Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00503/21.3BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/29/2022
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:SUSPENSÃO DA EFICÁCIA DE ACTO; ORDEM DE RESTITUIÇÃO DE UM TERRENO SITUADO EM RESERVA AGRÍCOLA NACIONAL;
PROVA TESTEMUNHAL; LEVANTAMENTO TOPOGRÁFICA; DOCUMENTO AUTÊNTICO - N.º2 DO ARTIGO 393º DO CÓDIGO CIVIL; ARTIGO 44º DO DECRETO – LEI Nº 73/2009, DE 31.03, NA REDACÇÃO DADA PELO DECRETO – LEI Nº 199/2015, DE 16.09
Sumário:1. Só será necessário, em providência cautelar, produzir prova testemunhal que, pela sua natureza, torna mais demorado o processo, se for de todo indispensável para um juízo meramente perfunctório sobre factos essenciais para a decisão cautelar. Sob pena de transformar o julgamento da matéria de facto do processo cautelar em julgamento da matéria de facto na acção principal.

2. O que é susceptível de prova por levantamento topográfico de entidades oficiais é insusceptível de prova testemunhal, de acordo com o disposto no n.º2 do artigo 393º do Código Civil.

3. Estando em causa execução pela requerente de um aterro que atinge 5000 m2 de solos situados em mancha da Reserva Agrícola Nacional, definida como tal por instrumento legal de ordenamento do território e que não permite, como tal, classificação diversa, até alteração desse instrumento, pelos meios legalmente previstos, aterro que se destinou a encobrir resíduos vários, como pedras, pedaços de betuminoso, pedaços de betão pertencentes a manilhas, pedaços de ferro semienterrados e pedaços de tubos de fibrocimento, é improvável o êxito da acção principal, pois à entidade requerida não restava outra solução legal que não fosse a tomada no acto suspendendo, face ao disposto no artigo 44º do Decreto – Lei nº 73/2009, de 31.03, na redacção dada pelo Decreto – Lei nº 199/2015, de 16.09, a ordenar a restituição da situação a momento anterior à prática da infracção.*
* Sumário elaborado pelo relator
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

JM----, S.A. veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra – U.O.1, de 01.01.2022, pela qual foi indeferida a providência cautelar interposta contra Direcção Regional da Agricultura e Pescas do Centro para a suspensão da eficácia do acto do Senhor Director Regional de Agricultura e Pescas do Centro, de 28.07.2021.

Invocou para tanto em síntese que a decisão recorrida padece de erro de julgamento de facto e de lapsos de escrita e, ao contrário do decidido, se verificam todos os pressupostos para ser decretada a suspensão da eficácia do acto em apreço; no mesmo articulado invocou a nulidade e, em todo o caso, o erro de julgamento do despacho prévio que dispensou a produção de prova testemunhal.

Defendeu também que deve ser mantido o valor fixado à providência no articulado inicial.

Foi proferido despacho de sustentação.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.
*
Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
*

I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

1 – Nos termos do artº 118 nº 3 do C.P.T.A o Juiz pode ordenar as diligências de prova que considere necessárias.

2 – Para o juízo de probabilidade de deferimento do pedido da acção principal impunha-se que as testemunhas indicadas fossem ouvidas à matéria constante dos artº 39 a 50º da petição inicial.

3 - Tudo para determinar a natureza agrícola do terreno invocada nos autos, e se o mesmo detinha aptidão agrícola, mesmo que estivesse integrado em RAN

4 – É que as testemunhas indicadas, conhecem a situação do terreno antes da utilização referida nos autos.

5 - O despacho de recusa da prova testemunhal, não indica nem fundamenta porque não é necessária aquela produção de prova testemunhal, pois também não se refere porque se entendeu como suficientes os documentos juntos aos autos.

6 – O despacho de indeferimento da prova testemunhal é nulo, face ao disposto no artº 20º da C.R.P e 615 nº 1 aliena b) e 201 do C.P.C, artº 90 nº 3, 118 nº 1 e 3 e 5 todos do C.P.T.A, e como tal deve ser declarado e substituído por outro que marque julgamento para inquirição de testemunhas com todas as legais consequências, nomeadamente para o de ser decretada a suspensão da eficácia do acto.

7 – O despacho sob impugnação contém em si manifesto erro de julgamento.

8 – A afirmativa do disposto no artº 32 nº 6 do C.P.T.A, deve ser entendida como reportada ao valor dos bens que se pretende conservar e não propriamente ao prejuízo sofrido pela A., na sequência do acto que se vem impugnar .

9 - Deve o valor da causa ser o correspondente ao da utilidade económica do processo, que no caso é apenas o da suspensão da eficácia do acto, que tem em si um valor indeterminável.

10 – Deve assim ser mantido o valor processual indicado de € 31.000,00, com as legais consequências.

11 – Para a boa decisão da causa deve ser aditado ao constante da alínea F, conforme Doc. Nº 6 o seguinte:

“aluga a empresa JM---- …. para a última utilizar como estaleiro, a fim de depositar exclusivamente, inertes, terras, contentores e demais materiais e equipamentos necessários á execução de uma empreitada”

“Compromete-se a não cortar qualquer arvoredo existente no terreno, e a fazer a limpeza do terreno no fim da conclusão da obra “

12 - A alínea F deve ser rectificada para 05/06/2019.

13 – A alínea M deve ser rectificada onde consta € 750,00, deve constar € 7.500,00, e devendo ser aditado que o processo de contra-ordenação Nº 74/R/2019, se mostra judicialmente impugnado, e em julgamento no Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra. (Processo actualmente suspenso).

14 – Tal julgamento de um ilícito de mera - ordenação social, impõe-se como subjacente à legalidade da actuação impugnada neste processo, a actuação da Administração – no chamado nos autos “Processo autónomo – visando obter decisão superior sobre eventual reposição dos solos.

15 – Por outro lado face à matéria alegada nos artº 40º - 41º da petição inicial – Doc. Nºs 11 a 15 devem ser julgados sumariamente provados os seguintes:

1 - Ora tal imóvel tanto é possível pesquisar, em matéria cartográfica, ao tempo dos factos ano de 2010, não passava de um terreno na área de implantação do estaleiro já referido, de um terreno pedregoso, sem qualquer área de cultivo, na zona adjacente à estrada nacional;
2 - Pois era um terreno rochoso, rebaixado de nascente para poente, com lotes de medição que acentuavam até ao meio do terreno a cerca de 5,78 m, e com abaixamento que começou em 1,8 m, 2,06m, 5,32 e 5,84 tudo conforme mapa referenciado do local e análise de técnico que que se juntam e dão por reproduzidos para os devidos e legais efeitos (Doc. Nº 11 a 15 )
3 - A área do local referenciada a vermelho apenas representa cerca de 15000 m2 daquele referido imóvel.
4 - E a hipotética área de Ran constitui a referenciada zona a azul desses mesmos documentos (Doc. Nº 14 e 15 )
5 - Resulta assim claro, que por parte da A., não foi utilizada área da RAN, porquanto o estaleiro, conforme demonstram os documentos estava implantado em zona que não constituía RAN (Doc. Nº 14)
6 - A A. apenas colocou no terreno na zona de rebaixamento, terras devidamente sereadas, resíduos sobrantes das obras, a pedido do proprietário, não RCD,
7 - Para beneficiação do imóvel identificado nos autos, que ficou mais arável do que anteriormente sucedia,
8 - E que consta da informação da ERRALVT o seguinte:
1- Prédio Rústico -“Terreno situado fora de um aglomerado urbano, que não se possa considerar como terreno de construção, e desde que tenha como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícola … “ – Artº 3º Dec. Lei 73/2009
2 – UNA – Utilização Não Agrícola de Solos – Afetação a outro fim,
3 – Classificação de Terras – Classe A O – Unidades de terra sem aptidão (inaptas) para uso agrícola - Classe E – Solos com capacidade de uso muito baixa.
4 – Áreas integradas a RAN – Integram a RAN as unidades de terras que apresentam elevada ou moderada aptidão para a actividade agrícola, correspondendo às Classes A1 e A2 previstos no artº 6º (Artº 8º - Dec. Lei 73/2009)
5 – Acções interditas: (Artº 21) – Acções que diminuam ou destruam potencialidades para o exercício da actividade agrícola das terras e dos solos da RAN E neste âmbito:
Todas as operações agrícolas necessitam de parecer da ERRALVT (órgão correspondente ao da requerida)
“Não. As operações agrícolas abaixo descritas, desde que não estejam sujeitas a licenciamento, apresentação de comunicação prévia ou autorização junto da Câmara Municipal e/ou de outra entidade, não carecem de parecer da Entidade Regional da Reserva Agrícola de Lisboa e Vale do Tejo (ERRALVT), no âmbito do Regime Jurídico da RAN, a saber:
a) realização de melhoramentos fundiários com vista à melhoria da capacidade produtiva dos solos (pressupõe a preservação ou melhoria das características agronómicas do solo e a salvaguarda dos riscos de erosão ou de encharcamento duradoiro – exceto arroz e agrião) na parcela objeto da intervenção:
- terraplenagens e nivelamentos, desde que efetuadas em zonas de várzea (declives entre 0% a 5%) e cuja finalidade seja a preparação do terreno para a atividade agrícola, designadamente, para redução de irregularidades no terreno com vista à redução de zonas de encharcamento ou para preparação do terreno para rega por escorrimento;
- obras de drenagem, incluindo abertura de valas, sem revestimento (exceto o vegetal) de taludes, e colocação de drenos subsuperficiais;
- muros de suporte para retenção de terras em que o aterro e/ou escavação é o estritamente indispensável para a implantação do muro;
b) desmatações, para preparação do terreno para sementeira ou plantação subsequente de culturas agrícolas ou para plantação de floresta de produção, de proteção ou de galerias ripícolas;
c) colocação de estufas (com pé direito até 2,5 m de altura) com cobertura em plástico e estrutura em metal, ou madeira, cravada diretamente no solo, para melhorar as condições de desenvolvimento vegetativo e de floração/frutificação das culturas efetuadas diretamente no solo, ou não o sendo, desde que não haja impermeabilização deste nem diminuição da sua capacidade produtiva;
d) execução de vedações em rede metálica ou plástica e estacas de madeira ou prumos de betão ou metálicos, cravados diretamente no solo, portanto sem recurso a quaisquer elementos de betão ou cimento de amarração ao solo, e desde que se destinem à vedação de uma parcela onde se desenvolva uma atividade agrícola ou à proteção de outros usos (edificações / atividades) legais ou com viabilidade atestada pela Câmara Municipal.”
In. Informação ERRALVT – (Entidade Reserva Agrícola de Lisboa e Vale do Tejo – A propósito da implementação do Regime – Dec. Lei 199/2015)

16 – Ora uma análise dos factos provados, não permite concluir nomeadamente o que consta dos pontos F e G, qualquer comportamento violador da requerente.

17- O que existe é tão só o auto de 5/06/2019, do técnico Engº. Américo Ferreira.

18 – Não consta que o aterro seja da autoria do recorrente, que o imóvel lhe pertença, apesar da utilização daquele local como estaleiro de obras há mais de dez anos.

19 – É nuclear saber se, qualquer acto ali praticado, o foi a mando do proprietário e sob suas ordens.

20 – E nesse quadro sempre se imporia determinar quem estava vinculado à obtenção de qualquer licenciamento, se o proprietário se o comissário, ou ambos.

21 – Importa sempre determinar, a ter existido movimentação de terras, se se trata de terreno, embora em RAN, sem aptidão Agrícola, e assim sem sujeição a qualquer licenciamento prévio.

22 – Face ao disposto no artº 44 do Dec. Lei 73/2009, não se demonstrando qualquer actuação passada ou presente da recorrente, sobre o imóvel carecia o Exmº Director Regional de qualquer legitimidade para notificar a recorrente, que nunca teve a posse do imóvel, nem ali executou ou executa presentemente por sua iniciativa própria acção violadora do regime RAN.

23 – O acto suspendendo, é assim ilegal, por ofensa ao disposto no artº 23 e 44 do Dec. Lei 73/2009 por estar assente em factos inverídicos e inexistentes, sendo nulo nos precisos termos do disposto no artº 161 nº 2 alínea j) do C.P.A .

24 – E a recorrente tem toda a possibilidade de provar a ilegalidade da actuação da Administração mostrando-se demonstrado o “fumus boni iuris” devendo assim ser decretada a providência requerida.

25- Qualquer pequena empresa, que na actualidade económica se veja, perante o dispêndio de montante forçado de € 238.500,00, constitui valor imensurável, que perante a experiência e o senso comum, é facto notório, não carecendo de alegação .

26- E não pode ser ignorado, justamente que a obtenção do deferimento junto dos tribunais para o ressarcimento do prejuízo sofrido, é processo que em execução de sentença, demorará ano ou anos a produzir os seus efeitos, e é assim também facto que não carece de alegação.

27 – Existe assim o requisito do periculum mora demonstrado, pois a produção de prejuízos de probabilidade decorre de um juízo de probabilidade e não de um juízo de certeza.

28 – Além disso a lei basta-se para a procedência da providência, com um juízo negativo de não – improbabilidade da procedência da acção principal, para fundamentar a concessão de uma previdência conservatória.

29 – A aliás douta sentença viola além do mais o disposto nos artº 112 nº 1 e 2, 120, 118 nº 3 e 5 , artº 31, 32 nº 6 todos do C.P.T.A, artº 306 do C.P.C, artº 23, e 44 do Dec.Lei 73/2009, e artº 161 aliena j) e artº 163 nº 1 do C.P.A
*
II – Questões prévias.

II.I – O valor da causa (conclusões 8 a 10).

Determina o n.º 6 do artigo 32º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos:

“O valor dos processos cautelares é determinado pelo valor do prejuízo que se quer evitar, dos bens que se querem conservar, ou da prestação pretendida a título provisório.”

E, como a própria Recorrente admite, o valor do prejuízo que se quer evitar na presente providência cautelar é o fixado como valor da providência.

Ora existindo norma especial para as providências cautelares nenhuma outra se aplica, designadamente uma qualquer das invocadas pela Recorrente.

Impõe-se por isso manter o valor fixado à providência pelo Tribunal recorrido.

II.II. O despacho que dispensou a produção de prova testemunhal (conclusões 1 a 7).

1. A nulidade do despacho. A falta de fundamentação.

Este é o teor do despacho que dispensou a prova testemunhal:

“As partes solicitaram a produção de prova testemunhal.

O n º 3 do artigo 118.º do CPTA, dispõe que “mediante despacho fundamentado, o juiz pode recusar a utilização de meios de prova quando considere assentes ou irrelevantes os factos sobre os quais eles recaem ou quando entenda que os mesmos são manifestamente dilatórios.”

No caso concreto, quer a requerente quer entidade requerida, fazem assentar a factualidade alegada na prova documental oferecida, elementos estes que se afiguram bastantes para a apreciação da pretensão deduzida na presente ação, tanto mais que, cumpre recordar, nos encontramos em sede cautelar, onde se exige uma sumario cognitio, diferentemente do que se passará em sede de ação principal.

Cabendo às requerentes alegar e oferecer prova sumária dos factos em que assenta a verificação dos pressupostos em causa, sem que o tribunal se possa substituir à mesma, entendesse que não se afigura necessária a produção de prova testemunhal, na medida em que se mostram suficientes, para a tomada de decisão final, os documentos juntos e a posição assumida pelas partes em sede de articulados, atentos os factos alegados, o objeto do processo cautelar e a sumariedade que ao mesmo subjaz. Não se deixe de referir que a prova da situação financeira da requerente sempre terá de passar pela prova através de documentos contabilísticos, cuja junção é feita pela mesma, não se afigurando ser bastante, neste ponto, a produção de prova testemunhal.

Assim, indeferem-se os requerimentos de prova testemunhal, por se mostrar desnecessária a produção da aludida prova (Cfr. artigo 118.º, n.º1 do CPTA).”

Apenas padece de nulidade a sentença que careça, em absoluto, de fundamentação de facto ou de direito; a simples deficiência, mediocridade ou erro de fundamentação afecta o valor doutrinal da decisão que, por isso, poderá ser revogada ou alterada, mas não produz nulidade (artigos 613º, n.º3, e 615º, n.º1, al. b), do Código de Processo Civil de 2013; Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984 (reimpressão), p.140; acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 11.9.2007, recurso 059/07

Verifica-se, portanto, que o despacho recorrido contém um mínimo – o suficiente – de fundamentação, pelo que não se lhe pode imputar nulidade.

Ainda que assim não se entendesse, o despacho de sustentação sempre teria desvanecido qualquer dúvida, sobre a razão de ser da dispensa da prova testemunhal:

“Entende a recorrente que se impunha a produção de prova testemunhal em face da alegação de "não existência de solo agrícola, por ser um buraco em declive, e assim não se trata de solo RAN suscetível de obtenção de qualquer parecer prévio".

Sucede porém, que a classificação do referido solo como RAN ou não, não está dependente da posição dos referidos residentes no local ou técnicos que hajam atuado na obra, resultando ao invés da classificação constante das plantas de condicionantes do local. No limite, se havia dúvidas sobre a inserção do prédio em causa em área RAN, deveria ser produzida prova pericial sobre tal facto, a qual se encontra vedada em sede cautelar, ou prova documental - levantamento topográfico ou outra peça desenhada”.

Não se verifica, portanto, a nulidade deste despacho.

2. O acerto do despacho.

Só será necessário, em providência cautelar, produzir prova testemunhal que, pela sua natureza, torna mais demorado o processo, se for de todo indispensável para um juízo meramente perfunctório sobre factos essenciais para a decisão cautelar.

Sob pena de transformar o julgamento da matéria de facto do processo cautelar em julgamento da matéria de facto na acção principal.

No caso e como indicou o Tribunal recorrido, a prova do facto indicado pela Recorrente poderia ser provado por documento, o levantamento topográfico ou outra peça desenhada.

O que é susceptível de prova por levantamento topográfico de entidades oficiais é, de resto, insusceptível de prova testemunhal, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 393º do Código Civil:

“Também não é admitida prova por testemunhas, quando o facto estiver plenamente provado por documento ou por outro meio com força probatória plena”.

Para além do que constasse do documento apenas poderia resultar de depoimento de pessoa com conhecimento especiais, ou seja, por prova pericial, incompatível com a sumariedade das providências cautelares.

Termos em que improcede o recurso no que diz respeito a este despacho prévio.

III –Matéria de facto (conclusões 11 a 21).

O que a Recorrente pretende aditar à alínea F), com a qual nada tem a ver, consta da alínea B) dos factos provados na decisão recorrida. Pelo que nada há a aditar neste ponto. Deverá, no entanto, corrigir-se aí o evidente lapso de escrita, substituindo a data “05.06.2016” pela data “05.06.2019”.

Assim como o manifesto lapso de escrita constante da alínea M), substituindo-se o valor de 750€00 por 7.500€00. Na verdade, aquele valor menor foi o valor da coima aplicada à anterior proprietária e não à ora Requerente, como consta do artigo 42.º da oposição apresentada pela Entidade Pública requerida.

Quanto aos factos a que alude a conclusão 15 também nada se impõe aditar.

A questão da prática de uma contra-ordenação não pode aqui ser apreciada sequer a título incidental, porque não se compadece esse conhecimento com a natureza sumária da presente providência, por um lado, e porque, por outro lado, o que interessa para a presente providência e em particular para a verificação, ou não, do requisito da aparência do bom direito, está já fixado na matéria de facto constante da decisão recorrida.

Isto sendo certo que dos documentos para que remete o Requerente – 11 a 15 da petição inicial – documentos autênticos que, como tal, nem sequer admitiriam prova testemunhal em contrário (n.º2 do artigo 393º do Código Civil), resulta precisamente o contrário, em termos factuais, daquilo que invoca e confirmam-se os pressupostos de facto do acto suspendendo.

Em particular confrontando o ortofotomapa junto como documento n.º 11 da petição inicial com o ortofotomapa junto como documento n.º 14 do mesmo articulado verifica-se que:

“No local assinalado na planta de localização anexa ao presente auto verificou-se a existência de modelação de terrenos com recurso a aterro com solos com características diversas.

O aterro executado em solo da RAN … soterrando por completo o tronco de uma das oliveiras existentes no terreno”.

Quanto ao mais trata-se apenas de matéria de direito, conclusões e apreciações jurídicas da matéria de facto indiciária relevante, a ficou fixada na decisão recorrida.

Também nesta parte se impõe não alterar o julgamento, sumário, da matéria de facto.

Quanto ao facto de ser a Requerente a responsável pelo aterro aqui em causa, para além de ter sido admitido pela própria (veja-se artigos 28º a 31º da oposição da Entidade Pública requerida e processo instrutor) retira-se por ilação natural de dois factos provados e não postos em causa: 1º a Requerente arrendou o prédio em causa para “utilizar como estaleiro a fim de depositar exclusivamente inertes, terras, contentores e demais materiais e equipamentos necessários à execução de uma empreitada de águas e saneamento (facto provado sob a alínea B)) e 2º - nos termos deste contrato de empreitada a Requerente assumiu este encargo: “Os materiais sobrantes provenientes das escavações, limpezas, desmatações, remoções de vegetação, demolições e entulhos devem ser depositados em locais devidamente licenciados, de acordo com o Regulamento Sobre Remoção de Entulhos no Município (…), edital nº 60/1995, e demais Legislação aplicável. A obtenção dos vazadouros necessários será da responsabilidade do Empreiteiro independentemente da distância ao local da obra. Terá também de ser cumprido o plano de prevenção e gestão de resíduos de construção apresentado (facto provado sob a alínea K).

Não é plausível, perante estes factos, ao menos em termos perfuntórios, que tivesse sido terceiro a proceder ao ilegal a erro e movimentação de terras.

Tudo aponta, pelo contrário, para a responsabilidade directa da Requerente.

E não se mostra plausível que tivesse chegado ao seu termo o processo de contra-ordenação, depois de garantido o direito de defesa, com equívoco sobre a pessoa responsável pelo aterro.

Deveremos assim dar como indiciariamente provados os seguintes factos, contantes da decisão recorrida, com as rectificações acima assinaladas.

A) Em 08.09.2009, foi celebrado entre a Requerente e as Águas de (…) – E.M., contrato de empreitada de “Saneamento básico da freguesia(s) de (…)” (Cfr. documento nº 3, junto com o requerimento inicial.

B) Em 21.09.2009, foi celebrado entre a Requerente e OC..., contrato de arrendamento de “… terreno situado na Portela (…), inscrito na matriz predial rústica sob o nº 2746 da freguesia de (…), para a última utilizar como estaleiro a fim de depositar exclusivamente inertes, terras, contentores e demais materiais e equipamentos necessários à execução de uma empreitada de águas e saneamento…. O período de tempo previsto para a utilização do terreno é 21 meses, com início a 21 de Setembro de 2009, e término a 21 de Julho de 2011...” (cfr. documento nº 6, junto com o requerimento inicial).

C) Decorre do referido contrato que a Requerente, “… compromete-se a não cortar qualquer arvoredo existente no terreno e a fazer a limpeza do terreno no fim da conclusão da obra” (Cfr. doc. nº 6, junto com o requerimento inicial).

D) Em 16.03.2012, foi elaborado auto de recepção provisória total da empreitada acima identificada (cfr. processo de reposição nº 74R/2019, fls. 53).

E) Por escritura pública lavrada na 2ª Conservatória do Registo Predial de (…), outorgada em 19.01.2017, o Contrainteressado adquiriu, pelo preço de 85.000€00 (oitenta e cinco mil euros), o prédio rústico, composto de terra de cultivo com olival, pinhal e mato, sito na Vale (…), descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial (…) sob o nº 4470 e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 2746 (cfr. doc. nº 4, junto com o requerimento inicial).

F) No dia 05.06.2019 e na sequência de denúncia por parte do Contrainteressado, relativa a eventual irregularidade cometida em solo da RAN, o técnico superior da Requerida, Engº AF..., deslocou-se ao prédio identificado no ponto anterior (cfr. Processo de Reposição nº 74R/2019, fls.4).

G) Nesse seguimento, foi lavrado Auto de Notícia nº 36/RAN/2019 de onde é possível extrair:

“Data: 5 de junho de 2019; horas 16h30m
No local assinalado na planta de localização anexa ao presente auto verificou-se a existência de modelação de terrenos com recurso a aterro com solos com características diversas.
No aterro efectuado foi possível verificar a existência de resíduos vários, como pedras, pedaços de betuminoso, pedaços de betão pertencentes a manilhas, pedaços de ferro semi-enterrados, e pedaços de tubos de fibrocimento, materiais que degradam o solo.
O aterro executado em solo da RAN atinge nalguns locais uma altura bem superior a 2 metros, soterrando por completo o tronco de uma das oliveiras existentes no terreno.
O local foi utilizado pela primeira arguida (Requerente da presente providência cautelar) como estaleiro de obras para a execução da empreitada “Saneamento Básico da Freguesia de (...)
– 3ª fase”, em que foi dona da obra a quarta arguida.
A deposição de aterros com as características do ali depositado constitui uma ação interdita, nos termos do artigo 21º do regime jurídico da RAN.
Apesar da intervenção em causa atingir uma área sujeita ao regime jurídico da Reserva Agrícola Nacional que se cifra em 5000 m2, não foi requerido o necessário parecer prévio, quer para a deposição de aterros e modelação do terreno, quer para a instalação do estaleiro temporário para a execução da empreitada acima referida.
Dada a alteração significativa do relevo natural do terreno, não é possível fazer a sua caracterização. Os solos do local têm textura média a pesada e aparentam possuir produtividade agrícola mediana.”
(Cfr. Processo de Reposição nº 74R/2019, fls. 5 a 13).

H) Em 03.01.2018, foi elaborado auto de recepção definitiva relativo à empreitada acima identificada (cfr. Processo de Reposição nº 74R/2019, fls. 54).

I) No dia 12.01.2021, foi efectuada nova visita ao local a fim de aferir da situação actual do terreno, tendo-se concluído que se mantinha a situação descrita no auto de notícia nº 36/RAN/2019 (cfr. Processo de Reposição nº 74R/2019, fls. 18 a 20).

J) Nas Condições Técnicas Gerais do Caderno de Encargos relativo à empreitada supra identificada em 1 consta, de entre o mais, o seguinte:

“Cláusula 6º Preparação e planeamento da execução da obra 1 - O empreiteiro é responsável:
alínea a) Perante o dono da obra pela preparação, planeamento e coordenação de todos os trabalhos da empreitada, ainda que em caso de subcontratação, bem como pela preparação, planeamento e execução dos trabalhos necessários à aplicação, em geral, de normas sobre segurança, higiene e saúde no trabalho vigentes e, em particular, das medidas consignadas no plano de segurança e saúde, e no plano de prevenção e gestão de resíduos de construção e demolição; (…)
3 – O empreiteiro realiza, à sua custa (exceto os trabalhos referidos na alínea a) que são da responsabilidade do dono da obra e que constituirão um preço contratual unitário), todos os trabalhos que, por natureza, por exigência legal ou segundo o uso corrente, sejam considerados como preparatórios ou acessórios à execução da obra, designadamente:
alínea f) O transporte e remoção, para fora do local da obra ou para locais especificamente indicados neste Caderno de Encargos, dos produtos de escavação ou resíduos de limpeza;
(…)
Cláusula 47º Aspetos Ambientais
(…)
3 - Os resíduos produzidos no âmbito da obra (materiais sobrantes das escavações e/ou demolições, embalagens, etc.) deverão ser conduzidos pelo empreiteiro, a cargo deste, para depósitos adequados e que respeitem integralmente as exigências decorrentes da legislação ambiental a esse nível. O processo de seleção dos vazadouros/destino final a utilizar carece de análise por parte do dono da obra, pelo que determinado depósito só poderá ser utilizado após aprovação para fiscalização.”.
(Cfr. fls. 465 a 494 do suporte eletrónico do processo).

K) Nas Condições Técnicas Especiais do Caderno de Encargos relativo à mesma empreitada prevê, além do mais, na sua cláusula 6ª, o seguinte:

“6 ESTALEIRO
(…)
6.1 Disposições gerais:
A localização do estaleiro e a obtenção dos terrenos a ocupar são da responsabilidade do Empreiteiro.
O Empreiteiro deverá apresentar à aprovação do Dono da Obra o projeto de estaleiro antes da sua implementação.
(…)
Após a conclusão da obra, o Empreiteiro deverá demolir as instalações, obras e vedações provisórias e os seus restos serão removidos e depositados em locais que respeitem a legislação em vigor. As zonas de realização dos trabalhos devem ficar perfeitamente limpas e regularizadas.
Todas as operações indicadas nas alíneas anteriores são da responsabilidade e por conta do
Empreiteiro. (…)
6.5. Ambiente do Estaleiro
6.5.1. Limpeza
O estaleiro deve ser mantido limpo e arrumado. A remoção de entulho e outros materiais relacionados com a obra é da responsabilidade do Empreiteiro, que deverá informar, para o efeito, o Dono da Obra sobre os locais de depósito e legalidade da operação.
(…)
A remoção de entulho e outros materiais para vazadouro deverá ser feita regularmente para evitar a sua aglomeração no estaleiro.
No final da obra, os locais utilizados pelo Empreiteiro como apoio à sua obra têm que ficar livres de quaisquer instalações, equipamentos, materiais ou resíduos de qualquer espécie, devendo o Empreiteiro retirá-los logo que se tornem definitivamente desnecessários. Estes locais (estaleiros, acessos temporários e actividades de construção) deverão ser recuperados e integrados paisagisticamente após a realização das obras.
(…)
6.5.3. Poluição
(…)
Todo e qualquer resíduo deve ser encaminhado para os locais de recolha adequados.
(…)
10 VAZADOUROS
10.1 Os materiais sobrantes provenientes das escavações, limpezas, desmatações, remoções de vegetação, demolições e entulhos devem ser depositados em locais devidamente licenciados, de acordo com o Regulamento Sobre Remoção de Entulhos no Município de Coimbra, edital nº 60/1995, e demais Legislação aplicável. A obtenção dos vazadouros necessários será da responsabilidade do Empreiteiro independentemente da distância ao local da obra. Terá também de ser cumprido o plano de prevenção e gestão de resíduos de construção apresentado.
(…)
18 OUTROS ENCARGOS DO EMPREITEIRO
18.1 Salvo disposição em contrário deste Caderno de Encargos, correrão por conta do empreiteiro, que se considerará, para o efeito, o único responsável:
(…) alínea e) Todas as operações de limpeza final da obra;”
(Cfr. fls. 498 a 535 do suporte eletrónico do processo).

L) Por despacho de 05.07.2019 foi mandado instaurar processo de contraordenação contra JM----, S.A., OC... e MG--- e Águas (…), E.M. (processo de contraordenação nº 74/2019), bem como mandado elaborar processo autónomo visando obter decisão superior sobre a eventual reposição dos solos RAN (processo de reposição nº 74R/2019) (Cfr. Processo de Reposição nº 74R/2019, folhas 3).

M) No âmbito do processo de contraordenação nº 74/2019, foi elaborada a seguinte proposta de decisão final:

“3.2.3. Mais proponho que o Senhor Director Regional de Agricultura e Pescas do Centro, ao abrigo do disposto no artigo 54º, nº 2 do RGCO, condene: a- a arguida JM----, S.A., como co-autora material e imediata, sob a forma consumada, pela prática, com negligência, da contraordenação por utilização não agrícola de área integrada na RAN sem parecer prévio favorável da ERRANC, prevista e punida no artigo 39º, nº 1, alínea a) e nºs 2 e 4 do Decreto – Lei nº 73/2009, de 31 de março, aplicando-lhe uma coima de 7.500€,00.”
(Cfr. Processo de Reposição nº 74R/2019, folhas 31 verso).

N) Tal proposta foi objecto de despacho de concordância por parte do Diretor Regional de Agricultura e Pescas do Centro, datado de 11.01.2021 (Cfr. Processo de Reposição nº 74R/2019, fls. 22).

O) Consta do relatório final da instrução do Processo de Reposição nº 74R/2019, a seguinte proposta de decisão:

“Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 44º do Decreto – Lei nº 73/2009, de 31 de março, na redação que lhe foi conferida pelo Decreto – Lei nº 199/2015, de 16 de Setembro, com fundamento nos elementos de facto e de direito supra indicados, em obediência aos princípios da legalidade, da prossecução do interesse público na defesa dos solos da RAN e da proporcionalidade (artigos 3º, nº 1, 4º e 7º do novo Código do Procedimento Administrativo), proponho que o Senhor Diretor Regional de Agricultura e Pescas do Centro determine a reposição integral da situação anterior à execução da edificação dos autos, a cumprir voluntariamente num prazo de 60 (sessenta) dias úteis a contar da notificação da infratora, com execução dos trabalhos indicados no ponto 4.4.4.1. – A) da presente informação.”
(Cfr. Processo de Reposição nº 74R/2019, fls. 107 verso).

P) Tal proposta foi objecto de despacho do Director Regional de Agricultura e Pescas do Centro, datado de 28.07.2021, com o seguinte teor: “Concordo. Determino a reposição nos termos descritos no ponto 5 das conclusões e proposta de decisão da presente informação.” (Cfr. Processo de Reposição nº 74R/2019, fls. 101).

Q) Em 01.09.2021, foi a Requerente notificada do despacho suspendendo, despacho do Diretor Regional de Agricultura e Pescas do Centro, de 28.07.2021, para, no prazo de 60 dias úteis, a contra da notificação, repor a situação anterior à infração, com execução das seguintes operações: a) escavação do aterro até atingir o solo natural do local; b) carregamento e transporte de materiais resultantes da escavação para vazadouro autorizado, devendo ser apresentada à DRAPC cópia do documento comprovativo da entrega dos ditos materiais (Cfr. Processo de Reposição nº 74R/2019, fls. 111 e 112).

R) Para o transporte de 15.000m3 de terras para vazadouro, a Requerente obteve orçamento no valor de 238.500€00 (Cfr. documentos n.º 22, 23 e 24 juntos com o requerimento inicial).

S) O balancete da Requerente referente ao mês de novembro de 2021 apresenta os valores constantes do documento n.º 25, junto aos autos com o requerimento inicial, cujo teor se tem por reproduzido.

T) O balanço da Requerente referente aos anos de 2019 e 2020 apresenta os valores constantes do documento n.º 26, junto aos autos com o requerimento inicial, cujo teor se tem por reproduzido.

IV - Enquadramento jurídico (conclusões 22 a 29).

Sobre os requisitos da aparência do bom direito e dos prejuízos pela demora do processo principal, é dito na decisão recorrida:

“(…)

- Do fumus boni iuris

O critério do fumus boni iuris (aparência do bom direito), encontra-se previsto na segunda parte do nº 1 do artigo 120º do C.P.T.A., nos seguintes ternos, “… e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.”

Efetivamente, “A par do periculum in mora, o nº 1 do presente artigo faz depender também a atribuição de providências cautelares da formulação de um juízo sobre as perspetivas de êxito do requerente no processo principal”. – Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto F. Cadilha, 4ª Edição, Almedina, pág. 973.

O referido critério, tal como se encontra previsto no citado normativo, intervém na sua vertente positiva, tornando necessária, para o decretamento da respetiva providência, a existência de um juízo positivo de probabilidade quanto ao êxito do processo principal.

“Tal juízo na apreciação do requisito do fumus boni iuris não é sinónimo da evidência da concreta ilegalidade e consequente muito provável e evidente procedência da pretensão a deduzir a título principal, nem significa que apenas ocorra ou se mostre preenchido quando as ilegalidades ou questões que as mesmas envolvem se apresentem como simples, ou incontroversas”. – Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 15.11.2018, Proc. nº 0229/17.2BELSB 0649/18, publicado em www.dgsi.pt.

Como resulta dos autos, a providência cautelar ora requerida, providência de suspensão de eficácia da decisão contida no despacho do Diretor Regional de Agricultura e Pescas do Centro, de 28/07/2021, ou seja, da escavação do aterro e carregamento e transporte dos materiais daí resultantes para vazadouro autorizado, foi intentada previamente à instauração da ação principal, nos termos do disposto no artigo 114º, nº 1, alínea a) do C.P.T.A., a qual terá em vista, como alega a requerente, a impugnação do ato suspendendo.

Posto isto, entremos agora na análise perfunctória e sumária das concretas ilegalidades apontados ao ato suspendendo.

Descendo ao caso concreto, verificamos que a requerente alega que não praticou qualquer ato violador do regime da RAN.

Efetivamente e reportando-se aos anos de 2009/2011, entende a requerente, a este respeito “… não ter ocupado com o estaleiro da obra, qualquer área da RAN, e a ter existido qualquer modelação de terreno com terra sobrante da obra, tal acto foi executado a pedido do proprietário, para beneficiação do terreno que era terreno não arável, porventura em termos legais não integrando a RAN, e assim um acto, até não carente de qualquer autorização prévia, que sempre seria da obrigação do proprietário e não da A., pois tal movimentação e terraplanagem em área RAN foi-o para suprir o declive existente ao tempo no local, que da Estrada ao local ia de 0% a 9%,…”.

Considera, por isso, que o ato em crise constitui uma decisão que assenta e é certificativa de atos inverídicos e inexistentes, o que determina a nulidade do ato por força dos estatuído no artigo 161º, nº 2, alínea j) do C.P.A.

Não obstante, desde já se adianta que se nos afigura como não provável a procedência de tal pretensão, quando alegada em sede de ação principal.

Vejamos.

A este respeito determina o artigo 21º do Decreto – Lei nº 73/2009, de 31/03 que aprova o regime jurídico da Reserva Agrícola Nacional, “São interditas todas as ações que diminuam os destruam as potencialidades para o exercício da atividade agrícola das terras e solos da RAN, tais como: (..) d) Intervenções ou utilizações que provoquem a degradação do solo, nomeadamente erosão, compactação, desprendimento de terras, encharcamento, inundações, excesso de salinidade, poluição e outros efeitos perniciosos; (…) f) Deposição, abandono ou depósito de entulhos, sucatas ou quaisquer outros resíduos.”

Doutro passo, dispõe o nº 1 do artigo 23º do referido diploma legal, “As utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN para as quais seja necessária concessão, aprovação, licença, autorização administrativa ou comunicação prévia estão sujeitas a parecer prévio vinculativo das respetivas entidades regionais da RAN, a emitir no prazo de 20 dias.”

Sob a epígrafe reposição da legalidade, resulta ainda do artigo 44º do diploma em análise, “1 – Após audição dos interessados e independentemente de aplicação das coimas, compete ao diretor regional de agricultura e pescas territorialmente competente determinar que os responsáveis pelas ações violadoras do regime da RAN procedam à respetiva conformação com a legislação aplicável, fixando o prazo e os termos que devem ser observados.”

Ora, analisada, ainda que sumariamente, a ilegalidade apontada pela requerente ao ato em crise e tendo conta o teor dos preceitos supra transcritos, não demonstra a mesma a aparência do bom direito, tal como alega no seu requerimento inicial.

Pois que, pese embora o alegado pela requerente no que concerne à ausência de qualquer ato ou comportamento violador do regime da RAN, tal não é o que resulta dos factos provados.

Na verdade, resulta dos factos dados como provados, concretamente dos factos constantes das als. F) e G), que a mesma ocupou os terrenos da RAN.

Ocupação essa que não se prende, como refere a requerente, com a possível ocupação de área da RAN com o estaleiro da obra, mas sim com o facto da mesma ter executado um aterro ocupando 5000 m2 de solos situados em mancha de RAN, aterro esse onde foi possível verificar a existência de resíduos vários, como pedras, pedaços de betuminoso, pedaços de betão pertencentes a manilhas, pedaços de ferro semienterrados e pedaços de tubos de fibrocimento, tudo materiais que degradam o solo, ou seja, espalhando os RCD`S por todo o terreno arrendado para estaleiro e concretamente de áreas integradas na RAN.

Sendo certo que tal utilização, por força do disposto nos artigos 21º e 23º do Decreto – Lei nº 73/2009, de 31.03, corresponde a uma utilização não agrícola interdita, em relação à qual a requerente não tomou as diligências necessárias a obter o parecer prévio vinculativo por parte da respetiva entidade regional da RAN.

Assim sendo e por força do artigo 44º do diploma em análise, cabia à requerida no âmbito de procedimento administrativo adequado para o efeito, ordenar a restituição da situação a momento anterior à prática da infração.

O que no caso veio a suceder, tal como se afere pela existência do Processo de reposição nº 74R/20019, mandado instaurar por despacho de 05/07/2019 [facto provado na al. J)].

Processo esse que culminou, como decorre da factualidade assente [cfr. als. N) e O) do probatório], com a prolação do despacho suspendendo, o qual determinou a escavação do aterro até atingir o solo natural e o carregamento e transporte de materiais resultantes das escavações para vazadouro autorizado.

Acresce, entrando um pouco no âmbito do requisito dos interesses em presença, que igualmente não procede a argumentação da requerente ao alegar que a situação dos autos advém da pressão feita pelo contrainteressado, pois que tal situação já ali se encontra há mais de 10 anos sem qualquer perigo ou reparo social.

Pois que a ilegalidade resultante da atuação da requerente não é sanável pelo decurso do tempo e muito menos pelo facto de não existir qualquer suposta oposição.

Se assim não se entendesse tal situação acabaria por premiar a requerente que nada fez no sentido de obter o parecer prévio vinculativo nos termos do artigo 23º do Decreto – Lei nº 73/2009, de 31/03.

Por conseguinte, considerando o supra exposto e nada mais tendo a requerente alegado a respeito de concretas ilegalidades de que pudesse padecer o ato suspendendo, não se vislumbra como provável a procedência do vicio invocado aquando da sua alegação em sede de ação principal.

Pois que o ato suspendendo, tendo em conta a real factualidade subjacente à sua prolação, não padece de nulidade por força do disposto no artigo 161º, nº 2, alínea j) do C.P.A.

Logo, face ao supra alegado, impõe-se concluir que não se verifica, no caso concreto, o requisito do fumus boni iuris, essencial ao decretamento da providência requerida, o que importará desde logo a improcedência da pretensão da requerente.

- Do Periculum in mora

Não obstante o que se deixou dito em relação ao requisito do fumus boni iuris, a idêntica conclusão se chegará em sede de periculum in mora.

O periculum in mora traduz-se no fundado receio ou num perigo na demora, ou seja, o perigo de em virtude da demora do processo principal, as circunstâncias alterem de tal forma que a prolação de uma decisão definitiva naquele processo se mostre inútil, ou implique para o interessado prejuízos de difícil reparação.

Desta feita, permite o n.º 1 do CPTA a verificação deste requisito, tanto numa situação de facto consumado como alternativamente numa situação de produção de danos de difícil reparação.

Ora, “ocorre uma “situação de facto consumado” previsto no art. 120º, n.º 1, al. b), do CPTA quando, a não ser deferida a providência, o estado de coisas que a ação quer influenciar fique inutilizada ex ante” (Cfr. Acórdão do STA de 05/12/07, proferido no processo nº 723/2007).

Na verdade, a situação de facto consumado pressupõe que no caso de não ser decretada a providência cautelar se cristalize a situação que o requerente pretende evitar no momento em que for proferida decisão no processo principal, pelo que esta perde qualquer utilidade.

Por sua vez, estaremos perante a produção de prejuízos de difícil reparação no caso de, não sendo decretada a providência cautelar, apesar de a sentença no processo principal assumir utilidade e resolver definitivamente a questão em litígio, certo é que, atendendo à demora na prolação da mesma, os prejuízos entretanto ocorridos não são suscetíveis de reparação ou, sendo-o, apenas o serão de forma parcial.

Para que se afira da existência de um (facto consumado) ou de outro (prejuízo de difícil reparação) deve o juiz realizar um juízo de prognose no sentido de analisar, ainda que perfunctoriamente, da possibilidade de ocorrerem tais situações.

O periculum, num ou noutro caso, deve surgir como efetivo ou real e não meramente hipotético ou eventual, pois, não obstante a sumariedade adjacente à tutela cautelar, não constitui qualquer perigo um mero inconveniente ou mal-estar do requerente perante a situação em que certa conduta o coloque, antes devendo ressaltar dos contornos fácticos do caso concreto alegados pelo requerente.

Nos termos do artigo 114.º, n.º 3, alínea g) do CPTA, na senda do disposto no artigo 5.º, n.º 1 do Código de Processo Civil e 342.º do Código Civil, deve o requerente especificar, de forma articulada, os fundamentos do pedido, oferecendo prova sumária da respetiva existência.

Compete, assim, ao requerente o ónus de alegar e demonstrar, ainda que sumariamente, os factos concretos que justificam o requisito do periculum in mora e através dos quais seja possível encetar um juízo de prognose no sentido de no caso de não ser decretada a providência cautelar requerida a sentença a proferir no processo principal não terá qualquer utilidade, ou tendo-a se mostrem dificilmente reparáveis os prejuízos entretanto sofridos pelo requerente.

Mas, para tanto, afigura-se necessária a alegação de concretos factos que permitam tal juízo, exigindo-se da parte do requerente um esforço para a concretização de todos os elementos que possam permitir ao Tribunal dar como verificado o periculum in mora.

Não basta, deste modo, a realização de afirmações de natureza conclusiva ou genérica sobre a possível existência de prejuízos ou de um facto consumado, requer-se, antes, que o requerente identifique, em concreto, a sua situação económica global, as despesas regulares que suporta e demais circunstâncias concretas que espelhem tais prejuízos ou facto consumado. Além do mais, deve concretizar em que medida o não decretamento da providência resultará num facto consumado ou em prejuízos de difícil reparação, não se afigurando bastante a mera alegação genérica de que os mesmos vão ocorrer.

No mesmo sentido, veja-se o decidido no acórdão do TCAN, de 8/2/2013, processo n.º 02104/11.5BEBRG

“(…). Daí que se quanto ao juízo de probabilidade da existência do direito invocado se admite que o mesmo seja de mera verosimilhança, já quanto aos critérios a atender na apreciação do “periculum in mora” os mesmos devem obedecer a um maior rigor na apreciação dos factos integradores de tal requisito visto que a qualificação legal do receio como “fundado” visa restringir as medidas cautelares, evitando a concessão indiscriminada de proteção meramente cautelar com o risco inerente de obtenção de efeitos que só podem ser obtidos com a segurança e ponderação garantidas pelas ações principais.

XCI. À semelhança da petição inicial numa ação administrativa (comum ou especial), o requerente de uma providência cautelar deve expor as razões de facto e de direito que fundamenta a sua pretensão, derivando do disposto no art. 114.º, n.º 3, al. g) do CPTA que no “… requerimento, deve o requerente: ... Especificar, de forma articulada, os fundamentos do pedido, oferecendo prova sumária da respetiva existência …” e sendo que decorre do art. 264.º, n.º 1 do CPC que às “… partes cabe alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções …”.

XCII. Impõe-se, pois, ao requerente da providência o ónus de alegar a matéria de facto integradora dos requisitos legais de que depende a concessão da providência requerida (art. 342.º do CC), não podendo o tribunal substituir-se ao mesmo.

XCIII. Daí que o requerente terá de tornar credível a sua posição através do encadeamento lógico e verosímil de razões convincentes e objetivas nas quais sustenta a verificação dos requisitos da providência já que, da conjugação dos arts. 112.º, n.º 2, al. a), 114.º, n.º 3, als. f) e g), 118.º e 120.º todos do CPTA, não se mostra consagrada uma presunção "iuris tantum" da existência dos aludidos requisitos como simples consequência da existência em termos de execução do ato, pelo que o requerente do presente meio cautelar não está desobrigado ou desonerado de fazer a prova e demonstração dos factos integradores dos pressupostos ou requisitos em questão, alegando, para o efeito, factos integradores daqueles pressupostos de modo especificado e concreto, não sendo idónea a alegação de forma meramente conclusiva e de direito ou com utilização de expressões vagas e genéricas.”

Cumpre, assim, transpor o referido supra para o caso ora em análise.

A requerente orça o custo pela remoção das terras em 238.500,00€, concluindo que o cumprimento do ato suspendendo “traduzir-se-á em prejuízos imensuráveis”, pondo assim em risco a sua sustentação financeira.

Contudo, não resulta da sua alegação factos concretos que evidenciem que da execução do ato suspendendo se verificará uma situação de facto consumado.

Com efeito, a vir a requerente a incorrer no aludido custo, uma eventual procedência dos autos principais importará a indemnização desta no referido valor, sendo que, estando em causa um prejuízo financeiro, sempre o mesmo será ressarcível. Apenas assim não seria no caso de uma tal despesa importar a insolvência da requerente.

Sucede porém, que a alegação desta, neste ponto, mostrou-se conclusiva, não concretizando em que medida uma eventual despesa naquela valor conduziria a uma situação de facto consumado. Com efeito, a requerente nada diz quanto ao seu estado financeiro. Corroborando o afirmado supra no que concerne ao específico ónus de alegação a cargo da requerente, veja-se o que resulta do seguinte aresto:

Acórdão do TCAN, de 28/04/2017, processo nº 00480/16.2BEBRG-A:

“(…) Não cabe dúvida de que, nos termos do artigo 114º/1/g) do CPTA incumbe ao requerente da providência o ónus de “especificar, de forma articulada, os fundamentos do pedido” o que significa, em termos de fundamentação de facto e na questão em apreço, a necessidade da alegação dos factos concretos capazes de consubstanciar a situação de “periculum in mora” invocada, segundo o “guião” paradigmaticamente definido no acórdão deste TCAN de 17-04-2015, Proc. 02410/13.4BEPRT, 1ª Secção Contencioso Administrativo, em cujo sumário se pode ler:

«I - A concessão das providências cautelares, no tocante ao requisito do periculum in mora exigido pelo artigo 120º, nº 1, alíneas b) e c), do CPTA, assenta nos factos alegados pelas partes. Uma alegação insuficiente e meramente “conclusiva”, porque desprovida dos factos essenciais que constituem a causa de pedir, não é adequada para a averiguação do preenchimento de tal requisito.

II - Cabe ao requerente alegar factos concretos que permitam ao julgador apreciar e eventualmente concluir pela existência de uma situação de carência económica relevante para preenchimento do requisito do periculum in mora previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA (…).

III - Se ao tribunal é lícito considerar os factos instrumentais que resultem da instrução da causa, bem como os factos daí resultantes que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e também os factos notórios e aqueles de que tenha conhecimento por virtude do exercício das suas funções, como dispõe o nº 2 do artigo 5º do CPC, já vedado lhe é erigir ele próprio uma causa de pedir, quanto aos factos essenciais, mediante inquirição de testemunhas sobre matéria meramente conclusiva e afirmações de ordem tabelar por referência à facti species da respectiva norma legal: Sairia violado gravemente o princípio da imparcialidade do juiz.»

Exigia-se, pois, que a requerente alegasse os factos em que sustentassem uma eventual situação de facto consumado.

Não obstante, a requerente efetuou a junção aos autos do balancete de novembro de 2021, e do balanço em 31 de dezembro de 2020. Apesar de, como se deixou dito, nenhuma referência a dados contabilísticos ser feita pela requerente, da análise dos mesmos documentos juntos não resulta igualmente uma situação financeira que, em face de uma despesa naquele referido montante, pudesse fazer perigar a empresa.

Com efeito, analisando o rácio de solvabilidade, mediante a divisão do capital próprio pelo passivo, temos uma situação positiva porque maior que um.
Concomitantemente, verifica-se igualmente um volume elevado de vendas por comparação com os encargos com os empréstimos.

Deste modo, não obstante, não ter sido alegado, da análise dos documentos juntos pela requerente não resulta também uma situação financeira que pudesse conduzir à conclusão de que a execução do ato suspendendo fosse apta a criar uma situação de facto consumado, capaz de levar a sua situação de insolvência da empresa, isto é, uma situação que, em caso de provimento da ação principal, não fosse suscetível de ser indemnizável em sede de execução da sentença.

Assim, da documentação junta, não resulta evidente uma situação em que, no caso de a ação principal vir a ser julgada procedente, não fosse passível de ser indemnizável.

Não se mostra pois verificado o requisito de periculum in mora.”

Com total acerto.

Quanto à aparência do bom direito e dada a matéria de facto provada não se mostra provável o êxito da acção principal, pelo contrário.

Não está em causa a possível ocupação de área da RAN com o estaleiro da obra.

Está em causa execução pela Requerente de um aterro que atinge 5000 m2 de solos situados em mancha da Reserva Agrícola Nacional, definida como tal por instrumento legal de ordenamento do território e que não permite, como tal, classificação diversa, até alteração desse instrumento, pelos meios legalmente previstos.

Aterro que se destinou a encobrir resíduos vários, como pedras, pedaços de betuminoso, pedaços de betão pertencentes a manilhas, pedaços de ferro semienterrados e pedaços de tubos de fibrocimento.

Resíduos que a Requerente se comprometeu, no contrato de empreitada celebrado com as Águas (…), a colocar em vazadouro à sua escolha, adequado e devidamente licenciado, de acordo com o Regulamento Sobre Remoção de Entulhos no Município de (…), edital nº 60/1995, e demais legislação aplicável, independentemente da distância – ponto 10 dos factos provados.

Sem cuidar de verificar que o terreno arrendado para o efeito (presumidamente por ser o economicamente menos oneroso) tinha uma parcela abrangida pela RAN e sem obter o parecer prévio vinculativo por parte da respectiva entidade regional da RAN.

À Entidade Requerida não restava outra solução legal que não fosse a tomada no acto suspendendo, face ao disposto no artigo 44º do Decreto – Lei nº 73/2009, de 31.03, na redacção dada pelo Decreto – Lei nº 199/2015, de 16.09, ordenar a restituição da situação a momento anterior à prática da infracção.

Pelo que provavelmente a acção principal claudicará por o acto impugnado, ora suspendendo, se mostrar válido e legal.

Quanto ao periculum in mora também a Requerente não o logrou demonstrar.

Alegou de forma conclusiva que o cumprimento do acto suspendendo “traduzir-se-á em prejuízos imensuráveis”, pondo assim em risco a sua sustentação financeira. Mas apenas invoca o custo pela remoção das terras que ascende a 238.500€00 sem que tenha invocado e comprovado documentalmente demais factos relevantes da sua actividade e situação económica que permitissem concluir pela incomensurabilidade ou irreversibilidade da repercussão desse custo.

De resto, este custo, em bom rigor, resulta não do acto impugnado, mas do contrato de empreitada que a Requerente celebrou com as Águas (…) e no qual assumiu o compromisso de colocar os resíduos em causa em vazadouro à sua escolha, adequado e devidamente licenciado. O que não é o caso do terreno arrendado especificamente para esse efeito.

Custo que, pelos vistos, a Requerente quis minorar em desrespeito não só pela lei, mas também pelo contrato de empreitada celebrado.
*

V - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em NEGAR PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que mantêm a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.
*
Porto, 29.04.2022


Rogério Martins
Luís Migueis Garcia
Conceição Silvestre