Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00699/19.4BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/12/2024
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:FGS;
AÇÃO DE INSOLVÊNCIA;
PERÍODO DE REFERÊNCIA;
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
«AA», «BB», «CC», «DD», «EE», «FF», «GG», «HH» e «II», instauraram acção administrativa contra o Fundo de Garantia Salarial, todos melhor identificados nos autos, visando a impugnação dos despachos proferidos pelo Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial, de indeferimento dos pedidos de pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho apresentados pelas AA.
Pediram a anulação dos mencionados despachos, bem como, a condenação da Entidade Demandada a praticar outros actos que defiram o pagamento dos créditos requeridos pelas AA., identificados no art. 11º da petição inicial.
Por sentença proferida pelo TAF de Aveiro foi julgada improcedente a acção e absolvida a Entidade Demandada dos pedidos.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, as Autoras formularam as seguintes conclusões:
A)A douta sentença fez errada interpretação da lei.

B) As recorrentes utilizaram os procedimentos legais ao seu dispor, nomeadamente tendo recorrido ao processo de insolvência para a defesa e reconhecimento dos seus direitos o que foi conseguido com o termo de transacção elaborado no dia 28/02/2019;

C) Não tendo sido pagos os créditos laborais reconhecidos às Recorrentes, os mesmos foram reclamados no âmbito do processo de insolvência e devidamente reconhecidos, tendo sido emitido o respectivo formulário para ser junto ao processo de reclamação de créditos laborais junto do FGS;

D) É a declaração de insolvência da empresa que faz nascer o direito ao acionamento do FGS,

E) Direito esse que só ocorreu a 28/02/2019 - data em que foi decretada a insolvência da empresa [SCom01...], LIMITADA.
F) Pelo que, sem essa sentença, nunca poderia o FGS pagar os créditos salariais reclamados pelas ora Recorrentes.

G) Pelo que deve ser recusada a aplicação, por materialmente inconstitucional, do nº 4 do artigo 2º do Decreto Lei 59/2015 de 21/04,

H) Por violadora do Princípio do Estado Direito, consagrado no artigo 2º e do Princípio da Igualdade, consagrado no artigo 13º ambos da Constituição da República Portuguesa, pelo que tem de ser desaplicado em concreto;

I) Desta forma a douta sentença violou a lei e a CRP com a interpretação que fez da lei;

J) Devendo, assim, ser revogada e substituída por outra que reconheça o seu direito aos créditos laborais.

Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente e, consequentemente:

a) Revogada a sentença recorrida e, consequentemente;

b) Condenar-se a Recorrida, Fundo de Garantia Salarial, Entidade que proferiu os actos administrativos acima mencionados, a praticar outros actos administrativos (um por cada uma das Recorrentes) que defira nos exactos termos do peticionados pelas Recorrentes o pagamento dos créditos requeridos pelas Recorrentes e

c) Condenar-se a Ré nas custas processuais.
ASSIM SE DECIDINDO FAR-SE-Á JUSTIÇA!
O Réu não juntou contra-alegações.
A Senhora Procuradora Geral Adjunta notificada, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
1) A 1ª A. prestou trabalho para a sociedade “[SCom01...], Limitada” (actualmente designada “[SCom02...], Lda”) desde 06/02/2001 até 31/12/2017, data da cessação do contrato de trabalho, por encerramento da empresa – cfr. fls. 1 e ss. do respectivo PA;
2) A 2ª A. prestou trabalho para a sociedade “[SCom01...], Limitada” (actualmente designada “[SCom02...], Lda”) desde 01/08/2002 até 31/12/2017, data da cessação do contrato de trabalho, por encerramento da empresa – cfr. fls. 1 e ss. do respectivo PA;
3) A 3ª A. prestou trabalho para a sociedade “[SCom01...], Limitada” (actualmente designada “[SCom02...], Lda”) desde 01/07/2002 até 31/12/2017, data da cessação do contrato de trabalho, por encerramento da empresa – cfr. fls. 1 e ss. do respectivo PA;
4) A 4ª A. prestou trabalho para a sociedade “[SCom01...], Limitada” (actualmente designada “[SCom02...], Lda”) desde 31/03/2006 até 31/12/2017, data da cessação do contrato de trabalho, por encerramento da empresa – cfr. fls. 1 e ss. do respectivo PA;
5) A 5ª A. prestou trabalho para a sociedade “[SCom01...], Limitada” (actualmente designada “[SCom02...], Lda”) desde 01/07/2002 até 31/12/2017, data da cessação do contrato de trabalho, por encerramento da empresa – cfr. fls. 1 e ss. do respectivo PA;
6) A 6ª A. prestou trabalho para a sociedade “[SCom01...], Limitada” (actualmente designada “[SCom02...], Lda”) desde 24/02/2005 até 31/12/2017, data da cessação do contrato de trabalho, por encerramento da empresa – cfr. fls. 1 e ss. do respectivo PA;
7) A 7ª A. prestou trabalho para a sociedade “[SCom01...], Limitada” (actualmente designada “[SCom02...], Lda”) desde 01/09/2002 até 31/12/2017, data da cessação do contrato de trabalho, por encerramento da empresa – cfr. fls. 1 e ss. do respectivo PA;
8) A 8ª A. prestou trabalho para a sociedade “[SCom01...], Limitada” (actualmente designada “[SCom02...], Lda”) desde 01/09/2002 até 31/12/2017, data da cessação do contrato de trabalho, por encerramento da empresa – cfr. fls. 1 e ss. e 50 do respectivo PA;
9) A 9ª A. prestou trabalho para a sociedade “[SCom01...], Limitada” (actualmente designada “[SCom02...], Lda”) desde 01/06/2001 até 31/12/2017, data da cessação do contrato de trabalho, por encerramento da empresa – cfr. fls. 1 e ss. do respectivo PA;
10) Em 22/12/2018 foi apresentado no Tribunal Judicial de Oliveira de Azeméis – Juízo de Comércio, pelas aqui AA., o Processo de Insolvência da sociedade identificada nos pontos antecedentes, que deu origem ao proc. nº 5163/18.6T8OAZ – cfr. fls. 1 e ss. do PA da 1ª A.;
11) Em 28/02/2019, foi apresentado no processo identificado no ponto anterior requerimento subscrito conjuntamente pelas ali AA. e pela ali Requerida “[SCom02...]”, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e do qual se extrai, designadamente, o seguinte: “(...)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)” – cfr. fls. 25-30 dos autos (SITAF);
12) A sociedade “[SCom02...], Lda.” foi declarada insolvente por sentença proferida em 28/02/2019 – cfr. fls. 33 e ss. do PA da 1ª A.;
13) Em 28/12/2018, a 1ª A. apresentou requerimento dirigido ao Fundo de Garantia Salarial solicitando o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho devidos pela “[SCom01...], Limitada”, no valor global de 10.183,57 €, discriminados da seguinte forma: Subsídio de férias [2017 (em falta) proporcionais]: 272,06 €; Indemnização/compensação por cessação de contrato de trabalho: 9.911,51 €.
– cfr. fls. 1 e ss. do PA da 1ª A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
14) Em 28/12/2018, a 2ª A. apresentou requerimento dirigido ao Fundo de Garantia Salarial solicitando o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho devidos pela “[SCom01...], Limitada”, no valor global de 9.064,85 €, discriminados da seguinte forma: Subsídio de férias [2017 + proporcionais]: 249,60 €; Indemnização/compensação por cessação de contrato de trabalho: 8.815,25 €.
– cfr. fls. 1 e ss. do PA da 2ª A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
15) Em 28/12/2018, a 3ª A. apresentou requerimento dirigido ao Fundo de Garantia Salarial solicitando o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho devidos pela “[SCom01...], Limitada”, no valor global de 9.112,50 €, discriminados da seguinte forma: Subsídio de férias [2017 + proporcionais de 2017]: 249,60 €; Indemnização/compensação por cessação de contrato de trabalho: 8.862,90 €.
– cfr. fls. 1 e ss. do PA da 3ª A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
16) Em 28/12/2018, a 4ª A. apresentou requerimento dirigido ao Fundo de Garantia Salarial solicitando o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho devidos pela “[SCom01...], Limitada”, no valor global de 6.968,20 €, discriminados da seguinte forma: Subsídio de férias [2017 + proporcionais]: 249,60 €; Indemnização/compensação por cessação de contrato de trabalho: 6.718,60 €.
– cfr. fls. 1 e ss. do PA da 4ª A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
17) Em 28/12/2018, a 5ª A. apresentou requerimento dirigido ao Fundo de Garantia Salarial solicitando o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho devidos pela “[SCom01...], Limitada”, no valor global de 9.112,50 €, discriminados da seguinte forma: Subsídio de férias [2017 + proporcionais de 2017]: 249,60 €; Indemnização/compensação por cessação de contrato de trabalho: 8.862,90 €.
– cfr. fls. 1 e ss. do PA da 5ª A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
18) Em 28/12/2018, a 6ª A. apresentou requerimento dirigido ao Fundo de Garantia Salarial solicitando o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho devidos pela “[SCom01...], Limitada”, no valor global de 7.683,40 €, discriminados da seguinte forma: Subsídio de férias [2017 + proporcionais de 2017]: 249,60 €; Indemnização/compensação por cessação de contrato de trabalho: 7.433,80 €.
– cfr. fls. 1 e ss. do PA da 6ª A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
19) Em 28/12/2018, a 7ª A. apresentou requerimento dirigido ao Fundo de Garantia Salarial solicitando o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho devidos pela “[SCom01...], Limitada”, no valor global de 9.331,04 €, discriminados da seguinte forma: Subsídio de férias [2017 + proporcionais de 2017]: 249,60 €; Indemnização/compensação por cessação de contrato de trabalho: 9.081,40 €.
– cfr. fls. 1 e ss. do PA da 7ª A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
20) Em 28/12/2018, a 8ª A. apresentou requerimento dirigido ao Fundo de Garantia Salarial solicitando o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho devidos pela “[SCom01...], Limitada”, no valor global de 9.211,85 €, discriminados da seguinte forma: Subsídio de férias [2017 + proporcionais de 2017]: 272,06 €; Indemnização/compensação por cessação de contrato de trabalho: 8.939,71 €.
– cfr. fls. 1 e ss. do PA da 8ª A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
21) Em 28/12/2018, a 9ª A. apresentou requerimento dirigido ao Fundo de Garantia Salarial solicitando o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho devidos pela “[SCom01...], Limitada”, no valor global de 9.731,95 €, discriminados da seguinte forma: Subsídio de férias [2017 + proporcionais de 2017]: 249,60 €; Indemnização/compensação por cessação de contrato de trabalho: 9.482,35 €.
– cfr. fls. 1 e ss. do PA da 9ª A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
22) Em 25/03/2019, foi elaborada pelo Centro Distrital ... informação, a propósito dos requerimentos mencionados nos pontos anteriores, de cujo teor se extrai, designadamente, o seguinte: “(...)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)” – cfr. fls. 50 do PA da 1ª A.;
23) Em 27/03/2019, foi elaborada pelo Núcleo do Fundo de Garantia Salarial informação, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai, designadamente, o seguinte: “
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)” – cfr. fls. 52 do PA da 1ª A.;
24) Sobre a informação mencionada no ponto antecedente foi exarado despacho de concordância da Presidente do Conselho de Gestão do FGS, datado de 05/04/2019 – cfr. fls. 54 do PA da 1º A.;
25) Com data de 26/04/2019, o Director de Segurança Social remeteu à 1ª A. ofício com o assunto “Fundo de Garantia Salarial – Notificação Indeferimento”, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai, designadamente, o seguinte: “
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)” – cfr. fls. 57 e 58 do PA da 1ª A.;
26) Às demais AA. foi, de igual modo, remetido ofício de teor idêntico ao mencionado no ponto antecedente – cfr. fls. 59 e 60 do PA da 2ª A.; fls. 72 e 73 do PA da 3ª A.; fls. 57 e 58 do PA da 4ª A.; fls. 56 e 57 do PA da 5ª A.; fls. 56 e 57 do PA da 6ª A.; fls. 57 e 58 do PA da 7ª A.; fls. 60 e 61 do PA da 8ª A.; e fls. 58 e 59 do PA da 9ª A..
DE DIREITO
Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo o Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Sem embargo, por força do artigo 149.º do CPTA, o Tribunal, no âmbito do recurso de apelação, não se quedará por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decidirá “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
Assim,
Avança-se, já, que não assiste razão às Recorrentes.
Conforme resulta claro da sentença, a presente questão já foi analisada pelo Tribunal Constitucional, nos Acórdãos nºs 152/2020, de 04/03/2020 e 269/2020, de14/05/2020, que decidiu:
“não julgar inconstitucional a norma segundo a qual o Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento de créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação que se tenham vencido nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência, decorrente do artigo 2.º, n.º 4, do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril”
Acresce que os Acórdãos invocados pelas Recorrentes, nas suas alegações de recurso, não se pronunciam sobre a matéria em discussão nos presentes autos, mas antes sobre a tempestividade da apresentação do pedido no Fundo de Garantia Salarial.
A sentença encontra-se em conformidade com a Jurisprudência dos Tribunais Superiores, conforme resulta dos Acórdãos nela citados, sendo no mesmo sentido o Acórdão deste TCAN, proferido no proc. nº 00695/19.1BEBRG, em 09-04-2021, cujo sumário reza assim:
1 – O Fundo de Garantia Salarial, assegura o pagamento dos créditos emergentes de contratos de trabalho que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da propositura da ação ou apresentação do requerimento referidos no artigo 2º anterior – artº 319º/1 da Lei 35/2004.
2 – Resulta do art. 317º da Lei nº 35/2004 (Regulamento do Código do Trabalho) que «O Fundo de Garantia Salarial assegura, em caso de incumprimento pelo empregador, ao trabalhador o pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação nos termos dos artigos seguintes».
Por outro lado, estabelece o art. 318º, nº1 do mesmo diploma que «O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos a que se refere o artigo anterior, nos casos em que o empregador seja judicialmente declarado insolvente».
Complementarmente, refere o art. 319º que «O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos previstos no artigo 317.° que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da propositura da ação ou apresentação do requerimento referido no artigo anterior (n° 1).
3 - À luz do regime introduzido pelo DL n° 59/2015 (Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial), é exigida a verificação cumulativa dos requisitos estabelecidos para que o FGS possa assegurar o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação e cessação (cfr. arts. 1º e 2º do DL n° 59/2015).
Com efeito, para que o referido regime possa operar importa que se mostrem preenchidos, no caso, os seguintes pressupostos:
a) Seja a entidade empregadora judicialmente declarada insolvente;
b) Que os créditos emergentes do contrato de trabalho se tenham vencido nos seis meses anteriores à data da propositura da ação (cfr. art° 2°, n°4, do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial aprovado pelo DL n° 59/2015).
4 – O FGS assegura o pagamento dos créditos emergentes de contratos de trabalho que se tenham vencido nos seis meses que antecederam a data da propositura da ação de insolvência, sendo que para esse efeito, importa, apenas, a data do vencimento dos créditos laborais e não a do trânsito em julgado da sentença proferida na ação intentada com vista ao seu reconhecimento judicial, ou a data do seu reconhecimento no processo de insolvência.
5 – Em concreto, resultando dos factos dados como provados que os créditos laborais se venceram com a cessação do contrato de trabalho, em 20-11-2016, e que a Ação de insolvência foi proposta em 25-05-2017, é manifesto que os créditos reclamados estão fora do período de referência (seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência - entre 25.11.2016 e 25.05.2017).
Face ao exposto, e concordando-se inteiramente com a fundamentação da sentença, torna-se inútil a invocação de mais fundamentos, para além dos já enunciados.
A sentença foi proferida ao abrigo do princípio da legalidade.
Em suma,
Contrariamente ao alegado, a sentença não padece de erro de julgamento;
Pelo contrário, a decisão sob censura no sentido em que o fez, procedeu de forma irrepreensível à interpretação dos factos e aplicou corretamente aos mesmos o direito, não tendo violado quaisquer preceitos legais/constitucionais;
Como sentenciado:
Como se alcança do probatório, a Entidade Demandada, com base em análise idêntica e semelhantes pressupostos, apreciou e indeferiu os requerimentos apresentados pelas AA., vertidos nos pontos 13) a 21) do probatório, extraindo-se do teor dos actos emitidos pela ED e notificados aos interessados, aqui AA., por ofícios datados de 26/04/2019, que a decisão da ED foi proferida com o seguinte fundamento: os créditos não se encontram abrangidos pelo período de referência, ou seja, não se venceram nos 6 meses que antecederam a propositura da acção de insolvência da entidade empregadora, já que os contratos de trabalho cessaram em 31/12/2017 e o período de referência iniciou-se em 22/06/2018;
(…)
Assim, tendo todos os créditos reclamados pelas AA. data de vencimento anterior aos seis meses que antecederam a data da propositura da acção na qual a entidade empregadora foi declarada insolvente, não lhes assiste o direito a que o FGS assegure o respectivo pagamento, por inobservância no caso concreto do requisito previsto no n° 4 do art. 2° do Novo regime do Fundo de Garantia Salarial.
Importando, ainda, salientar, face à alegação produzida pelas AA. nestes autos, que para efeitos de assegurar o pagamento, pelo FGS, dos créditos emergentes de contratos de trabalho, releva, apenas, a data de vencimento dos créditos em causa e não a do trânsito em julgado da sentença que declarou a insolvência da entidade patronal, ou da sentença proferida em eventual acção intentada com vista ao reconhecimento judicial dos créditos ou a data do reconhecimento desses créditos no âmbito do processo de insolvência (excepção feita à indemnização por despedimento ilícito, já que esta ilicitude apenas pode ser declarada pelos tribunais de trabalho no domínio laboral privado).
Por outro lado, a circunstância de as AA. terem formulado tempestivamente o pedido de pagamento dos respectivos créditos salariais ao FGS não tem a virtualidade de alterar a interpretação e aplicação da norma relativa ao período de referência em causa, previsto na lei em termos que não deixam quaisquer dúvidas, tratando-se de distinto pressuposto de accionamento dos mecanismos de acesso ao FGS.
Do mesmo modo, a invocação de que de acordo com o art. 337° do CT os créditos salariais prescrevem no prazo de 1 ano, também não contende com o disposto no art. 2°, n° 4 do citado regime legal, na medida em que tal norma se destina a evitar a inércia do trabalhador interessado em accionar judicialmente a sua entidade empregadora com vista ao recebimento de créditos salariais em dívida.
(…)
Por fim, não pode ser esquecido que o Fundo foi criado, em parte, para concretizar o mandamento constitucional constante do n.º 3 do artigo 59.º da Constituição, dirigido ao legislador da República, para que este institua “garantias especiais” para proteger os salários. Nessa medida, configurando uma das garantias especiais da retribuição, o regime do Fundo tem de ser efetivo, como referido no Acórdão n.º 328/2018, ponto 2.4.1., mas também terá de ser sustentável. Assim, é de aceitar que não resulta do texto constitucional a imposição de um Fundo de Garantia sem prazo, a todo o tempo.
De facto, o regime desenhado pela UE e transposto nacionalmente «tem em consideração a capacidade financeira» dos Estados-Membros, neste caso Portugal, e «procura preservar o equilíbrio financeiro das suas instituições de garantia» (cfr. Acórdãos do TJ de 28 de novembro de 2013, Gomes Viana Novo e o., Proc. n.º C­309/12, EU:C:2013:774, n.º 29, e de 25 de julho de 2018, Guigo, Proc. n.º C-338/17, EU:C:2018:605, n.º 31). É, pois, de aceitar que exista um prazo de garantia que delimite as responsabilidades do Fundo de Garantia, desde que respeite as restantes imposições constitucionais, nomeadamente as decorrentes do princípio da proporcionalidade. Nesse contexto, um prazo que abrange os créditos laborais emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação que se tenham vencido nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência não é desproporcionado.
Para além disso, o regime em causa «pressupõe um nexo entre a insolvência e os créditos salariais em dívida» (cfr. Acórdão do TJ de 25 de julho de 2018, Guigo, Proc. n.º C-338/17, EU:C:2018:605, n.º 34) – o que se enquadra no dever do Estado de assegurar “garantias especiais” para proteger os salários nesse contexto especialmente complexo que é a insolvência do empregador. Assim, não é desrazoável que esse prazo tenha como ponto de referência para o início da sua contagem a propositura da ação de insolvência. Verifica-se, aliás, como já se referiu, uma tendencial correspondência temporal entre este período de garantia de seis meses e os seis meses de incumprimento de dívidas emergentes de contrato de trabalho, ou da violação ou cessação deste contrato, que legitimam os trabalhadores a apresentar um pedido de declaração de insolvência. Nesta leitura integrada do regime, trata-se de um prazo adequado para a prossecução das finalidades a que o legislador se propôs.” – fim de citação.
Aderindo integralmente ao entendimento propugnado pelo TC, forçoso será concluir que, no presente caso, não ocorre a violação dos princípios constitucionais invocados pelas AA..
Em suma, face ao não cumprimento do disposto no art. 2°, n° 4, do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, sempre teria o pedido de pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho apresentado pelas AA. de ser indeferido, tal como decidiu a Entidade Demandada, não se encontrando, assim, reunidos os pressupostos legais para que esta seja condenada a deferir a pretensão das AA..
Improcedem, pois, as Conclusões das alegações.

DECISÃO

Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pelas Recorrentes, sem prejuízo de eventual benefício de apoio judiciário.
Notifique e DN.
Porto, 12/01/2024


Fernanda Brandão
Rogério Martins
Nuno Coutinho