Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01103/15.2BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:12/16/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURANÇA SOCIAL, REGIME CONTRIBUTIVO DO TRABALHADOR INDEPENDENTE, ENQUADRAMENTO, LEGALIDADE DA LIQUIDAÇÃO,
VÍCIO PRÓPRIO IMPUTADO A ACTO DIVERSO, OPOSIÇÃO
Sumário:I - O primeiro enquadramento no regime contributivo dos trabalhadores independentes e a vinculação dele decorrente, se for caso disso, produzem efeitos no dia 1 do 12.º mês seguinte ao do início da actividade – cfr. artigo 28.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25/9, na redacção aplicável à data.

II - No caso de reinício de actividade, o enquadramento produz efeitos no dia 1 do mês seguinte àquele em que tiver início o exercício de actividade por conta própria – cfr. artigo 28.º, n.º 1 do mesmo diploma.

III - Por via de regra, as contribuições para a Segurança Social resultam da apresentação das declarações de remunerações pelo contribuinte, a quem compete também proceder à liquidação dos montantes a entregar.

IV - Nessa situação, a lei permite a extracção de certidões de dívida perante a mera constatação de omissão de um pagamento, sem que haja um acto administrativo ou tributário prévio definidor da obrigação, devendo considerar-se que a extracção do título executivo integra o acto de liquidação para os efeitos previstos na alínea h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, uma vez que será em sede de oposição à execução fiscal que o contribuinte poderá questionar a legalidade do acto tributário.

V - Por esse motivo e atento o objecto da oposição judicial, não poderá ser conhecido acto diverso desse acto de liquidação nem proceder a oposição à execução fiscal instaurada, com fundamento em vício de falta de fundamentação imputado a esse outro acto proferido pelo órgão de execução fiscal de não-aceitação de reclamação quanto às mesmas dívidas exequendas de contribuições à Segurança Social.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:M.
Recorrido 1:IGFSS
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

M., contribuinte n.º (…), residente na Rua (…), interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 19/03/2020, que julgou parcialmente extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, no que concerne ao pedido de extinção das contribuições dos períodos de 2009/11 e 2009/12, e improcedente a Oposição, no que respeita ao pedido de extinção das contribuições dos períodos de 2010/01 a 2010/08, também em cobrança no processo de execução fiscal n.º 1302201100432890, contra si instaurado por dívidas à Segurança Social provenientes de contribuições de trabalhador independente, no valor de € 1 597,20.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
1. Deve ser considerado provado o conteúdo da comunicação de 06-11-2009, dirigida à ora recorrente, onde é declarado o início de actividade como trabalhador independente em 2009-10-02;
2. Até 8/2011, nada foi informado sobre qualquer alteração ao comunicado em 1.
3. A comunicação é uma formalidade legal e de per si constitutiva de direitos,
4. não tendo sido revogada ou alterada sequer.
5. O enquadramento e a inscrição dos trabalhadores independentes competem ao Centro Regional da Segurança Social da área, in casu, do Porto.
6. Os cerca de 4 meses de atividade em 2002/2003 e respetivo enquadramento não produzem qualquer efeito,
7. Pelo que o início de atividade em 2/10/09 é correto, legal e 1º enquadramento.
8. A reclamação apresentada não é facto novo, nem ampliação do pedido.
9. Foram violados por errada interpretação os art.ºs 27 e 28, n.º 3 do Dec. Lei 328/93 de 25 de Setembro e respetivas alterações, entre outros.
Pelo exposto e pelo que doutamente será suprido, dando-se provimento ao recurso e revogando-se a sentença recorrida por acórdão que julgue procedente a Oposição, no que respeita ao pedido do período 2010/01 a 2010/08, e absolvendo a recorrente da execução fiscal, far-se-á Justiça.”
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Não houve contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; submete-se o processo à Conferência para julgamento.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa analisar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao não apreciar o vício de falta de fundamentação imputado ao acto de não aceitação da reclamação apresentada e manter a execução fiscal, por as contribuições serem devidas, na medida em que a Oponente já tinha beneficiado da isenção contributiva de 12 meses quando iniciou a actividade em 08/10/2002, sendo que em 02/10/2009 se tratou de um reinício de actividade, que não lhe conferiu direito a nova isenção.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto
Na sentença prolatada em primeira instância consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
A) A Oponente apresentou junto do Serviço de Finanças de Gondomar 2 uma declaração de início de atividade onde indicou como data de início da atividade (no CAE 93050) o dia 08/10/2002 – cfr. fls. 37 a 40 da cópia do processo de execução fiscal (PEF) n.º 1302201100432890 apensa aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
B) A Oponente apresentou junto do Serviço de Finanças de Gondomar 2 uma declaração de cessação de atividade, indicando como data de cessação em sede de IVA e IRS o dia 28/02/2003 – cfr. fls. 41 e 42 da cópia do PEF apensa aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
C) A Oponente apresentou junto do Serviço de Finanças de Gondomar 2 uma declaração de reinício de atividade em 02/10/2009 – cfr. fls. 43 a 46 da cópia do PEF apensa aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
D) A Oponente apresentou junto do Serviço de Finanças de Gondomar 2 uma declaração de cessação de atividade, indicando como data de cessação em sede de IVA e IRS o dia 25/08/2010 – cfr. fls. 47 e 48 da cópia do PEF apensa aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
E) Em 30/06/2011, foi instaurado contra a Oponente o processo de execução fiscal n.º 1302201100432890, por dívidas à Segurança Social provenientes de contribuições de trabalhador independente, dos períodos de 2009/11 a 2010/08, no valor de € 1 597,20 – cfr. fls. 1 e 2 da cópia do PEF apensa aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
F) A Oponente foi citada para a execução fiscal mencionada na alínea antecedente em 14/07/2011 – cfr. fls. 3 da cópia do PEF apensa aos autos.
G) A presente oposição foi deduzida em 12/08/2011 – cfr. fls. 5 a 8 do processo físico.
H) Em data que o IGFSS não logrou identificar, mas que é posterior à citação da Oponente para a execução e à dedução da presente oposição, foram anuladas as dívidas de contribuições dos períodos de 2009/11 e 2009/12, em cobrança no processo de execução fiscal n.º 1302201100432890 – cfr. fls. 92, 96 e 97 do processo físico e fls. 56 e 57 da cópia do PEF apensa aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
2. FACTOS NÃO PROVADOS
Inexistem, com interesse para a decisão.
MOTIVAÇÃO:
A convicção do Tribunal quanto aos factos dados como provados resultou da análise dos documentos, não impugnados, juntos aos autos.”
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2. O Direito

Cumpre salientar que, face à anulação, na pendência da causa, das dívidas de contribuições dos períodos de 2009/11 e de 2009/12, o tribunal recorrido extinguiu, nesta parte, a instância, por inutilidade superveniente parcial da lide. Assim sendo, o objecto do presente recurso circunscreve-se à sentença recorrida na parte ainda desfavorável à Recorrente, ou seja, quanto às dívidas de contribuições dos períodos de 2010/01 a 2010/08, em cobrança no processo de execução fiscal n.º 1302201100432890.
A Recorrente reitera o pedido de extinção desta execução, insistindo, em síntese, que estava isenta de qualquer obrigação contributiva durante o período de 12 meses após o início da sua actividade como trabalhadora independente, que ocorreu em Outubro de 2009, tendo essa actividade sido cessada em Agosto de 2010, concluindo, consequentemente, inexistir obrigação contributiva, uma vez que só existiria a partir do 12.º mês seguinte ao início de actividade, e, portanto, não serem devidas as correspondentes dívidas exequendas à Segurança Social.
Vejamos o julgamento realizado no tribunal recorrido:
“(…) Por outro lado, alega a Oponente que as contribuições exequendas não são devidas porquanto estava isenta de qualquer obrigação contributiva durante o período de 12 meses após o início da sua atividade como trabalhadora independente, ocorrido em outubro de 2009, sendo que cessou essa atividade em agosto de 2010.
Antes de mais, importa referir que no caso das contribuições para a segurança social a lei permite a extração de certidões de dívida perante a mera constatação de omissão de um pagamento, sem que haja um ato administrativo ou tributário prévio definidor da obrigação, motivo pelo qual a jurisprudência tem vindo a afirmar que a extração do título executivo integra o ato de liquidação para os efeitos previstos na alínea h) do n.º 1 do art.º 204º do CPPT, uma vez que será em sede de oposição à execução que o contribuinte poderá questionar a legalidade das contribuições (neste sentido, veja-se o acórdão do STA de 14/06/2012, processo 0443/12. Também neste sentido, na doutrina, veja-se Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, III volume, 6.ª edição, Áreas Editora, págs. 496 e 497).
Vejamos, então, se as contribuições exequendas são ou não devidas.
O regime de segurança social dos trabalhadores independentes era regido, à data a que respeitam as dívidas exequendas, pelo D.L. n.º 328/93, de 25/9 (com as alterações introduzidas pelos D.L. n.ºs 240/96, de 14/12, 397/99, de 13/10, 159/2001, de 18/5 e 119/2005, de 22/7) O D.L. n.º 328/93, de 25/9, foi revogado pela Lei n.º 110/2009, de 16/9, entrada em vigor em 01/01/2011 (cfr. Lei n.º 119/2009, de 30/12), que aprovou o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.
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Previa o art.º 28º, n.º 1, do D.L. n.º 328/93, de 25/9 (na redação conferida pelo D.L. n.º 240/96, de 14/12), que o enquadramento no regime dos trabalhadores independentes se reportava, na falta de disposição especial, ao dia 1 do mês seguinte àquele em que tivesse início o exercício de atividade por conta própria. Dispondo o seu n.º 3 que o primeiro enquadramento no regime dos trabalhadores independentes e a vinculação dele decorrente, se fosse caso disso, reportava-se ao dia 1 do 12.º mês seguinte ao do início da atividade, sem prejuízo de o mesmo poder ter lugar, anteriormente, a requerimento dos interessados.
Por seu turno, o art.º 47º, n.º 1, alínea a), do D.L. n.º 328/93, de 25/9 (também na redação dada pelo D.L. n.º 240/96, de 14/12), estabelecia que as contribuições dos beneficiários do regime dos trabalhadores independentes eram devidas a partir do 1.º dia do 12.º mês seguinte ao do início da atividade, no caso do primeiro enquadramento no regime. Prevendo a alínea c) do n.º 1 do referido normativo que nos restantes casos as contribuições eram devidas a partir do 1.º dia do mês seguinte ao do início efetivo da atividade por conta própria. Resultando ainda do n.º 2 do citado art.º 47º que a obrigação de contribuir deixava de se verificar a partir do 1.º dia do mês seguinte àquele em que a atividade cessasse.
Extrai-se, assim, dos mencionados preceitos que, no caso de primeiro enquadramento no regime dos trabalhadores independentes, a obrigação contributiva ficava suspensa até ao 1.º dia do 12.º mês seguinte ao do início da atividade, ou seja, nos primeiros 12 meses do início da atividade, sendo que, nos restantes casos, a obrigação contributiva verificava-se logo a partir do mês seguinte ao do início da atividade.
Revertendo ao caso sub judice, ficou provado que a Oponente iniciou a sua atividade em 08/10/2002, cessando-a em 28/02/2003. Posteriormente, reiniciou a atividade em 02/10/2009, cessando-a novamente em 25/08/2010.
Donde resulta que a atividade iniciada em 08/10/2002 constitui o primeiro enquadramento da Oponente no regime dos trabalhadores independentes.
Ora, a este primeiro enquadramento no referido regime era aplicável o art.º 47º, n.º 1, alínea a), do D.L. n.º 328/93, de 25/9, que previa que as contribuições do trabalhador independente eram devidas a partir do 1.º dia do 12.º mês seguinte ao do início da atividade.
Sucede que a Oponente reiniciou a atividade em 02/10/2009, o que já não pode ser considerado como o primeiro enquadramento no regime dos trabalhadores independentes, na medida em que já tinha estado enquadrada nesse regime nos anos de 2002 e 2003. Assim, face ao reinício da atividade, as contribuições da Oponente como trabalhadora independente eram devidas a partir do 1.º dia do mês seguinte ao daquele reinício e até ao mês da cessação de atividade (cfr. art.º 47º, n.º 1, alínea c) e n.º 2, do D.L. n.º 328/93, de 25/9).
Estamos, então, em condições de concluir que a Oponente não estava dispensada do pagamento das contribuições de trabalhador independente dos períodos de 2010/01 a 2010/08, sendo estas devidas, o que determina a improcedência da oposição. (…)”
A Recorrente começa por solicitar um aditamento à decisão da matéria de facto, por forma a verter nos factos provados que a data de início da actividade como trabalhadora independente é 02/10/2009. Para tanto, alega constar dos autos a comunicação promovida pelo Director da Segurança Social do Porto – Centro Distrital, comunicação do registo de actividade como trabalhadora independente, datada de 2009-11-06. No verso da referida comunicação consta “Extracto da Informação Registada no Sistema de Informação da Segurança Social” onde, para além da identificação da ora recorrente, é feito constar “Data de início de actividade 2009-10-02”. Acentuou a Recorrente não ter sido posto em causa o conteúdo constante da referida comunicação, nem ter sido revogada ou alterada, vindo a confiar na mesma para efeitos da gestão dos seus interesses laborais.
Ora, compulsados os documentos ínsitos nos autos, verifica-se existirem outros elementos também suportados por vários “print screen”, referentes a informações registadas no sistema de informação da Segurança Social. Referimo-nos, designadamente, ao resultado de uma pesquisa informática relativa aos registos referentes à Recorrente nos diversos regimes contributivos – cfr. fls. 81 do processo virtual consultado no SITAF. De facto, aí podemos observar, além do mais (pois também consta registo no regime dos trabalhadores por conta de outrem, por exemplo, em 28/08/2010), que a Recorrente esteve inscrita no regime dos trabalhadores independentes em 01/11/2002 (registada a data de fim em 28/02/2003) e em 01/11/2009 (registada a data de fim do regime em 25/08/2010).
Nesta conformidade, julgamos não se apresentar ajustado aditar a matéria peticionada pela Recorrente, por poder configurar uma visão parcelar dos regimes contributivos em que a Recorrente já esteve inscrita.
Não questionamos, como alerta a Recorrente na conclusão 5 das alegações do recurso, que o enquadramento e a inscrição dos trabalhadores independentes competem aos centros regionais de segurança social em cuja área territorial se situe a residência do trabalhador, sem prejuízo do estatuído quanto ao âmbito pessoal de caixas sindicais de previdência – cfr. artigo 27.º (Instituições competentes) do D.L. n.º 328/93, de 25/09, com as alterações aplicáveis à data.
Contudo, é nossa convicção que a matéria de facto seleccionada no probatório se mostra suficiente para o devido enquadramento jurídico, sem condicionar, desde logo, o desfecho da causa – cfr. os pontos A, B, C e D da decisão da matéria de facto.
Nas conclusões 6 e 7 das alegações do recurso, a Recorrente pretende insistir na ideia de que o início de actividade em 02/10/2009 corresponde ao primeiro enquadramento da Recorrente no regime dos trabalhadores independentes, dado que os cerca de 4 meses de actividade em 2002/2003 e o respectivo enquadramento não produziram qualquer efeito.
Todavia, o que releva é o impulso da trabalhadora (enquanto trabalhadora independente), que se mostra vertido nos pontos A a D do probatório:
A) A Oponente apresentou junto do Serviço de Finanças de Gondomar 2 uma declaração de início de actividade onde indicou como data de início da actividade (no CAE 93050) o dia 08/10/2002 – cfr. fls. 37 a 40 da cópia do processo de execução fiscal (PEF) n.º 1302201100432890 apensa aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
B) A Oponente apresentou junto do Serviço de Finanças de Gondomar 2 uma declaração de cessação de actividade, indicando como data de cessação em sede de IVA e IRS o dia 28/02/2003 – cfr. fls. 41 e 42 da cópia do PEF apensa aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
C) A Oponente apresentou junto do Serviço de Finanças de Gondomar 2 uma declaração de reinício de actividade em 02/10/2009 – cfr. fls. 43 a 46 da cópia do PEF apensa aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
D) A Oponente apresentou junto do Serviço de Finanças de Gondomar 2 uma declaração de cessação de actividade, indicando como data de cessação em sede de IVA e IRS o dia 25/08/2010 – cfr. fls. 47 e 48 da cópia do PEF apensa aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
De seguida, esta informação é partilhada com os centros regionais de segurança social respectivos, que procedem ao enquadramento e à inscrição dos trabalhadores independentes.
Porém, não obstante estas datas, o acto de enquadramento praticado e o momento em que a Segurança Social considera inscrito determinado trabalhador independente no respectivo regime contributivo, é o artigo 28.º do D.L. n.º 328/93, de 25/09, na redacção aplicável à data, que regula a respectiva produção de efeitos:
1 - O enquadramento no regime dos trabalhadores independentes reporta-se, na falta de disposição especial, ao dia 1 do mês seguinte àquele em que tiver início o exercício de actividade por conta própria.
2 - O enquadramento dos trabalhadores abrangidos pelo n.º 4 do artigo 6.º reporta-se ao dia 1 do mês seguinte ao da data da entrada do requerimento.
3 - O primeiro enquadramento no regime dos trabalhadores independentes e a vinculação dele decorrente, se for caso disso, reportam-se ao dia 1 do 12.º mês seguinte ao do início da actividade, sem prejuízo de o mesmo poder ter lugar, anteriormente, a requerimento dos interessados, caso em que os efeitos se referem ao dia 1 do mês seguinte ao da apresentação do requerimento.
4 - No caso de o requerimento ser apresentado por cônjuge abrangido pela alínea c) do n.º 1 do artigo 6.º, o deferimento do mesmo depende de prévio enquadramento do trabalhador independente.
Efectivamente, recordamos, a Recorrente insurge-se contra a sentença recorrida por esta ter considerado um primeiro início de actividade em 08/10/2002 como primeiro enquadramento, pelo que o reinício de actividade em 02/10/2009 já seria um segundo enquadramento no regime contributivo dos trabalhadores independentes. Não se conforma, por entender que essa primeira inscrição não chegou a produzir efeitos enquanto enquadramento, na medida em que a respectiva actividade cessou cerca de quatro meses após o seu início.
Ora, o artigo 28.º, n.º 3 transcrito supra espelha que esta interpretação não tem respaldo na lei, dado que o primeiro enquadramento no regime dos trabalhadores independentes e a vinculação dele decorrente, se for caso disso, produzem efeitos no dia 1 do 12.º mês seguinte ao do início da actividade.
Nem poderia ser outra a interpretação da norma, pois, caso contrário, poderíamos ser confrontados com sucessivas cessações de actividade antes do 12.º mês seguinte ao do início da actividade, sem que nunca estivéssemos perante um primeiro enquadramento no respectivo regime contributivo, beneficiando repetidamente da isenção da obrigação de contribuir.
É nossa convicção não ter sido esta a intenção do legislador, tanto mais que a norma do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social que sucedeu a este artigo 28.º, mas que não é aplicável ao caso em análise, uma vez que somente entrou em vigor em 01/01/2011 O D.L. n.º 328/93, de 25/9, foi revogado pela Lei n.º 110/2009, de 16/9, entrada em vigor em 01/01/2011 (cfr. Lei n.º 119/2009, de 30/12), que aprovou o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.
, previu expressamente uma solução para as situações de cessação da actividade na pendência dos 12 meses, desde que o reinício da actividade ocorra nos 12 meses seguintes à cessação (o que, de todo o modo, também não se enquadraria no nosso caso – o reinício deu-se mais de seis anos após a cessação):
Artigo 145.º (Produção de efeitos)
1 - No caso de primeiro enquadramento no regime dos trabalhadores independentes, este só produz efeitos no primeiro dia do 12.º mês posterior ao do início de actividade.
2 - (Revogado.)
3 - No caso de reinício de actividade, o enquadramento produz efeitos no 1.º dia do mês do reinício.
4 - Em caso de cessação de actividade no decurso dos primeiros 12 meses, a contagem do prazo previsto no n.º 1 é suspensa, continuando a partir do 1.º dia do mês do reinício da actividade, caso este ocorra nos 12 meses seguintes à cessação.
5 - (Revogado.)
6 - No caso de requerimento apresentado por cônjuge de trabalhador independente, o enquadramento produz efeitos no mês seguinte ao da apresentação do requerimento, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
7 - A produção de efeitos do enquadramento previsto no número anterior depende da prévia produção de efeitos do enquadramento do trabalhador independente.
Nesta conformidade, a discordância da Recorrente não tem suporte legal, devendo entender-se que o primeiro enquadramento no regime dos trabalhadores independentes e a vinculação dele decorrente produzem efeitos no dia 1 do 12.º mês seguinte ao do início da actividade. Logo, à actividade mencionada nos pontos A e B do probatório corresponderá um primeiro enquadramento da Recorrente no regime contributivo dos trabalhadores independentes, falecendo, portanto, as conclusões 1.ª a 7.ª das alegações do recurso.
Nestes termos, as contribuições em apreço da beneficiária deste regime são devidas a partir do 1.º dia do mês seguinte ao do início efectivo da actividade por conta própria, dado que, como vimos, não está em causa o primeiro enquadramento no regime, conforme decidido pelo tribunal recorrido – cfr. artigo 47.º, n.º 1, alínea c) do D.L. n.º 328/93, de 25/09.
Note-se que a tese da Recorrente enferma, ela própria, de alguma obscuridade, uma vez que se tudo ocorresse como pretende convencer neste recurso, então também o reinício de actividade em 02/10/2009 ainda não equivaleria ao seu primeiro enquadramento, pois cessou actividade em 25/08/2010, antes da suposta produção de efeitos. Salientamos que, na conclusão 7.ª, a Recorrente assume expressamente este início de actividade como primeiro enquadramento.
Concluímos, portanto, dever improceder também a conclusão 9.ª, na medida em que não foram violados, por errada interpretação, os artigos 27.º e 28.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro.
Resta-nos a conclusão 8.ª das alegações do recurso, afirmando a Recorrente que a reclamação apresentada não é facto novo, nem ampliação do pedido.
Efectivamente, a Recorrente havia sustentando, nas alegações escritas apresentadas no âmbito do artigo 120.º do CPPT ex vi artigo 211.º, que a decisão de não aceitação da reclamação apresentada junto da Segurança Social é nula por não estar minimamente fundamentada. Tendo o tribunal recorrido decidido o seguinte:
“(…) Atentemos, agora, na viabilidade do conhecimento da questão suscitada, ex novo, em sede de alegações. Alegou a Oponente a nulidade da decisão de não aceitação da reclamação que apresentou junto da Segurança Social, por não estar fundamentada.
Ora, de acordo com o disposto no art.º 260º do CPC, aplicável ex vi art.º 2º, alínea e), do CPPT, após a citação do réu a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei.
Estabelecendo o art.º 265º, n.º 1, do CPC, que na falta de acordo (que é o caso dos autos) a causa de pedir só pode ser alterada ou ampliada em consequência de confissão feita pelo réu e aceite pelo autor.
No caso vertente, a Oponente veio, em sede de alegações, invocar um novo fundamento para a procedência da oposição, que não havia sido suscitado na petição inicial, configurando tal atuação uma ampliação da causa de pedir.
Considerando que essa ampliação não é consequência de confissão feita pelo IGFSS, terá de concluir-se pela sua inadmissibilidade.
Consequentemente, tal fundamento não será de atender. (…)”
A Recorrente insurge contra o assim decidido, pugnando que a questão da ausência de fundamentação da decisão de não aceitação da reclamação e respectiva nulidade não é facto novo. Para sustentar a sua alegação, lembra ter aludido, na petição inicial da Oposição, no seu artigo 6.º, à existência dessa reclamação, sendo que também na contestação, no artigo 6.º, se dá nota da referida reclamação. Acrescenta terem-se juntado cópias também da “petição de reclamação sob a forma de impugnação, art.º 276 do C.P.P.T.”, que foram anexadas aos presentes autos.
Com efeito, existe menção e cópia da dita reclamação (bem como da reclamação do acto de não aceitação da mesma) nos presentes autos, e, portanto, a sua existência não é um facto novo, nem é disso que se trata.
Em sede de alegações, a Oponente invocou um novo fundamento tendo em vista a procedência da oposição, que não havia sido suscitado na petição inicial, configurando tal comportamento uma ampliação da causa de pedir (dado que o pedido se mantém – a extinção do processo de execução fiscal), sendo esse novo fundamento a imputação de falta de fundamentação do acto de não aceitação da reclamação.
Ora, na presente petição de oposição deduzida em 12/08/2011 alude-se à reclamação apresentada em 01/08/2011, mas não se imputa qualquer vício à respectiva decisão, que, conforme resulta dos autos, somente veio a ser proferida e comunicada em 06/12/2011.
Salientamos que as alegações proferidas no âmbito do artigo 120.º ex vi artigo 211.º, ambos do CPPT, se destinam à apreciação da matéria de facto e discussão das questões jurídicas que são objecto do processo, podendo, designadamente, ser aproveitadas para contrariar a posição assumida pela contra parte ao pronunciar-se sobre a petição de oposição.
Nas alegações, em regra, apenas é admissível a apreciação crítica das provas e a discussão das questões de direito suscitadas na petição inicial, não sendo possível utilizá-las para invocar novos factos ou suscitar novas questões de ilegalidade Recordamos o acerto da nota prévia constante da sentença recorrida: no caso das contribuições para a segurança social a lei permite a extracção de certidões de dívida perante a mera constatação de omissão de um pagamento, sem que haja um acto administrativo ou tributário prévio definidor da obrigação, motivo pelo qual a jurisprudência tem vindo a afirmar que a extracção do título executivo integra o acto de liquidação para os efeitos previstos na alínea h) do n.º 1 do art.º 204º do CPPT, uma vez que será em sede de oposição à execução que o contribuinte poderá questionar a legalidade das contribuições..
Assim, só relativamente a questões de conhecimento oficioso ou quando surjam factos subjectivamente supervenientes que proporcionem à parte a tomada de conhecimento de vícios de que não podia ter conhecimento no momento da apresentação da petição, será permitido invocar novos factos ou suscitar novas questões de legalidade do acto em crise, designadamente imputar-lhe novos vícios – cfr. Jorge Lopes de Sousa in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, volume I, 2006, Areal Editora, páginas 858 e 859.
Após a citação no âmbito do processo de execução fiscal, em 14/07/2011, a aqui Recorrente deduziu reclamação contra as dívidas de contribuições à Segurança Social, em 01/08/2011, pedindo a sua anulação por as contribuições não serem devidas. Por carta registada em 06/12/2011, foi comunicado pelo Instituto da Segurança Social, I.P. que a referida reclamação não foi aceite. É com este acto que a ora Recorrente não se conforma, por não lhe ter sido comunicado qualquer fundamento para esta decisão, tendo, por isso, em 16/01/2012, apresentado petição de reclamação versando este acto de rejeição/indeferimento, nos termos do artigo 276.º e seguintes do CPPT – cfr. elementos remetidos pelo órgão de execução fiscal para tribunal com a presente oposição.
Com efeito, conforme decorre da decisão da matéria de facto, a petição de oposição foi deduzida em 12/08/2011 – cfr. ponto G do probatório – logo, nessa data, a Recorrente ainda não tinha conhecimento do acto que não aceitou a reclamação apresentada em 01/08/2011.
Não residem dúvidas que estamos perante factos que surgiram supervenientemente à petição de oposição, pelo que, numa abordagem mais perfunctória, poderíamos equacionar a apreciação do vício apontado de que a Recorrente não podia ter tido conhecimento no momento da apresentação da petição de oposição. Todavia, não podemos esquecer que nos presentes autos de oposição está em análise a legalidade de dívidas de contribuições à Segurança Social, tendo em vista a extinção do processo de execução fiscal (pedido), por tais contribuições eventualmente não serem devidas (causa de pedir).
Queremos com isto significar não ser objecto da presente oposição nem o acto que não aceitou a reclamação nem os vícios próprios que lhe são imputados, tanto mais que esse acto somente foi proferido posteriormente (comunicação enviada em 06/12/2011) pelo órgão de execução fiscal e já se mostra adequadamente impugnado através da petição de reclamação apresentada nos termos do artigo 276.º e seguintes do CPPT em 16/01/2012. Além do mais, a eventual verificação do vício de falta de fundamentação apenas teria aptidão para eliminar o acto de não-aceitação da reclamação da ordem jurídica, não se mostrando adequada para produzir o efeito jurídico pretendido de extinção da execução fiscal. Logo, nesta parte, sempre a oposição teria que ser julgada improcedente.
Assim, o vício de falta de fundamentação imputado ao acto decisório da reclamação já se mostra invocado nessa reclamação do acto do órgão de execução fiscal, não tendo sido, em rigor, suscitadas novas questões de legalidade do acto de liquidação referente às dívidas exequendas nas alegações, dado que o vício novo não se reporta à legalidade das dívidas, mas antes se mostra imputado a outro acto proferido em Dezembro de 2011, como julgamos ter deixado claro.
Uma vez que a reclamação apresentada em Janeiro de 2012 não se fundamentou em prejuízo irreparável, o tribunal somente conhecerá da mesma quando o processo lhe for remetido a final – cfr. artigo 278.º, n.º 1 e n.º 3 do CPPT.
Pelas razões que agora apontamos, estava vedado ao tribunal recorrido conhecer do vício de falta de fundamentação, suscitado nas alegações da oposição judicial, imputado ao acto de não-aceitação da reclamação comunicado por carta registada em 06/12/2011, uma vez que, nesse âmbito, se mantém incólume o pedido de extinção da instância executiva, não podendo legalmente entender-se a introdução de tal questão como uma válida alteração à causa de pedir.
Nesta conformidade, e sem necessidade de ulteriores considerações, há que concluir pela total improcedência das conclusões da alegação de recurso, devendo manter-se a sentença na parte recorrida na ordem jurídica.



Conclusões/Sumário

I - O primeiro enquadramento no regime contributivo dos trabalhadores independentes e a vinculação dele decorrente, se for caso disso, produzem efeitos no dia 1 do 12.º mês seguinte ao do início da actividade – cfr. artigo 28.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25/9, na redacção aplicável à data.
II - No caso de reinício de actividade, o enquadramento produz efeitos no dia 1 do mês seguinte àquele em que tiver início o exercício de actividade por conta própria – cfr. artigo 28.º, n.º 1 do mesmo diploma.
III - Por via de regra, as contribuições para a Segurança Social resultam da apresentação das declarações de remunerações pelo contribuinte, a quem compete também proceder à liquidação dos montantes a entregar.
IV - Nessa situação, a lei permite a extracção de certidões de dívida perante a mera constatação de omissão de um pagamento, sem que haja um acto administrativo ou tributário prévio definidor da obrigação, devendo considerar-se que a extracção do título executivo integra o acto de liquidação para os efeitos previstos na alínea h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, uma vez que será em sede de oposição à execução fiscal que o contribuinte poderá questionar a legalidade do acto tributário.
V - Por esse motivo e atento o objecto da oposição judicial, não poderá ser conhecido acto diverso desse acto de liquidação nem proceder a oposição à execução fiscal instaurada, com fundamento em vício de falta de fundamentação imputado a esse outro acto proferido pelo órgão de execução fiscal de não-aceitação de reclamação quanto às mesmas dívidas exequendas de contribuições à Segurança Social.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.

Custas a cargo da Recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.

Porto, 16 de Dezembro de 2021

Ana Patrocínio
Paula Moura Teixeira
Conceição Soares
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i) O D.L. n.º 328/93, de 25/9, foi revogado pela Lei n.º 110/2009, de 16/9, entrada em vigor em 01/01/2011 (cfr. Lei n.º 119/2009, de 30/12), que aprovou o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.

ii) O D.L. n.º 328/93, de 25/9, foi revogado pela Lei n.º 110/2009, de 16/9, entrada em vigor em 01/01/2011 (cfr. Lei n.º 119/2009, de 30/12), que aprovou o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.

iii) Recordamos o acerto da nota prévia constante da sentença recorrida: no caso das contribuições para a segurança social a lei permite a extracção de certidões de dívida perante a mera constatação de omissão de um pagamento, sem que haja um acto administrativo ou tributário prévio definidor da obrigação, motivo pelo qual a jurisprudência tem vindo a afirmar que a extracção do título executivo integra o acto de liquidação para os efeitos previstos na alínea h) do n.º 1 do art.º 204º do CPPT, uma vez que será em sede de oposição à execução que o contribuinte poderá questionar a legalidade das contribuições.