos em que
deverá se manter a sentença recorrida e julgar improcedente a impugnação, assim se fazendo
JUSTIÇA

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância da Exma. Desembargadora Adjunta e do Exmo. Desembargador Adjunto, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).

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Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber: (1) se o tribunal a quo laborou em erro de julgamento ao dispensar a produção de prova testemunhal; (2) se ocorreu violação do direito de audição prévia; (3) se as liquidações se encontram suficientemente fundamentadas; (4) se ocorre incompetência por falta de atribuições do Município para liquidar a taxa, consequentemente se existe nulidade do ato de liquidação; (5) se a taxa impugnada não tem a correspondente prestação pública, tratando-se de um imposto; (6) se a taxa viola o princípio da equivalência; e (7) se ocorre violação do princípio constitucional da proporcionalidade.

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Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:
III. FUNDAMENTAÇÃO
1. FACTOS PROVADOS
Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
A) Em 02/04/2015, a Impugnante foi notificada pela Câmara Municipal de ............ para, no prazo de 30 dias, pagar a taxa anual devida pela instalação e funcionamento de um posto de abastecimento de combustíveis, sito na Estrada Nacional n.º ..., Km 299,4, Lugar ..., freguesia ... e ..., localizado em “Zona A”, referente ao ano de 2015, no montante de € 5 000,00, constando da referida notificação, além do mais, que “[n]os termos do disposto no artigo 55º, n.º 1 alínea b) do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público (…) e ao abrigo do artigo 6º, n.º 2 da Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, a instalação de postos de abastecimento de combustíveis na área do Concelho integra o conceito de atividade privada suscetível de causar impacto ambiental negativo, encontrando-se, por isso, sujeita ao pagamento de taxa anual, variável em função da zona de localização e cujo valor se encontra previsto no artigo 25º, n.º 3 da Tabela de Taxas constante do Anexo II do Regulamento de Taxas e Outras Receitas do Município de ............, sendo que, no caso concreto, o posto de abastecimento explorado pela requerente se encontra localizado em Zona A, tendo a taxa liquidada sido calculada nos termos do n.º 3 do artigo 58º do Regulamento Municipal de Taxas e Compensações Urbanísticas” – cfr. fls. 3 a 4.1 do processo administrativo (PA) n.º 1158/15 apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
B) Em 02/04/2015, a Impugnante foi notificada pela Câmara Municipal de ............ para, no prazo de 30 dias, pagar a taxa anual devida pela instalação e funcionamento de um posto de abastecimento de combustíveis, sito na Estrada Nacional n.º ..., Km 299,4, Lugar ..., freguesia ... e ..., localizado em “Zona A”, referente ao ano de 2015, no montante de € 5 000,00, constando da referida notificação, além do mais, que “[n]os termos do disposto no artigo 55º, n.º 1 alínea b) do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público (…) e ao abrigo do artigo 6º, n.º 2 da Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, a instalação de postos de abastecimento de combustíveis na área do Concelho integra o conceito de atividade privada suscetível de causar impacto ambiental negativo, encontrando-se, por isso, sujeita ao pagamento de taxa anual, variável em função da zona de localização e cujo valor se encontra previsto no artigo 25º, n.º 3 da Tabela de Taxas constante do Anexo II do Regulamento de Taxas e Outras Receitas do Município de ............, sendo que, no caso concreto, o posto de abastecimento explorado pela requerente se encontra localizado em Zona A, tendo a taxa liquidada sido calculada nos termos do n.º 3 do artigo 58º do Regulamento Municipal de Taxas e Compensações Urbanísticas” – cfr. fls. 3 a 4.1 do PA n.º 1159/15 apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
C) Em 30/04/2015, a Impugnante apresentou reclamação, ao abrigo do art.º 16º do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais (RGTAL), do ato de liquidação mencionado na alínea A) supra, pedindo a sua anulação, nos termos e com os fundamentos constantes de fls. 6 a 22 do PA n.º 1158/15 apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
D) Em 30/04/2015, a Impugnante apresentou reclamação, ao abrigo do art.º 16º do RGTAL, do ato de liquidação mencionado na alínea B) supra, pedindo a sua anulação, nos termos e com os fundamentos constantes de fls. 6 a 22 do PA n.º 1159/15 apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
E) A reclamação mencionada na alínea C) supra foi indeferida por deliberação da Câmara Municipal de ............ de 15/06/2015 – cfr. fls. 48 a 51 do PA n.º 1158/15, apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
F) A reclamação mencionada na alínea D) supra foi indeferida por deliberação da Câmara Municipal de ............ de 15/06/2015 – cfr. fls. 48 a 51 do PA n.º 1159/15, apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
G) Em 26/06/2015, a Impugnante foi notificada das decisões de indeferimento mencionadas nas alíneas E) e F) supra – cfr. fls. 52 a 54.1 do PA n.º 1158/15 e fls. 52 a 54.1 do PA n.º 1159/15, apensos aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
H) A presente impugnação foi deduzida em 08/07/2015 – cfr. fls. 3 a 24 do suporte físico do processo.
Mais se provou que,
I) Os postos de abastecimento de combustíveis mencionados nas alíneas A) e B) supra encontram-se instalados em propriedade privada – facto dado como provado face ao teor do contrato de arrendamento para fins não habitacionais e contrato de cessão da posição contratual, insertos a fls. 49 a 61 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.
J) A atividade de exploração dos postos de abastecimento de combustíveis sitos na Estrada Nacional n.º ..., Lugar ..., sentido Norte/Sul e Sul/Norte, freguesia ..., encontra-se licenciada pela Direção Regional da Economia do Norte desde 23/12/2008, pelo prazo de 20 anos – cfr. fls. 46 e 47 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.

2. FACTOS NÃO PROVADOS
Inexistem, com interesse para a decisão.

MOTIVAÇÃO:
A convicção do Tribunal quanto aos factos dados como provados assentou na análise dos documentos, não impugnados, juntos aos autos.

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Apreciação jurídica do recurso.

Em primeiro lugar, alega a Recorrente que o tribunal a quo laborou em erro de julgamento ao dispensar a produção de prova testemunhal.
Apreciando.
Conforme despacho de pág. 102 do SITAF proferido a 03/11/2016, o tribunal recorrido indeferiu a produção e prova testemunhal.
Nessa sequência devia ter sido interposto recurso interlocutório, que subiria a final (atenta a data em que o despacho foi proferido, nos termos do n.º 1 do artigo 285.º do CPPT, na redação anterior à dada pela Lei n.º 118/2019, de 17/09), sendo que mesmo que o não tivesse feito, sempre é possível alegar a falta de inquirição de testemunhas como fator que implique erro de julgamento, demonstrando-se que com a inquirição se adquiriria melhor prova para os termos da causa.
Ora, a Recorrente quando se refere à prova testemunhal, não menciona nenhum facto passível de poder ser demonstrado pelos depoimentos, mas antes referindo que os documentos poderão não ser bastantes para comprovar toda a matéria, sem explicar a necessidade da prova testemunhal.
Nas suas alegações, passa até a ideia, de que pretendia que as testemunhas fossem depor para explicar os documentos e o direito aplicável.
Portanto, a Recorrente não logra concretizar nenhuma factualidade concreta que carecesse se ser demonstrada por prova testemunhal, pelo que não se vislumbra necessidade de produção dessa prova para melhor aquisição de factos.
Desta forma não se acolhe a alegação de que com a não realização da prova testemunhal o tribunal incorreu em erro de julgamento de facto, pelo que improcede este segmento do recurso.
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Em segundo lugar alega a Recorrente que ocorreu violação do direito de audição prévia, não podendo a mesma ser dispensada, na medida em que não se está diante de uma situação de possível dispensa de audição prévia, como a prevista na alínea b) do n.º 2 do artigo 60.º da Lei Geral Tributária.
O tribunal recorrido entendeu que poderia haver dispensa de audição prévia, com os seguintes fundamentos:
«Atentemos, agora, na questão da violação do direito de audição antes das liquidações.
Dispõe o art.º 60º, n.º 1, alínea a), da Lei Geral Tributária (LGT), que a participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efetuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido diverso, através do direito de audição antes da liquidação.
Prevendo as alíneas a) e b) do n.º 2 do citado preceito que a audição é dispensada no caso de a liquidação se efetuar com base na declaração do contribuinte ou no caso de a liquidação se efetuar oficiosamente, com base em valores objetivos previstos na lei, desde que o contribuinte tenha sido notificado para apresentação da declaração em falta, sem que o tenha feito.
Revertendo ao caso sub judice, extrai-se das notificações das liquidações efetuadas à Impugnante que estas foram apuradas em conformidade com os valores previstos no art.º 25º, n.º 3, da Tabela de Taxas constante do anexo II do Regulamento de Taxas e Outras Receitas do Município de ............, tendo as taxas liquidadas sido calculadas nos termos do art.º 58º, n.º 3, do Regulamento Municipal de Taxas e Compensações Urbanísticas de .............
À luz do exposto, considerando que as taxas em crise foram oficiosamente liquidadas com base em valores objetivos previstos nos citados Regulamentos, isto é, sem qualquer margem de discricionariedade por parte do Município de ............, entendemos que estava dispensada a audição prévia da Impugnante, ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do art.º 60º da LGT, pelo que não ocorre a invocada preterição de formalidade legal.
E ainda que se entendesse que a audiência do contribuinte configurava uma formalidade essencial do procedimento, sempre se dirá que tal formalidade se degradou em não essencial, não sendo, por isso, invalidante das liquidações, posto que essa audiência não era suscetível de alterar o valor das taxas liquidadas, já que são os próprios Regulamentos do Município de ............ que determinam o exato valor das taxas a pagar pelos postos de abastecimentos de combustíveis localizados em determinada zona, sendo que a Impugnante não pôs minimamente em causa a localização que foi considerada pelo Município para efeitos de liquidação dos tributos.»
Apreciando.
Relativamente a esta matéria já se pronunciou este Tribunal Central Administrativo Norte no dia 08/02/2024, em Acórdão no processo n.º 2887/14.0BEPRT, em que as partes são as mesmas e os fundamentos da causa, bem como do recurso exatamente idênticos, pelo que concordando com o teor de tal Acórdão aqui o acolhemos com as devidas adaptações e damos por reproduzido:
«Acontece que não tem aplicação a alínea b), do n.º 2, do art. 60.º, da LGT, na medida em que não decorre do processo que o contribuinte tenha sido notificado para apresentação da declaração em falta e não o tenha feito, ainda que se equacionasse considerar que a taxa foi determinada com base nos valores objetivos previstos no regulamento.
Ora não tendo sido observado direito de audição prévia decorrente do imperativo legal consubstanciado no art. 60.º, n.º 1, al. a), a sentença incorreu em erro de julgamento.
Com efeito, é jurisprudência constante que a regra é a audição prévia Ac. do TCAN de 02-02-2017, no processo n.º 01196/05.0BEPRT, disponível em www.dgsi.pt
e que o princípio da participação dos contribuintes nas decisões que lhes dizem respeito não pode ser afastado a não ser nas exatas situações que a lei define.
2.Por isso, quando a alínea a) do n.º 2 do art. 60 LGT dispensa a audição no “...caso de a liquidação se efetuar com base na declaração do contribuinte...” é só mesmo nesta situação que o direito de audição pode ser dispensado. Seria absolutamente desnecessária a participação do contribuinte na formação de um acto em que o próprio já participou através da apresentação da declaração.
3. Mas só é assim se a liquidação se efectuar, factual e juridicamente, de acordo com os dados fornecidos pelo contribuinte na declaração.
4. A consideração de quaisquer outros elementos para além dos declarados pelo contribuinte, ou um enquadramento jurídico diferente, obrigarão à sua audição.
5. Quando não seja legalmente dispensada, a falta de audição prévia constitui a preterição de formalidade essencial, conducente à anulabilidade do acto, por aplicação supletiva do art. 135º do CPA/1991 (a que corresponde, com alterações, o actual 163º CPA).
Embora de forma muito imprecisa Quer na p.i. quer agora nas alegações e conclusões de recurso [arts. 62.º a 70.º da p.i e conclusões I., N. e P.], a impugnante, ora recorrente, como se colhe do que alega em sede de falta de fundamentação da liquidação Arts. 39.º e 74.º da p.i. coloca a questão de nunca lhe ter sido dado conhecimento do modo como se calculou o quantum a pagar, o método de cálculo que levou ao apuramento do montante da taxa, o critério que foi seguido e os fatores de agravamento e benefício ponderados. Afastando, também, a teoria do aproveitamento do ato pela razão de que os elementos que as liquidações se basearam não foram apresentadas pela recorrente, mas tratando-se de elementos na posse e conhecimento apenas do município, não pôde assim pronunciar-se, entre outras coisas, da bondade dos dados considerados.
De facto, o que a recorrente de forma pouco clara coloca é que não tendo estado desde o início no processo de licenciamento da exploração dos postos de abastecimento, como decorre da licença de exploração n.ºs ...61 e ...62 e o contrato de cessão da posição contratual do contato de arrendamento dos prédios para instalação e exploração de posto de abastecimento, em que figura a [SCom02...], S.A., não teve acesso a todos os elementos que estão na posse do Município e, por via disso, não se pôde pronunciar sobre eles, ou seja, os elementos que concorreram para a aplicação do art. 29.º da tabela anexa ao Regulamento Municipal de Taxas e Compensações Urbanísticas.
Ainda que com nuances diferentes na fundamentação para a violação do direito de audição, este tribunal já se pronunciou, pela violação de tal direito e da necessidade de o art. 60.º, n.º1, da LGT, dever ser cumprido, sancionando que Acórdão de 11-01-2024 no processo n.º 3004/14.2 BEPRT. :«(…)Acresce que, segundo decorre dos autos, os elementos em que a liquidação se baseou não foram apresentados pela Recorrente, configurando antes elementos oficiosos do próprio Município e, caso à Recorrente tivesse sido dada a oportunidade de se pronunciar em momento anterior à liquidação, esta poderia ter imediatamente esclarecido o Município sobre a sua incompetência in casu para a mesma, assim como poderia ter, eventualmente, aferido da bondade dos dados considerados naquelas, como sejam a localização estabelecida unilateralmente pelo Município para efeitos de determinação do montante da taxa ou, por fim alertado para a sua ilegitimidade passiva no procedimento de liquidação, uma vez que os alvarás estão emitidos em nome da “[SCom02...], S.A. e não em nome da Recorrente.
Assim, a necessidade de existir resposta sobre todas estas questões era por si só suficiente para que não se pudesse concluir estar na presença de situação que dispensa a audição prévia, dado não estarmos perante uma situação de solução legal evidente, onde a participação do sujeito passivo nada acrescentaria à decisão por apelo ao que dispõe o art. 165º, nº 5, al. a) do CPA. (…)
Assim sendo, não tendo sido facultado o direito de audiência prévia à aqui Recorrente, nos termos do artigo 60º, nº 1 a) da LGT, errou a sentença que entendeu que tal ato era dispensável. Neste mesmo sentido, de que se mostra violado o princípio da audição prévia na liquidação das taxas de instalação e funcionamento de postos de combustíveis, já decidiu este TCAN em 17/02/2022, no processo nº 1778/14.0BEPRT e em 07/12/2023, no processo nº 2030/16.1BEPRT.»

Por fim, em reforço do que tem sido a jurisprudência deste tribunal na questão da violação do direito de audição nos litígios que envolvem o Município de ............, em matéria de liquidação das Taxas de Instalação e funcionamento de postos de abastecimento de combustíveis, o STA, pronunciou-se no âmbito de uma apreciação preliminar de admissão de recurso de revista No recurso de acórdão deste TCA no processo 01778/14.0BEPRT de 26-10-2022, disponível em www.dgsi.pt
: que nas situações em que atentas as circunstâncias concretas não se está perante uma situação de solução legal evidente e em que não se vislumbra qualquer possibilidade de a omitida audição do sujeito passivo, antes do ato de liquidação, pode influenciar o conteúdo desta (…), pois que o princípio de matriz constitucional é o da existência de audiência prévia à liquidação, sendo a referida dispensa excepcional. Não há, aliás, novidade nas questões colocadas atenta a existência de abundante jurisprudência dos tribunais superiores da jurisdição quer quanto à questão da audiência prévia, quer quanto ao princípio do aproveitamento do acto. (sublinhado nosso)
(…)É para nós manifesto inexistir no acórdão sindicado “erro manifesto na aplicação do direito” que justifique a admissão da revista, bem pelo contrário.
Ao invés de uma aplicação mecânica da jurisprudência sobre o princípio do aproveitamento do acto, o acórdão sindicado fez do referido princípio uma aplicação atenta às circunstâncias do caso concreto, como aliás se impõe, que de modo algum se revela “manifestamente errada ou juridicamente insustentável”. [fim de citação]

Desta forma, conclui-se que o vício em apreço não podendo ser suprido, pelo que enferma a totalidade da liquidação, pelo que esta não se pode manter na ordem jurídica.
Por este motivo, fica também prejudicada a análise dos demais fundamentos do recurso.
Face ao exposto, o recurso deve proceder, em consequência a sentença ser revogada, julgando-se procedente a impugnação, com a consequente anulação da liquidação impugnada.
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No concerne a custas, atenta a revogação da sentença e ao facto de a Recorrida ter contra-alegado, assim como a impugnação acabar por ser totalmente procedente, é a Recorrida responsável pelas custas em ambas as instâncias – vide artigo 527.º, nos. 1 e 2 do Código de Processo Civil.
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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:
Quando o contribuinte não tenha sido notificado para apresentar a declaração fiscal em falta, o direto de audição prévia não pode ser dispensado, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 60.º da Lei Geral Tributária, mesmo que a liquidação possa ser efetuada oficiosamente, com base em valores objetivos previstos na lei.
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Decisão
Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Subsecção Tributária Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a impugnação procedente, anulando-se o ato de liquidação impugnado.
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Custas a cargo da Recorrida, em ambas as instâncias.
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Porto, 22 de fevereiro de 2024.

Paulo Moura
José António Coelho
Maria da Conceição Soares